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http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014. ISBN: 978-85-7506-232-6 ANÁLISE MORFOLÓGICA DOS BAIRROS DE NAZARÉ E GUAMÁ NO PROCESSO DE REDUÇÃO DAS ÁREAS VERDES URBANAS NO MUNICÍPIO DE BELÉM-PA. José Edilson Cardoso Rodrigues Universidade Federal do Pará [email protected] Luziane Mesquita da Luz Universidade Federal do Pará [email protected] Joecylene Santos Saraiva Universidade Federal do Pará [email protected] INTRODUÇÃO Nas últimas décadas a perda da cobertura vegetal vem apresentando um quadro alarmante na cidade de Belém, principalmente no que tange à área da primeira légua patrimonial. Entretanto, alguns bairros desse primeiro perímetro de ocupação apresentam concentração e conservação da arborização, a exemplo Bairro de Nazaré, enquanto outros apresentam retração, como é o caso do Bairro do Guamá. Assim o principal objetivo do presente artigo é analisar como a morfologia urbana vem contribuindo para o processo de perda das áreas verdes nos bairros de Nazaré e Guamá no município de Belém-PA. Para este trabalho adotou-se como metodologia uma revisão da literatura a respeito do tema morfologia e áreas verdes urbanas. Também utilizamos imagens de alta resolução IKONOS, 2006 para o mapeamento da morfologia e cobertura vegetal dos bairros em estudo. Foi realizado Índice de cobertura vegetal (ICV) e 2813

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ANÁLISE MORFOLÓGICA DOS BAIRROS DENAZARÉ E GUAMÁ NO PROCESSO DE REDUÇÃODAS ÁREAS VERDES URBANAS NO MUNICÍPIO

DE BELÉM-PA.

José Edilson Cardoso Rodrigues

Universidade Federal do Pará

[email protected]

Luziane Mesquita da Luz

Universidade Federal do Pará

[email protected]

Joecylene Santos Saraiva

Universidade Federal do Pará

[email protected]

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas a perda da cobertura vegetal vem apresentando um

quadro alarmante na cidade de Belém, principalmente no que tange à área da primeira

légua patrimonial. Entretanto, alguns bairros desse primeiro perímetro de ocupação

apresentam concentração e conservação da arborização, a exemplo Bairro de Nazaré,

enquanto outros apresentam retração, como é o caso do Bairro do Guamá.

Assim o principal objetivo do presente artigo é analisar como a morfologia

urbana vem contribuindo para o processo de perda das áreas verdes nos bairros de Nazaré

e Guamá no município de Belém-PA. Para este trabalho adotou-se como metodologia uma

revisão da literatura a respeito do tema morfologia e áreas verdes urbanas. Também

utilizamos imagens de alta resolução IKONOS, 2006 para o mapeamento da morfologia e

cobertura vegetal dos bairros em estudo. Foi realizado Índice de cobertura vegetal (ICV) e

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Índice de cobertura vegetal por habitante (ICVH), onde se calcula o total da cobertura vegetal

pela área e pela população do bairro respectivamente, com o intuito de se obter índices

aceitáveis de cobertura vegetal que é de 12m2 de áreas verdes por habitante estabelecido

pela ONU em áreas urbanas, também foram realizados trabalho de campo.

Nesse contexto, partimos do pressuposto que a expansão territorial urbana,

promoveu espaços arborizados e não arborizados de forma significativa em diversos bairros

da cidade de Belém. Nessa perspectiva, surgem questões de como ocorreu o processo de

arborização e perda da cobertura vegetal na cidade de Belém; e em que direção esses

processos ocorreram.

O estudo se dá pela abordagem comparativa entre dois bairros da cidade de

Belém, respectivamente Bairros de Nazaré e Guamá. Nazaré um bairro bem estruturado, de

alto padrão e com áreas arborizadas, e o Guamá, bairro oposto, com pouca infraestrutura,

de médio a baixo padrão, concentração populacional elevada, e pouco arborizado.

MORFOLOGIA URBANA: UMA ABORDAGEM CONCEITUAL.

A importância do conceito de morfologia urbana vem adquirindo renovado

interesse nos estudos do meio urbano, principalmente na dimensão física das cidades,

consequentemente, nas questões da forma urbana (Huang et al., 2007, citado por Reis, et al,

2011). Reis et al (2011) considera que uma grande parte dos trabalhos publicados nesta área

prende-se com os padrões de crescimento das cidades, nomeadamente com o fenômeno de

“expansão urbana”, bem como muitos trabalhos estão relacionados com a segregação

espacial, produção e reprodução do capital. Entretanto, através da morfologia urbana

podemos compreender outras dimensões urbanas como ruas, praças, monumentos e áreas

verdes (Lamas, 2004). Este será um de nossos desafios neste ensaio, analisar a

espacialidade da cobertura vegetal na cidade de Belém pela lente da morfologia urbana

tomando como exemplo os Bairros de Nazaré e Guamá.

No que concerne à definição ou conceito de morfologia urbana, várias são as

definições. De forma mais geral, entende-se por morfologia urbana o estudo da forma da

cidade (BIANCA et al, 2008). Para Leite e Anjos (2010) a morfologia é o arranjo de suas

formas, bem como seus consequentes usos e apropriações. Para, Capel (2002, p. 20) a

morfologia urbana, o espaço construído, reflete a organização econômica, a organização

social, as estruturas políticas, os objetos dos grupos sociais dominantes.

