ANDERSON, Perry Linhagens Do Estado Absolutista FICHAMENTO, IDEIAS CENTRAIS

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ANDERSON, Perry; Linhagens do Estado Absolutista ; Brasiliense; 3 edição, 1995 Consiste em um estudo marxista acerca do absolutismo europeu; prefácio Os historiadores marxistas nem sempre estiveram preocupados , nas últimas décadas, com os problemas teóricos de seus trabalhos. Ao mesmo tempo, os filósofos marxistas procurando elucidar ou resolver as questões básicas do Materialismo Histórico, o fizeram, com freqüência, consideravelmente afastados dos resultados específicos expostos pelos históriadores;7 Na literatura marxista atual, constroem-se ou pressupõem-se modelos gerais abstratos – não apenas do absolutismo, mas como também das revoluções burguesas ou do Estado capitalista --, sem preocupação com suas variações reais; por outro lado, exploram-se casos localizados concretos, sem referência às suas implicações e interconexões recíprocas;8 O objetivo desse estudo é examinar simultaneamente o absolutismo europeu “em geral” e “em particular”: vale dizer tanto as estruturas “puras” do absolutismo, como as variantes impuras, representadas pelas diferentes monarquias específicas da Europa pós-medieval; Os tempos dos absolutismos mais importantes na Europa foram diversos, o absolutismo espanhol sofreu a sua primeira grande derrota em fins do século XVI, nos países baixos; o absolutismo inglês foi 1

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fichamento com algumas comparações com ideias de outros autores, alguns comentários meus. foi tentado preservar ao máximo as ideias do autor, em grade parte o fichamento é reproduçao literal do livro, mas em boa parte é um resumo reescrito por mim, mas com o intuito de preservar a ideia do autor.

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ANDERSON, Perry; Linhagens do Estado Absolutista; Brasiliense; 3 edição, 1995

Consiste em um estudo marxista acerca do absolutismo europeu;

prefácio

Os historiadores marxistas nem sempre estiveram preocupados , nas últimas décadas, com os problemas teóricos de seus trabalhos. Ao mesmo tempo, os filósofos marxistas procurando elucidar ou resolver as questões básicas do Materialismo Histórico, o fizeram, com freqüência, consideravelmente afastados dos resultados específicos expostos pelos históriadores;7

Na literatura marxista atual, constroem-se ou pressupõem-se modelos gerais abstratos – não apenas do absolutismo, mas como também das revoluções burguesas ou do Estado capitalista --, sem preocupação com suas variações reais; por outro lado, exploram-se casos localizados concretos, sem referência às suas implicações e interconexões recíprocas;8

O objetivo desse estudo é examinar simultaneamente o absolutismo europeu “em geral” e “em particular”: vale dizer tanto as estruturas “puras” do absolutismo, como as variantes impuras, representadas pelas diferentes monarquias específicas da Europa pós-medieval;

Os tempos dos absolutismos mais importantes na Europa foram diversos, o absolutismo espanhol sofreu a sua primeira grande derrota em fins do século XVI, nos países baixos; o absolutismo inglês foi derrubado em meados do século XVII; o absolutismo prussiano sobreviveu até um período avançado do século XIX; o absolutismo russo sobreviveu até o século XX.10

Hoje, quando a “história a partir de baixo tornou-se senha reconhecida tanto em círculos marxistas como não marxistas e já produziu enorme benefícios para a nossa compreensão do passado, é necessário relembrar um dos axiomas básicos do materialismo histórico: que a luta secular entre as classes se resolve em última instância no âmbito político da sociedade - e não no âmbito econômico ou cultural. Em outras palavras, é a construção e a destruição dos Estados que sela as modificações básicas nas relações de produção, enquanto subsistirem as classes.11

Marx escreveu em sua maturidade: “A liberdade consiste na conversão do Estado de órgão sobreposto a sociedade em órgão completamente subordinado a ela, e também hoje uma sociedade é mais livre ou menos livre na medida que restrinja a liberdade do Estado;

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1ª PARTEEUROPA OCIDENTAL

Crise dos séculos XIV e XV teve como conseqüência política a emersão do absolutismo;

Para Engels o absolutismo representava o equilíbrio entre a nobreza e a burguesia( o que é dito no próprio Manifesto Comunista);

Marx por várias vezes disse que a estrutura administrativa do estado absolutista era um instrumento tipicamente burguês: " O poder centralizado do estado, com seus órgãos onipresentes: exército permanente, polícia, burocracia, clero e magistratura, tem sua origem no absolutismo, quando serviu a sociedade da classe média nascente, como arma poderosa na luta contra o feudalismo" ;

Todavia, para Anderson, tais juízos estavam equivocados, pois o fim da servidão ( simultânea ao aparecimento do estado absolutista) não significou o desaparecimento das relações feudais no campo;17

A coerção dos senhores sobre os servos , a posse dos meios de produção pelo produtor e a dependência pessoal não desapareceram quando as obrigações servis deixaram de ser extraídas na forma de corvéia e prestações em espécie(aqui, parece-me que espécie quer dizer produção) , e se tornou renda em dinheiro: enquanto a propriedade aristocrática impedia um mercado livre na terra e a mobilidade efetiva do elemento humano, as relações de produção rurais permaneceram feudais( o que é confirmado por Marx em o Capital);17

Durante toda fase inicial da época moderna, a classe dominante - econômica e politicamente - era, portanto, a mesma do período medieval: a aristocracia feudal;18

Essa nobreza passou por profundas metamorfoses nos séculos que se seguiram ao fim da idade média, mas até o final do absolutismo não foi desalojado do poder político;18

Contudo as formas de exploração feudal passaram por significativas mudanças. Na verdade, foram precisamente essas modificações que mudaram as formas do Estado( concepção própria do materialismo histórico). O regime político da monarquia absoluta é apenas um forma de manutenção da exploração feudal, no período do desenvolvimento da economia mercantil;19

Com a comutação generalizada das obrigações, transformadas em renda monetária, a unidade celular de opressão política e econômica do campesinato foi gravemente debilitada e ameaçada de dissociação. O poder de classe dos senhores feudais estava assim diretamente em risco com o desaparecimento gradual da servidão. O resultado disso foi um deslocamento da coerção

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político-legal no sentido ascendente, em direção a uma cúpula centralizada e militarizada - o estado absolutista;19

Essencialmente, o absolutismo era apenas isto: um aparelho de dominação feudal recolocado e reforçado, destinado a sujeitar as massas camponesas a sua posição social tradicional - não obstante e contra os benefícios que elas tinham conquistado com a comutação generalizada de suas obrigações.18

Estado absolutista tinha a função política permanente de reprimir as massas camponesas e plebéias. Entretanto ela foi dotada de força capaz de disciplinar e sujeitar indivíduos ou grupos dentro da própria nobreza.20

O advento do absolutismo foi marcado por agudos conflitos no seio da aristocracia rural, cujos interesses coletivos em última análise servia;20

O deslocamento do poder do âmbito local, nas mãos dos senhores, para as monarquias absolutistas foi acompanhado de um fortalecimento compensatório dos títulos de propriedade, enfraquecendo as concepções medievais de vassalagem;20

Se a aristocracia perdeu poder político, ganhou economicamente;20Simultaneamente a aristocracia tinha de se adaptar a burguesia

mercantil que se desenvolvera nas cidades medievais;20 Viu-se que a intercalação da burguesia impediu a nobreza ocidental de

ajustar suas contas com o campesinato a maneira oriental, esmagando a sua resistência para agrinhoá-lo ao domínio;.

A cidade medieval fora capaz de desenvolver-se porque a dispersão hierárquica de soberanias no modo de produção feudal libertara pela primeira vez as economias urbanas da dominação direta de uma classe dirigente rural(nota abaixo). (Nota: O celebrado debate entre Sweezy e Dobb, com contribuições de Takahashi, Hilton e Hill, permanece até hoje como a única abordagem sistemática das questões centrais da transição do feudalismo ao capitalismo. Num aspecto importante, contudo, ele girou em torno de uma falsa questão. Sweezy argumentou que a força Motriz na transição foi um agente externo de dissolução - os enclaves urbanos que destruíram a economia agrária feudal através da expansão do intercâmbio de mercadorias nas cidades. Dob replicou que o ímpeto para a transição deve ser localizado no seio das contradições da própria economia agrária, que geraram a diferenciação social do campesinato e a ascensão do pequeno produtor. Num ensaio posterior sobre o tema, Vilar formulou explicitamente o problema da transição como sendo o de definir a combinação correta das transformações agrárias endógenas e comerciais-ubanas exógenas, ao mesmo tempo que ele próprio enfatizava a importância

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da nova economia comercial atlântica no século XVI. Merrington resolveu efetivamente esta antinomia(oposição recíproca), ao demonstrar a verdade básica de que o feudalismo europeu - longe de se constituir numa economia exclusivamente agrária - foi o primeiro modo de produção na história a conceder um lugar estrutural autônomo a produção e as trocas urbanas. O crescimento das cidades era, nesse sentido, um processo tão interno como a dissolução do domínio feudal, no feudalismo da Europa Ocidental.), fim da nota;

Neste sentido, as cidades nunca foram exógenas ao feudalismo no Ocidente, como vimos: com efeito, a própria condição de sua existência era a singular destotalização da soberania no interior da ordem político-económica do feudalismo.

Durante a pior crise do século XIV, várias famílias patrícias do mediterrâneo foram a bancarrota, os Bardi e os Peruzzi arruinaram-se em Florença, Siena e Barcelona entraram em declínio; contudo Augsburgo, Genebra ou Valência estavam justamente no início da ascensão;21

Indústrias urbanas importantes cresceram durante a depressão feudal, como o ferro, papel e têxteis. O desenvolvimento das cidades interferia na luta de classes centrada na terra, e bloqueava qualquer solução regressiva proposta pela nobreza;21

Entre 1450 e 1500, simultânea estão o início do absolutismo, num país após o outro, e a superação da crise da economia feudal, através de recombinação dos fatores de produção, onde , pela primeira vez, os avanços técnicos especificamente urbanos desempenharam o papel principal. Esse período foi marcado por uma série de invenções: uma técnica para separar o minério de prata e cobre reabriu as minas da Europa Central e restabeleceu o fluxo de metais, quintuplicando a produção de moeda entre 1460 e 1530. O desenvolvimento do canhão de bronze fundido fez da pólvora, pela primeira vez, a arma decisiva na arte da guerra, tornando obsoleta a defesa dos castelos senhoriais. Os tipos móveis para imprensa. O galeão de três mastros, com leme a popa, tornou os oceanos navegáveis. Com estas rupturas técnicas, foi então que a depressão agrária secular foi finalmente sustada, por volta de 1470, na Inglaterra e França;22

Do caos das guerras de 2 rosas, cem anos e Civil de Castela, surgem quase concomitantemente o absolutismo na França, com Luís XI; Inglaterra, com Henrique VII; na Espanha, com Isabel e Fernando e na Áustria, com Maximiliano;22

A forma dos estados absolutistas foi fundamentalmente estruturada para opor-se ao campesinato, após a dissolução da servidão. Mas ela foi secundariamente sobredeterminada pela ascensão de uma burguesia

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urbana, que avançava rapidamente em direção de uma as manufaturas pré-industriais;22

As poderosas revoluções marítimas e industriais tiveram um grande impacto nas condições econômicas, porém não foram acompanhadas no âmbito político. O ordem política permaneceu feudal, enquanto a sociedade ficava cada vez mais burguesa;23

A forma do estado absolutista deriva então da ameaça de inquietação camponesa junto da pressão do capital mercantil;23

Em uma nota Anderson diz que a uma moda de tentar depreciar a contribuição de Engels para a formação do materialismo histórico. Mas para ele, os juízos históricos de Engels são quase sempre superiores aos de Marx. Ele possuía um conhecimento mais profundo da história européia;23

A base jurídica do absolutismo estava assentado no direito romano, cujo reflorescimento foi um dos grandes movimentos culturais da época, o qual atendia ao interesse das duas classes, cuja posição e poder desiguais moldaram o estado absolutista, a nobreza e a burguesia.23

A memória e a prática do direito romano nunca morreu na península Itálica.24

Fora da Itália, o direito romano começou a difundir-se a partir do século XII, adaptando-se a época, principalmente no que tratava da escravidão. No final da Idade Média, nenhum país importante da Europa ocidental escapara a esse processo. Mas sua assimilação definitiva aconteceria com o absolutismo;24

O direito romano foi fundamental para a expansão do livre capital na cidade e no campo, pois sua maior diferença era a concepção de propriedade privada incondicional24

O ressurgimento pleno da idéia de propriedade privada só se concluiu com o absolutismo;

Nas cidades já durante do período medieval as relações jurídicas tornaram-se em certos aspectos mais avançadas que os precedentes romanos. Como o primitivo direito das sociedades e o direito marítimo. A assimilação do direito romano era um resultado do desenvolvimento mercantil e correspondia aos interesses da burguesia;26

Mas a determinante primordial da adoção da jurisprudência romana reside na sua compatibilidade com a centralização do poder nas monarquias. Pois em sua divisão em direito civil e publico, esta segunda parte concedia soberania imperial ao menos a partir do Dominato;27

A primeira monarquia a adotar a jurisprudência romana em grande escala foi o Papado, com a codificação do direito canônico nos séculos XII e XIII. Por conseqüência a única a atingir total emancipação de

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restrições. O papado então abriu um precedente para os futuros príncipes, os quais em grande parte o usariam contra o poder exorbitante do próprio papado.28

Assim como os juristas canônicos assumiram os controles administrativos da Igreja, os burocratas versados no direito romano tornaram-se os principais funcionários dos Estados monárquicos;28

O estado absolutista foi o principal arquiteto da assimilação do direito romano na Europa Ocidental, cujo efeito supremo foi o reforçamento da classe aristocrática tradicional;28

Onde o poder monárquico falhou em impor o direito civil, ele não ganhou raízes no meio urbano, como na Inglaterra onde o direito romano nunca se naturalizou, em grande parte devido a centralização precoce, cuja unidade administrativa tornou a monarquia inglesa indiferente as vantagens do direito civil. No início da época moderna, as dinastia Tudor e stuart introduziram instituições similares as do direito civil, mas estas foram incapazes de prevalecer sobre as do direito comum( neste aspecto há um afastamento do Materialismo Histórico, ao considerar o âmbito político se sobrepondo ao econômico);28

As instituições que nasceram com a centralização do poder, vale considerar pela ordem, foram: exército, burocracia, tributação, comércio e diplomacia.

