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ANALISE ERGONÔMICA DO TRABALHO EM UMA EMPRESA DE TECNOLOGIA DE FLORIANÓPOLIS: ENFOQUE NA ANÁLISE DA ATIVIDADE Monica Holdorf Lopez (UFSC) [email protected] Lizandra Garcia Lupi Vergara (UFSC) [email protected] Gabriela Hammes (UFSC) [email protected] O trabalho no cargo de chefia é caracterizado pela multiplicidade de tarefas que muitas vezes competem umas com as outras na esfera temporal, é uma atividade complexa e variável que demanda habilidade na comunicação interpessoal e domínio do conhecimento técnico. O presente artigo traz a Análise Ergonômica do Trabalho focando na atividade do supervisor de engenharia de uma empresa do ramo de tecnologia de Florianópolis que levanta como demanda inicial a constante interrupção de sua equipe e outros atores durante o desenvolvimento de suas atividades. Essas interrupções foram analisadas por meio de observações e entrevistas, assim como o contexto do trabalho e da organização e foram ao final indicadas possíveis soluções. XXXV ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Perspectivas Globais para a Engenharia de Produção Fortaleza, CE, Brasil, 13 a 16 de outubro de 2015.

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ANALISE ERGONÔMICA DO

TRABALHO EM UMA EMPRESA DE

TECNOLOGIA DE FLORIANÓPOLIS:

ENFOQUE NA ANÁLISE DA ATIVIDADE

Monica Holdorf Lopez (UFSC)

[email protected]

Lizandra Garcia Lupi Vergara (UFSC)

[email protected]

Gabriela Hammes (UFSC)

[email protected]

O trabalho no cargo de chefia é caracterizado pela multiplicidade de

tarefas que muitas vezes competem umas com as outras na esfera

temporal, é uma atividade complexa e variável que demanda

habilidade na comunicação interpessoal e domínio do conhecimento

técnico. O presente artigo traz a Análise Ergonômica do Trabalho

focando na atividade do supervisor de engenharia de uma empresa do

ramo de tecnologia de Florianópolis que levanta como demanda inicial

a constante interrupção de sua equipe e outros atores durante o

desenvolvimento de suas atividades. Essas interrupções foram

analisadas por meio de observações e entrevistas, assim como o

contexto do trabalho e da organização e foram ao final indicadas

possíveis soluções.

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Palavras-chave: Análise Ergonômica do Trabalho, Ergonomia,

Trabalho de Chefia

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1. Introdução

O trabalho dos chefes (coordenadores, líderes, supervisores de um setor, de uma equipe, etc) é

caracterizado pela ampla gama de tarefas que nem sempre são bem definidas, assim como

pela descontinuidade de suas ações e pela importância da comunicação e das relações inter-

humanas (LANGA, 1998, p.99). WISNER (1987) complementa argumentando que as

atividades de chefia são por definição múltiplas e ligadas às variações da situação, tendo em

vista que o chefe atua como um regulador da atividade geral.

Ao coordenar uma equipe o chefe precisa se preocupar com inúmeras questões, como: a

definição dos objetivos que essas pessoas devem atingir; a pertinência dos meios colocados à

sua disposição; os métodos, procedimentos e regras a serem observados; a resolução dos

diferentes problemas e a gestão das interferências de imprevistos diversos; e a avaliação dos

resultados obtidos (LANGA, 1998).

A multiplicidade de atividades que os chefes precisam gerenciar para que todo o sistema

funcione são complexas. De acordo com Vasconcelos et al. (2008) a complexidade é

normalmente associada a atividades com elementos predominantemente cognitivos e que são

desenvolvidas em interação com sistemas de alta tecnologia e processos automatizados, como

nas indústrias de processos contínuos e aeronáutica, ou em atividades criativas que procuram

resolver problemas complexos ou lidam com decisões arriscadas, como os cientistas,

executivos, professores, médicos, engenheiros, etc.

