ANÁLISE DA LEI ANTITERRORISMO E SUA APLICAÇÃO EM CRIMES...

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ PALIMECIO GIMENES GUERRERO JUNIOR ANÁLISE DA LEI ANTITERRORISMO E SUA APLICAÇÃO EM CRIMES ENVOLVENDO ARMAS QUÍMICAS CURITIBA 2017

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

PALIMECIO GIMENES GUERRERO JUNIOR

ANÁLISE DA LEI ANTITERRORISMO E SUA APLICAÇÃO EM CRIMES ENVOLVENDO ARMAS QUÍMICAS

CURITIBA

2017

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PALIMECIO GIMENES GUERRERO JUNIOR

ANÁLISE DA LEI ANTITERRORISMO E SUA APLICAÇÃO EM CRIMES ENVOLVENDO ARMAS QUÍMICAS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito, da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Dr. Murilo Henrique Pereira Jorge.

CURITIBA

2017

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TERMO DE APROVAÇÃO

PALIMECIO GIMENES GUERRERO JUNIOR

ANÁLISE DA LEI ANTITERRORISMO E SUA APLICAÇÃO EM CRIMES ENVOLVENDO ARMAS QUÍMICAS

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado e aprovado para obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ___de ________________de 2017.

________________________________________ Prof. Doutor Eduardo de Oliveira Leite Coordenador do Núcleo de Monografias

Universidade Tuiuti do Paraná

__________________________________________ Orientador Prof. Doutor Murilo Henrique Pereira Jorge

Faculdade de Ciências Jurídicas Universidade Tuiuti do Paraná

Prof.__________________________________________ Faculdade de Ciências Jurídicas Universidade Tuiuti do Paraná

Prof. _________________________________________ Faculdade de Ciências Jurídicas Universidade Tuiuti do Paraná

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AGRADECIMENTOS

-Primeiro à Deus por permitir a saúde e motivação para realização desse

trabalho.

- Ao Professor Doutor Murilo Jorge pela competente orientação.

-À minha família em especial minha amada esposa Silvana Ripka e meus

adoráveis filhos Luma e Matheus.

-À Dra. Camila Gomes Colasso pela doação do livro “Armas Químicas. O Maú

uso da Toxicologia.

-À todas as pessoas que contribuíram para a realização desse trabalho.

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“Tantas vezes pensamos ter chegado.

Tantas vezes é preciso ir mais além.”

(Fernando Pessoa)

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RESUMO

O presente trabalho descreve a análise jurídica da Lei Antiterrorismo (Lei 13.260/2016) sancionada em Março de 2016 em obediência ao comando constitucional previsto no Artigo 5o inciso XLIII da Carta Magna. A Lei Antiterrorismo disciplina no ordenamento jurídico brasileiro atos específicos referentes às condutas humanas que se amoldam ao tipo incriminador do delito de terrorismo e suas respectivas penalidades. Além disso, o trabalho apresenta uma discussão pormenorizada referente à aplicação da Lei Antiterrorismo envolvendo ataques terroristas com utilização de armas químicas, mostrando as suas principais propriedades toxicológicas e seu correspondente potencial destrutivo. Palavras-chave: terrorismo, armas químicas, lei antiterrorismo, crime hediondo, segurança nacional.

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ABSTRACT

The present work describe the juridical analysis of the Counter-Terrorism Law (Law no 13.260/2016) signed in March, 2016 as determined by Federal Constitution in Article 5o, incise XLIII. The Counter-Terrorism Law disciplines in the Brazilian Juridical Order specific acts regarding the human conduct which can be molded to obtain the type crime of terrorism and his respective penalties. Moreover, this work presents a detailed discussion to apply the Counter-terrorism Law involving terrorist attacks using chemical weapons, their main toxicological proprieties and corresponding powerful destructive effects.

Key Words: terrorism, chemical weapons, counter-terrorism law, heinous crime, national security.

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LISTA DE ABREVIATURAS

Art. Artigo

C. Colendo

CRFB Constituição da República Federativa do Brasil

E. Egrégio

HD Mostarda Enxofre

HN-1 Mostarda Nitrogenada

OPCWa. Organisation for the Prohibition of Chemical Weapons

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 09

1.1 ARMAS QUÍMICAS E SEU EMPREGO EM ATAQUES TERRORISTAS 10

2 A DISTINÇÃO ENTRE O TERRORISMO E GUERRA 11

3. A CONCEPÇÃO DO BEM JURÍDICO PENAL E SUA INTERPRETAÇÃO

CONSTITUCIONAL 12

3.1 PREVISÃO CONSTITUCIONAL DO CRIME DE TERRORISMO 14

4. ANÁLISE DA LEI ANTITERRORISMO 17

4.1 CLÁUSULAS DE CRIMINALIZAÇÃO 17

4.2 DA TIPIFICAÇÃO LEGAL DO DELITO DE TERRORISMO 18

4.3 O ELEMENTO ESTRUTURAL NO CRIME DE TERRORISMO 20

4.3.1 Condutas/Delitos-Meios .20

4.4 ELEMENTO TELEOLÓGICO .22

4.5 CAUSA DE EXCLUSÃO DO CRIME .23

4.6 O BEM JURÍDICO TUTELADO........................................................................24

4.7 DO FAVORECIMENTO PESSOAL NO CRIME DE TERRORISMO.............24

4.8 DOS ATOS PREPARATÓRIOS NO CRIME DE TERRORISMO....................25

4.9 RECRUTAMENTO E ORGANIZAÇÃO PARA PRATICA TERRORISTA....26

4.10 FINANCIAMENTO DO CRIME DE TERRORISMO.......................................26

4.11 AUMENTO DE PENA NO CRIME DE TERRORISMO...................................26

4.12 INQUÉRITO POLICIAL E COMPETÊNCIA PROCESSUAL..........................27

4.13 TRATADOS INTERNACIONAIS NO COMBATE AO TERRORISMO..........28

4.14 REFORMULAÇÃO DO CONCEITO DE ORGANIZAÇAO TERRORISTA....29

4.15 TERRORISMO COMO CRIME HEDIONDO.....................................................30

4.16 APLICAÇÃO DA PRISÃO TEMPORÁRIA........................................................31

4.16.1 O Crime de Terrorismo como Delito de Prisão Temporária................................32

5 O TERRORISMO ENVOLVENDO ARMAS QUIMICAS..........................32

5.1 ARMAS QUÍMICAS E A LEI 13.260/2016........................................................32

5.1.1 Agentes Neurotóxicos..........................................................................................34

5.1.2 Agentes Vesicantes.............................................................................................35

5.1.3 Agentes Sufocantes.............................................................................................36

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5.1.4 Agentes Sanguíneos...........................................................................................37

5.2 A PROIBIÇÃO DE ARMAS QUÍMICAS........................................................37

6 APLICAÇÃO DA LEI ANTITERRORISMO NO CASO CONCRETO. A

OPERAÇÃO HASHTAG.................................................................................38

CONCLUSÃO 42

REFERÊNCIAS 43

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1 INTRODUÇÃO

Inicialmente apresentaremos de maneira sintética as principais

características envolvendo o fenômeno de terrorismo e os conceitos fundamentais e

respectiva toxicidade de armas químicas com potencial para serem utilizadas em

ataques terroristas.

A palavra terror apareceu na língua francesa (terreur) em 1.335, originária

do latim terror, que designava “um medo ou uma ansiedade extrema correspondendo,

com mais freqüência, a uma ameaça vagamente percebida, pouco familiar e

largamente imprevisível.”(GUIMARÃES, 2007, p. 14).

Um dos primeiros instrumentos jurídicos a elevar o terrorismo como crime

internacional surgiu na década de 1.930 após os assassinatos do estadista francês Jan-

Louis Barthou e do Rei Alexandre I da Iugoslávia. Esses importantes fatos históricos

motivaram a comunidade européia a criar a primeira convenção para prevenir o

terrorismo (CRETELLA NETTO, p. 19, 2008).

Uma das primeiras definições de “atos terroristas” foi estabelecida na

Convenção de Genebra para a prevenção e repressão do terrorismo em 1937. Assim,

atos terroristas foram entendidos com atos criminosos dirigidos contra um Estado com

o objetivo de causar terror em determinadas pessoas ou no público em geral.

Consequentemente, houve uma grande crítica na época, pois tal convenção não definiu

o fenômenos de terrorismo e sim os atos de terrorismo (CRETELLA NETTO, p. 19,

2008).

Estabelecer de maneira adequada e precisa o termo terrorismo é uma tarefa

de difícil elucidação por tratar-se de uma modalidade criminal que ocorre em diversos

países, onde cada nação enfrenta essa questão de forma peculiar.

Gabbellini (p. 6, 2016, apud Fragoso, p. 12, 1981) considera que a

dificuldade semântica em estabelecer um conceito de terrorismo incide principalmente

na inexistência de uma figura penal específica para esse tipo de delito. A nomenclatura

do terrorismo aplica-se a diversas modalidades delitivas que têm como pontos em

comum a causa de dano considerável a pessoas e coisas e principalmente no sentido de

criar terror ou intimidação generalizada com propósitos político-sociais.

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Dessa forma, faz-se necessário estabelecer os pressupostos principais dos

fenômenos terroristas, no sentido de compreender e identificar essa manifestação nas

sociedades atuais. Nesse aspecto, determinante se apresenta o estudo desse fenômeno

para possibilitar o mais adequado tratamento penal. É importante salientar que devido

a complexidade do tema e pelas conseqüências sociais dos atos terroristas, o

tratamento legal equivocado e sem consistência jurídica tende muitas vezes a criação

de leis ineficientes no combate ao terrorismo.