Quanto ao exército que surgiu com os estados modernos, vale ressaltar que eles divergem dos exércitos profissionais do estado burguês, os exércitos da época moderna era constituídos prioritariamente por mercenários, os quais continuaram em grande quantidade até o final dos estados absolutistas mesmo depois que o recrutamento obrigatório foi adotado pela maioria dos estados europeus. Essa preferência pelos mercenários vem de dois motivos principais, porque a nobreza receava armar seus camponeses e devido ser uma das funções desses exércitos esmagar as revoltas camponesas, o que seria mais fácil se não conhecessem a língua;30

Durante a Idade Média, o comércio e a produtividade agrícola se desenvolveram, porém seu rendimento era muito menor do quanto se ganhavam com as conquistas territoriais. É lógico, portanto, que a classe dominante feudal fosse militar, a qual era móvel podendo ir residir em territórios bem distantes de línguas e costumes diferentes.31

O estado absolutista herdou esta inclinação para a guerra, a paz era uma exceção, sempre gastaram a maior parte de sua renda em despesa militares. Com Carlos V, cerca de 80%; Necker calculava que a França de 1789 gastava cerca de 65%.32

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A forma predominante que a nobreza integrou-se ao estado absolutista foi pela aquisição de cargos, o qual era tratado como propriedade vendável, quem adquirisse um cargo poderia depois se ressarcir do gasto através do abuso dos privilégios e da corrupção, poderiam ter lucros de 400% ou até mais, em uma espécie de caricatura monitorizada da investidura num feudo.33

A expansão da venda de cargos era um subproduto da monetarização e ascensão da burguesia, a qual também se integrou ao aparelho do estado por meio da compra de cargos, mas a nobreza ainda ocupava o topo da hierarquia;34

Se a venda de cargos era uma forma de enriquecimento da nobreza e da burguesia, o estado absolutista tributava, evidentemente, os pobres;34

A transição das obrigações em forma de trabalho em dinheiro foi acompanhado pela cobrança de um imposto régio para guerra, esses novos tributos tinham sido a principal causa de revoltas camponeses no final da idade média; para os camponeses era a mesma coisa, exércitos inimigos ou amigos, um levava tanto quanto o outro. E então vinham os coletores de impostos e varriam o que podiam encontrar.

E, por último, os senhores recuperavam de seus homens as quantias de " ajuda" que eles próprios eram obrigados a pagar para seu soberanos. Os camponeses com certeza suportavam menos os encargos de guerra e os impostos remotos;34

Na prática, a classe senhorial estava, em toda a parte, efetivamente isenta de impostos diretos;34

Esse sistema duplo de exações conduziu a uma epidemia de rebeliões dos pobres, na França do século XVII, os nobres das províncias jogavam seus camponeses contra os coletores, para sobrar mais para extorquir-lhes. Os funcionários do fisco tinham que ser protegidos por unidades de fuzileiros;35

O mercantilismo requeria suprimir barreiras particulares e formar um mercado interno unificado para a produção de mercadorias. Para aumentar o poder do Estado, em oposição aos outros Estados, estimulava a exportação de mercadorias e restringia a exportação de ouro e prata e de moeda, devido a crença da soma zero, o que tornava o estado mercantilista extremamente belicoso, daí tantas guerras, enquanto o Laissez-faire seria mais pacifista, insistindo nos benefícios da paz mundial como meio do fomento do comércio internacional, mutuamente lucrativo;

(nota: hecksher defendeu que o objetivo do mercantilismo era aumentar o poder do estado, mais do que a riqueza das nações. Viner, ao contrário, não teve dificuldades de demonstrar que os teóricos do mercantilismo contemplavam na mesma medida o poder do estado e a riqueza das nações.

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Anderson diz que Viner subestimava a distância entre a teoria e a prática mercantilista. E na verdade tanto Viner como Hecksher deixaram de atentar para o ponto central, que era a indistinção entre economia e sistema político na época que gerou as teorias mercantilistas);35

Na França o mercantilismo marcou-se pelas manufaturas reais e as corporações regulamentadas pelo estado; na Inglaterra, pelas companhias privilegiadas(as quais era motivo de escândalo para Adam Smith, devido sua fusão do político com o econômico);36

As doutrinas burguesas clássicas do Laissez-faire, com sua nítida separação entre política e economia iria contrapor-se ao mercantilismo;

O comércio e a guerra não eram as únicas preocupações do estado absolutista, o seu grande outro esforço era a diplomacia. Esta foi uma das grandes invenções institucionais da época, inaugurada na região da Itália do século XV e depois estendida ;37

Na Europa medieval não haveria como haver um sistema diplomático formal, o mapa político era extremamente confuso e intrincado. Engels apreciava citar o exemplo da Borgonha(região central-leste da França, onde fica Dijon): " Carlos, o Temerário, por exemplo, era vassalo do imperador por uma parte de suas terra, e vassalo do rei francês por outra; por outro lado, o rei da França, seu suserano, era ao mesmo tempo vassalo de Carlos, o Temerário, seu próprio vassalo quanto a certas regiões."

As concepções ideológicas de nacionalismo eram estranhas a natureza mais íntima do absolutismo. Os Estados monárquicos da nova era não desprezavam a mobilização dos sentimentos patrióticos em seus súditos, nos conflitos políticos e militares que a todo momento opunham reciprocamente os vários reinos da Europa Ocidental. Mas a existência difusa de um Protonacionalismo popular na Inglaterra Tudor, na França Bourbon ou na Espanha Habsburgo era basicamente um indício da presença burguesa no seio do sistema político sempre manipulado pelos soberanos, ao invés de dominá-los( não esta claro quem domina o que).38

Evidentemente, as próprias massas rurais e urbanas manifestavam formas espontâneas de xenofobia: mas esta reação negativa tradicional as comunidades estrangeiras era bastante distinta da identificação nacional positiva que começou a aparecer nos meios burgueses cultos, no início da época moderna;38

O nacionalismo do absolutismo, ainda que muito acentuada na aparência, era, na realidade, inconsistente. A instância última da legitimidade era a dinastia, não o território. O estado era concebido como o patrimônio do monarca. O supremo estratagema da diplomacia era o casamento, menos dispendiosa como acesso para a expansão territorial que a

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agressão armada, a manobra matrimonial era, porém, de resultados imediatos menores( ao menos 1 geração) e sujeitos a imprevisibilidade da morte. O que desencadeava comumente guerras( guerra de Sucessão espanhola, Áustria ou Baviera);39

O estado ainda feudal absolutista era, no entanto, contínua e profundamente sobredeterminado pela expansão do capitalismo;39

A burguesia já era forte o bastante para deixar a sua marca indistinta no Estado, sob o absolutismo. Com efeito, o paradoxo aparente do absolutismo na Europa Ocidental era que ele representava fundamentalmente um aparelho para a proteção da propriedade e dos privilégios aristocráticos, embora, ao mesmo tempo, os meios através dos quais tal proteção era promovida pudessem simultaneamente assegurar os interesses básicos das classes mercantis e manufaturarias emergentes;39

O absolutismo:- centralizou o poder;- esforçou-se para impor um sistema jurídico uniforme;- Aboliu barreiras internas ao comércio;- patrocinou tarifas protecionistas contra os estrangeiros;- Proporcionou ao capital usurário investimentos lucrativos, ainda

que arriscados, nas finanças públicas: os banqueiros de Augsburgo, no século XVI, e os oligarcas gevoveses, no século XVII, puderam fazer fortunas com os seus empréstimos ao Estado espanhol;

- Mobilizou a propriedade rural por meio de confisco de terras eclesiásticas: dissolução de mosteiros na Inglaterra;

- Patrocinou empreendimentos coloniais e companhias de comércio;40- Em outras palavras cumpriu um papel importante na acumulação

primitiva necessária ao triunfo do capitalismo;40

A possível coexistência do estado absolutista e o capital mercantil e manufatureiro, deu-se ao fato que nenhum desses dois assentava-se na produção de massa característica da industria mecanizada, não exigindo portanto uma ruptura com a ordem agrária feudal que ainda englobava a ampla maioria da população;40

Diante das guerras endêmicas entre os estados, o desenvolvimento da produção era sempre de importância crítica para a sua força militar e política. A centralização econômica, o protecionismo e a expansão ultramarina engrandeceram o Estado feudal, ao mesmo tempo que beneficiou a burguesia emergente( AQUI ELE GENERALIZOU, PORÉM, PELO QUE ME CONSTA, EM PORTUGAL E ESPANHA A BURGUESIA FOI IMPEDIDA

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DE DESENVOLVER-SE);40Nunca ocorreu nenhuma derrogação política da classe nobre no Estado

absolutista. O seu caráter feudal acabava contentemente por frustrar ou falsificar as suas promessas ao capital. Os Fuggers acabaram por ser arruinados pelas bancarrotas dos Habsburgo; os nobres ingleses apropriaram-se da maior parte das terras dos mosteiros; Luís XIV destruiu os benefícios da obra de Richelieu ao revogar o Edito de Nantes;41

Idéias principais dessa primeira parte

Crise dos séculos XIV e XV teve como conseqüência política a emersão do absolutismo;

Fim da servidão ( simultânea ao aparecimento do estado absolutista) não significou o desaparecimento das relações feudais no campo;17

Enquanto a propriedade aristocrática impedia um mercado livre na terra e a mobilidade efetiva do elemento humano, as relações de produção rurais permaneceram feudais

Com a comutação generalizada das obrigações, transformadas em renda monetária, a unidade celular de opressão política e econômica do campesinato foi gravemente debilitada e ameaçada de dissociação. O poder de classe dos senhores feudais estava assim diretamente em risco com o desaparecimento gradual da servidão. O resultado disso foi um deslocamento da coerção político-legal no sentido ascendente, em direção a uma cúpula centralizada e militarizada - o estado absolutista, a fim de sujeitar as massas;19(ANDERSON ASSINALA COM MOTIVO PRINCIPAL DO DESLOCAMENTO DO PODER PARA AS MONARQUIAS EM DETRIMENTO DOS SENHORES O ENFRAQUECIMETO DESTES DIANTE DA COMUTAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES, PORÉM ANDERSON AQUI NÃO EXPLICA COMO OPEROU ESSE ENFRAQUECIMENTO);

Se a aristocracia perdeu poder político, ganhou economicamente, FORTALECIMENTO DOS TÍTULOS DE PROPRIEDADE;20

A cidade medieval fora capaz de se desenvolver porque a dispersão hierárquica de soberanias no modo de produção feudal libertara pela primeira vez as economias urbanas(ADIANTE ANDERSON DIZ QUE O DESENVOLVIMENTO DAS CIDADES INTERFERIAM NA LUTA ENTRE SENHORES X CAMPONESES. E A GRADATIVA PERDA DO CONTROLE DOS SENHORES FOI A CAUSA DO DESLOCAMENTO DO PODER PARA AS MONARQUIAS.)

O feudalismo europeu - longe de se constituir numa economia

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exclusivamente agrária - foi o primeiro modo de produção na história a conceder um lugar estrutural autônomo a produção e a troca urbanas. O crescimento das cidades era, nesse sentido, um processo tão interno como a dissolução do domínio feudal, no feudalismo da Europa Ocidental.

O desenvolvimento das cidades interferia na luta de classes centrada na terra, e bloqueava qualquer solução regressiva proposta pela nobreza;

A SEGUIR TRECHO DO PASSAGENS DA ANTIGUIDADE PARA O FEUDALISMO, ONDE ANDERSNO EXPLICA PORQUE AS CIDADES FORAM FUNDAMENTAIS PARA A DESAGREGAÇÃO DA SERVIDÃO:

Acima de tudo, era o setor urbano, protegido estruturalmente pela parcelarização da soberania na forma de governo medieval, que agora se desenvolvia a um ponto em que podia alterar de maneira decisiva o resultado das lutas de classes no setor rural. As grandes revoltas ocorreram próximas a poderosos centros urbanos.

O papel das cidades nas revoltas camponesas da época não era limitado a seus efeitos sapadores contra a ordem senhorial tradicional em sua vizinhança. Muitas das cidades apoiaram ou deram assistência às rebeliões. Os mais pobres em Londres se reuniram à Revolta camponesa em solidariedade social; os ricos burgueses em Paris emprestaram auxílio tático à Jacquerie com objetivos políticos. Assim, tanto objetiva quanto subjetivamente, as cidades afetavam o caráter e o curso das grandes revoltas;

As cidades, mesmo em períodos de paz, tornaram a possibilidade de fuga da servidão uma constante. Máxima alemã: “o ar da cidade faz o homem livre”199

Os senhores precisavam de dinheiro vivo e - além de um certo ponto - não podiam arriscar a impelir seus camponeses indiscriminadamente à vida errante ou ao emprego urbano. Viu-se então uma substituição das obrigações servis por renda em dinheiro no Ocidente, e um crescente arrendamento a camponeses sob contrato.(FIM DO TRECHO DO PASSAGENS)

Entre 1450 e 1500, simultaneamente está o início do absolutismo, num país após o outro, e a superação da crise da economia feudal, através de recombinação dos fatores de produção, onde , pela primeira vez, os avanços técnicos especificamente urbanos desempenharam o papel principal.

A forma dos estados absolutistas foi fundamentalmente estruturada para opor-se ao campesinato, após a dissolução da servidão. Mas ela foi secundariamente sobredeterminada pela ascensão de uma burguesia urbana, que avançava rapidamente em direção de uma as manufaturas pré-industriais

A forma do estado absolutista deriva então da ameaça de inquietação camponesa junto da pressão do capital mercantil;23

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As instituições que nasceram com a centralização do poder, vale considerar pela ordem, foram: exército, burocracia, tributação, comércio e diplomacia.

A transição das obrigações em forma de trabalho em dinheiro foi acompanhado pela cobrança de um imposto régio para guerra, esses novos tributos tinham sido a principal causa de revoltas camponeses no final da idade média.( UM PARADOXO, POIS ANDERSON HAVIA AFIRMADO QUE A CENTRALIZAÇÃO DO PODER TINHA O OBJETIVO DE CONTER AS REBELIÕES CAMPONESES E AQUI ELE DIZ QUE A PRINCIPAL CAUSA DAS REBELIÕES ADVINHAM DA PRÓPRIA CENTRALIZAÇÃO)

A possível coexistência do estado absolutista e o capital mercantil e manufatureiro, deu-se ao fato que nenhum desses dois assentava-se na produção de massa, característica da industria mecanizada, não exigindo portanto uma ruptura com a ordem agrária feudal que ainda englobava a ampla maioria da populacao;40

classe e Estado:problemas de periodização

A periodização real do absolutismo no Ocidente encontra-se, no fundo, precisamente na relação em transformação entre a nobreza e a monarquia e nas múltiplas mudanças políticas subordinadas;42

As monarquias medievais eram uma combinação instável de suseranos, no topo de uma hierarquia de vassalagem e reis ungidos. Como suseranos eram muito fracos e limitados, mas como reis tinham extraordinárias prerrogativas. Esta contradição configurava a tensão central do Estado feudal na Idade Média;42

O papel de suserano era o componente dominante deste modelo monárquico, como o absolutismo viria a demonstrar. Esse papel de suserano impôs limites muito estreitos à base econômica da monarquia no início do período medieval. Pois o governante feudal tinha que angariar seus rendimentos essencialmente nas suas próprias terras. As prestações originárias de seus domínios seriam recebidas inicialmente em espécie e depois, progressivamente, em dinheiro.

