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UNIVERSIDADE ANHANGUERA-UNIDERP ANA CLAUDIA MARQUES O SÍTIO ARQUITETÔNICO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO BRASIL E SUAS FUNÇÕES SOCIAIS NA CIDADE DE CAMPO GRANDE – MS. CAMPO GRANDE – MS 2013

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UNIVERSIDADE ANHANGUERA-UNIDERP

ANA CLAUDIA MARQUES

O SÍTIO ARQUITETÔNICO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO

BRASIL E SUAS FUNÇÕES SOCIAIS NA CIDADE DE CAMPO

GRANDE – MS.

CAMPO GRANDE – MS

2013

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ANA CLAUDIA MARQUES

O SÍTIO ARQUITETÔNICO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO

BRASIL E SUAS FUNÇÕES SOCIAIS NA CIDADE DE CAMPO

GRANDE – MS.

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em nível de Mestrado

Acadêmico em Meio Ambiente e

Desenvolvimento Regional da Universidade

ANHANGUERA–UNIDERP, como parte dos

requisitos para a obtenção do título de

Mestre em Meio Ambiente e

Desenvolvimento Regional.

Orientação: Prof. Dr. Gilberto Luiz Alves

CAMPO GRANDE – MS

2013

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Anhanguera – Uniderp

Marques, Ana Claudia.

O sítio arquitetônico da estrada de ferro Noroeste do Brasil e suas funções

sociais na cidade de campo Grande-MS. / Ana Claudia Marques. -- Campo

Grande, 2013.

89f.

M315s

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Dedico a presente dissertação à

minha mãe, fiel e insistente no meu

progresso, e ao meu irmão Octávio,

pois sem o seu incentivo, essa

conquista não seria possível.

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AGRADECIMENTOS

À minha família tão querida, razão maior da minha força e existência.

As minhas amigas de curso pelo curto, mas prazeroso tempo que passamos e

aprendemos juntas, como também, é claro, das boas risadas que demos.

A todos que contribuíram para minha pesquisa, como os órgãos públicos

PLANURB, o IPHAN. Aos moradores do sítio da ferrovia, em especial a historiadora

Maria Madalena Dib Mereb Greco, pelo tempo que dedicou me recebendo no

Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul.

Aos professores que, ao longo de minha educação, fizeram grande diferença

na formação do meu intelecto. Sem poder citar todos, dou meu singelo

agradecimento a Celilza Esley Fernandes, Heloisa Messias Mesquita e Gogliardo

Vieira Maragno.

Ao meu orientador Gilberto Luiz Alves, por acreditar em mim e me guiar neste

trabalho tão importante para minha formação, me apresentando o mundo de uma

forma ainda desconhecida por mim e me ensinando a desenvolver um gosto pela

história e pelos livros.

Ao Prof. Dr. Sandino Hoff e a Profa. Dra. Silvia Helena Andrade de Brito, pois

foram grandes colaboradores para a melhoria do meu trabalho.

À Aline, que sempre me auxiliou em toda e qualquer dúvida que tive ao longo

do curso, sempre pronta a me ajudar.

À Universidade Católica Dom Bosco, pois me deu a chance de iniciar meu

aprendizado na carreira docente.

Agradeço a Deus por me permitir essa caminhada, como também pelos

encontros e desencontros que tive na vida, formando a minha história e me tornando

uma pessoa melhor.

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“Feliz aquele que transfere o que sabe e

aprende o que ensina.”

(Cora Coralina)

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RESUMO

O presente trabalho tem por objeto as funções sociais do Sítio Arquitetônico da

Estrada de Ferro Noroeste do Brasil em Campo Grande, MS e integra a linha de

pesquisa Sociedade, Ambiente, e Desenvolvimento Regional Sustentável. Descreve

historicamente a importância desse Sítio Arquitetônico, desde a chegada da NOB,

em 1914, até sua decadência, e avalia as transformações ocorridas, as funções

sociais desempenhadas por ele, o processo de tombamento da área e de que forma

está sendo tratado. Respalda teoricamente a investigação os estudos de ALVES

(1986) e MARX e ENGELS (2007). A revisão bibliográfica levantou informações

relevantes no que concerne aos assuntos ligados à ferrovia, ao urbanismo e à

expansão da cidade. O levantamento de dados se fez a partir de documentos, de

mapas e de entrevista aplicada aos técnicos e dirigentes de órgãos responsáveis

pelo bem tombado, como o PLANURB e o IPHAN, e aos residentes do Sítio

Arquitetônico. Diante dos dados obtidos percebe-se que o processo de

refuncionalização daquele espaço ainda não se completou. Processo lento e

gradativo, ele vem decorrendo de iniciativas governamentais e parcerias público-

privadas. No passado, ele foi expressão do domínio da NOB, que centralizou e

polarizou o desenvolvimento da cidade, enquanto suas unidades arquitetônicas, no

presente, são restauradas e refuncionalizadas para servir a projetos

predominantemente da área cultural.

Palavras-chave: Desenvolvimento urbano; Ferrovia; Patrimônioarquitetônico.

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ABSTRACT

The object of this work is the social functions of the Site Architectural Railroad

Northwest Brazil in Campo Grande, MS and integrates online research Society,

Environment, and Regional Sustainable Development. Describes the importance of

such historically Architectural Site, since the arrival of NOB in 1914, until its decay,

and evaluates the changes occurred, the social functions performed by him, the

process of overturning the area and how they are being treated. Theoretically

supports the research the study of ALVES (1986) and Marx and Engels (2007).The

literature review raised relevant information in respect of matters pertaining to the

railroad, urban planning and expansion of the city. The data collection was made

from documents, maps and interviews to coaches and officials responsible for organ

fallen well as the PLANURB and IPHAN, and residents Architectural Site. From the

data obtained it is clear that the process of refunctionalisation that space is not yet

completed. Slow and gradual, it comes derive from government initiatives and public-

private partnerships. In the past, it was the expression domain of the NOB, which

centralized and polarized the city's development, while its architectural units at

present are restored and refuncionalizadas projects predominantly to serve the

cultural area.

Keywords:Urban Development; Railroad; Architectural heritage.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Campo Grande: ínicio do século XX. .......................................................22

Figura 2 - Campo Grande: Primeira igreja construída em taipa, ano de 1879. .........25

Figura 3 - Rio de Janeiro: capital do Brasil, área central da cidade, início do século

XX. ............................................................................................................................27

Figura 4 -Santos: área próxima ao Porto de Santos, ano de 1902............................27

Figura 5 - Corumbá: vista do Porto, início do século XX. ..........................................28

Figura 6 - Campo Grande: ainda Vila, início do século XX. ......................................28

Figura 7 - Campo Grande: vista de um rodeio de gado, início do século XX. ...........29

Figura 8 -Campo Grande: Hotel Democrata, construído em taipa. Servia de parada

para os compradores de gado, antes da chegada do trem (início do século XX). ....29

Figura 9 - Campo Grande: Estação Ferroviária da NOB, construída em alvenaria,

ano de 1920 ..............................................................................................................35

Figura 10 –Fazenda Capão Bonito: propriedade da Brazil Land, a construção fazia

uso de telha de barro, material construtivo ainda não produzido na região, (década

de 20). .......................................................................................................................38

Figura 11 -Campo Grande: planta do plano de alinhamento de ruas e praças, ano de

1909 ..........................................................................................................................40

Figura 12 - Campo Grande: vista aérea da estação e a visualização da paisagem

urbana com alterações claras; várias casas, calçamento e ruas bem delimitadas

(década de 30). .........................................................................................................42

Figura 13 - Campo Grande: análise da ocupação da cidade e distribuição de

serviços e bairros, (década de 30). ...........................................................................43

Figura 14 - Campo Grande: primeira rodoviária, construída pelos irmãos Laburu,

expressa as necessidades criadas pelas rodovias, anuncia a decadência das

ferrovias, (década de 60). .........................................................................................58

Figura 15 - Campo Grande: destinos e horários de partida para os trechos que a

Ferrovia realizava no ano de 1992. ...........................................................................60

Figura 16 - Campo Grande: foto aérea com a área de tombamento do Sítio da

Estrada de Ferro Noroeste do Brasil. ........................................................................63

Figura 17 - Campo Grande: vista aérea de toda a extensão do Sítio da Estrada de

Ferro Noroeste do Brasil e suas principais setorizações...........................................69

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Figura 18 - Campo Grande: Estação Ferroviária transformada em Armazém Cultural

após sua revitalização. ..............................................................................................70

Figura 19 - Campo Grande: Primeira casa de alvenaria a ser construída para o

Chefe da Estação, está em processo de recuperação e fica no espaço da Orla

Ferroviária. ................................................................................................................71

Figura 20 – Projeto Parque Esplanada: zoneamento das propostas de reutilização do

Sítio Arquitetônico do Brasil. .....................................................................................72

Figura 21 - Campo Grande: Croqui do Parque Esplanada e suas propostas para

novo uso do espaço .................................................................................................73

Figura 22 - Bauru: Casa do Engenheiro Chefe já restaurada e com esquadrias e

toldos que não pertencem ao projeto original. ..........................................................77

Figura 23 - Bauru: Casa do Engenheiro Chefe já restaurada e com esquadrias e

toldos que não pertencem ao projeto original. ..........................................................77

Figura 24 - Campo Grande: Casa de Pouso dos dirigentes que passavam pela

cidade, esquadrias e portão ainda de madeiras........................................................78

Figura 25 - Bauru: Casa de Pouso para altos cargos que passavam pela cidade,

alterações no gradil. ..................................................................................................78

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SUMÁRIO

RESUMO

ABSTRACT

INTRODUÇÃO..........................................................................................................01

1 REVISÃO DE LITERATURA .................................................................................05

1.1 FONTES TEÓRICAS...........................................................................................05

1.2 FONTES HISTORIOGRÁFICAS .........................................................................09

2 MATERIAL E MÉTODOS ......................................................................................12

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO.............................................................................15

CONCLUSÃO ...........................................................................................................81

REFERÊNCIAS.........................................................................................................84

ANEXO 1...................................................................................................................87

ANEXO 2...................................................................................................................88

ANEXO 3...................................................................................................................89

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INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objeto de estudo a Estrada de Ferro Noroeste do

Brasil – NOB e sua influência para a história, formação e economia da cidade de

Campo Grande. Essa importância se explica devido ao fato de, antes de 1914, ano

de chegada da NOB, os habitantes terem a região como uma área isolada e

abandonada pelas instâncias governamentais.

As pessoas que habitavam Campo Grande, na época, viviam situadas umas junto às outras, mas sem maiores ligações a não ser a amizade ou o parentesco. Inexistia uma integração maior, por falta de presença do governo, do contato com o capital da província e mesmo pela ausência de lideranças mais ativas. A Região sentia-se abandonada, dona do próprio destino, sem disciplina, sem conforto, inteiramente balda dos mais elementares recursos. (MACHADO, 2008, p. 38).

A instalação da NOB em 1914 transformou Campo Grande, trouxe novas

ideias e novas necessidades, mudou as relações dos homens que aqui viviam.

Então a população cresceu, o comércio expandiu e sua importância econômica e

política começou a tomar vulto em todo o estado.

A Criação de novos centros de população, na Noroeste, sobre o percurso da via férrea, e a espantosa rapidez com que se povoavam, constituem um dos mais interessantes fenômenos provocados pela construção da estrada e tão surpreendente e tantas vezes repetidos que a fundação das cidades apareceu nessa região, como um corolário da estrada de ferro. (AZEVEDO, 1950, p. 76).

O crescimento das cidades por onde o trilho passou foi patente. Lugares

antes sem perspectiva alguma tiveram sua realidade e futuro completamente

modificados.

Para se ter uma ideia do impulso que tomou, em um quarto de século, de 1914 a 1940, o povoamento dessas regiões, bastará observar que a população dos quatro municípios, de Três Lagoas (15.378 hab), Campo Grande (49.629), Aquidauana (20.949) e Miranda (14.126) ascendeu, nesse período, a mais de cem mil habitantes ou mais do quíntuplo da população estimada antes da construção da estrada de ferro. (AZEVEDO, 1950, p. 83).

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Os trilhos da Noroeste do Brasil transformaram profundamente a estrutura

econômica de Mato Grosso, colocando por terra a hegemonia das casas comerciais

dos portos, pelo qual Campo Grande passou a assumir a função de grande

entreposto comercial do Estado.

Essa rede de transporte, que correspondeu ao assalto final contra as casas comerciais, teve seu momento culminante quando da inauguração da Noroeste do Brasil, mas consolidou-se com as estradas de rodagem que alimentavam essa ferrovia. Dentre elas merece destaque a rodovia que ligou Cuiabá a Campo Grande, cuja instalação resultou na progressiva sustação do movimento fluvial entre a capital do Estado e Corumbá. Campo Grande transformou-se, a partir de então, no grande entreposto comercial de Mato Grosso, capturando uma função que vinha sendo exercida por Corumbá desde a abertura dos rios da bacia do Prata à navegação. A ferrovia e as estradas de rodagem venceram os rios. Expressão material da vitória da ferrovia foi o desenvolvimento intenso de Campo Grande, enquanto a decadência em que se afundou Corumbá foi o reflexo dramático da derrota dos rios.(ALVES, 1984, p. 70).

As relações com o estado de São Paulo ficaram cada vez mais estreitas e,

tudo e todos que faziam o percurso de trem para, em seguida, se dirigir ao Norte do

Estado, tinham que passar por aqui. A cidade recebeu, como imigrantes, não só

brasileiros de outras regiões, mas, também, contingentes de paraguaios, japoneses

e árabes.

