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    ANLI SE L ITERRIA: UTOPIA SELVAGEM, Darcy RibeiroProf.: Daniele Ribeiro SRIE: 3 Ano DATA: ____/_____/2011

    UTOPIA SELVAGEM: saudades da ino cnc ia perd ida: um a fbu la, Darcy RibeiroSobre o Autor: Darcy Ribeiro nasceu em 26 de outubro de 1922 em Montes Claros MG. Ficcionista, poeta,professor, antroplogo, etnlogo, socilogo, historiador e poltico. Fez estudos sobre os ndios do Pantanal, doBrasil Central e da Amaznia (1946-1956). Criou o Museu do ndio e formula projeto de criao do ParqueIndgena do Xingu. Darcy Ribeiro deixou como legado uma vasta obra etnogrfica e de defesa da causa indgena.

    Estrutura da narrativa: O autor define sua narrativa como uma fbula. Assim, o assunto do livro o utpico, oimaginrio. Darcy Ribeiro cria, imagina, narra, instrui, mente, diverte e conversa nesta fbula. A moral noaparece somente no final, mas no decorrer de todo o livro: a viso do Brasil como um paraso, a miscigenao e

    uma organizao social pautada na tecnologia e no gozo, ou seja, o Brasil como ele . No entanto, o livro naverdade uma novela. Tudo gira em torno de uma nica temtica: a convivncia de um negro em tribos indgenas.A partir disso, tem-se outras reflexes, mas todas em torno do processo civilizatrio e de formao tnica.Tempo e espao: a obra segue uma sequncia cronolgica de aes, tendo como referncia a personagemPitum. Primeiro, o reino das Amazonas, segundo o mundo Galibi. Tanto em uma quanto em outra tribo, as aesde Pitum se desenvolvem gradativamente de acordo com o enredo da narrao, desde o seu estranhamentoinicial at a adaptao ao meio, sobretudo vida Galibi.Espao: h dois espaos em que as aes ocorrem: o mundo das Icamiabas, isto , as guerreiras amazonas; e omundo dos Galibis. Ambos esto situados no norte da Amaznia, em um espao indeterminado, utpico,mtico. Como o negro se refere constantemente a Guerra Guiana, podemos dizer que a regio est situadaprxima a Roraima, que o estado brasileiro que faz fronteiras com a Guiana Inglesa e Venezuela, pas, estetambm mencionado na obra. Alm desses dois espaos, h aluso a vrios Brasis, pelos personagens Pitum e

    Monjas, alm do mundo Utopia, de Prspero.A narrativa entrecortada pelo narrador que representa a voz do autor: tal recurso visa esclarecer algunsacontecimentos ou introduzir suas opinies crticas eou humorsticas.Ao mesmo tempo em que se pode pensar em um tempo remoto, primitivo, at mesmo mtico, devido presena dos selvagens, como as guerreiras amazonas, cuja existncia data da antiguidade greco-romana; pode-se perceber a presena do colonizador, representado pelas monjas missionrias. No dilogo das monjas ha presena de um universo tecnolgico, permeado de discursos comunista-socialistas. Portanto, um discurso maisatual, no sculo XX, um contraponto ao primitivismo selvagem. H tambm trechos de reflexes psicolgicas,vindas do personagem Pitum e do prprio narrador.

    Linguagem e seus recursos: A linguagem hbrida, marcada ora por pensamentos muito sofisticados, oraconversaes vulgares. Como numa centrfuga, Darcy Ribeiro rene em sua obra o romancista, o antroplogo,historiador, poltico e educador, deixando entrever em suas palavras resqucios de um homem tambm hbrido emsua formao cultural e humana. H tambm marcas de oralidade na fala de alguns personagens, trechoszombeteiros e de forte apelo sexual com despudor e vocabulrio chulo, uso de neologismos. A musicalidadetambm se faz presente por meio de cantigas, como a entoada por Tivi, em seu delrio. Trata-se de uma canofolclrica que foi musicada por Belchior, intitulada Aguap.A ironia e o humorso duas caractersticas marcantes na linguagem de Darcy Ribeiro nesta obra. O discursoantropofgico pode ser sintetizado atravs do recurso da pardia, empregado ao se referira Carta de Caminha:Darcy faz pequenas alteraes do discurso original, adequando-o ao seu contexto original. Foco narrativo: o narrador em terceira pessoa. Porm, sua participao ativa na obra permite cham-lo demetanarrador ou autor implcito, pelas constantes interferncias na obra, as quais fazem parte da formao doautor. , portanto, um narrador que se aproxima tanto das personagens quanto dos leitores. Vrios so os trechosem que pede licena para se intrometer na histria, seja para esclarecer, seja para divertir, ironizar, criticar,

