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Análise e Discussão dos Conceitos e Legislação Sobre Reuso de Águas Residuárias” por Marcos Roberto Muffareg Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre em Ciências na área de Saúde Pública Orientador: Prof Dr. Odir Clécio da Cruz Roque Rio de Janeiro, Abril/2003

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  • Anlise e Discusso dos Conceitos e Legislao Sobre

    Reuso de guas Residurias

    por

    Marcos Roberto Muffareg Dissertao apresentada com vistas obteno do ttulo de Mestre em Cincias

    na rea de Sade Pblica

    Orientador: Prof Dr. Odir Clcio da Cruz Roque

    Rio de Janeiro, Abril/2003

  • i

    FICHA CATALOGRFICA Catalogao na fonte Centro de Informao Cientfica e Tecnolgica Biblioteca Lincoln de Freitas Filho

    M949a Muffareg, Marcos Roberto

    Anlise e discusso dos conceitos e legislao sobre reuso de guas residurias./ Marcos Roberto Muffareg. Rio de Janeiro : s.n., 2003.

    72p., tab

    Orientador: Roque, Odir Clcio da Cruz Dissertao de Mestrado apresentada Escola Nacional

    de Sade Pblica.

    1.Tratamento de guas Residurias 2.guas

    Residurias - legislao 3.Redes de Esgoto

    CDD - 20.ed. 628.3

  • ii

    DEDICATRIA

    Dedico essa obra ao meu pai,

    Jorge David Muffareg (in memorian)

  • iii

    AGRADECIMENTOS

    A Fundao Oswaldo Cruz, atravs da Escola Nacional de Sade Pblica ENSP pela

    oportunidade.

    Ao meu amigo e orientador Prof. Dr. Odir Clcio da Cruz Roque pela sua magnitude

    enquanto ser humano e por incorporar de forma irretocvel a semntica ORIENTAR.

    A todos os professores da ENSP pela dedicao em repassar os conhecimentos

    necessrios para o embasamento deste trabalho, e em especial ao Prof. Aldo Pacheco

    Ferreira pelo apoio irrestrito.

    Ao Dr. Guilherme Franco Netto pelo apoio, incentivo e compreenso da importncia

    da capacitao tcnica e cientfica.

    A todos os meus companheiros de trabalho e amigos da Diviso de Engenharia de

    Sade Pblica - DIESP, FUNASA-RJ, que me apoiaram e colaboraram para a

    realizao deste trabalho.

    Ao companheiro Eng Sadi Coutinho Filho pelo apoio que me possibilitou superar as

    dificuldades institucionais.

    Ao meu grande mestre Carlos Virglio Napoleo de Miranda.

    Ao Eng Johnny Ferreira dos Santos pelo vasto e importante material gentilmente

    cedido.

    Aos meus colegas de turma Ernesto, Joo, Mrcio, Tatsuo e em especial aos meus

    grandes amigos Lcio Henrique Bandeira e Francisco de Assis Quintieri, elos de uma

    corrente de companheirismo e ajuda mtua.

    Aos funcionrios do Departamento de Saneamento e Sade Ambiental pelo apoio.

    A minha amiga Maria Mrcia Badar Bandeira pela dedicao e carinho com que

    realizou a reviso ortogrfica.

    A todos os meus familiares, em especial a minha me Nbia, que compreenderam os

    momentos da minha ausncia.

    A minha esposa Vera e minha filha Rachel pelo carinho, pacincia e incentivos

    inesgotveis, fora motriz para a concluso deste trabalho.

    A todos que de forma direta ou indireta colaboraram para a realizao deste trabalho.

  • iv

    RESUMO

    Apesar da gua ser considerada um recurso natural renovvel, a mudana dos

    ecossistemas, a dinmica das cidades, a demanda aumentada e diversificada desse

    recurso mineral nos alerta para sua eminente escassez como fonte de manuteno da

    vida, seja nas atividades produtivas, agropastoris e at mesmo para o abastecimento

    pblico.

    No Brasil, antes de abordarmos a questo do reuso de gua, importante nos

    darmos conta do enorme dficit de cobertura de sistemas de esgotos sanitrios, com o

    devido tratamento, adequado aos corpos receptores. Esse dficit alm contribuir para a

    deteriorao dos nossos corpos hdricos, interferir na sade pblica, vem cada vez mais,

    devido ao alto custo no tratamento da gua para abastecimento, se transformando em

    um fator econmico de extrema relevncia.

    Essa demanda por gua tem levado os diversos pases a se preocupar alm da

    proteo dos seus mananciais a aprofundar estudos sobre reuso das guas servidas. Em

    todo o mundo, atualmente, esto sendo desenvolvidos vrios estudos e revisando vrias

    normas, diretrizes e legislaes referentes a reuso de guas residurias.

    Pretende-se com esse trabalho, discutir o conceito do reuso de guas, apresentar

    algumas experincias exitosas pelo mundo e levantar normas e legislaes existentes no

    Brasil e em vrios pases, a fim de contribuir na construo de um pensar integrado

    sobre o reuso, que por fim v ao encontro dos esforos existentes para construo de

    uma legislao especfica sobre o reuso de guas residurias.

    Palavras Chave: Reuso de guas residurias; Tratamento de esgotos sanitrios;

    Legislao sobre reuso

  • v

    ABSTRACT

    Despite the water be consider a renewable natural resource, the ecosystem

    change, the dynamics of the cities, the demand increased and diversified of this mineral

    resort alert us for its eminent scarcity as spring of life maintenance, be in the productive

    activities, cattle maintenance and to even for the public supplying.

    In Brazil, before of developing the subject of water reuse, it is important to take

    into account the huge sanitary sewers systems cover deficit, with the suitable handling,

    appropriate to the water bodies receivers. This deficit not only contributes for the water

    courses deterioration, but also interferes in the public health, and comes even more, due

    to the high cost in the treating water system for public supplying, being transformed in

    an economic factor of extreme relevance.

    This water demand has lead several countries to be concerned, beyond its water

    reserve protection, to implement studies about reuse of wastewater. In the world, at

    present, are being developed many studies, norms, directives and legislation aiming the

    wastewater reuse.

    Its intended with this dissertation, discuss the concept of the water reuse,

    present some successful experiences around the world and raise norms and existing

    legislation in Brazil and in several countries, in order to contribute in the construction of

    an integrated think about the reuse, that finally goes of meeting to the existing efforts

    for construction of an specific legislation about the wastewater reuse.

    Key words: Wastewater Reuse; Treatment of Sanitary Sewers; Legislation of Reuse

  • vi

    NDICE DE FIGURAS PG Figura 01 Remoo de Coliformes Fecais nas Lagoas de Estabilizao de San Juan 27 Figura 02 Projeto Aqicultura de San Juan - Qualidade Sanitria dos Peixes 28

  • vii

    NDICE DE QUADROS PG Quadro 01 Cobertura com Sistemas Pblicos de Abastecimento de gua 06 Quadro 02 Coberturas com Sistemas Pblicos de Esgotamento Sanitrio 07

  • viii

    NDICE DE TABELAS PG Tabela 01 Principais Caractersticas Fsicas dos Esgotos Domsticos 10 Tabela 02 Principais Caractersticas Qumicas dos Esgotos Domsticos 11 Tabela 03 Principais Caractersticas Quantitativas Qumicas e Fsicas dos Esgotos Domsticos 12 Tabela 04 Principais Caractersticas Biolgicas dos Esgotos Domsticos 13 Tabela 05 Microrganismos presentes nos Esgotos Domsticos 13 Tabela 06 Parmetros Mdios de Qualidade de gua Industrial 20 Tabela 07 Produo do Feijo Panamito 29

    Tabela 08 Evoluo Histrica da Legislao sobre reuso de guas residurias 31 Tabela 09 Critrios de Qualidade para Irrigao com guas Residurias Tratadas 36 Tabela 10 Diretrizes da OMS para Utilizao de guas Residurias Tratadas na Agricultura 62 Tabela 11 Diretrizes Revisadas de Microbiologia Recomendadas para Utilizao de guas Residurias na Agricultura 64

  • ix

    NDICE GERAL DE ASSUNTOS PG

    FICHA CATALOGRFICA i

    DEDICATRIA ii

    AGRADECIMENTOS iii

    RESUMO iv

    ABSTRACT v

    NDICE DE FIGURAS vi

    NDICE DE QUADROS vii

    NDICE DE TABELAS viii

    NDICE GERAL DE ASSUNTOS ix

    1 INTRODUO 01

    2 OBJETIVOS DA DISSERTAO 04

    2.1 Objetivos Gerais 04

    2.2 Objetivos Especficos 04

    3 REVISO DE LITERATURA: ASPECTOS METODOLGICOS 05

    3.1 Demanda por Sistemas e Tratamento de Esgotos 05

    3.2 Principais Caractersticas dos Esgotos 10

    3.3 Conceituao de Reuso de gua 14

    3.4 Experincias de Reuso de guas Residurias 18

    3.5 Normas e Legislaes Existentes pelo Mundo 30

    3.6 Legislao existente no Brasil 49

    4 RESULTADOS 61

    4.1 Novas Tendncias 61

    5 CONCLUSO 68

    6 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 72

  • 1

    1 - INTRODUO

    O reuso da gua para fins no potveis foi impulsionado em todo mundo nas

    ltimas dcadas, devido a crescente dificuldade de atendimento da demanda de gua

    para os centros urbanos e algumas localidades no meio rural, pela escassez cada vez

    maior de mananciais prximos e/ou de qualidade adequada para abastecimento aps

    tratamento convencional. Com a poltica do reuso, importantes volumes de gua potvel

    so poupados, usando-se gua de qualidade inferior, geralmente efluentes secundrios

    ps-tratados, para atendimento das finalidades que podem prescindir da potabilidade.

    As imagens mais comuns associadas ao reuso da gua so normalmente quelas

    ligadas ao abastecimento domstico, industrial e agrcola. O reuso da gua, entretanto,

    afeta outras utilizaes do recurso hdrico, como a da diluio dos despejos nos cursos

    dgua receptores, o uso de mananciais para abastecimento, a navegao, as atividades

    recreacionais, a pesca, e mesmo a gerao de energia eltrica. Torna-se assim

    recomendvel que o reuso da gua seja abordado sob a tica do uso mltiplo dos

    recursos hdricos.

    So muitas as formas e configuraes de reuso da gua. A seleo de uma

    determinada alternativa deve considerar seus efeitos locais e sobre as regies vizinhas,

    em cenrios atual e estimado para o futuro. Os impactos sociais, ambientais e

    econmicos, positivos e negativos do reuso planejado, devem ser criteriosamente

    avaliados para que a proposta se aproxime da tima na explorao do recurso hdrico.

    A forma de reuso pode ocasionar importantes alteraes na qualidade e na

    quantidade das guas, bem como na morfologia dos corpos dgua devido a mudanas

    no regime de transporte da descarga slida nestes cursos.

    A transposio do recurso hdrico entre bacias hidrogrficas pode s vezes gerar

    conflitos entre as necessidades dos usurios das bacias afetadas, trazendo para a bacia

    importadora, como a da Regio Metropolitana de So Paulo (RMSP), por exemplo, a

    necessidade de captar mananciais adequados cada vez mais distantes do plo

    consumidor (ABES, 1992).

