Anatomia Cardíaca

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Anatomia Cardíaca - As Artérias Coronárias As artérias coronárias constituem-se nos primeiros ramos emergentes da aorta, logo acima do plano valvar aórtico, e seu início pode ser observado nos dois óstios das artérias coronárias, situados nos seios aórticos ou seios de Valsalva direito e esquerdo. A existência de apenas um óstio ou mesmo mais de dois pode ocorrer, embora raramente, havendo relato na literatura de até cinco óstios independentes. Existe uma grande variação na denominação dos ramos coronários principais, bem como de seus subramos; isto depende da preferência de cada centro ou de cada serviço, embora a Nômina Anatômica proponha a padronização. Outro aspecto que merece aqui ser comentado diz respeito aos territórios de irrigação pelas artérias coronárias que, embora apresentem inúmeras variações, têm uma disposição mais freqüente. Em linhas gerais, a coronária direita se encarrega da irrigação do átrio e ventrículo direitos, da porção posterior do septo interventricular, dos nós sinusal e atrioventricular e, ainda, de parte da parede posterior do ventrículo esquerdo. A coronária esquerda é responsável pela irrigação da parede ântero-]ateral do ventrículo esquerdo, átrio esquerdo e da porção anterior e mais significativa do septo interventricular. Como a irrigação dos ventrículos é muito mais preponderante do que a dos átrios, quase sempre a descrição se refere aos ramos ventriculares.

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       Anatomia Cardíaca - As Artérias Coronárias         

As artérias coronárias constituem-se nos primeiros ramos emergentes da aorta, logo acima do plano valvar aórtico, e seu início pode ser observado nos dois óstios das artérias coronárias, situados nos seios aórticos ou seios de Valsalva direito e esquerdo. A existência de apenas um óstio ou mesmo mais de dois pode ocorrer, embora raramente, havendo relato na literatura de até cinco óstios independentes.                  Existe uma grande variação na denominação dos ramos coronários principais, bem como de seus subramos; isto depende da preferência de cada centro ou de cada serviço, embora a Nômina Anatômica proponha a padronização.                  Outro aspecto que merece aqui ser comentado diz respeito aos territórios de irrigação pelas artérias coronárias que, embora apresentem inúmeras variações, têm uma disposição mais freqüente. Em linhas gerais, a coronária direita se encarrega da irrigação do átrio e ventrículo direitos, da porção posterior do septo interventricular, dos nós sinusal e atrioventricular e, ainda, de parte da parede posterior do ventrículo esquerdo. A coronária esquerda é responsável pela irrigação da parede ântero-]ateral do ventrículo esquerdo, átrio esquerdo e da porção anterior e mais significativa do septo interventricular. Como a irrigação dos ventrículos é muito mais preponderante do que a dos átrios, quase sempre a descrição se refere aos ramos ventriculares.

           

      Artéria Coronária Direita

                 A coronária direita se origina na aorta a partir do óstio coronário direito, segue um curto trajeto até se posicionar no sulco atrioventricular direito, passando a percorrê-lo. Os primeiros ramos com direção ventricular dirigem-se à parede anterior do ventrículo direito, na região do cone ou infundíbulo, e são denominados ramos conais ou infundibulares. Entretanto, muitas vezes,  observa-se a presença da artéria do cone que sai diretamente da aorta. Seguindo o seu trajeto, a coronária direita contorna o anel tricúspide, situando-se anteriormente ao mesmo, até atingir a margem direita ou aguda

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do coração. Neste trajeto originam-se vários ramos, responsáveis pela irrigação da parede anterior do ventrículo direito, até a sua margem, sendo conhecidos como ramos marginais da coronária direita.

            Após ultrapassar a margem, a coronária direita se dirige em direção ao sulco interventricular posterior e à crux cordis. Entre a margem e este ponto podem se originar pequenos ramos posteriores do ventrículo direito até a ocupação pela coronária direita do sulco interventricular posterior, com o ramo interventricular posterior ou descendente posterior. A continuação da coronária direita em direção à parede posterior do ventrículo esquerdo, bem como a própria presença do ramo interventricular posterior, depende do conceito da dominância, que será discutido mais adiante.

            A coronária direita dá origem, em cerca de 58% dos casos, à artéria do nó sinusal, que se dirige para cima e medialmente, circundando o óstio da veia cava superior, irrigando neste trajeto o átrio direito e principalmente o nó sinusal. Além da artéria do nó sinusal, a coronária direita emite para os átrios alguns ramos de pequeno calibre.

