A legitimação cultural dos quadrinhos e o Programa Nacional ...
Analise de Fontes Para Estudo Da Legitimação Regia Visigoda
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Analise de fontes para estudo da legitimação regia visigoda
Júlio César do Carmo de Sá1
Dentro do cenário criado pelos visigodos ao adentrarem a PenínsulaIbérica e se estabelecerem inicialmente ao norte da península em Toulouse,
muitos foram os fatos que propiciaram sua permanência neste território, mas
acima de tudo, foram grandes os processos de transformação\adaptação pelo
qual passou este povo. Seria complicado a analise deste período se não fosse
pelos documentos deixados por Isidoro de Sevilha, que possibilitam um melhor
entendimento e descobertas constantes sobre a permanência e expansão dos
Visigodos dentro da Península Ibérica.
Isidoro de Sevilha (em castelhano: San Isidoro de Sevilla; em latim:
Sanctus Isidorus Hispalensis) (Cartagena, 560 - Sevilha, 4 de abril de 636) foi
um teólogo, matemático e doutor da Igreja, além de arcebispo de Sevilha,
considerado um dos grandes eruditos e o primeiro dos grandes compiladores
medievais. Isidoro nasceu na cidade de Cartagena (Espanha) em 560, filho de
Severiano e Teodora, ambos de alta nobreza e virtude. Foram seus irmãos São
Leandro, que o precedeu na Sé de Sevilha, São Fulgêncio, bispo de Ecija, eSanta Florentina, da qual se diz que governou 40 conventos e mil monjas.
Embora sendo um dos autores mais lidos e plagiados de seu tempo, esse grande
Doutor da Igreja não teve um biógrafo contemporâneo. Assim, sua vida, além
dos traços gerais conservados pela tradição, tem que ser adivinhada em seus
inúmeros escritos.
Em meados do ano 600, tendo falecido Leandro, Isidoro foi escolhido
pelo rei e pelo povo para substituí-lo na Sé de Sevilha, então a principal de toda
a Espanha. Podemos perceber a importância que a Hispania tem em seus
trabalhos quando lemos sua “ Laude Spaniae”.
Hispania... rainha de todas as províncias, da qual recebememprestadas as luzes não apenas o Ocidente, mas também o Oriente.
1 Mestrado Profissional em História Ibérica, Unifal-MG, e-mail: [email protected]
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Tu és a honra e o ornato do mundo, a mais ilustre porção da terra, naqual a gloriosa fecundidade da nação goda se recria e floresce2
Ao analisar sua obra percebemos que o ambiente em que Isidoro seformou estava em ebulição. Como o reino passava por um processo de
unificação territorial e religiosa, os poderes internos estavam tentando ganhar
seu espaço. Isidoro de Sevilha, por meio de alguns de seus trabalhos, foi um dos
principais responsáveis pela construção do conjunto de concepções políticas
relativas à Monarquia visigoda, bem como, pela solidificação e normatização
dessa instância de poder, especialmente, quando observamos os Concílios
visigóticos3
. Durante este período percebemos transformações, no qual buscava-se a unidade religiosa, política, legal, administrativa e de identidade do reino.
Nos cenários conciliares que se iniciaram no reinado de Recaredo, foram-
se introduzindo conexões tendentes a aquilatar a estratégia que buscava a
colaboração dos bispos no âmbito fiscal. Em termos gerais, o modelo inaugurado
no III Concílio de Toledo manteve-se de pé até o final do reino visigodo.
No século VII, buscava-se o reforço dos aspectos de estabilidade política
e respaldo ideológico da realeza, precisamente, no ambiente que, na prática,
foram enormemente tensos e violentos. No âmbito do discurso teórico, havia-se
alcançado a definição da aliança entre rei e bispos. Evidentemente, essa aliança,
selada na conversão, supôs, para ambas as partes, uma plataforma de poder e
novas vias estratégicas, o que não significava que conseguiram resolver seus
problemas.