    Por outro lado, a bacia exportadora do recurso hdrico tem sua oferta para

    consumo local diminuda, com eventuais prejuzos para manuteno de sua qualidade de

  • 2

    vida. O reuso das guas surge como forma de minimizar, ou mesmo evitar, estes

    conflitos.

    Um programa de reuso da gua no pode prescindir de informaes confiveis a

    respeito das caractersticas quantitativas e qualitativas do recurso hdrico, alvo do

    estudo, tanto o superficial como o subterrneo. Devem ser avaliadas as demandas de

    gua, as cargas poluidoras afluentes aos cursos d'gua e a autodepurao que eles

    possam promover (ABES, 1992).

    As variveis qualitativas e quantitativas significativas devem ser selecionadas e

    monitoradas com uma freqncia e durao satisfatrias. A confiabilidade destas

    informaes aumenta com a extenso das sries histricas de dados, fato importante a

    considerar no dimensionamento e na operao das redes de monitoramento (ABES,

    1992).

    A gua pura mercadoria rara. E o desperdcio a prtica comum. De toda a

    gua do planeta, apenas seis por cento servem ao consumo humano. Estima-se que no

    sculo XXI a gua ser produto escasso em diversos pases, pelo aumento do consumo

    domstico, na agricultura e na indstria (Jornal O GLOBO, 08 de maio de 1992, pg 16).

    Dentre os principais fatores que afetam o reuso da gua, alm da qualidade e da

    quantidade para os diversos fins, esto as normas e a legislao adequadas de reuso,

    ainda no discutidos no Brasil at o momento. Faz-se necessrio fomentar uma ampla

    discusso sobre reuso no nosso pas que contemple as finalidades, propostas de reduo

    de tarifas, lugares prioritrios, estudos e locais onde programas estejam em andamento.

    Para concretizar e alavancar, principalmente em cidades e municpios brasileiros

    programas com essas finalidades, essa dissertao levanta os dados de necessidade de

    gua para o consumo humano disponveis em alguns pases do chamado mundo

    desenvolvido, comparando esses resultados com dados brasileiros, evidenciando que,

    apesar de existir percentual significativo de gua em terras brasileiras, existem

    necessidades localizadas de economia de gua nas principais cidades brasileiras.

    Aborda, tambm, a demanda por tratamento dos esgotos domsticos e industriais ,

    reconhecendo os investimentos recentes em saneamento e chamando ateno para o

    desafio que o enorme dficit atual ir desafiar tcnicos e gestores do setor.

    Por outro lado ao se reconhecer esta necessidade, verifica-se que h esforos

    em estados como So Paulo, Esprito Santo, Rio Grande do Sul, Cear, Rio Grande do

  • 3

    Norte, Pernambuco, dentre outros, de reutilizao e reciclagem de gua pela prpria

    qualidade da gua de captao, que j no oferece condies de tratamento por

    processos convencionais. Pode-se citar o exemplo do Rio Guandu, responsvel pelo

    abastecimento de nove milhes de pessoas no Grande Rio de Janeiro que est sob forte

    ameaa de transformar-se dentro de cinco anos a semelhana do Tiet, rio que percorre

    o estado de So Paulo e chegou a um nvel to alto de poluio que sua gua no pode

    ser mais tratada. A previso de tcnicos da Universidade Federal do Rio de Janeiro

    (UFRJ) e da Companhia Estadual de guas e Esgotos do Estado do Rio de Janeiro

    (CEDAE), de que, se nada for feito para baixar os nveis de poluio e degradao do

    Rio Paraba do Sul, contribuinte fundamental do rio Guandu, dentro de cinco anos se

    tornar invivel a captao de gua para consumo humano (Jornal O GLOBO, 12 de

    janeiro de 2003, pg 32).

    Apesar dos exemplos acima citados no h normas e legislao ou mesmo

    propostas que incentivem processos de reuso ou reciclagem sendo este um dos objetivos

    deste trabalho.

    Seguindo uma metodologia que primeiramente levanta as demandas por

    tratamentos de esgotos e caracteriza os efluentes sanitrios, esta dissertao procura, em

    um segundo momento, apresentar uma conceituao atual sobre reuso e as principais

    normas e legislaes j em andamento em alguns pases levantados e ainda apontar uma

    proposta para discusso do caso brasileiro.

  • 4

    2 OBJETIVOS DA DISSERTAO

    2.1- Objetivos Gerais:

    Os objetivos gerais deste trabalho consistem em levantar as demandas de gua

    para consumo humano e tratamento de esgotos sanitrios no Brasil, apresentar o

    conceito de reuso de guas residurias e conhecer as diversas experincias exitosas pelo

    mundo, de forma a contribuir para o incremento do pensar e de mudana de paradigmas

    sobre o reuso de guas.

    2.2- Objetivos Especficos:

    Os objetivos especficos desse trabalho sero, a partir do conhecimento das

    demandas de cobertura por sistemas de esgotamento sanitrio, da conceituao de reuso,

    da legislao levantada em diversos pases, contribuir para o incremento de subsdios na

    construo de uma legislao prpria e adequada reuso dos efluentes, para a realidade

    brasileira.

  • 5

    3 - REVISO DA LITERATURA: ASPECTOS METODOLGICOS

    3.1 Demanda por Sistemas e Tratamento de Esgotos

    Na Regio da Amrica Latina e Caribe, 49% da populao tem servio de

    esgotamento sanitrio, coletando-se diariamente 40 milhes de metros cbicos de guas

    residurias que se vertem nos rios, lagos e mares. A previso para o ano 2.000 seria a de

    se estar recolhendo cerca de 100 milhes de metros cbicos de desges que agravariam

    ainda mais a contaminao. Desse volume coletado pelos sistemas de esgotamento

    sanitrio, menos de 10% recebem tratamento prvio antes de ser descarregado a um

    corpo receptor de gua superficial ou antes de seu uso para a rega direta de produtos

    agrcolas.

    Estima-se que nessa Regio existem 215 cidades costeiras com mais de 100.000

    habitantes; 76 destas conformam uma populao de 58 milhes de habitantes, localizada

    ao longo da costa marinha ou de esturios. A descarga dessas guas residurias sem

    nenhum tratamento contaminam as praias de uso recreacional e os produtos

    hidrobiolgicos que crescem nas reas circunvizinhas.

    A disposio de guas residurias, sem tratamento prvio, nas guas superficiais

    afeta seu uso posterior. Muitos dos rios e lagos utilizados como fontes de abastecimento

    de gua tm altos nveis de contaminao microbiolgica; 16 rios da Amrica superam

    os 1.000 coliformes fecais/100ml e o nvel de risco a que est exposta a populao alto

    se considerarmos que menos de 50% dos servios de abastecimento de gua produz

    gua desinfectada.

    Essas mesmas guas superficiais so utilizadas para a rega de cultivos agrcolas

    para consumo humano, o que aumenta os fatores de risco para a sade da populao. As

    situaes endmicas de diarrias, parasitos, febre tifide e salmoneloses que imperam

    desde o Rio Grande at o Cone Sul, no so mais do que reflexo dessa situao crtica, a

    que veio se somar a clera, nesta poca (OPS/CEPIS, 1996).

    Estes dados no so diferentes no Brasil. De acordo com o Censo 2.000 - IBGE,

    o pas apresenta hoje um total de 44,7 milhes de domiclios particulares permanentes.

    Desse total, 37,3 milhes esto nas cidades e 7,4 milhes na rea rural. Em termos de

  • 6

    moradores desses domiclios permanentes, o Censo 2.000 constata uma populao

    brasileira de 168,3 milhes. Desse total, 137 milhes moram nas cidades e 31,3 milhes

    vivem no meio rural.

    O Censo, de 2.000, Quadro 1, revela que os sistemas pblicos de abastecimento

    de gua cobrem 89,4% dos domiclios urbanos brasileiros, equivalente a 89,1% da

    populao urbana. Embora tenha havido um progresso marcante em relao a 1.970,

    quando a cobertura era de apenas 45%, existem ainda 14,9 milhes de brasileiros em

    centros urbanos sem acesso a esse servio.

    No meio rural, onde residem aproximadamente 31,3 milhes de brasileiros ou

    18,6% da populao, a situao mais grave, uma vez que 25,8 milhes, ou seja, 82,4%

    da populao rural, no tm acesso aos sistemas pblicos, embora deva se considerar,

    que uma parcela dessa populao esteja dispersa no meio rural, dispondo de solues

    individuais de abastecimento. No que se refere ao nmero de domiclios ligados a rede

    geral, os contrastes entre reas urbanas e rurais tornam-se ainda mais evidentes pois

    contrapem coberturas de 89,4% em reas urbanas contra 17,6% nas rurais.

    Quadro 1 Cobertura com sistemas pblicos de abastecimento de gua

    SITUAO

    TOTAL TOTALTOTAL % TOTAL % TOTAL % TOTAL %

    URBANO 37,3 33,5 89,8 3,8 10,2 137 122,1 89,1 14,9 10,9RURAL 7,4 1,3 17,6 6,1 82,4 31,3 5,5 17,6 25,8 82,4TOTAL 44,7 34,8 77,9 9,9 22,1 168,3 127,6 75,8 40,7 24,2

    NO ATENDIDOS

    DOMICLIOS(em 1.000.000 de domiclios)

    ATENDIDOSNO

    ATENDIDOS

    MORADORES(em 1.000.000 de moradores)

    ATENDIDOS

    Fonte: IBGE CENSO2.000

    De acordo com a Pesquisa Nacional de Saneamento Bsico PNSB-2.000 (IBGE), no Brasil, existe a distribuio de gua por rede geral em 8.656 distritos, em

    5.391 municpios, atravs de 30,5 milhes de ligaes prediais, sendo que 25 milhes

    dessas ligaes possuem medidores. De toda essa gua distribuda populao

    brasileira, a maior parte (75% do volume total) recebeu tratamento convencional. Entre

    1.989 e 2.000, as estaes de tratamento de gua passaram de 2.485 para 4.560 unidades

    de tratamento convencional e no-convencional.

  • 7

    O Censo 2.000 constatou que dos municpios com menos de 30.000 habitantes,

    somente 55,6% tm atendimento de servios de abastecimento de gua e dentre aqueles

    acima de 30.000 chega a 83,7%. A PNSB evidenciou que ainda existem 116 municpios

    sem nenhum servio de abastecimento de gua por rede geral.

    Os ndices de cobertura de sistemas de saneamento disponveis denunciam um

    quadro sanitrio preocupante. No entanto, a abordagem quantitativa, alm de

    insuficiente, no permite considerar deficincias tcnicas e operacionais dos sistemas,

    capazes de comprometer a qualidade dos servios oferecidos, representando riscos

    sade das populaes atendidas.

    A coleta e a disposio final de esgotos sanitrios tambm reproduz a

    desigualdade de acesso aos servios verificadas em abastecimento de gua, e apresenta

    um quadro ainda mais negativo.