Ao lado dessa receita, recebia incidências feudais e “auxílios” especiais de seus vassalos, ligados à investidura em seus feudos, além de tributos senhoriais cobrados em mercados e rotas de comércio, das contribuições de emergência da Igreja e dos rendimentos da justiça real, sob forma de multas e confiscos;43

Essas fontes de rendimentos logo se mostraram insuficientes, mesmo

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para os exíguos deveres governamentais na organização medieval. Primeiramente os monarcas recorreram ao crédito de banqueiros e comerciantes das cidades, apenas adiando o problema;43

As monarquias passaram a convocar, de tempos em tempos, os “Estados” de seu reino, a fim de elevarem os impostos. Os "Estados" adquiriram freqüência, sua periodicidade variava de país para país, e relevância cada vez mais crescentes a partir do século XIII, na Europa Ocidental, quando as tarefas do governo feudal tornaram-se mais complexas e dispendiosa;43

Os "Estados" faziam parte da estrutura política feudal. Precisamente porque a ordem política e econômica se fundiam numa cadeia de deveres e obrigações pessoais, nunca existiu uma base legal para a tributação geral por parte do monarca, fora da hierarquia de soberanias intermediárias. A tributação universal, tão fundamental no Império Romano, era ausente durante a Idade das Trevas. Assim, nenhum rei podia decretar impostos à sua vontade. Todo governante tinha de obter o consentimento dos Estados;44

É sintomático que a maioria dos impostos gerais e diretos que foram lentamente introduzidos na Europa Ocidental, sujeitos ao assentimento dos parlamentares medievais, tinham sido criados na Itália, onde a primitiva síntese feudal pendia mais para a herança romana e urbana; Não só a Igreja cobrou impostos gerais aos fiéis para as Cruzadas, os governos municipais não tiveram dificuldades em impor taxas às suas próprias populações urbanas. A Península também inaugurou muitos impostos indiretos: o monopólio do sal; 44

Logo se desenvolveram um diversificado sistema fiscal nos principais países mais importantes da Europa Ocidental. Os príncipes ingleses contavam primordialmente com as taxas aduaneiras, devido sua situação insular, os franceses com os impostos sobre o consumo e os alemães com os pedágios. Tais taxas, entretanto, não constituíam subsídios regulares, permaneceram ocasionais até o final da Idade Média;45

Os “Estados do reino” representavam habitualmente a nobreza, o clero e os burgueses das cidades. Tais estados existiram praticamente em toda a Europa Ocidental, com exceção do Norte da Itália, devido sua urbanização e falta de suserania;45

Os "Estados" além da função fiscal expressavam os princípios mais profundos da hierarquia feudal, o dever do vassalo prestar ao suserano não apenas o auxilium, mas também o consilium( o direito de fornecer-lhe seu conselho solene em assuntos concernentes a ambas as partes);

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Os Estados inicialmente comportavam um grupo restrito da nobreza. Com a expansão dos Estados no século XII, parcelas maiores da classe nobiliárquica expandiam-se. E, à medida que expandiam a base fiscal da monarquia, crescia o controle coletivo da própria nobreza;46

Na prática os estados continuaram esporádicos e os impostos cobrados pelo monarca modestos. Em parte devido a falta de uma burocracia interposta entre a nobreza e a monarquia, baseando o monarca nos serviços de uma burocracia clerical, cujos funcionários já recebiam salários do aparelho clerical e originavam-se da própria nobreza.

O contraste entre monarquia medieval e absoluta sempre foi nítida, até para nobreza, essa, porém, não conseguia compreender sua causalidade, que decorria da difusão da produção e do intercâmbio de mercadorias;46

A transição para o absolutismo proporcionou para muitos nobres novas oportunidades de fortuna e glória; para muitos outros, significou a indignidade e a ruína, contra o que se revoltaram;

para maioria implicou um processo difícil e demorado de adaptação, através de sucessivas gerações. Esse processo de transição para a monarquia absoluta levou a nobreza a deixar:

- o exercício militar da violência privada;- os padrões de lealdade do vassalo;- os direitos políticos de autonomia representativa;- e aprender as novas ocupações de:

- um funcionário disciplinado e letrado;- um político cortesão;- e um proprietário de terras mais ou menos

prudente;47A época do Renascimento assistiu a primeira fase na consolidação do

absolutismo, quando ainda estava relativamente próximo do padrão monárquico precedente, os exércitos ainda eram pequenos e de mercenários;

No século XVI, aumento demográfico e advento do ouro, prata, e do comércio com a América => inflação, sem uma correspondente expansão fiscal => príncipes recorrem a facilitação do crédito, idade áureo dos financistas do Sul da Alemanha;48

Administração burocrática cresce, colonizada por grupos de nobres disputando privilégios políticos e benefícios econômicos dos cargos. Formavam rede rivais de apadrinhamento, que formavam uma sólida base regional no seio de um país tenuamente unificado(tanto na Inglaterra, na Espanha e na França, onde houve mortífera guerra entre Guise, Montmorency e Bourbon);

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Apenas entre 1550 e 1600, aparecem os primeiros teóricos do absolutismo desenvolvem a concepção do direito divino dos reis, acima da fidelidade recíproca e limitada da suserania. Bodin foi o primeiro e os mais rigoroso deles e seu pensamento dominou o pensamento político por um século ;48

Mas o século XVI encerrou-se, nos principais países, sem que a forma acabada do absolutismo existisse em qualquer deles: mesmo na Espanha, Filipe II foi impotente para enviar tropas através da fronteira de Aragão, sem permissão de seus senhores locais;48

Na verdade, o próprio termo absolutismo era uma denominação imprópria. Nenhuma monarquia Ocidental gozara jamais de poder absoluto sobre seus súditos. Todas elas eram limitadas;

Bodin: “ A marca principal da majestade soberana e do poder absoluto é, essencialmente, o direito de impor leis aos súditos sem o consentimento deles.(...)Existe na verdade uma distinção entre justiça e a lei, pois uma implica a equidade, enquanto a outra implica o mando.” mas ao mesmo tempo que discorria sobre o poder absoluto do monarca, retomava um princípio feudal, limitativos do poder monárquico: “ esta fora da competência de qualquer príncipe no mundo cobrar impostos livremente de seu povo” ; pois, “ desde que o príncipe soberano não tem poderes para transgredir as leis da natureza ordenadas por Deus - de quem ele e a imagem na terra -, não pode tomar a propriedade de outrem sem um motivo justo e razoável.” 49

Nenhum estado ocidental podia tomar a propriedade da nobreza ou burguesia, a maneira de tiranias asiáticas suas contemporâneas, os particularismo corporativos e as heterogeneidades regionais herdados do período medieval marcaram o Ancien Regimes até sua destruição;50

A monarquia absoluta no Ocidente foi sempre, na verdade, duplamente limitada: pela persistência, abaixo dela, de corpos políticos tradicionais, e pela presença, sobre ela, de um direito moral abrangente;50

O século XVII foi marcado por:- depressão demográfica e agrária;- tendência a queda dos preços;- completa instalação do absolutismo;

Os exércitos multiplicaram rapidamente seus efetivos, tornando-se astronômicas dispendiosos, numa série de guerras em expansão incessante. A coação fiscal sobre as massas, de um modo geral, intensificou-se. Ao mesmo tempo, a venda de cargos públicos e honrarias tornou-se agora fundamental, e sistematizou-se de uma forma muito diferente do século XVI. O resultado foi a integração de um número crescente da burguesia arrivista( que quer vencer na vida de qualquer forma), tornando a

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administração profissionalizadas;51A venda de cargos não apenas aumentava as rendas, como tinha um

papel político fundamental, bloquear fortalecimento de nobres que formavam sistemas de clientela de apadrinhamento. Richelieu sublinhou em seu testamento a importância da PAULETTE, ao afastar da administração as linhagens aristocráticas como a Casa dos Guise;

A burocratização dos estados formou novos tipos de administradores, normalmente recrutados na nobreza, ainda que ansiosos pelos benefícios dos cargos, estavam imbuídos de um respeito pelo estado. Estes dirigentes, carentes de uma base regional ou militar, foram reformadores do século XVII;52

A escalada da guerra, a burocratização, o aumento dos impostos, o desgaste do clientelismo, tudo isso levou a eliminação do que Montesquieu, no século seguinte teorizaria como os “ poderes intermediários” entre a monarquia e o povo;52

Levando a uma intensificação na centralização do poder na monarquia, mas o poder da monarquia não necessariamente correspondia ao poder do monarca, era raro um soberano efetivamente dirigir a política, apesar de exceções(Luís XIV e Frederico II);

O florescimento do absolutismo significava também a perda da autonomia da nobreza e o enfraquecimento dos Estados. Os últimos estados gerais antes da revolução reuniram-se na França em 1614; em Castela antes de Napoleão em 1665; na Inglaterra ocorria o mais longo recesso parlamentar em um único século, de 1629 a Guerra Civil;52

Essa época é não só o apogeu do absolutismo, como do generalizado descontentamento da aristocracia. A perda de privilégios e direitos consuetudinário não foram abandonados sem luta, especialmente nesse século XVII de recessão econômica e crédito inelástico. As revoltas da nobreza dessa época freqüentemente mesclavam-se com a sedição de mercadores e, às vezes, da fúria das massas contra a monarquia. A Fronda na França, A Republica Catalã na Espanha, A Revolução Napolitana na Itália, A Revolta dos Estados na Boêmia e a própria Grande Revolta na Inglaterra tiveram, todas, algo dessa revolta da nobreza contra a monarquia;53

Mas nenhuma conseguiu unificar a nobreza em grande escala contra a monarquia, pois ambas estavam vinculadas, tampouco registrou-se alguma revolta puramente aristocrática no século XVII.;53

A brecha fundamental entre nobreza e monarquia não era econômica, apesar dos impostos de guerra terem levados a revoltas, era política;

Apenas na Inglaterra, onde o componente capitalista da revolta foi predominante tanto na classe proprietária rural como na urbana, é que a

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revolta conseguiu êxito. Pois a aristocracia poderia abrir mão do absolutismo, sem colocar em risco sua existência;

Nenhuma classe na história compreende imediatamente a lógica de sua própria situação histórica em épocas de transição: um longo período de desorientação e confusão pode ser necessário para que ela aprenda as regras obrigatórias de sua própria soberania. A nobreza ocidental, na tensa época do absolutismo do século XVII, não constituiu uma exceção: teve que ser amansada na severa e inesperada disciplina de suas próprias condições de governo;54

É esta a explicação do paradoxo para a trajetória ulterior do absolutismo: se o século XVII, marca o auge do conflito entre aristocracia e estado, o século XVIII marca uma reconciliação, à medida que cem anos de uma relativa prosperidade econômica se instalava na Europa;54

Uma rearistocratização refinada da burocracia, ocorria em um país atrás dos outros, mesmo na Inglaterra georgiana e a Holanda das Perucas, onde a revolução burguesa efetivamente converteram o Estado e o modo de produção dominante ao capitalismo;54

O Estado, na era do Iluminismo, reflete este padrão: havia uma ornamentação de excessos e um refinamento de técnicas;54

A burocracia tornou-se menos venal, mas para compensar a diminuição desta receita, muitas vezes, recorria-se a empréstimos públicos;54

Ainda se pregava e se praticava o mercantilismo, embora o ideais liberais da dos fisiocratas, que defendiam o livre comércio e o investimento agrário, tenham feito alguns progressos limitados na França;55

Mas talvez o processo mais importante e interessante no seio da classe dominante fundiária nos cem anos que antecederam a Revolução Francesa foi exterior ao próprio estado. Trata-se da difusão por toda Europa do vinculismo - expedientes aristocráticos para a proteção e consolidação da grande propriedade fundiária contra as pressões e caprichos do mercado capitalista. A nobreza da Inglaterra, depois de 1689, foi uma das primeiras a seguir tal rumo, com a criação do strict settlement, que impedia a alienação das terras rurais e conferia apenas o primogênito o direito sobre elas, a fim de congelar o mercado de terras, no interesse da aristocracia. Logo os principais países ocidentais adotaram sua variante desse vinculismo, o MAYORAZGO espanhol foi de longe o mais antigo e chegou a incluir bens móveis;

Grande parte da estabilidade da nobreza européia no século XVIII foi devido, sem dúvida, ao suporte econômico decorrente de tais artifícios jurídicos; Houve provavelmente menos flutuação de famílias e fortunas nessa época que a anterior, em meio a grande levantes políticos;55

Foi com este panorama que uma cultura de elite cosmopolita de corte e

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salão espalhou-se por toda Europa, caracterizando-se pelo predomínio do francês como idioma internacional no discurso diplomático e intelectual, mas na verdade nesta cultura, mais do que nunca, havia penetrado as idéias burguesa, que tinha sua expressão triunfante no Iluminismo;56

Ao longo do século XVIII, ocorreu a segunda grande onda de expansão comercial e colonial ultramarina. Mas somente a Inglaterra e a Holanda, devido a revolução burguesa, essas expansão determinou a política do estado

Em outros estados, não há sinal mais notável da continuidade estrutural do estado feudal na sua última fase que a persistência de suas tradições militares;56

O aparato físico da guerra deixara de aumentar, ao menos em terra(no mar, era outra questão). Mas a freqüência e o seu caráter central para o sistema político internacional não se alterara seriamente;56

Talvez, durante o século XVIII, tenham mudado de mãos mais territórios geográficos - objeto clássico de todo conflito militar aristocrático - que durante qualquer dos dois séculos precedentes, a forma característica foi o conflito dinástico puro e simples do início do século XVI ( a disputa Habsburgo/Valois pela Itália). Sobreposto a esta por cem anos, de 1550 a 1650, estava o conflito religioso entre as potências da Reforma e da contra-reforma, que nunca iniciou, mas, com freqüência, intensificou e exacerbou as rivalidades geopolíticas, fornecendo-lhes o idioma ideológico da época. A Guerra dos Trinta anos foi a maior, e a última, destas lutas mistas;57

As guerras comerciais anglo-holandesas dos anos de 1650 e 1660, nas quais quase todas as batalhas foram marítimas, foi o primeiro conflito europeu com objetivos diferentes, mas restringiam-se a estados que haviam passado por revoluções burguesas e constituíam-se em disputas estritamente intercapitalistas;57

A partir da Guerra da Liga de Augsburgo, o comércio tornou-se quase sempre uma presença complementar nos mais importantes conflitos militares europeus

(TRECHO ABAIXO APARENTA ESTAR EM CONTRADIÇÃO COM A COMUTAÇÃO DE OBRIGAÇÕES DE TRABALHO, PARA ESPÉCIE OU MOEDA, TANTO ENFATIZADA)

As economias ocidentais compostas da época de transição combinavam, via de regra, uma agricultura semi-monetarizada e feudal pós-servil com enclaves de capital mercantil e manufatureiro;

Nota(p.197): O índice real de monetarização das diversas agriculturas da Europa ocidental nas séculos XVI e XVII era provavelmente muito inferior ao que vulgarmente se pensa. Jean Meuvret nota que , na França do século

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XVI, o campesinato vivia praticamente por toda a parte sob regime de quase-autarquia doméstica, ao passo que a vida cotidiano dos artesãos, inclusive os pequenos burgueses, era efetivamente regida pelo mesmo princípio, nomeadamente, o de viver sobretudo de alimentos cultivados no solo das terras que possuíam e apenas comprar e vender um mínimo; pois, para satisfazer as necessidades ordinárias, o uso das moedas de ouro ou de prata era complemente desnecessário. Com efeito, dado o número limitado de transações comerciais indispensáveis, podia-se muitas vezes passar sem o dinheiro.

