Análise Formalista e Estruturalista Do Poema

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Anlise Formalista e Estruturalista do Poema Teresa de Manuel Bandeira Por Danielle Marinho

Resumo: o trabalho realiza um estudo sobre o poema Teresa, de Manuel Bandeira, a partir de conhecimentos sobre as teorias literrias formalista e estruturalista. Assim, no desenvolvimento desta anlise, so abordados aspectos formais e estruturais, tais como o ritmo, a mtrica, a seleo vocabular e a distribuio dos versos em estrofes, e, ainda, feita uma interpretao do poema para a compreenso da mensagem potica.

(1) A primeira vez que vi Teresa

(2) Achei que ela tinha pernas estpidas

(3) Achei tambm que a cara parecia uma perna

(4) Quando vi Teresa de novo

(5) Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo

(6) (Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

(7) Da terceira vez no vi mais nada

(8) Os cus se misturaram com a terra

(9) E o esprito de Deus voltou a se mover sobre a face das guas.

De incio, uma anlise quanto aos aspectos formais: o poema composto por nove versos distribudos em trs tercetos, sem mtrica e sem rimas. Pode-se falar em rimas internas pela aliterao existente nas estrofes: na primeira, pela repetio do i vi, tinha, parecia; na segunda, pelo o fechado nOvo, cOrpo; na terceira, por meio do a aberto nAda, misturAram, guas. O esquema rtmico variado, mas percebe-se um padro: os primeiros versos de cada estrofe (1, 4 e 7) possuem fora na entoao da 3 e 5 slabas, e os versos 1 e 7 possuem ainda entoao na 7 e 9 slabas, sendo, pois, idnticos quanto mtrica e ao ritmo, e diferindo do verso 4 por este ter 8 slabas e entoao silbica 3-5-8.

Conforme a regra estruturalista de imanncia, a qual analisa o sistema por si e sem a necessidade de elementos externos, nota-se que o poema retrata trs vises do eu-lrico em relao a uma mulher, situadas em trs tempos distintos; da o porqu de o poema ser estruturado em trs estrofes, cada uma representando um tempo (regra de integrao: continuidade lgica no desenvolvimento de um sintagma). Essa marcao temporal d-se atravs do primeiro verso de cada estrofe; os versos 1, 4 e 7 so, pois, elementos de funo equivalente, que se relacionam segundo a regra de compatibilidade: eles representam os diferentes momentos em que o eu-lrico viu Teresa.

O primeiro encontro, a vez primeira, bastante fria, inexpressiva, e Teresa no provoca no eu-lrico nenhum sentimento amoroso; isso demonstrado pela escolha das imagens cara e perna como as partes observadas do corpo de Teresa e pelo adjetivo estpidas. Merece destaque, pois, a pertinncia desses elementos na transmisso da falta de encanto do eu-lrico em relao Teresa e seu corpo.

O segundo encontro um pouco mais intenso, j que o eu-lrico prefere observar os olhos da mulher; a mscara estpida de Teresa posta de lado pelo autor; ainda assim, no se estabelece nenhuma relao amorosa entre os dois, pois ele produz a imagem de olhos velhos, no sexto verso, com valor depreciativo. A escolha da imagem dos olhos pertinente para se demonstrar a ocorrncia de uma relao um pouco mais profunda entre ambos, j que o contato do eu-lrico com os olhos de Teresa revela um maior grau de intimidade.

Da terceira vez, o eu-lrico explicita a sua condio de apaixonado: nos versos 8 e 9, ele usa um lirismo sublime atravs da fuso entre o material (terra, guas) e o espiritual (cus, Deus) para retratar o que sentiu ao ver Teresa naquele momento, uma descoberta de sensaes maravilhosas. A diferena entre as linguagens utilizadas nas estrofes est em conformidade com o sentimento despertado no eu-lrico: nas duas primeiras, como no houve viso apaixonada, o encontro entre os dois foi banal, e a linguagem prosaica, cotidiana; na terceira estrofe, pela paixo despertada, a linguagem potica. A mudana de linguagem pertinente com a mudana na percepo do eu-lrico acerca de Teresa e o uso de uma linguagem potica necessrio para a construo do significado do poema.

Conclui-se, pois, que o segundo e terceiro versos de cada estrofe so a descrio dos diferentes sentimentos experimentados pelo eu-lrico no contato com Teresa. Esses versos (2 e 3, 5 e 6, 8 e 9) so termos de trs sistemas distintos (as estrofes) e assumem a mesma funo no sintagma (o poema); relacionam-se, ento, conforme a regra de compatibilidade. Outra possvel aplicao dessa regra a separao de pernas, cara, olhos e no vi mais nada em sistemas distintos e pertencentes ao mesmo sintagma, a parte do corpo de Teresa que observada.