Apesar de não haver consenso a respeito de um conceito universal de

terrorismo, parece haver concordância à necessidade de um fator específico para a sua

constituição. O próprio termo terrorismo, em sua acepção comum significa um estado

psíquico de grande medo e pavor (WILKINSON, p. 13, 1976).

1.1 ARMAS QUÍMICAS E SEU EMPREGO EM ATAQUES TERRORISTAS

Armas químicas são definidas como qualquer substância cujas propriedades

tóxicas são utilizadas com a finalidade de matar, ferir ou incapacitar um grande

número de indivíduos em situações de guerra ou em ataques terroristas (COLASSO, p.

21, 2015).

O uso de substâncias químicas como armamento foi introduzido no século

XIX, com o surgimento de bombas incendiárias de arsênio, que liberavam nuvens de

fumaça tóxica que ao atingirem as pessoas apresentavam espasmos musculares,

vômitos intensos, colapso cardiovascular e morte em poucas horas de inalação

(GOLISZEK, p. 52, 2004). De acordo com França (p. 84, 2010), as armas químicas

apresentam um alto potencial de uso por parte de grupos terroristas e paramilitares,

independente de seu tamanho ou importância militar.

Os mais recentes ataques terroristas que utilizaram armas químicas são

apresentados a seguir:

Em junho de 1.994, um ataque terrorista com gás Sarín ocorreu em

Matsumoto no Japão por um grupo radical religioso provocando a morte de dezenas de

pessoas e mais de 300 feridos (OKUMURA, p. 129, 1996).

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Na Rússia em 2.002 um grupo terrorista invadiu um teatro e lançou o gás

químico denominado de quinonuclidinil-benzilato (BZ) matando cento e dezoito

reféns. (COLASSO, p. 60, 2015).

Atualmente, o grupo Estado Islâmico (EI) tem realizado ataques terroristas

como o ocorrido no Iraque em 2.006 matando cento e quinze pessoas com gás cloro.

Além disso, é importante destacar o ataque terrorista em uma escola no Afeganistão

em 2.010 que resultou em seiscentos e setenta e duas vítimas envenenadas com

praguicidas (VICE NEWS, 2015).

É importante destacar que no dia 04 de abril de 2.017 o governo da Síria

liderado por Bashar-al Assad atacou sua própria população com gás Sarín provocando

a morte de 86 pessoas causando perplexidade mundial.1

Assim, percebe-se que as armas químicas são consideradas armamentos não

convencionais de baixo custo. Como o custo das armas químicas é muito menor do

que as nucleares, são denominadas de “bombas atômicas dos pobres.”

Esse fato é verdadeiro, ainda quando se sabe que a tecnologia necessária para

a criação e uso desse tipo de arma é muito simples e de fácil acesso para quaisquer

grupos terroristas interessados na sua utilização com o propósito de provocar um

grande número de vítimas fatais.

2 A DISTINÇÃO ENTRE TERRORISMO E GUERRA

É destacado por Wilkinson (p. 19, 1976) a grande dificuldade de distinção, de

forma nítida, o terrorismo do ato de guerra. Entretanto, é importante salientar que

considerando a dificultosa tarefa de diferenciação entre essas duas condutas humanas

degradantes, a guerra e o terrorismo não refletem um mesmo fenômeno.

Em caso de guerra, existem certas diretrizes a serem seguidas pelos Estados

(como por exemplo, as dispostas nas Convenções de Genebra que regulam a tutela de

militares feridos, o tratamento a prisioneiros e a proteção de civis).

__________________ 1 Disponível em: https://www.nytimes.com/2017/04/06/world/middleeast/chemical-attack-syria.html. Acesso em: 10/04/2017.

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Assim, os atos de guerra são distintos dos atos de terrorismo, considerando-

se os primeiros juridicamente legítimos em algumas situações específicas, ou em

outras, constitutivas de crimes de guerra (LLOBET, p. 127, 2010).

Por outro lado, o terrorismo não configurando ato de guerra carece de poder

militar. Assim, o terrorismo se diferencia principalmente de um conflito armado de

grande intensidade, pois as práticas dos atos de terror configuram uma estratégia

frequentemente mais débil (CALLEGARI et al, p. 66, 2016). Como resultado dessa

característica, o terrorismo necessita de um equivalente à força militar que não possui.

Esse equivalente normalmente é encontrado nos meios específicos de ação terrorista

como a seleção de objetos distintos como alvos de sua agressão, com o objetivo de

gerar uma ameaça generalizada em toda a sociedade. Óbvio, considerando o grupo de

agentes terroristas possuir um grande poderio militar não era necessário o apelo à

estratégia de disseminação do terror.

É importante destacar que a diferenciação entre o ato terrorista e o ato de

guerra importará em conseqüências diretas na forma de combate ao terrorismo a ser

adotada pelo Estado. Ou seja, a abordagem para os fenômenos da guerra e terrorismo

são diferentes levando em consideração suas motivações e conseqüências especiais.

De acordo com a doutrina, o grande equívoco atualmente cometido por

alguns Estados no combate ao terrorismo é adotar o discurso “guerra ao terror”,

exercendo deliberadamente atos de combate militar em grande escala. Entretanto, o

ideal seria preservar a distinção entre o terrorismo e a guerra reservando para esse

último o tratamento próprio de um ato criminoso (CALLEGARI et al, apud

FERRAJOLI, p. 364, 2007).

É imperioso salientar que o combate ao terrorismo tem como alvo principal a

proteção de bens jurídicos protegidos pela Constituição Federal, que serão

apresentados a seguir.

3 A CONCEPÇÃO DO BEM JURÍDICO PENAL E SUA INTERPRETAÇÃO

CONSTITUCIONAL

O conceito de bem jurídico passa por várias concepções em busca de uma

definição precisa. Uma delas é o fato do bem jurídico transcender o direito positivo de

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corte jus naturalista ou da política criminal para os quais os bens jurídicos podem ser

considerados no direito natural ou na vida social (GABBELINI, p. 79, 2016).

Críticas foram produzidas no sentido de que o legislador poderia estabelecer

como crimes o que melhor conviesse, dando ensejo à possibilidade de arbitrariedade

da ingerência do Estado em relação ao cidadão.

Outra concepção entende que o bem jurídico integra o próprio ordenamento

jurídico. Ou seja, o bem jurídico não tem existência própria antes da norma, mas sim,

nasce com ela (BUSATO, p. 42, 2007).

O ordenamento penal brasileiro atua em conjunto com os princípios

constitucionais do Estado Democrático de Direito, assumindo a efetiva proteção aos

bens jurídicos. Assim, o direito penal deve estar voltado à proteção efetiva dos bens

juridicamente relevantes apresentados pela Constituição Federal e qualquer ofensa aos

seus princípios justifica a legítima ação estatal.

A Constituição Federal estabelece as diretrizes essenciais e a forma de

organização do Estado abarcando os direitos e garantias fundamentais nela guardados,

com a função de nortear a convivência pacífica e harmoniosa da sociedade.

Ferrajoli (p. 372, 2002) ensina que o direito penal deve recorrer à Constituição

visando encontrar os bens jurídicos para proteger com sanções:

Uma vez que nas constituições, já estão feitas as valorações criadoras dos bens jurídicos, cabendo ao penalista, em função da relevância social desses bens tê-los obrigatoriamente presentes, inclusive a eles limitando, no processo de tipologia criminal.

O direito penal brasileiro compõe, portanto, um ordenamento jurídico que tem

entre seus fundamentos principais no Estado Democrático de Direito, assegurar o

princípio da dignidade humana como prescrito no Artigo 1o, inciso III da Carta Magna:

Art. 1o, A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana.

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Entende-se que a única restrição imposta ao legislador se encontra nos

princípios da Constituição Federal (GABBELINI, p. 88, 2016, apud ROXIN, p. 55,

1997):

Portanto, um conceito material de bem jurídico vinculante político-criminal só pode derivar do contido, plasmado na Lei Fundamental do nosso Estado de Direito baseado na liberdade do indivíduo, através dos quais se marcam seus limites ao poder punitivo do Estado.

Mendes e Branco (2014, p. 136) justificam os bens jurídicos como núcleos

da proteção da dignidade da pessoa, e a Constituição da República Federativa do

Brasil deve positivar referidas normas assecuratórias dessa pretensão. Por sua vez,

Tavares (2015, p. 27) ressalta que os bens jurídicos em muito se aproxima da noção de

direitos naturais.

Ademais, apresenta Fernandes (2012, p. 307) sua definição sobre o tema:

Nesses termos, os bens jurídicos fundamentais seriam, ao mesmo tempo, ora vistos como direitos de defesa (ligados a um dever de omissão, um não fazer ou não interferir no universo privado dos cidadãos), principalmente contra o Estado; mas ainda, como garantias positivas para o exercício das liberdades (e aqui, entendidos como obrigações de fazer ou de realizar) por parte do mesmo Estado.

Assim, percebe-se que o ordenamento penal brasileiro em harmonia com os

princípios constitucionais assume a postura de instrumento de proteção aos bens

jurídicos fundamentais tutelados e a eles deve circunscrever-se.

