Análise bíblica unçao

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Análise bíblica ANÁLISE DO TEXTO DE I CORÍNTIOS 12:1-11 Peri de twn pneumatikwn, adelfoi, ou qelw umaV agnoein. v.1: A respeito dos dons espirituais, não quero, irmãos, que sejais ignorantes. Perí dé tôn pneumatikôn, adelfoí, ou thélô hymás agnoein. Palavras importantes: - pneumatikoV (pneumatikós): espiritual. O sufixo indica “aquilo que pertence ao espírito”. A palavra pode ser masculina, indicando pessoas espirituais, ou neutra, indicando dons ou coisas espirituais. Oidate oti ote eqnh hte proV ta eidwla ta afwna wV an hgesqe apagomenoi. v.2: Sabeis que, outrora, quando éreis gentios, deixáveis conduzir-vos aos ídolos mudos, segundo éreis guiados. Oidate hoti hote ethnê ête prós tá eidôla tá afôna hôs an êgesthe apagómenoi.

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Análise bíblica

ANÁLISE DO TEXTO DE I CORÍNTIOS 12:1-11

Peri de twn pneumatikwn, adelfoi, ou qelw umaV agnoein.

v.1: A respeito dos dons espirituais, não quero, irmãos, que sejais ignorantes.

Perí dé tôn pneumatikôn, adelfoí, ou thélô hymás agnoein.

Palavras importantes:

- pneumatikoV (pneumatikós): espiritual. O sufixo indica “aquilo que pertence ao espírito”. A palavra pode ser masculina, indicando pessoas espirituais, ou neutra, indicando dons ou coisas espirituais.

Oidate oti ote eqnh hte proV ta eidwla ta afwna wV an hgesqe apagomenoi.

v.2: Sabeis que, outrora, quando éreis gentios, deixáveis conduzir-vos aos ídolos mudos, segundo éreis guiados.

Oidate hoti hote ethnê ête prós tá eidôla tá afôna hôs an êgesthe apagómenoi.

Palavras importantes:

- afwnoV (afônos): sem falta, mudo

- hgesqe (êgesthe): guiar, levar

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- apagomenoi (apagómenoi): levar embora, ser arrastado. Sugere momentos de êxtase experimentados nas religiões pagãs, quando um ser humano é possuído por um sobrenatural.

dio gnwrizw umin oti oudeiV en pneumati qeou lalwn legei, Anaqema IhsouV, kai oudeiV dunatai eipein, KurioV IhsouV, ei mh en pneumati agiw.

v.3: Por isso vos faço compreender que ninguém que fala pelo Espírito de Deus afirma: Anátema Jesus! por outro lado, ninguém pode dizer: Senhor Jesus! senão pelo Espírito de Deus.

Dió gnôrizô hymîn hoti oudeis en pneumati Theou lalôn legei, Anáthema Iêsous, kaí oudeis dynatai eipeîn, Kyriós Iêsous, ei mê en pneumati hagiô.

Palavras importantes:

- en (en): em, por meio de, sob o controle de.

- lalwn (lalôn): falar

- anaqema (anáthema): aquilo que é separado para uma divindade, aquilo que é abandonado pelos deuses, uma maldição, amaldiçoado.

DiaireseiV de carismatwn eisin, to de auto pneuma

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v.4: Ora, os dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo.

Diaireseis dé charismatôn eisin, tó dé autó pneuma.

kai diaireseiV diakoniwn eisin, kai o autoV kurioV

v.5: E também há diversidade nos serviços, mas o Senhor é o mesmo.

Kai diaireseis diakoniôn eisin, kai hó autós kyriós.

kai diaireseiV energhmatwn eisin, o de autoV qeoV o energwn ta panta en

pasin.

v.6: E há diversidade nas realizações, mas o mesmo Deus é quem opera tudo em todos.

Kai diaireseis energêmatôn eisin, hó dé autós theós hó energôn tá panta en pasin.

A primeira coisa que devemos observar neste texto são os termos, Espírito, Senhor e Deus. Estes termos não estão neste texto por acaso. Eles apontam para a trindade divina, mesmo que apareça fora da ordem comum(Mt.28:19). Paulo usou estes termos para se referir a trindade em que usa para Cristo o vocábulo kyriós(kurioV), para Deus theós(qeoV) e para o Espírito pneuma(pneuma)(cf. II Co.13:13; Ef.4:4-6). Desta forma vemos que os dons espirituais provém de Deus, que opera tudo em todos.