Pela regra de variaes diacrnicas pode-se estabelecer outra relao: o primeiro verso de cada estrofe/sistema constitui uma forma diferente dos outros dois versos da mesma estrofe. Isso porque esses versos (1, 4 e 7) marcam o tempo do sistema a que pertencem, enquanto os outros versos expressam a sensao vivida pelo eu-lrico no sistema a que pertencem (exemplo: no primeiro sistema/estrofe, o verso 1 difere em funo dos versos 2 e 3).

Consideraes vlidas do poema podem ser retiradas segundo a regra estruturalista de comutao. Por exemplo, Teresa, ttulo do poema e nome da mulher que o inspirou, pode ser alterado por outro nome feminino, desde que este seja paroxtono, a fim de se manter a continuidade do ritmo nos versos 1 e 4 [1] o ritmo fator construtivo e fundamental do verso, conforme defendia Eikhenbaum em suas teorias do mtodo formal. Ainda estudando a comutao, cabvel a afirmao de que a troca do termo perna, na primeira estrofe, por outro termo contrastante com cara, isto , contrastante com os elementos faciais, no causaria grandes mudanas ao significado pretendido pelo poeta. Se o termo perna fosse alterado por tornozelo, por exemplo, o contraste entre elementos corporais seria mantido, e, tambm, o sentido da estrofe (no-atrao fsica). A regra de comutao explica que a mensagem transmitida permanece inalterada, apesar da seleo e troca de itens, porque preservada a estrutura de relao entre os itens, responsvel pelo sentido.

O sexto verso em si mesmo interessante: ele a explicao da perturbao sentida pelo eu-lrico nos dois versos anteriores; a explicao longa ( o verso mais longo do poema) pertinente a fim de se expressar esse estado de confuso experimentado por ele; ele est escrito entre parnteses, possivelmente como forma de continuar evitando o uso de algum conectivo entre os versos, o qual seria necessrio para iniciar essa explicao.

O verso que inicia o ltimo terceto do poema possui uma inovao em relao ao primeiro e quarto versos. Nestes, o resultado da ao de ver Teresa no est expresso, sendo relatado posteriormente. J no stimo verso, o poeta antecipa a perturbao experimentada naquela vez, ao afirmar que no vi mais nada. Essa caracterstica fundamental para o significado da terceira estrofe, que expressar algo tambm novo para o eu-lrico, um sentimento intenso, grandioso e incontrolvel (Os cus se misturaram com a terra / E o esprito de Deus voltou a se mover sobre a face das guas).

A manifestao potica em Teresa ocorre principalmente na associao inusitada entre os termos. A poesia percebida em elementos prosaicos capazes de ativar uma cadeia de significaes: a singularizao, a quebra do automatismo perceptivo. Esse um aspecto vlido tanto para a anlise formalista quanto para a estruturalista.

Uma observao de poemas direcionada por teorias literrias como a formalista e estruturalista, teorias consideradas nesse estudo, vlida e interessante. Nesse tipo de anlise, percebem-se aspectos riqussimos na construo potica, isto , no modo como o poeta condensou a poesia e estruturou o poema. Tais aspectos tornam-se ainda mais valiosos, e, portanto, a anlise mais fascinante, na obra de um poeta enorme como Manuel Bandeira. No poema Teresa, Bandeira mescla o prosaico ao sublime, o banal ao potico. Trata-se de uma atitude de desapego ao lirismo tradicional e ao amor romntico. , pois, a criao de uma poesia do cotidiano: o poeta fala de amor em circunstncias simples e ironiza a idealizao romntica, traando a modernidade.

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira. 20 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

BOSI, Alfredo. Histria concisa da Literatura Brasileira. 44.ed. So Paulo: Cultrix, 2006.

EAGLETON, Terry (2004). Teoria da literatura: uma introduo. So Paulo: Martins Fontes.

EIKHENBAUM, B. A Teoria do Mtodo Formal. In: LIMA, Luiz Costa. Teoria da literatura em suas fontes (2002). 3 ed. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira.

[1] Essa observao no vlida se for considerada a inteno de Bandeira, em conformidade com os ideais modernistas de pardias e parfrases, de fazer uma intertextualidade com o poema romntico O Adeus de Teresa, de Castro Alves. Tal fato, porm, irrelevante para anlises formalistas e estruturais, visto que essas analisam a obra em si, e no seu autor ou seu contexto histrico-social.