3.1 A PREVISÃO CONSTITUCIONAL DO CRIME DE TERRORISMO

São considerados bens jurídicos tutelados no crime de terrorismo, a vida, a

incolumidade e a paz pública. Consequentemente, também se tutela, no aspecto do

poder público constituído e da ordem constitucional vigente, a estabilidade social e,

mais concretamente, a estabilidade política. (GABBELINI, p. 85, 2016)

O fundamento para a apreciação e constatação da relevância do bem

jurídico, a ponto de erigir como crime e sua violação deve ser determinado

fundamentalmente pela própria Constituição. A hierarquia dos bens jurídicos tem

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como matriz, a Carta Magna, que expressará a partir de seus princípios fundamentais e

da relação de direitos e deveres individuais, a vontade do Poder Constituinte.

A Constituição Federal de 1.988 cuidou de repudiar as práticas terroristas de

modo expresso, e colocou os bens jurídicos tutelados pertinentes ao terrorismo, ao lado

de outros da mais alta relevância, em primeiro plano de hierarquia de proteção devida

pelo atual ordenamento jurídico.

A inclusão do crime de terrorismo no chamado temário constituinte

demonstra, o grau de atenção que o sistema jurídico-político atribui ao tema.

Assim, podemos considerar que a prática do terrorismo, colide com bens

jurídicos protegidos pela Carta Magna essencialmente incluídos em alguns dos

princípios, direitos e garantias constitucionais fundamentais.

O cometimento de atos de natureza terrorista, em maior ou menor grau,

vulnera princípios fundamentais como a dignidade da pessoa humana (Artigo 1o,

inciso III da CF), a prevalência dos direitos humanos e da solução pacífica dos

conflitos (Artigo 4o, incisos II e VII da CF).

Além disso, destaca-se ainda que o Artigo 4o, inciso VIII da Constituição

Federal repudia expressamente o terrorismo como um dos princípios que regem o país

nas suas relações internacionais, vejamos:

Art. 4o, A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

(...) II – prevalência dos direitos humanos. VII – solução pacífica dos conflitos. VIII – repúdio ao terrorismo e ao racismo.

A Constituição Federal no caput do Artigo 5o, dos direitos e garantias

fundamentais, deixa clara a determinação da tutela de vários bens jurídicos,

especificando garantir aos brasileiros e estrangeiros residentes no país a

inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

Portanto, observa-se que a vida e a segurança (individual e coletiva) são valores mais

vulneráveis perante os atos terroristas como bens jurídicos a serem precipuamente

protegidos pela ordem jurídica.

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Sem dúvida, a proteção ao crime de terrorismo está nitidamente destinada a

proteger o interesse difuso ligado ao texto constitucional, cuja atividade legislativa deu

cumprimento aos objetivos fundamentais da República com previsto no Artigo 5o,

inciso XLIII da Carta Magna, vejamos:

Art. 5o, Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

XLIII – a Lei considerará crimes inanfiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.

Assim, a Lei no 13.260/2016 tem como preocupação salvaguardar os bens

jurídicos penais difusos, previstos no Artigo 5o da Constituição Federal, como a

inviolabilidade do direito a vida, a liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade

cuja norma vem a garantir a higidez do próprio sistema, tendo em vista o caráter

fragmentário do direito penal.

Segundo Gonçalves (p. 12, 2002), é importante salientar que o terrorismo

foi expressamente mencionado com destaque na Constituição Federal, mesmo em

norma considerada cláusula pétrea, além de constar da Lei de Crimes Hediondos.

Entretanto, antes da Lei 13.260/2016 encontra-se apenas um tipo penal que descreve o

crime de terrorismo no ordenamento jurídico brasileiro, mais precisamente no Artigo

20 da Lei 7.170/1983 (Lei de Segurança Nacional):

Artigo 20. Devastar, saquear, extorquir, roubar, seqüestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas. Pena: reclusão, de 3 a 10 anos. Parágrafo único - Se do fato resulta lesão corporal grave, a pena aumenta-se até o dobro; se resulta morte, aumenta-se até o triplo.

A seguir apresentaremos na presente Monografia uma análise crítica da Lei

13.260/2016.

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4 ANÁLISE DA LEI ANTITERRORISMO

A Lei no 13.260/2016, originada do Projeto de Lei da Câmara no 2.016, de

2.015, de iniciativa do Presidente da República e que tramitou em regime de urgência,

estipula diversos crimes relacionados com o terrorismo.2

Trata-se de uma grande conquista para o ordenamento penal brasileiro, dando

cumprimento aos mandados de criminalização, previstos no Artigo 5o, inciso XLIII, da

Constituição Federal, determinando dessa maneira a obrigatoriedade de edificação

referente à Lei de proteção ao terrorismo, passando a ser disciplinado pela Lei no

13.260/2016 (CALLEGARI et al, p. 89, 2016).

4.1 CLÁUSULAS DE CRIMINALIZAÇÃO

O legislador constituinte elevou vários preceitos, destinados a aumentar a

incidência do direito penal, para proteger a sociedade. Esses tipos de normas penais

constitucionais têm sido chamados pela doutrina de “cláusulas de criminalização”

(GABBELINI, p. 129, 2016).

As cláusulas de criminalização estabelecem obrigatoriedade do legislador

infraconstitucional criar normas que protejam bens jurídicos de forma adequada de

acordo com as disposições constitucionais (GABBELINI, p. 130, 2016).

A Lei no 13.260/2016 passou a disciplinar o crime de terrorismo e estabelece o

cumprimento do legislador com os ditames constitucionais, com a criação de

mecanismos legais para proteção contra este grave delito.

Atualmente, a mídia mundial apresenta o terrorismo com um dos mais graves

fenômenos de criminalidade que assola parte da Europa, Oriente Médio e América do

Norte. Podemos citar como exemplos ilustrativos: os ataque às torres gêmeas em Nova

York, ao edifício sede do jornal Charlie Hebdo em Paris e os recentes atentados

promovidos pelo Estado Islâmico.

_________ 2Regulamenta o disposto no Inciso XLIII do Artigo 5o da Constituição Federal, disciplinando o terrorismo, tratando de disposições investigatórias e processuais e reformulando o conceito de organização terrorista; e altera as Leis nos 7.960, de 21 de dezembro de 1989, e 12.850, de 2 de agosto de 2013. (BRASIL. Projeto de Lei da Câmara no 101/2015. Brasília, DF: Senado Federal. Disponível:WWW.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jessionid=EC6AC266795DA0B196F14CD263E83C6C.proposicoesWeb2?codteor=1373970&filename=Tramitacao-PL+2016/2015. Acesso em: 04/04/2017.

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Percebe-se nessa senda que o terrorismo é uma modalidade criminosa de difícil

combate, na medida em que, ocorre como um fator rudimentar e inesperado, haja vista

a sua imprevisibilidade baseada no comportamento humano. O terrorismo é um

exemplo clássico de crime transnacional que produz vários efeitos negativos em países

que não sofreram diretamente o atentado.

4.2 DA TIPIFICAÇÃO LEGAL DO DELITO DE TERRORISMO

O terrorismo é tipificado como prescreve o Artigo 2o da Lei no 13.260/2016:

Art. 2o, O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública. § 1o São atos de terrorismo: I - usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa; II - (VETADO) III - (VETADO); IV - sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa ou servindo-se de mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, instalações militares, instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás e instituições bancárias e sua rede de atendimento; V - atentar contra a vida ou a integridade física de pessoa: Pena - reclusão, de doze a trinta anos, além das sanções correspondentes à ameaça ou à violência. § 2o O disposto neste artigo não se aplica à conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais, sem prejuízo da tipificação penal contida em lei.

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Na análise do “caput” do Artigo 2o da Lei 13.260/2016 percebe-se

inicialmente que trata-se de crime comum que pode ser executado por apenas uma ou

várias pessoas. Além disso, observa-se que o tipo incriminador caracteriza-se como

uma típica Lei Penal em Branco.

Assim, para ocorrer o crime de terrorismo, deve estar presente na conduta do

agente os atos descritos no Artigo 2o da Lei 13.260/2016 as razões de xenofobia,

discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião que deverão ser

complementadas por outra lei. No caso, previstas, por exemplo, na Lei 7.716/1989

(Lei dos Crimes de Preconceito de raça ou cor) e Artigo 140, § 3o do Código Penal

(Injúria Racial).3

De acordo com Junqueira e Vanzolini (p. 97, 2013), normas penais em branco

são aquelas cujo preceito primário precisa ser complementado outro ato normativo. O

entendimento majoritário é de que o complemento da norma penal em branco, seja

qual for a sua origem, integra o tipo penal, sua aplicação no tempo regula-se pelas

normas penais.

A regra é, portanto, a retroatividade benéfica ao acusado. Entretanto, caso o

complemento tenha características de temporariedade ou excepcionalidade, vale a

aplicação da ultra-atividade penal.

O doutrinador Régis Prado (p. 198, 2007) ensina que “quando a lei penal em

branco objetiva assegurar o efeito regulador do elemento integrador temporal contido

em outro dispositivo legal, o efeito da regulação de normas de referência (o injusto no

momento do fato), mas não em relação às próprias normas, aplica-se o critério da

ultra-atividade.” Ademais, neste caso, além de perdurar o desvalor ético-social do

comportamento, o fator tempo componente do tipo penal incriminador é tido como

indispensável para garantir a sua eficácia.

É imperioso destacar que a redação do tipo penal de terrorismo da Lei

13.260/2016 não foge a tendência geral de reconhecimento do elemento essencial do

crime de terrorismo, qual seja a mensagem de terror.

_______________ 3 Artigo 140 Código Penal: Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro. § 3o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.