Outro ponto importante que podemos analisar aqui é quanto ao termo grego “diaireseis”(diaireseiV). Este vocábulo significa diversidade, distinto, diferente, variedade. Vem de uma raiz que expressa divisão.

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Charismatôn(carismatwn) significa dons, e geralmente é usada para uma das qualidades extraordinárias que o Espírito dá aos homens. A palavra deriva de charis(cariV), graça. Basicamente mostra a gratuidade, a liberalidade do dom. O fato de Paulo dizer que “os dons são diversos, mas o Espírito é o mesmo”, nos mostra que o apóstolo chamava a atenção da igreja de Corinto. Os dons eram um dos motivos da tremenda divisão da Igreja, e Paulo mostra que o Espírito não luta contra si mesmo. Enquanto para muitos em Corinto os dons eram sinônimo de orgulho espiritual, Paulo mostra que é o Espírito que concede todos os dons.

No verso 5 aparece o vocábulo “diakoniôn”(diakoniwn), que pode ser traduzido por ministrações ou serviços. Esse termo deriva do grego diakonia(diakonia), palavra que pode significar serviços práticos ou serviços de cunho espiritual. O termo aparece como um dos dons em Rm.12:7. O que Paulo tem em mente aqui é que há muitos modos de servir, mas as diferenças não são importantes. Por que? Porque o “Senhor é o mesmo”. O que temos aqui é o emprego real dos dons, onde o crente trabalha para Cristo por meio de ações espirituais. Estão em foco aqui o serviço dos apóstolos, profetas, mestres, ou então serviços que visam ajudar os necessitados nos seus sofrimentos físicos, ajudando as esmolas, etc.(I Co.16:15; II Co.8:4).

No verso 6 encontramos o termo “energêmatôn”(energhmatwn), e a palavra pode ser traduzida como realizações, atividades. Este vocábulo deriva da palavra obra, trabalho. A idéia e do poder de Deus agindo. As atividades divinas são muitas, mas é o mesmo Deus. Nestes três versículos Paulo está combatendo a divisão da igreja. Não pode haver divisão entre os homens com base nos dons, porque é o mesmo Deus que dá os dons em toda a sua diversidade. Por isso Paulo acrescenta, “quem opera tudo em todos”, ou seja, Deus é quem faz tudo em todos os homens. Enquanto que serviços indica o dom trabalhos individuais, as realizações indica todas as atividades que contribuem para um determinado fim. Mesmo sendo diversos, eles compõe o todo, sendo operados pelo mesmo Deus.

Portanto, vemos aqui que dons, serviços e realizações correspondem a mesma ação do Espírito. Paulo estava combatendo a divisão da igreja justamente porque alguns se achavam mais espirituais do que outros. É impossível que o apóstolo esteja falando de três ações do Espírito, já que ele relaciona cada um destes com uma pessoa da Trindade. O verso 7 é muito esclarecedor quanto a isto:

ekastw de didotai h fanerwsiV tou pneumatoV proV to sumferon.

v.7: A manifestação do Espírito é concedida a cada um, visando a um fim proveitoso.

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Hekástô dé didotai hê fanérôsis tou pneumatos prós tó symféron.

Dois vocábulos aparecem com muita propriedade:

- fanerwsiV (fanerôsis): manifestação, tornar claro.

- sumferon (symféron): trazer juntos, conferir um benefício, ser vantajoso, útil ou proveitoso.

O que Paulo tenta mostrar aos coríntios é que o Espírito concede, mostra a cada um o seu dom. E este deve servir para um fim útil no corpo. Ou seja deve produzir a unidade. O dom visa ser um benefício tanto individual quanto coletivo. Se os dons são muitos em sua diversidade, assim também é o corpo com seus diversos e diferentes membros. Mas como no corpo, em que cada membro com sua diferença e função trabalha com um propósito, assim também os dons, sendo diferentes e diversos, devem levar a igreja e os crentes a um fim proveitoso.

Paulo neste texto retira do homem qualquer condição de ser ele o que manifesta os dons. Não há lugar para um possível “orgulho espiritual”. Quem manifesta é o Espírito, que conhece as necessidades da Igreja, e trás dons aos crentes com a finalidade de fortalecer o Corpo de Cristo em suas necessidades.