    Com relao ao esgotamento sanitrio e ainda segundo o Censo 2.000, 36,2

    milhes de domiclios urbanos permanentes possuem algum tipo de banheiro ou

    sanitrio e desses, 20,9 milhes esto ligados rede pblica de esgotos. Na rea rural,

    somente 4,8 milhes de domiclios tm algum tipo de banheiro ou sanitrio e apenas

    246,7 mil esto conectados rede pblica de esgotos. No meio urbano, 5,9 milhes de

    domiclios e no meio rural, 715 mil usam fossa sptica. O restante dos domiclios

    brasileiros, cerca de 15 milhes, lana os esgotos em fossa rudimentar, vala, rio, lago,

    mar ou outros escoadouros. Nas cidades, 1,1 milho de moradias e no meio rural, 2,6

    milhes no possuem nenhum tipo de banheiro ou sanitrio. Para o Censo 2.000,

    somente 31,6% dos municpios, com populao menor que 30.000 habitantes, tm

    atendimento de servios de esgotamento sanitrio. Dentre aqueles com mais de 30.000

    habitantes, o atendimento chega a 69,8 %.

    Quadro 2 Cobertura com sistemas pblicos de esgotamento sanitrio

    SITUAO

    TOTAL TOTALTOTAL % TOTAL % TOTAL % TOTAL %

    URBANO 37,3 19,1 51,2 18,2 48,8 137 73,7 53,8 63,3 46,2RURAL 7,4 0,34 4,6 7,06 95,4 31,3 0,96 3,1 30,3 96,9TOTAL 44,7 19,44 43,5 25,2 56,5 168,3 74,7 44,4 93,6 55,6

    ATENDIDOSNO

    ATENDIDOSNO

    ATENDIDOS ATENDIDOS

    DOMICLIOS MORADORES(em 1.000.000 de domiclios) (em 1.000.000 de moradores)

    Fonte: IBGE Censo 2.000

  • 8

    Segundo a PNSB, somente 52,2% dos 5.507 municpios brasileiros, em 2.000, eram servidos por algum sistema coletivo de esgotamento sanitrio. Atualmente, 47,8%

    do total de municpios brasileiros no tm coleta de esgoto. Dentre os distritos

    brasileiros que coletam o esgoto, somente 33,8% fazem o tratamento, enquanto 66,2 %

    no tratam de forma alguma. Do total de distritos que no tratam os esgotos coletados, a

    grande maioria (84,6%) lanam nos rios. Desta forma, comprometem a qualidade da

    gua para o abastecimento humano, indstria, irrigao e recreao.

    Quanto ao nmero de moradores atendidos pelo esgotamento sanitrio, foi

    identificado que 132,7 milhes de moradores urbanos (96,9% da populao urbana)

    tinham algum tipo de banheiro ou sanitrio, sendo que desses, somente 73,7 milhes

    (53,8/o da populao urbana) so atendidos por rede geral de esgoto (rede pblica, da

    rua). Na rea rural, a situao mais grave, pois s 19,5 milhes de moradores (64,7%

    da populao rural) possuem algum tipo de banheiro ou sanitrio e apenas 962 mil

    moradores (3,l%) so atendidos por rede geral de esgoto e 2,7 milhes por fossa sptica.

    O restante da populao rural, ou seja, 27,6 milhes de pessoas, usam alternativas

    inadequadas para esgotamento sanitrio, como fossa rudimentar, vala, rio, mar, lago e

    outros escoadouros.

    Esta situao geral do pas reflete-se, indiscutivelmente, na sade da populao

    que padece por doenas causadas pela ausncia de saneamento, tornando-se ineficazes

    as aes de sade, principalmente a nvel local (Heller et al, 1997).

    Alm disso, mesmo em municpios que tratam seus esgotos dentro deste

    pequeno percentual, atendem apenas a uma parte da populao; muitas vezes as

    eficincias deixam a desejar e, problemas de operao e manuteno so constantes

    (Barros et al., 1995).

    No Brasil, quando no h uma soluo coletiva, a opo geralmente passa pela

    utilizao do tanque sptico com sumidouro e, em grande parte, lanamentos dos

    efluentes sobre o solo (Roque, 1997).

    Apesar da larga experincia com a utilizao de tanques spticos, as condies

    operacionais conforme j citado, so usualmente deficientes, devido falta de anlise

    dos projetos e de acompanhamento da execuo e da operao dos mesmos (Andrade

    Neto, 1997). Em conseqncia, embora muito aplicado e teoricamente uma soluo

    sanitariamente satisfatria (FUNASA, 1999), a maioria apresenta problemas de

  • 9

    funcionamento e no cumprem as suas finalidades de tratamento e disposio correta de

    esgotos (Chernicharo, 1997).

    Por outro lado , cerca de 80% das guas de abastecimento utilizadas por uma

    populao, retornam na forma de esgotos, que sem tratamento provocam a poluio do

    solo e contaminao das guas de superfcie e subterrneas, alm de diminuir a oferta de

    gua para consumo humano. Portanto urge que se estabelea nova conscincia de no

    somente tratar os esgotos, mas tambm, da reutilizao da guas tratadas como forma de

    enfrentar a escassez de gua para abastecimento de populaes.

    Neste sentido, os processos de tratamento bem como os sistemas devem atender

    as caractersticas brasileiras econmico-financeiras, de operao e manuteno onde se

    constata a necessidade de no somente tratar esgotos, mas a necessidade de conjugar

    baixos custos de implantao e operao, simplicidade operacional, ndices mnimos de

    mecanizao e sustentabilidade do sistema como um todo (Roque, 1997).

    Desta forma as seguintes alternativas, dentre outras, devem ser consideradas

    (Chernicharo, 1997):

    Sistemas individuais de tratamento e disposio de excretas e esgotos.

    Fossa seca, nas suas diversas modalidades.

    Tanque sptico + infiltrao no solo.

    Tanque sptico + filtro anaerbio.

    Tanque sptico + filtro anaerbio seqencial (tipo Cynamon, 1986)

    Sistemas coletivos de tratamento de esgotos.

    Lagoas de estabilizao.

    Aplicaes no solo.

    Reator anaerbio de manta de lodo

    Sob o ponto de vista de custos em geral e eficincias desejveis, as solues

    coletivas apresentadas atendem, em maior ou menor grau, aos principais requisitos que

    devem ser observados num estudo tcnico-econmico de escolha de alternativas (von

    Sperling, 1995; Lettinga & Handel, 1995; Chernicharo, 1997):

    Baixo custo de implantao;

    Elevada sustentabilidade do sistema, relacionada a pouca dependncia de

    fornecimento de energia, de peas e equipamentos de reposio, etc.

    Simplicidade operacional, de manuteno e de controle;

  • 10

    Baixos custos operacionais;

    Pouco ou nenhum problema com a disposio do lodo gerado na estao;

    Dependendo da soluo, baixos requisitos de rea;

    Existncia da flexibilidade em relao a expanses futuras e ao aumento da

    eficincia;

    Possibilidade de aplicao em pequena escala;

    Fluxograma simplificado de tratamento;

    Ausncia de problemas que causem transtorno populao vizinha;

    Possibilidade de reuso das guas tratadas;

    3.2 - Principais Caractersticas dos Esgotos

    Os esgotos domsticos contm aproximadamente 99,9 % de gua. A frao

    restante inclui slidos orgnicos e inorgnicos, suspensos e dissolvidos, bem como

    microrganismos. Portanto, devido a essa frao de 0,1% que h necessidade de se

    tratar os esgotos (Jordo & Pessoa, 1995).

    Os esgotos se caracterizam pela utilizao a que a gua foi submetida. Esses

    usos, e a forma com que so exercidos, variam com o clima, situao social e

    econmica, e hbitos da populao.

    De forma a se ter parmetros de qualidade, as tabelas 1 e 2 apresentam as

    principais caractersticas fsicas e qumicas dos esgotos domsticos, a tabela 3 os

    valores quantitativos, as tabelas 4 e 5 as caractersticas biolgicas.

    Tabela 1 Principais caractersticas fsicas dos esgotos domsticos Parmetro Descrio

    Temperatura

    Ligeiramente superior da gua de abastecimento - Variao conforme as estaes do ano (mais estvel que a temperatura do ar) - Influncia na atividade microbiana - Influncia na solubilidade dos gases - Influncia na viscosidade do lquido

    Cor - Esgoto fresco: ligeiramente cinza - Esgoto Sptico: cinza escuro ou preto

    Odor

    - Esgoto fresco: odor oleoso, relativamente desagradvel - Esgoto sptico: odor ftido (desagradvel), devido ao gs sulfdrico e a outros produtos da decomposio - Despejos Industriais: odores caractersticos

    Turbidez - Causada por uma grande variedade de slidos em suspenso - Esgotos mais frescos ou mais concentrados geralmente maior turbidez Fonte: von Sperling, 1995; adaptado de Qasim, 1985

  • 11

    Tabela 2 Principais caractersticas qumicas dos esgotos domsticos Parmetro Descrio SLIDOS TOTAIS Em suspenso - Fixos - Volteis Dissolvidos - Fixos - Volteis Sedimentveis

    Orgnicos e inorgnicos: suspensos e dissolvidos; sedimentveis - Frao dos slidos orgnicos e inorgnicos que no so filtrveis (no dissolvidos) - Componentes minerais, no incinerveis, inertes, dos slidos em suspenso - Componentes orgnicos dos slidos em suspenso. - Frao dos slidos orgnicos e inorgnicos que so filtrveis. Normalmente

    considerados com dimenso inferior a 10-3 - Componentes minerais dos slidos dissolvidos. - Componentes orgnicos dos slidos dissolvidos. - Frao dos slidos orgnicos e inorgnicos que sedimenta em 1 hora no cone Imhoff. Indicao aproximada da sedimentao em um tanque de decantao

    MATRIA ORGNICA Determinao Indireta DBO5 DQO DBO ltima Determinao direta COT

    Mistura heterognea de diversos compostos orgnicos. Principais componentes: protenas carboidratos e lipdios - Demanda Bioqumica de Oxignio. Medida a 5 dias, 20 C. est associada frao biodegradvel dos componentes orgnicos carbonceos. uma medida do oxignio consumido aps 5 dias pelos microrganismos na estabilizao bioqumica da matria orgnica. - Demanda Qumica de Oxignio. Representa a quantidade de oxignio requerida para estabilizar quimicamente a matria orgnica carboncea. Utiliza fortes agentes oxidantes em condies cidas. - Demanda ltima de Oxignio. Representa o consumo total de oxignio, ao final de vrios dias, requerido pelos microorganismos para a estabilizao bioqumica da matria orgnica. - Carbono Orgnico Total. uma medida direta da matria orgnica carboncea determinado atravs da converso do carbono orgnico a gs carbnico.

    NITROGNIO TOTAL Nitrognio orgnico Amnia Nitrito Nitrato

    O nitrognio total inclui o nitrognio orgnico, amnia, nitrito e nitrato. um nutriente indispensvel para o desenvolvimento dos microrganismos no tratamento biolgico. O nitrognio orgnico e a amnia compreendem o denominado Nitrognio Total Kjeldahl(NTK) - Nitrognio na forma de protenas, aminocidos e uria - Produzida como primeiro estgio da decomposio do nitrognio orgnico - Estgio intermedirio da oxidao da amnia. Praticamente ausente no esgoto bruto - Produto final da oxidao da amnia. Praticamente ausente no esgoto bruto

    FSFORO Fsforo orgnico Fsforo inorgnico

    - O fsforo total existe na forma orgnica e inorgnica. um nutriente indispensvel no tratamento biolgico - Combinado matria orgnica. - Ortofosfato e polifosfatos.

    pH

    Indicador das caractersticas cidas ou bsicas do esgoto. Uma soluo neutra em pH 7. Os processos de oxidao biolgica normalmente tendem a reduzir o pH.