A Noroeste do Brasil fez, sobretudo, a extensa região mato-grossense orbitar

economicamente em torno do eixo São Paulo-Santos, retirando-a da influência

platina. Daí a importância de se discutir a história, a cultura e a economia antes e

depois da chegada do trem, para compreender a importância do patrimônio histórico

e cultural que fez de uma Vila Entroncamento, a Capital do Estado de Mato Grosso

do Sul e um dos maiores centros de exportação de gado de corte do país.

Campo Grande foi a cidade que mais “avultou”, no SMT, com a chegada da ferrovia. Entretanto, deve ser dito que essa afirmação apresenta-se incompleta: o problema, de fato, não consiste simplesmente em determinadas localidades haverem obtido maior ou menor vulto, mais importante que essa constatação parece ser o fato de que Campo Grande concentrou, notavelmente, os impactos gerados pela Noroeste – de tal modo que muitos dos efeitos alvissareiros, detectados no âmbito de nossa “área da NOB”, correspondem a eventos limitados, em considerável medida, ao município de Campo Grande. (QUEIROZ, 1999, p. 497).

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A partir dos anos 30 a Ferrovia Noroeste do Brasil, sofreu déficits por conta da

queda do café, que foi a mercadoria que mais rendeu lucros para a NOB durante

seu funcionamento. A região do Sul de Mato Grosso não pagava seus próprios

custos, devido à estrutura deficitária e às baixas tarifas por força das longas

distâncias. A partir do incentivo do governo de Juscelino Kubitschek para a criação

das rodovias e a instalação de indústrias automobilísticas no país, gradativamente o

fluxo de uso da ferrovia diminuiu.

Campo Grande teve através dos trilhos, o fortalecimento de suas relações

comerciais, intensificou o seu contado com São Paulo e investiu na criação de gado,

tanto em quantidade, como em qualidade. Mesmo os vagões tendo auxiliado, e

muito, no trajeto do gado negociado com outros estados, deixou a desejar pois não

investiu em momento algum em vagões frigoríficos.

Com a chegada das rodovias, os caminhões foram tomando conta dos

transportes. A Ferrovia, deixou de funcionar para transporte de pessoas em 1995 e

foi privatizada no ano seguinte, quando também conseguiu ser reconhecida como

Patrimônio Histórico Municipal.

Para compreender melhor este processo o presente estudo analisou o espaço

que a NOB ocupa na cidade, seu corredor, a vila dos ferroviários, as ruas e como a

cidade se desenvolveu ao redor de uma área, outrora tão importante e que depois

de uma longa fase de decadência do transporte ferroviário, se tornou Patrimônio

Histórico e se encontra em processo de revitalização.

O objetivo geral deste trabalho é a análise do espaço correspondente ao sítio

arquitetônico da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil em Campo Grande, no intuito

de compreender a função social desse espaço no desenvolvimento da cidade.

Para tanto, como objetivos específicos, busca: a) Analisar, a partir de

levantamentos documentais, bibliográficos e em periódicos, o processo de produção

do sítio arquitetônico da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil em Campo Grande; b)

Apreender, através da história, como se estabeleceram as relações sociais neste

espaço, tanto no processo de maior influência da Noroeste, como no momento de

sua decadência.

O trabalho foi dividido em capítulos de forma que cada um deles consiga

explicitar claramente as etapas do trabalho e a sua linha de estudo. A revisão de

literatura, traz as fontes teóricas que fundamentaram a linha de pesquisa e as

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principais fontes historiográficas, que permitiu a obtenção de dados cronológicos e

significativos no que tange o objeto desta pesquisa.

Em materiais e métodos, se esclareceu como foram obtidos todos os dados

citados neste estudo, seja em livros, entrevistas ou documentos levantados em

orgãos competentes.

O cápitulo de resultados e discussão traz a interpretação de todos os dados

da pesquisa combinados, na busca de atender os objetivos deste trabalho. A

conclusão do projeto apresenta uma leitura geral das análises feitas ao longo da

pesquisa.

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1 REVISÃO DE LITERATURA

Esta revisão teve como objetivo analisar estudos que auxiliassem a

compreensão da história e das relações sociais, pertinentes ao tema proposto. Em

um primeiro momento, foram buscadas as obras que serviram de fundamentação

teórica, em especial ao estudo da gênese e desenvolvimento da cidade moderna. E

em um segundo momento foram levantadas as fontes historiográficas que

permitiram enriquecer o estudo do objeto.

2.1 FONTES TEÓRICAS

Essas fontes foram a base de desenvolvimento desta pesquisa, a qual teve

como principal foco o desenvolvimento da cidade, por meio da chegada da Ferrovia.

Estudar a formação da cidade, sua política, economia e suas origens, é entender as

suas relações sociais, levando-se em consideração também, o espaço e o período

em que se insere na história geral.

Ao tratar de relações sociais dentro da sociedade moderna, é imprescindível

fazer uma análise da obra de Marx e Engels que,em se tratando deste trabalho,

serviu de fonte teórica. Desta forma, foi avaliada a formação da cidade e seu

progresso, com busca por autores relevantes dentro das ciências sociais, que se

encaixassem no período estudado, sendo este o período moderno.

A chegada dos trilhos na Vila de Campo Grande traz a ideia do progresso que

segundo muitos autores nada mais é do que evoluir nas suas relações econômicas,

onde o homem possa conquistar sua vida de forma mais produtiva e satisfatória,

ultrapassando vários limites e etapas, seja na busca de alimentos, do pastoreio, da

agricultura, do comércio, até chegar à etapa industrial.

Segundo Marx e Engels (2007, p. 75)

A maior divisão do trabalho físico e intelectual é a separação entre a cidade e campo. O antagonismo entre campo e cidade começa com a passagem da barbárie à civilização, do regime tribal ao Estado, da localidade à nação, e se mantém ao longo de toda a história da civilização até chegar aos dias

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6

de hoje (anti-corn-law-league)[...]Com a cidade, aparece a necessidade da administração, da policia, dos impostos e assim por diante, em suma da organização política em comunidade (Gemeindewssen) e, portanto, da política em geral. Nisso se manifestou pela primeira vez a separação da população em duas grandes classes, baseadas diretamente na divisão do trabalho e nos instrumentos de produção. A cidade já é obra da concentração da população, dos instrumentos de produção, do capital, do desfrute e das necessidades[...].

Quando foi avaliado o desenvolvimento local desta região, antigo Mato

Grosso, estávamos falando de um período de transição do Brasil república, e de um

período de muito investimento de capitais estrangeiros em território nacional.

Veremos que apesar de o estudo de Marx e Engels ser bem anterior as datas que

foram apresentadasneste trabalho, ele é bastante eficaz,até mesmonos dias atuais.

O estudo e o desenvolvimento de um país colônia é retardatário diante das

grandes potências como Europa e América do Norte. Mas, gradativamente, as

influências da Revolução Industrial e das máquinas a vapor e usinas vão chegando

ao Brasil. Nacionalmente, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais estavam em

constante contato com esses investidores estrangeiros e foi através de contatos

políticos e acordos econômicos que se iniciou o processo de concessão das

construções de Ferrovia no País.

Neste caminho, temos dois períodos acontecendo dentro do Brasil:a região de

São Paulo que já havia passado do período da agricultura e agora chega a receber

suas primeiras indústrias e, no Sul de Mato Grosso, Campo Grande ainda

completamente rural que, com o trem,ainda vai entender o que é cidade.

E como está na citação acima, é a cidade que vem concentrar a população,

produzir o capital, gerar as necessidades. Começam assim a se estabelecer

relações que antes não existiam e isso modifica a estrutura urbana, o homem e o

seu modo de pensar.

Pode-se diferenciar os homens dos animais através da consciência, através da religião, através do que se quiser. Eles mesmos começam a produzir seus viveres, um passo que é condicionado pela organização corporal. Ao passo que produzem seus viveres (Lebensmittel), os homens também produzem indiretamente na sua vida material (materielles Leben). [...} O que os indivíduos são, portanto, depende das condições materiais de sua produção. (MARX and ENGELS, 2007, p. 43)

A chegada do progresso e o contato com outros Estados mais desenvolvidos,

modificaram o pensamento e as relações sociais locais. Os imigrantes, os

profissionais liberais, o comércio e os serviços que foram se concentrando na cidade

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atraíram cada vez mais investimentos para o setor de destaque local, a pecuária.

Através dessa produção e dos interesses gerados pelo capital monopolista, essa

produção passa a atender a demanda do setor industrial do estado de São Paulo

que, como consequência, passou a firmar parcerias de exportação deste mesmo

produto.

Outro autor que estuda as relações sociais em Mato Grosso, nesse período,

através do progresso do mundo capitalista, é Alves. No ensaio que realizou sobre a

transição do domínio econômico da casa comercial para a hegemonia do capital

financeiro, consegue explanar, através de dados econômicos, as mudanças que

aconteceram do período anterior a este estudo, onde Corumbá era o grande

entreposto comercial através do Porto. E finda com a chegada da Ferrovia que veio,

então, a fazer da cidade de Campo Grande a cidade de maior ligação comercial com

o eixo São Paulo – Santos.

Este ensaio contribuiu muito para o entendimento das questões políticas da

região, da mudança das formas de negociação e dos que possuem o poder do

capital. Em um primeiro momento as Casas Comerciais eram determinantes nas

relações de comércio e exportação.

Em Mato Grosso o capital financeiro manifestou-se por duas vertentes. A primeira delas utilizou como canal a própria casa comercial, quando esta se erigiu em representante de bancos nacionais e estrangeiros. Do crédito à produção a casa comercial retirou a maior força de seu domínio econômico e político no Estado nessa fase. A sua ação implacável, porém refletida especialmente em elevadas taxas de juros sobre empréstimo e financiamentos, gerou nos capitalistas mato-grossenses ligados à produção o anseio pela presença de bancos na região. (ALVES, 1986, p. 39)

Com a vinda dos bancos as relações comerciais mudam e isso também afeta

todo um ciclo de acontecimentos, tanto nas alianças políticas, quanto econômicas.

Alvesapresenta em seus levantamentos que antes mesmo da chegada da Ferrovia,

havia um próspero investimento na pecuária. Com as instalações de frigoríficos no

estado de São Paulo, este interesse pela área Sul de Mato Grosso como produtora

de gado se intensifica e ao mesmo tempo a vinda da NOB só contribuiu para

acelerar esse processo.

Os rios da bacia do Prata, enquanto vias naturais de comunicação e transporte, foram substituídos pela ferrovia, que encarna, por excelência, uma relação social. Igualmente, foram promovidos o melhoramento qualitativo do rebanho e a substituição de pastagens naturais etc. etc. (ALVES, 1986, p. 67)

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Em vista disso é possível entender que essa transição econômica afetou as

pessoas e também a paisagem local, ou seja, novas pessoas foram atraídas e, com

elas, vieram novos investimentos, fazendas, cidades, pelos quais chega o progresso

para uns e a estagnação ou decadência para outros. É o domínio daqueles que

possuem o poder de decisão, naquele determinado tempo e espaço.

As ideias da classe dominante são as ideias dominantes em cada época, quer dizer, a classe que exerce o poder objetal dominante na sociedade é, ao mesmo tempo, seu poder espiritual dominante. A classe que tem à sua disposição os meios para a produção material dispõe ao mesmo tempo, com isso, dos meios para a produção espiritual, o que faz com que lhe sejam submetidas, da mesma forma e em média, as ideias daqueles que carecem dos meios necessários para produzir espiritualmente. (MARX and ENGELS, 2007, p. 71)

Ao utilizar o trabalho de Marx e Engels como base, fica muito mais claro

entender as relações que se formaram durante todo o processo de inserção desta

Ferrovia, a sua vida útil e sua decadência. Em suma, pode-se afirmar que

pertencemos a uma sociedade capitalista, uma vez que o Brasil desde o século XVI

foi incorporado como colônia portuguesa e assim a um mundo capitalista.

Para uma análise focada no urbano, levou-se em conta a cidade moderna e

suas formas de organização, seus zoneamentos e desta forma a divisão de classes.

O trabalhador, como o grande produtor da energia ou de capital, esteve sempre

limitado pelo capital monopolista e seus interesses. Campo Grande se formou

através da NOB, mas, antes mesmo, já era um ponto de produção de gado e

estabelecia relações com grandes compradores de Minas Gerais e São Paulo. Na

verdade os acontecimentos foram gradativos e intencionais, para atender a

interesses de fundo econômico.

Alves (1986) deixa explícito em sua obra que o interesse na pecuária foi o que

determinou a mudança do poder de Corumbá para Campo Grande. Esclarece

também o porquê, até os dias de hoje, o Mato Grosso do Sul tem a pecuária como

sua principal fonte de renda, com destaque nacional e internacional na produção de

carne.

Dentro do ponto de vista de Marx e Engels, o estudo de Alves (1986),se

baseou em relatórios de compra e venda de mercadorias, exportação e demanda de

mercado, ele abordou claramente todas as relações políticas e foi através delas que

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se tornou possível entender como as transações comerciais daquele período

acabaram determinando o futuro da região.

Baseado no estudo da sociedade e na maneira de sua organização, evolução

e desenvolvimento intelectual, Marx e Engels fizeram um estudo sobre o trabalho e

as implicações que trazem ao indivíduo, quando passa a fazer parte de um grupo,

ou seja, o indivíduo em sociedade e suas relações.

A implantação daquele Sítio foi o que propiciou o desenvolvimento local e

trouxe investimentos e mão-de-obra que antes não existia. As pessoas que

participaram da construção e depois se estabeleceram em Campo Grande, foram

frutos de acordos e negociações políticas e econômicas, utilizando da força efetiva

que é o trabalhador.