ESPANHA

Houve amplas diferenças entre o modelo absolutista de cada país e nenhum pode ser assimilado a um tipo puro;58

Espanha foi a primeira grande potência da Europa Moderna;58Devido a desproporção de riqueza e poder, a ascensão da Espanha

Habsburgo influenciou na configuração dos outros estados europeus. Sua supremacia deveu-se a:

- pactos da política dinástica de casamentos;- metais preciosos da América;59Nenhum estado absolutista teve um caráter tão aristocrático e contrário a

burguesia que o espanhol. A própria extração da América desmotivou-a a incentivar a manufatura e difusão de empresas mercantis;

O estado espanhol sufocou a vitalidade urbana do norte da Itália e esmagou as florescentes cidades de metade dos Países Baixos - as duas regiões mais avançadas quando da virada do século XVI;59

Na mesma época, os estados monárquicos do Sul da Itália e Portugal foram absorvidos pela Espanha. As monarquias da França e da Inglaterra foram fustigadas por ataques hispânicos, os principados alemães foram invadidos repetidas vezes;59

Os ataques e a ameaça de dominação Habsburgo apressou a o fortalecimento das dinastias dos outros estados;59

Nasceu com o casamento de Isabel I e Fernando II em 1469. Começou com uma base econômica aparentemente firme. Durante os períodos de escassez de mão-de-obra provocada pela crise geral do feudalismo ocidental, áreas crescentes de Castela foram convertidas a uma lucrativa economia lanífera, transformando-a em um parceiro importante do comércio flamengo; enquanto isso, Aragão era há muito tempo uma potência territorial e comercial no Mediterrâneo, com o controle da Sicília e da Sardenha. O dinamismo político e militar do novo Estado dual logo se revelaria

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dramaticamente numa série de extensas conquistas externas( Granada, Nápoles, Navarra e a América). O ramo Habsburgo em breve adicionou Milão, Países Baixos e Franche-Comte, franco condado, penso;

O absolutismo espanhol gozou de uma posição internacional que nenhum outro absolutismo do continente foi jamais capaz de igualar. Todavia, o Estado que presidia este vasto império era, ele próprio, uma armação em ruínas unida, em última análise, apenas pela pessoa do monarca. O absolutismo espanhol, tão terrível para o protestantismo setentrional externamente foi, com efeito, notavelmente modesto e limitado em seu desenvolvimento interno.

Os reinos compostos de Castela e Aragão, unidos por Isabel e Fernando, representavam uma base extremamente diversa para a construção da nova monarquia espanhola no final do século XV.

Quando do casamento de Fernando e Isabel, Castela estado dominante na Península tinha:

- 5 a 7 milhões de habitantes, aristocracia latifundiária( 3% com 97% das terras), ordens militares, bastantes cidades.

- Lucro da lã => enriquecimento de casas aristocráticas => atividade pastoril substituía agricultura cerealífera => crescimento urbano e do comércio externo;

- Clero e nobreza eram isentos, impostos eram pagos só pelas cidades, recaindo sobre as massas;

Castela contrastava com o caráter político e econômico de Aragão ( com suas três províncias: Aragão, Valência e Catalunha) onde havia:

- Talvez o mais sofisticado sistema de estados da Europa, cada província tinha sua corte e instituições jurídicas e administrativas;

- 1 milhão de habitantes;- mais repressivo sistema senhorial da península;- aristocracia com poderes feudais;- Servidão;- Catalunha, que fora tradicionalmente o centro do império

mercantil no Mediterrâneo: Barcelona era a maior cidade da Espanha medieval, no entanto prosperidade catalã sofrera com a devastação da população pela peste e concorrência genovesa e revolta dos pequenos mercadores contra o patriciado nas cidades;

- Valência terceira província do reino era um meio termo entre Aragão e Catalunha. Nobreza explorava o trabalho mourisco e durante o século XV, cresceu comunidade mercantil, mas não compensou adequadamente o declínio da Catalunha;

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Fernando e Isabel decidiram, obviamente, estruturar o reino em Castela, onde a riqueza era maior e não havia obstáculos para centralização política:

- ordens militares foram decapitadas e anexados seus territórios e vastos rendimentos.

- Castelos baroniais foram demolidos, expulsos senhores das zonas de fronteiras e guerras privadas proibidas;

- autonomia das cidades quebradas;- justiça real fortalecida, assumiu o controle dos benefícios

eclesiásticos;- As cortes foram domesticadas pela omissão do clero e nobreza,

que não se opunham as decisões, pois estavam isentas e as principais decisões referiam-se a aumento de impostos para guerra( Granada e Itália, sobretudo)Em outras palavras a máquina do estado foi racionalizada e

modernizada, mas a monarquia nunca se contrapôs a aristocracia em seu conjunto, os quais ocupavam as posições militares e diplomáticas. As propriedades rurais foram imobilizadas através do MAYORAZDO. Garantiu-se amplos privilégios para o cartel de lã;

Nas cidades foi imposto a nascente industria um sistema constritivo de corporações e a perseguição religiosa dos conversos conduziu ao êxodo de capitais dos judeus;64

Aragão, ao contrário, apesar de formalmente vinculado, foi deixado a sua própria administração, na Observância de 1481 expressamente reconheceu-se as liberdades catalãs. Não se colocava de modo algum a questão de uma fusão administrativa, Fernando teve que reconhecer solenemente os privilégios da região. Nem uma moeda única conseguiu-se implantar, menos ainda um sistema fiscal e jurídico unico;65

A única instituição unitária espanhola foi a inquisição - invenção singular na Europa daquela época - um elaborado aparelho ideológico que compensava a divisão e dispersão administrativa;65

A ascensão de Carlos V gerou uma onda de xenofobia que culminou na revolta dos Comuneros de 1520, que diferentemente dos outros lugares da Europa naquela época foi uma revolta burguesa, não aristocrática, que foi esmagada;67

A súbita expansão territorial levou a criação de vice-reinados, sujeitos a um precário controle, que ficavam vinculados ora a Castela, ora a Aragão. A expansão então dificultou ainda mais a centralização;

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Com os gastos militares, Filipe II teve que anunciar oficialmente em 1556 a bancarrota do estado espanhol, cuja recuperação caberia aos tesouros do novo mundo, os quais tornava possível a Espanha prescindir da unificação fiscal e administrativa que constituía condição previa para o absolutismo em outros países;69

Houve uma ausência completa de contribuições proporcionais por parte de Aragão e a Itália para os esforços de guerra durante os séculos XVI e XVII. Castela tinha que suportar praticamente sozinha o encargo fiscal, e é precisamente por trás dela que estão as minas das Índias;

No auge das frotas de prata, apenas 20 a 25% da receita da Espanha vinha diretamente da América. O grosso era fornecido pelos encargos de Castela, mas essa quantidade de riqueza de Castela originavam-se dos carregamentos da América, entrava em Castela cerca do dobro do que era destinado a coroa;

As enormes operações militares de Filipe II somente foram possíveis devido à América, com seus carregamentos ou mesmo com a possibilidade de crédito que ela proporcionava;70

Como 60 a 70% dos metais da América não iam diretamente aos cofres do rei, estes tinham que ser trocados por produtos, formando um amplo comércio com as colônias, principalmente têxteis, azeite e vinho. Inicialmente esse mercado era monopolizado pelos produtores castelhanos. O que gerou uma alta de preços para os próprios consumidores da metrópole e a conversão de terras cerealíferas em produtores de vinha e oliveira. Somando isso a uma tendência que já havia de substituir a produção de trigo para lã. O resultado conjunto dessas pressões faria a Espanha pela primeira vez um grande importador de cereais em 1570;70

Gerou também um desemprego indiscriminado nas aldeias. O censo de 1571 revelou que apenas 30% da população masculina, ao passo que 40% estavam alheios a qualquer forma de produção, inchando o setor terciario;71

O fluxo de metais também paralisou as manufaturas. O aumento do custo de vida na Espanha e o baixo nível técnico tornaram o preço dos tecidos castelhanos proibitivos. Atravessadores Holandeses e ingleses abasteceram as colônias e manufaturados invadiram Castela. A Espanha transformara-se na América da Europa;

Auge do afluxo de prata em 1600, mas as despesa de guerra eram já tão elevadas que Filipe II criou novo imposto sobre os pobres, quadruplicando as receitas, mas ainda assim em 1596 surpreendeu a bancarrota oficial. 1599 mais terrível peste da época dizimou a população da província;74

A partir de 1620, a produção de metais na América começou a decair;

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Exportações da metrópole para colônia também cai, devido a aumento na produção de cereais, azeite e vinho(aristocracia crioula que crescia, enriquecia acima de tudo com a agricultura) , e comércio interno na América. E os manufaturados que interessavam não eram produzidos na Espanha e eram contrabandeados pelos ingleses e holandeses, os quais ascenderam nos mares à custa da inimiga Espanha;

A guerra de 30 anos iniciada por Viena em 1620 , foi incentivada pela Espanha, para esmagar o protestantismo na Alemanha e vingar-se da Holanda. Em 1635 Richelieu declarou guerra, que conseguiu reverter as derrotas Holandesas;76

Se nas guerras do século XVI, a Espanha beneficiou-se da fraqueza do estado dos Valois, aliando-se a dissidentes locais, agora o absolutismo maduro dos Bourbons aproveitou-se do separatismo regional para invadir a Espanha;

Os recursos para a guerra de 30 anos continuaram vindo quase que exclusivamente de Castela: Portugal cuida apenas de suas colônias, Flandres era cronicamente deficitária; Nápoles e Sicília não mais contribuíam como no século passado; Aragão e Valência restringiram-se a pequenos empréstimos. A Catalunha província oriental mais rica nada ajudava;

Para forçar a Catalunha ajudar na guerra, Olivares, Espanha, atacou o Sul da França nas proximidades da Catalunha, a qual foi retaliada pelos franceses. Esta jogada voltou-se contra a Espanha. A Revolução Catalã de 1640 agregou todas as classes sociais. O poder Habsburgo na província desintegrou-se. Para afastar os perigos do radicalismo popular e impedir uma reconquista por Castela, a nobreza catalã incitou a ocupação francesa. Pelo espaço de uma década a Catalunha tornou-se um protetorado da França. Pouco meses depois, Portugal iniciava sua revolta. Em 1643, Nápoles e Sicília livravam-se do domínio espanhol. Confirmando a deterioração do absolutismo espanhol, que cresceu muito rápido sem consolidar sua fundações. Na década de 1640 chegava a derrota na guerra de 30 anos e deparava-se com a bancarrota;80

A Fronda salvou a Catalunha e a Itália para a Espanha. Mazarino renunciou a Catalunha. A guerra, entretanto, arrastou-se ainda por mais quinze anos - contra os holandeses, os franceses, os ingleses e portugueses;80

Por volta do final do século XVII, o Estado Habsburgo estava moribundo: em todas as chancelarias estrangeiras aguardava-se a sua extinção;81

A guerra de sucessão espanhola renovou o absolutismo em Madri. A monarquia Bourbon excluiu do poder os grandes que haviam apoiado as tropas anglo-austríaca, com a importação das técnicas do absolutismo francês, criou-

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se um estado centralizado no século XVIII. Os sistemas de estados de Aragão, Valência e Catalunha foram eliminados. Todavia era tarde para revitalizar a sociedade espanhola e alcançar o desenvolvimento da França e Inglaterra. E as limitações da estrutura administrativa Bourbon sempre estiveram patentes;82

Mesmo após as reformas carolíngias, até a invasão napoleônica, mais da metade das cidades na Espanha não se encontra sob jurisdição monárquica, mas sim senhorial ou clerical;

Depois do colapso das minas americanas do século XVII, houve um novo surto de prata mexicana no século XVIII, mas sem manufaturas, beneficiou-se mais a expansão francesa. Tal como antes o capital local era desviado para as rendas públicas ou para a terra;

A administração continuava cheia de nobres empobrecidos. Por volta do final do século, a própria corte Bourbon estava em plena decadência;

O ancien régime preservou suas raízes feudais na Espanha até o dia de sua morte;83

FRANÇA

A monarquia Capeto foi unificando gradualmente a França, interrompendo esse processo em três crises( guerra dos cem anos, as religiosas no século XVI e as Frondas no século XVII), mas estes conflitos , se inicialmente atrapalham, depois aceleram a formação do absolutismo;

Todos os ducados sempre renderam vassalagem a dinastia central, mesmo os mais poderosos que o próprio suserano real(não havia mais de um reino como a Espanha)

As diferenças lingüisticas não eram tão acentuadas como na Espanha;

O controle da monarquia não era uniforme, mais fraco nas regiões distantes de Paris. A unificação também era dificultada pela população: 20 milhões no século XVI;85

Com o fim da dinastia Capeto(1328), tem-se o início da dinastia Valois, a guerra dos cem anos contra Inglaterra e Borgonha e a ruptura da unidade do reino;