    ALCALINIDADE Indicador da capacidade tampo do meio (resistncia s variaes do pH). Devido presena de bicarbonato, carbonato e on hidroxila (OH-).

    CLORETOS Provenientes da gua de abastecimento e dos dejetos humanos

    LEOS E GRAXAS Frao da matria orgnica solvel em hexanos. Nos esgotos domsticos, as fontes so leos e gorduras utilizados nas comidas

    Fonte: von Sperling, 1995;adaptado de Arceivala, 1981; Qasim, 1985; Metcalf & Eddy, 1991

  • 12

    Tabela 3 Principais caractersticas quantitativas qumicas e fsicas dos esgotos domsticos

    Contribuio per capita (g/hab.d) - Concentrao Parmetro Faixa Tpico Unidade Faixa Tpico SLIDOS TOTAIS Em suspenso - Fixos - Volteis Dissolvidos - Fixos - Volteis Sedimentveis

    120 220 35 70 7 14 25 60 85 150 50 90 35 60 -

    180 60 10 50 120 70 50 -

    mg/l mg/l mg/l mg/l mg/l mg/l mg/l ml/l

    700 1350 200 450 40 100 165 350 500 900 300 550 200 350 10 - 20

    1100 400 80 320 700 400 300 15

    MATRIA ORGNICA Determinao Indireta DBO5 DQO DBO ltima Determinao direta COT

    40 60 80 130 60 90 30 60

    50 100 75 45

    mg/l mg/l mg/l mg/l

    200 500 400 800 350 600 170 350

    350 700 500 250

    NITROGNIO TOTAL Nitrognio orgnico Amnia Nitrito Nitrato

    60 112,0 2,5 5,0 3,5 7,0 =0 0,0 0,5

    8,0 3,5 4,5 =0 =0

    mgN/l mgN/l mgNH3-N/l mgNO2-N/l mgNO3-N/l

    35 70 15 30 20 40 =0 0 2

    50 20 30 =0 =0

    FSFORO Fsforo orgnico Fsforo inorgnico

    1,0 4,5 0,3 1,5 0,7 3,0

    2,5 0,8 1,7

    mgP/l mgP/l mgP/l

    5 25 2 8 4 17

    14 4 10

    PH - - - 6,7 7,5 7,0 ALCALINIDADE 20 30 25 mgCaCO3/l 110 170 140 CLORETOS 4 8 6 mg/l 20 50 35 LEOS E GRAXAS 10 30 20 mg/l 55 170 110 Fonte: von Sperling, 1995; adaptado de Arceivala, 1981, Pessoa & Jordo ,1982; Qasim, 1985; Metcalf & Eddy, 1991

  • 13

    Tabela 4 Principais caractersticas biolgicas dos esgotos domsticos

    Microorganismo Descrio Bactrias

    - Organismos protistas unicelulares - Apresentam-se em vrias formas e tamanhos - So os principais responsveis pela estabilizao da matria orgnica. - Algumas bactrias so patognicas causando principalmente doenas

    intestinais

    Fungos

    - Organismos aerbios, multicelulares, no fotossintticos, heterotrficos. - Tambm de grande importncia na decomposio da matria orgnica. - Podem crescer em condies de baixo PH.

    Protozorios

    - Organismos unicelulares sem parede celular. - A maioria aerbia ou facultativa - Alimentam-se de bactrias, algas e outros microorganismos - So essenciais no tratamento biolgico para a manuteno de um

    equilbrio entre os diversos grupos. - Alguns so patognicos

    Vrus

    - Organismos parasitas, formados pela associao de material gentico (DNA ou RNA) e uma carapaa protica.

    - Causam doenas e podem ser de difcil remoo no tratamento da gua ou do esgoto

    . Helmintos

    - Animais superiores - Ovos de helmintos presentes nos esgotos podem causar doenas.

    Fonte: Silva & Mara, 1979; Tchobanoglous & Schroeder, 1985; Metcalf & Eddy, 1991

    Tabela 5 Microrganismos presentes nos esgotos domsticos brutos

    Microorganismos Contribuio per capita (org/hab.d) Concentrao (org/100ml)Bactrias totais Coliformes totais Coliformes fecais Estreptococos fecais Cistos de protozorios Ovos de helmintos Vrus

    1012 1013 109 1012 108 1011 108 109

  • 14

    de doenas. Este fato no gera um impacto biota do corpo dgua em si, mas afeta

    alguns dos usos preponderantes a ele destinados, tais como abastecimento dgua

    potvel, balneabilidade, reutilizao da gua para diversos fins (von Sperling, 1996).

    , portanto, de fundamental importncia o conhecimento do comportamento dos

    agentes transmissores de doenas em um corpo dgua, a partir do seu lanamento at

    os locais de utilizao.

    3.3 - Conceituao de Reuso de gua

    Em 1958, o Conselho Econmico e Social das Naes Unidas estabeleceu uma

    poltica de gesto para reas carentes de recursos hdricos, que suporta este conceito:

    a no ser que exista grande disponibilidade, nenhuma gua de boa qualidade deve ser

    utilizada para usos que toleram guas de qualidade inferior (Revista BIO, 2001).

    De uma maneira geral, o reuso da gua pode ocorrer de forma direta ou indireta,

    atravs de aes planejadas ou no planejadas.

    De acordo com a Organizao Mundial da Sade (1973), tem-se:

    reuso indireto: ocorre quando a gua j usada, uma ou mais vezes para uso

    domstico ou industrial, descarregada nas guas superficiais ou subterrneas e

    utilizada novamente a jusante, de forma diluda;

    reuso direto: o uso planejado e deliberado de esgotos tratados para certas

    finalidades como irrigao, uso industrial, recarga de aqfero e gua potvel;

    reciclagem interna: o reuso da gua internamente a instalaes industriais,

    tendo como objetivo a economia de gua e o controle da poluio.

    Essa mesma publicao diferencia o reuso indireto intencional do no

    intencional, estabelecendo que quando o reuso indireto decorre de descargas planejadas

    a montante, ou a recargas planejadas no aqfero subterrneo, ele designado reuso

    indireto intencional.

  • 15

    Lavrador Filho (1987), referindo-se a obra de Montgomery, afirma que esse

    autor associa o reuso planejado existncia de um sistema de tratamento que no

    atenda as exigncias ambientais, mas tambm aos padres de qualidade requeridos pelo

    reuso da gua. Alm disso, os termos planejado e no planejado referem-se ao fato do

    reuso ser resultante de uma ao consciente, subseqente descarga do efluente, ou do

    reuso ser apenas um subproduto no intencional dessa descarga.

    Quanto ao termo reciclagem, definido como o reuso interno da gua para o

    uso original, antes de sua descarga em um sistema de tratamento ou outro ponto

    qualquer de disposio; enquanto o termo reuso utilizado para designar descargas de

    efluentes que so subseqentemente utilizados por outros usurios, diferentes do

    original (Brega Filho & Mancuso, 2002).

    Nessas condies o reuso planejado direto da gua para fins potveis pode ser

    classificado como reciclagem, desde que os efluentes tratados sejam utilizados

    novamente pela mesma entidade que os produziu, num circuito fechado .

    Cecil (1987) referindo-se a reuso de gua na indstria, distingue o termo reuso

    direto da palavra reciclagem, da seguinte maneira: reuso direto diz respeito a guas

    que, tendo sido poludas pela atividade humana, no tenham sido misturadas com guas

    naturais; o uso de guas provenientes de outras indstrias ou sistema pblico um reuso

    direto das guas, se estas no tiverem sido misturadas com guas naturais. Ou seja,

    para Cecil reciclagem no sinnimo de reuso e sim um caso especial de reuso: ela

    recupera os esgotos gerados por um uso, para atender o mesmo uso.

    Lavrador Filho (1987), sugere a seguinte terminologia para efeito de

    uniformizao de linguagem:

    Reuso de gua: o aproveitamento de guas previamente utilizadas, uma ou

    mais vezes, em alguma atividade humana, para suprir as necessidades de outros

    usos benficos, inclusive o original. Pode ser direto ou indireto, bem como

    decorrer de aes planejadas ou no planejadas.

    Reuso indireto no planejado de gua: ocorre quando a gua, j utilizada uma

    ou mais vezes em alguma atividade humana, descarregada no meio ambiente e

    novamente utilizada a jusante, em sua forma diluda, de maneira no intencional

    e no controlada. Neste caso, o reuso da gua um subproduto no intencional

    da descarga de montante. Aps sua descarga no meio ambiente, o efluente ser

  • 16

    diludo e sujeito a processos como autodepurao, sedimentao, dentre outros,

    alm de eventuais misturas com outros despejos advindos de diferentes

    atividades humanas.

    Reuso planejado de gua: ocorre quando o reuso resultado de uma ao

    humana consciente, adiante do ponto de descarga do efluente a ser usado de

    forma direta ou indireta. O reuso planejado das guas pressupe a existncia de

    um sistema de tratamento de efluentes que atenda aos padres de qualidade

    requeridos pelo novo uso que se deseja fazer da gua. O reuso planejado tambm

    pode ser denominado reuso intencional da gua.

    Reuso indireto planejado de gua: ocorre quando os efluentes, depois de

    convenientemente tratados, so descarregados de forma planejada nos corpos

    dgua superficiais ou subterrneos, para serem utilizados a jusante em sua forma

    diluda e de maneira controlada, no intuito de algum uso benfico.

    O reuso indireto planejado da gua pressupe que, alm do controle feito a

    montante, na descarga, e de jusante, na captao, exista tambm um controle das

    eventuais novas descargas de efluentes nesse percurso, para garantir que, alm

    das aes naturais do ciclo hidrolgico, o efluente tratado esteja sujeito apenas a

    eventuais misturas com outros efluentes lanados no corpo de gua os quais

    tambm atendam aos requisitos de qualidade do reuso objetivado.

    Neste caso, a descarga do efluente tratado no meio ambiente pode se dar para

    melhoria de sua qualidade, para armazenamento, para uma modulao de vazes

    ou at mesmo por motivos psicolgicos do usurio localizado a jusante (Brega

    Filho & Mancuso, 2002).

    Reuso direto planejado de gua: ocorre quando os efluentes, aps

    convenientemente tratados, so encaminhados diretamente de seu ponto de

    descarga at o local do reuso; sofrendo em seu percurso os tratamentos

    adicionais e armazenamentos necessrios, mas no sendo, em nenhum momento,

    descarregados no meio ambiente.

    Reciclagem de gua: o reuso interno da gua, antes de sua descarga em um

    sistema geral de tratamento ou outro local de disposio, para servir como fonte

    suplementar de abastecimento do uso original. um caso particular do reuso

    direto.

  • 17

    Westerhoff (1984) classifica reuso de gua em duas grandes categorias: potvel e

    no potvel. Pela sua praticidade e facilidade, essa classificao, que apresentada a

    seguir, foi adotada pela Associao Brasileira de Engenharia Sanitria e Ambiental

    (ABES), Seo So Paulo, tendo sido amplamente divulgada em sua srie Cadernos de

    Engenharia Sanitria e Ambiental em 1.992.