Desta forma vemos que os dons representam um todo, mesmo sendo diversos, assim como o corpo humano. Os serviços seriam dons que são trabalhados no âmbito pessoal e as realizações seriam dons que visam uma finalidade.

· Palavra de Sabedoria

· Palavra do Conhecimento

· Fé

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· Dons de curar

· Operações de milagres I Co.12:8-10

· Profecia

· Discernimento de espíritos

· Variedade de línguas

· Capacidade de interpretar as línguas

· Apóstolos

· Profetas

· Mestres

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· Operadores de milagres I Co.12:28

· Dons de curar

· Socorros

· Governos

· Variedade de línguas

Podemos perceber que, nas duas listas, Paulo vai falar de dons e não de três classificações (dons, serviços e realizações). Todos são dons, e todos podem ser serviços e realizações, pois são dados pelo mesmo Espírito. O verso 11 é muito importante para entendermos tudo isto:

panta de tauta energei to en kai to auto pneuma diairoun idia ekastw

kaqwV bouletai.

v.11: Mas um só e o mesmo Espírito realiza todas estas cousas, distribuindo-as, como lhe apraz, a cada um, individualmente.

Panta dé tauta energei tó hen kai tó autó pneuma diairoun idia hekástô kathôs bouletai.

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A expressão “um só e mesmo Espírito”, está aqui colocada de uma forma mais forte. Os dons são diferentes, mas isto não significa dizer que os propósitos divinos são. É o único e o mesmo Deus que dá todos estes dons, e estes revelam a unidade do propósito divino.

A palavra realiza vem do grego “energeo”(energei), que significa operar, trabalhar, produzir, efetuar. Isto nos mostra que é Deus quem efetua os dons espirituais no homem. Outro ponto importante de salientar é que Deus não distribui os dons indiscriminadamente, pelo contrário, Ele visa atender as necessidades e capacidades de cada pessoa. Por esta razão Paulo vai salientar o caráter do Espírito quando diz que Ele distribui os dons como “lhe apraz”, ou seja, como Ele quer. O mais interessante é que Paulo nos diz que, o Espírito dá os dons espirituais a cada um, individualmente(gr. idia(idia): privativamente; individualmente). Ele não dá os dons de acordo com os méritos humanos, mas de acordo com a Sua própria vontade.

ANÁLISE BÍBLICA SOBRE “UNÇÃO”

A palavra “unção” ultimamente tem sido muito usada, porém a sua significação tem sido pouco entendida. Muitas coisas que tem acontecido por aí não revelam a verdadeira vontade de Deus, justamente por não encontrar fundamentação bíblica. É importante ressaltarmos que “unção” vai determinar uma série de coisas. A “unção” pode fazer parte de uma expressão cultural, religiosa ou espiritual.

É importante sabermos que, objetos e pessoas eram ungidas no A.T. a fim de significar santidade ou separação para Deus. No entanto, a unção era usada de diversas formas. Por exemplo, Rute unge seu corpo para se enfeitar(Rt.3:3); em II Cr.28:15 fala da unção no sentido de amparo. Neste caso está ligado ao comer e beber, possivelmente com a idéia de refrescar o corpo daqueles que estavam sofrendo. Em Et.2:12 a unção aparece como tratamento corporal. A unção podia ser usada no tratamento aos enfermos(Mc.6:13; Tg.5:14), na cura de ferimentos(Is.1:6; Lc.10:34) e até mesmo para preparar os mortos para o sepultamento(Mt.26:12). Até mesmo as armas eram ungidas para a guerra(II Sm.1:21; Is.21:5). Percebemos aqui que a unção envolve neste caso uma conotação cultural, que envolve todas as esferas da vida(Am.6:6).

No sentido religioso o melhor exemplo da unção é visto no Tabernáculo onde a tenda e os objetos foram consagrados ao Senhor(Êx.30:26-29; 40:9-11). Vemos também que o altar de bronze foi ungido(Êx.29:36). Tudo no Tabernáculo seria santificado e consagrado para o uso

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exclusivo do serviço de Deus. O óleo da unção não poderia ser usado para outra coisa a não ser no serviço do Tabernáculo. Este óleo também não podia ser imitado(Êx.30:32,33).