Para Wisner (1987, p.120) a descrição das atividades complexas exige uma metodologia

singular que se apropria de certo número de técnicas, bem como deve “proceder a

aproximações entre os comportamentos observados e as condições e exigências do trabalho, a

fim de permitir as recomendações ergonômicas”. O autor cita alguns instrumentos

metodológicos que auxiliam nessa análise, tais como: verificar os deslocamentos; verificar a

importância e tipo das interrupções; e verificar a importância e orientação das comunicações

verbais.

Dentro desse contexto o presente artigo traz a Análise Ergonômica do Trabalho (AET) da

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atividade do supervisor de uma equipe de desenvolvimento de tecnologia de uma empresa de

Florianópolis. Foi escolhida essa metodologia, pois ela analisa a atividade real do trabalhador

considerando o contexto no qual ele está inserido, ou seja, que leva em conta o que é proposto

para o trabalhador realizar, seu ambiente de trabalho, as condições para que esse trabalho seja

executado e como de fato esse trabalho é executado.

1. Etapas da AET

A Análise Ergonômica do Trabalho tem como objetivo “aplicar os conhecimentos da

ergonomia para analisar, diagnosticar e corrigir uma situação real de trabalho” (IIDA, 2005,

p.61). Buscando compreender o trabalho e assim transformá-lo, a fim de construir soluções

que garantem o bem-estar dos sujeitos e a produtividade da empresa (Guréin et al., 2001). A

AET é estruturada em cinco etapas, sendo elas: análise da demanda, análise da tarefa, análise

da atividade, diagnóstico e recomendações. (Guréin et al., 2001). Este artigo, no entanto,

concentrará maior atenção na etapa de análise da atividade, na qual é possível, por meio da

observação, compreender como o trabalhador gerencia e executa de fato suas tarefas. Na

Tabela 1 é possível visualizar todo o processo desta AET, desde o levantamento inicial até as

recomendações finais.

Tabela 1- Etapas AET na análisa da empresa do ramo de tecnologia

Etapas O que coletou Fonte Objetivo Método Com quem

interagiu

Levantamento

dados empresa

Dados sobre a

empresa.

Empresa, e-

mai, site.

Conhecer o

funcionamento

da empresa.

Entrevista e

levantameto

Diretoria e

supervisor de

engenharia.

Análise da

Demanda

Informações

sobre os

problemas

levantados pela

empresa e pelo

trabalhador.

Diretoria,

supervisor de

engenharia e

dado da

empresa.

Compreenção

de problemas,

levantamento de

dados e

hipoteses.

Entrevista. Diretoria e

supervisor de

engenharia.

Análise da

Tarefa

Descrição da

tarefa prescrita,

ambiente de

trabalho e

equipamentos.

Supervisor de

engenharia.

Levantar dados

sobre as

condições

prescritas de

trabalho.

Entrevista e

questões via

e-mail.

Diretoria e

supervisor de

engenharia.

Análise da

Atividade

Informações de

como as tarefas

eram de fato

realizadas.

Supervisor de

Engenharia.

Compreender o

comportamento

do supervisor e

da equipe

durante o

trabalho.

Observações

e entrevista.

Com todos os

integrantes do

setor de

engenharia e

desenvolvimento

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Diagnóstico e

Recomendações

Integração e

análise das

informações

coletadas

Supervisor de

engenharia,

literatura.

Entrevista e

Análise de

conteúdo.

Supervisor de

engenharia.

Fonte: Autora.

1.1. Levantamentos de dados da empresa

A primeira etapa foi o levantamento de dados da empresa, esta etapa é importante, pois ela

possibilita o conhecimento global do funcionamento da empresa. A empresa estudada tem

como principal atividade desenvolver cursos presenciais e à distância aplicados ao

treinamento de tecnologia para os profissionais liberais e empresas de engenharia que a atuam

no segmento de projetos, especialmente da área da engenharia civil.