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Ao referir, em seu “caput” que ocorrerá ato de terrorismo quando a conduta

for voltada à “finalidade de terror social ou generalizado,” a lei reconhece o caráter

preponderantemente comunicacional do terrorismo, além da indiscriminação ou

aleatoriedade desse efeito, pois não pessoaliza o alvo da mensagem de terror,

direcionada a população de maneira geral.

Considerando a redação insculpida no “caput” do Artigo 2o da Lei

13.260/2016, não se exige que o sentimento de terror seja difundido em um número

indeterminado de pessoas, bastando que seja essa a finalidade do ato terrorista.

Entretanto, deve-se exigir que o ato praticado seja, ao menos, capaz de alcançar essa

finalidade, sob pena de caracterização de crime impossível.

É importante consignar que a difusão do sentimento de terror não constitui

uma mera circunstância objetiva, independente da vontade do agente. Ao contrário,

deve ser o objetivo primeiro e imediato do agente a intenção de provocar o sentimento

de terror, para o alcance eficaz de seu ato delituoso.

Dessa maneira, podemos considerar que o Artigo 2o da Lei 13.260/2016

conceitua o crime de terrorismo especificando dois elementos importantes: estrutural,

a forma de configuração e atuação e o elemento teleológico, os fins pretendidos com o

ato de terror (CALLEGARI et al, p. 91, 2016).

4.3 O ELEMENTO ESTRUTURAL NO CRIME DE TERRORISMO

4.3.1 CONDUTAS/DELITOS-MEIOS

As condutas típicas capazes de configurar o crime de terrorismo são

estabelecidas nos incisos do § 1o do Artigo 2o da Lei 13.260/2016, tratando-se de um

crime de ações múltiplas.

Muitas das condutas discriminadas nesse artigo, como por exemplo, “atentar

contra a vida ou a integridade física de pessoa” (Artigo 2o, § 1o, inciso V da Lei

13.260/2016) já são figuras incriminadoras nos Artigos 121 e 129 do Código Penal.4

__________________

4Artigo 121 do Código Penal: Matar Alguém (Homicídio) Artigo 129 do Código Penal: Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem (Lesão Corporal)

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Além disso, verifica-se um conflito aparente de normas penais, que seria

solucionado pelo princípio da consunção em relação à pena cominada às condutas

previstas no Artigo 2o da Lei 13.260/2016. Ou seja, de acordo com o princípio da

consunção o crime-fim (terrorismo) absorveria os delitos que consubstanciam a fase

necessária de sua consumação (crime-meio), evitando-se uma dupla punição do agente

e a preservação do princípio do ne bis in idem (CALLEGARI et al, pg. 92, 2016).

Entretanto, em seu preceito secundário, ao estabelecer a pena aplicável ao

crime de terrorismo, o tipo penal faz ressalva também à aplicação da sanção

correspondente à ameaça ou à violência (Pena – reclusão, de doze a trinta anos, além

das sanções correspondentes à ameaça ou à violência/crimes meio). Tem-se nesse

caso, uma concorrência de leis, devendo-se aplicar o tipo penal de terrorismo

concomitantemente a figura incriminadora referente à ameaça ou violência.

A doutrina atual não concorda com a tese da não aplicação do princípio da

consunção ao crime de terrorismo.

Nesse ponto, não estamos de acordo, que isso seja possível, pois, ficaria afastado o princípio da consunção, que resolve o conflito aparente de normas. Se os crimes-meios (violência ou ameaça) são um rito de passagem para o crime-fim (terrorismo), não deveria ser possível que o autor que pratique o terrorismo seja duplamento punido. Isso contraria as regras de aplicação do Direito Penal, e a dupla incriminação não pode ser aplicada (CALLEGARI et al, p. 92, 2016).

É importante salientar que na sistemática adotada pela legislação, se ausente o

elemento especial do terrorismo (finalidade de provocar terror social ou generalizado),

permanecerá a possibilidade de punição unicamente pela conduta criminosa simples,

ou seja, o meio de prática do terrorismo.

Nos incisos I a V do § 1o do Artigo 2o da Lei 13.260/2016, são descritas as

condutas por meio das quais o ato terrorista será executado. Nota-se a tendência à

descrição de atos de efeitos generalizados, o que caracteriza uma natureza de

amplitude comunicacional do terrorismo, que discutiremos a seguir:

O inciso I do § 1o do Artigo 2o da Lei 13.260/2016 que é um dos temas

principais da presente Monografia será discutido pormenorizadamente mais adiante.

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O inciso II do § 1o do Artigo 2o da Lei 13.260/2016 foi vetado quando de sua

sanção. A redação desse inciso contida no Projeto de Lei, destaca a conduta de

depredar qualquer bem público ou privado. Para a configuração do terrorismo,

conjugando-se a conduta antes prevista no inciso vetado com o especial fim de agir

(elemento teleológico do terrorismo), deve-se concebê-la como sendo, no caso a ser

examinado, capaz de provocar terror generalizado. Dessa maneira, acredita-se que a

conduta levada a efeito no sentido de depredar qualquer bem público ou privado, em

um primeiro momento, não é capaz de atingir a gravidade e a amplitude dos efeitos

próprios do crime de terrorismo. Entretanto, sendo adquirida a gravidade na conduta,

capaz de indicar a possível prática do terrorismo, acredita-se que esse ato será

abarcado na Lei 13.260/2016 (CALLEGARI et al, p. 93, 2016).

O inciso III (interferir, sabotar ou danificar sistemas de informática ou banco

de dados) foi também vetado na sanção presidencial da Lei 13.260/2016. Esse

dispositivo estabelecia o que se denomina de ciberterrorismo, que, de acordo com

Llobet essa conduta causaria o psíquico de terror na população (CALLEGARI et al,

apud LLOBET, p. 85).

No inciso IV, estabelece-se como conduta-meio para o terrorismo aquela

referente à sabotagem ou aponderamento de serviços.

Por fim, o inciso IV traz a curta referência ao atentado contra a vida ou

integridade física da pessoa. Assim, como em relação aos demais incisos acima

mencionados, deve-se sempre considerar os requisitos essenciais para a configuração

da gravidade do ato terroristas presentes no caput do Artigo 2o da Lei Antiterrorismo

4.4 ELEMENTO TELEOLÓGICO

O Artigo 2o da Lei 13.260/2016 no seu caput apresenta as motivações exigíveis

para a configuração do ato de terrorismo e a finalidade que deve estar

obrigatoriamente contida no ato de terror.

A motivação do ato terrorista será a circunstância subjetiva que faz mover a

vontade, ou seja, o dolo (CALLEGARI et al, apud FERRATER MORA, p. 236, 1964).

Como exemplo ilustrativo, podemos descrever o descontentamento de alguém com o

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crescente número de imigrantes em seu país, que serve de força motriz para a tomada

de alguma medida, que poderá se caracterizar em um ato de terrorismo.

Em relação às motivações do ato terrorista prevista na Lei 13.260/2016, o

Artigo 2o deixa clara a natureza discriminatória dessas condutas ao referir que o

terrorismo consistirá em atos praticados (por razões de xenofobia, discriminação ou

preconceito de raça, cor, etnia e religião).

4.5 CAUSA DE EXCLUSÃO DO CRIME

O § 2o do Artigo 2o da Lei 13.260/2016 faz menção a respeito da

inaplicabilidade do tipo penal de terrorismo em relação a manifestações diversas,

vejamos:

Art. 2o O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública.

(...)

§ 2o O dispositivo neste artigo não se aplica à conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais, sem prejuízo da tipificação penal contida em lei.

Dessa maneira, resguarda-se o livre exercício de manifestação, evitando-se, na

medida do possível, futuras tipificações equivocadas no tipo penal de terrorismo.

Entretanto, é importante destacar que a Lei 13.260/2016 ressalva ao final do

dispositivo legal supra citado, a possibilidade de responsabilização criminal por outros

fatos criminosos eventualmente praticados (CALLEGARI et al, p. 96, 2016)

Percebe-se que para a caracterização do crime de terrorismo deverá ocorrer a

intenção de produção de atmosfera de terror na população em geral, que é elemento

essencial do delito. Geralmente, em uma manifestação social ou reivindicatória não há

a motivação de criar terror na sociedade.

Além disso, o ataque indiscriminado à população, com o objetivo de causar

terror generalizado, elementos representativos da gravidade do terrorismo, jamais

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podem ser considerados adequados ou compatíveis com qualquer finalidade pretendida

em um Estado Democrático de Direito.

Dessa maneira, a problemática da tentativa de criminalização de manifestações

sociais diversas como atos de terrorismo será resolvido no âmbito da tipicidade,

quando se poderá excluir a aplicabilidade do tipo penal de terrorismo pela ausência de

algum elemento essencial que caracteriza o crime.

4.6 OS BENS JURÍDICOS TUTELADOS

O terrorismo previsto na Lei 13.260/2016 pode ser considerado um crime

atentatório a diversos bens jurídicos.

Em um primeiro momento, o terrorismo pode ser considerado como uma

violação do mesmo bem jurídico tutelado pela figura criminosa comum da qual se

utiliza para a prática do ato de terror. Como exemplo, se o ato terrorista levou a morte

várias pessoas por xenofobia ou preconceito racial, tem-se a Lei 13.260/2016 aplicada

para tutelar a vida. (CALLEGARI et al, p. 97, 2016).

Ademais, pode-se atribuir o combate ao terrorismo a tutela de bens jurídicos

mais amplos, como a paz pública e consequentemente a própria democracia.