    satirizar ou debochar. No captulo Prspero a voz autoral domina. Apesar de afirmar tratar-se de uma fbula, porvezes utiliza argumentos ou referncias a personalidades histricas para tentar apresentar-se verossmil.Obs.: O captulo Felicidade Senil, ao refletirr sobre a velhice e a morte, pode se assemelhar a trajetria deManuelzo, em Uma estria de am or, de Gu imares Ros a.

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    Narrador cronista: seguindo os moldes dos cronistas do sculo XVI, os quais acompanhavam as viagens,expedies e aventuras, ele vai descrevendo as cenas e comentando algumas peripcias. Porm, diferentementedos cronistas clssicos mencionados na obra, como Carvajal, Gndavo e Caminha, o narrador concede a voz aosseus personagens que se conectam a ele, sendo representados de forma cmica, dramtica. O fluxo narrativo na obra apresenta ora velocidade, ora lentido, prprio dos recursos cinematogrficos.H na obra uma juno entre o arcaico e o novo, entre o mtico e o tecnolgico, fragilidade humana e sistemainformtico.

    Personagens:Gasparino Carvalhal, Pitum, Orelho: negro gacho, tenente do Exrcito Brasileiro que se perde de sua tropadurante a Guerra Guiana. Seu nome sugestivo, Gasparino Carvalhal, lembra o frei espanhol Gaspar de Carvajalque acompanhou Francisco de Orellana em suas expedies pela Amaznia. Orelho pode ser muito bem umacorruptela de Orellana, que era um capito espanhol. Pitum apresenta a cultura afro-brasileira. obrigado amanter relaes sexuais com as ndias amazonas, iniciando a miscigenao, dando origem aos cafuzos(descendentes de negros e ndios). apresentado na obra como ser malevel. Apesar de sempre se lembrar doseu Brasil, adapta-se ao mundo das amazonas. Posteriormente, na tribo Galibi, censurado pelas monjasbrancas. Indcios de preconceito, j que elas tentam impedi-lo de se relacionar com as ndias. No inicio apresentado como um homem viril, que tinha o hbito de sururucar com as ndias amazonas; depois, passa a terum envolvimento com Axi, um ndio, o que torna Orelho um sujeito de postura sexual dubitativa.Ele um personagem que passa por vrias modificaes (esfrico): no mundo civilizado tinha posio decomando, no das ndias, est sempre amedrontado, com medo de ser devorado, alm de no poder assumir seu

    lugar na relao sexual, submisso, ele comido sexualmente pelas mulheres.J entre o Galibis, o tenente assume outra identidade: torna-se Orelho, por escutar o tempo todo a culturadaquele povo, ao contrrio da sua postura de falastro no pas do mulheril, e tambm pelo deboche que fazemdele, devido ao sotaque gacho que possui.Gasparino Carvalhal, Pitum ou Orelho um personagem sem identidade definida, tal qual o povo brasileiro.No ltimo captulo, ele forado a tomar o caapir: esse momento se completa, simbolicamente, a insero dopersonagem ao mundo Galibi.Tivi e Uxa: simbolizam os missionrios europeus que estiveram no Brasil durante o perodo colonial, sobretudo,no sculo XVI, destaque para os jesutas Jos de Anchieta, Manuel da Nbrega e Antnio Vieira.Uxa prostestante, mais velha e razinza. Arrepende-se de ter ensinado as letras aos ndios, j que eles brincammuito e se recusam a usar o portugus do Brasil. Seu grande desejo era transformar um dos indiozinhos emsacerdote. Discutia muito com Pitum quando falam em evangelizao. Tambm desentendia-se s vezes comTivi. Censura a cultura dos Galibis, representando a ideia de que somente o colonizador tem algo a ensinar.