Quanto a forma de organização, ela possui um organograma horizontal, sendo que no centro

deste encontram-se os conselheiros administrativos, seguidos da diretoria e posteriormente

dos supervisores dos sete setores da empresa, e, na ultima camada, os demais funcionários. Os

setores são divididos em: engenharia, tecnologia da informação, desenvolvimento, design,

comercial, administrativo e relações humanas. No total, a empresa possui 30 funcionários,

sendo 19 homens e 11 mulheres, com idades entre 20 e 35 anos, assim como um diretor e três

conselheiros administrativos.

Figura 1: Organograma Empresa

Fonte: Autora

2.2 Análise da demanda

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A demanda surgiu quando ao solicitar um pedido de AET no setor Comercial da empresa a

diretoria sugeriu que esta fosse realizada no setor de engenharia na atividade de Supervisor de

Engenharia e colocou alguns pontos que gostaria que fossem analisados, como: maior

desenvolvimento e aplicação da criatividade e inovação; melhoramento de processos (agilizar

o processo de desenvolvimento); expansão da infraestrutura da cadeia de produção.

Portanto, o primeiro passo foi conhecer esse setor e o trabalho do supervisor. O setor de

Engenharia é responsável por elaborar o conteúdo técnico dos cursos e prestar suporte aos

clientes que possuem dúvidas em alguma etapa do curso (as respostas são geralmente via e-

mail), assim como tirar dúvidas do setor comercial referentes ao conteúdo que será

transmitido ao cliente (as dúvidas também são retiradas geralmente pelo sistema de

comunicação interno da empresa). Compõe este setor: o supervisor de engenharia, dois

funcionários efetivos e um estagiário. O supervisor, de forma indireta, também auxilia a

equipe do design, que elabora a interface do curso, este setor é composto por uma supervisora

de design e uma funcionária que é designer (o layout do setor pode ser visualizado na figura

2).

O segundo passo foi a entrevista com o supervisor de engenharia, a fim de compreender o

funcionamento do setor e quais eram as queixas mais significativas. A entrevista ocorreu no

dia 31 de julho de 2014 das 15h40min às 16h20min e foi transcrita e analisada. As queixas

que se sobressaíram nesse primeiro contato foram a respeito das interrupções constantes da

equipe de engenharia que necessitam de orientação e suporte constantes, assim como as

dificuldades em prever atividades não planejadas que acabam atrasando as demais que

estavam em curso. Nessa entrevista foi apontado e aqui será ressaltado que até o ano passado

a equipe era composta em sua maioria por estagiários, o que gerava uma rotatividade muito

grande e o tempo de treinamento não compensava o tempo que o estagiário permanecia na

empresa, como consequência o supervisor era o único detentor do conhecimento e somente

ele era capacitado para realizar novamente esse treinamento, gerando estresse e desgaste.

Então para esse ano (2014) tomou-se a decisão de contratar dois funcionários que ainda estão

em fase de treinamento para diminuir esse problema. A empresa também está passando por

uma fase de crescimento no qual tem o intuito de receber um número maior de projetos, o que

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reforça a necessidade do supervisor delegar funções antes a ele atribuídas aos funcionários.

Como resumo dessa seção é importante apontar:

A demanda colocada pela empresa é: maior desenvolvimento e aplicação da

criatividade e inovação; melhoramento de processos (agilizar o processo de

desenvolvimento); expansão da infraestrutura da cadeia de produção.

A demanda colocada pelo supervisor: a grande quantidade de interrupções da equipe

que acabam atrasando as demais atividades e não permitindo a criação de novos

projetos.

Figura 2: Layout Desenvolvimento

Fonte: Empresa (adaptado pela autora)

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1.2. Análise da tarefa

O terceiro passo foi levantar junto a diretoria e com o supervisor de engenharia quais são as

tarefas prescritas a ele para serem realizadas. Constatou-se que assim como outros cargos de

chefia as tarefas a eles prescritas são extremamente variadas e não possuem uma ordem

específica no âmbito temporal, elas são executadas com certo planejamento, mas não é

estabelecida uma rotina fixa, pois são muitas as situações não planejadas que vão tomando

conta da demanda diária. Na Figura 2 é possível visualizar a lista de tarefas prescritas pela

diretoria ao supervisor de engenharia, inclusive àquelas esporádicas.