    Reuso potvel

    reuso potvel direto: quando o esgoto recuperado, atravs de tratamento avanado,

    diretamente reutilizado no sistema de gua potvel.

    reuso potvel indireto: caso em que o esgoto, aps tratamento, disposto na coleo de

    guas superficiais ou subterrneas para diluio, purificao natural e subseqente

    captao, tratamento e finalmente utilizado como gua potvel.

    Reuso no potvel:

    reuso no potvel para fins agrcolas. embora quando se pratica esta modalidade de

    reuso via de regra haja, como sub produto, recarga do lenol subterrneo, o objetivo

    precpuo desta prtica a irrigao de plantas alimentcias, tais como rvores frutferas,

    cereais, etc, e de plantas no alimentcias tais como pastagens e forraes, alm de ser

    aplicvel para dessedentao de animais.

    reuso no potvel para fins industriais: abrangem os usos industriais de refrigerao,

    guas de processo, para utilizao em caldeiras etc.

    reuso no potvel para fins recreacionais: classificao reservada irrigao de

    plantas ornamentais, campos de esportes, parques e tambm para enchimento de lagoas

    ornamentais, recreacionais etc.

    reuso no potvel para fins domsticos: so considerados aqui os casos de reuso de

    gua para rega de jardins residenciais, para descargas sanitrias e utilizao desse tipo

    de gua em grandes edifcios.

    reuso para manuteno de vazes: a manuteno de vazes de cursos de gua promove

    a utilizao planejada de efluentes tratados, visando uma adequada diluio de eventuais

  • 18

    cargas poluidoras a eles carreadas, incluindo-se fontes difusas, alm de propiciar uma

    vazo mnima na estiagem.

    Aquacultura ou aqicultura: consiste na produo de peixes e plantas aquticas

    visando a obteno de alimentos e/ou energia, utilizando-se os nutrientes presentes nos

    efluentes tratados.

    Recarga de aqferos subterrneos: a recarga dos aqferos subterrneos com

    efluentes tratados, podendo se dar de forma direta atravs de injeo sob presso, ou de

    forma indireta utilizando-se guas superficiais que tenham recebido descargas de

    efluentes tratados a montante.

    O reuso de gua para manuteno de vazes de cursos de gua, aqicultura e recarga de

    aqferos so classificaes complementares s de Westerhoff e que foram incorporadas

    neste trabalho.

    3.4- Experincias de Reuso de guas Residurias

    A Repblica da Nambia vem tratando desde 1968 esgotos exclusivamente

    domsticos para fins potveis. Os esgotos industriais so coletados em rede separada e

    tratados independentemente. Aps tratamento, o efluente encaminhado para a fase de

    potabilizao. Esta estao tem pr-ozonizao, coagulao-floculao em primeiro

    estgio, flotao com ar dissolvido, adsoro em carvo ativado em p, coagulao-

    floculao em segundo estgio, sedimentao, filtros rpidos de areia, ozonizao,

    deaerao e reciclagem de ozona, adsoro em carvo ativado granular, clorao ao

    breakpoint, correo de pH com cal e armazenamento da gua potvel em lenol

    fretico, por longos perodos, de onde , posteriormente, removida atravs de poos e

    introduzida no sistema de abastecimento pblico (Revista BIO, 2001).

    Na cidade japonesa de Fukuoka, com aproximadamente 1,2 milho de

    habitantes, diversos setores operam com rede dupla de distribuio de gua, uma das

    quais com esgotos domsticos tratados em nvel tercirio (lodos ativados, desinfeco

    com cloro em primeiro estgio, filtrao, ozonizao, desinfeco com cloro em

  • 19

    segundo estgio), para uso em descarga de banheiros em edifcios residenciais. Esse

    efluente tratado tambm utilizado para outros fins, incluindo irrigao de rvores em

    reas urbanas, para lavagem de gases, e alguns usos industriais, tais como resfriamento

    e desodorizao (Hespanhol, 2001).

    Em Denver, Colorado-USA, foi construda uma estao de tratamento de

    demonstrao com capacidade de 44 l/s. Esta estao foi planejada para utilizar o

    efluente de um sistema de esgotos domsticos, tratado em nvel secundrio como gua

    bruta. Esse sistema de tratamento foi concebido tendo como objetivo o estudo da

    viabilidade tcnica e econmica do reuso potvel direto, empregando-se tecnologia de

    ponta para potabilizao de gua de m qualidade devido a um uso anterior. Alm disso,

    o projeto foi idealizado para possibilitar o desenvolvimento de metodologias cientficas

    de monitoramento de qualidade de gua, baseada nos mais modernos indicadores.

    Por ser um projeto bastante avanado, inclui um intensivo programa de

    amostragem que visa, alm dos parmetros normais de controle, determinar a

    capacidade de remoo dos chamados elementos traos e tambm avaliar os efeitos

    sobre a sade por meio de estudos crnicos e sub-crnicos em animais, conforme os

    trabalhos de Lauer (1984).

    A Companhia de Saneamento de So Paulo (SABESP), vem lidando com a

    questo do reuso de uma forma bem profissional, desde quando firmou com a empresa

    Coats Corrente, em 1998, uma parceria para fornecimento de gua industrial oriunda da

    Estao Experimental de Tratamento de Esgotos (ETE) Jesus Netto.

    A ETE de Jesus Netto, inaugurada em 1934, j fez histria como a primeira

    estao de tratamento de esgotos com processo biolgico de lodos ativados do Brasil. A

    deciso de iniciar o reuso foi tomada em funo da qualidade do seu efluente. Esse

    lquido passa por tratamento tercirio, atravs da adio de polmeros e desinfeco com

    cloro, cujos resultados so monitorados e controlados em seu laboratrio de anlises

    devidamente certificado.

    O contrato de fornecimento de gua industrial, com volume mnimo mensal de

    45.000 m3 foi assinado em 1998 e o valor estipulado poca foi de R$ 0,46 por metro

  • 20

    cbico. Uma rede em ferro fundido, com dimetro variando entre 200mm e 150mm e

    800m de extenso, foi implantada para abastecer esta empresa, garantindo continuidade,

    volume e qualidade requeridas em seu processo industrial de lavagem, tingimento e

    mercerizao de fios e outros processos de apoio. Atualmente o consumo mdio mensal

    desta indstria de 50.000 m3. O ganho em termos de custo tambm foi expressivo pois

    o preo da gua potvel para grandes consumidores industriais (acima de 50 m3 por

    ms) era de R$ 5,84 o m3.

    Como parmetros mdios para guas industriais , podemos citar a tabela 6:

    Tabela 6 Parmetros Mdios de Qualidade de gua Industrial

    Parmetros (mg/L) Qualidade da gua Industrial Padro da gua Industrial (**)

    Alcalinidade 57,18 100 Cloreto 65,8 80 (70*) Condutividade (uS/cm) 403,61 250 (500*) Cor (UC) 9,08 10 DQO 12,76 20 Fosfato Total 0,44 1 Nitrognio amoniacal 10,06 6,7 Slidos dissolvidos totais 406,81 250 (300*) Slidos suspensos totais 7,54 5 Sulfatos 18,93 50 (30*) Turbidez (NTU) 0,72 1 (*) Limites requeridos pela indstria

    (**) Padro gua Industrial Guidelines for Water Reuse Camp Dresser & Mckee Inc

    Devido a suas caractersticas de receber esgoto predominantemente domstico,

    capacidade de tratamento limitada, existncia de Interceptor do Tamanduate - Sistema

    Barueri e proximidade de Plo Industrial com clientes em potencial, essa ETE teve suas

    instalaes adaptadas para funcionar como uma Unidade de Tratamento de gua

    Industrial.

  • 21

    Outra alterao feita foi a desativao da fase slida, onde as estruturas do

    digestor anaerbio de lodo foram reformadas para reservatrio de gua de reuso, com

    capacidade aproximada de 1.000 m3, possibilitando execuo de manuteno preventiva

    em suas Unidades sem interrupo no fornecimento de gua aos clientes.

    Para o reuso, so utilizadas atualmente Unidades da ETE Jesus Netto que tratam o

    esgoto atravs de dois processos paralelos:

    a) Processo biolgico aerbio de lodos ativados, com capacidade mxima de

    tratamento de 30 l/s.

    b) Processo biolgico combinado de reator anaerbio de fluxo ascendente e filtros

    biolgicos com capacidade mxima de tratamento de 30 l/s.

    Com a combinao destes dois processos, foi possvel aumentar a vazo mdia

    para 40 l/s de gua de reuso, que pode ser disponibilizada de forma direta (pipe-to-pipe),

    atravs de rede para outros clientes do Plo Industrial do Ipiranga, prximos da Estao,

    ou atravs de abastecimento por carro-tanque, utilizando sempre contratos especficos

    de fornecimento de gua industrial.

    Est sendo implantado tambm um sistema de filtrao pressurizado com

    capacidade de 200 m3/h, que conta com 4 filtros granulares de antracito e areia e 4

    filtros de cartuchos construdos em ao inox com controle automtico de vazo, presso

    e retrolavagem. Esse sistema dever garantir o atendimento de padres internacionais

    fsicos e biolgicos de qualidade para gua de reuso, possibilitando diversificar suas

    aplicaes em processos que no exijam o uso de gua potvel.

    A Sabesp e as prefeituras de Barueri e Carapicuba assinaram no contrato para

    fornecimento de gua de reuso para fins no-potveis, como lavagem de ruas, ptios,

    logradouros e veculos, combate a incndios, irrigao de reas verdes e desobstruo

    de redes coletoras de esgotos e galerias de guas pluviais. O fornecimento de 2

    milhes de litros de gua por ms para Barueri, e 1 milho de litros para Carapicuba.

    O primeiro contrato entre a Empresa e a administrao pblica foi assinado com

    a prefeitura de So Caetano do Sul, em 2001, para fornecimento de 1 milho de litros de

    gua por ms. de Este volume retirado na Estao de Tratamento de Esgotos do ABC.

  • 22

    Outro subproduto que pode sair da ETE Barueri a gerao de energia eltrica a

    partir do biogs (gs de esgoto). O poder calorfico do gs de esgoto cerca de 60% do

    gs natural. Por dia, o processamento de 22 mil metros cbicos de biogs vai gerar 2,6

    mil Kw de energia, que ser consumida pela prpria Sabesp.

    O projeto ser assessorado pelo Instituto de Eletrotcnica e Energia da

    Universidade de So Paulo e pelo Centro Nacional de Referncia em Biomassa.

    Dependendo do resultado que for obtido em Barueri, outras estaes de tratamento de

    esgoto da Grande So Paulo tambm podero produzir energia.

    Das cinco grandes plantas de tratamento de esgoto da regio metropolitana de

    So Paulo, quatro delas geram biogs. A Sabesp tambm avalia possveis aplicaes

    agrcolas para o lodo resultante do processo. Estudos j foram desenvolvidos em Franca

    e no Vale do Ribeira . (Revista BIO, 2002).