Guerra dos cem anos e força dos arqueiros ingleses => criação de um exército remunerado( substituindo a convocação de cavaleiros vassalos do rei), para tal a aristocracia consentiu no primeiro imposto nacional => emancipação fiscal e militar da monarquia, mas ainda não havia uma administração em escala nacional;

Mas apesar de fortalecida, Carlos VII, como tinham feito os Capetos,

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concedeu autonomia a partes reconquistadas, devido incapacidade de administrar;86

Carlos VII voltou a convocar os Estados, mas raramente seus desejos foram satisfeitos; nem sempre os nobres acataram;87

Luís XI,1461 - 1483, assumiu o controle de cidades, impondo pesados tributos(nobres e clero isentos), com o revés de Carlos, O Temerário, levou a decadência da rival dinastia de Borgonha, culminado em um significativo aumento do poder e tesouro reais;87

A extinção da maioria das grandes casas da Idade média e a reintegração de seus domínios, reunindo todas as províncias vassalas da época medieval, deu grande relevo aos Valois. Mas a nova monarquia de Luís XI estava longe de seu um estado centralizado. A França estava dividida em 12 governos autônomos, tampouco as liberdades das cidades foram muito reduzidas. Os reis cessaram gradualmente de convocar os estados, pois as assembléias regionais elegiam deputados que se recusavam aprovar impostos nacionais;88

Na primeira metade do século XVI, Francisco I e Henrique II presidiram um reino próspero e em crescimento:

- funcionários aumentaram o poder jurídico;- assumiu-se o controle das nomeações eclesiásticas através

da Concordata de Bolonha, assinada pelo papa, mas o padroado não retirou a imunidade da igreja( ao contrário da Espanha onde o clero era pesadamente tributado)

- A França saiu derrotada das guerras na Itália pela Espanha onde o absolutismo era mais desenvolvido;90

A morte de Henrique II(1519, 1547-59) precipitou a França em 40 anos de guerras religiosas. A guerra entre os hunguenotes e a Santa Liga, pelo controle da monarquia, serviu para aglutinar todos os conflitos políticos. Do princípio ao fim, foram conduzidas pelas três grandes linhagens: de Guise, N.E.; Montmorency, centro; e Bourbon, S.O.. Cada uma possuía:

- um território;- vasta clientela;- influência no Estado;- tropas e conexões internacionais;- e recebendo o apoio de nobres empobrecidos acostumados a

pilhagem na Itália, que ligavam-se a uma linhagem independentemente da religião;

Quando Henrique de Navarra assumiu, estouravam revoltas urbanas que tendiam ao republicanismo e levantes de camponeses. A nobreza uniu-se

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então. Henrique IV aceitou tacitamente o catolicismo, juntou-se a aristocracia da Liga e reprimiu as revoltas. As guerras religiosas terminaram com a reafirmação do Estado monárquico;92

Henrique de Navarra(1553, 1589-1610): - reconstruiu Paris,- levou a pacificação civil;- incentivou a recuperação agrícola e do comércio exterior, - recuperou prestígio para a monarquia;- Edito de Nantes conteve o problema do protestantismo e

deu-lhe autonomia regional ilimitada;- paz externa;- duplicou a receita;- A mais importante inovação foi a Paulette, venda de cargos(

aumentava a receita e preservava a burocracia da nobreza);

Todavia as vendas de cargos cresceram enormemente e impediam o controle da monarquia sobre a justiça e finanças;

Richelieu, (1624 - 1642), e seu sucessores deram início a construção de uma máquina administrativa racionalizada, capaz de intervir e controlar toda França. Richelieu:

- liquidou as fortalezas Huguenotes remanescentes do S.O.;- Esmagou conspirações aristocráticas, com execuções

sumárias;- Derrubou castelos da nobreza;- Proibiu duelos;- Suprimiu os estados;- Criou os intendants, funcionário recrutados com amplos

poderes enviados temporariamente, depois permanentemente, as províncias. Mas tinham que conviver com os officiers, nobreza local. A compra de cargo continuou a existir. A aquisição de títulos de nobreza e de imunidade fiscal tornou-se meta empresarial da burguesia e sugou recursos das manufaturas e comércio;96

O estado por sua vez patrocinou manufaturas régias e companhias oficiais desde Sully, administrador de Henrique IV, a Colbert. O que desviou a evolução política burguesa por 150 anos.

O grande custo dos sucessos na Guerra de trinta anos foram sustentados pelos pobres(vendeu-se cargos como nunca e, ao mesmo tempo, rendeu fortunas espetaculares a banqueiros). Eclodiram desesperadas revoltas de massas urbanas e rurais, por décadas e décadas;

As Frondas podem ser vista como um movimento conduzido pela alta

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nobreza, magistratura e burguesia municipal que manipularam o descontentamento das massas para os seus próprios fins.

Mazarino,(1642), após a Paz de Vestfalia, provocou a Fronda ao tentar libertar Nápoles e Catalunha da Espanha:

- Os officiers liderados pelo Parlements(parlamentos provinciais controlados pela nobreza local) revoltaram-se contra os intendants, aproveitando a fúria popular;

- Exércitos privados perambulavam, saqueando;- cidades estabeleciam ditaduras rebeldes;- intrigas pelo controle da corte;-- governos provinciais tentavam acertar as contas com os

parlements;

Mazarino pois fim aos últimos redutos da revolta. Apesar de todas as contradições entre eles, como os officers e os intendants tinham a mesma origem nobre e os banqueiros e coletores de impostos tinham relações pessoais com os parlements contra os quais protestavam, estes grupos acabaram se reconciliando contra as massas. Aproximando a aristocracia dissidente e a monarquia;

A aristocracia, a partir de então, iria encontrar sossego sob o absolutismo consumado e solar de Luís XIV;

Luís XIV(1661-1715):

- Herdou os ministros chave de Mazarino(que depois de 1680 foram sendo substituídos por nobres mais ou menos medíocres);

- Silenciou os parlements;- Províncias não podiam discutir impostos;- Restringiu autonomia municipal;- obrigou a alta nobreza residir em Versalhes(1682);- criou polícia para reprimir motins;- Exército, agora com uniforme e soldo regular, passou de

30mil, para 300mil no final do período;

Durante o século XVII, a nobreza - 2 %- apropriava-se de 20 a 30% de toda renda da nação;

O estado de Luís XIV virou modelo para o resto da nobreza européia;A primeira década, 1661 - 1672, foi dedicada a organização do estado,

quando se produziu as mais duradouras realizações de seu governo, para depois lançar-se nas guerras externas: Sob a administração de Colbert, antes das guerras:

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- Eliminou-se cargos para cortar despesas;- Espoliações dos arrendadores de impostos foram reduzidas;- controlou-se mais a arrecadação;- os rendimentos dobraram e conseguiu-se um superávit;- intensificou-se o incentivo as manufaturas e

comércio(companhias, estaleiros) e a expansão colonial;- Protecionismo, que levou a invasão da Holanda em 1672

para eliminar seu comércio que era superior, frustrada ao final pela retaliação de Espanha, Áustria e depois Inglaterra;

Mas depois que iniciaram as Guerras:- Aumentou-se a venda de cargos;- aumentaram-se os antigos impostos e criaram-se outros;- Miséria decorrente de altos impostos e más colheitas

levaram a levantes populares, mas a nobreza não tentou manipulá-los a seu favor dessa vez, pois estavam aliviadas dos encargos que Richelieu e Mazarino tinha tentado impor-lhe;

- Expulsão de protestantes;

Guerra da Liga de Augsburgo (1689-97) - Holanda, Inglaterra, Áustria, Espanha contra França - devido a derrota do candidato francês ao eleitorado de Colônia, e a elevação de Guilherme III a monarquia Inglesa. Terminou empatada, mas dessa vez Luís XIV precisou tributar até a nobreza;

Em 1700, iniciava a guerra de sucessão espanhola e novamente a rudeza de Luís XIV maximizavam a coligação anti-francesa. O exército francês foi dizimado. A França foi derrotada e invadida, economia entrou em colapso, fome. Mas a aristocracia manteve o apoio a monarquia mesmo com os desastres de guerra e o conseqüente abalo na sociedade;104

O paradoxo do absolutismo francês foi que em seu auge, Luís XIV, externamente foi fraca, enquanto seu auge externo, Richelieu e Mazarino, marcou-se por fraqueza interna e sublevações;105

O absolutismo espanhol dominou a Europa por cem anos, posto em cheque com a Revolução Holandesa, e tendo sua supremacia destruída pelo absolutismo francês com o apoio da Holanda;

O absolutismo francês teve sua supremacia por curto tempo vinte anos após a paz dos Pirineus 1659 já estava contida. Mas já pelos estados capitalistas Inglês e Holandês com o apoio da Áustria. Os verdadeiros vencedores da guerra de cem anos foram os comerciantes e os banqueiros de Londres: esta anunciou um imperialismo britânico de escala mundial.

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O século XVIII marcaria o caráter aristocrático do absolutismo, assumindo o controle a alta nobreza cada vez mais unificada, dominando o clero, exército , burocracia, judiciário e isenta do grosso de impostos;

Mas o absolutismo francês nunca alcançaria confiança e aceitação inquestionáveis por parte da aristocracia que a baseava. Continuava a ser um poder inacessível e irresponsável, exercido sobre a cabeça da nobreza. Estando sua eficácia enquanto o estado estava na sua distância estrutural em relação a própria nobreza.

Durante o absolutismo, a França preservou a sua selva desconcertante de jurisdições e instituições. Até a revolução não ocorreu nenhuma racionalização na estrutura política: nunca foram criados tarifas alfandegárias, nem sistema fiscal, codificação de leis uniformes;

Os jesuítas foram expulsos da França, numa vitória simbólica do galicanismo (defendia a autonomia dos bispos franceses em face do pontífice romano).

Luís XIV deixou o estado afundado em dívidas, a partir da guerra de sucessão da Áustria, aliada a extravagância da corte, piorou. Tentativas de romper a imunidade da aristocracia foram sabotadas nos parlements. Utilizando o discurso burguês de liberdade e representação(direitos políticos), a aristocracia recusava-se alienar os seus privilégios econômicos sem conquistar direitos políticos sobre a condução do Estado.108

No século XVIII, apesar da agricultura continuar a ser o ramo amplamente dominante, as manufaturas e o comércio registraram notáveis avanços. Apareceram verdadeiras fábricas. E apesar da industrialização inglesa ser muito mais elevada. Com o processo de urbanização no final do século as cidades provinciais francesas suplantavam as inglesas em número e tamanho;

A burguesia cresceu de tal forma fora do estado, que os resultados seriam inevitáveis para a autonomia política da classe burguesa. A monarquia mostrou-se incapaz em defender os interesses burgueses, mesmo onde também lhe convinha. As guerras buscavam ainda pequenos territórios na Europa, mais do que colônias;

A guerra dos Sete Anos (1756 - 63), na qual a França comprometeu-se a apoiar o ataque austríaco a Prússia, contrário a qualquer interesse dinástico racional, levou ao desastre do império colonial Bourbon.110

A crise fiscal que detonou a revolução de 1789 foi provocada por sua incapacidade jurídica em taxar a classe que representava. A própria rigidez do vinculo entre Estado e nobreza acabaria por precipitar a sua derrocada comum.111

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INGLATERRA

Durante a Idade Média, a monarquia inglesa anglo-normanda foi, em geral, mais poderosa que as outras ocidentais. A nobreza era limitada e regionalmente unificada, sem potentados ou semi-independentes. Mas foi a que produziu o absolutismo mais fraco e curto;112

As cidades sempre fizeram parte do domínio do rei;Os senhores eclesiásticos não tinham enclaves sólidos e extensos;Existia uma única assembléia, e não uma em cada província, a qual não

havia divisão entre clero, nobreza e burguesia;Embora os monarcas medievais ingleses tivessem um poder executivo

muito maior, eles, e por isso mesmo(impossibilidade de separatismo regional), nunca chegaram a alcançar a autonomia legislativa dos franceses;

A administração e a justiça local eram controladas por um funcionário escolhido pelo rei, não vitalício, mas da própria região;115

A nobreza era tão predatória e militarizada como qualquer outra na Idade Média, expedições atravessaram a Europa no século XIV.

A Guerra de Cem anos foi realizada com pequenas tropas, pagas pelos senhores, para servir o rei, mas visando a pilhagem. E sua supremacia durante a maior parte da guerra deu-se em virtude da força da monarquia inglesa. Enquanto a francesa estava assolada por vassalos desleais na Bretanha ou Borgonha. Derrotados seus aliados borgonheses, as forças inglesas logo passaram a ser enfrentadas por exércitos cada vez maiores e mais equipados.;117

Com o fim da guerra, não existindo uma monarquia vitoriosa para manter unida a nobreza, a máquina de guerra volta-se contra si mesma, eclodindo a guerra de Duas rosas(1455 -1485)117

Antes das Guerras das Duas Rosas, os Parlamentos eram virtualmente anuais;

Henrique VII(1457,1485-1509) fortaleceu a monarquia e legou um erário próspero e um Executivo poderoso;

Henrique VIII, devido suas campanhas contra a França, 1512 e 1522, foi obrigado a dois breves arremedos de convocação parlamentar. Depois disso, uma tentativa de taxação arbitrária, que levou a oposição das classes proprietárias, suficientes para desestimulá-la;119

Em 1529, Henrique VIII(1491,1509-47) para ganhar apoio contra ClementeII e Carlos V convocou o parlamento de maior duração, que:

- Transferiu-lhe o controle do aparelho eclesiástico;- Destituiu os senhores do poder de nomear juízes de paz;- Incorporou o País de Gales;

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- Mosteiros dissolvidos e suas terras tomadas pelo Estado - cerca de 20% do território inglês, as quais acabaram sendo vendidas pequena nobreza que fortaleceu-se, o que seria um fator determinante para a limitação e futuro fim do absolutismo inglês;

- Uma rebelião eclodiu, mas foi sufocada;- Criou-se uma polícia secreta para delações e execuções

sumárias, crescendo rapidamente o aparelho repressivo;Henrique VIII desfrutou um poder interno semelhante ao seu

contemporâneo Francisco I da França. Mas não tinha um exército, em oposição a sua supremacia inglesa medieval, tão poderoso como o espanhol( a qual possuía o dobro da população e império colonial e possessões européias) e o francês( população 4 ou 5 vezes maior). Mas a memória da supremacia inglesa alimentava sua ambição, o próprio Henrique VII, acalentou desejos expansionistas. Henrique VIII tentou intervir nas guerras Valois-Habsburgo pela Itália e alimentou o sonho de ser imperador da Alemanha. Essas guerras sem propósito não foram fruto de um capricho pessoal, e sim da perda de importância militar da Inglaterra

Contudo sua posição insular a deixava imune do perigo de uma invasão, mesmo com sua inferioridade militar, a qual advinha em parte dessa própria segurança.