O traçado da ferrovia chega até a região por interesses políticos e

economicos, visto que essa região do país, sul de Mato Grosso, era muito mais

favorável a um futuro desenvolvimento, que o norte de Mato Grosso e a região do

extremo leste da Bolívia. O período aureo desse investimento acompanhou o auge

do café, mercadoria que devido ao grande rendimento conseguiu cobrir os déficits

que o trecho de Mato Grosso tinha.

Após a queda do café a ferrovia não consegue mais cobrir seus gastos e

durante a década de 50 e 60 já se encontrava em um processo de decadência, que

se intensifica com o incentivo do governo à abertura de estradas.

Estudar a formação da cidade, sua economia e política é entender o seu

processo de evolução de uma sociedade, sua diversidade. O trabalho é o que

constrói através do homem, que é o agente principal do desenvolvimento, das

relações humanas e do tão esperado progresso.

1.2 FONTES HISTORIOGRÁFICAS

A literatura levantada sobre a Noroeste do Brasil é bastante rica.Mas grande

parte dela serve como coletora de dados, pois se baseia em relatórios expedidos ou

diários de bordo de pessoas que participaram da criação da ferrovia. Sãolivros muito

importantes e que possuem focos específicos, de onde se pode levantar o processo

histórico da NOB.

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Em Azevedo (1950) é possível resgatar toda a ideia inicial do projeto da

Ferrovia e as diversas mudanças que ocorreram antes e durante essa construção.

Aborda bastante as relações políticas da época e as implicações que isso trouxe, na

qualidade do serviço aplicado, nos anos de construção dos trilhos. Cita as

dificuldades que se tinha em cortar a mata e o sufoco que enfrentaram com as

malárias e a leishmaniose.

Cita a Marcha para o Oeste e a intenção que se tinha de povoar o oeste do

país. Aborda ainda a grande fronteira terrestre que o Brasil tem com o Paraguai e a

importância de se instalar um fluxo constante de gente no local, na tentativa de

proteger o país de invasões. E em seus relatos, chega a citar Campo Grande como

um dos fenômenos de desenvolvimento, graças aos trilhos.

A Criação de novos centros de população, na Noroeste, sobre o percurso da via férrea, e a espantosa rapidez com que se povoavam, constituem um dos mais interessantes fenômenos provocados pela construção da estrada, e tão surpreendentes e tantas vezes repetidos que a fundação das cidades apareceu, nessa região, como um corolário da estrada de ferro. (AZEVEDO, 1950, p. 76)

Além dos dados importantes que trás da criação da Ferrovia, é uma leitura

bastante enriquecedora, pois foi escrita no ano de 1950, quando a NOB ainda

estava em funcionamento. Azevedo acreditava que seria possível manter o avião, o

carro e o trem funcionando ao mesmo tempo, sem que um tomasse o espaço do

outro. Chegou a considerar como exemplo alguns países Europeus.Hoje concluímos

que as políticas do país não propiciaram este equilíbrio, e que o trem, em grande

parte, foi inutilizado.

Em Queiroz (1999) foi exposto, através de levantamentos bibliográficos e

relatórios anuais da NOB, um paralelo entre a atuação e o rendimento da Ferrovia

no estado de São Paulo e no Sul de Mato Grosso. Nesta pesquisa são apontados

vários fatores, retirados desses relatórios, que concluem que na verdade a Ferrovia

rendeu lucros apenas em São Paulo e que os trilhos do Estado de Mato Grosso

foram mantidos por esses rendimentos.

Houve um empenho muito grande na busca de informações que deixassem

claros os motivos da Ferrovia ter entrado em decadência. Enfatiza as dificuldades

que se teve para a construção dos trilhos, o sucateamento dos vagões, a grande

influência política dos militares no comando da NOB e as influências das revoluções

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a partir de 1924. Mas deixa claro que o grande vilão dos déficits da Ferrovia era o

Sul de Mato Grosso. Deixa claro, assim como Azevedo (1950), que a NOB valorizou

as terras do Mato Grosso e contribuiu para a formação de cidades, reconhecendo o

movimento do progresso.

Em Congro (1920), tem-se uma espécie de relatório de acontecimentos na

cidade de Campo Grande, no período em que foi escrito. O autor faz um

levantamento de todas as condições físicas deste município. Fica evidente como

principal interesse a questão da pecuária local, pois além de realizar visitas nas

principais fazendas da região, faz uma memória fotográfica desse material. É uma

leitura muito rica e restrita a Campo Grande, ou seja, é bem específica. Mas, como

em Azevedo (1950), é bastante enriquecedor o fato de ter sido escrita quando a

Ferrovia ainda estava em funcionamento, pois havia várias expectativas econômicas

para o espaço físico da cidade.

Em todos os autores aqui citados, Alves (1986), Azevedo (1950) e Queiroz

(1999), há, através de análise de determinados acontecimentos, o estudo das

relações sociais. A todo o momento, mesmo durante o fornecimento de dados, se

evidenciam os interesses, e por fim entende-se que todo o desenvolvimento de uma

sociedade e o futuro que ela toma, depende das relações humanas e da força de

trabalho que é o homem.

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2 MATERIAL E MÉTODOS

Nestesegundo capítulo, foram apresentados os materiais e os procedimentos

realizados para apropriação do objeto de pesquisa. Assim, ao realizarmos todo o

levantamento histórico, pudemos entender como a Ferrovia serviu para o

desenvolvimento econômico e as relações sociais que vieram a se estabelecer neste

espaço.

Foi efetuado o levantamento bibliográfico, tanto sobre a Noroeste do Brasil,

quanto sobre a cidade de Campo Grande, no intuito de entender a proporção da

influência deste evento. Desenvolveu-se o estudo de forma cronológica, avaliando-

se sempre os acontecimentos concomitantemente, do antigo estado de Mato Grosso

e do país.

Neste levantamento historiográfico as obras de Azevedo (1950) e Queiroz

(1999), discorrem sobre a ferrovia em uma visão nacional. Na obra de Alves (1986),

foram levantados dados das condições em que o estado se encontrava até a

chegada da ferrovia, como também as mudanças dos interesses econômicos e

políticos da época. No relatório feito por Congro(2003), foi possível obter dados mais

específicos, uma vez que em toda a obra se encontra dados e imagens do município

de Campo Grande no período de 1920. Na obra de Greco (2011), há uma visão mais

intimista e enfoca as relações sociais de dentro do Sítio, sendo, dessa forma, um

relato bem específico da vida e dos acontecimentos dentro do espaço da Noroeste.

Outro autor que realizou levantamentos sobre as obras do sítio foi Arruda (2000),

com uma proposta mais voltada para a arquitetura do sítio e suas características

construtivas, o que também é um reflexo do desenvolvimento econômico e das

relações políticas do período em questão.

Com as bibliografias de apoio, foi possível entender a cidade de Campo

Grande e o seu desenvolvimento antes e depois da chegada da ferrovia, e assim

elaborar um mapeamento (figura 14), pelo qual se investigou as primeiras formas de

ocupação do espaço urbano e de sua organização. Foi possível avaliar o traçado, as

atividades e serviços que a população local desenvolvia, e delimitar, através dos

limites de ruas e manchas, a organização e vida da cidade com a instalação da

Estação.

O levantamento de imagens fotográficas, das principais cidades, durante a

chegada da Ferrovia e a comparação do grau de desenvolvimento desses espaços

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com o material fotográfico da Vila de Campo Grande, encontrado no Álbum Gráfico

de Mato Grosso (2011), deu a dimensão exata de quão importante foi a instalação

da NOB neste espaço. A integração visual com o levantamento bibliográfico, não

deixa dúvidas de que o desenvolvimento local, atraído por criadores de gado, se

solidifica após a chegada do trem, e só assim se alcançou o posto de cidade.

Campo Grande teve suas relações comerciais consolidadas com São Paulo e, desta

forma, acesso ao desenvolvimento e ao progresso.

As imagens de outras Estações, que também pertenceram a Noroeste, como

a Estação de Bauru, servirampara fazer comparaçõescom as condições do

Patrimônio,uma vez que, tanto o Sítio da NOB em Campo Grandecomo o Sítio da

NOB de Bauru eram considerados Patrimônios Históricos e possuíam os mesmos

tipos de construções, da mesma época. Ao avaliarmos a manutenção e as

alterações, percebemos, inclusive, que o nosso Sítio possui muito mais fidelidade

aos projetos originais do que de outros estados, como São Paulo.

Sobre o levantamento realizado no Instituto Municipal de Planejamento

Urbano – PLANURB, pode-se afirmar que é o órgão responsável pelo Sítio e que

participa dos projetos que venham a ser feito dentro da área do patrimônio histórico

local. Foi possível o acesso às propostas de projeto do Programa Reviva Centro, do

qual o Sítio da Ferrovia faz parte. Este projeto foi realizado a partir de um incentivo

cedido pelo PAC – Cidades Históricas. Dentreas noventa e quatro propostas feitas

para o Centro Antigo da cidade,destaca-se a Orla Ferroviária, que envolve todo o

traçado do trilho que corta a região central – obra que foi entregue em dezembro de

2012. O Sítio da Ferrovia, que envolve o pátio dos ferroviários, a rotunda e oficinas,

estão dentro deste novo projeto.

Sobre o levantamento junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico

Nacional – IPHAN, não foi possível marcar entrevista. O que foi possível levantar

sobre o parecer do IPHAN em relação ao espaço do Sítio, foi uma entrevista do seu

atual superintendente, cedida ao jornal local da cidade que deu algumas

informações de relevância para o trabalho.

Ainda no IPHAN foi possível ter acesso ao Decreto Lei n°25 de novembro de

1937, onde se estabelece todas as diretrizes do Patrimônio Histórico e Artístico

Nacional, seja ele material ou imaterial. Essas leis julgam os bens que foram

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relevantes para a história nacional e quais os procedimentos para que este bem seja

protegido.

Foi possível o acesso ao documento de registro do patrimônio, que é um

relatório de condições do bem tombado que o IPHAN realiza logo que avalia as

condições do espaço. Neste material, fiscais do IPHAN fazem um estudo do espaço

e em que estado de conservação se encontram os bens. Este documento e datado

ano de 2009 e avalia todos os bens inclusos no tombamento da Estação Ferroviária,

escritórios, oficinas, armazém, rotunda de manutenção, casas para operários, casas

para funcionários intermediários, casas para funcionários graduados, caixa d’água e

escola, o conjunto de 135 edificações, ocupa 22,3 hectares. Após essa avaliação foi

realizada a inscrição dos mesmos, no livro do Tombo Histórico Arqueológico,

Etnográfico e Paisagístico. E ainda registra que a importância deste patrimônio se dá

pela participação que a Ferrovia teve na integração e na modernização nacional.

As entrevistas feitas no espaço do sítio, iniciaram em julho de 2012 e durante

as visitas ao Intituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul, que tem suas

instalações na antiga casa de pouso da NOB, foi possivel obter o endereço de

moradores que participaram da ferrovia antes de sua privatização. Gradativamente

se deu o contato com essas pessoas que até hoje residem em casas dentro do sítio.

Ao todo buscou-se por aproximadamente 14 moradores que fizeram parte da

ferrovia e ainda residem naquele espaço, desse número apenas 10 se

disponibilizaram a dar entrevista.

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3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Neste terceiro capítulo foram apresentados os resultados da pesquisa a partir

dos levantamentos das fontes teóricas, historiográficas, entrevistas e documentos.

Do mesmo modo, também serão apresentadas a descrição do processo histórico da

instalação e da decadência da NOB, e as funções sociais que ela exerceu na cidade

de Campo Grande.

Para entender a proporção da influência da EFNOB na região de estudo,

precisamos conhecer quais as condições locais antes da chegada de seus trilhos. O

espaço territorial do Estado de Mato Grosso no início do século XVIII despertou

interesses em decorrência da descoberta de ouro na área norte, em Cuiabá,

atraindo vários portugueses para a região.

Em 1775 o governo manda construir o Forte Coimbra, no distrito de Corumbá,

um vilarejo na época chamado Vila de Nossa Senhora da Conceição de

Albuquerque. Essa construção era uma forma de manter o domínio sobre a fronteira

e evitar as invasões Espanholas.Acabou como palco da guerra do Paraguai.

Após a Guerra da Tríplice Aliança, o Estado de Mato Grosso passa a ter livre

acesso pelas rotas fluviais e se livra das grandes viagens cruzando o estado de

Goiás. A bacia do Prata fica livre de obstáculos para suas navegações, após a

derrota do Paraguai.

A circulação intensa de mercadorias inglesas na bacia do Prata, afastados os obstáculos à livre concorrência, ultrapassou as fronteiras do Paraguai, alargando seus limites para o interior de Mato Grosso. Com isso foram reduzidas sensivelmente as dificuldades de acesso à excêntrica Província brasileira, até essa época restrita ao caminho terrestre de Goiás. O barateamento das mercadorias, viabilizado pela redução dos custos de transporte, fixou em definitivo a nova rota fluvial do comércio, tendo sido relegada ao abandono a antiga alternativa terrestre. Mato Grosso libertava-se, enfim, das limitações impostas pelo longo e tortuoso caminho de Goiás. (ALVES, 1984, p. 11).

Corumbá era o ponto de maior destaque na região sul do estado. O porto, as

relações comerciais e a ocupação militar, fizeram deste povoado um dos mais

significativos na história de Mato Grosso. A chamada Cidade Branca abastecia toda

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a região com suas mercadorias através de suas Casas Comerciais.