    Possui uma voz etnocntrica e se revolta constantemente. Seu discurso possui convergncias com aquele deAnchieta que optou por uma misso mais severa, agressiva num processo de converso dos indgenas fora.Uxa nega a abertura da cultura brasileira ao tuxaua que desejava conhecer o Brasil. Juntamente com Tivi,carregam os smbolos da civilizao que vo inserindo no mundo ndio: as roupas, os modos, a religio crist.Tivi: missionria catlica, mais jovem, mais bela, encanta tuxaua que a chama de Diaba de Deus. Essechamamento mostra a dupla funo da personagem: a serva de Deus e aquela que se desvirtua do seu caminhoao se entregar ao tuxaua. Tivi possui grande conhecimento acerca da cultura Galibi. Ela ser a av de Por, osenhor, o deus. Assemelha-se, dessa maneira, a imagem da Virgem Maria que concebeu pelo Esprito Santo. Tivis consegue ver o seu destino aps ingerir o caapi. Sua relao com Calib se d num ritual mstico e repleto demagia, em que seu corpo se transforma em bichos. Aqui, h uma inverso da histria da colonizao:historicamente foi o portugus que forou a relao com as ndias inocentes. No entanto, quem perde a inocncia a mulher branca. De modo irnico, Darcy mostra um processo de miscigenao em que o ndio conseguiusuplantar sua cultura sobre a do colonizador, dando origem aos caboclos e mamelucos.

    Calib: o tuxaua, o chefe da nao Galibi, que assume uma voz irnica na narrativa. Tivi via nele uma espciede salvador, aquele que, se convertendo, traria a cristandade aos ndios Galibis. Mostra-se sem preconceitos,anseia penetrar o mundo dos brancos. Relaciona-se, intertextualmente, obra de William Shakespeare, Atempestade.Prspero: tambm relacionado obra de Shakespeare, em Utopia Selvagem, prspero a personificao dasabedoria, uma espcie de deus, detentor da mgica da tecnologia.

    Os vrios brasis:No Brasil de Tivi h a abolio da justia e da polcia e toda a burocracia institucional, onde o cidado detentorde duas prprias aes. Uma clara crtica ao Brasil da Ditadura, contexto poltico brasileiro na poca depublicao da obra. H tambm o feminismo no pas dessa monja, uma que revela conscincia da necessidade deinsero da mulher no mercado de trabalho e nas decises sociais.O Brasil de Uxa marcado pela educao diferenciada em que se ensinam coisa prticas. A modernidade

    aparece por meio da presena do computador.O Brasil de Pitum um pas problemtico, mais condizente com a realidade do incio da dcada de 80, decontexto ditatorial e de misria popular.

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    Dessa forma, o mundo das monjas, Tivi e Uxa, um local tpico do ideal cristo de harmonia. Tudo felicidade, maneira dos rcades. No h guerra nem corrupo das instituies. um verdadeiro paraso perdido, oEldorado, to sonhado pelos ficcionistas e pelas comunidades do sculo XVI.O mundo do progresso e da tecnologia representado por Pitum se mescla ao mundo do bom selvagem dasMonjas, que vem no campo o melhor lugar para viver.Um outro Brasil apresentado na obra o Paraso Terreal, o Eldorado. Pitum pensou ser o pas das ndiasamazonas este lugar. O eldorado foi muito buscado pelos viajantes europeus. Nas terras americanas, muito desseencantamento foi consolidado. A bblia no relata o extermnio do den, apenas a expulso de Ado e Eva. Logoo paraso ainda continua na Terra. Esse jardim seria um espao pacificante, utpico, lugar de sossego e

    recolhimento, que transmite uma mensagem simblica e alegoria da felicidade.

    Relaes intertextuais:Mencionando personagens histricos, cronistas do descobrimento, textos de Shakespeare, baseando-se naantropofagia cultural idealizada por Oswald de Andrade, o processo de antropofagia se d em Utopia Selvagemno apenas no mundo indgena nos rituais canibalsticos, mas tambm na prpria construo do texto. Como opovo brasileiro, Darcy faz uma miscelnea em seu livro, misturando o potico e o prosaico, cristianismo epaganismo, machismo e feminismo, vida e morte, saber e erudio, ptria e militarismo, socialismo e liberdade,primitivo e tecnolgico. uma obra que quebra a ideia de identidade nacional. Todos somos primitivos ecivilizados, somos um, somos muitos, vivendo num mundo fragmentado, de diversas correntes ideolgicas. Ummundo em que somos orientados um pelo outro, pela mdia, pela tecnologia. Senhores e escravos da

    contemporaneidade, da era da tecnologia.