É importante saber que a vida religiosa está intimamente ligada a vida social hebraica. Pelo menos três tipos de pessoas recebiam a unção: Os profetas(I Rs.19:16), os sacerdotes(Êx.30:30; 40:13-15) e os reis(Jz.9:8; I Sm.9:16; 16:1-3,13; I Rs.1:34). Estes eram representantes de Deus entre o povo. Eles eram protegidos pelo próprio Deus(I Cr.16:22; Sl.105:15), mas isto não significava em absoluto que eles podiam fazer qualquer coisa. Eles também não podiam ser injuriados nem insultados(I Sm.24:6; 26:9; II Sm.1:14,15; 19:21). Davi quando perseguido por Saul não levantou a mão contra o rei justamente por isto. Por duas vezes Davi teve a oportunidade de se desfazer de Saul mas não o fez baseado justamente na unção dada ao rei.

Mas quanto a expressão espiritual? O que vem a significar a “unção”? Ungir no hebraico vem de “mashah”, que significa ungir, espalhar um líqüido. Existem termos derivados deste vocábulo: “mishhâ”(óleo de unção); “moshhâ”(porção); “mashîah”(aquele que é ungido). O verbo “mashah” e seus derivados ocorrem cerca de 140 vezes no A.T., principalmente no Pentateuco e nos históricos; nos profetas ocorre apenas duas vezes com a conotação de unção sagrada(Is.61:1; Dn.9:24).

Segundo o Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, o vocábulo “mashah” possui um quádruplo significado teológico:

1º. Ungir algo ou alguém indicava uma separação oficial para o serviço divino. Moisés ungiu Arão(Lv.8:12); na unção de Salomão a Bíblia diz que “ungiram ao Senhor”(I Cr.29:22). Embora “mashah” indique uma posição de honra, também representa um aumento de responsabilidade. Aquele que recebia a unção era convocado a prestar contas ao Senhor, isto baseado na unção recebida(I Sm.15:17; II Sm.12:7).

2º. Mesmo que o agente da unção fosse um sacerdote ou profeta, a Palavra fala dos ungidos como aqueles a quem o Senhor ungiu(I Sm.10:1; II Sm.12:7). Esta expressão salienta que é Deus quem é o agente competente, que o ungido é inviolável(I Sm.24:8-22) e que o ungido deve ser tido na mais alta consideração(I Sm.26:9-16).

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3º. Segundo o entendimento da época, a capacitação divina acompanhava o “mashah”. Se diz, tanto de Saul quanto de Davi, que o “Espírito do Senhor se apossou” deles(I Sm.10:6; I Sm.16:13).

4º. Na forma “mashîah”, a palavra “mashah” foi associada ao libertador prometido e que viria, Jesus. Este ungido do Senhor traria um governo justo e de paz(Is.9:1-7; 11:1-5; 61:1).

Desta forma percebemos que a unção no A.T. vai estar ligada a uma vida ou coisas separadas para o serviço Deus. Porém não exclui a idéia de ser usada na vida diária das pessoas. É importante darmos uma palavra acerca do óleo usado no Tabernáculo, chamado de Óleo de unção. Este vocábulo hebraico será encontrado apenas em Êxodo, Levítico e Números.

“mishhâ” refere-se ao óleo utilizado na unção ritual, que era preparado de acordo com uma fórmula(Êx.30:22 e ss.), e que era aspergido sobre as autoridades e sobre as suas vestes(Êx.29:21), mas, sobre a cabeça do sumo sacerdote, era derramado(Êx.29:7; Lv.8:10-12). Este óleo era descrito como santo, e sua aplicação no tabernáculo e seus apetrechos santificava-os. Os sacerdotes que foram ungidos tinham restringidas as suas atividades(Lv.21:12; cf. 10:7). Na realidade não era o óleo o mais importante, apenas era um símbolo tangível de que, determinada pessoa ou objeto, estava separada para o serviço divino.

No N.T. o termo grego para unção é “chrisma”. Segundo Westcott esta palavra não se refere ao ato de ungir, mas aquilo com que isto se faz. No caso era o óleo. Mas quando o Messias(o Ungido do Senhor) veio, em cumprimento de Is.61:1, foi ungido no Seu batismo, não com óleo, mas com o Espírito Santo(Lc.4:18; At.4:27; 10:38). Este termo unção só aparece na Primeira Epístola de João(2:20,27). Segundo John Stott, a unção a que João se refere é o próprio Espírito Santo. João está falando daqueles que enganam o povo de Deus, e que, muitas vezes, estão entre nós(I Jo.2:19). João está combatendo aqueles que são contra o Senhor(lit. antichristós = aquele que se opõe a Cristo). A unção que vem do Santo significa que o próprio Deus é que dá esta unção aos seus. Ele é a fonte da unção. No verso 27 João é ainda mais específico:

“Quanto a vós outros, a unção que dele recebestes permanece em vós, e não tendes necessidade de que alguém vos ensine; mas, como a sua unção vos ensina a respeito de todas as cousas, e é verdadeira, e não é falsa, permanecei nele, como também ela vos ensinou.”