                 Artéria Coronária Esquerda                   A coronária esquerda se origina do óstio coronário esquerdo, no seio de Valsalva esquerdo, percorrendo um trajeto posterior ao tronco pulmonar. A coronária esquerda tem uma extensão que varia de milímetros a poucos centímetros; este pequeno segmento, muito calibroso (cerca de 4mm), é denominado tronco da coronária esquerda e apresenta direção anterior, bifurcando-se para originar as artérias interventricular anterior ou descendente anterior e circunflexa. Em vários casos, que segundo alguns autores pode chegar a 39%, ocorre uma trifurcação originando-se na bissetriz do ângulo formando pela artéria descendente anterior e artéria circunflexa, um ramo chamado diagonalis, que cruza obliquamente a parede ventricular.

           A artéria descendente anterior tem direção anterior, ocupa o sulco interventricular anterior e se dirige à ponta do ventrículo esquerdo, podendo em alguns casos até mesmo ultrapassá-Ia e prosseguir por poucos centímetros em direção ao sulco interventricular posterior, apresentando comprimento médio de 10-13cm e cerca de 3,6mm de diâmetro. Há duas categorias de ramos que se originam a partir da artéria descendente anterior: os ramos septais e os diagonais. Os septais se dirigem ao septo interventricular e se originam a partir da parede posterior da artéria descendente anterior; são intramiocárdicos, ocorrem em número variado, do início da artéria descendente anterior à ponta do ventrículo esquerdo. Os ramos diagonais se originam lateralmente à parede esquerda da artéria descendente anterior, têm sentido oblíquo, se dirigem à parede late"ral alta do ventrículo esquerdo e são também conhecidos' como ramos anteriores do ventrículo esquerdo.

           A artéria descendente anterior, ainda que geralmente seja uma estrutura epicárdica, pode converterse em intramiocárdica em alguns trechos do seu trajeto para depois emergir à sua posição epicárdica habitual. Estes segmentos de músculo sobre a artéria são denominados ponte miocárdica.

           A artéria circunflexa posiciona-se no sulco atrioventricular esquerdo e o percorre, desde o seu início, a partir do tronco da coronária esquerda, apresentando entre 6 e 8cm de comprimento. Em cerca de 30% dos casos, a artéria do nó sinusal origina-se da artéria circunflexa em lugar da coronária direita, podendo ocasionalmente, cerca de 10% dos casos, originar-se diretamente do tronco da coronária esquerda. Em seu trajeto, ao longo do sulco atrioventricular, a artéria circunflexa emite inúmeros

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ramos para a parede lateral do ventrículo esquerdo. Eles são conhecidos como marginais, quanto mais proximais, e ventriculares posteriores, quanto mais distais e próximos ao sulco interventricular posterior. Em uma porcentagem reduzida de casos, a artéria circunflexa pode ocupar o sulco interventricular posterior, caracterizando uma dominância do tipo esquerdo. Neste caso, este ramo recebe o nome de interventricular posterior da coronária esquerda.

                Padrões de Dominância Coronária                   A distribuição da circulação coronariana pode variar de coração para coração. Para padronizar esta distribuição utiliza-se o conceito da dominância, que determina qual a artéria dominante em relação ao sulco interventricular posterior e região da crux cordis. Quando a irrigação destas regiões é feita pela coronária direita - que, além do ramo interventricular posterior (ou descendente posterior) pode emitir um ou mais ramos para a parede posterior do ventrículo esquerdo, considera-se que a dominância é direita, o que ocorre em aproximadamente 70% dos casos. Nos casos em que o sulco interventricular posterior é irrigado pela coronária esquerda, considera-se que o padrão dominante é do tipo esquerdo, o que ocorre em cerca de 16% dos casos.

Há, também, o padrão balanceado (cerca de 14% dos casos), onde a coronária direita e a coronária esquerda atingem a crux cordis, sendo a coronária direita responsável pela irrigação da porção posterior do septo, e a coronária esquerda por toda a parede posterior do ventrículo esquerdo.

