ANÁLISE DO CROQUI DO ESTUDANTE DE ARQUITETURA
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ANÁLISE DO CROQUI DO ESTUDANTE DE ARQUITETURA: UMA
EXPERIÊNCIA NA DISCIPLINA DE TÉCNICAS DE REPRESENTAÇÃO GRÁFICA
II
NUNES, Gustavo de Oliveira– acadêmico– [email protected]
NAOUMOVA, Natalia(orientadora)– professora doutora– [email protected]
1. RESUMO
O trabalho é um relato de uma experiência de monitoria na disciplina de Técnicas de
Representação Gráfica II, do segundo semestre do curso de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Federal de Pelotas. Tendo o croqui como meio de apresentação de ideias,
conceitos e imagens como um todo, e valendo-se da teoria que o mesmo é uma forma de
abstração, onde o croqui é ao mesmo tempo produto e instrumento do arquiteto futuro. O
objetivo do estudo busca entender, baseado em experiências, a importância do aprendizado da
abstração e do entendimento do espaço, por meio do desenho, e a influência que o mesmo
possui no desempenho do acadêmico de arquitetura no decorrer do curso. A estrutura da
disciplina ao longo do semestre está dividida em cinco etapas: introdução, traço, percepção
visual, capacidade de abstração, aprimoramento e finalização. O número de materiais
utilizados na disciplina é amplo, com enfoque principal no uso do lápis e hidrocor, por serem
instrumentos rápidos e expressivos de desenho. A metodologia do trabalho foca na análise do
croqui do estudante ao decorrer da disciplina, avaliando o seu desempenho, sua capacidade de
entender os espaços, perspectivas, e de abstração. Finalizando este processo, compara-se a
capacidade de mimese e abstração do aluno desde seus primeiros desenhos até o final da
disciplina. Percebe-se, além da expressão adquirida no traço, uma maior liberdade de criação,
defesa e conceituação, e o quão importante tais aprendizados serão na prática projetual.
Palavras-chave: croqui; abstração; aprendizado
1 Universidade Federal de Pelotas, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo 2 Universidade Federal de Pelotas, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Departamento de Arquitetura e
Urbanismo
1.1. ABSTRACT
This work reports an experience of monitoring in the discipline of Graphical Techniques II,
from the second semester of Architecture and Urbanism, Federal University of Pelotas. The
sketch is a meaning to present ideas, concepts and images as a whole, and drawing is a form
of abstraction, where the sketch is both product and instrument of future architect. The aim of
this study is to understand, based on experience, the importance of learning and understanding
the abstraction of space, through the design, and the influence it has on the academic
performance of architecture throughout the course. The structure of the course during the
semester is divided into five stages: introduction, trace, abstraction capacity, visual
perception, udgrading and completion. The number of materials used in the discipline is
broad, with focus on the use of the pencil and the marker, because both are able to do fast and
expressive drawings. The methodology of this work focuses in the studant’s sketch during the
course, evaluating their performance, their ability to understand the spaces, perspectives, and
abstraction. Terminating this process, we compare the ability of mimesis and abstraction of
the student from the earliest sketches to the end of the course. It can be seen that, beyond
expression in the trace, greater freedom of establishment and defense concepts, and how
important are these learning in design practice.
2. INTRODUÇÃO
No artigo “O croqui do arquiteto como objeto artístico” Ana Paula Gouvea (1996) destaca:
“o croqui do arquiteto é todo e qualquer desenho, instrumentalizado ou não, que
parte do processo de projeto. Este tipo de classificação engloba desenhos de
observação da cidade, do entorno, perspectivas internas e externas, detalhes, como
também plantas, cortes e fachadas, de caráter mais analítico e técnico.” (GOUVEA,
1996:23)
Baseado em tal afirmação, partiremos do ponto de vista citado pela pesquisadora, porém
analisaremos apenas croquis “não instrumentalizados” realizados por alunos da disciplina de
Técnicas de Representação Gráfica II. Serão apresentados conceitos de mimese e abstração, e
analogias com desenhos do arquiteto franco-suíço Le Corbusier, que preencheu durante a sua
carreira, uma média de 80 cadernos de croquis.