Figura 3: Tarefa Prescrita

Tarefa Prescrita (diária) Tarefas Esporádicas

1. Ler, responder e organizar os e-mails recebidos;

2. Orientar a equipe de desenvolvimento de cursos;

3. Desenvolver projetos e seus cronogramas;

4. Controlar o processo de produção de

cursos/produtos;

5. Definir e revisar a aplicação dos padrões

didáticos nos cursos Presenciais e a Distância;

6. Supervisionar o suporte e monitoria aos cursos a

distância;

7. Orientar a equipe nas solicitações de suporte.

7.1. Pesquisa de Opinião / Feedback Cliente;

7.2. Plataforma Moodle - Finalização e Emitir

Certificado;

7.3. Tira-Dúvidas Interno;

7.4. Visualização das Aulas, Biblioteca e Tira-

Dúvida;

1. Atuar no contato e comunicação externa a

professores e terceirizados;

2. Controlar o recebimento e envio de materiais e

recursos externos, ligados a engenharia;

3. Aprovar os releases dos cursos;

4. Revisar tecnicamente as publicidades (Site e E-

mail);

5. Documentar os processos e treinamentos

interno.

Fonte: Empresa (adaptação autora)

1.3. Análise da atividade

Para esse artigo foi escolhida uma demanda a ser analisada nessa etapa: a análise das

interrupções constantes realizadas pelos membros da equipe e demais membros da empresa.

Logo, para compreender a rotina do supervisor, bem como suas dificuldades foram realizadas

três observações e posteriormente uma entrevista, esta sequencia pode ser vista na tabela 2.

Tabela 2: Coleta de dados Atividade

Etapas Local Data/Horário Objetivo

1ªObservação/

interrupções

Setor de

Desenvolvimento;

Data: 13/08/2014

Horário: 14h04 às

Conhecer a rotina, os

tempos, os fluxos e

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16h25 identificar os problemas no

setor.

2ªObservação

/interrupções +

filmagem

Setor de

Desenvolvimento;

Data: 21/08/2014

Horário: 11h10 às

12h54 e das 14h10

às 16h10.

Conhecer a rotina, os

tempos, os fluxos e

identificar os problemas no

setor e analisá-los com

detalhe a partir da filmagem.

2ª Entrevista Sala de reuniões; Data: 28/09/2014

Horário:16h30 às

17h00.

Apresentar o levantamento

realizado nas outras etapas

para esclarecer as dúvidas

levantadas anteriormente.

Fonte: Autora.

Nas observações foi anotado tudo o que ocorria na sala do desenvolvimento, quem estava na

sala, as conversas paralelas, quando alguém da equipe ou o supervisor de engenharia

levantava para tomar café ou resolver algum problema, quando tocava o telefone, etc.

Também foi pedido ao supervisor que anotasse cada tarefa executada, bem como seu início e

fim. Posteriormente essas informações foram descritas em formato de tabela e cada tipo de

interrupção foi categorizada e separada por cores (para demonstrar visualmente a frequência

de cada ação) As categorias são: ligações recebidas; suporte-dúvidas; trabalho no computador;

sons no ambiente de trabalho (conversas paralelas), pausas para café; pausas e entrada e saída

de colegas; ligações efetuadas pelo supervisor ou perguntas feita aos demais integrantes.

Quanto a disposição das colunas: a primeira coluna indica o horário da ação, a segunda

descreve a ação e a terceira é a descrição feita pelo supervisor de engenharia da atividade que

ele estava realizando naquele momento, um exemplo pode ser encontrado na figura 2.

Figura 2: Tabela de observações

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Fonte: Autora.