O coração localiza-se na cavidade torácica, no mediastino. Dois terços do seu volume estão situados à esquerda da linha sagital mediana. Esta posição, chamada de levocárdica, é a mais freqüente. Variações na posição do coração em relação ao tórax podem ocorrer. A posição mesocárdica, ocorre quando a maior parte do seu volume está situada na porção mediana do tórax. A posição dextrocárdica ocorre quando grande

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parte de sua massa localiza-se no hemitórax direito. Estes termos são utilizados com freqüência ao descrevermos as mal formações congênitas.                  A forma do coração é aproximadamente cônica, com a base voltada para trás e para a direita, e o ápice para a frente e para a esquerda.                  Há três faces no coração: a anterior ou esternocostal, sobre a qual os pulmões direito e esquerdo se sobrepõem, deixando exposta apenas uma pequena porção; a face inferior, que repousa sobre o diafragma, recebendo também o nome de face diafragmática; e a face lateral esquerda, formada principalmente pelo ventrículo esquerdo, que produz a impressão cardíaca na face medial do pulmão esquerdo. Estas faces são delimitadas pelas margens cardíacas. A direita é bem definida, sendo chamada de aguda, enquanto que a esquerda ou obtusa é pouco definida. Anteriormente, além dos pulmões, o coração relaciona-se também com o esterno, costelas e músculos intercostais; posteriormente com a aorta descendente, esôfago e veia ázigos; e lateralmente com os pulmões, hilos pulmonares, nervos frênicos e vagos.

Anatomia Cardíaca - As valvas cardíacas

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Valvas Atriovcntricularcs

                 As valvas tricúspide c mitral estão inseridas cada uma em um anel fibroso que usualmente não é contínuo ao nível da transição atrioventricular, principalmente à direita. São constituídas por cúspides de tamanho e extensão variáveis, as quais estão presas por cordas tendíneas aos músculos papilares, ou, como é observado na tricúspide, diretamente na superfície do septo ventricular. As cúspides são constituídas por tecido conjuntivo frouxo. com variável quantidade de colágeno, proteoglicanos e fibras elásticas. A partir da face atrial, identificam-se histologicamente duas camadas: a esponjosa, mais frouxa, e a fibrosa. As cordas tendíneas são classificadas de acordo com a região de sua insersão na cúspide, a saber: cordas da borda livre, cordas da zona rugosa e cordas basais. As cordas mais espessas são geralmente as da zona rugosa, uma região da face ventricular das cúspides que fica entre a borda livre e a área mais lisa (basal), junto à inserção no anel fibroso. Há, na valva mitral, duas cordas que se salientam pela sua espessura, sendo denominadas cordas estruturais. Há, ainda, as chamadas cordas comissurais, que apresentam-se em forma de leque e definem o local das comissuras, tanto na tricúspide como na mitral. A linha de fechamento valvar não coincide com a borda livre das cúspides, mas situa-se a uma distância que varia de 2mm a 8mm dela, na face atrial. No local, observa-se uma pequena proeminência linear, que costuma salientar-se com a idade.                   O perímetro da valva tricúspide varia normalmente de 10 a 12 cm. A cúspide anterior é a mais longa, seguida em extensão pela cúspide  posterior e depois  pela septal. O nome das cúspides deriva de sua relação espacial com as paredes do ventrículo direito. Os músculos papilares do ventrículo direito mostram variação quanto ao número. Há, entretanto, um que é constante e em geral o mais desenvolvido situado na parede livre do ventrículo direito, denominado músculo papilar anterior, já citado anteriormente. Por vezes observa-se, entre os braços da trabécula septomarginal, a presença de um pequeno músculo papilar, o chamado "músculo de Lancisi", onde se inserem as cordas da comissura ântero-septal da valva tricúspide. Quando ausentes, as cordas comissurais convergem diretamente para a musculatura septal, um achado aliás encontrado em diversos pontos ao longo das cúspides septal e posterior, e que ajuda a caracterizar a valva como tricúspide e o ventrículo como morfologicamente direito.  

            A valva mitral tem sua circunferência variando entre 8 e 10 cm, apresentando duas cúspides. A anterior é a maior, mostrando formato grosseiramente triangular e apresentando grossas cordas de sustentação, conforme já descrito. A cúspide posterior é dividida em três bolsões proeminentes, separados entre si por pequenas fendas também guarnecidas por cordas em leque. Caracteristicamente, as cordas da mitral convergem para o topo dos músculos papilares do ventrículo esquerdo, com exceção de poucas cordas basais da cúspide posterior, que se inserem diretamente na musculatura da via de entrada ventricular. O septo ventricular é, no entanto, sempre livre de inserções cordais. Há dois grupos de músculos papilares, um situado ântero-lateralmente e o outro póstero-medialmente. Na sua base, esses dois grupos musculares são contíguos, embora haja a falsa impressão de que eles são separados, em virtude da maneira como habitualmente se abre o coração para estudo anatômico.  