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA - DESENHO DE OBSERVAÇÃO
Durante o ensino acadêmico do curso de arquitetura e urbanismo, a maioria dos currículos das
universidades contam com disciplinas de representação gráfica, ou expressão gráfica. Em
outras, a nomenclatura da disciplina é mais específica, como “desenho de observação”, por
exemplo. Tais disciplinas abrangem desde os princípios básicos de desenho, como forma, luz,
plano, até desenhos mais complexos, ou em alguns casos mais artísticos. Dentre esses
conhecimentos, deve-se ganhar destaque os desenhos de observação, ou desenhos de mimese.
Estes desenhos focam na prática do desenho através da observação do espaço. Ana Paula
Gouveia resume o conceito de mimese de uma forma clara, no seu artigo “o croqui do
arquiteto como objeto artístico”:
“Observar espaços, percebê-los em suas relações formais, de escala, luz, cor, sem
falar na questão do tempo que implica na movimentação do observador neste
espaço, e representar tais percepções graficamente é a forma de apreender uma
realidade e configurá-la dentro de padrões de escolha, inerente a um processo de
ensino aprendizagem, institucionalizada ou não. Isso envolve captar esta realidade
através da mimese.” (GOUVEIA, 1996:25)
O desenho de observação força o sujeito, neste caso o estudante de arquitetura ou arquiteto, a
olhar com mais intensidade os objetos para poder desenhar. Para Klee “a mimese estava
relacionada não à imitação, mas a compreensão da essência da forma”.
Exemplo disso são os croquis de observação de Le Corbusier da Acrópole, em Atenas,
realizados durante uma viagem em 1911, que mostram a capacidade de entender o espaço que
possuía tal arquiteto, através do desenho. Também mostra-se aqui três desenhos realizados
por alunos da disciplina de TRG II da UFPel, os dois primeiros de observação, e o último de
entendimento da forma.
Fig.1 – Atenas. Acrópole vista do exterior. CORBUSIER, Le.
Fig.2 – Atenas. Entrada na Acrópole. Plantas e fachadas de Propileus. CORBUSIER, Le.
Fig.3 – Pompéia. Planta e Entrada de termas. CORBUSIER, Le.
Fig. 4 – Castelo Rua XV, Pelotas. RABAIOLLI, B. 2011
Fig.5 – Grande Hotel, Pelotas. NUNES, G. 2012
Fig.6– Robbie House, Frank Loyd Wright. SCHNEID, G. 2011.
Dominado o desenho de observação, passa-se para uma nova fase do ensino aprendizagem de
desenho na disciplina de Técnicas da Representação Gráfica II. A fase de abstração, pois para
Da Vinci:
“El joven debe antes de todas cosas aprender La Perspectiva para La justa medida de
las cosas (...) luego dibujará el natural, para ver La razión de las cosas que aprendió
antes; (...) para adquirir facilidad em practicar lo que ja há aprendido.”
3.1. DESENHO DE ABSTRAÇÃO
Depois de já ter dominado o desenho de observação, o aluno é incentivado a fazer desenhos
de abstração. Para Ana Paula Gouveia (GOUVEIA, 1996:25) “abstração é o processo no qual
se projeta, do qual o croqui é ao mesmo tempo produto e instrumento”. Já Beatriz Regina
Dorfman avança mais na questão do desenho de abstração, dizendo:
“A linguagem do desenho pode ser empregada como ferramenta de trabalho, em
diversos níveis. O desenho é uma linguagem que permite a visualização de idéias,
mesmo que estas não envolvam a visualidade de maneira direta. Visualizar é uma
maneira de abstrair o pensamento, de pensar sem palavras. Ou seja, os desenhos ou
diagramas permitem a manipulação de conceitos abstratos ou subjetivos, através do
uso de esquemas de raciocínio não verbais.”(DORFMAN, 2007:2)
Portanto, é natural que toda carga inicial de desenho já tenha acontecido, quando surgirem os
primeiros desenhos de abstração. Para isso, a disciplina de Técninas da Representação Gráfica
II é dividida em cinco etapas: introdução, traço, percepção visual, capacidade de abstração,
aprimoramento e finalização. Todo esforço é direcionado para que os alunos desta disciplina
percam o medo de desenhar, pois é só apenas da prática que se consegue resultados bons. Para
que isso ocorra, é fundamental o envolvimento do aluno. Analisaremos aqui um croqui de Le
Corbusier, do Palácio da Justiça de Chandigarh e a obra já edificada. Nota-se que o grau de
abstração que o arquiteto atingiu é tão grande que, mesmo em um desenho simples com traços
rápidos, vê-se todo o projeto e sente-se todo o impacto que tal obra possui no sítio. Mostra-se
também um croqui inicial de uma idéia de projeto de uma ex-aluna da disciplina, e a maquete
eletrônica, já na etapa de ante-projeto, em uma analogia aos croquis e métodos projetuais do
mestre franco-suíco. Para Ana Paula Gouveia (GOUVEIA, 1996:22):
“O mais importante a ressaltar nesta comparação não é a qualidade gráfica do
desenho, feito com pouquíssimas linhas, de contorno apenas, mas o reflexo pelo
qual o edifício impressiona o espelho d’água que compõe seu entorno. Esta imagem,
este efeito proporcionado pela arquitetura inserida dentro da paisagem já estava pelo
mestre, claramente definida pelo croqui.”