Na discussão sobre morfologia urbana, Vilagrasa (1991, p.12) define como “o

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estudo da forma urbana e de seus processos e pessoas que a constroem [...]”, além de

compreender “as causas sociais que promovem as mudanças, ou permanências, do plano,

das edificações e da imagem urbana em si entendida como uma paisagem global”.

No contorno apresentado por Larkham & Jones (1991, citado por Rosaneli, 2011),

a morfologia urbana pode ser entendida como “o estudo do tecido físico (ou construído) da

forma urbana, assim como das pessoas e processos que o molda”. A princípio podemos

perceber que a morfologia se preocupa com a forma e seus arranjos, assim como reflete as

organizações econômicas, sociais e políticas. Além destes a morfologia pode ser lida e

analisada pela forma física da cidade.

Assim, segundo Lamas (2004) a morfologia é entendido como “ciência que

estuda as formas e as interliga com os fenômenos que lhes deram origem, nas suas

características exteriores, físicas, e na sua evolução no tempo”.

Um estudo morfológico não se ocupa só com o processo de urbanização, ou

seja, do conjunto de fenômenos sociais, econômicos e outros, motores da urbanização.

Estes convergem na morfologia como explicação da produção da forma, mas não como

objeto de estudo. Esse estudo deve, no entanto ocupar-se dos elementos morfológicos da

cidade e da sua articulação entre si e com os lugares que constituem o espaço urbano

(SALGUEIRO, 2010).

Esta ideia também apresentada por Carlos (2007) considera que a análise da

morfologia da cidade revela uma dimensão que não é apenas espacial, mas também

temporal quando aponta uma profunda contradição nos processos de apropriação do

espaço pela sociedade. A autora também deixa claro que “a morfologia urbana não revela a

gênese do espaço, mas aparece como um caminho seguro para a análise do modo como o

passado e presente se fundem nas formas, revelando as possibilidades abertas no

presente”.

Na verdade, a estrutura urbana é resultado da ação conjunta da evolução

histórica, as funções de estrutura demográfica e morfologia urbana, que pode ser

considerada um resultado de outros fatores específicos, apesar de a análise concreta dos

nossos estudos de caso, é sempre condicional (VILAGRASA, 1991).

É importante resaltar que a cidade não é só uma estrutura espacial, onde existe

uma relação entre os elementos que a constituem e o seu espaço como as condições

históricas, sociais, econômicas e políticas, também observa-se a apropriação social e cultural

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do espaço da cidade que também contribui para sua forma (SALGUEIRO, 2010).

É importante resaltar também que quando analisamos a forma urbana é

fundamental falarmos dos elementos morfológicos do espaço urbano que são: solo,

edificações, lotes, o quarteirão, fachada, os logradouros, o traço das ruas, a praça, o

monumento, o mobiliário urbano e as áreas verdes. Segundo Lamas (2004) as áreas verdes

caracterizam a imagem da cidade, tem individualidade própria, desempenham funções

precisas, são elementos de composição e do desenho urbano, servem para organizar, definir

e conter espaços.

Nucci e Cavalheiro (1999) e Guzzo (1997) apresentam conceitos que abrangem o

verde urbano, classificando-os, caracterizando-os e diferenciando espaços livres e áreas

verdes, praças, parque urbano e arborização urbana, e que esses espaços verdes

apresentam uma morfologia definida por Jim (1989) apud Nucci e Cavalheiro (1999) em

estudos realizados em Hong Kong como Isolada, Linear e Conectada.

Além da forma, a vegetação urbana desempenha funções muito importantes nas

cidades, não se restringindo a estética e paisagística, as quais valorizam a beleza no

ambiente, mas vão além, apresentando as funções ecológica, social, educativa, estética,

psicológica, cultural (GUZZO, 1991; NUCCI e CAVALHEIRO 1999; PIVETTA et al,2002).

É notório observarmos na paisagem urbana espaços arborizados, seja pela

forma, seja pela função, estão dispostos de acordo com os elementos morfológicos que as

constituem e as definem no espaço urbano. Esta materialidade do verde na cidade pode ser

analisada através da própria forma do meio urbano, pelo processo histórico, pelo estrato

social e econômico e pelo relevo urbano.

O PAPEL DA MORFOLOGIA URBANA NO PROCESSO DE PERDA DAS ÁREAS VERDES NOS BAIRROS DE NAZARÉ E GUAMÁ.

Na área da morfologia urbana, pouca atenção é dada a relação do verde urbano

com a forma da cidade. Entretanto, buscaremos a partir deste momento relacionar

elementos como histórico de ocupação, topografia, e uso do solo na tentativa de

demonstrar como esses vários componentes do tecido urbano se articulam entre si e como

contribuíram ao longo do tempo para a retração do verde urbano dos bairros de Nazaré e

Guamá.