O bem jurídico paz pública relaciona-se diretamente com a característica

comunicacional do terrorismo, que tem em seu cerne o objetivo de difusão do terror

nas pessoas e, por isso, atenta contra o sentimento de paz pública.

Um conceito interessante referente à paz pública é descrito por Cordero:

(...) a la tranquilidad y sosiego em relaciones de unos com otros, esto es, a las condiciones básicas para la convivência ciudadana, a la seguridad em el ejercicio de derechos y libertades sin temor a ataques contra las personas”. (CALLEGARI et al, apud CORDERO, p. 52, 2008).

4.7. DO FAVORECIMENTO PESSOAL NO CRIME DE TERRORISMO

Além da definição jurídica do delito de terrorismo, o Artigo 3o da Lei 13.260/2016 estipula a punição do crime de favorecimento pessoal em atos de terror:

Art. 3o Promover, constituir, integrar ou prestar auxílio, pessoalmente ou por interposta pessoa, a organização terrorista. Pena – reclusão, de cinco a oitos anos, e multa.

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O artigo legal acima segue uma tendência amplamente criticada pela doutrina

penal mundial, adotando o que se convencionou de “Direito Penal do autor”,

preocupando-se cada vez mais com a punição de simples status do sujeito, pertencendo

a um grupo determinado. Segundo Roxin (p. 177, 1997), esse modelo de

criminalização próprio do Direito Penal do autor é propulsionado pela preocupação

inerente em se evitar futuros delitos.

4.8 DOS ATOS PREPARATÓRIOS NO CRIME DE TERRORISMO

É imperioso destacar que o acolhimento da racionalidade penal de

adiantamento da punição, em uma preocupação preventiva, com reflexos na ideologia

do Direito Penal do inimigo, encontra-se no Artigo 5o da Lei 13.260/2016.5

Art. 5o Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de consumar tal delito. Pena – a correspondente ao delito consumado, diminuída de um quarto até a metade. § 1o Incorre nas mesmas penas o agente que, com o propósito de praticar atos de terrorismo: I – recrutar, organizar, transportar ou municiar indivíduos que viajem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade, ou II – fornecer ou receber treinamento em país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade. § 2o Nas hipóteses do § 1o, quando a conduta não envolver treinamento ou viagem para país distinto daquele de sua residência ou nacionalidade, a pena será a correspondente ao delito consumado, diminuída da metade a dois terços.

Esse dispositivo traz em seu caput a possibilidade de adiantamento da

intervenção penal, permitindo a punição dos atos preparatórios, o que conduz à

tentativa de implementação do Direito Penal de caráter preventivo ao ato punível.

Assim, observa-se que a Lei 13.260/2016 apresenta-se, portanto, compatível

com o pensamento punitivista que muitos resultados negativos produz já na atualidade

da intervenção penal (CALLEGARI et al, p. 99, 2016).

_____________ 5 De acordo com o Artigo 15 da Lei 13.260/2016, aplicam-se as disposições do Artigo 15 do Código Penal a respeito da desistência voluntária e do arrependimento eficaz na hipótese do Artigo 5o da Lei Antiterrorismo.

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4.9 DO RECRUTAMENTO E ORGANIZAÇÃO PARA PRÁTICA TERRORISTA

O § 1o do Artigo 5o estabelece a punição ao recrutamento, organização,

transporte e municiamento de indivíduos que viagem de seu país de origem a outro

diverso. Além disso, o agente que receber ou fornecer treinamento em país diverso

daquele de sua residência ou nacionalidade poderão ser punidos pela Lei 13.260/2016,

com pena referente ao delito consumado diminuída de um quarto até a metade desde

que demonstrado o propósito da prática terrorista.

Entretanto, quando o ato criminoso previsto no § 1o do Artigo 5o da Lei

13.260/2016 não envolver países distintos, mas permanece no âmbito nacional, haverá

a incidência do § 2o do Artigo 5o do mesmo diploma legal com pena referente ao crime

consumado diminuído da metade até dois terços (CALLEGARI et al, p. 101, 2016).

4.10 DO FINANCIAMENTO DO CRIME DE TERRORISMO

O Artigo 6o da Lei 13.260/2016 tipifica a conduta de financiamento do

terrorismo, vejamos:

Art. 6o Receber, prover, oferecer, obter, guardar, manter em depósito, solicitar, investir, de qualquer modo, direta ou indiretamente, recursos, ativos, bens, direitos, valores ou serviços de qualquer natureza, para o planejamento, a preparação ou a execução dos crimes previstos nesta Lei: Pena – reclusão, de quinze a trinta anos. Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem oferecer ou receber, obtiver, guardar, mantiver em depósito, solicitar, investir ou de qualquer modo contribuir para a obtenção de ativo, bem ou recurso financeiro, com a finalidade de financiar, total ou parcialmente, pessoa, grupo de pessoas, associação, entidade, organização criminosa que tenha como atividade principal ou secundária, mesmo em caráter eventual, a prática dos crimes previstos nesta Lei.

A Lei 13.260/2016 trata-se neste dispositivo uma tentativa importante de

combate efetivo ao terrorismo para sua realização depender de investimentos amplos,

buscando o legislador impedir que os recursos financeiros cheguem até o grupo

terrorista, independente da execução do tipo penal.

4.11 AUMENTO DE PENA NO CRIME DE TERRORISMO

O Artigo 7o da Lei 13.260/2016 prevê causa de aumento de pena para os

crimes previstos pela produção de lesão corporal grave ou morte:

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Art. 7o Salvo quando for elementar da prática de qualquer crime previsto nesta Lei, se de algum deles resultar lesão corporal grave, aumenta-se a pena de um terço, se resultar morte, aumenta-se a pena da metade.

É importante destacar que a ressalva na parte inicial do Artigo 7o (salvo

quando for elementar da prática de qualquer crime previsto nesta Lei), impossibilita

sua incidência no crime de terrorismo previsto no Artigo 2o, que já prevê como

modalidade do crime, em seu inciso V (atentar contra a vida ou a integridade física da

pessoa).

Segundo Calegari (p. 102, 2016) mesmo que não existisse a previsão do

inciso V do Artigo 2o da Lei ou a ressalva mencionada do Artigo 7o a incidência do

aumento de pena nestes casos seria equivocada:

Considerando a gravidade do crime de terrorismo, seria desarrazoado o aumento de pena em caso de ocorrência de lesão corporal ou morte. Ao menos uma delas normalmente se faz presente em atos de terrorismo, não se tratando de uma excepcionalidade, mas de uma circunstância normal desse crime.

Discordamos desses autores, e acertadamente descreveu o legislador no

Artigo 7o da Lei 13.260/2016. É necessário o aumento de pena neste crime

extremamente grave e degradante que dissemina o terror e principalmente quando há

lesão corporal grave e morte, claro observando se não existirem no caso concreto as

elementares do crime como previsto no Artigo 2o, inciso V.

4.12 DO INQUÉRITO POLICIAL E COMPETÊNCIA PROCESSUAL PARA

JULGAMENTO DO CRIME DE TERRORISMO

A lei 13.260/2016 estabelece no seu Artigo 11 a responsabilidade de

abertura de inquérito pela Policial Federal para investigação do crime de terrorismo e a

respectiva competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento dos

crimes previstos nesta Lei:

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Art. 11 Para todos os efeitos legais, considera-se que os crimes previstos nesta Lei são praticados contra o interesse da União, cabendo à Polícia Federal a investigação criminal, em sede de inquérito policial, e à Justiça Federal o seu processamento e julgamento, nos termos do inciso IV do Artigo 109 da Constituição Federal. Parágrafo único. Fica a cargo do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República a coordenação dos trabalhos de prevenção e combate aos crimes previstos nesta Lei, enquanto não regulamentada pelo Poder Executivo.

É importante salientar que o início da ação penal, conforme regra do Artigo

12 da Lei 13.260/2016, dar-se-á por meio do requerimento do Ministério Público ou

mediante representação da Autoridade Policial, cabendo ao juiz, iniciar a persecução

penal, com atenta análise da existência dos indícios suficientes do crime, para poder

decretar, no curso da investigação ou na respectiva ação penal as medidas cautelares

cabíveis:

Art. 12, O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação do delegado de polícia, ouvido o Ministério Público em vinte e quatro horas, havendo indícios suficientes de crime previsto nesta Lei, poderá decretar, no curso da investigação ou da ação penal, medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores do investigado ou acusado, ou existentes em nome de interpostas pessoas, que sejam instrumento, produto ou proveito dos crimes previstos nesta Lei. § 1o Proceder-se-á à alienação antecipada para preservação do valor dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção. § 2o O juiz determinará a liberação, total ou parcial, dos bens, direitos e valores quando comprovada a licitude de sua origem e destinação, mantendo-se a constrição dos bens, direitos e valores necessários e suficientes à reparação dos danos e ao pagamento de prestações pecuniárias, multas e custas decorrentes da infração penal. § 3o Nenhum pedido de liberação será conhecido sem o comparecimento pessoal do acusado ou de interposta pessoa a que se refere o caput deste artigo, podendo o juiz determinar a prática de atos necessários à conservação de bens, direitos ou valores, sem prejuízo do disposto no § 1o. § 4o Poderão ser decretadas medidas assecuratórias sobre bens, direitos ou valores para reparação do dano decorrente da infração penal antecedente ou da prevista nesta Lei ou para pagamento de prestação pecuniária, multa e custas.