É esta a visão que nos passa, santo Isidoro de Sevilha sobre a formaçãodesta região após a chegada e permanência dos Godos, ele nos apresenta uma
imagem onde, de forma simultânea, observamos reflexos e anúncios. Sua obra
em conjunto com os documentos e atas provenientes dos concílios que aí se
iniciam formam um cenário propicio para investigações com relação a formação
2 ISIDORO DE SEVILHA De laude Spaniae In ISIDORO DE SEVILHA HistoriaGothorum, Vandalorum et Suevorum. Ed. bilíngüe (latim-espanhol) de C. Rodriguez Alonso.
Leon, Centro de Estúdios Investigación “San Isidoro”, 1975, pp168-169.3 CONCILIOS VISIGÓTICOS E HISPANO-ROMANOS. Ed. bilíngue (latim-espanhol) de J. Vives. Barcelona-Madrid: CSIC, 1973.
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de uma nova imagem regia no reino visigodo ligada aos conceitos romanos e
derivados do mesmo em alguns aspectos. Sua Hispânia é a rainha de todas as
províncias.
“Memória ainda guardava a ideia de uma Hispania romana; tambémda mediterrânea Roma aeterna, que unia o Ocidente e o Oriente. Masessas impressões já se mostravam embaçadas. Tinham que buscarnoutras partes a luz que lhes daria maior nitidez. Ornato do mundo, aHispânia mostra possuir luminosidade própria. Individualizada, ela projeta seus clarões sobre o Nascente e o Poente. Todavia, na maisilustre porção da terra, já não é Roma que floresce, mas a gloriosafecundidade da nação goda. Obscurecida há tempos, a imagem daunidade mediterrânica mostrava-se agora estilhaçada. O fim douniversalismo imperial abrira espaço para as partes. Partido o espelho,seus fragmentos ganham contornos. ” (ANDRADE FILHO,2013, p.125)
Fazendo uma análise da obra de Isidoro, Ruy de Oliveira Andrade Filho 4
em Imagem e Reflexo5, nos apresenta qual seria a ideia que seria transpassada
pela permanência e relação dos Visigodos com a península, a partir daí quais
foram os desafios que este povo enfrentou até sua total permanência (que não
seria duradoura) como moradores e cidadãos desta região.
Todo o processo que levou a “conversão” do Visigodos para o
cristianismo, culminou em um crescimento e fortalecimento dentro da península
ibérica de ações que irão levar o Reino Visigodo a se fortalecer, como Já diria
Isidoro de Servilha, os cacos do espelho vão tomando formas, esta visão já
exemplifica o que ocorria em toda a Europa neste período, sendo este
crescimento godo, algo natural para o desenvolvimento de parte deste
continente.
4 Ruy de Oliveira Andrade Filho - Formado em História pela FFLCH-USP, onde
também fez o doutoramento sob orientação do Prof. Dr. Hilário Franco Jr. Professor de HistóriaMedieval da Faculdade de Moema, Faculdades Associadas do Ipiranga e da PUC-SP.Atualmente leciona História Medieval na UNESP-ASSIS. Membro da Associação Brasileira deEstudos Medievais (ABREM), da Sociedade Argentina de Estudos Medievais (SAEMED) ecoordenador de História Medieval do NEAM (Núcleo de Estudos Antigos e Medievais -UNESP-Assis). Colaborador brasileiro da International Medieval Bibliography (Leeds) emembro do Centre Européen d`Art et de Civilisation Médiévale (Conques). É co-autor comHilário Franco Jr de O Império Bizantino (Brasiliense) e Atlas de História Geral (Scipione).Autor de Os muçulmanos na Península Ibérica (Contexto). Entre 2010 e 2011 realizou estágiode pós-doutorado na Universidade de Barcelona, sob supervisão da Profa. Titular Gisela Ripoll.Desde 1999 desenvolve atividades de pós-graduação na UNESP-Assis e dedica-se, atualmente,com maior ênfase à pesquisa da Hispânia visigoda, religiosidade, política, cultura e imagináriomedievais Fonte: Lattes
5 ANDRADE FILHO. Ruy de Oliveira; Imagem e Reflexo: Religiosidade e Monarquiano Reino Visigodo de Toledo (Séculos VI-VIII), São Paulo: Editora da Universidade de SãoPaulo, 2012