Foram três dias de observações e pode-se notar, principalmente no primeiro dia, que a cor

vermelha da tabela, que significa interrupções para tirar dúvidas da equipe, predominaram

(das 2h de observações 53 minutos foram ocupados para essa função) e a cor verde que

significa trabalho constante era pouco frequente. Da mesma forma foram os dias

subsequentes, no terceiro dia, por exemplo, além das pausas para dúvidas também houve uma

reunião - que se enquadra dentro das atividades esporádicas - esta durou cerca de 50 minutos.

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Foi observado também que o supervisor prefere fazer seu horário de almoço depois dos

demais, pois ele pode trabalhar tranquilamente durante cerca de uma hora sem interrupções

enquanto os demais estão almoçando.

Com o propósito de quantificar o tempo utilizado para algumas ações, foi feita uma tabela

(tabela 3) na qual podem ser encontrados: o tempo de dúvidas da equipe (dúvidas sobre o

conteúdo, procedimentos, ou a conferência de um texto que precisa passar pelo crivo do

supervisor); as pausas rápidas (perguntas rápidas, pausa para água ou café); o tempo

trabalhado sem interrupções; e a demanda externa (como reuniões não previamente

estabelecidas).

Tabela 3: Resumo Interrupções nas três observações

1ª Observação: 13/08/ 2014 das

14h04 às 16h25

Orientação: 29 Suporte:11 =40min

Pausas atividade = 13min

Horas trabalhadas= 1h04

2ª Observação: 21/08/2014 das

11h10 às 12h54

Orientação: 12 Suporte:0 =12min

Pausas atividade = 4min

Horas trabalhadas= 1h25

3ª Observação: 21/08/2014 das

14h10 às 16h10

Orientação: 04 Suporte:35 =39min

Pausas atividade = 4min

Horas trabalhadas= 24min

Demandas Externas =50min

Fonte: Autora.

Como houveram inúmeras interrupções para dúvidas da equipe surgiu a necessidade de

compreender com mais profundidade a natureza dessas dúvidas. Então foi feita uma entrevista

com o supervisor de engenharia, e foi constatado que existem dois tipos de dúvidas por parte

da equipe: as dúvidas de orientação e as de suporte. As de orientação estão relacionadas a

parte burocrática dos cursos e as de suporte seriam quanto ao conteúdo técnico (dúvidas de

alunos que precisam ser respondidas, mas nem sempre o funcionário tem total certeza ou

conhecimento técnico da resposta).

Esclarecido este ponto, foi perguntado se é responsabilidade do supervisor ajudar nesses casos

e se existia outra pessoa que poderia auxiliá-lo nessa função. Nos dois casos realmente essa

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tarefa faz parte das tarefas prescritas ao supervisor. E quanto a orientação, o supervisor

explicou que assim que os funcionários ganharem experiência essas dúvidas possivelmente

diminuiriam, mas no caso do suporte, por mais que as dúvidas diminuíssem com a

experiência, é imprescindível que ele revise as respostas e certifique que estão corretas (as

respostas dadas aos clientes com dúvidas com relação ao curso).

Outro fator destacado nessa entrevista quanto as interrupções, é que ao analisar a sequencia de

atividades junto com o supervisor foi visto que na segunda observação ele estava respondendo

a um e-mail e quando foi interrompido voltou e iniciou outra tarefa, esquecendo

completamente do e-mail, que só foi respondido no dia seguinte. O supervisor falou que isso

ocorre com frequência e as vezes se está trabalhando em um projeto mais complexo a

possibilidade de ocorrerem erros aumentam nessas condições.

Dentro desse tópico, a título de curiosidade, de acordo com Siewiorek et al. (2007) os seres

humanos tem uma capacidade finita que limita o número de atividades simultâneas que

podem desempenhar, de forma que a eficácia humana é reduzida à medida que novas

atividades são acrescentadas. As interrupções frequentes exigem uma reorientação da atenção

e essa reorientação leva um determinado tempo para ocorrer. Altmann et al. (2014)

complementa argumentando que o controle cognitivo pode agir de variadas formas à uma

interrupção ou uma distração, o autor dá o exemplo de uma conversa que está ocorrendo

eloquentemente e quando esta é inesperadamente interrompida pelo toque de um celular, por

exemplo, o segmento do pensamento pode se perder, levando ao “Onde estávamos mesmo”?