4.13 DOS TRATADOS INTERNACIONAIS NO COMBATE AO TERRORISMO

O Brasil é detentor de diversos tratados internacionais de combate ao

terrorismo (por exemplo, a convenção interamericana de terrorismo, Decreto

5.639/2005) estabelecendo no Artigo 15 da Lei 13.260/2016 a harmonização com as

normas internacionais:

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Art. 15, O juiz determinará, na hipótese de existência de tratado ou convenção internacional e por solicitação de autoridade estrangeira competente, medidas assecuratórias sobre bens, direitos ou valores oriundos de crimes descritos nesta Lei praticados no estrangeiro. § 1o Aplica-se o disposto neste artigo, independentemente de tratado ou convenção internacional, quando houver reciprocidade do governo do país da autoridade solicitante. § 2o Na falta de tratado ou convenção, os bens, direitos ou valores sujeitos a medidas assecuratórias por solicitação de autoridade estrangeira competente ou os recursos provenientes da sua alienação serão repartidos entre o Estado requerente e o Brasil, na proporção de metade, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé.

Esse dispositivo autoriza o magistrado a atender solicitação de autoridades

estrangeiras para determinar judicialmente medidas assecuratórias, sobre bens, direitos

ou valores provenientes do crime de terrorismo praticado no estrangeiro.

É importante destacar que independentemente do tratado ou convenção

internacional, o juiz, poderá aplicar medidas cautelares, a favor do país estrangeiro,

desde que ocorra reciprocidade com a autoridade estrangeira solicitante, com fulcro no

Artigo 15, § 1o da Lei 13.260/2016.

4.14 DA REFORMULAÇÃO DO CONCEITO DE ORGANIZAÇÃO TERRORISTA

Antes da vigência da Lei 13.260/2016, encontrava-se apenas um tipo penal

que previa a organização terrorista (GUIMARÃES, p. 97, 2007) como insculpido no

Artigo 20 da Lei 7.170/83 (Lei de Segurança Nacional):

Art 20, Devastar, saquear, extorquir, roubar, seqüestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas.

Além da definição de crime de terrorismo, a Lei 13.260/2016 reformulou o

conceito de organização terrorista no Artigo 16:

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Art. 16, Aplicam-se as disposições da Lei nº 12.850, de 2 agosto de 2013, para a investigação, processo e julgamento dos crimes previstos nesta Lei.

A Lei 12.850/2013 (Organização Criminosa) prevê no seu Artigo 1o a

definição de organização terrorista e os seus respectivos procedimentos investigatórios

e processuais a serem aplicados no caso concreto:

Art. 1o Esta Lei define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado. § 1o Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional. § 2o Esta Lei se aplica também: I - às infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente; II - às organizações terroristas, entendidas como aquelas voltadas para a prática dos atos de terrorismo legalmente definidos (Incluído pela Lei 13.260/2016)

É importante destacar que de acordo com a Lei 12.850/2013(Organização

Criminosa), há a necessidade de pelo menos quatro indivíduos que deverão executar o

crime de terrorismo para ocorrer a formação da organização terrorista.

De toda sorte, é necessário que a Lei 13.260/2016 disponha mais claramente e

de maneira precisa a definição de organização terrorista (diminuindo, por exemplo, o

número de sua composição de indivíduos ), no sentido de evitar problemas futuros na

aplicabilidade dessa legislação.

4.15 DO TERRORISMO COMO CRIME HEDIONDO

A regra do Artigo 17 da Lei 13.260/2016 estabelece que as normas de combate

ao terrorismo serão regidas pela Lei 8.072/1190 (Crimes Hediondos):

Art. 17. Aplicam-se as disposições da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, aos crimes previstos nesta Lei.

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Dessa maneira, os crimes de terrorismo tipificados nos Artigos 2o, 3o e 6o da

Lei 13.260/2016 são de caráter hediondo.

É necessário destacar que a classificação do crime de terrorismo em hediondo é

imprescindível para o combate desse tipo de delito extremamente grave e que degrada

a paz e incolumidade da sociedade. Assim, faz-se necessários medidas penais duras

visando a melhor aplicabilidade do dispositivo legal que define o crime de terrorismo.

4.16 DA APLICAÇÃO DA PRISÃO TEMPORÁRIA NO CRIME DE

TERRORISMO

A prisão temporária destina-se para fins de investigação criminal, nos termos da

Lei 7.960/1989, possibilitando, colheitas de provas que são indispensáveis a conclusão

do inquérito policial.

A prova colhida durante a prisão temporária destina-se a servir de elemento

probatório a ser utilizado na propositura da ação criminal pelo Ministério Público.

Segundo Gabbelini (p. 147, 2016), o conteúdo da medida cautelar é

declaratório, visando, assegurar a tutela definitiva, sendo uma via para garantir o

resultado específico da tutela jurisdicional do Estado, a ser obtida, por meio do

processo.

É importante consignar que não resta dúvida que a criminalidade moderna,

dispõem de vários meios escusos que dificultam o trabalho da polícia.

Assim, a resposta do Direito Penal para enfrentar a macrocriminalidade de

caráter transnacional, como o crime de terrorismo, tem que ser rápida, eficiente e

prospectiva, justamente, em razão dos danos causados serem de difícil reparação.

O inquérito policial visa colher elementos para instruir a denominada opinitio

delicti e a prisão temporária, inserida neste contexto investigativo, tem por principal

objetivo garantir a eficiência da fase investigativa.

A opinio delicti necessita de elementos claros para a elucidação do delito e da

autoria, cujo êxito desta investigação, poderá ser prejudicado pelo periculum in mora

que autorizará a propositura de medidas judiciais de natureza cautelar a ser justificada

pelo periculum libertatis (GABBELINI, p. 148, 2016).

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4.16.1 A INSERÇÃO DO CRIME DE TERRORISMO NO ROL TAXATIVO DOS

DELITOS DA PRISÃO TEMPORÁRIA

O Artigo 1o da Lei 7960/1989 (prisão temporária) trata das hipóteses que

admitem a cautelar, estabelecendo a lei, a imposição desta medida, para as infrações

penais mais graves. Os crimes passíveis de prisão temporária estão previstos, no rol

taxativo, do Artigo 1o, inciso III, acrescido pela alínea p, com fulcro no Artigo 18 da

Lei 13.260/2016:

Art. 18 O inciso III do art. 1o da Lei no 7.960, de 21 de dezembro de 1989, passa a vigorar acrescido da seguinte alínea p: (...) III - quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes: (...) p- crimes previstos na Lei de Terrorismo

Dessa maneira, a prisão temporária, nos crimes de terrorismo pode ser

legalmente aplicada. Além disso, o crime de terrorismo é hediondo e de maior

gravidade, justificando, a prisão cautelar, para elucidar a autoria e o delito.

O prazo da prisão temporária, para apurar crime hediondo, como no caso, o

terrorismo será de trinta dias, prorrogável por igual período, em caso de extrema e

comprovada necessidade com fulcro no Artigo 2o da Lei 8072/1990 (GABBELINI, p.

147, 2016).

5 O CRIME DE TERRORISMO ENVOLVENDO ARMAS QUÍMICAS

A seguir apresentaremos as principais características jurídicas e toxicológicas

envolvendo a utilização de armas químicas visando ataques terroristas.

5.1 ARMAS QUÍMICAS E A LEI 13.260/2016

O Artigo 2o, § 1o da Lei 13.260/2016 define como ato terrorista a utilização de

armas químicas como instrumentos de ameaça e ataque à incolumidade pública, por

razões de xenofobia ou outros motivos discriminatórios, vejamos:

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Art. 2o O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública. § 1o São atos de terrorismo: I - usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa. Pena – Reclusão de 12 a 30 anos.

Como previsto no Artigo 2o, § 1o, inciso I, primeira parte, o delito de

terrorismo é essencialmente um crime material quanto a sua classificação e de dano

referente a obrigatoriedade de provocar efetiva lesões aos bens jurídicos tutelados. Por

exemplo, o uso de armas químicas aplicado a um grande número de pessoas com os

motivos de xenofóbicos e preconceituosos provocando terror social. Entretanto, ainda

neste dispositivo legal a presenças do verbos “ameaçar usar” armas químicas,

nucleares ou biológicas para prática terrorismo caracteriza-o como um crime formal ou

de consumação antecipada (JUNQUEIRA e VANZOLINI, p. 207, 2013).

Além disso, é importante destacar, que a previsão legal insculpida no “ caput”

do Artigo 2o última parte (“expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a

incolumidade pública”), combinado com o Artigo § 1o , inciso I da Lei 13.260/2016

quanto aos verbos “transportar, guardar, portar ou trazer” consigo explosivos, gases

tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes

de causar danos ou promover destruição em massa ) é baseada na possibilidade de

gerar através de uma conduta típica um risco de lesão ao bem jurídico. Ou seja, tem-se

o denominado crime de perigo concreto (JUNQUEIRA e VANZOLINI, p. 208, 2013)

em relação à possibilidade real de ocorrência do ato terrorismo exigindo que a conduta

efetivamente provoque a situação de perigo com a provável utilização de armas

químicas, biológicas ou nucleares.

Outra peculiaridade importante encontra-se na última parte desse dispositivo

legal. Não há uma definição precisa do termo “causar dano ou promover destruição

em massa.” Ou seja, pode-se atribuir subjetivamente e de uma maneira interpretativa

que a expressão “destruição em massa” significa atingir um grande número de pessoas

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ou patrimônio. Entretanto, a Lei 13.260/2016 não descreve em seu texto legal, a exata

quantidade de indivíduos ou seus respectivos patrimônios que atacadas por um ato

terrorista caracterizariam os danos ou destruição em massa e, consequentemente tem-

se a prática do delito de terrorismo.