O estudo concentrou-se nos bairros de Nazaré e Guamá. O primeiro está

localizado na porção centro sul da cidade de Belém tendo como coordenadas 1º 26’ 45.16” e

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1º 27’ 25.61” de lat. S e 48º 28’ 35.37” e 48º 29’ 38,77” long. W. O Guamá está localizado na

porção sudeste da cidade tendo como coordenadas 1º 27’ 17.78” e 1º 28’ 43.56” de lat. S e

48º 27’ 09.19” e 48º 28’ 24.51” long. W. (Figura 1).

Figura 1: Carta Imagem de Localização dos bairros de Nazaré e do Guamá na cidade de Belém doPará.

Fonte: Base cartografia Imagem Landsat 7, 2002, projeção UTM, Org. Rodrigues (2014).

O mapeamento da cobertura vegetal realizado em Nazaré e Guamá revelou

baixos índices de vegetação em ambos os bairros. O bairro de Nazaré apresentou cobertura

vegetal equivalente a 172.105,6m2 correspondendo a 11,35% da área do bairro, já o bairro

do Guamá apresentou um quadro mais preocupante com uma área de 226.819,91m2 da

cobertura vegetal, correspondendo a 5,42% da área total do bairro.

De acordo com padrões pré-determinados pela ONU (Organização das Nações

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Unidas), esses bairros apresentam índices muito baixos, pois as áreas urbanas devem

apresentar um índice de cobertura vegetal correspondente a 30%, o que é recomendável

para proporcionar um adequado balanço térmico em áreas urbanas, sendo que áreas com

índice de arborização inferior a 5% determinam características semelhantes a um deserto

florístico (OKE apud LOMBARDO, 1985). O que se constata é que o bairro do Guamá

apresenta estas características de deserto florístico, ao contrário do bairro de Nazaré que

não apresenta índice satisfatório de 30%, mas em compensação não está em estado crítico.

A respeito da forma os bairros de Nazaré e Guamá apresentam organização e

extrato social diferenciado (Figura 2). O bairro de Nazaré é mais planejado e mais organizado

com ruas largas e arborizadas, lotes grandes e residências amplas com sobrados e com alta

concentração da verticalização, obedecendo às cotas mais altas da cidade onde se

estabeleceu uma população de maior poder aquisitivo. Já o bairro do Guamá surge no

contexto da expansão urbana de Belém a partir dos anos 40 do séc. XX pela população mais

pobre ocupando áreas de baixadas, sem controle ou qualquer planejamento, onde temos

um bairro desorganizado do ponto de vista do planejamento, alta densidade populacional,

vias estreitas, com pouca ou nenhuma arborização, falta de espaços públicos e

infraestrutura, restando.

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Figura 2: A morfologia dos Bairros de Nazaré e Guamá.

Fonte: Base Cartográfica, Imagem IKONOS, 2006, DATUM SAD 69, projeção UTM, Rodrigues, 2014.

O Bairro de Nazaré por ser planejado é mais arborizado, por outro lado o bairro

do Guamá por apresentar uma morfologia desorganizada do ponto de vista do

planejamento, apresenta pouca ou nenhuma arborização em alguns setores do bairro.

Assim, as causas da maior arborização no bairro de Nazaré e pouca arborização no bairro do

Guamá estão intimamente associadas com as suas respectivas morfologias, que por sua vez

moldada em processos históricos de ocupação, pela topografia, e pelo uso do solo que cada

bairro apresenta como veremos a seguir.

Histórico de Ocupação dos Bairros de Nazaré e Guamá.

A cidade de Belém foi fundada no século XVII e por muito tempo fora constituída

basicamente por mata entremeada por redes de igarapés, e uma área urbanizada,

constituída pelos bairros da Cidade Velha e da Campina. Ainda no contexto de

desenvolvimento do processo de urbanização da cidade de Belém, novos bairros foram

sendo formados, em função da abertura de caminhos dentro da mata virgem e o

surgimento de fazendinhas e o processo de ocupação desses bairros também ocorrem em

épocas diferentes (Figura 3).

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Figura 3: Mapa da evolução histórica da cidade de Belém destacando os períodos do surgimento dosbairros de Nazaré e Guamá.

Fonte: Base cartografia, Planta da reconstituição histórica do município de Belém, Penteado (1968) adaptado porRodrigues, 2012.

Assim o bairro de Nazaré começa em 1619, quando um caminho aberto na mata

passou a ser conhecido por estrada Real de Bragança e o bairro do Guamá tem suas origens

na fazenda localizada próximo ao igarapé Tucunduba, a qual foi doada como sesmaria.

Segundo Farias (2009) no caminho conhecido como estrada Real de Bragança

havia uma ermida (igreja rústica) onde habitava um homem devoto de Nossa Senhora de

Nazaré. Após alguns anos, mais especificamente em 1792, por tais motivos religiosos, foram

promovidas, anualmente, festas religiosas para homenagear a santa que levava o mesmo

nome da Igreja e a modesta capela de N. S. de Nazaré ficava afastada do povoado. A partir

de então, a estrada ficou conhecida como Estrada de Nazaré que posteriormente se tornou

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o bairro de Nazaré em homenagem a Nossa Senhora de Nazaré, padroeira dos paraenses. O

futuro bairro de Nazaré era um bosque imenso que ligava o largo de Nazaré, com outras

localidades mais afastadas.