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O contraponto elaborado pelo imperador e o rei nos esclarece: osreflexos também se cobrem de anúncios. No ornato do mundo, prosperava agora a nação goda. “Inda que de forma esmaecida, oelogio isidoriano reconhecia os novos tempos. Os fragmentosdestacavam-se do todo, É do Reino de Toledo que recebememprestadas as luzes, não apenas o Ocidente, mas também o Oriente.Ilumina-se, ao menos entre as elites peninsulares, uma consciêncianacional. Mesmo tendo sido antes desposada por Roma, ao final, aflorescente nação dos godos, após grandes vitórias por todo o mundo,te amou e te conquistou ... (ANDRADE FILHO,2013, p.126)
Após esta adaptação ao território a Hispania se desgarrava cada vez mais
do restante do império e formava-se um novo conceito gens et Patria Gothorum,
reunindo diversos elementos sociais e territoriais de raízes basicamente romanas
sob uma única denominação étnica dos godos, pensando neste sentido , podemos
analisar esta formação como uma Hibridação das formas culturais que nestemomento se formavam, o hibridismos neste caso e com base nas análises de
Peter Burke vem da nova formação cultural e étnica que se formava junto a este
povo, não esquecendo de suas raízes mas se adaptando ao modo de vida romana.
Tomando como base o trabalho de Isidoro, podemos visualizar, portanto, que a
partir deste momento, uma nova formação cultural se iniciava e as bases
romanas decaiam cada vez mais. “É o próprio Isidoro, culturalmente um
hispano-romano, que comemora a vitória dos godos sobre os últimos redutos daRoma Oriental. ” (ANDRADE FILHO,2013, p.127). Em sua História Gothorum
encerrase no quinto ano do gloriosíssimo príncipe Suintila, nenhum imperador é
mencionado, a Roma aeterna caíra irreversivelmente e as características deste
novo reinado Visigodo se apresenta firme e glorioso.
Percebemos que para Isidoro os olhares se desviavam de imagens
abstratas para a concretude dos novos reflexos, pois passou-se lentamente de um
universalismo romano para os particularismos /regionalismos dos reinos
germânicos. As imagens eram ainda pouco nítidas e ensaiavam unidades
políticas e territoriais. Fica evidenciado que naquele momento de formação de
novos conceitos dentro do império, a diversidade de povos que permaneciam e
usufruíam dos benefícios romanos, mantinham seus preceitos culturais, de certa
forma esta permanência desfocou a imagem de soberania do Império e fez, como
cita anteriormente o autor , com que a imagem resplandecente do império se
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mantivesse opaca, que este mosaico que se formava dentro do império apesar de
novo, não caracterizasse o espelho como espelho mas como algo novo.
O que nos chama a atenção e que alguns autores mesmo de forma distinta
aparentam ocultar a pluralidade dos povos e também sua heterogeneidade. “Se écerto que de onde se podia avistar o Mediterrâneo as luzes de Roma se
projetavam sem grandes dificuldades, noutros cantos o poderio dos césares era
frequentemente contestado. Às vezes, até mesmo inexistente. Longe de se
postarem como reflexos passivos, as gentes da Hispania também arremessavam
suas imagens. Mesclavam-se as tintas e, disto se originaria uma multiplicidade
de tons. Às cores trazidas por Roma, os peninsulares acrescentariam as suas”.
(ANDRADE FILHO,2013, p.128)
A partir da conversão do reino, três concílios trataram explicitamentea questão da idolatria40 • O 3Toledo (589) reconhece o arraigamentoda idolatria na "Gália e Espanha". Determina-se que o bispo e o juizda diocese não demorem para "investigar e exterminar o queencontrarem", e àqueles que frequentam tais erros, "salva sempre avida", devem ser castigados com as penas possíveis. Também ameaçaao bispo e ao juiz com a excomunhão, caso não procedam dessamaneira. E, se algum senhor não fizer o mesmo em suas posses, proibindo seus servi de tais pecados, também ele será privado da
comunhão (3Toledo, 16).