Levando a uma desmilitarização da aristocracia inglesa, a qual envolveu-se em atividades comerciais muito antes que as nobrezas do resto da Europa;122

Em 1500, todo par do reino portava armas; já à época de Elizabeth, apenas a metade tinha experiência de combate; em 1640 pouquíssimos nobres tinham um passado militar;

Produção de lã acelerou a tendência da nobreza ao comércio e a indústria têxtil rural proporcionava alternativas de investimento para a pequena nobreza;

Na Inglaterra, como a hierarquia feudal primitiva tinha sido minada devido as relações monetarizadas, os séculos XIV e XV presenciariam a adoção de novos graus - duques, marqueses, barões, e viscondes - no interior da nobreza, os quais, juntamente com os expedientes destinados a garantir o direito de primogenitura da herança, levariam a uma estratificação da nobreza; separariam, pela primeira vez, um pariato( o qual seria daí em diante a nobreza mais poderosa e rica) distinto do restante da classe;

Mas devido a sua propensão não militar e protocomercial, estimulada na época Tudor com a venda de terras e surto agrário, não desenvolveu-se, na Inglaterra, como ocorreu em outros países, uma ordem aristocrática mais rigorosa e de dupla linhagem;

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Assim a classe fundiária inglesa na época do absolutismo era civil em sua formação, comerciante por profissão e plebéia de linhagem;

Os limites para o absolutismo inglês eram conseqüência da nobreza que o circundava;

A breve passagem de Maria Tudor, com sua subordinação dinástica a Espanha e efêmera restauração católica, quase não deixou traço político;127

Elizabeth:- Inclina-se ao protestantismo, estabelece uma igreja

anglicana obediente;- popularidade da rainha atinge o ápice;- rede de espionagem e polícia, ocupada principalmente com a

repressão as atividades católicas, foi ampliada;- Rivalidades transformam-se em intrigas palacianas;- pequena nobreza, que foi apoiada pelos Tudor, como

contrapeso ao pariato, eram já um obstáculo ao poder real;- Importunação religiosa e obstrução fiscal do Parlamento,

convocado 13 vezes em 45 anos, leva Elizabeth a vender terras reais para diminuir dependência a ele;

- Máquina repressiva da monarquia permaneceu muito exígua, faltava-lhe a agitação das guerras por territórios, que acelerara o absolutismo no continente;

- Inferioridade militar continuou a impedir expansionismo no continente, política externa de Elizabeth era preventiva: contra Espanha, quando da independência da Holanda, contra ocupação da França nos países baixos, contra Liga na França;

- vitoria naval de 1588 não proporcionou aquisição de territórios ou tesouros;

- Ainda assim conseguiu conquistar, com medidas de extermínio, a pobre e primitiva sociedade de clãs da Irlanda. Que já tinha dominado no século XII;

O grande avanço no caráter(comercial) da classe fundiária inglesa no século XVI foi o aparelhamento e expansão naval;

- Por volta de 1500, a tradicional divisão entre galera longa, movida a remo, para guerra, e sua congênere redonda, movida a vento, para comércio, era superada por grandes navios de guerra a vela com canhões, que tomavam lugar dos remos e dos soldados;132

- Henrique VII mandou construir a primeira doca seca inglesa em 1496 e mandou fazer 2 desses navios;

- Henrique VIII foi responsável pela expansão sistemática e sem precedentes do poder naval inglês, mas as batalhas navais ainda

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continuavam a ser, essencialmente, disputas corpo a corpo entre tropas dentro da água;

- Nas décadas seguintes as marinhas espanhola e portuguesa superaram muito a inglesa com a invenção do galeão, muito mais rápido;

- A partir de 1579, com os galeões de baixo calado(parte imersa) equipados com canhões de longa distância. A marinha inglesa viria a demonstrar a superioridade técnica na Guerra contra Espanha, longamente ensaiada pela pirataria inglesa nas Antilhas;

- Em 1588, Elizabeth I era senhora da marinha mais poderosa que a Europa jamais conhecera;

- A marinha tinha a dupla função: militar e comercial;133- Ao longo do século XVI, a frota inglesa era composta de

navios mercantes convertidos a objetos bélicos pela adição de canhões, mas ainda passíveis de retomarem a função comercial;

- Com a expansão naval a classe fundiária pode aliar-se ao capital mercantil dos portos e condados;

Jaime I, habituado com a Escócia, cujo parlamento pouco valia, não conseguiu enxergar que o parlamento inglês ocupava o lugar central do poder da nobreza, cujo militarismo tinha sido vergado;

O capitalismo agrário e mercantil registrara, portanto, progressos muito mais rápidos que em qualquer outra nação, a exceção dos Países Baixos e a aristocracia - o pariato e a pequena nobreza - conseguiu adaptar-se a ele com sucesso. (Não necessitando de um Estado feudal);

Além disso não havia o perigo de uma revolta das massas, (fator determinante para a formação do absolutismo). Sem grande exército, os níveis fiscais conservaram-se notavelmente baixos, talvez 30% do equivalente na França no século XVII. Poucos desse encargos recaíam sobre as massas rurais e os pobres recebiam uma caridade dos cofres públicos. Além disso, com o desenvolvimento comercial, foi possível a consolidação de um estrato Kulak relativamente próspero, yeomanry, e de um grande número de trabalhadores rurais assalariados. Daí resultaria uma relativa paz social no campo, em oposição a inquietação de meados do século XVI;

( TADAVIA SEGUNDO HILL A depressão do setor têxtil na década de 1620 e a batalha pelas florestas isolaram o povo e um setor da gentry da coroa e dos grandes aristocratas que estavam cercando florestas e terras comunais)

O modelo de estrutura rural que viria a dominar na Inglaterra dividido em: senhores de terras, arrendatários e trabalhadores rurais, já

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se pronunciava nas zonas mais ricas da Inglaterra.Londres, com seu comércio e manufaturas, já era a capital mais

influente da Europa em 1630;CarlosI,(1625 - 1649):

- Desgaste com o fracasso na intervenção na guerra dos 30 anos e guerra desnecessária e malsucedida com a França;

- dissolveu parlamento;- aproxima-se da alta nobreza, com concessões, e do

patriciado da cidades;- leva o aparelho ideológico clerical a recomendar o direito

divino;- não conseguiu aumento de impostos, descambando para

vendas de cargos, que nunca tinha sido relevante na Inglaterra;- Enquanto o absolutismo continental foi construído sobre

seus exércitos, o absolutismo insular só podia existir se não tivesse que erguer um exército;

- A pequena nobreza desarmada também não podia iniciar uma revolta;

- Nobreza escocesa presbiteriana rebela-se contra imposição do anglicanismo e invade a Inglaterra em 1640. Na Escócia a aristocracia e a pequena nobreza não haviam sido desmilitarizas;

- Carlos I convoca o parlamento que lhe impõe várias restrições;

- 1641 eclode revolta católica na Irlanda;- 1642 inicia-se uma guerra entre o rei e o parlamento pelo

controle do exército;

Paradoxalmente, o absolutismo inglês foi levado a crise pelo particularismo aristocrático, que historicamente o sustentou;

Mas foi derrubado, no centro da nação, por uma pequena nobreza mercantilizada, um grande centro urbano capitalista, um artesanato e uma pequena burguesia rural. Antes que pudesse chegar a sua maturidade o absolutismo foi interrompido por um a revolução burguesa ;

É um erro pensar que os Stuarts poderiam contornar os problemas, se tivessem mais habilidade política. O erro fatal tinha sido cometido pelos Tudor: a imprevidente venda de terras. Foram as bases institucionais que impediram a consolidação do absolutismo inglês.

HILL, Christopher, Uma revolução burguesa?. Revista brasileira de

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história número 7

A revolução Inglesa, como todas as revoluções, foi causada pela ruptura da velha sociedade e não pelos desejos da burguesia ou pelos líderes do Longo Parlamento. Seu resultado, no entanto, foi o estabelecimento de condições muito mais favoráveis ao desenvolvimento do capitalismo do que aquelas que prevaleceram até 1640;

Dizer que a revolução, em última instância, resultou da tensões decorrentes do modo de produção capitalista, não é o mesmo que dizer que Carlos I foi derrubado por um bando de capitalistas;

Foram as estruturas, as fraturas e as pressões da sociedade e não os desejos dos líderes, que ocasionaram a eclosão da revolução moldando o Estado que dela emergiu.

Na década de 1640, camponeses se revoltaram contra os cercamentos, tecelões contra a miséria resultante da depressão;

O resultado da Revolução não foi algo desejado por quaisquer dos participantes;

Como Marx frisou, uma das diferenças essenciais entre a Revolução inglesa e a Revolução Francesa de 1789 foi a contínua aliança que na Inglaterra uniu a classe média, com a maior parte dos grandes proprietários de terra;

Na Inglaterra dos século XVI, a classe dominante de proprietários de terras era restrita e estava segura apenas enquanto estivesse unida. Nas duas gerações anteriores a 1640, esta já não estava mais unida pelo medo, seja da Espanha, de uma guerra civil dinástica ou de uma revolta camponesa; estava dividida por questões econômicas, principalmente monopólios, e questões religiosas;

ITÁLIA

As pequenas tiranias da Itália estavam muito afastados das realidades da estrutura ideológica e política muito mais complexa do poder de classe das novas monarquias da Europa ocidental. Maquiavel pouco percebia da imensa força histórica da legitimidade dinástica, na qual estavam as raízes do absolutismo emergente, não conseguiu compreender que o poder das novas monarquias territoriais fundamentava-se precisamente nesta combinação de nobreza feudal e legalidade constitucional. O seu mundo era o dos aventureiros transitórios e dos tiranos arrivistas das signorie da Itália;

É evidente que as instituições medievais do papado e do império, com

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seu caráter universalista, dificultaram o desenvolvimento de uma monarquia ortodoxa na Itália e na Alemanha;

O prematuro capital mercantil nas cidades do Norte da Itália impediu o surgimento de um poderoso Estado feudal;

Após a questão das investiduras no século XII, o papado construiu gradualmente uma autoridade autocrática e centralista, cujas prerrogativas ultrapassavam de qualquer monarquia, os benefícios clericais de toda cristandade passaram a ser controlados por ele;145

Mas ao mesmo tempo a posição do papado como Estado Italiano continuou frágil;

A riqueza e a vitalidade das comunas da Toscada e da Lombardia, com o apoio dos anátemas(excomunhão) do papado, derrotaram o reino da Sicília no século XIII, que foi o esforço mais importante para a construção de um monarquia feudal unificada, que poderia desdobrar em um estado absolutista.

As cidades Italianas assemelhavam-se, e em muito tentaram imitar, as da antigüidade clássica:

- Ambas exigiam serviço militar de seus cidadãos;150- ambas eram intensos centros de comércio;150- havia até algumas semelhanças com a polis grega: muitos

cidadãos temporariamente com cargos ou o uso de sorteio na escolha de magistrados;

- ambas inicialmente dominadas por nobres e a maioria da cidadania primitiva era proprietária das terras rurais ao redor( o que não acontecia nas cidades do resto da Europa);

Mas na realidade a natureza socio-econômico entre elas era muito diversa.

Cidades medievais:- Enclaves urbanos dentro do modo de produção feudal; elas

existiam essencialmente numa tensão dinâmica com o campo;151- Dominadas por mercadores, banqueiros, juristas- Excetuando nas colônias de Gênova e Veneza, não usavam a

escravidão, como também baniram a servidão e a vassalagem dentro delas;- Cidades Italianas eram fundamentalmente centros de produção

urbana, baseadas nas corporações de oficio, enquanto as da antigüidade eram primariamente centro de consumo.151

- divisão de trabalho, transportes marítimos e nível técnico das manufaturas - têxteis ou metalúrgicas - muito mais desenvolvidos que as da antigüidade;

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- Instituições financeiras muito desenvolvidas com sociedades por ações, letras de câmbio;

- meio rural era subjugado, cujos habitantes não tinham direito a cidadania. Sujeito a imposição de preços e um meticuloso regime de culturas;152

- As artes plásticas e visuais como a pintura, a escultura e a arquitetura ultrapassaram em riqueza artística a antigüidade, nas quais a escravidão levou ao divórcio com o trabalho manual, por outro lado, as realizações teóricas e intelectuais foram mais restritas. A literatura, a filosofia e a ciência - segundo a ordem descendente de suas contribuições - ficaram aquém da antigüidade;153

- Enquanto na cidade clássica o meio de expansão fundamental era a guerra, o das medievais era a expansão do comércio, cuja capacidade beligerante revelou-se limitada;153

cidades da antigüidade:- Dominadas por uma aristocracia proprietária de terras e o grosso

da população era constituído de pequenos lavradores ou plebeus pobres e escravos;

- Eram um simples aglomerado de consumidores da produção agrária e da renda fundiária;

- Constituíam uma continuação simbólica dele;- as cidades antigas eram primariamente centro de consumo;- Formavam uma unidade cívica e econômica com o seu meio

rural;- meio de expansão era a guerra pela pilhagem e conquista de

terras e escravos. A agressão armada era uma constante nas cidades Italianas, mas nunca chegou a adquirir tal primazia, voltando-se mais para a competição comercial;

- As tiranias foram um período de transição entre um governo oligárquico para um popular. Já na Renascença constituiu a forma final;

- a expansão territorial culminando em impérios era um prolongamento natural de sua vocação agrária e militar;

Mas as corporações de ofício medievais impediam a separação dos meios de produção do produtor, condição prévia do capitalismo. Exceto os têxteis de lã em centros avançados como Florença, que atingiu uma organização protofabril baseada no trabalho assalariado, mas a regra era manufatura têxteis domésticas controlada pelo capital mercantil. “todo o conjunto da legislação corporativa tinha como finalidade impedir qualquer tipo de

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inovação”. 158Assim a manufatura Italiana acabou sendo arruinada pela

concorrência com as indústrias estrangeiras mais livres e localizadas em áreas rurais. O capital mercantil sobreviveu por mais tempo, mas pagou seu preço , quando o predomínio marítimo deslocou-se da navegação mediterrânea para a atlântica, com o advento de formas de transporte naval mais rápidas e baratas, desenvolvidas pelos holandeses e ingleses;157

As cidades-estados Italianas, como o resto da Europa Ocidental foi assolada pelo despovoamento do século XV: o refluxo comercial e as falências dos bancos reduziram a produção manufatureira. Mas o autor sugere que elas devem ter se recuperado da crise geral do feudalismo em melhores condições que qualquer outra região do Ocidente;

Enquanto as cidades Italiana foram pródigas na criação artísticas na Renascença, as cidades alemãs, por estar próximas de minas(prata, ferro, cobre, estanho, zinco), foram palco de praticamente todas as grandes progressos tecnológicos da época: imprensa, refinação de mineiro, material bélico, relógios;159

Na Prússia e na Rússia, surgiu um superabsolutismo sobre um vazio urbano. Na Itália e na Alemanha a oeste do Elba, a densidade urbana produziu apenas uma espécie de Microabsolutismo;

Diante de sua fraqueza a península passa para o domínio dos Habsburgo, os quais venceram a França. O resultado foi a regressão econômica: os patriciados urbanos abandonaram as finanças e as manufaturas para investir nas terras. Piemonte tinha uma base para a unificação: somente ai surgiu um verdadeiro absolutismo nativo claramente alicerçado numa nobreza feudal, em uma formação social dominada pela servidão. Piemonte era economicamente rudimentar, se comparado a Veneza ou Milão; precisamente por essa razão conseguiu a unificação;

Em 1460, nas vésperas das invasões estrangeiras que encerrariam a Renascença, o Piemonte era o único Estado independente da Itália com um sistema de estados influente, justamente por sua formação mais feudal da península. Mas ainda caiu sob o domínio francês;

No século XVIII, Piemonte deu um importante avanço ao absolutismo, aumentando as receitas, construiu um amplo aparelho diplomático e militar na qual se integrou a aristocracia, subordinou a Igreja, promoveu a manufatura de exportação e construiu uma grande capital em Turim.