    Diversos pesquisadores brasileiros, que integram o Programa de Pesquisas em

    Saneamento Bsico (Prosab) esto realizando estudos para utilizao do efluente das

    estaes de tratamento de esgoto na irrigao. Duas experincias, nas cidades de Recife

    (PE) e Natal (RN), sob superviso dos professores Mario Kato e Ccero Onofre de

    Andrade Neto esto dando excelentes resultados com culturas de milho e acerola, em

    Pernambuco, e flores e forragem para o gado, no Rio Grande do Norte.

    Na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), o programa

    desenvolvido em trs etapas: tratamento de efluentes por processo anaerbio controlado;

    ps-tratamento; e uso produtivo do efluente tratado. Segundo Andrade Neto, depois de

    passar pelas etapas de tratamento o esgoto irriga plantaes de flores e capim-elefante

    para alimentao de gado, atravs de tcnica de hidroponia. O pesquisador destaca que

    a gua resultante do tratamento j contm nutrientes, boa para produzir, poupa gua

    potvel e deixa de poluir.

    Em Pernambuco a experincia est sendo feita com a utilizao dos efluentes da

    ETE Mangueira, operada pela Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa),

    composta de elevatria de esgoto bruto, grade e caixa de areia, reator UASB com 800

    m3 com 8 clulas (tempo de deteno hidrulica de 8 horas) e uma lagoa de polimento

    (TDH 3,5 dias).

  • 23

    A experincia est sendo feita. atravs de um convnio tripartite entre a

    Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a Compesa e a URB-Recife, Empresa de

    Urbanizao de Recife, rgo da Prefeitura de Recife, para o monitoramento da estao.

    Ao lado da ETE esto feitos estudos de utilizao do efluente final na irrigao de

    plantaes, em solo, de milho e acerola. (Revista BIO, 2002).

    A Universidade Federal do Cear vem desenvolvendo vrias pesquisas sobre o

    tema de reuso de guas residurias . Essas pesquisas originaram uma publicao sobre

    reuso, cujo organizador, Professor Suetnio Mota autor de uma das primeiras

    pesquisas sobre reuso realizadas no Brasil nos idos de 1980. Entusiasta pelo tema ele

    acredita que o reuso de guas uma prtica que deve ser incentivada, principalmente

    em regies semi-ridas como o Nordeste do Brasil, onde h carncia de gua at para o

    consumo humano.

    Foram apresentados oito trabalhos nessa publicao, resultados das pesquisas

    que integram dissertaes de mestrado de alunos do curso de ps-graduao, dentre as

    quais destacamos:

    a) APLICAO DE ESGOTO DOMSTICO EM IRRIGAO Suetnio Mota

    O trabalho estuda a aplicao de efluentes de estaes de tratamento de esgoto

    domstico em irrigao. So apresentados resultados de experincia realizada em

    Fortaleza, Cear, onde se efetuou a irrigao de pequenas reas plantadas com sorgo,

    utilizando o esgoto proveniente de um hospital (com caractersticas de esgoto

    domstico), previamente tratado pelo processo de filtro biolgico. O trabalho conclui

    recomendando esta prtica, principalmente, porque: uma forma de re-utilizao do

    lquido em regies carentes de gua, proporciona benefcios econmicos e sociais,

    significa tratamento adicional para efluentes de estaes de tratamento de esgotos

    domsticos e constitui-se medida de controle da poluio das guas.

    b) REUSO PLANEJADO DE GUAS RESIDURIAS EM IRRIGAO: UMA

    ALTERNATIVA PARA O ESTADO DO CEAR Francisco Csar Lima Bezerra.

    Este trabalho destaca a importncia e a necessidade do reuso planejado de guas

    residurias, observando padres de qualidade requeridos para a irrigao de culturas

  • 24

    arbreas, cerealferas e forrageiras, tendo como finalidade principal o melhoramento da

    qualidade ambiental, na forma de recuperao de nutrientes para culturas agrcolas e a

    preservao dos recursos hdricos.

    O autor destaca que as lagoas de estabilizao, seguidas de irrigao com os seus

    efluentes, constituem uma soluo barata, e com grande eficincia adotadas em regies

    semelhantes, minimizando ou at suprimindo os impactos negativos. Ressalta, ainda,

    que a medida que as guas residurias se infiltram no solo, a matria orgnica retida,

    evitando o deslocamento para o ecossistema aqutico dos metais e sais dissolvidos, e

    recuperando os nutrientes.

    O trabalho apresenta os resultados de pesquisa realizada com a aplicao de

    esgoto tratado em trs culturas : sorgo, algodo e capim elefante, comparando-se os

    desempenhos das mesmas com relao irrigao com gua.

    c) PERSPECTIVA DO USO DAS LAGOAS DE MATURAO NA

    PISCICULTURA Maria do Socorro Ribeiro Hortegal Filha

    O estudo teve como objetivo avaliar o desempenho do sistema de lagoas de

    estabilizao do Distrito Industrial de Maracana, Cear, tratando esgoto domstico e

    industrial, fazer o levantamento da ictiofauna presente nas lagoas de maturao e

    observar o crescimento de formas juvenis de tilpia do Nilo (oreochromis niloticus)

    estocados em quatro tanques-rede nas lagoas de maturao secundria e terciria.

    Os exemplares estocados nos tanques-rede triplicaram de peso ao final do

    experimento, o que mostra que estas lagoas apresentam condies adequadas para o

    cultivo de tilpia do Nilo em cativeiro. As suas condies sanitrias, em termos de

    coliformes fecais, tambm apresentaram-se dentro dos padres exigidos para alimentos.

    d) ASPECTOS SANITRIOS DO REUSO DE GUA NA AGRICULTURA Carlos

    Adriano da Cruz Neve

    Este estudo teve como objetivos mostrar a importncia do reuso de efluentes em

    regies com problemas de escassez hdrica e se h a possibilidade do aproveitamento

    desta gua na irrigao de culturas ingeridas crua, atravs do estudo de alguns

  • 25

    microorganismos provavelmente presentes, aps a irrigao com o esgoto tratado, nas

    partes comestveis de tais culturas e comparando-se tais valores com os padres de

    qualidade de efluente usado em sistemas de irrigao e culturas alimentcias-

    existentes no Brasil e fora dele, completado com uma reviso de bibliografia.

    O objetivo principal foi fazer o estudo dos impactos do reuso de gua na

    irrigao dessas hortalias , sob o ponto de vista de tais aspectos microbiolgicos.

    No Rio Grande do Sul a Companhia Riograndense de Saneamento ( Corsan )

    est investindo R$ 1 ,3 milho na construo de uma Estao de Tratamento de Esgotos

    (ETE) em Dom de Pedrito, Municpio na fronteira com o Uruguai, cujo efluente ser

    destinado irrigao de lavouras de arroz, todos os anos, no perodo entre 15 de outubro

    a 15 de abril. O fornecimento ser dado em compensao, durante 20 anos, ao antigo e

    proprietrio que cedeu a rea para a implantao das lagoas de estabilizao.

    A iniciativa pode ser uma das solues para os conflitos pela utilizao da gua

    entre agricultores e para abastecimento pblico nessa regio.

    Segundo o Departamento de Esgotos da Corsan, lagoas em srie se enquadram

    como a forma ideal de tratamento devido s caractersticas do corpo receptor dos

    efluentes, no caso o Rio Santa Maria, que um manancial de plancie em toda a sua

    extenso e cujo volume principal de gua utilizado para irrigao de arroz. Em outros

    anos quando ocorreram estiagens, o Rio Santa Maria se transformou em pequenos lagos,

    levando sua quase exausto e comprometendo o abastecimento de gua de cidades a

    jusante, como Rosrio do Sul .

    Ao ser estudado o local da futura ETE pelos tcnicos da Corsan, o primeiro

    proprietrio contatado j demonstrou interesse em realizar uma parceria com a empresa

    visando utilizao do efluente resultante do tratamento dos esgotos para irrigao de

    arroz. A remunerao da cedncia da rea Corsan se efetiva mediante a descarga

    contnua da terceira lagoa da srie, ou seja, a lagoa de maturao, no perodo entre 15 de

    outubro a 15 de abril s lavouras de arroz. Na entressafra, entre 15 de abril e 15 de

    outubro, o efluente ser lanado no Rio Santa Maria onde, via de regra, o volume de

    gua considervel no inverno.

  • 26

    A ETE ser composta por trs lagoas em srie, sendo a primeira anaerbia, de

    formato semi-pistonado, medindo 106 metros de comprimento e um espelho dgua

    variando entre 3 e 3,5 metros de profundidade. A segunda lagoa, apresenta

    caractersticas pistonadas mais acentuadas do que a primeira, tem uma largura mdia de

    90 metros e 600 metros de comprimento, e uma profundidade mdia entre 1 ,5m e 2

    metros. A terceira lagoa tem 72 metros de largura por 650 metros de comprimento e

    uma profundidade entre l m e 1,5 metro. O projeto prev uma vazo mdia do efluente

    de 105 litros por segundo.

    A Corsan est implantado uma cmara de bombeamento junto descarga da

    terceira lagoa na divisa da rea do proprietrio. Nesta cmara existir uma estrutura

    fsica denominada desviadora de fluxo operada pela companhia. Nela tambm haver

    uma segunda cmara destinada ao bombeamento que ser operada pelo proprietrio da

    rea. Da em diante todas as providncias necessrias irrigao sero custeadas pelo

    agricultor, inclusive os custos de energia eltrica, condutos, taipas e curvas de nvel

    praticadas nessa atividade.

    Sobre a utilizao da gua proveniente de um efluente de esgotos domsticos

    numa cultura a ser consumida por seres humanos, tcnicos da Corsan afirmam que esse

    processo demorado desde o princpio at o final, numa seqncia de etapas de

    assepsia, o que o torna seguro.

    O processo de tratamento, com lminas escoantes sujeitas ao intensivo regime de

    insolao caracterstica do vero, poca do seu cultivo - e a ao ultravioleta, garante,

    segundo os tcnicos, alto poder de desinfeco, completado pelo perodo de secagem, o

    beneficiamento do produto a altas temperaturas e o cozimento final pelo consumidor.

    (Revista BIO-2001).

    Considerando o rpido crescimento das atividades aqcolas no mundo, o Centro

    Panamericano de Engenharia e Cincias do Ambiente (CEPIS) levou a cabo um projeto

    de aqicultura utilizando efluentes tratados de lagoas de estabilizao localizadas em

    San Juan, Lima, Peru. Nos pases com grande tradio pisccola esto se incorporando

    as guas residurias aos tanques de cultivo sem nenhum tratamento prvio. o caso de

    Calcut na ndia, onde existem mais de 10.000 ha de tanques alimentados com guas

    brutas, o que ocasionam um alto risco sanitrio que ainda no foi avaliado. Em

    contrapartida os pases desenvolvidos esto usando a criao de peixes como uma forma

  • 27

    de melhorar a remoo de matria orgnica, sem que haja preocupao com a qualidade

    do produto j que no se destina ao consumo humano direto.