Para Andrade (2003) Belém tardou a se expandir mata adentro e esse quadro se

estende até a primeira metade do século XIX, e é quando se inicia o processo de

urbanização do atual bairro de Nazaré, através da Avenida Nazaré e sua extensão a Avenida

Governador Magalhães Barata, tornaram-se o eixo principal da cidade, devido ao processo

de arruamento e à instalação de bondes de tração animal, que fez com que as ruas fossem

calçadas com paralelepípedos e arborizadas (Figura 4). Foram abertas avenidas, ruas e

travessas largas, e criados grandes quarteirões, alterando a caracterização viária existente,

que se baseava em ruas e vielas estreitas. Oficialmente, o bairro de Nazaré passou a existir

com a implantação do plano urbanístico de modernização, desenvolvido pelo engenheiro

Manoel Odorico Nina Ribeiro, em 1883, e posto em prática em 1887 pelo então intendente

Antônio Lemos.

Figura 4: Avenida Nazaré no início do séc. XX já apresentava significativa arborização.

Fonte: Silva, 1908 citado por Andrade (2003)

Ainda segundo Andrade (op. cit.), a modernidade e a infraestrutura trouxeram

para o bairro de Nazaré moradores de maior poder aquisitivo. Outro fator de grande

importância no planejamento de urbanização de Nazaré, e de outros bairros de Belém, foi o

processo de arborização das principais vias do bairro, tendo em vista que o processo de

arborização é um fator que até os dias atuais é percebido, através dos tuneis de mangueiras,

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como positivo por uma questão estética, de embelezamento e também pelo conforto

térmico para os cidadãos.

Por outro lado, o bairro do Guamá não recebeu mesma atenção nas melhorias

urbanas, o bairro foi construído através de um processo de ocupação desordenada tendo

seu processo de ocupação no final do século XVIII, com a construção de uma olaria, com o

objetivo de fornecer materiais para a crescente cidade de Belém, bem como a posição

geografia da fazenda, pois o igarapé do Tucunduba e o rio Guamá facilitavam o escoamento

da produção e sua articulação com o centro da capital (RAMOS, 2002).

A referida área, apesar da proximidade com o centro da cidade, ainda estava

inserida ao contexto urbano de Belém como um 'depósito de lixo social'. Nesse sentido, o

bairro ficou marcado pela forte presença de hospitais de isolamento, antigo leprosário, dos

cemitérios de Santa Izabel (1887) e da Ordem Terceira de São Francisco (1885), dos hospitais

Domingos Freire, São Sebastião e São Roque e do Asilo Infantil Santa Terezinha, que

abrigava os filhos nascidos no hospício do Tucunduba. O bairro teve períodos de grande

ocupação populacional, causados pela reabilitação da economia da borracha no Estado e,

principalmente, a partir das décadas de 60 e 70 do séc. XX. Nesse contexto, surgem as

primeiras e principais ruas do bairro do Guamá, consideradas caminhos de terra batida, que

eram por muitas vezes abertas pelos próprios moradores e sem o mínimo de infraestrutura

urbana, diferente do bairro de Nazaré que recebeu intervenção do Estado.

O Relevo dos Bairros de Nazaré e Guamá.

As diversas e mais importantes morfologias contidas na área de estudo como a

forma de ocupação por grupos sociais de maior e menor poder aquisitivo, a rugosidade,

densidade e tamanho das construções, o tipo de uso e ocupação do solo e índice de

cobertura vegetal obedecem às características geomorfológicas dos bairros em estudo.

Os terrenos dos bairros em estudo fazem parte, segundo Oliveira (1992), da

grande planície, constituídas pelas terras baixas sedimentares, que por sua vez possuem

dois setores, os baixos platôs e as planícies. Apesar dos baixos platôs serem representados

pelas superfícies mais baixas, entretanto na escala adotada, os baixos platôs são

considerados os divisores de água no sítio urbano de Belém, isto é, o bairro de Nazaré foi

edificado sobre a parte mais alta da cidade, no baixo platô, pois parte do bairro esta sobre o

divisor da bacia a NW a bacia do Reduto e Tamandaré a SE bacia da Estrada Nova. Os baixos

platôs estruturam-se em níveis de terraço (terra firme) com altitudes que variam entre 5 a 15

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metros.

O bairro do Guamá foi edificado na parte mais baixa da cidade definida como as

áreas de planícies de inundação, esculpidos em terrenos mais recentes do quaternário e sua

altitude atinge em média cotas de até 6 metros, este nível é bem visível ao N, NE por

influência da bacia do rio Tucunduba que no seu baixo curso apresenta a várzea baixa, e no

seu médio curso a várzea alta e ao S pelo rio Guamá. Já a NW eleva-se o terreno mais alto do

bairro com cotas até 12 metros, mas é um trecho bem pequeno de terraço (Figura 5).

Figura 5: Mapa Hipsométrico dos bairros de Nazaré e Guamá.

Fonte: Base Cartográfica, Imagem IKONOS, 2006, shp de curva de nível da cidade de Belém; DATUM SAD 69, ProjeçãoUTM, Rodrigues, 2014.