No séc. XVIII, Piemonte desenfeudou amplas faixas de terras da nobreza, tornando-os alódios. E isto tem um significado bem claro para a história geral do absolutismo. Pois na organização medieval, onde não existia

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um sistema fiscal centralizado, o interesse econômico do governante era multiplicar o número de feudos - com o dever de serviço militar e tributos feudais - e reduzir o número de alódios (Bens ou propriedades isentas de obrigações senhoriais), com o seu regime de posse incondicional e a conseqüente isenção de prestar obrigações a um superior feudal. Com o advento de um sistema fiscal centralizado, a situação se inverteu: os feudos ficaram fora da tributação fiscal, porque deviam um serviço militar que era agora meramente simbólico, ao passo que as propriedades alodiais podiam ser tributadas como qualquer propriedade urbana ou camponesa.

SUÉCIA

Nunca existiu na idade Média uma hierarquia feudal bem articulada, o que evitou a formação de potentado feudais, ou separatismo como no continente;

Apenas metade das terras em sistema feudal( ainda que a servidão não fosse jurídica, os tributos eram extraídos por coação extra-econômica, outra parte ocupada por um pequeno campesinato;

Uma das menores taxas de comercialização e poucas e frágeis cidades;Centralização não ocorreu em resposta a uma crise da servidão ou

mudanças sociais devido ao comércio e, sim, devido a ameaça dinamarquesa;

nobres suecos se uniram contra a invasão das tropas do rei dinamarquês em 1520 formando uma monarquia estável que:

- Expropriou os bens da Igrejas e, diferentemente dos Tudors e da secularização dos príncipes alemães, passou quase todo patrimônio da igreja para a monarquia sueca;

- Oficializou a Suécia como luterana em 1544;- 1544, monarquia passa de eletiva para hereditária;- iniciou um império ultramarino;- entrou em conflito com a nobreza;

No Ocidente: absolutismo edificado sobre um campesinato não-servil e cidades em ascensão;

No Leste: absolutismo edificado sobre um campesinato servil e cidades subjugadas;

Na Suécia: Predominava camponeses livres e cidades insignificantes; Embora a nobreza tivesse um menor predomínio na área rural, que as do restante do Ocidente, era também muito menos constrangida pela burguesia urbana. Havendo poucas chances do campesinato subverter a ordem. A

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extensão da propriedade camponesa independente tornava tal hipótese impraticável. A ordem social na Suécia era então invulgarmente estáveis, até a ameaça externa;

Além disso a nobreza sueca era proporcionalmente em muito menor número;

Único estado renascentista com exército de recrutas, devido a campesinato independente;

Absolutismo exigia grande monetarização. Na Suécia pouca comercialização da agricultura compensou-se com extração de ferro e cobre, a qual foi anda mais importante para o seu absolutismo, que o ouro e a prata para Espanha;

Em vez de um início conflitante, uma estabilização e uma integração final tranqüila com a nobreza, o que foi a evolução normal em outros países. O absolutismo sueco foi marcado por reveses periódicos.

Em 1655, Carlos X relançou o expansionismo sueco tomando Potsdam, Varsóvia e Cracovia, Prússia Oriental e Lituânia;

absolutismo no Leste

A crise econômica dos séculos XIV e XV => violenta reação senhorial a leste do Elba. A repressão contra os camponeses cresceu no século XVI. Esse processo resultou a formação do absolutismo na Prússia e Rússia, contemporâneo mas de linhagens diferentes da do Ocidente;195

Ocidente: absolutismo foi uma compensação pelo desaparecimento da servidão(a classe feudal havia aceito a comutação das obrigações), no contexto de uma economia crescentemente urbana que ele não controlava complemente e a qual tinha de adaptar-se;

Leste: absolutismo foi um mecanismo para consolidação da servidão, num meio onde não existiam cidades autônomas. Uma máquina repressiva de uma classe feudal que acabara de suprimir as tradicionais liberdades comunais da população pobre;

Embora o comércio de cereais tinha sem dúvida intensificado a exploração servil na Alemanha oriental ou na Polônia, a economia ocidental não foi responsável pela reação senhorial no leste. O comércio externo era ainda pequeno, com exceção da Holanda e Veneza, o modo de produção feudal que ainda persistia no ocidente nos séculos XVI e XVII era incapaz de criar um sistema econômico unificado, o qual só seria possível com o capitalismo industrial;

Foi a pressão do absolutismo do ocidente que forçou a nobreza do

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Leste a adotar uma centralização para sobreviver. O competição habitual interfeudal era a guerra, a conquista era a forma de expansão não o comércio;

A Suécia o mais novo estado absolutista ocidental revelou-se o flagelo do Leste;

A ascensão do Estado absolutista no século XVII respondeu basicamente ao temor social: o seu aparelho político-militar de repressão era a garantia da estabilidade da servidão. Havia, portanto, para o absolutismo oriental, uma ordem interna que complementava as suas determinações externas: a função do Estado centralizado era defender a posição de classe da nobreza feudal ao mesmo tempo contra os seus rivais estrangeiros e os seus camponeses dentro do país. O estado absolutista foi assim um fenômeno europeu geral;

A influência da guerra na sua estrutura era ainda mais preponderante que no Ocidente: todo ministro de estado era simultaneamente intitulado ministro da Guerra, toda organização estava ligada a fins militares;

O absolutismo oriental foi, portanto, fundamentalmente determinado pelas coações impostas pelo sistema político internacional em que as nobrezas de toda a região estavam objetivamente integradas. Foi este o preço de sua sobrevivência numa civilização marcada pela incessante guerra territorial; o desenvolvimento desigual do feudalismo forçou-as a confrontar-se com as estruturas políticas do Ocidente antes de terem atingido um estágio semelhante de transição econômica para o capitalismo.( evolucionismo);202

Não obstante, este absolutismo foi também, e inevitavelmente, sobredeterminado pelo curso da luta de classes;

A consolidação da servidão na Prússia, Rússia e Boêmia ao mesmo tempo do lançamento das bases do absolutismo, estando estreitamente vinculados.

Para formar exércitos na Prússia decretou-se ordenações vinculando a força de trabalho a terra, o que aumentou o poder da dinastia sobre a nobreza e da nobreza sobre o campesinato;

O pacto social entre a monarquia e a aristocracia russas estava firmado, estabelecendo-se o absolutismo em troca da consecução da servidão;

O tratado de Vestfalia 1648, fim da guerra de 30 anos, consagrou a dupla vitória da monarquia Habsburgo sobre os Estados boêmios e da alta nobreza fundiária sobre o campesinato theco;

O amadurecimento dos Estados absolutistas no século XVII acabou por desferir um golpe fatal na possibilidade de um renascimento da independência urbana no Leste. As monarquias asseguraram de forma inabalável a supremacia política da nobreza sobre as cidades.

O aparelho de repressão do absolutismo do Leste dirigia-se básica e

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primordialmente contra o campesinato. O século XVII, com guerras(30 anos e outras) e desastres civis levaram a queda de preços e da população, cuja densidade já era bem menor que no Ocidente;

A época das dificuldades, com suas guerras civis, invasões estrangeiras e rebeliões rurais veio acrescentar a instabilidade e escassez de força de trabalho;

O principal objetivo da classe senhorial não era, portanto, como no Ocidente, fixar o nível dos tributos a serem pagos pelo campesinato, mas deter a mobilidade dos aldeões e prendê-los aos domínios. Em amplas áreas orientais a forma característica e eficaz de luta de classe empregada pelo campesinato era simplesmente a fuga(em 1720, muito depois da consolidação jurídica da servidão, o censo russo apontou 200 mil servos fugitivos, que correspondia 4%total dos servos, e que foram repatriados a seus antigos senhores;

A constante preocupação senhorial com o problema da mobilidade da mão-de-obra no Leste foi o fator que esteve por trás de grande parte do impulso interno em direção do absolutismo. Um aparelho repressivo impiedosamente centralizado e unitário(muito mais severo que o sistema de policiamento no ocidente na idade média) era uma necessidade objetiva para a vigilância e a supressão da mobilidade rural generalizada, em épocas de depressão;208

NOBREZA E MONARQUIA:A VARIANTE ORIENTAL

Na Idade Média no Leste, não formou-se uma organização feudal integralmente articulada. Esta situação estava ligado a pouca densidade populacional no Leste, que dificultava a exploração do trabalho pela nobreza, dada a possibilidade de fugas, e a integração hierárquica da nobreza, o sistema de feudo propriamente dito nunca chegou a estabelecer-se verdadeiramente além-Elba, não se conheciam as complexas cadeias de retrovassalagem ou subenfeudação. Na Rússia o progresso do czarismo foi construído sobre a conversão das posses alodiais em posses condicionais no século XVI;

Por outro lado a autoridade pública nunca chegou a ser tão limitada ou dividida juridicamente como no Ocidente;

O século XVIII presenciou o apogeu da harmonia entre a aristocracia e a monarquia na Prússia e na Rússia, tal como na Europa Ocidental. Esta foi a época em que a nobreza de ambos os países adotou o francês como a língua culta da classe dominante, o que evidenciava a ausência do

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protonacionalismo que se desenvolvia no Ocidente, que por sua vez era fruto da ausência de uma burguesia ascendente no Leste;

A propriedade privada e a segurança da classe fundiária permaneceram como o talismã doméstico dos regimes monárquicos, por mais autocráticos que fossem suas pretensões;

No Leste tal como no Ocidente, o imperioso advento do absolutismo encontrou inicialmente a incompreensão e a recusa; depois, passada a confusão e a resistência, este foi finalmente aceito e acolhido pela classe fundiária;

O despotismo iluminado do século XVIII marcou o apogeu do absolutismo no Leste simbolizado por Frederico II, Catarina II e José II que partilharam a Polônia(a qual por não conseguir desenvolver um absolutismo, acabou por deixar de ser um estado independente), calma e coletivamente em desafio as potências ocidentais, impotentes as vésperas da Revolução Francesa, aparece como um símbolo de sua ascensão internacional;

Enquanto Filipe II e Luís XIV expulsaram os mouriscos e os hunguenotes, Frederico II, não apenas acolheu os refugiados religiosos como estabeleceu um estrangeiro escritório de imigração a fim de promover o crescimento demográfico de seu reino - uma nova volta no parafuso do mercantilismo;234

Frederico II e José II promoveram o ensino público e incentivaram as manufaturas. O recrutamento foi introduzido em toda parte.234

Mas ainda continuaram monarquias retrogradas. A servidão foi preservada por Frederico II e ampliada por Catarina II: os fundamentos senhoriais do absolutismo oriental sobreviveram intatos nas duas potências dominantes da região até o século seguinte;235

Então, mais uma vez, seria o impacto do ataque militar do Ocidente, que outrora contribuíra para trazer a luz o absolutismo oriental, que poria fim a servidão sobre a qual este assentara.235

Prússiaa fazerPolônia

Áustria

Rússia

A casa do Islã

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Terceira parteCONCLUSOES

Ocupante do sudeste da Europa por quinhentos anos, o Estado Otomano instalou-se no continente sem nunca ter adotado o seu sistema social ou político. Sempre permaneceu como um intruso islâmico na cristandade. Mas nenhum pensador político europeu reduziu a diferença Otomana a religião.397

O teóricos marxistas tem afirmado que o feudalismo foi um fenômeno de dimensão mundial, que abrangeu tanto os Estados africanos e asiáticos como os europeus. Reconheceu-se e estudou-se o feudalismo otomano, egípcio, marroquino, persa, hindu, mongol ou chinês. O modo de produção feudal é assim definido como a combinação:

- grande propriedade da terra;- pequena produção camponesa;401- classe exploradora extrai um excedente ao produtor imediato

pelas formas costumeiras de coerção extra-econômica - corvéias, prestações em espécie, ou rendas em dinheiro;

- troca de mercadorias e a mobilidade do trabalho são correspondentemente restritas.

Apresenta-se esse núcleo econômico invariável e definidor do feudalismo, que pode subsistir dentro de diversas formas políticas e jurídicas. Não importando o tipo de propriedade agrária, a natureza da classe possuidora e a matriz do estado.