    Com os auspcios do Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento

    PNUD e a Agncia Alem de Cooperao Tcnica (GTZ), se realizaram quatro cultivos

    experimentais de forma contnua durante dois anos nas pocas de calor e frio prprias

    do clima de Lima. Mais de 60 parmetros fsicos, qumicos e biolgicos foram

    avaliados diria ou semanalmente. Entre os parmetros sanitrios se incluram :

    bactrias totais, coliformes totais e fecais, Salmonella, Clostridium sulfito redutor,

    bacterifagos de Escherichia coli , enteroparasitos, poliovirus, vrus da hepatite B,

    metais pesados e pesticidas. Tambm se avaliou a concentrao bacteriana na gua dos

    tanques de cultivo em relao a resistncia dos peixes para impedir o ingresso de

    bactrias no msculo.

    O sistema de tratamento permitiu reduzir os nveis de DBO total at a faixa de

    112 a 68 mg/l. A alta produo de algas se situou entre os 1.573 a 718 mg/l de clorofila

    A, de acordo com o clima. A amnia total flutuou entre 2,62 e 0,45 mg/l, valores

    tolerveis para a tilpia do Nilo. A remoo de coliformes fecais no processo de

    tratamento confirmou que o sistema capaz de reduzi-los at 5 logaritmos e permite um

    efluente com nveis de 104 . Devido aos tanques pisccolas trabalharem em srie, se

    espera reduzir a concentrao de coliformes a um logaritmo e obter um nvel de 103

    recomendado pela OMS (Figura 1).

    Figura 1 Remoo de Coliformes Fecais nas Lagoas de Estabilizao de San Juan

    1E+03

    1E+04

    1E+05

    1E+06

    1E+07

    1E+08

    1E+09

    1E+10

    ESG. BRUTO 1E+08 3E+09 3E+08 4E+09

    PRIMRIO 2E+07 2E+07 3E+06 2E+07

    SECUNDRIO 6E+05 4E+05 2E+05 2E+05

    TERCIRIO 1E+04 2E+04 1E+04 3E+04

    EXP.1 EXP.2 EXP.3 EXP.4

    Fonte: CEPIS OPS, 1991

  • 28

    Nas condies de Lima, pode-se obter 4.400kg/ha de tilpia com um peso mdio

    de 250g ao final do vero, sem adicionar alimentos artificiais. O crescimento muito

    reduzido durante o perodo de inverno porque a temperatura cai a 17 C. Nos criadouros

    convencionais da Amaznia, s possvel obter esse nvel de produo se for

    adicionado alimentos concentrados. A abundante biomassa de algas, favorecidas pelas

    guas residurias tratadas, permite substituir o alimento artificial e portanto reduzir os

    custos de produo.

    A qualidade dos peixes foi avaliada de acordo com uma classificao restrita

    proposta por Buras (1987), que estabelece como muito bons os peixes com menos de

    10 bactrias por grama de msculo, so aceitveis aqueles com 10 a 50 bactrias,e so

    rechaados os peixes com mais de 50 bactrias. importante esclarecer que o pescado

    comercializado nos mercados, normalmente apresenta maior carga bacteriana no

    msculo que os mencionados na classificao. Em trs experincias se alcanou uma

    classificao de muito bons para 100% dos peixes (Figura 2). S no terceiro

    experimento se rechaou 6% dos peixes, situao motivada por um incremento

    deliberado do nvel de coliformes fecais que ultrapassou 105 no efluente. Isto permitiu

    estabelecer um limite de qualidade do efluente que deve ser utilizado na criao de

    tilpias; ultrapassado o limite, o sistema imunolgico da tilpia se debilita e as bactrias

    ingressam no msculo. Tambm pode-se observar a capacidade de autodepurao

    desses peixes, sempre que se reduzia o nvel de coliformes por um perodo de 30 dias.

    Isto significa que em caso de uma eventual sobrecarga no sistema de tratamento, a

    qualidade sanitria dos peixes afetados pode ser recuperada.

    Figura 2 Projeto Aqicultura de San Juan - Qualidade Sanitria dos Peixes

    0%

    20%

    40%

    60%

    80%

    100%

    MUITO BOM 100% 100% 86% 100%

    ACEITVEL 0% 0% 8% 0%

    RECHAADO 0% 0% 6% 0%

    EXP.1 EXP.2 EXP.3 EXP.4

    Fonte: Buras, 1987

  • 29

    Os resultados obtidos permitiu elaborar um modelo computadorizado para

    dimensionar criaes comerciais em zonas tropicais e subtropicais. As temperaturas

    elevadas das zonas tropicais permitem reduzir o tempo de criao a sete meses,

    obtendo-se at trs colheitas ao ano. Com o programa, fica fcil calcular, por exemplo,

    que para conseguir uma produo de 60 toneladas anuais se requer 19 ha em locais com

    climas subtropicais, j nos climas tropicais s se necessita de 9 ha, situao que tambm

    reduz o custo de produo (OPS/CEPIS, 1996).

    Em 1991 o Ministrio de Agricultura do Peru iniciou o Projeto Nacional de

    Irrigao com guas Servidas Tratadas, com o qual pretende ampliar a fronteira

    agrcola da costa com 18.000 ha irrigadas com 20m3 de desges produzidos nas

    principais cidades da costa peruana.

    O CEPIS ofereceu assistncia tcnica para avaliar o grau de substituio dos

    fertilizantes pelo aporte de nutrientes das guas servidas tratadas. Foram avaliadas

    diferentes doses de adio, desde um experimento somente com guas residurias at

    nveis de adio de fertilizantes que normalmente se aplicam nos cultivos. Foram

    ensaiados diferentes cultivos comerciais como feijo, brcolis, couve, milho etc.

    Tabela 7 Produo do Feijo PANAMITO (irrigado com efluente de 1000CF/100ml)

    DOSES (Kg/ha)

    N P K RENDIMENTO

    (Kg/ha)

    0 0 0 1,361

    50 50 50 1,203

    80 80 80 1,297

    50 80 80 1,342 Fonte: Cepis, 1991

    Tal como observa na Tabela 7 os resultados obtidos com o feijo panamito, os

    cultivos avaliados mostraram rendimentos de produo muito similares em todos os

    tratamentos, incluindo o teste sem fertilizao. Se demonstrou que as guas residurias

    aportam os nutrientes requeridos pelos cultivos, o que permite economizar os custos de

    fertilizao, que muitas vezes representam mais de 50% do custo de produo. As

    pesquisas em Israel mencionam que certos cultivos de frutas e gros podem ser afetados

    por altos nveis de nitrognio existentes nas guas residurias tratadas, j que somente

  • 30

    favorece o desenvolvimento vegetativo da planta. Portanto, seus sistemas de tratamento

    esto orientados a melhorar a remoo desse nutriente. Entretanto, essa alta

    concentrao de nitrognio favorvel aos cultivos de pasto, onde conveniente

    propiciar o crescimento vegetativo da planta (OPS/CEPIS, 1996).

    Todos os dados citados so interessantes e apontam para uma diversidade

    bastante favorvel para a reutilizao da gua. No caso, necessita-se estabelecer enfim

    critrios e normas, especialmente em pases como o Brasil. A dissertao no tem

    portanto o interesse de propor normas, mas sim contribuir na anlise dos conceitos e

    discusso das normas levantadas, de pases que j aplicaram e aplicam reuso de guas

    como mostrado a seguir.

    3.5 Normas e Legislaes existentes pelo Mundo

    A diversidade encontrada nas legislaes dos diversos pases, com diferentes

    enfoques se explica pela necessidade dessas serem adaptadas s suas particularidades

    ambientais e culturais. Alguns pases, como no norte europeu, tem recursos hdricos

    abundantes, neles a questo do reuso, no passa pela proviso extra de gua, mas tm

    uma importncia fundamental no aspecto da proteo dos recursos hdricos e

    preservao ambiental. J em outros pases, como no sul Europeu, regies dos Estados

    Unidos e da Amrica do Sul, os recursos hdricos adicionais, oriundos do reuso de guas

    servidas, so de grande importncia para agricultura, aqicultura, etc.

    A evoluo das regras do reuso de guas residurias no pode ser entendida

    completamente sem fazer uma reviso histrica destes padres desde 1918. Naquela

    poca a febre de legislar sobre reuso guas residurias j havia comeado. Um resumo

    desta evoluo pode ser achado na tabela 8

  • 31

    Tabela 8 Evoluo histrica da Legislao sobre reuso de guas residurias

    ANO FATOS E CRITRIOS DE QUALIDADE

    1918 Departamento de Sade Pblica do Estado da Califrnia estabelece os Primeiros Regulamentos para utilizao de esgotos com propsito de irrigao na Califrnia

    1952 Primeiras regras editadas por Israel

    1973 WHO 100 CF/100ml. em 80% das amostras

    1978 Critrio sobre reuso de guas residurias do Estado da Califrnia : 2,2 CT/100ml

    1978 Israel: 12 CF/100ml em 80% das amostras: 2,2 CT/100ml em 50% das amostras

    1983 Relatrio do Banco Mundial

    1983 Estado da Flrida: nenhuma deteco de E.coli em 100ml

    1984 Estado do Arizona: padres para vrus (1 vrus/40 L) e Girdia (1 cist/40 L)

    1985 Relatrio de Feachen et al,1983

    1985 Relatrio de Engelberg (IRCWD,1985)

    1989 Recomendaes da OMS para reuso de guas residurias: 1000 CF/100ml, < 1 ovo de nematide/L

    1990 Estado do Texas: 75 CF/100ml.

    1991 Frana: Recomendaes sanitrias baseadas nas da OMS

    1992 Guia da USEPA para reuso de guas: Nenhuma deteco de CF em 100ml (7 d em mdia, no mais de 14 CF/100ml em qualquer amostra

    Fonte: Salgot & Angelakis, 2001

    Por muitos anos os regulamentos do Estado da Califrnia eram a nica

    referncia legal vlida para recuperao, reuso e reciclagem de guas residurias. Este

    fato, fez com que qualquer tcnico de qualquer lugar do mundo assumisse esses

    conceitos ali introduzidos como a verdade, axiomtico e indiscutvel. Foi declarado at

    mesmo, que estes padres foram copiados e recopiados at que fossem reconhecidos

    oficialmente.

    Durante as dcadas de 70 e 80 houve uma considervel evoluo. Os diferentes

    estados no E.U.A. e vrias agncias internacionais, como o Banco Mundial e a OMS

    (Organizao Mundial de Sade) iniciaram um processo de extrema atividade na

    produo de legislao. Depois da publicao das recomendaes da USEPA em 1992,

    uma pequena evoluo foi feita na Europa que, como j foi descrito, h pouco

    movimento legislativo para recuperao e reuso de guas residurias.

  • 32

    Conforme comentado, a Califrnia foi o nico estado que teve regulamentao

    especfica durante anos, e por isso, considerado o que rene uma melhor abordagem

    para muitos tcnicos e cientistas.

    Muito diferente da realidade atual onde diferentes entidades supranacionais

    discutem a possibilidade de implementar novos conceitos ou sugerir modificaes, a

    OMS (Organizao Mundial de Sade, 1989) e o Banco Mundial patrocinaram vrios

    estudos sobre o tema, alm do USEPA que tambm executou vrios estudos e comparou

    as leis estatais existentes e recomendaes emitidas poca (USEPA, 1992).

    Atualmente os regulamentos da Califrnia e de Israel esto sofrendo uma

    reviso. Paralelamente, um comit de especialistas foi criado para uma reviso inicial

    das diretrizes da OMS (Organizao Mundial de Sade), e vrios estudos esto em

    desenvolvimento para estabelecer diretrizes ou regulamentos em vrios pases e na

    Europa.