Portanto, as unidades de relevo como terraços e planícies presentes no bairro de

Nazaré e do Guamá apresentam estreita relação com o uso do solo nesses bairros,

procurando assim demonstrar a seguir tal relação.

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Uso do solo dos Bairros de Nazaré e Guamá.

Ao longo do processo de ocupação do bairro de Nazaré, os terrenos mais

elevados passaram a ser mais valorizados por ser seco e plano, sua proximidade ao centro,

este não sofre com alagamentos, melhor para se construir prédios e para se urbanizar e

arborizar, ruas largas e retas. Por outro lado, o bairro do Guamá sofre influência do rio

Tucunduba que forma uma extensa planície que foi ocupada basicamente por uma

população de baixa renda. Esse tipo de terreno é drenado por diversos canais retendo as

águas pluviais, contribuindo para a perenização dos alagamentos. Em virtude desta situação,

a população que ocupou este ambiente efetuou processo de aterramento com diversos

tipos de materiais como lixos, caroços de açaí, serragem, laterita e piçarras (FERREIRA, 1995),

principalmente nas cotas mais baixas do terreno, dando uma forma caótica ao bairro, sem

planejamento, surgindo assim, ruas estreitas e tortuosas, retificação dos canais, retirada da

cobertura vegetal para dar lugar a moradias, ausência de espaços de laser como praças,

parques, inexistência de espaçamento entre as edificações, delimitação de lotes pequenos e

formato de anfiteatro.

Todas essas transformações podem ser observadas através do uso do solo dos

bairros de Nazaré e Guamá. Para melhor compreensão optou-se por utilizar o sistema de

classificação proposta por Pivetta (2005) destacando três classes de uso do solo, são elas:

área edificada horizontal e vertical, cobertura vegetal e vias pavimentadas e não

pavimentadas.

Edificações

Segundo Pivetta et al (2005), consideram-se edificações todas as construções

que se ergue acima do solo como casas, prédios, fábricas, hospitais etc. O bairro de Nazaré

apresenta maior índice de verticalização 9,18%. O bairro Guamá apresenta apenas 0,33% de

área edificada concentrada apenas a NW do bairro que são as áreas mais elevadas. As áreas

horizontais no bairro de Nazaré é de 76,12% e o Guamá apresenta 77,49% de sua área que é

de ocupação horizontal (Figura 6).

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Figura 6: Mapa edificações vertical e horizontal dos bairros Nazaré e Guamá.

Fonte: Base Cartográfica, Imagem IKONOS, 2006, DATUM SAD 69, Projeção UTM, Rodrigues, 2014.

Levando em consideração as características peculiares de cada bairro, podemos

considerar que a configuração espacial dos Bairros de Nazaré e Guamá vem ser produto da

forma de ocupação decorrente nas últimas décadas, onde se verificou que no processo de

produção do espaço do bairro de Nazaré houve um planejamento e preocupação com a

apropriação do bairro. Há uma predominância de casarões particulares e públicos e ergue-

se no bairro prédios de alto padrão (Figura 7).

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Figura 7: Casarões e prédios de alto padrão edificados no bairro de Nazaré.

Fonte: Saraiva (2014) trabalho de campo.

Inegavelmente, o bairro reproduziu na imagem da cidade as proposições, os

símbolos, os valores, os domínios de uma cultura exógena a sua, provocando a criação de

uma forma erudita com um traçado regular (ou mais regular), planejadas e construídas de

acordo com um projeto, onde é definida uma ordem (geométrica) que estrutura o traçado

urbano e define a posição dos diferentes tipos de edifícios e de funções (TEIXEIRA e VALLA

(1999), citado por SALGUEIRO, 2010).

No Guamá, a ausência de ordenamento territorial, sem planejamento e nenhum

tipo de preocupação para implementação de espaços planejados levou a ocupação das

cotas mais baixas às margens de rios e igarapés por famílias de baixa renda, que viam nessa

baixadas alternativa de moradia a custo muito baixo e desprovido de infraestrutura como

rede de água e esgoto, energia elétrica entre outros, porém encontram-se residindo às

proximidades do centro. Costuma-se observar uma residência mista no bairro, constituídas

de palafitas, casas de madeira e alvenarias, que já representa uma fase avançada da

consolidação da ocupação e uma alta densidade populacional (Figura 8).

Esse modelo distinto vai proporcionar ao bairro do Guamá uma forma vernácula

segundo Teixeira e Valla (1999), citado por Salgueiro (2010), associado a um bairro menos

regular e estruturado essencialmente a partir de funções singulares, civis ou religiosos,

situados em lugares afastados da malha urbana, os quais vão dar sentido e estruturar os

espaços urbanos envolventes.

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Figura 8: (A) Exemplo de forma mista de residência, primeiro pavimento é de alvenaria e o segundopavimento é de madeira; (B) registro do adensamento ocupacional do bairro.