Existem várias pesquisas como as dos dois autores citados que estudam o quanto uma mínima

interrupção pode afetar no desempenho de uma tarefa, levando ao erro, ou ainda como cada

pessoa reage em situações como esta (TRAFTON et al., 2012; BRUMBY et al.,2013 ).

1.4. Diagnóstico e recomendações

O último passo consiste na análise das etapas anteriores, estudando com cuidado cada

situação observada incluindo o contexto no qual o trabalhador está inserido. A priori

observando por um âmbito global a empresa está passando por um período de transição, no

qual está em crescimento e surgiu a necessidade de contratar novos funcionários

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substituindo o esquema que tinham antes que era a contratação de estagiários, o que trazia um

desgaste ainda maior para o supervisor de engenharia que a cada um ano tinha que treinar

novamente seus funcionários. No entanto esses novos funcionários estão ainda em fase de

treinamento e o supervisor continua com o mesmo número de tarefas que anteriormente

estava e precisa lidar com as interrupções. O que foi observado e é relevante ressaltar é que

para suprir essas dúvidas os funcionários podem interromper a qualquer momento o

supervisor, não existindo nenhuma organização ou restrição.

Também foi colocado na demanda inicial pela diretora a intenção de expandir a cadeia de

produção e em entrevista o supervisor também deixou claro que a empresa tinha a intenção de

receber um número maior de projetos, mas com a quantidade de tarefas destinadas a ele não

haveria como desenvolver novos conteúdos. Durante a entrevista e posteriormente via e-mail

foi perguntado ao supervisor se ele iria delegar algumas tarefas aos funcionários assim que

estes estivessem aptos, então ele respondeu que essa era a intenção e repassou uma lista com

as atividades que poderiam ser delegadas. Apontando que o item 7 das tarefas prescritas

diárias e o 2 e 5 das esporádicas seria delegado a um dos funcionários (figura 2). E que o item

3 das tarefas prescritas diárias e o 4 das esporádicas seria parcialmente delegado a um dos

funcionários (figura 2).

Para melhorar as condições de trabalho do supervisor de engenharia durante e após esse

período de transição foram propostas algumas recomendações.

Curto prazo:

Estipular um horário diário para realizar atividades que exigem concentração em uma

sala separada: como foi conversado com o supervisor de engenharia existem horários

propícios dentro da rotina dele que poderão ser separados para essas atividades, tendo

também como objetivo estimular a equipe a buscar soluções, incentivando a pró-

atividade.

Organizar o momento de tirar dúvidas; orientando a equipe a separar as dúvidas e

avisar o supervisor que estas estão separadas, o que dará tempo a ele de terminar o que

está fazendo e ajudar o respectivo funcionário.

Médio Prazo:

Delegar tarefas de suporte e algumas orientações a outros membros da equipe, assim

que esses estiverem aptos para fazê-lo.

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2. Considerações finais

Este estudo trouxe uma Análise Ergonômica do Trabalho realizada em uma empresa de

tecnologia de Florianópolis. A análise foi realizada no cargo de supervisor de engenharia

conforme solicitado pela diretoria da empresa. Este artigo focou na fase de análise da

atividade principalmente voltada para a demanda levantada pelo próprio supervisor: as

interrupções constantes da equipe de trabalho que estavam prejudicando o desenvolvimento

de sua própria atividade e a criação de novos projetos. Para essa pesquisa foram utilizados

como instrumentos metodológicos entrevistas e observações.

A Análise Ergonômica do Trabalho dentro de cada uma de suas etapas permitiu uma

visualização mais nítida dos fatores que estavam impedindo uma maior produtividade do setor

de engenharia. Com a análise da demanda notou-se que a empresa está passando por um

período de crescimento no qual almeja aumentar o número de projetos em desenvolvimento.