Pela sua condição de principal porto fluvial da região, Corumbá erigiu-se, nessa fase, no centro nervoso do comércio mato-grossense. As embarcações de médio calado, provenientes de Buenos Aires, Montevidéu e Assunção despejavam mercadorias nos depósitos das casas comerciais corumbaenses, ou suas cargas eram transferidas, para embarcações menores, que se dirigiam para o norte da Província, especialmente Cuiabá. Enquanto principal entreposto comercial de Mato Grosso, não é surpreendente que em pouco tempo Corumbá tenha alcançado um grau de desenvolvimento ímpar na região. (ALVES, 1984, p. 22).

Instalaram-se ali, vários estrangeiros e grandes casas comerciais como a

Casa Vasquez e a Casa Bais & Wanderley. A cidade possui, até os dias de hoje,

construções e monumentos que podem nos remeter ao período áureo do local e

assim entendermos quão grande foi o poderio econômico da mesma.

Mercadorias eram trazidas, frequentemente, em carros de bois, da Vila Nova, mas provenientes de Corumbá ou do Paraguai, Tecidos, calçados, chapéus, especiarias e até alguns artigos de luxo importados, pois Corumbá, nessa época, era excelente praça importadora de artigos europeus. Ali, no seu velho e arruinado porto, ainda é possível sentir hoje a opulência de seus grandes dias, examinando a faustosa arquitetura das maiores casas comerciais da época, como a Casa Vasquez, a Casa Cavassa, a Casa Bais & Wanderley. (MACHADO, 2008, p. 42)

O papel que as Casas Comerciais desempenhavam na época era de suma

importância no entendimento do desenvolvimento econômico e político da região.

Possuíam poder sobre as importações e exportações, além de controlarem as rotas

fluviais, se apoderando de grande parte da riqueza.

Segundo Alves (1984, p. 28)

[...] todos os produtores regionais, sem exceção, dependeram da casa comercial para efeito de abastecimento e escoamento de mercadorias, o que os colocou sob o controle irrestrito desta. Também insinuou-se claramente, nesse momento em que a casa comercial era a principal incentivadora da diversificação da produção mato-grossense, a presença de um novo mecanismo, que passava a mediar as relações entre comerciantes e produtores: o crédito.

Os produtores da região tinham nas Casas Comerciais um sistema de conta

corrente, onde tudo que era retirado era relacionado para controle tanto da casa

quanto do comprador. Era muito comum fazer retirada de produtos durante todo o

ano e no findar do mesmo fazer o acerto. Essas Casas Comerciais também

funcionavam como bancos na região. Esses comerciantes detinham a renda e o

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domínio sobre as informações.Eles conseguiam saber o que acontecia nas regiões

do interior, quais os prováveis investimentos a serem feitos e acabavam dominando

além das informações, a riqueza da região, através da compra, venda e estocagem

de mercadorias.

Tem-se, enfim uma ideia do que era a casa comercial mato-grossense no ocaso do século XIX: monopolizava a navegação e o comércio de importação e exportação de mercadorias; através do crédito, financiava a exploração de novas atividades econômicas em Mato Grosso ou a expansão das existentes, aproximando-se, em seu funcionamento, do próprio banco; finalmente começava a participar diretamente da produção, arrendando e comprando terras para extrair borracha e explorar a pecuária extensiva. Esse arrolamento reflete, por sí só, o alto grau de concentração do capital levado a cabo pela casa comercial na região. (ALVES, 1984, p. 31 - 32).

Muitas dessas casas comerciais se expandiram para outras vilas no estado, a

própria Casa Wanderley Baís & Cia., fundada em Corumbá teve filiais em

Aquidauana e Campo Grande. Outras tinham sua sede em Cuiabá e vinham agente

da Brasil Land, Cattle and Packing Co., pertencente ao Sindicato Farquahr, grupo de

grande influência na história da econômica e política do estado. No ano de 1889,

chega a ser proposto a transferência da Capital do estado, que era Cuiabá, para

Corumbá.

Durante esses acontecimentos na principal cidade da região sul do estado de

Mato Grosso, outras regiões começaram a explorar a erva-mate, produto também de

suma importância para a vida econômica e social do sul do estado. A Companhia

Matte Larangeira, inicialmente comandada por Thomaz Larangeira (1882) e depois

em parceria com os Irmãos Murtinho (1891), recebeu a concessão do governo para

explorar a área onde a erva-mate era nativa.

Esta companhia sempre teve grande força política no estado, pelo fato de

Thomaz Larangeira possuir contato com o presidente de estado e outras figuras

políticas. A ele foi assegurado o direito de ser o único arrendatário legal na

exploração da erva-mate, entre outras obrigações estabelecidas pelo estado.

A vinculação entre Larangeira e políticos mato-grossenses, particularmente com aqueles que estão no poder, garante-lhe as primeiras concessões e o Decreto 520, faculta-lhe o monopólio da exploração da erva-mate. Esse Decreto autoriza a Empresa Larangeira “a zelar e fazer zelar por seus prepostos as matas e ervais de modo que fossem conservados no melhor estado possível, não permitindo que estranho alí se estabelecessem sem autorização legal [...] (WEINGARTNER, 1995, p. 70)

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Desta maneira a Companhia Mate Larangeira passa a ter a responsabilidade

de controlar a entrada de estranhos nos ervais e por consequência autorizar esse

acesso. Ela também tinha livre direito a formulação de contrato para com terceiros

na prestação de serviços e autorização para manter uma guarda policial. Outra

resolução estabelecida pelo governo, Resolução n° 76 de 1894, também a isentava

do pagamento de impostos. Obteve assim, o monopólio de exploração da erva-mate

nas áreas que a ela foram concedidas.

O poder dado pelo Estado à Cia. Matte Larangeira concede a esta grande

poder político e econômico. Enriquecendo-se, chega a fazer empréstimos para o

próprio estado. Ela passa a controlar o governo estadual, a decidir como as terras e

as ocupações acontecem nesse espaço.

Para os outros moradores desses ervais, ela impõe sua lei, de forma que todos devem prestar serviços à Matte Larangeira, porque, pelos contratos de arrendamento, só ela tem direito de autorizar a fixação de migrantes na região. Aqueles que não aceitam ser empregados da Companhia e tentam tornar-se proprietários são considerados estranhos, perturbadores da ordem e, assim, a Companhia ficava autorizada a expulsá-los dos ervais e dos Campos de Vacaria. (WEINGARTNER, 1995, p. 73).

Por um bom período a Cia. Matte Larangeira funcionou como um vigia da

região sul de Mato Grosso e desta forma sempre teve domínio político sobre grande

parte da população. As relações comerciais com os moradores colaboravam para

esse poder. Os produtores das áreas de plantio, ao fazerem a venda do mate,

recebiam o pagamento em produtos como sal, tecido e ferramentas, no preço que a

mesma estabelecia, sempre criando créditos para a companhia e débitos para o

produtor.

Segundo Centeno (2008, p. 140):

[...] carta redigida por Thomas Larangeira, em 1879, na qual informava ao Barão de Maracaju sobre seus primeiros trabalhadores que iria introduzir nos ervais de Mato Grosso. Tendo se iniciado nessa atividade no Paraguai, nos anos 1870, e possuindo experiência para administrá-la, sabia de antemão que, para contar com esse trabalhador, era preciso adiantar seu pagamento, ou melhor era necessário fazer com que ficasse endividado para que não abandonasse o trabalho.

O trabalhador ervateiro era em maior parte de nacionalidade paraguaia, pois

já estavam adaptados com o tipo de cultivo que a Matte Laranjeira precisava e, por

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que não dizer, “domesticados” ao modo de trabalhar da companhia. Outro fator de

destaque para essa migração dos paraguaios é o pós-guerra, que deixou muitos

deles sem perspectiva alguma em seu país de origem e buscaram, assim, no país

vizinho, novas fontes de sobrevivência. Povos de outros estados migraram para a

região, mas nem todos conseguiram terras para plantio disponíveis ou se adaptaram

as regras que o monopólio impunha.

Como se vê, a economia do mate atraiu muitos imigrantes na esperança de que pudessem vir a melhorar suas vidas no sul do Estado. Contudo, foram poucos os imigrantes que conseguiram lotes de terras explorando o mate e criando gado. Chegando a fronteira, deparavam-se com o monopólio exercido pela Companhia Matte Larangeira que os impossibilitava de ter acesso às terras. (CENTENO, 2008, p. 168).

É com a vinda de mineiros, após a independência, que se dá a ocupação da

área Sul do Estado de Mato Grosso, por meio da criação extensiva de gado. Os

grandes campos deram a possibilidade do uso dessa terra para a exploração

pastoril.

Em busca não mais do desconhecido, mas de uma região habitada apenas por tribos selvagens e animais ferozes, se pôs a caminho a caravana dos modernos bandeirantes, dos audazes pioneiros da civilização em tão belas, porém incultas paragens. (CONGRO, 2003, p. 25).

Nota-se em estudos de historiadores da região, que os bandeirantes

paulistas, que empobreceram depois de frustradas buscas ao ouro em Minas e no

Mato Grosso, se fixaram por essas terras e assim começaram a desenvolver a

pecuária no sul do Mato Grosso. Passaram a desbravar a terra que estava arruinada

devido a Guerra do Paraguai ou até mesmo ainda inexplorada, fugindo da pobreza

em que se encontravam. Os mineiros também vieram em busca dessas terras para

explorar a pecuária.

Em meados do século XIX, essa região começa a ser habitada por imigrantes mineiros e paulistas atraídos pelos vastos campos favoráveis à criação de gado, e militares responsáveis pela defesa do território brasileiro. (CENTENO, 2008, p. 153).

A ocupação da região sul ocorreu, portanto, por meio de duas vertentes: uma

advinda do norte de Mato Grosso, que se instala no pantanal, baixo-paraguai; e a

segunda, constituída por mineiros e paulistas que ocuparam parte da fronteira com o

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Paraguai e a Serra de Maracajú. Esses povos possuíam costumes distintos e isso

influenciou muito na constituição de uma cultura universal, de diferentes costumes e

de descendentes singulares.

Segundo Alves (2004, p. 30):

Por outro lado, baseado na historiografia especializada, colocou em relevo a origem fidalga desses bandeirantes, também eles descendentes de uma nobreza empobrecida, [...] mesmo pobres, esses homens jamais deixaram de revelar atitudes aristocráticas que traíam sua origem social.[...] a valorização dos estudos foram traços de comportamento que evidenciaram sua ascendência nobre e os tipificaram socialmente.[...] Muito diferente era a atitude dos pecuaristas instalados no planalto da Serra de Maracaju, originários de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul, cuja prática era a de incorporar os filhos imediatamente às lides do campo, assegurando-lhes pouco mais do que os estudos das primeiras letras. Na Nhecolândia, muito rapidamente, os pecuaristas descendentes dos pioneiros foram tornando-se, quase todos eles, “doutores”.

Instalavam-se, inicialmente, em ranchos que eles mesmos construíam, e as

benfeitorias de pasto ou do que precisassem para o serviço, era retirado da mata

local. Depois de algum tempo, e de renda acumulada, iam melhorando as condições

de moradia, pasto e controle, marcação de gado.

No início, ainda sem um capital significativo, os fazendeiros instalados na

região da Nhecolândia, ao precisarem de mercadorias, como remédio e sal, tinham

de fazer o charque e transportar esse produto até Corumbá, para fazerem trocas

com as casas comerciais. Mas em Corumbá não era dado o devido valor a esse

produto, pois as casas comerciais eram as únicas compradoras, tornando o preço

pago insignificante. Isso gerou, historicamente, um mal-estar nessa relação, que

perdurou por tempos e impediu qualquer acordo político depois disto.

Eis a origem econômica das divergências e do rancor do pecuarista contra o comerciante corumbaense. Este, por seu lado, não via o pecuarista como um cliente importante, daí uma certa desconsideração por aquele homem rude que raramente se dirigia ao seu estabelecimento. (ALVES, 2004, p. 43).

Na realidade, o que o pecuarista realmente precisava, era manter seu contato

com os tropeiros e boiadeiros que vinham do Triângulo Mineiro, Uberada e São

Paulo. Era com eles que as negociações aconteciam,e através deles que chegavam

as informações sobre as novidades do mercado e a descoberta por novas raças e

do aprimoramento do plantel.

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Após a chegada da NOB e o poder do capital financeiro atingir Corumbá, as

casas comerciais foram perdendo progressivamente o poder e as relações

comerciais passaram a ser priorizadas por São Paulo e pelas extensões dos trilhos

da Noroeste. A chegada dos bancos na região também tirou um dos principais

serviços das casas comerciais, que era a concessão de créditos.

A expansão pastoril se intensificou, atingiu várias áreas de Mato Grosso pela

NOB e Campo Grande foi uma delas.

A expansão pastoril semeia posses e fazendas na região propiciando o aparecimento de arraias e cidades, entre eles, Nioaque, Entre Rios, Aquidauana, Campo Grande [...]. (WEINGARTNER, 1995, p. 19).

Campo Grande fora apenas um campo de vacaria e, no ano de 1872, chegou

até essa região um sertanista chamado José Antônio Pereira. Um mineiro que

organizou uma expedição a Mato Grosso, que ao chegar averiguou que a terra era

boa para a lavoura, terra vermelha e abundante em água, estabeleceu aqui seu

ponto de parada e colocou em pé o primeiro rancho. Deixou Nepomuceno, um

caboclo vindo de Camapuã, para cuidar da benfeitoria e retornou para Minas Gerais.