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Valvas Arteriais                  Tanto a valva da aorta quanto a do tronco pulmonar apresentam três válvulas ou folhetos semilunares, cada um deles inserindo-se em uma linha com formato de "U", superiormente na túnica média da grande artéria correspondente e inferiormente no miocárdio da via de saída do ventrículo. A valva aórtica, em particular, apresenta uma área onde é contínua com a cúspide mitral anterior, conforme já descrito, e também com o septo membranoso, o que torna sua inserção inferior não muscular, mas fibrosa nos pontos citados.                  O conceito de "anel" das valvas arteriais fica, portanto, comprometido, pois não existe uma linha circular contínua de inserção valvular, como ocorre com as valvas atrioventriculares. Do ponto de vista cirúrgico, entretanto, costuma-se considerar como "anel" da valva aórtica uma circunferência que passa pelo limite inferior da inserção de cada um dos folhetos semilunares.                  Em cada diástole, os folhetos semilunares abaúlam pelo enchimento com sangue, formando os seios de Valsalva. Dois a dois, os folhetos encontram-se nas comissuras, que se prendem na parede arterial. A linha de fechamento das valvas arteriais também não coincide com a borda livre, a exemplo do que ocorre nas valvas atrioventriculares. No ponto médio da borda de cada folheto há, na face ventricular, um pequeno nódulo, chamado nódulo de Arantius.                  Os folhetos da valva do tronco pulmonar recebem nomes de acordo com sua distribuição topográfica. Há um anterior e dois posteriores, dos quais um é direito e outro esquerdo.  Já os folhetos da valva aorta são designados conforme os seios de Valsalva correspondentes e de acordo com a origem das artérias coronárias (coronariano direito, coronariano esquerdo e não coronariano). É importante conhecer as relações topográficas de cada um dos seios de Va1salva.                  A estrutura histológica das valvas aórtica e pulmonar é semelhante. Na face ventricular de cada válvula há tecido conjuntivo frouxo, com aspecto mixomatoso, e na face arterial uma camada mais densa, a fibrosa, delimitada por fibras elásticas.  ESQUELETO FIBROSO DO CORAÇÃO                   A função do esqueleto fibroso do coração foi discutida durante muitos anos, sendo o mesmo descrito c1assicamente como ponto de ancoragem para as fibras miocárdicas ventriculares ou, ainda, como elemento de transição entre a musculatura atrial e ventricular. Atualmente parece haver um consenso de que a principal função do esqueleto fibroso é sustentar as valvas atrioventriculares e ancorá-las à massa ventricular                  O esqueleto fibroso do coração compõe-se de tecido fibroso ou fibrocartilaginoso. Fazem parte do esqueleto fibroso os anéis das valvas mitral, tricúspide e aórtica, o corpo fibroso central, o septo membranoso, o tendão do cone e os trígonos fibrosos anterior e posterior. A valva pulmonar, cujas válvulas apóiam-se diretamente na musculatura do trato de saída do ventrículo direito, não apresenta suporte fibroso, mas está unida ao esqueleto fibroso pelo tendão do cone.                  É importante ressaltar que o conceito clássico pelo qual os anéis valvares são estruturas circulares bem definidas, situadas ao redor dos orifícios atrioventriculares ou no ponto de inserção das valvas arteriais é impróprio, do ponto de vista anatomofisiológico. Assim, o termo ane1 usado neste estudo refere-se a uma estrutura que está longe de ser circular contínua perfeita.

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                 Entre os anéis das valvas mitral e aórtica encontra-se a região mais resistente do esqueleto, na continuidade fibrosa mitro-aórtica, que apresenta em suas margens espessamentos adicionais que constituem os trígonos fibrosos anterior e posterior.                  A unidade mitro-aórtica apresenta um prolongamento que a une ao anel valvar tricúspide, constituindo o corpo fibroso central que inclui o trígono fibroso posterior e o septo membranoso.                  Embora existam padrões mais freqüentes, há variações no posicionamento dos anéis valvares em corações normais, que via de regra não acarretam maiores problemas, sobretudo quando relacionadas à função e ao desempenho cardíaco. São as chamadas chamadas variações da normalidade, cujo conhecimento é importante para identificá-las em situações de diagnóstico por imagem e tratamento cirúrgico.