Fonte: Saraiva (2014) trabalho de campo

A população do bairro de Nazaré é de 20.504 habitantes e sua densidade é de

12.949,42 km2/hab., já a população do bairro do Guamá é de 94.610 habitantes, é

considerado um dos bairros mais populosos de Belém e sua densidade é de 19.871,57

km2/hab. (IBGE,2010) e o adensamento urbano é de 85,30% em Nazaré, e 77,82% no

Guamá. Segundo Nucci (2008), o ideal é que se tenha 40% da área construída, 40% para

espaços livres e 20% para o sistema viário. Segundo o autor a alta densidade populacional

está diretamente relacionada com desconforto, risco de doenças, deficiência de

abastecimento em geral problemas com lixo, poluição, escassez de espaços livres para lazer

e áreas verdes. Essas formas distintas dos dois bairros vão fazer com que tenhamos índices

de cobertura vegetal diferenciados.

Vias

Atualmente o bairro de Nazaré apresenta um sistema viário bastante intenso

com grande fluxo de veículos, devido apresentar ruas largas, retas que interligam o bairro ao

centro da cidade e a bairros vizinhos. As ruas do bairro são todas asfaltadas e bem

arborizadas, dando um charme a mais para a cidade bem como seus monumentos como

prédios públicos, a Igreja de N. S. Nazaré e prédios suntuosos. O alinhamento das vias do

bairro de Nazaré obedeceu ao discurso de modernização e do almejado “progresso” com a

ampliação de sua malha urbana (Figura 9). A abertura de grandes avenidas e a introdução da

arborização proporcionou a Belém ares de cidade moderna (Figura 10).

O mesmo não podemos falar a respeito das vias do Bairro do Guamá. São

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poucas a vias que são largas e segue o traçado reto, esse formato mais planejado é

observado na porção NW do bairro, para o restante do bairro as vias deixam de apresentar

essas características, passam a ser tortuosas, estreitas e pouca arborizadas (Figuras 09 e 10).

As principais vias do bairro são as Av. Bernardo Sayão, José Bonifácio, Mundurucus e

Conselheiro Furtado. Recentemente, grande parte das ruas do bairro recebeu pavimento,

porém não foi acompanhado pela arborização. Por um lado o asfalto resolveu um problema

de saneamento que atingia milhares de pessoas a anos, por outro o processo de

pavimentação impermeabiliza o solo agravando os processos de alagamento nas áreas mais

baixas do bairro, promove o fenômeno conhecido como ilhas de calor agravado pela falta de

arborização das vias.

Figura 9: Configuração da malha viária dos bairros de Nazaré e do Guamá.

Fonte: Base Cartográfica, Imagem IKONOS, 2006, DATUM SAD 69, Projeção UTM, Rodrigues, 2014

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Figura 10: (A) Ruas Largas e arborizadas no bairro de Nazaré; (B) ruas estreitas e sem arborização nobairro do Guamá.

Fonte: Saraiva, 2014 (trabalho de campo).

Cobertura vegetal

De acordo com nossos estudos o bairro de Nazaré é o que melhor apresenta

arborização em relação ao bairro do Guamá que, de certa forma, apresenta uma

precariedade em sua cobertura vegetal acompanhando o índice do distrito do Guamá

que também se apresenta muito abaixo do recomendado.

Primeiramente, analisando a vegetação o bairro de Nazaré, as intervenções

paisagísticas principalmente o processo de arborização que o bairro sofreu se inseria

em um processo de reordenação e abertura de artérias viárias, construção de praças,

parques no governo de Antônio Lemos que tinha preocupações com o aspecto da forma

(estético/funcional) e de tempo, pois como esses espaços estariam interagindo com a

paisagem do tempo presente e futuro e também o aspecto ambiental.

Outro fator do processo de arborização segundo Andrade (2003), se

justificava devido o fator climático, Belém apresenta um tipo climático equatorial quente

úmido onde se registra elevadas precipitações e temperaturas o ano todo. Esse rigor

climático em especial as elevadas temperaturas traziam certo desconforto térmico a

população belenense e a causa das elevadas temperaturas relacionava-se à incipiente

presença de árvores nas ruas, parques, praças e, também, à estrutura de suas ruas

geralmente curtas e estreitas dificultando uma ventilação ideal.

O Serviço de arborização no governo de Antônio Lemos mereceu os maiores

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cuidados do poder municipal, prestando um serviço de saneamento urbano pela

arborização em larga escala. As ruas de maior largura receberam o benefício da

arborização. Esse processo de arborização, assim como todas as obras de melhorias,

era visto por Antônio Lemos como melhorias na qualidade de vida para os habitantes da

cidade, pois Antônio Lemos via que os jardins seriam em poucos anos magníficos

parques, prestando aos habitantes da cidade um grato refrigério, mesmo nas horas

mais duras do dia. Lemos levava em consideração a posição geográfica da cidade,

encontrando-se em uma zona climática equatorial que apresenta elevadas

temperaturas o ano todo. Então a arborização possibilitou refrigerar a cidade e

amenizar as altas temperaturas.

Entretanto, a ideia de um plano de embelezamento (estético) e sanitarismo

(aspectos técnicos) para toda a cidade foi uma prioridade. No entanto, esta premissa

não se consolidou, o que se constatou foi à concentração dessas obras de melhorias

urbanas (arborização e saneamento) em áreas específicas, mais precisamente nas áreas

centrais como o bairro de Nazaré, não atendendo bairros como o Guamá.