Em 1875 retorna para este arraial com toda sua família, empregados e carros de boi,

e se tornou o fundador desta cidade.

A enorme extensão de terras não ocupadas, a sua ótima qualidade para cultura e criação e, sobretudo o clima ameníssimo, elementos seguros de prosperidade, fizeram atração de inúmeras pessoas vindas não só de Minas, como de São Paulo, Rio Grande do Sul e outras províncias. (CONGRO, 2003, p. 28).

Logo à margem do córrego, hoje chamado Prosa, se estabeleceram vários

ranchos com pessoas que buscavam um futuro promissor tirado da terra. Esses

ranchos se instalaram na chamada Rua Velha, atual 26 de agosto e em 1887 surge,

neste mesmo local, a primeira casa comercial, que era abastecida pela compra de

mercadorias no Porto de Corumbá.

Era possível, na aprazível cidade de Corumbá, comprar-se manteiga “de Many”, da França, biscoitos e queijos da Suíça, casimiras inglesas, calçados de legítimo cromo alemão, conservas, bebidas finas e tudo o mais que produzia a indústria europeia. Poucas dessas coisas chegavam á pequena freguesia de Campo Grande, ainda pobre e caipira. (MACHADO, 2008, p. 42-43).

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Figura 1 - Campo Grande: início do século XX. Fonte: Corrêa, 2006.

Campo Grande era chamada por Arraial de Santo Antônio, devido a

construção pelo seu fundador em 1879, da primeira igreja local que tinha como

padroeiro o santo casamenteiro. Os costumes, já nesse primeiro período, sofriam

influências mineiras, gaúchas e fronteiriças. Um povo onde a miscigenação formou

uma cultura singular, um somatório de várias culturas. Uma região que, até os dias

de hoje, não tem um tipo étnico definido, mas por conta disso adquiriu condições

peculiares.

Os paraguaios que vieram, em grande parte por conta da erva-mate, acabam

encontrando parada e outros tantos de mineiros e gaúchos que vem em busca dos

campos imensos e propícios a um fácil desenvolvimento da pecuária. É a partir

desse período que se percebeu a força que este ramo da produção possuiria na

economia local. Data de 1750 a introdução dos primeiros rebanhos em Mato Grosso,

mas é após a fundação da Vila de Santo Antônio que se intensifica a relação de

comércio desse gado com o Triângulo Mineiro, com destaque para Uberaba.

Como disse o Dr. Trajano Balduino de Souza em primoroso artigo, “tornou-se o lugar preferido dos boiadeiros, dos viajantes, dos negociantes de toda espécie, pela sua colocação próxima aos centros produtores do gado, pela amenidade do seu clima, pela sua surpreendente fertilidade, e daí a grande fama de riqueza que se irradiou por todo o país, tornando-se o lugar quase fantástico, onde, dizia-se, o dinheiro corria a rodos, tendo havido de fato grande acúmulo de capitais trazidos pelos boiadeiros. (CONGRO, 2003, p. 28).

A atração dos chamados “mudanceiros” na expectativa do novo e assim

novas oportunidades de vida, atraiu muitos trabalhadores, mas também muitos

bandidos e desocupados. A vila ainda não possuía nenhum tipo de autoridade local

que pudesse reprimir crimes e, dessa forma, muita gente ficou impune.

Os crimes eram coisas normais para os padrões da época, fossem elas por

preço do boi, disputa de mulheres, bebida ou honra. O bandido não se espantava e

tinha justificativas e motivos para o ocorrido.

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Segundo Machado (2008, p. 265), o bandido:

Aqui desligou-se do patrão e fez proezas incríveis. Baixo, grosso, sempre de botas e esporas de roseta grande, chapéu de abas largas, quebrado na frente, guaiaca cheia de balas e o inseparável 44 na cintura. Montava um cavalo tordilho pedrês, fogoso e bem tratado. Era temido por toda gente. Atribuíam-lhe diversos delitos nos anos que aqui viveu e quando a impunidade era regra.1

A vila começa a se preocupar em estabelecer alguma ordem no ano de 1889,

quando se instala o distrito de paz por uma lei provincial. Passou a ter um juiz de

paz e um subdelegado, mas ainda assim a manutenção da ordem era difícil. Por

muito tempo é reivindicado para a capital, Cuiabá, maior atenção à segurança da

vila, mas por muitas vezes não obtiveram retorno. Em alguns momentos era enviado

um soldado de Nioaque, pois lá se instalava o 7° Regimento de Cavalaria, mas não

era suficiente e o subdelegado local acabou reunindo alguns ajudantes locais.

Mas a vinda de novos povoadores não se resumia a bandidos e pistoleiros,

como já citado anteriormente, os chamados “mudanceiros”.Eram italianos,

espanhóis, portugueses, árabes e até mesmo brasileiros de outros estados. A

pecuária era o que vinha praticar a grande maioria, e o comércio acontecia a partir

da vinda de compradores, em sua maioria da cidade de Uberaba. A cidade passou a

ser conhecida, nos centros de engorda e abate, como o melhor local para gado de

corte e isso só acelerou o progresso local.

A formação desse empório de gado cresceu na medida da demanda, de tal forma que todos os boiadeiros faziam aqui seu quartel-general, exatamente na Rua 26 de agosto, mesmo quando Campo Grande já dispunha de outras ruas. As pensões da 26 é que abrigavam os ádvenas. As comitivas acampavam nos arredores, nas chácaras preparadas para isso com pasto para a tropa e galpões para a peonada. (MACHADO, 2008, p. 59).

Outra fonte de trabalho era o comércio e a instalação de casas comerciais,

que aconteceu em maior parte pelos povos estrangeiros. Os árabes tinham grande

destaque nessa função, e o sistema usual da região, era a base de troca de

mercadoria.

1 Machado se referia a Antônio Brabo, um pistoleiro da época, que se encontrava na rua Alegre, hoje 7 de setembro, uma das zonas de baixo meretrício, área pobre da vila.

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A Casa Verde vendia aos fazendeiros pelo sistema usual da região. Fornecia as mercadorias durante todo o ano para receber a conta em novembro, na venda das boiadas. Como pagamento recebia também galinhas, ovos, erva-mate, couro, frutas e vendia sal de Cadiz, arame Gorgon da Bélgica, mantimentos, tecidos, calçados, chapéus. Tudo era lançado em conta corrente para o acerto final. Não era costume fazer qualquer documento das operações e nunca houve calote. Bons tempos. (MACHADO, 2008, p. 105).

Analisando dessa forma a maneira como o comércio acontecia nesse período,

podemos também entender como funcionavam os sistemas de negociação. Nessa

época o que importava era a capacidade matemática que esse comerciante possuía

para realizar as transações e obter lucro.

Segundo Alves (1984, p. 14):

Já foi assinalada a peculiaridade da operação de compra e venda no período manufatureiro – em quaisquer condições tal operação só se efetivava mediante a presença física da mercadoria -, mas é indispensável destacar duas questões a ela ligadas. A primeira é que o pagamento só se fazia contra a entrega do produto, daí por que operações a crédito eram desconhecidas, ou destituídas de maior importância face ao seu insignificante volume. A segunda questão é que a peculiaridade da operação estava estreitamente associada à qualidade do produto, que ainda não apresentava nessa fase maior unidade. Logo, o preço acertado na compra e na venda estava sempre na dependência da qualidade da mercadoria, o que tornava indispensável sua presença física. Compreende-se com maior precisão, dessa forma, por que o comerciante não era dado à abstração nesse mundo tangível, onde somente a materialidade das coisas tornava passíveis de consideração.

A vila foi crescendo e em 1898 a população urbana se aproximou de

trezentas pessoas, todas morando praticamente no mesmo local: a Rua Velha, hoje

chamada rua 26 de agosto. No ano de 1899 o Arraial de Santo Antônio foi elevado a

Vila de Campo Grande.

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Figura 2 - Campo Grande: primeira igrejaconstruída em taipa, ano de 1879.Fonte:

Congro, 2003.

Surgiu neste período a Câmara Municipal e com os cargos de presidente, vice

e os primeiros vereadores. É quando começam a surgir alguns códigos de postura e

cobrança de impostos pelas operações comerciais, que muitas vezes eram feitas por

mascates, os quais estabeleciam preços exorbitantes às suas mercadorias.

Em 1906 a vila busca ordenar o espaço de convivência, alinhar as ruas e

estabelecer uma planta que previsse o crescimento da cidade e o surgimento de

novas ruas, consequência de uma expansão urbana. O cemitério local ficava na

Praça Ari Coelho (hoje é assim chamada) e neste período acreditava-se que o

crescimento da vila aconteceria para a zona norte.

Emilio Rivasseau era um agrimensor francês que assinou várias plantas de

demarcações de terra no estado de Mato Grosso e foi chamado para fazer esse

estudo da Vila. Ele foi designado para este projeto no ano de 1906, mas não chegou

a realizar o plano de expansão. Em 1909 é que o engenheiro Nilo Javari Barém faz

um plano para a cidade e este é aprovado.

Depois que elaborou a primeira planta foi que começou o crescimento de Campo Grande, obedecendo a um traçado inteligente, organizado, funcional, dentro dos parâmetros urbanísticos das cidades modernas, com ruas largas, bem direcionadas, que fizeram de Campo Grande a bela cidade de tantas vezes elogiada por semelhantes predicados. (MACHADO, 2008, p. 127).

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No ano de 1907, a Vila de Campo Grande recebe a visita do engenheiro

Emílio Schnoor em conjunto com uma equipe. Eles procuravam pelas autoridades

locais, queriam conhecer a vila promissora nas transações comercias pecuárias.

Vieram realizar pesquisas para a ferrovia Itapura-Corumbá, pois precisavam saber

se a Vila de Campo Grande poderia receber uma estação intermediária.

E foi desta forma que Emílio Schnoor consolidou o novo traçado, que em lugar de tomar o rumo de Cuiabá seguiu para Corumbá, em demanda da Bolívia, e, por decisão de Schnoor, iria passar também por Campo Grande. (MACHADO, 2008, p. 66).

No dia 28 de maio de 1914, os trilhos que partiram do Porto Esperança

atingiram a Vila de Campo Grande. Junto com eles chegaram vários trabalhadores

para a construção desta ligação. A Estrada de Ferro Noroeste do Brasil tem sua

inauguração oficial na vila no dia 14 de outubro de 1914. A influência da chegada

dos trilhos trouxe novos parâmetros sociais para a vila. A influência foi tão grande

que, em 1918, a vila é elevada a cidade, confirmando a chegada do progresso.

Para se ter uma ideia da proporção de desenvolvimento em que Campo

Grande se encontrava antes da chegada da ferrovia, as imagens seguintes deste

período, esclarecerão bastante. Ao comparar as fotos dos grandes centros

econômicos da época, verificou-se o quanto eram ainda precárias as infraestruturas

locais,como também o pouco povoamento. É notável a diferença no fluxo de

pessoas nas ruas e na arquitetura, tanto na proporção das obras quanto nos

materiais e acabamentos utilizados.

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Figura 3 - Rio de Janeiro: capital do Brasil, área central da cidade, início do século

XX. Fonte: Agenda Piracicabana. Disponível em:

<http://agendaculturalpiracicabana.blogspot.com.br/2012/04/joaquim-manuel-de-

macedo-um-olhar.html> Acesso em: setembro de 2012.

Figura 4 – Santos: área próxima ao porto, ano de 1902.Fonte: Brasil Antigo. Disponível em: <http://brasilantigo1.blogspot.com.br/2007/04/fotos-antigas-da-cidade-de-santos.html> Acesso em: agosto de 2012.

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Figura 5 - Corumbá: vista do Porto, início do século XX.Fonte: Ayala, 2011.

Figura 6 - Campo Grande: ainda Vila, início do século XX.Fonte: Ayala, 2011.

Diante das imagens podemos ter ideia do que acontecia antes da chegada da

Noroeste em Campo Grande. As construções de taipa começam ser substituídas por

alvenaria. A ferrovia atraiu para a cidade, emigrantes e entre eles alguns

construtores. O acesso a materiais vindos de São Paulo, como tijolos e telhas,

mudou o perfil das construções. A localização da cidade e seus campos propiciaram

a instalação de investidores e pecuaristas para esta região e isso atraiu interesses

econômicos dos grandes frigoríficos paulistas.

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Figura 7 - Campo Grande: vista de um rodeio de gado, início do século XX.Fonte:

Ayala, 2011.

Figura 8 - Campo Grande: Hotel Democrata, construído em taipa. Servia de parada

para os compradores de gado, antes da chegada do trem (início do século

XX).Fonte: Ayala, 2011.

Antes da chegada da linha férrea ao estado de Mato Grosso, as viagens

duravam meses. Pessoas que saíam do Rio de Janeiro para Cuiabá, faziam o trecho

navegando dias e dias pela Argentina e Paraguai. Era uma região isolada

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geograficamente, com grande extensão de divisa com países vizinhos ao Brasil e

por isso de difícil controle de invasões e domínios de outros povos.

Na segunda metade do século XIX ocorreu a Guerra do Paraguai (1864 à

1870), também chamada Guerra da Tríplice Aliança, que envolvia interesses

ingleses, os quais chegaram a financiar os gastos do conflito através de seus

bancos. Foi o maior conflito armado que ocorreu na América do Sul, envolvendo

quatro países, Paraguai, Argentina, Uruguai e Brasil. Preocupados com o

crescimento do Paraguai, com o monopólio que ele tinha das navegações pelos rios

do Prata e pelo domínio que ele teria nos ramos de importação e exportação, fez-se

a guerra.