6
Nesta perspectiva se inicia um trabalho de elaboração de uma teoria
política, que buscava garantir a Monarquia através de um sistema teológico,
onde ganham destaque, especialmente, as ideias de Isidoro de Sevilha. A partir
destas ideias que há a formação do poder em todo o reino.
O cânone 75 do 4Toledo, reconhecia o monarca como ungido doSenhor, Christus Domini. Preservava-se, contudo, a Monarquiaeletiva, dispondo-se que morto pacificamente o rei, a nobreza de todo
o povo, em união com os bispos, designaria, de comum acordo, osucessor do trono. Estipularam-se anátemas para aqueles que fossemculpados de infidelidade, que atentassem contra a estabilidade da pátria (sic), do povo dos godos e da pessoa do rei. Ressalvava-se,todavia, que se algum rei desrespeitasse a lei ou governassedespoticamente, com soberba, entre delitos, crimes e ambições, sejacondenado com sentença de anátema, por Cristo Senhor, e sejaseparado e julgado por Deus, porque atreveu-se a trabalhar mal e levaro reino à ruína. Esta disposição do concílio encontrava respaldo noutra
6 ANDRADE FILHO, Ruy de Oliveira. Espaços e fronteiras entre o cristianismo e o
paganismo no reino visigodo católico. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA, 20., 1999,Florianópolis. História: fronteiras. Anais do XX Simpósio da Associação Nacional de História.São Paulo: Humanitas – FFLCH-USP/ANPUH, 1999, p. 1031
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obra de Isidoro, que recolhia a conhecida sentença rex eris se recte
facias, si non facias non eris. O mencionado cânone 75 aindareconhecia o monarca como escolhido do Senhor, Christos meos,através da gratia Dei. A frase rex Dei gratia não aparece nadocumentação disponível sobre o reino de Toledo; porém, a expressãocitada, assim como a frase isidoriana Suintila gratia divina regni(...) possuem um valor conceitual equivalente. Era, dessa forma, umadesobediência às normas divinas. (ANDRADE FILHO,2013, p.143-144)
Por estes preceitos, regras e normas que vem juntamente com a
efetivação do poder divino no rei, são em base, para garantir que o reino
prosperasse e que o cristianismo ocupasse seu espaço dentro das novas formas
aristocráticas de expansão do poder, se fixa neste momento a igreja como parte
preciosa do poder terreno, em comum acordo com o poder divino, para uma
melhor vida do povo e a difusão da fé cristã.
É através deste viés procuraremos buscar responder as questões que
circundam esta questão relacionada a união do régio ao “divino cristão”, não
somente como uma legitimação deste poder na terra, mas sim, tudo que está
ligado a esta parceria, questões tanto da parte política como na parte religiosa,
até iria as obrigações e benefícios de ambas as partes deste casamento. Nosso
intuito ao investigar estes processos que culminaram na formação real no reinoVisigodo é a de estabelecer parâmetros que possam ser base para o entendimento
da formação de outros reinos após o termino deste e a partir daí, entender como
se procedeu esta união do Régio com o divino a partir deste momento, não tendo
somente uma visão dos deveres e da posição Cristã, mas também do pensamento
que se inicia com estes fatos, buscando um melhor entendimento deste período.
BIBLIOGRAFIA
FONTES
CONCILIOS VISIGÓTICOS E HISPANO-ROMANOS. Ed. bilíngue (latim-espanhol) de J.Vives.
Barcelona-Madrid: CSIC, 1973.
ISIDORO DE SEVILHA De laude Spaniae In ISIDORO DE SEVILHA Historia Gothorum,
Vandalorum et Suevorum. Ed. bilíngüe (latim-espanhol) de C. Rodriguez Alonso. Leon, Centro
de Estúdios Investigación “San Isidoro”, 1975.
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ISIDORO DE SEVILHA. Etymologiarum, V, 39, 25. ISIDORO DE SEVILHA Etymologiarum. Ed.
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