João, ao se referir a unção, fala que já recebemos a unção e que esta permanece em nós. Devemos entender que, esta unção permanece sobre aqueles que vivem em comunhão com o Senhor, que realmente foram transformados pelo poder de Jesus. Outro ponto importante de

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salientar é que ninguém precisa nos ensinar acerca do que já está ensinado. Ou seja, temos o Espírito Santo dentro de nós e é Ele quem há de mostrar a nós a vontade de Deus. Estas idéias de outras “unções”, não condiz com o que a Palavra nos mostra. A unção do Espírito foi dada a todos os cristãos que realmente se converteram ao Senhor. Como o próprio apóstolo João nos mostra, esta unção nos ensina “a respeito de todas as cousas”, ou seja, o Espírito cumpre aquilo que Jesus disse(Jo.14:26; 15:26; 16:13,14; cf. Jr.31:31-34). Isto não significa em absoluto que não precisamos mais de pastores e líderes. Isto estaria totalmente contrário a Palavra de Deus. João está aqui combatendo os mestres gnósticos, que diziam que Cristo era uma emanação, negando a encarnação do Verbo vivo de Deus.

Nós temos que aprender que só existe uma unção, que é a do Espírito Santo. É o Espírito quem nos dirige e quem nos faz ter a verdadeira experiência cristã(II Co.3:18). A experiência cristã é este crescer no Senhor, de glória em glória, para que a cada dia possamos ser o mais parecido possível com Cristo. O desejo do Senhor é imprimir em seus filhos o caráter de Cristo; e isto nasce da operação do Espírito Santo em nós(Gl.5:22,23). Podemos perceber que o verdadeiro significado da unção não é sacramental e sim espiritual. Como escreveu Champlin: “A verdadeira unção é um contato genuíno com o Espírito, por parte da alma humana. Pode ser simbolizada por certos ritos, mas a sua substância transcende ao que é ritual.”.

Portanto, estas idéias de “outras unções”, não condizem com o que a Bíblia nos diz. Se a Palavra realmente é a nossa regra de fé e prática, então percebemos que, a única unção que a Bíblia se refere é a Unção do Espírito Santo, que a mesma que o Filho de Deus recebeu. Se o cristão deseja ser mais de Deus, ter uma vida mais dedicada aos pés do Senhor, ele deve se encher mais do Espírito Santo(Ef.5:18), e isto se dá com a vida aos pés de Jesus(Jo.7:37-39).

ANÁLISE DOS TEXTOS DE AP.4 E EZ.1:10; 10:14

Estes textos tem sido mal interpretados neste últimos dias, em que certas pessoas tem relacionado estes textos com a unção. Precisamos fazer algumas considerações antes de entrarmos em uma análise direta destes textos:

1º. Estes textos estão dentro de um estilo de literatura chamado apocalíptico. Este estilo de literatura começou a existir dentro da linguagem profética do A.T., desde os dias do profeta Isaías onde podemos achar o apocalipse de Isaías(cap.24-27). O tema principal é a escatologia, ou seja, o fim de todas as coisas. Ezequiel está inserido neste estilo desde sua chamada. As

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visões que teve e seu ministério são marcados por este estilo. O profeta Daniel está também dentro deste grupo, juntamente com Joel e Zacarias. Mesmo no silêncio profético de 400 anos(de Malaquias até João Batista), a literatura apocalíptica continuou existindo dentro da cultura judaica.

2º. Estes textos apocalípticos são marcados por visões de animais quase que mitológicos, números e forte simbolismo. Não há como entender um livro deste estilo sem analisar com clareza os símbolos que nele se apresentam.

3º. Em nenhum dos textos que aparecem estas visões de animais está inserida qualquer idéia de unção.

Façamos agora uma análise dos textos separadamente, partindo de Apocalipse 4. O capítulo inteiro é dedicado a apresentar uma visão do trono de Deus. Toda a visão que João presencia é da glória de Deus e do seu trono. Os seres viventes que aparecem no verso 7 estão ligados a mesma visão de Ez.1:10. Podemos perceber que em Ezequiel, os seres tinham quatro rostos, enquanto que no Apocalipse tinha um. Tudo isto é simbólico, e todos os comentadores deste texto são unânimes em afirmar que os simbolismos podem ser variados.