A Tríplice Aliança realizou, portanto, uma guerra providencial para a Inglaterra, consolidando seu domínio, antes precário, sobre a Argentina e o Uruguai, e colocando sob controle o outrora arredio e perigoso Paraguai. Aos vencedores, terminado o conflito e já assegurado o direito de consumir as maquinofaturas inglesas e exportar basicamente matérias-primas, caberia, completamente, saldar dívidas. Seus feitos guerreiros só se realizaram merçê dos financiamentos propiciados pelas casas Bharing, Rothschild e pelo Banco de Londres, todos ingleses não por acaso. (ALVES, 1984, p. 11).

Com o fim da Guerra, a preocupação para ter maior controle desta fronteira

terrestre era constante. Ao final da disputa foi possível ter acesso, através da Bacia

Platina, à fronteira de Mato Grosso, que antes só poderia ser feito de forma terrestre

pelo estado de Goiás. O estado passa a ter um grande investimento por conta da

livre navegação, e Corumbá passa a ter destaque com as casas comerciais e o

ramo de importação e exportação, como citado anteriormente.

A ideia de vias mais rápidas para chegar até o estado de Mato Grosso já

acontecia antes mesmo da guerra, mas nada foi feito para que efetivamente algo

acontecesse. No entanto, só depois da guerra e de Mato Grosso ter sido invadido, é

que se teve a ideia de quão grande era a dificuldade de enviar reforços para defesa.

Diante disto, o governo imperial resolveu tratar o assunto com maior interesse,

organizando estudos sobre a ligação ferroviária do estado de São Paulo com o

estado do Mato Grosso.

A partir do ano de 1851 tiveram início as primeiras discussões em torno das necessidades de um meio mais rápido e seguro de transporte que ligasse Mato Grosso ao litoral do Brasil, para se evitar o então obrigatório e longo caminho fluvial do Prata e do Paraguai, cujo percurso chegava em certas

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épocas do ano a demorar mais de 30 dias, face às dificuldades de navegação. (BOLETIM, 1975)

As construções de ferrovias no Brasil estavam autorizadas desde 1835,

porém as ferrovias eram concessões que o governo cedia através de contrato com

pessoas ou firmas que oferecessem vantagens de interesse da Corte em São Paulo

e Minas Gerais. No ano de 1854, o Barão de Mauá tinha acabado de inaugurar a

primeira ferrovia do país, Estrada de Ferro Petrópolis ou Estrada de Ferro Mauá,

mediante concessão. Realizou estudos da área e investiu na construção dos

primeiros 14 quilômetros de ferrovia do país.

No ano de 1904 instalou-se uma empresa com o nome de Companhia

Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, no intuito de conseguir a concessão da Estrada

Uberaba-Coxim, que era inicialmente do Banco União de São Paulo. Esta estrada

tinha como traçado sair de Bauru, estado de São Paulo, e acabar em Cuiabá, Mato

Grosso.

De qualquer forma, definido aparentemente o traçado Baurú-Cuiabá já em novembro de 1904 tinham início em Baurú, os trabalhos de reconhecimento do trecho até Itapura [margem leste do Rio Paraná]. Efetuado o reconhecimento, a construção propriamente dita veio a ser iniciada em julho de 1905. A partir daí as obras prosseguiram em ritmo regular. (QUEIROZ, 1997, p. 22). De capitais mistos, brasileiro e franco-belga, com concessão de garantia de juros baixos pelo governo federal, a construção da Noroeste se iníciou em 1905. Terminados os estudos para a locação da linha férrea, a Companhia de Estradas de Ferro Noroeste do Brasil e a companhia empreiteira dos serviços mandaram para Bauru os primeiros engenheiros, técnicos e operários que se encarregariam da construção. Muitos morreram de várias moléstias (como a leishmaniose e a malária) e no confronto com os índios caingangues. Em 2 de dezembro de 1908, os trilhos chegavam ao quilômetro 281, onde futuramente se fundaria a cidade de Araçatuba. (BINI, 2011,p. 10)

Em 1907 esse traçado inicial sofreu alteração e a ferrovia passou a ter novo

rumo. O seu término, que se daria em Cuiabá, se deu em Corumbá. No ano seguinte

1908 já começou a construção partindo do Porto Esperança, no município de

Corumbá. As duas linhas, saindo de Bauru e a outra de Corumbá, se encontram, em

1914, próximo a Vila de Campo Grande e esse encontro faz a estação local ser

chamada de “Ligação”. A Noroeste ficou com seu ponto terminal em Porto

Esperança por muitos anos. Só a partir de 1938 é que se deu início ao trecho que

atingiria Corumbá e Ponta Porã, o qual só foi concluído totalmente em 1952.

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A Noroeste do Brasil que, ao ser iniciada em Bauru, em 1905, se destinava a Cuiabá, Capital do Mato Grosso, segundo traçado de Gonzaga de Campos, teve de introduzir as primeiras modificações na sua orientação, em conformidade com os estudos anteriores e o projeto (de 1903) de Emílio Schnoor, que o governo resolveu adotar em 1907, e no qual se sugeria o deslocamento dessa linha para Corumbá, a fim de atender melhor ao nosso convênio político com a Bolívia e ao plano continental de um ferro-carril do Atlântico ao Pacífico. (AZEVEDO, 1958, p. 70).

A ferrovia veio como fruto da industrialização mundial, pois os trilhos traziam

junto com eles as estações, suas construções, profissionais de grande respeito

como engenheiros e médicos. No ínicio do século do século XX isso era, para todos

os habitantes da região, a chegada do progresso.

[...] de acordo com esta perspectiva, que via nas ferrovias uma das manifestações mais evidentes do progresso ao qual indivíduos e países deveriam se sujeitar, cumpria, acompanhar o movimento determinado pela própria história. Não saber andar junto com ela podia significar o enfraquecimento e a perda de posição, entre as demais nações. Inscrevendo-se o progresso na própria história e sendo as ferrovias um de seus mais poderosos elementos, elas passaram a ser consideradas fundamentais para garantir a força e o poder de uma nação. (CASTRO, 1992, p. 26) Acresce que o valor estratégico de uma estrada de ferro não se mede apenas pela sua capacidade de transporte de tropas e de seu abastecimento, mas pela função civilizadora (econômica, comercial, política e cultural) que exerce, transformando as regiões percorridas que, de terras de ninguém, no man’s lands, desertas ou quase desabitadas, passaram a ser poderosos centros de produção agrícola e industrial. É que, não apenas os caminhos em si mesmos, mas povoamento, produção e circulação constituem elementos essenciais de defesa das fronteiras de um país. (AZEVEDO, 1958, p. 91)

As ferrovias no Brasil eram a projeção de um futuro promissor, a ideia de uma

integração nacional e o zelo de terras do país, de suas fronteiras que, por serem

enormes, eram muito onerosas de serem feitos. O ideal em conseguir modernizar o

país e alcançar o desenvolvimento de países europeus, era um ideal da república. A

partir de 1889, a República Velha emerge com o ideal da industrialização. O

comando político da burguesia agrária do período era formada por mineiros,

paulistas e cariocas. Nesse momento o Brasil era grande exportador de café e a

indústria teve bom crescimento.

Os republicanos partem de um diagnóstico da monarquia como o sistema de governo que tem vícios, não satisfaz ás necessidades do presente, que funciona mal e comprime o organismo social [...]. Ao realizarem esse diagnóstico da monarquia, [...] os republicanos, simultaneamente, [outorgavam-se] o estatuto de sujeitos da história, ao se proporem combater

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um sistema de governo que está em descompasso com o tempo histórico. (SALLES, 1986, p. 62)

O governo federal, com participação de figuras do império como Barão do Rio

Branco, tinha a ideia de constituiruma nação moderna. Pode-se observar que os

ideais de ordem e progresso desse pensamento se encaixavam muito bem nos

acontecimentos que se deram após a instalação da ferrovia e o que ela mudou com

sua chegada.

Voltado para a estabilidade interna e a concorrência externa, seus três principais movimentos são a ação integradora e constrictora sobre o próprio território; a ação social traduzida em sistemas de benefício e seguro social que lhe garantissem apoio e flexibilidade; e o desenvolvimento da força militar marítima e terrestre. Seu objetivo seria propiciar a máxima racionalidade ao desenvolvimento do sistema econômico e a oferta continua de novas oportunidades de inserção e incremento social. (SEVCENKO, 1983, p. 73).

O ideal de progresso que se esperava na chegada dos trilhos, envolve muito

mais do que um território melhor para todos. Os interesses políticos e econômicos

da classe dominante deste período vinham muito mais fortes. O investimento de

várias potências internacionais em conjunto com a classe dominante do país é que

fazia acontecer esse progresso que, para chegar até seu destino, tinha um preço.

Nesta fase, surge mundialmente o imperialismo com sua política neocolonialista, que encontra no Brasil, o caminho para intervenção do capital estrangeiro através de vários canais, com, as companhias de Colonização o que na Noroeste será respaldado, pois esta região encontrava-se numa fase de expansão e início de colonização e povoamento devido aos trilhos da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil que avançava até a região onde fica hoje Araçatuba. (MANFREDI NETO, 1999, p. 25).

Para a construção da ferrovia foram necessárias muitas lutas com o próprio

território, ainda inóspito, cheio de malárias, muita mata a ser derrubada e muitos

combates com os nativos. Os índios ficaram por muito tempo temidos pelo povo;

eram os selvagens que atacavam os acampamentos e não entendiam a invasão de

suas terras por uma máquina de ferro. Morreram muitos homens, tanto por conta das

doenças como por conta de lutas contra os nativos, em grande parte os chamado

Kaingang. Trabalhar na construção da Noroeste era ato de coragem.

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Por toda parte, como vimos com o povoamento e a exploração desses sertões, romperam e se expandiram as atividades produtivas, agropecuárias, fundaram-se cidades e colônias, e a Noroeste transformou-se numa terra de Promissão. (AZEVEDO, 1958, p. 109). A Estrada de Ferro Noroeste do Brasil lançar-se-á no sertão desconhecido, trazendo a vida que gerará a morte e dentro dela outra vez a vida, que trará a semente do progresso capitalista. (MANFREDI NETO, 1999, p. 25).

Investir no setor ferroviário era uma forma de aplicar capitais estrangeiros, já

muito comuns nesse período. Como dirigente desse grupo estava Percival Farquhar,

um grande investidor de capitais estrangeiros no Brasil, que posteriormente passou

a ter o controle de várias outras empresas, como a belga Brazil Land, Cattle and

Packing Co., que pertencia ao grupo Farquhar e veio a investir na pecuária no

estado de Mato Grosso, com criação de gado de engorda em Campo Grande e Três

Lagoas.

Essa ferrovia foi financiada por capitais franco-belgas, exatamente num momento em que especialmente grupos belgas tinham grandes interesses econômicos localizados em Mato Grosso. A Brazil Land and Cattle Packing Co. presta-se a uma ilustração mais expressiva; essa empresa invernava gado em suas fazendas de Campo Grande e Três Lagoas, ambos os municípios servidos pela Noroeste do Brasil, e exportava para São Paulo, através da via férrea, gado gordo destinado ao abate no Frigorífico de Osasco. (ALVES,1984 ,p. 69).

O estado de São Paulo, neste período, já possuía um grande destaque

político, por conta do investimento no café. O Brasil era dono de oito pés de cafés, a

cada dez pés mundiais.Seu poder de exportação sobre esse mercado foi muito

grande e só veio a cair em 1929, junto com o quebra da bolsa de Nova Iorque. O

estado dominava por muito tempo a exportação de café, couro e algodão. E essas

manufaturas, muitas vezes, vinham de outros estados, como no caso de Mato

Grosso, que criava o gado e o vendia para frigoríficos em São Paulo.A partir desse

momento, a carne e o couro seriam beneficiados e comercializados com maior lucro

ou valor agregado.

As terras ao sul do estado valorizam-se e o dinamismo com que se formam

cidades ao longo do trilho é notório. Foi resultado de uma estratégia geopolítica e

territorial conduzida pelo Estado, e uma integração econômica com o polo São Paulo

– Santos. Um período em que a burguesia paulista assumiu a economia nacional e

procurou formar laços comerciais com diversos territórios brasileiros e, por

consequência, acabou determinando a divisão regional de trabalho no país.

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A chegada dos trilhos à comarca de Campo Grande, em 1914, fez muita coisa

mudar. A vila passa a servir de ligação entre duas grandes pontas de mercado e de

capitais do país: o estado de São Paulo e o Porto de Corumbá. O fluxo de pessoas

que começou a acontecer por conta da estação local era muito grande. A vila

começa a receber povos de todos os tipos, de todas as culturas de forma muito

acelerada. Passa a conhecer novas tecnologias, mercadorias finas, trazidas por

mascates e novos comerciantes. Com o aumento do movimento local e o trânsito de

pessoas, a vila passa a ter a preocupação de organizar seu espaço urbano. Foram

criadas novas ruas, deram-se nome a elas. Esse desenvolvimento traz em 1918 a

elevação de vila de Campo Grande a município de Campo Grande.

Assim, “a 14 de outubro seguinte teve lugar a inauguração oficial da Estrada

de Ferro Noroeste do Brasil, datando da sua chegada o extraordinário

desenvolvimento, o vertiginoso progresso da localidade.” (CONGRO, 2003, p. 35).

Figura 1 - Campo Grande: Estação Ferroviária da NOB, construída em alvenaria,

ano de 1920. Fonte: Congro. 2003.

A cidade começa a se organizar, novas ruas surgem ao redor da ferrovia. A

chegada do trem na gare cria um ponto de encontro na cidade e as pessoas se

reúnem nas proximidades da ferrovia para passar o dia, conversar. Percebendo o

movimento no local, muitos comerciantes se mudam para a proximidade, ou seja,

para a Rua 14 de julho.