As principais substâncias químicas com grande potencial de letalidade que

poderão ser utilizadas em um ataque terrorista são apresentadas na tabela 1 abaixo:

Tabela 1: Principais armas químicas (COLASSO, 2015).

Classe do Agente Agentes Químicos Efeitos Tóxicos Neurotóxicos Sarin

Tabun Soman Ciclosarin VX Amiton

Convulsões, parada cárdio respiratória, edema pulmonar, colapso por super estimulação do coração e tecidos lisos

Vesicantes Mostarda de enxofre (HD) Mostarda nitrogenada (HN-1) Levisita Fosgênio oxima

Lesões graves de pele, cegueira, necrose tecidual, parada cárdio respiratória

Sufocantes Cloro Fosgênio

Lesões pulmonares graves, edema pulmonar

Sanguíneos Zyklon B (Ácido Cianídrico) Hipóxia fatal, parada cárdio respiratória

5.1.1 AGENTES NEUROTÓXICOS

Os neurotóxicos conhecidos como agentes dos nervos, são os mais tóxicos entre

as substâncias químicas utilizadas em ataques terroristas. O contato da pele com

apenas uma única gota desses agentes é suficiente para levar a vítima a óbito. O

primeiro ataque utilizando substâncias neurotóxicas ocorreu durante o conflito Irã e

Iraque entre 1980 e 1988, quando Sadam Hussein ordenou ataques contra os iranianos

e dissidentes curdos no norte do Iraque que ocasionou centenas de mortes

(MACILWAIN, p. 3, 1993).

Em 1994, membros da seita extremista japonesa Amum Shinrikyo (verdade

suprema) lançaram gás sarin em uma estação de metrô nas cidades de Matsumoto e

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Tóquio ocasionando a morte de dezenas de pessoas e intoxicação de aproximadamente

5.000 indivíduos (COLASSO, p. 77, 2015).

Os agentes neurotóxicos provocam uma superestimulação dos órgãos e tecidos

enervados pelas chamadas fibras colinérgicas (glândulas, coração, pulmões, estômago,

fígado, intestino e bexiga).

Os efeitos dessas armas químicas provocam um colapso generalizado no

organismo caracterizado por lacrimação, salivação, corrimento nasal, tonturas,

convulsões, micção involuntária, diminuição/aumento do ritmo cardíaco, depressão

respiratória, transpiração, ansiedade, fraqueza e cólicas. Se não controlada a

intoxicação pode levar a morte por parada cardiorrespiratória ou a paralisia dos

músculos respiratórios.

5.1.2 AGENTES VESICANTES

Os agentes vesicantes são substâncias químicas que produzem vesículas na

pele, ou seja, bolhas. Assim, esse tipo de compostos não somente seriam tóxicos

através da inalação como também pela absorção da pele.

Um dos principais agentes vesicantes é o gás mostarda que é denominado de

“Rei dos Gases”, devido a sua eficácia dos ataques e nos danos provocados à saúde

humana (COLASSO, p. 89, 2015).

Existem vários tipos de gás mostarda. A convenção sobre Armas Químicas

(CWC – Chemical Weapons Convention) inclui nove mostardas de enxofre em sua

lista de produtos químicos para verificação de inspeções industriais. A CWC é um

tratado internacional que tem como objetivos proibir o desenvolvimento, produção e

armazenamento, transporte e emprego de armas químicas. A CWC entrou em vigor em

1997 com sede em Haia (OPCW, 2015).

Os órgãos mais afetados pelo gás mostarda são pele, olhos e sistema

respiratório, que entram em contato direto com o agente. Após a absorção da mostarda

por via dérmica ou inalatória, o sistema hematopoiético, o trato gastrointestinal e o

sistema nervoso central são afetados. A mostarda causa serias lesões oculares e vias

respiratórias (COLASSO, p. 107, 2015).

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Os danos provocados pela exposição à mostarda líquida produz lesões

semelhantes a queimaduras de terceiro grau (COLASSO, p. 110, 2015)

As lesões oculares produzidas pela levisita são graves, como cegueira em caso

de exposição em sua forma líquida. Com apenas 0,1mg de vapor de levisita por oito

segundos ocorrem graves lesões oculares e necrose (COLASSO, p. 117, 2015).

O vapor de levisita provoca também edema pulmonar levando a formação de

secreções nasais, lacrimejamento, que se intensificam até o surgimento da morte

(COLASSO, p. 119, 2015).

O fosgênio oxima é um agente químico que produz uma das maiores ações

dolorosas que é imediatamente seguida por necrose . Ou seja, o fosgênio oxima afeta a

pele, olhos e pulmões e provoca dor imediata e necroso tecidual em comparação com

os outros vesicantes (COLASSO, p. 119, 2015).

A principal lesão de fosgênio oxima nos pulmões é o edema. Esse efeito ocorre

após a inalação ou absorção sistêmica do agente, com irritação imediata, coriza,

rouquidão e dor nasal. O edema pulmonar é acompanhado por bronquiolite necrosante

e trombose pulmonar levando a morte.

5.1.3 AGENTES SUFOCANTES

Um dos gases mais eficazes utilizados como arma química foi o fogênio, devido

à sua alta toxicidade e à capacidade de provocar um grande número de vítimas. Esse

gás foi responsável por cerca de 71 mil vítimas na Primeira Guerra Mundial. O

fosgênio não foi aplicado apenas para matar mas também incapacitar os soldados no

campo de batalha (COLASSO, p. 143, 2015).

Além disso, o gás cloro também pode ser utilizado como uma eficiente arma

química. Essa substância química foi responsável por aproximadamente 5.000 mortes

na 1a Guerra Mundial. Os agentes sufocantes como cloro e fosgênio atuam

basicamente no trato respiratório com efeitos tóxicos diretamente nos pulmões

causando hemorragia e morte por edema pulmonar (COLASSO, p. 150, 2015).

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5.1.4 AGENTES SANGUÍNEOS

Desde os tempos de Roma Antiga, o cianeto e seus derivados foram utilizados

em armas. Nero empregou o loureiro-cereja, que continha cianeto como principal

componente tóxico. (COLASSO, p. 129, 2015)

Um artefato químico desenvolvido na 2a Guerra Mundial, denominado de

Zyklon B a base de cianeto e cloro foi utilizado para produzir o extermínio humano

devido sua altíssima toxicidade em câmaras de gás nazistas e é considerado uma das

mais letais e perigosas armas químicas já desenvolvidas (ZACARIAS, p. 42, 2009).

Assim, no cenário atual, o cianeto é considerado um importante agente químico

para fins suicidas ou homicidas; a possível ameaça de seu emprego em atos terroristas

não deve ser negligenciada devido a seu alto potencial de letalidade.

A arma Zyklon B que contém cianeto, um líquido altamente volátil, incolor e

com o famoso odor característico de amêndoas amargas, é considerado, como já dito,

extremamente perigoso por inalação (COLASSO, p. 133, 2015).

Os tecidos corpóreos que dependem demasiadamente da respiração aeróbica,

mais vascularizados como o sistema nervoso central e coração, serão particular e

rapidamente afetados por essa ação tóxica pelo cianeto, caracterizando desde logo um

quadro de hipóxia prontamente fatal.

A morte segue-se ao dano dos neurônicos do SNC que controlam a respiração,

uma vez que são muitos sensíveis à hipóxia, acarretando a incapacidade de respirar.

5.2. A PROIBIÇÃO DE ARMAS QUÍMICAS

Atualmente, em escala mundial, há um intenso esforço de dezenas de países na

produção de armas químicas, considerando os protocolos formais que visam ao seu

combate (ADLER, 2006).

Os agentes químicos de guerra não exigem uma infraestrutura sofisticada de

produção, portanto os conteúdos químicos e biológicos letais são meios de provocação

de terror acessíveis.

A grande periculosidade e os efeitos generalizados de armas químicas aliados

a sua grande facilidade de fabricação levam as autoridades aplicarem um tratamento

específico referente às políticas de controle internacional de armas.

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Dessa maneira, foi criada a “Organization for the Prohibition of Chemical

Weapons - OPCW (Organização de Proibição de Armas Químicas) que é um

organismo internacional responsável pela verificação do cumprimento das obrigações

da Chemical Weapons Convention - CWC (Convenção para a Proibição de Armas

Químicas). Essa convenção, frisa-se, tem como objetivo proibir o desenvolvimento,

produção, armazenamento, transporte e emprego de armas químicas.

A OPCW além de atuar na destruição de armas já existentes, tem atuado nas

questões de verificação de indústrias que contenham substâncias com potencial para

produção de armas químicas (OPCW, 2017a)

É importante destacar que o Brasil é país signatário da OPCW desde 1997

(COLASSO, p. 157, 2015).