Fig.7– Palácio da Justiça, Chandigarh, Índia. CORBUSIER, Le.
Fig.8– Palácio da Justiça, Chandigarh, Índia. CORBUSIER, Le. (obra construída)
Fig.9– Idéia inicial de projeto residencial. VOLOSKY, Ivy. (3º semestre do curso de
Arquitetura e Urbanismo, UFPel)
Fig.10– Perspectiva projeto residencial, etapa ante projeto. VOLOSKY, Ivy. (3º semestre do
curso de Arquitetura e Urbanismo, UFPel)
4. ACERCA DA DISCIPLINA: RESULTADOS E CONCLUSÕES
Mesmo que existam pessoas com maior potencial para desenvolverem a linguagem do
desenho, todos os indivíduos podem desenvolver um trabalho no sentido de ampliar suas
habilidades. Nas primeiras aulas do semestre, praticamente todos os estudantes sentem-se
intimidados, talvez até amedrontados, quando debruçados sobre uma folha de papel em
branco. De acordo com Beatriz Regina Dorfman (DORFMAN, 2007:2):
“Em pleno século XXI, ainda persiste no senso comum a mentalidade corrente de
que a habilidade para o desenho é um dom inato. Uma das maiores dificuldades para
o ensino do desenho é o preconceito a respeito da necessidade de se possuir algum
dom especial para aprender a desenhar.”
Porém, com o decorrer do tempo e das aulas, muitos alunos que no começo pareciam um
tanto “amedrontados” foram perdendo tal sentimento, e realmente vivenciando o desenho
como um exercício prazeroso. Esses estudantes que conseguiram chegar a um nível bom de
desenho, seguiram um aprendizado linear, com treinamento dentro e fora da sala de aula,
demonstrando disciplina e vontade no ato de “querer desenhar”. Essa sequência é de
fundamental importância, pois, de acordo com Beatriz Regina Dorfman (DORFMAN,
2007:4):
“O desafio e a dificuldade funcionam como combustíveis para o desenvolvimento
do trabalho e isto faz com que a disciplina seja indispensável, porque ela preenche
as lacunas entre patamares de envolvimento e impedem que haja interrupção.”
Para comprovar tais afirmações, mostram-se alguns desenhos realizados por alunos da
disciplina.
Fig. 11– Falling Water House, Frank Lloyd Whright. ZIGGIATI, Pedro.
Fig. 12– Desenho em papel colorido. BRUGNHAGO, Thamara.
Fig. 13– Perspectiva Rua. SCHNEID, Geovana.
5. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARTIGAS, João Vilanova. O desenho. Natal: Nossa Editora: 1984.
CORBUSIER, Le. Diário de Viagem e Arquitetura. Rio de Janeiro, 2006.
CORBUSIER, Le. Voyage d’Orient. Milão Carnets Electa.Architecture, 2002.
DA VINCI, Leonardo. El Tratado de la Pintura. Versión española de la edición de 1828.
Buenos Aires: More-Mere, 1924.
DORFMAN, Regina Beatriz. Pensar em palavras ou a Biologia do desenho. Porto Alegre:
PUCRS, 2007.
GOUVEIA, Ana Paula Silva. O croqui do arquiteto como objeto artístico. São Paulo:
FAUUSP, 1996.
KLEE, Paul. Notebooks. Vol. 1. The thinking eye. London: Lund Humphries, 1969.