No final da década de 10, a cidade já possuía algumas construções com uso

de alvenaria de tijolos e telhas de barro. A primeira casa foi construída na Rua

Velha, 26 de agosto. Com a Estrada de Ferro vem uma quantidade muito grande de

migrantes, muitos portugueses, espanhóis, árabes, italianos, japoneses. Entre esse

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pessoal havia alguns construtores e isso vem mudar a caracterização visual da

cidade, as casas começaram a aparecer com alguns traços de uma arquitetura

clássica e novas técnicas construtivas.

Com o advento da Estrada de Ferro Noroeste e a localização de sua gare ao norte da cidade, a rua passou a ser a mais comprida de todas as existentes e era caminho para a estação, por onde trafegavam os carros de praça, puxados a cavalos e perambulavam os pedestres, que se divertiam com o movimento da chegada dos trens, numa vila de poucas distrações. Fácil entender que os comerciantes passaram a preferir esse logradouro para a instalação de suas lojas. (MACHADO, 2008, p. 134).

As antigas ruas, como a Rua Velha, hoje 26 de agosto e a Rua Alegre, hoje 7

de setembro, começam a ficar relegadas ao esquecimento e a cidade passa a

acontecer próxima à ferrovia. Os moradores da Rua 26 de agosto começam a

procurar lugares mais altos para suas novas moradias, e começam a ocupar a Rua

15 de novembro e a nova Avenida Marechal Hermes, hoje Afonso Pena.2 A Rua 7 de

setembro passou a ser usada apenas para cabarés de baixo nível, chamada por isso

de Boca do Lixo.

Estar próximo das instalações da ferrovia trazia ares de nobreza a tudo que

se estabelecia por ali. Havia, nas ruas Dom Aquino e Maracaju, os cabarés de luxo e

esses locais eram conhecidos como “Baixadinha de Ouro”. A Rua 14 se tornou a rua

principal para o comércioe para o tráfego de pedestres, com os carros de praça que

atendiam aos viajantes recém chegados na cidade. Todas as características de uma

urbe e seus setores começam a ser delimitados de forma bem precisa nesse

período.

A ferrovia aparece como fecundadora do desenvolvimento da cidade, na constituição de sua importância política-econômica nos anos seguintes. Teria ocorrido então, uma espécie de ruptura. Antes da estrada de ferro, Campo Grande não passava de uma pequena aglomeração de pessoas, perdida no “sertão” e encoberta pela poeira da história. Depois, eis a cidade surgida do limbo e já como promissor núcleo urbano, centro comercial econômico e político, estratégico para a circulação de mercadorias e ao processo de acumulação do capital monopolista. (ARRUDA, 1995, p. 30 - 31).

A cidade então tem como coração o Sítio da Estrada de Ferro Noroeste do

Brasil. É ao redor daquele corredor da estação ferroviária, das casas de funcionários

e de respeitosos engenheiros da ferrovia que a cidade passa a orbitar. Muitos

2 Nome dado em homenagem ao presidente que estava no governo, quando se decidiu instalar a NOB em Campo Grande.

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imigrantes vindos para a construção dos trilhos acabaram ao final da obra ficando

pela cidade e se instalando por aqui. Os árabes com a formação de casas

comerciais, italianos, japoneses com a área de plantio e hortas, espanhóis,

paraguaios, com sua comida e música, entre outros.

Grande e operosa é a população estrangeira, destacando-se as colônias síria, italiana e portuguesa, que se dedicam ao seu intenso comércio, e a japonesa, vinda empregada na construção da ferrovia e agora dedicada, nas redondezas da cidade, à pequena agricultura, abastecendo diariamente o mercado consumidor. (CONGRO, 2003, p. 38).

Junto com essas novas culturas vinham novos costumes, comidas, danças e

acabaram fazendo dessa pluralidade, uma cultura singular, que se revelava através

da mistura de várias etnias em um mesmo território. Dentro da ocupação econômica,

muitos delas se dedicaram ao comércio e outros resolveram investir na pecuária,

que era algo de bastante importância para Campo Grande.

Com o trajeto do trem acontecendo periodicamente, ficou muito mais fácil o

acesso de compradores de gado à região. A pecuária passa a crescer muito

rapidamente e, em meados de 1920, Congro (2003, p. 54) já previa maior evolução:

Diariamente afluem os compradores de gado e de terras, entre estes muitos ingleses e americanos-do-norte, e não está longe o estabelecimento de frigoríficos em Campo Grande, dentro de toda a grande e magnífica zona pastoril do sul mato-grossense.

Neste mesmo estudo que Congro realizou sobre a pecuária, dá destaque a

Fazenda Capão Bonito, cujo proprietário é a Brazil Land Cattle & Packing Co.,

expressão da entrada de capital estrangeiro na região. Junto com ela ainda se

somavam mais seis outras propriedades, envolvendo em torno de 158.873 hectares.

Esta empresa é citada como um marco do desenvolvimento da pecuária moderna do

município de Campo Grande. Traziam bois de outros países para apurar as cruzas e

possuir gado de qualidade. Segundo Queiroz (1999), o ano de 1927 foi um período

de grande destaque para a pecuária no Sul de Mato Grosso devido aos

investimentos da Brazil Land Cattle e isso fez com que o preço do gado começasse

a subir.

Povoam as campinas de Capão Bonito cerca de quarenta mil bovinos e, nas longas excursões através das mesmas, somente num retiro ainda podem ser vistos alguns touros indianos, tendo sido espalhados pelas planuras,

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introduzidos nos rebanhos crioulos mais de mil reprodutores Hereford e Shorthorn, raças de corte, de carne excelente, principalmente a primeira, mais conhecida e apreciada em todo o mundo pela sua precocidade, peso vivo e rendimento de carne, além de sua rusticidade, que a torna mais resistente. (CONGRO, 2003, p. 62).3

No ano de 1922 se instala o primeiro banco, Banco Nacional do Comércio.

Figura 10 - Fazenda Capão Bonito: propriedade da Brazil Land. A construção fazia

uso de telhas de barro, material construtivo ainda não produzido na região, (década

de 20). Fonte: Congro, 2003.

Com a instalação, em seguida, de mais dois bancos, incluindo o Banco do

Brasil, começa uma fase de transição, quando as casas comerciais passam a perder

seu domínio financeiro da região.

Segundo Alves (1984, p. 38):

No plano substantivo do geral, a passagem do século XIX para o século XX testemunhou também a “viragem do velho capitalismo para o novo”, a transição “da dominação do capital em geral para a dominação do capital financeiro. Em outros termos, a livre concorrência, que na sua realização levou a uma progressiva concentração do capital, foi, ela própria, superada numa determinada etapa da evolução histórica desse processo de concentração ao ser gerado o monopólio. Dessa forma, o capitalismo atingiu sua “fase superior”, o imperialismo. Nessa nova etapa os bancos passaram a exercer uma nova função. Já não eram meros intermediários nos pagamentos, pois a concentração bancária havia permitido que dispusessem de somas gigantescas de capital e que aumentassem significativamente seus movimentos. Liberaram-se, dessa forma, para novas modalidades de operações, passando a encarnar não mais o capital bancário, mas sim o capital financeiro.

3 Raças que posteriormente foram substituídas pelo Nelore.

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Com a queda do poder das casas comerciais e o desenvolvimento da cidade

de Campo Grande por conta da chegada da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, a

cidade de Corumbá começa seu processo de decadência.

O período em questão compreende inclusive a primeira guerra mundial, que

apesar de causar uma grande crise nos países envolvidos no conflito, deu a Mato

Grosso a possibilidade de exportar o charque, o couro e a erva-mate.

Foi comoreconheceu Congro (2003, p. 38), a saber:

A despeito da dificultosa situação geral criada pela grande guerra e da falta de materiais, vindos de longe por preços fabulosos, foi verdadeiramente febricitante o crescimento da urbes, notando-se ainda, continuadamente dezenas de prédios em construção.

No ano de 1921 foi transferido, de Corumbá para Campo Grande, a

Circunscrição Militar. Acreditava-se que essa transferência era por conta da

instabilidade da posse de terras na região ou possíveis invasões e pela importância

econômica que a cidade estava assumindo.

Em 1920, Campo Grande passou a ter planejamento, haja vista o estado já

serconsiderado como o quarto maior rebanho bovino do país. Com a chegada de um

promissor progresso, a cidade planeja seu primeiro bairro e passa a pensar

seriamente sobre o seu crescimento e suas projeções urbanísticas. “A regularidade

da malha urbana, usando a trama ortogonal, com uma grande avenida central,

evidenciava a utilização de um traçado europeu das cidades do século passado.”

(ARRUDA, 1997, p. 3).

A chegada da ferrovia e a instalação da Circunscrição Militar influenciaram

muito a criação de organismos importantíssimos para o funcionamento de uma

cidade, como seu Código de Posturas e o hospital.

Com o rocio implantado a cidade foi se estruturando com edifícios públicos, instalações militares, (quartéis, hospital) e, no ano de 1921, foi aprovado um novo Código de Posturas contendo requisitos urbanísticos importantes, tais como, a continuidade de vias com a mesma faixa de domínio e implantado o primeiro bairro de Campo Grande o Amambaí, criado para interligar o sítio urbano aos quartéis do Exército que se instalaram na parte oeste da cidade. (ARRUDA, 1997, p. 4),

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Figura 11 - Campo Grande: planta do plano de alinhamento de ruas e praças, ano

de 1909.Fonte: Arruda, 1997.

Suas edificações começam a seguir alguns padrões da época e fazer uso da

arquitetura do estilo eclético e art decó.Começaram a aparecer hotéis, cinemas,

edifícios. Nos relatórios levantados por Cimó, foi encontrada a nota de Ubaldo de

Medeiros, que dizia: “De um modo geral, verifica-se grande surto de progresso na

zona servida pela estrada, especialmente no trecho mato-grossense. (R56, 1957, p.

4 apud QUEIROZ, 1999, p. 389).”

Também Zardo afirma esse fato, a saber:

Com a construção dos quartéis, das moradias dos militares, da diretoria da ferrovia e das residências dos ferroviários, dos hotéis, das casas comerciais e dos lares dos fazendeiros e de outros trabalhadores, houve um grande desenvolvimento da indústria da construção civil, com implantação de olarias, pedreiras, marcenarias, serralherias, etc. [...] Como sede da Circunscrição Militar e da Diretoria da Companhia Noroeste do Brasil, Campo Grande teve grande crescimento populacional somado com a chegada de imigrantes das mais variadas profissões. (ZARDO, 1999, p. 63).

Os militares tinham grande influência na vida cultural, política e

socioeconômica da cidade, além de muitas vezes exercerem a função de

professores para alguns grupos, contribuindo assim para a educação local. Com a

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participação dos militares locais no golpe dado ao governo em 1930, sob o comando

de Getúlio Vargas, fortaleceu aqui a ideia de divisão do Estado.

Em 1926 é inaugurada a ponte ferroviária Francisco de Sá, que sai do estado

de São Paulo e cruza o Rio Paraná, atingindo Três Lagoas. A ponte era um projeto

ousado e oneroso, pois foi construída com materiais importados belgas, material que

não se tinha disponível no Brasil. O trajeto que antes era feito por balsas e atracava

no Porto de Parnaíba acabou e deu lugar a ponte, aumentando e facilitando o

tráfego da linha ferroviária. Apesar de todos os problemas e desgastes enfrentados

pela Noroeste nesse período, de acordo com levantamentos feitos por Queiroz, foi o

período de maior rendimento da ferrovia e, em 1927, ele também encontra um

relatório onde enfatiza o seguinte: “A exportação de gado em pé do Estado de Mato

Grosso, após a inauguração da Ponte do Paraná, vem se desenvolvendo de modo

animador.” (R.27, 1928, p. 17 apud QUEIROZ, 1999, p. 392).

Até 1930 a Ferrovia saía de Bauru, estado de São Paulo, e terminava no

Porto Esperança. A partir da década de trinta se dá início ao trecho que atingirá o

ponto final da estrada, que é Corumbá, que só veio a terminar realmente em 1953. E

no final da década de 30 começa a ser construída também, a Estrada de Ferro Brasil

- Bolívia.

Durante esse período de 1930 a 1945, Getúlio Vargas criou um movimento

que incentivava a ocupação do centro-oeste e levou o nome de Marcha para o

Oeste. A intenção era preencher os vazios demográficos. A região centro-sul estava

com um excedente populacional e, por conta disso, era melhor que migrassem para

outras regiões, servindo também de mão de obra para aumentar o fornecimento de

matéria-prima e promover as indústrias que viriam a se implantar na região sudeste.

Os principais estados que serviram para essa política foram Goiás, Paraná e Mato

Grosso, todos encarregados da produção de alimentos.

Em pouco mais de 25 anos, sua população ascendeu de cêrca de 7.000 habitantes em 1914 a 23.054, em 1940; e mais ainda do que a paisagem urbana, em que se erguem, sem, no entanto, dominá-la, numerosas casas confortáveis e prédios de cinco andares, se transfigurou a sociedade que lhe empresta, pelo seus hábitos, alguns dos aspectos mais amáveis das cidades modernas. (AZEVEDO, 1950, p. 83)

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Figura 12 - Campo Grande: vista aérea da estação e a visualização da paisagem urbana com casas, calçamento e ruas bem delimitadas (década de 30).Fonte: ARCA, s.d.