Champlin fala dos seres viventes da seguinte forma:

· O leão é animal poderoso e decidido. É considerado o “rei” dos animais. Está investido de grande força física. Isso também caracteriza o poder de Deus, nos céus e na terra.

· O novilho era um animal próprio a ser oferecido em sacrifício. Talvez isso signifique que o poder de Deus se manifesta mediante o sacrifício ou a expiação. O boi também é um animal paciente. Assim também o poder de Deus é administrado em meio a paciência.

· O homem é objeto da providência divina, e sua sabedoria total visa conduzir o homem a Cristo, fazendo do homem um filho, tal como Cristo é o Filho de Deus.

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· A águia poderia simbolizar que a revelação de Deus, em nosso caso, terá o poder de elevar-nos.

George Ladd no seu comentário nos fala assim:

“Isto por sua vez podemos interpretar de duas maneiras: ou os querubins representam o louvor e a adoração que toda criação tributa ao criador; ou eles representam seres angelicais que o Criador usa para executar seu governo e sua vontade divina em todas as espécies da criação. Eles são espíritos criados tidos por mediadores da energia e do poder de Deus em todo o mundo. O fato de eles cantarem um cântico de adoração, “Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus, o Todo-poderoso, aquele que era, que é e que há de vir!”, sugere que ambas as interpretações podem estar corretas.”

Para Ladd, estes seres viventes participam do louvor da santidade de Deus, como os serafins em Isaías(Is.6:3).

Um outro comentador respeitável, Eugênio Corsini, também trás algumas considerações sobre o capítulo 4 de Apocalipse:

“Em primeiro lugar daqueles que João chama de “Seres vivos”: são quatro, modelados exteriormente segundo o aspecto dos quatro célebres ‘querubins’ da visão de Ezequiel(cf. Ez.1:10), e parecem dotados, como aqueles, de um incessante movimento ao redor do trono...

O trono sobre o qual se assenta, distinto dos outros tronos, significa que ele possui, em grau supremo e exclusivo, as propriedades implícitas no símbolo: majestade, poder, senhorio, poder de julgamento, numa palavra, todas as manifestações exteriores que derivam da natureza divina. Tudo isso é reforçado pelo comportamento dos seres circundantes, cuja função mais importante é a de prestar homenagem à supremacia absoluta da divindade com incessantes hinos de louvor e com a oferta de atos de culto propriamente ditos.”

Percebemos que todos concordam que a visão é de uma apresentação da glória de Deus e de Seu poder. Os seres viventes estão em Sua Santa presença para adorar esta glória. Desta forma não há como negar que, este texto em si, nada tem haver com nenhum tipo de unção. Mesmo

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que alguém pudesse argumentar que é a unção de Deus que nos leva a adorar a Deus, isto seria facilmente refutado. Porque, em primeiro lugar já temos a unção(I Jo.2:20); em segundo lugar o texto é claro em afirmar a glória de Deus, não mencionando nada sobre a unção.

Sobre o texto do profeta Ezequiel temos uma visão clara da Teofania. Teofania significa a aparição ou a revelação da divindade. No caso aqui vemos Deus se revelando a Ezequiel junto ao rio Quebar. O capítulo 1:7-10 nos mostra a visão dos seres viventes. Este texto está intimamente ligado ao capítulo 10:14. O símbolo aqui é impressionante:

· Quatro rostos, simboliza a direção, visão.

· Quatro asas, simboliza rapidez

Aqui temos um relato em linguagem apocalíptica que deseja mostrar a preocupação de Deus em dizer a Israel que Ele, o Senhor, está atento a todas as coisas e age sempre em tempo certo.

Infelizmente associar estes textos de Apocalipse e Ezequiel com unção é de uma ignorância bíblica sem precedentes. Estes tipos de “unções” nada tem haver com a Palavra e muito menos com o Senhor. A unção já foi dada. O que ela precisa é ser preservada pelos crentes em Jesus. Uma vida coerente com a Palavra e cheia do Espírito é o que Deus deseja de seus filhos e não um misticismo incompreensível e sem sentido. Estas coisas nos afastam da centralidade da Palavra e da obra da cruz