    A seguir iremos analisar as diversas normas, legislaes e recomendaes

    existentes pelos diversos pases, e poderemos identificar as diferentes intenes de

    proteo dos recursos hdricos, preveno de poluio costeira, provimento extra de

    gua, recuperao de nutrientes para agricultura, economia em tratamento de guas

    residurias, recarga do lenol fretico, sustentabilidade na administrao dos recursos

    hdricos, etc:

    Frana.

    A Frana irrigou colheitas com guas residurias durante anos (perto de um

    sculo), em particular ao redor de Paris porque, at os idos de 1940, era o nico mtodo

    de tratar e dispor guas residurias da conurbao da Grande Paris.

    Esta prtica ainda est sendo utilizada na regio de Acheres onde parte dos guas

    residurias usada aps tratamento, mas provavelmente ser descontinuado em breve.

    O interesse em reuso de guas residurias reacendeu por volta da dcada de 1990 por

    duas razes principais: o desenvolvimento intensivo de irrigao de culturas (como

    milho) em particular na Frana Sul-ocidental e a regio de Paris, a grande diminuio de

    oferta de gua depois de vrias recentes secas severas que afetaram paradoxalmente

  • 33

    regies tradicionalmente consideradas molhadas, ou seja, com grande potencial

    hdrico (a Frana Ocidental e Norte-ocidental).

    Por causa deste interesse novo para o reuso de guas residurias, as autoridades

    de Sade emitiram em 1991 o documento Diretrizes de sade para o reuso ps-

    tratamento de guas residurias para agricultura e irrigao de espaos verdes (CS

    HPF., 1991). Estas diretrizes seguem essencialmente as diretrizes da OMS , mas

    tambm acrescenta restries tcnicas para irrigao e estabelece distncias entre locais

    de irrigao e reas residenciais e estradas. Em fevereiro de 1996 a Associao Geral

    dos Sanitaristas e Tcnicos Municipais (Association Gnrale des Hyginistes et

    Techniciens Municipaux - AGHTM) publicou recomendaes tcnicas sobre os

    tratamentos de guas residurias necessrios para assegurar o efetivo cumprimento das

    diretrizes francesas. Alm disso, recentes regulamentos franceses fazem o

    Departamento de Administrao solicitar de forma compulsria autorizao para

    qualquer novo projeto de reuso de guas residurias (Bontoux & Courtois, 1996).

    Alguns projetos tm sido descartados, at agora, principalmente por causa de

    problemas relativos ao custo de tratamentos tercirios. Todavia os projetos

    implementados chegam a um montante de 3.000 ha de terra, e agregam uma grande

    variedade de aplicaes: em jardinagem, pomares, plantaes cereais,de rvores e

    florestas, pastagens e campos de esportes. O sistema de ClermontFerrand de reuso de

    gua para irrigao conta hoje com mais de 700 ha de plantao de milho, e

    considerado hoje um dos maiores projetos desse tipo na Europa.

    O recente desenvolvimento de novos processos de tratamento, como bioreatores

    de membrana (ultrafiltrao e microfiltrao), para obter alta qualidade de purificao

    de gua, desinfeco e remoo de slidos em suspenso, poder abrir uma porta para a

    reciclagem de guas residurias com propsitos domsticos (guas de lavagem e

    descarga de vaso sanitrio, etc.).

    Itlia.

    Uma primeira pesquisa de plantas de tratamento de esgoto na Itlia calculou o

    total de efluente tratado na ordem de 2.400 Mm3/ano. Este dado d uma estimativa do

    recurso potencial disponvel para reuso de guas residurias. Devido a regulamentao

    que obriga a se alcanar um alto nvel de tratamento, para a mdia das grandes plantas

  • 34

    de tratamento (>100.000 hab), respondendo por aproximadamente 60% de fluxo de

    guas servidas urbanas podem proporcionar para efluentes r-utilizvel uma relao de

    custo/benefcio extremamente favorvel.

    O uso de guas residurias sem tratamento foi praticado na Itlia desde o

    comeo deste sculo, especialmente nas periferias das pequenas cidades e perto de

    Milo. Entre os casos mais antigos de irrigao com guas residurias pode ser citado

    le marcite(grandes campos irrigados constantemente atravs de sistemas de canaletas)

    que utiliza as guas do rio Vettabia, que recebe a maioria dos esgotos industriais e

    urbanos sem tratamento.

    Hoje em dia, esgotos tratados so principalmente usados para irrigao na

    agricultura cobrindo mais de 4.000 ha. Um projeto de maiores propores foi

    implementado em Emilia Romagna onde mais de 450.000 m3/ano de efluentes tratados

    so usados para irrigao em aproximadamente 250 ha. Os reais custos para a

    distribuio de esgotos reciclados (energia, mo de obra, manuteno do sistema)

    coberto pelos usurios. Novos sistemas de reuso de guas residurias foram

    recentemente implantados na Siclia e Sardenha para irrigao agrcola.

    A Legislao italiana existente (Padres Tcnicos Gerais - G.U. 21.2.77) atribui

    limites, dependendo do tipo de hortifruticultura e pastagens, de 2 a 20 colibacteria por

    100 cm3, respectivamente. Alm disso, a lei prescreve que na presena de lenol fretico

    em contato direto com guas de superfcie, devem ser usadas medidas preventivas

    adequadas para evitar qualquer deteriorao da qualidade das mesmas.

    Uma lei nova relativa a esgotos municipais est sendo preparada para dar

    melhor ateno administrao de recursos hdricos, em particular para o reuso de

    esgoto tratado. As indstrias sero encorajadas a usar guas residurias tratadas.

    Companhias responsveis pelo tratamento de esgotos municipais j planejaram construir

    uma rede de abastecimento de guas residurias tratadas para reuso pelas indstrias. Na

    rea metropolitana de Turim, por exemplo, as duas companhias principais (Azienda Po

    Sangone - APS e CIDIU) realizaram esse alternativa. Finalmente, uma proposta por

    estabelecer regulamentos nacionais em reuso de guas residurias tratadas est sendo

    elaborada .

  • 35

    Espanha.

    Um novo Plano Nacional dos Recursos Hidrolgicos foi publicado recentemente

    e muito favorvel para o reuso de guas residurias tratadas na irrigao. Em todo

    caso, o reuso de esgotos tratados j uma realidade em vrias regies espanholas para

    quatro aplicaes principais: irrigao de campos de esportes, irrigao agrcola, recarga

    dos aqferos subterrneos (em particular para impedir a intruso de gua salgada em

    aqferos litorneos) e incremento de vazo dos rios.

    Existe grande interesse comercial de algumas companhias de gua privadas em

    investir em pesquisa e desenvolvimento em colaborao com as Universidades (por

    exemplo: AGBAR e de Canal Isabel II). Por enquanto no h nenhuma legislao

    nacional na Espanha, mas pelo menos trs provncias autnomas (Andaluzia, Catalunha

    & Baleares) tem algumas prescries legais ou recomendaes relativas ao reuso de

    esgotos tratados.

    Chipre.

    No Chipre o esgoto gerado pelas principais cidades, aproximadamente

    25Mm3/ano, considerado um importante recurso hdrico a ser coletado e usado para

    irrigao aps um tratamento tercirio. Por causa do alto custo de tratamento, a maioria

    da gua reciclada, aproximadamente 55 a 60%, usada para propsitos com controle

    bacteriolgico menos rgido tais como: jardins, parques, campos de golfe etc. J o

    efluente restante integra uma rede de cerca de 10 Mm3/ano que reservado para ser

    disponibilizado para irrigao na agricultura.

    Segundo os dados observados, o custo de reciclar a gua baixo,

    aproximadamente 7,5 cents/m3 (US$). Isto vai permitir ampliar a irrigao na

    agricultura por volta de 8 a 10%, o que ir proporcionar uma conservao de quantidade

    equivalente de gua para ser utilizado em outros setores (Papadopoulos, 1995).

    Os padres para utilizao relacionados a efluentes de reuso de guas residurias

    tratados para fins de irrigao em Chipre apresentado na tabela 9. Eles so mais

    rgidos que as diretrizes da OMS , e leva em conta as condies especficas de Chipre.

    Estes critrios so seguidos por um cdigo de prticas para assegurar a melhor aplicao

    possvel do efluente para irrigao (Kypris, 1989).

  • 36

    Todavia, estes critrios seguem, de algum modo, a filosofia dos regulamentos da

    Califrnia.

    Tabela 9 Critrios de qualidade para irrigao com guas residurias tratadas

    Irrigao DBO5

    (mg/l) SS

    (mg/l)

    Coliformes Fecais

    (NMP/100ml)

    NematidesIntestinais

    (/L) Tratamento Requerido

    reas de lazer pblicas com acesso ilimitado

    10a 15b

    10a 15b

    50a 100b

    Nil Tercirio com desinfeco

    Alimentos para consumo humano

    A1 20a 30b

    30a 45b

    200a 1000b

    Nil Secundrio, armazenamento >1 semana e desinfeco ou tercirio e desinfeco

    reas de lazer pblicas com acesso limitado

    B1 - - 200a 1000b

    Nil Lagoa de estabilizao de maturao com deteno >30dias ou secundrio com armazenamento >30 dias

    Colheitas de Forragem

    A1

    B1

    20a 30b

    -

    30a 45b

    -

    1000a 5000b

    1000a

    Nil

    Nil

    Secundrio e armazenamento >1 semana ou tercirio com desinfeco Lagoa de estabilizao de maturao com deteno >30dias ou secundrio com armazenamento >30 dias

    Alimentos processados pela industria

    A1

    B1

    50a 70b

    -

    - - -

    3000a 10000b

    3000a

    10000b

    - - - -

    Secundrio e desinfeco Lagoa de estabilizao de maturao com deteno >30dias ou secundrio com armazenamento >30 dias

    a Esses valores no devem exceder a 80% das amostras por ms. b Mximo valor permitido. 1 Categoria de reuso (Tabela 10). Notas: A irrigao de vegetais no permitida. A irrigao de plantas ornamentais para fins de comrcio no permitida. Nenhuma substncia comprovadamente txica para os seres humanos e animais que poder ser acumulada nas partes comestveis de alimentos permitida nos efluentes.

    Fonte: Angelakis et al., 1999

    Blgica.

    A Blgica, com seus recursos disponveis de 817 m3/hab.ano, um dos pases

    europeus como Malta, Pases Baixos, Hungria. e Repblica da Moldova que sofre

    escassez de gua crnica (quantia de gua renovvel < 1.000 m3/hab.ano). Hoje, so

    tratados somente 38% de todo o esgoto produzido atualmente na Blgica, com

    perspectivas de alcanar nveis de cerca de 60% de tratamento do esgoto brevemente

  • 37

    nos prximos anos. Com isso a quantidade de reuso de guas residurias, atualmente,

    bastante limitado.

    No obstante, em algumas situaes, o reuso de guas residurias tratadas

    poder ficar cada vez mais atraente para a indstria, como termoeltricas, indstria de

    alimentos e outras com altas taxas de utilizao de gua, como tambm nas reas onde

    os recursos hdricos estejam em declnio ou pela alta demanda por gua no vero nas