Espécies como o eucalipto (eucalyptus-globulos), a sumaumeira, a

amendoeira foram espécies introduzidas no tecido urbano, entretanto, foi a mangueira

(mangifera indica) que se tornou a principal espécie a ocupar as ruas, avenidas e praças

da cidade. O que levou à adoção dessa espécie em grande escala foi sua singularidade

de adaptação ao ecossistema da região e, com efeito, esta espécie desenvolve-se com

rapidez, cresce a alturas consideráveis e esgalha-se com regularidade, apresenta

folhagem densa e constantemente é renovada sem falar que consegue gerar sombra

ampla e perfeita (Airoza, 2010).

O bairro de Nazaré foi contemplado com essas espécies, já o bairro do

Guamá não teve a mesma sorte, ao longo do seu desenvolvimento a cobertura vegetal

foi se perdendo dando lugar a ocupação espontânea, restando apenas resquícios de

vegetação em quintais, as poucas ruas que apresentam arborização não foram

contempladas com as espécies de mangueira, e sim, se observam espécies como

Oitizeiros (Licania tomentosa) Castanholas (Terminalia catappa), Ficus (Fícus benjamina,),

entre outras (Figura 11).

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Figura 11: (A) Arborização de Mangueiras formando belos túneis verdes pelo seu portearbóreo no bairro de Nazaré; (B) Arborização de Oiti de porte mais arbustivo no bairro do

Guamá.

Fonte: Saraiva (2014) trabalho de campo.

A forma da cobertura vegetal indica as áreas que foram planejadas e as que não

tiveram essa mesma atenção. Podemos observar na configuração das manchas de

cobertura vegetal, que no bairro de Nazaré a forma da vegetação é linear retilínea

caracterizada por apresentar uma justaposição de árvores em uma mesma direção,

correspondendo a um estreito alinhamento ao longo das calçadas de algumas avenidas e

travessas planejadas. No bairro do Guamá predomina a forma isolada que é a agregação de

árvores em grandes unidades, pode ser encontrada em propriedades particulares (nos

quintais), misturadas a componentes das edificações (Figura 12).

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Figura 12: Mapa da cobertura vegetal dos bairros de Nazaré e Guamá

Fonte: Base Cartográfica, Imagem IKONOS, 2006, DATUM SAD 69, Projeção UTM, Rodrigues, 2014.

A forma da vegetação retrata muito bem a influência da morfologia urbana dos

bairros, Nazaré por ser um bairro mais planejado apresenta maior arborização

principalmente nas vias de circulação e o Guamá pela sua organização mais espontânea

apresenta menor arborização.

A cobertura vegetal do bairro de Nazaré corresponde a uma área de

172.105,60m2 que corresponde a 11,35% da área do bairro, índice abaixo dos 30%

recomendado pela ONU e o Índice de cobertura vegetal por habitante é de 8,39m2/hab.

também abaixo do recomendado que é de 12m2/hab. pela OMS. A cobertura vegetal do

bairro do Guamá representa uma área de 226.819,91m2 que corresponde a 5,42% da área

do bairro, índice muito abaixo dos 30% recomendado pela ONU e próximo do indicativo de

deserto florístico. O Índice de cobertura vegetal por habitante é de 2,40m2/hab. também

muito abaixo do recomendado que é de 12m2/hab. pela OMS.

Apesar do bairro de Nazaré apresentar índices abaixo do recomendado seus

índices podem ser considerados satisfatórios no que tange a função da vegetação, o que

não podemos dizer o mesmo para o bairro do Guamá que seus índices apresentam situação

crítica bem abaixo do recomendado pelos órgãos competentes (Tabela1).

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Tabela 1: Dados sobre os índices da cobertura vegetal dos bairros de Nazaré e Guamá

Bairros Área do Bairroem m²

Área da cobetura vegetal População do bairroCenso 2010

ICVH m²

m² %

Nazaré 1.515.995,16 172.105,60 11,35 20.504 8,39m²/hab.

Guamá 4.184.066,75 226.819,91 5,42 94.610 2,40m²/hab.

Fonte: Trabalho de Campo, IBGE (2010)

O resultado observado no bairro do Guamá é reflexo da configuração e forma de

ocupação que o bairro tomou ao longo de seu desenvolvimento, o que fez com que os

espaços se tornassem cada vez mais impermeáveis e adensados, subtraindo a vegetação

que irá refletir diretamente na vida da população por meio do desconforto térmico,

aumento de temperatura, alagamentos etc.

No caso do bairro de Nazaré a perda da vegetação vem ocorrendo pela atuação

das companhias prestadoras de serviços urbanos (luz e telefonia) desrespeitando a

arborização pública por meio de realizações de podagem que é verdadeira mutilação das

espécies (Figura 13), associado à pressão massiva da verticalização que realiza grande

pressão as espécies de mangueiras centenárias tornando-as frágeis e sofrendo quedas,

trazendo transtornos a população como interrupções de luz e telefone no bairro.

Figura 13: Exemplos de podagem priorizando a rede de energia elétrica e telefonia no bairro deNazaré.

Fonte: Rodrigues (2014) trabalho de campo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A cidade de Belém, principalmente em meados do séc. XX assinalou mudanças

profundas em sua estrutura urbana, onde, inegavelmente, essas mudanças foram

percebidas nos bairros centrais e periféricos da cidade, exemplo disso, podemos observar

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comparando dois bairros da cidade, o bairro de Nazaré e o bairro do Guamá.