Dessa forma a soberania parcelada, a hierarquia de vassalagem e o sistema de feudos da Europa medieval deixam de ser , sob qualquer aspecto, essenciais ao feudalismo;402

A invalidade de tal teoria é evidenciada pelo fato de só na Europa e sua extensão americana o capitalismo industrial desenvolveu-se espontaneamente, nos outros lugares foi implantando de acordo com as necessidades e tendências de seu próprio sistema imperial;

Se o feudalismo europeu diferenciava-se apenas pelas formas jurídicas e constitucionais. A causa de apenas essa região ter produzido a revolução industrial esta justamente nas suas superestruturas político e jurídicas;

O próprio Marx afirmava que nas sociedades de classes anteriores ao capitalismo todos os modos de produção extraem sobretrabalho dos produtores imediatos através de meios de coerção extra-econômica. O capitalismo é o primeiro modo de produção na história em que os meios pelos quais o excedente é extraído do produtor direto tem forma puramente econômica - o contrato salarial: a troca de equivalentes entre duas partes livres que reproduz, dia a dia e hora a hora, a desigualdade e a opressão. Todos os modos de

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produção anteriores operam através de sanções extra-econômicas - religiosas, políticas, consuetudinárias, jurídicas ou de parentesco;403

Portanto, é sempre impossível, por princípio, interpretá-las a partir das simples relações econômicas. As superestruturas do parentesco, da religião do direito ou do Estado fazem parte necessariamente da estrutura constitutiva do modo de produção nas formações sociais pré-capitalistas;

Em conseqüências , os modos de produção pré-capitalistas não podem ser definidos exceto por suas superestruturas políticas, jurídicas e ideológicas; (ANDERSON DIFERÊNCIA O FEUDALISMO EUROPEU PELAS SUAS SUPERESTRUTURAS E NÃO PELA BASE ECONÔMICA E CONSIDERA QUE SÃO ESSAS DIFERENÇAS QUE JUSTAMENTE TORNARAM POSSÍVEL SOMENTE A EUROPA DESENVOLVER O SISTEMA CAPITALISTA, PARECE-ME QUE ESTA TEORIA FOGE DO MATERIALISMO HISTÓRICO)403

Portanto há uma gama muito vasta de modos de produção pré-capitalistas em comparação da uniformidade do modo capitalista;404

Os produtores imediatos e os meios de produção(instrumentos ou terra) são sempre dominados pela classe exploradora através do sistema de propriedade em vigor, interseção nodal entre direito e economia. Mas como as relações de propriedade, por sua vez, se articulam diretamente na ordem política e ideológica - que, de fato, muitas vezes rege sua distribuição(por exemplo, confinando da propriedade da terra aos aristocratas, ou excluindo a nobreza do comércio) - , o aparelho total de exploração ascende sempre a esfera das próprias superestruturas.404

Para o materialismo histórico a propriedade jurídica nunca pode ser separada seja da produção econômica, seja do poder político-ideológico: a posição absolutamente central dentro de qualquer modo de produção decorre da sua vinculação com ambos, que, nas formações sociais pré-capitalistas, torna-se uma fusão direta e oficial. Não é portanto por acaso que Marx dedicou nos Grundrisse, onde analisa as sociedades pré-capitalistas, a uma profunda análise das formas de propriedade agrária em modos de produção sucessivos ou contemporâneos na Europa, Ásia e América. O fio condutor de todo o texto e a mudança no caráter e na posição da propriedade fundiária e as suas relações interligadas com os sistemas políticos;405

Marx rejeita o modo de produção feudal a Índia mongol;A singularidade do feudalismo nunca se esgotou na simples

existência de classes senhoriais e servis. Foi a sua organização específica num sistema verticalmente articulado de soberania parcelar e de propriedade escalonada que distinguia o modo de produção feudal da Europa.

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O feudo era uma concessão econômica de terra, condicionada ao desempenho de serviço militar e investida de direitos judiciais sobre os campesinato que a cultivava;

A nobreza feudal combinava a honra, própria da antigüidade greco-romana, e a lealdade, própria dos servidores de uma autoridade despótica, como o sultanismo da Turquia. Assim se gerou uma ideologia aristocrática que tornava compatíveis o orgulho da posição e a humildade da homenagem;

O parcelamento global da soberania possibilitou o crescimento de cidades autônomas nos espaços intersticiais entre diferentes senhorios. Os sistemas de estados tornava necessário o consentimento coletivo para qualquer ação extra-suserania por parte do monarca situado no topo da hierarquia feudal. Os parlamentos medievais eram portanto uma extensão lógica e necessária da prestação tradicional de auxilium e consilium do vassalo para o suserano;

O complexo feudal nasceu nas terras carolíngias e lentamente se expandiu, primeiro a Inglaterra, Espanha e Escandinávia; em seguida, e menos perfeitamente, difundiu-se à Europa oriental;

A cristandade nunca foi coincidente com este modo de produção: não havia feudalismo na Etiópia ou no Líbano medievais;

Ao contrário do modo escravista e ao capitalismo que o delimitou, o feudalismo não levou diretamente ao expansionismo imperialista em larga escala.. Embora cada classe baronial se tenha esforçado incessantemente para ampliar a sua área de poder mediante a agressão militar, a construção de vastos impérios territoriais foi bloqueada pela fissão sistemática da autoridade, que definia o feudalismo da Europa medieval;

A dispersão da soberania no feudalismo europeu permitiu a subsistência de uma grande diversidade de populações e de línguas, após as migrações germânicas e eslavas. Não havia nacionalismo e a aristocracia era móvel;

O feudalismo, enquanto categoria histórica, foi cunhado pelo Iluminismo;

Foi a dinâmica econômica do modo de produção feudal na Europa que liberou os elementos para a acumulação primitiva do capital em escala continental e foi a ordem social da Idade Média que precedeu e preparou a ascensão da classe burguesa que a realizou;

A investigação moderna descobriu apenas uma região importante do mundo onde inequivocamente triunfou um modo de produção feudal comparável ao da Europa: as ilhas do Japão. Mas que diferenciava-se por um maior poder por parte do suserano;

Quando da restauração Meiji em 1867, que encerrou formalmente o

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shogunato, o que significou o fim do feudalismo japonês. Mas foi a estrutura que desenvolveu durante o shogunato que tornou propício a rápida industrialização que se seguiu. O shogunato impôs a unidade do Japão, sem centralismo. Ele de fato estabilizou uma espécie de condomínio entre o regime shogunal suserano, baseado na capital Tokugawa de Edo(Tóquio), e os governos daimyo autônomos em seus feudos provinciais. As vésperas da restauração Meiji de 1867 no Japão encontrava-se:

- alta produtividade agrícola;- senhorialismo orientado para o mercado, numa área rural cujo

índice de comércio era muito alto talvez 50%;- alta urbanização, Edo( Tóquio), era maior que Londres ou

Paris;- suporte educacional cerca de 50% era alfabetizada.

O modo de produção feudal na Europa estruturou-se a partir da síntese de elementos do sistema escravista da antigüidade clássica e os modos de produção comunal-primitivos das populações tribais de sua periferia. Enquanto o feudalismo japonês foi o produto da lenta desintegração de um sistema imperial centralizado de tipo chinês, baseado no monopólio estatal da terra. Onde os nobres guerreiros locais foram imperceptivelmente usurpando as terras provinciais e privatizando o poder militar ao longo de sete séculos, consolidando esta fragmentação com o shogunato Tokugawa;

A restauração Meiji foi uma revolução cujo objetivo formal era restaurar a autoridade imperial que fora usurpada pelo shogunato Tokugawa em 1603. O estado Meiji que o sucedeu prontamente procedeu a um amplo arco de medidas para abolir o feudalismo a partir de cima - o mais radical desses programas já estabelecidos:

- A ordem de 4 estados foi destruída;- a igualdade de todos os cidadãos perante a lei foi proclamada;- calendário e a bandeira reformados:- um mercado unificado e uma única moeda foram criados;- a industrialização e a expansão militar foram sistematicamente

promovidas

Uma economia e uma política capitalistas emergiram diretamente da eliminação do shogunato. E conseguiu atingir um ritmo de industrialização mais intenso que qualquer outro;

Entretanto havia uma divergência decisiva entre o desenvolvimento europeu e o japonês. O impulso fundamental de sua tempestuosa transição ao modo de produção capitalista, no final do século XIX , foi exógeno. Foi o

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impacto do imperialismo ocidental sobre o feudalismo japonês que subitamente galvanizou as forças internas numa transformação total da ordem tradicionalmente instituída.

Quando a esquadra de Perry ancorou em Yokohama, em 1853, havia um grande hiato histórico existente entre o Japão e as potências européias:

- Pequena parte da produção agricultura era voltada para o mercado, apesar de ser notavelmente comercializada no âmbito da distribuição;

- Apesar da grande urbanização, manufaturas eram rudimentares, fábricas praticamente não existiam;

- trabalho assalariado não existia em grande escala;- Culturalmente era atrasado, apesar da alfabetização, ciências,

direito, filosofia, teoria política eram limitados;- rico feudalismo, mas não conheceu absolutismo;

O shogunato não detinha qualquer monopólio da coerção no Japão:- Senhores conservavam seus exércitos;- Inexistência de legislação uniforme;- todo feudo importante tinha sua própria administração;- não havia impostos nacionais;

Mas o que tornou possível a passagem singular ao capitalismo na Europa foi a concatenação de antigüidade e feudalismo. A vantagem da Europa sobre o Japão reside nos seus antecedentes clássicos, que mesmo depois da Idade das Trevas não desapareceram atrás dela, mas sobreviveram, em certos aspectos básicos, a sua frente.

Assim a própria gênese do feudalismo(antigüidade) teve efeitos sobre sua dissolução;

Marx insistiu corretamente na distinção entre a gênese e a estrutura dos modos de produção. Mas, por outro lado, caiu no equivoco de acrescentar que a reprodução da última absorvia ou abolia os traços da primeira. Assim, escreveu que os “pressupostos” anteriores de um modo de produção, “ precisamente enquanto pressupostos históricos, pertencem ao passado, portanto a história da sua formação, mas de modo algum a sua história contemporânea, isto é, ao sistema real do modo de produção...(Grundrisse)

O feudalismo, como modo de produção, foi o primeiro na história a tornar possível uma oposição dinâmica entre cidade e campo; o parcelamento da soberania inerente a sua estrutura permitia que se desenvolvessem enclaves

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urbanos autônomos como centros de produção no quadro de uma economia predominante rural, e não como centros parasitários ou privilegiados de consumo e administração;

Assim a ordem feudal fomentou um tipo de vitalidade urbana diferente de qualquer outra civilização, cujos produtos comuns podem ser observados tanto no Japão como na Europa. Contudo as cidades européias possuíam um grau de autonomia e densidade desconhecido nas japonesas;

O movimento real da história nunca é a mera mudança de um modo de produção puro para o outro: compõe-se sempre de uma série complexa de formações sociais na qual se imbricam diversos modos de produção, sob a dominância de um deles. Assim o legado urbano da antigüidade, somado ao espaço e liberdade do feudalismo, proporcionou um grande desenvolvimento urbano;

Toda a concepção social e jurídica de uma cidadania urbana enquanto tal era de memória e derivação clássicas, mas toda a base sócio-econômica das cidades-repúblicas que gradualmente se desenvolveram no Norte e na Itália era radicalmente diferentes das que existiam no sistema escravista. O trabalho artesanal livre iria proporcionar uma maior criatividade;

Ao mesmo tempo, a área rural do feudalismo europeu sofreu também uma evolução sem paralelo. Na sua forma pura, o modo de produção feudal caracterizava-se pela propriedade privada condicional da terra, conferida a uma classe nobiliária de título nobiliárquico hereditário. A natureza privada e condicional desta forma de propriedade a distinguia, como notou Marx, dos lugares que a terra era monopólio do estado, na origem ou ao longo do tempo. Pois nessas regiões pressupunha-se classes possuidoras bem menos estritamente aristocráticas do que a dos cavaleiros ou samurais. Mas, uma vez mais, o desenvolvimento europeu processou-se à frente do japonês, com a transição da propriedade privada da terra de caráter condicional para a absoluta, na época do Renascimento( aqui também foi a herança do direito romano);423

O próprio vinculismo demonstrado pela aristocracia européia no início da época moderna já era uma evidência das pressões objetivas para um mercado livre da terra, que haveria de gerar uma agricultura capitalista;424

O direito romano, remodelado para as novas condições da Europa e generalizado por um corpo de juristas profissionais que a própria antigüidade desconhecia, foi fundamental para a aceleração do modo capitalista visto que regulamentava a compra, venda, arrendamento, locação, empréstimo e sucessão de bens:

O feudalismo insular do Japão resultou da lenta involução de uma ordem imperial cujas estruturas foram emprestadas ao estrangeiro. Evoluiu

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para dentro, isolando-se, afastando-se da matriz extremo-oriental do primitivo Estado Taiho( constituído no século 7 a.C. sob influência chinesa, predecessor o Shogunato);426

O Europeu expandiu-se e repercutiu em extensões mais amplas.Em sua natureza e estrutura, as monarquias absolutas da Europa

eram ainda Estados feudais: o instrumento de governo da mesma classe aristocrática que dominara a Idade Média. Mas formações sociais que elas governaram eram uma combinação complexa dos modos de produção capitalista e feudal, com uma burguesia gradualmente ascendente e uma crescente acumulação primitiva de capital a escala internacional;428

O que distingue basicamente o absolutismo europeu de qualquer outro governo despótico, arbitrário ou tirânico foi que o aumento do seu poder político, correspondeu não ao aumento do seu controle sobre a propriedade nobiliária, e sim, pelo contrário, a um aumento correspondente dos direitos gerais de propriedade privada.

O feudalismo expandiu-se para a Europa Oriental, que nunca experimentara a síntese romano-germânica. Na Europa Oriental, o poder social da nobreza não foi limitado por uma ascendente burguesia urbana, como a que esteve presente na Europa ocidental: a dominação senhorial não conheceu entraves e o absolutismo deixou bem claro a que classe pertencia, com a opressão de seus aparelhos sobre o campesinato.

No Leste o absolutismo não decorreu da expansão da produção e do intercâmbio de mercadorias como no Ocidente. O absolutismo da Europa oriental formou-se em decorrência da junção de dois fatores:

- A intensificada pressão do ocidente mais avançado;- processo incompleto de feudalização - que iniciara mais tarde,

sem o beneficio da herança da antigüidade clássica, e em condições topográficas e demográficas mais difíceis;429

Os estados absolutistas, cujas origens diferenciavam, seguiram trajetórias distintas:

No ocidente: - as monarquias inglesa, francesa e espanhola foram derrotadas ou derrubadas por revoluções burguesas a partir de baixo;

- os principados Italianos e alemães foram eliminados por revoluções burguesas de cúpula;430

No Leste: - o império russo foi finalmente destruído por uma revolução proletária;430

apêndicesa fazer

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O feudalismo japonês

O modo de produção asiático

Luís XIV queria criar uma frota. Seu ministro Coulbert foi encarregado de recrutá-los. Alguém guardava o chapéu na cabeça quando passava uma procissão religiosa? Era considerado hunguenote e enviado às galeras. Encontravam na rua um garoto de mais de 15 anos que não tinha onde morar? Enviavam-no às galeras. Grande reino! Grande século!(Victor Hugo)

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