No entanto, a medida que foram sendo realizadas as análises da tarefa e principalmente da

atividade (baseadas nas questões levantadas pelo engenheiro de produção como a grande

quantidade de interrupções) pode-se compreender o porque deste desenvolvimento não estar

acontecendo. As interrupções, em sua maioria, eram pedidos de orientação quando a

procedimentos burocráticos ou suporte técnico, estas ocorriam com frequência, pois esses

funcionários ainda estavam em treinamento e o único que poderia fornecer essas informações

a eles era o supervisor de engenharia. Contudo, não foi feita uma organização quanto a como

pedir essas informações, logo eles estavam livres para perguntar a qualquer momento,

interrompendo o trabalho do supervisor, que algumas vezes deixava a tarefa que estava

fazendo pela metade esquecendo-a e partindo para outra.

Como todo trabalho de chefia esse possui múltiplas tarefas a serem executadas sem uma

ordem específica, pois são várias as situações inesperadas que vão tomando conta da rotina.

Logo o planejamento do tempo e a organização das atividades (no caso do horário de tirar

dúvidas) é fundamental principalmente em uma atividade como a do supervisor de engenharia

que necessita de concentração para desenvolver novos conteúdos. Para tanto foram sugeridas

soluções como organizar os horários de dúvidas, ou se não for possível naquele momento

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específico o funcionário deve solicitar anteriormente um momento para tirar essas dúvidas e

assim que o supervisor terminar a tarefa que havia começado, ele responderia as questões,

entre outras sugestões que podem ser encontradas no tópico 2.5 diagnósticos e

recomendações.

3. Referências

ALTMANN, E.M.; TRAFTON, J.G.; HAMBRICK, D.Z. .Momentary Interruptions Can Derail the Train of

Thought. Journal of Experimental Psychology, 2014, Vol. 143, No. 1, 215–226. doi: 10.1037/a0030986.

BRUMBY, D. P., COX, A. L., BACK, J., & GOULD, S. J. J. (2013). Recovering from an interruption:

investigating speed-accuracy trade-offs in task resumption behavior. Journal of Experimental Psychology.

Applied, 19(2), 95–107. doi:10.1037/a0032696

IIDA, I. Ergonomia: Projeto e Produção – 2ª edição ver. E ampl. – São Paulo: Edgard Blücher, 2005.

LANGA, Mbumbu. Análise ergonômica do trabalho da chefia - das verbalizações de ação às verbalizações de

explicação. In Duarte, F.; Feitosa, V. (organizadores). Linguagem e trabalho. Editora Lucerna. Rio de Janeiro

1998.

GUERIN, F.; LAVILLE, A.; DANIELLOU, F.; DURAFFOURG, J.; KERGUELLEN, A.: Compreender o

trabalho para transformá-lo: A prática da Ergonomia. São Paulo. Editora Edgard Blücher. 2001.

SIEWIOREK, D; SMAILAGIC, A; STARNER, T. Human-Computer Interaction Fundamentals Wearable

Computers. Chapter 15. P. 275-276, 2007

TRAFTON, J. G., ALTMANN, E. M., BROCK, D. P., & MINTZ, F. E. (2003). Preparing to resume an

interrupted task: Effects of prospective goal encoding and retrospective rehearsal. International Journal of

Human- Computer Studies, 58, 583–603. doi:10.1016/S1071-5819(03)00023-5.

VASCONCELOS, C.R.; LIMA, P.F.; CAMAROTTO, A.J.; ABREU,S.M.C.A; COUTINHO, S.O.A . Aspectos

de complexidade do trabalho de coletores de lixo domiciliar: a gestão da variabilidade do trabalho na rua.

Gest. Prod., São Carlos, v. 15, n. 2, p. 407-419, maio-ago. 2008. Disponível em:

<http://www.scielo.br/pdf/gp/v15n2/a15v15n2>. Acesso: Setembro, 2014.

WISNER, A..A analise da atividade em trabalhos complexos. In Por dentro do trabalho: ergonomia, método e

técnica. São Paulo, FTD, Oboré, 1987.