6. APLICAÇÃO DA LEI ANTITERRORISMO NO CASO CONCRETO. A

OPERAÇÃO HASHTAG

A Lei 13.260/2016 foi aplicada pela primeira vez considerando os

desdobramentos investigativos oriundos da denominada operação Hastag deflagrada

pela Polícia Federal.5

O Ministério Público Federal na pessoa de seu Procurador Dr. Rafael Brum

Miron, baseado no inquérito policial supra acima denunciou à competente 14a Vara

Federal de Curitiba um grupo constituído pelos indivíduos identificados como: Alisson

Luan de Oliveira, Leonid El Kadre de Melo, Oziris Moris, Lundi dos Santos Azevedo,

Israel Pedra Mesquita, Levi Ribeiro Fernandes de Jesus, Hortêncio Yoshitake, Luis

Gustavo de Oliveira e Fernando Pinheiro Cabral, incursos no Artigo 3o da Lei

13260/2016, vejamos:

____________

5 Inquérito Polícia Federal/PR, no 50235576920164047000.

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De 17 de março a 21 de julho de 2016, os denunciados, de forma livre e consciente da

ilicitude de suas condutas, promoveram a organização terrorista Estado Islâmico do Iraque

e do Levante (EIIL) ou Estado Islâmico do Iraque e da Síria, por meio de publicações em

redes sociais, troca de materiais e diálogos em grupos de aplicativos. Em inúmeras

ocasiões, os denunciados demonstraram devoção à organização terrorista, afirmando,

inclusive, intenção de ação terrorista no decorrer dos Jogos Olímpicos Rio 2016 e objetivo

de reunião física para preparação e treinamento para futura migração à região de

dominação do grupo extremista.

A atuação dos denunciados se deu, essencialmente, por meio das seguintes formas: 1)

publicações em perfis da rede social Facebook, Twitter e Instagram; 2) diálogos em grupos

fechados da rede social Facebook; com troca de materiais de cunho extremista; 3) diálogos

em conversas privadas na rede social Facebook; 4) troca de e-mails compactuando a

formação de célula do Estado Islâmico no país; e 5) diálogos em grupos fechados por meio

do aplicativo Telegram.

A denúncia elaborada pelo Ministerio Público Federal foi recebida pelo juiz da

14a Vara Criminal de Curitiba, Dr. Marcos Jogrei da Silva no dia 19/09/2016 sendo

devidamente processada por meio da Ação Penal no 5046863-6720164047000.

Atualmente os autos da referida ação penal encontram-se conclusos com o

Excelentíssimo magistrado para proferimento de sentença.6

É importante consignar que os ora denunciados utilizavam tais ferramentas

tecnológicas para troca de informações de conteúdo ilícito, mas continuavam

utilizando os meios de publicações públicos para promover, também abertamente, o

Estado Islâmico e atrair novos membros.

Inclusive o Federal Bureau of Investigation (FBI) logrou identificar perfis de

indivíduos brasileiros que promoviam o grupo de cunho radical, enviando ao

Departamento de Polícia Federal/Divisão Antiterrorismo, em Brasília/DF.

_________________ 6 Disponível em: http://www2.trf4.jus.br/trf4/controlador.php?acao=consulta_processual_resultado_pesquisa&txtValor=50468636720164047000&selOrigem=PR&chkMostrarBaixados=&todasfases=S&selForma=NU&todaspartes=&hdnRefId=8495bfb7dcf0015686d81953baf3f627&txtPalavraGerada=DoMF&txtChave.

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Considerando não ser o seja o objetivo da presente Monografia descrever

sobre o complexo grupo extremista autodenominado Estado Islâmico, é necessário

discorrer brevemente no sentido de demonstrar a caracterização desses indivíduos

como uma organização terrorista trazido pela Lei 13.260/2016.

O Artigo 19 da Lei 13.260/2016 que modifica a Lei 12.850/2013 (Lei das

Organizações Criminosas) prevê que organizações terroristas são consideradas como

aquelas voltadas para a prática dos atos de terrorismo legalmente definidos.

Nesse cenário, é plenamente admissível a caracterização do grupo extremista

Estado Islâmico como uma organização terrorista nos moldes delineados pela

legislação. Assim, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito deraça, cor,

etnia e religião, o grupo expõe a perigo pessoa, patrimônio, paz e incolumidade

públicas, com a finalidade de provocar terror social ou generalizado.

Existe inclusive o reconhecimento do Ministério das Relações Exteriores do

Brasil, desde novembro de 2015, por meio de notas oficiais7,8 em que o Governo

Brasileiro aberta e expressamente refere-se ao Estado Islâmico como “organização

terrorista” e “grupo terrorista”.

Além disso, o Governo Brasileiro, por meio da nota 4677, de 24/11/2015,

adotou por unanimidade, da Resolução n.º 2249 do Conselho das Nações Unidas, que

conclama Estados Membros das Nações Unidas a tomarem todas as medidas

necessárias, em conformidade com o Direito Internacional, para combater o

autodenominado "Estado Islâmico", que constitui ameaça sem precedentes à paz e à

segurança internacional.

_______________ 7Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/notas-a-imprensa/12527-resolucao-do-conselho-deseguranca-das-nacoes-unidas-sobre-combate-ao-autodenominado-estado-islamico>.Acesso em 10 abril 2017. 8 Disponível em: http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/notas-a-imprensa/14512-atentadossiriajulho2016>. Acesso em 10 abril 2017.

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Em 06/07/2016, por meio do Decreto n.º 8.799,9 o Brasil comprometeu-se a

executar e cumprir integralmente a Resolução n.º 2253/2015, adotada pelo Conselho

das Nações Unidas em 17/12/2015. Tal documento reafirma a Resolução n.º

2249/2015 e tem como finalidade atualizar e fortalecer o regime de sanções, imposto

pela Resolução 1267 (1999), relativo ao Estado Islâmico no Iraque e no Levante e à

Al-Qaeda.

Um dos trechos do documento internacional, ratificado pelo Brasil, em que há

menção expressa atuação do Estado Islâmico e à Al-Qaeda:9

Reafirmando que o terrorismo em todas as suas formas e manifestações constitui uma

das mais sérias ameaças à paz e à segurança e que quaisquer atos de terrorismo são

criminosos e injustificáveis, independentemente de suas motivações, não importando

quando, onde e por quem sejam cometidos, e reiterando sua inequívoca condenação do

Estado Islâmico no Iraque e na Síria (ISIL na sigla em inglês, conhecido também

como Daesh), da Al-Qaeda e de indivíduos, grupos, empresas e entidades a eles

associados por contínuos e múltiplos atos criminosos de terrorismo com o objetivo de

causar a morte de civis inocentes e outras vítimas, destruir patrimônio e solapar

profundamente a estabilidade; (…)

Assim, percebe-se claramente que há amplo reconhecimento do grupo

extremista Estado Islâmico como organização terrorista, tanto no cenário interno como

no internacional.

____________ 9 Disponível em : >:https://legislacao.planalto.gov.br/LEGISLA/Legislacao.nsf/viwTodos/CD739A13F015800A83257FE90041110A?OpenDocument&HIGHLIGHT=1,Estado%20Isl%E2mico> Acesso em 10 abril 2017.

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7 CONCLUSÃO

É inegável a gravidade do fenômenos terrorista, principalmente nos seus

formatos contemporêneos, e o Direito Penal como instrumento de tutela deve incidir

no sentido de proteção dos bens jurídicos fundamentais da sociedade em um Estado

Democrático de Direito.

O terrorismo possui especiais características, basicamente, a motivação política,

de modo ilegítimo, normalmente em um sistema político de liberdades.

Assim, é necessário tipificar adequadamente cada conduta terrorista nos moldes

dogmáticos exigidos pela morder ciência penal, sob a cobertura do sistema

constitucional-penal vigente.

O delito de terrorismo possui previsão constitucional no Artigo 5o, inciso XLIII,

sendo tratado como crime inafiançável, insuscetível de graça ou anistia. A publicação

da Lei 13260/2016 cumpre o legislador seu dever constitucional, previsto nos

mandados expressos de criminalização do terrorismo conferindo mecanismos legais,

visando proteger a sociedade que assola a sociedade.

A Lei Antiterrorismo, à luz da Constituição Federal visa, proteger os direitos

fundamentais, como a vida, o patrimônio e a paz pública, a liberdade de religião de

opinião, para que a sociedade brasileira continue seguindo as metas dirigentes de um

Estado livre, justa e solidária, repudiando o terrorismo. Entretanto, alguns ajustes na

Lei 13.260/2016 são necessários como definir com maior exatidão a organização

terrorista, danos e destruição em massa. Além disso, faz-se necessário que a pena

mínima referente a atos terroristas previstos no Artigo 2o, §1o da Lei 13.260/2016 que

produzam a morte ou lesões em qualquer indivíduo sejam aumentadas em relação as

penalidades já previstas no código penal.

O direito penal deve permanecer sempre atualizado com o desenvolvimento da

sociedade e sendo útil e eficaz no combate ao terrorismo, de acordo com uma

legislação penal e processual penal que apresente mecanismos de combate ao delito de

terrorismo.

Pode-se admitir no combate ao crime de terrorismo posturas procedimentais

especiais para garantir a higidez do próprio sistema jurídico e promovendo ações

prospectivas face aos danos gravíssimos e irreparáveis dos direitos coletivos afetados

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pelos atos terroristas. Assim, tem-se a lei da organização criminosa aplicada de forma

extensiva as organizações terroristas para fins de investigação, processo e julgamento

conforme a Lei 13.260/2016.

Ante o exposto é importante salientar que as armas químicas (subdivididas em

neurotóxicas, sufocantes, sanguíneas e vesicantes) ocupam um local de destaque na

Lei 13.260/2016 por possuirem propriedades extremamente tóxicas e com alto grau de

letalidade e pode ser facilmente utilizada por grupos terroristas.

Como o custo dar armas químicas é muito baixo são denominadas de “bombas

atômicas dos pobres”, ou seja, qualquer grupo terrorista poderá criar ou obter esse tipo

de substância que causa enormes problemas de saúde pública.

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