O bairro de Nazaré se estruturou em um período áureo do ciclo da borracha,

cujo capital gerado por essa atividade econômica foi à força motriz, que reproduziu na

imagem do bairro, os símbolos, os valores, os domínios de uma cultura europeia,

principalmente da influência francesa. O bairro se alinha ao discurso de modernização,

como bairro planejado e bem estruturado economicamente e de infraestrutura através de

diversas obras como a ampliação de sua malha urbana a construção de prédios privados e

estatais bem como uma forte arborização que representa uma melhora na estética e no

saneamento do bairro.

Por outro lado, o bairro do Guamá tem seu processo de ocupação intensificado a

partir dos anos 60, quando um grande contingente populacional, tanto da própria cidade

como do interior, migram para o bairro, causado por diversos fatores como o alto custo e

valorização dos lotes no centro da cidade, por apresentar terrenos de baixo valor comercial,

tendo em vista que grande parte dos terrenos do bairro do Guamá está sobre influência do

Rio Tucunduba, que constitui uma grande planície de inundação, conhecido como terrenos

de várzea, que vão ficar conhecidos como áreas de baixadas.

Portanto, tendo em vista todo esse processo, os bairros de Nazaré e Guamá vão

apresentar uma morfologia que se diferencia em vários aspectos, que só pode ser

entendido pelo processo histórico de ocupação e produção espacial, combinados com o tipo

de relevo e com o uso do solo que cada bairro apresenta. Utilizando esses elementos,

tentamos apresentar, através desses constituintes o cenário morfológico de cada bairro em

estudo e que ao longo do processo refletiu diretamente nos índice de cobertura vegetal de

cada bairro.

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ANÁLISE MORFOLÓGICA DOS BAIRROS DE NAZARÉ E GUAMÁ NO PROCESSO DE REDUÇÃO DAS ÁREAS VERDES URBANAS NO MUNICÍPIO DE BELÉM-PA.

EIXO 4 – Problemas socioambientais no espaço urbano e regional

RESUMO

O adensamento populacional e o crescimento espacial desordenado nas grandes metrópoles são

fatores relevantes para a redução significativa das áreas com cobertura vegetal, afetando o clima

local. A redução das áreas verdes está diretamente relacionada aos modelos de ocupação, tanto

pelo capital imobiliário como por diversas ocupações espontâneas que se espraiam pelas áreas

periféricas da cidade, onde muitas vezes, estão condicionados à disputa por maior

aproveitamento do espaço. A relevância da pesquisa fundamenta-se na contribuição de estudos

de climatologia urbana na Amazônia, tendo como laboratório de estudo a cidade de Belém capital

do Estado Pará, e na criação e consolidação de grupos de pesquisa sobre o tema para a avaliação

dos problemas decorrentes do processo de ocupação das cidades e da região. O principal

objetivo é analisar como a morfologia urbana vem contribuindo para o processo de perda das

áreas verdes nos bairros de Nazaré e Guamá no município de Belém-PA. Para este trabalho

adotou-se como metodologia uma revisão da literatura a respeito do tema morfologia e áreas

verdes urbanas. Também se utilizou imagens de alta resolução IKONOS, 2006 para o

mapeamento da morfologia e cobertura vegetal dos bairros em estudo, assim como, o navegador

Google Earth para atualizações no uso do solo, pois algumas mudanças já ocorreram no espaço

após 2006. Juntamente, foi realizado Índice de cobertura vegetal (ICV) e por habitante (ICVH),

onde se calcula o total da cobertura vegetal pela área e pela população do bairro

respectivamente, com o intuito de se obter índices aceitáveis de cobertura vegetal que é de 12m2

de áreas verdes por habitante estabelecido pela ONU em áreas urbanas, também foram

realizados trabalhos de campo. Como resultado o bairro de Nazaré apresenta 11,35% de ICV o que

equivale a 8,39m2 por habitante. Já o bairro do Guamá o ICV é de 5,42% que corresponde a

2,39m2 de vegetação por habitante. Apesar de índices baixos, o bairro de Nazaré é o que

apresenta melhores índices de arborização motivada pela herança da Belle époque, durante

meados do séc. XIX, quando foi implantada arborização de vias, parques urbanos e infraestrutura,

surgindo um bairro mais organizado com ruas largas e arborizadas, lotes grandes e residências

amplas com sobrados, obedecendo as cotas mais altas da cidade, onde se estabeleceu uma

população de maior poder aquisitivo. Já o bairro do Guamá surge no contexto da expansão

urbana de Belém a partir dos anos 40 do séc. XX pela população mais pobre, ocupando áreas de

baixadas, sem controle ou qualquer planejamento, onde temos um bairro desorganizado do ponto

de vista do planejamento, cuja sua característica é o adensamento populacional, vias estreitas,

com pouca ou nenhuma arborização, falta de espaços públicos e infraestrutura, restando apenas

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uma arborização de quintais que predomina no bairro.

Palavras-chave: Cobertura vegetal, morfologia urbana, áreas verdes.

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