No mesmo período, final da década de 30, Campo Grande só tinha o bairro

Amambaí, que foi criado na década de 20 e o Cascudo, posteriormente. Neste

período é que o engenheiro Saturnino de Brito é chamado para fazer o plano de uso

do solo da cidade. No mapa a seguir será possível entender como a cidade se

distribuiu, com áreas de comércio, prestação de serviços e áreas residenciais.

O traçado da cidade em xadrez,sendo sua organização (inicialmente) com as

costas voltadas para os rios, é um caráter muito presente em todas as colônias de

descendência portuguesa, pelo qualse visava apenas o urbano e a área natural das

margens dos rios e os próprios rios, acabavam sendo vistos como local para dejetos.

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Figura 13 - Campo Grande: análise da ocupação da cidade e distribuição de

serviços e bairros, (década de 30). Fonte: Arruda, 2001. Adaptado pela autora, 2012.

As manchas do mapa se dividem em ocupação 1 e ocupação 2.Isso

corresponde a etapa de ocupação do espaço. A ocupação 1 foi a parte onde se

instalaram os primeiros moradores e onde se concentravam todas as atividades da

Vila, antes da chegada da ferrovia. A ocupação 2 veio a posteriori, com a chegada

da ferrovia,pelo qual todas as atividades econômicas da cidade se transportaram

para perto da estação.

O que anteriormente acontecia nas Ruas 26 de agosto e 7 de setembro,

subiram ao norte, sendo substituído pela Av. Calógeras, a qual era uma prestadora

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de serviços, com pensões e carros para traslados dos recém chegados a Campo

Grande. A Rua 14 concentrou toda a área de comércio e cafés. A maior parte

desses comércios era pertencente a emigrantes que aqui acabaram ficando após a

chegada do trem. Construíam seu comércio e, em um piso superior, suas

residências.

A área coberta por uma mancha verde, área de hortas, foi ocupada grande

parte por emigrantes japoneses. Vinham com um grande número de familiares em

busca de serviço e por disponibilizar da força braçal acabaram se dedicando ao

plantio. Atividade muito significativa, pois veio a atender a demanda do número de

moradores que aumentou consideravelmente após a chegada da NOB.

A mancha em cinza escuro, denominada por área militar, foi onde se instalou

o exército na década de 20, pertencente assim a ocupação 2. Para atender as

famílias desses militares, foi que se criou o primeiro bairro residencial de Campo

Grande, o bairro Amambaí. Era um local distante da área central da cidade e onde, a

maioria dos seus moradores se dedicava ao trabalho. Não havia nenhum

planejamento de convívio ou lazer, um bairro realmente criado dentro do ideal

modernista, das cidades pós-revolução industrial, bairro de trabalhadores.

O bairro Cascudo foi o segundo bairro a ser projetado e ficou ao Norte do

mapeamento, ladeando a Estação Ferroviária. Foi um bairro também criado para

abrigar trabalhadores; nele se instalaram prestadores de serviços, que

exerciamtrabalhos de olaria, barbearia, sapataria, açougue, ferraria, como também

residiam no mesmo local em que trabalhavam. O bairro abrigou também a Santa

Casa e o Colégio Dom Bosco.

A grande mancha em cinza claro foi onde se acomodaram os profissionais

liberais, médicos, advogados. As grandes casas dos fazendeiros da região também

ocuparam essa área. Ficou como uma área nobre da cidade, onde se instalaram as

pessoas de maior poder aquisitivo. A área contava com duas praças e também com

um clube, onde aconteciam todas as festas e reuniões desse mesmo público. O

Rádio Clube era um ponto de encontro e recreação dessas famílias que residiam em

suas proximidades e de acesso restrito.

A Estação Ferroviária teve muitas de suas casas construídas nesse mesmo

período. Outra parte delas, a mais antiga, acabou sendo refeita, pois as primeiras

instalações não eram nem de alvenaria. É possível, através de arquivos do IPHAN,

identificar os moradores das casas, as diferenças dos materiais empregados em

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suas construções. Dentro do Sítio da Ferrovia, as casas e suas ornamentações

eram construídas de acordo com o cargo que a pessoa residente exercia dentro da

hierarquia ferroviária.

Em 1941 a cidade passa a ser dividida por zonas: zona central ou comercial,

que é a área onde se encontrava o Sítio da NOB; zona industrial, zona residencial e

zona mista e, ainda neste período, encontramos registros de mais bairros como o

Boa Vista e o Vila Alba, praças, matadouro, curtume, quartéis. Em 1948 é criada

uma comissão para planejamento da cidade, com a função de melhorar e

desenvolver o urbanismo local.

O Sul de Mato Grosso até então era um grande exportador de erva-mate e

com a chegada da Ferrovia, muitos se animaram para realizar a exploração da

mesma. Em 1915 foi lançada uma lei estadual que garantia direitos de compra de

área de ervais, preferencialmente àqueles que já estavam estabelecidos ali, os

posseiros. A ideia de desfazer o monopólio da Cia de Matte Larangeira, parecia

próxima, se outros produtores de erva-mate conseguissem realizar transações

comerciais dessa possível produção, ela seria transportada pela NOB e isso traria

grande rendimento. Porém o monopólio permaneceu e a Matte Larangeira, acabava

comprando e revendendo a produção desses posseiros.

A Cia Matte Larangeira possuía todo tipo de transporte para realizar suas

próprias transações comerciais e utilizou poucas vezes o serviço da ferrovia. Na

década de 30 notou-se um aumento nos transportes de ervas pela Noroeste.No ano

de 1940 começaram a realizar embarques de erva-mate por Ponta Porã, devido a

proximidade com a fronteira, pois grande parte da erva era exportada.

Em 1943 Vargas cria o Território Federal de Ponta Porã, ação que não

agradou o governo do estado e muito menos a Matte Larangeira. Era o período da

Segunda Guerra Mundial e, para melhor comando de fronteira, criaram vários

territórios federais, onde militares assumiam a presidência temporária. Até os dias de

hoje a cidade de Ponta Porã é conhecida por princesinha dos ervais e, naquele

período, era a região de grande produção de erva-mate em Mato Grosso. A ferrovia

chegou em 1946 a Dourados e, em Ponta Porã, divisa com o Paraguai, em 1952. A

Matte Larangeira tem seu contrato com o estado de Mato Grosso findado em 1947,

quando as terras que antes ela dominava, gradualmente vão sendo ocupadas por

outras pessoas.

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Pelo visto, o Estado Novo imprimiu uma diretriz estatal, centralizada e nacionalista, nos seus ambiciosos projetos de ocupação dos “espaços vazios” do oeste e da Amazônia. Tal opção era politicamente orientada para criar, no “novo” espaço do país, uma nova ordem social, lastreada no fazer coincidir as fronteiras políticas com as econômicas e no estabelecimento de uma ordem original de relações sociais, ancoradas na pequena propriedade e na organização cooperativista dos associados – uma realidade nova e oposta às formas sociais da exploração do trabalho e do trabalhador do campo. (LENHARO, 1986, p. 46)

Neste mesmo período começa a haver incentivo à agricultura. Em 1943 dá-se

início a um projeto de reforma agrária e em Dourados é criada a Colônia Agrícola

Nacional de Dourados (CAND). Neste projeto foram doados lotes, em média 30

hectares a 10.000 famílias. Uma boa parte era de nordestinos e japoneses. Em seu

diário sobre a ferrovia, Figueiredo (1950) chega a citar que, em 1947, muitas

pessoas abandonaram a agricultura pela pecuária nos territórios “aquém – Paraná”,

devido à dificuldade do plantio e do clima, às vezes muito seco.

A ferrovia teve uma boa renda no trecho paulista e no trecho Sul Mato

Grossense, frequentemente, fechava seu orçamento com débitos. Durante todo o

período áureo do café, no estado de São Paulo, a ferrovia o teve como principal

fonte de lucro. O carregamento de café nos vagões era proveitoso, com muitas

sacas por vagão, aproveitando toda a capacidade. Com a crise do café a ferrovia

fica com o transporte do gado e do charque, que não sanavam os frequentes déficits

com que o trecho Sul-mato-grossense fechava anualmente.

Levando-se em conta que no grande Estado Central a quilometragem de linha é maior duas vezes que a da “Noroeste” paulista, em face das conclusões citadas, chega-se a conclusão geral que, sob o ponto de vista econômico, a exploração industrial do transporte ferroviário em Mato Grosso é altamente deficitário e impossível de ser mantida, se o Governo Federal não indenizar a Estrada de Ferro, anualmente dos prejuízos sofridos, levando-se em conta o seu caráter eminentemente estratégico. (FIGUEIREDO, 1950, p. 42)

Segundo dados do próprio Figueiredo, no ano de 1935 a NOB já havia feito

seu fechamento com débito e isso se seguiu nos anos posteriores. Em 1943

conseguiu fechar com algum lucro.No ano seguinte, os lucros e as despesas são

apenas pagos, mas em 1945, volta a ter déficit. O ano de 1948, que é o último ano

de análise, a quantidade de despesas chega a alcançar um quarto do lucro.

Enquanto o café manteve sua hegemonia os déficits da ferrovia eram

sanados, mas após a queda do café as outras mercadorias não conseguiam cobrir

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esses déficits, nem trazer rendimento semelhante. Dessa forma, era muito

importante que os locais onde a ferrovia estivesse instalada conseguissem gerar

renda que cumprisse com os gastos da ferrovia. Mas nem todos os povoados tinham

esse potencial. A maioria não tinha, principalmente no sul do Mato Grosso.

Os demais produtos, despachados na Noroeste, pagam de 30% até 68% menos que o café, enchem o vagão em volume e não o lotam em peso. O amendoim, por exemplo, paga um frete inferior ao do café em 58% e só ocupa, quando muito, peso correspondente à metade da lotação do vagão, apesar de enchê-lo em volume [...]. É um transporte duplamente desfavorável para a Estrada: no frete baixo atribuído pelas tarifas em vigor e no mau aproveitamento dos veículos. (R47, 1948, p. 148 apud QUEIROZ, 2004, p. 255)

O sul de Mato Grosso tinha agora a pecuária como principal produção e fonte

de negociações com os estados vizinhos. A erva-mate e o charque atendiam países

vizinhos, e a cidade de Corumbá passou a focar mais suas relações com países

como a Bolívia. Seu porto continuou em funcionamento e ainda era a fonte de

ligação com Cuiabá.

Campo Grande se expandia cada vez mais e grandes criadores de gado

acabaram se estabelecendo na cidade, construindo suas casas e acomodando suas

famílias. O transporte do gado, em Mato Grosso, era feito em grande parte para

Minas Gerais e São Paulo, locais onde estavam os grandes compradores;mesmo

com a chegada da ferrovia, ainda era levado em comitivas. Os vagões, para o

transporte desse gado, eram poucos e o fato de o boi ser levado em pé, acabava

ocupando muito espaço.

A ferrovia facilitou o transporte de gado, principalmente nas épocas de chuva,

pois as estradas ficavam empossadas e muito ruins de serem trafegadas. Mas há

vários registros de que eram ineficientes a quantidade de vagões e, a maneira como

o gado era acomodado, não era satisfatória de acordo com a demanda que havia.

Segundo Machado, (2008, p. 66):

Mesmo depois de inaugurada a Noroeste, em 1914, as coisas não mudaram muito para o boiadeiro no tocante ao transporte dos bois, que continuou por muito tempo a ser feito na base das comitivas, que conduziam as grandes boiadas para Minas, depois São Paulo e também para o Paraguai, sempre à procura de melhores preços e condições de negócio.

Outro parecer bastante interessante é o de Queiroz (2004, p. 404);

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A própria ponte da NOB sobre o Rio Paraná parece haver contribuído não só para o aumento dos transportes de gado pela ferrovia como, também, para a saída de animais em pé. Numa demonstração desse fenômeno, noticia-se em 1929 a execução de serviços visando a “adaptação”; tais serviços, que consistiam no assoalhamento da ponte e na instalação de um gradil de ferro em ambos os seus lados, foram concluídos em 1930 (R29, 1930, p. 15 – 16; R30, 1931, p. 15) – cabendo recordar que nessa época já havia uma estrada boiadeira entre Três Lagoas e Araçatuba, a qual era provavelmente percorrida por esse gado.

Além das questões de transporte desse gado, é importante entender o que

acontecia na negociação do mesmo. Lima Figueiredo, que era coronel e foi diretor

da ferrovia por cinco anos seguidos, declarou a necessidade de se construir um

frigorífico em Aquidauana, região que ele julgava ser equidistante dos principais

pontos de criação de gado do sul do estado de Mato Grosso. Assim seria produzida

uma carne mais descansada para o consumidor, evitando as longas viagens para

engorda e abate e trazendo maior lucro aos produtores.

Segundo Figueiredo (1950, p. 99-100);

O criador arca, pelo processo atual, com todos os ônus e é o que menos ganha. O invernista compra-lhe o boi, leva-o para suas pradarias bem formadas e, no fim de um ano apenas, o revende rachando de gordo. Ganha boa soma. O industrial, geralmente estrangeiro, em seu frigorífico recebe o bovino e o aproveita integralmente. Paga apenas o preço da carne, mas aproveita tudo: matambre, chifre, osso, casco, couro, sangue, pêlo e até o estrume. Quando póde exportar carnes frigorificadas ou enlatadas é um Deus nos acuda de dinheiro.[...] Por essa rápida exposição todo o mundo póde averiguar a desigualdade entre o ganho dos que criam e dos que negociam o animal bovino.

Segundo Azevedo (1950, p. 101),

[...] a solução do problema estaria antes na formação, em cada um dos centros de pastoreio, das diversas indústrias ligadas à criação de gado, e na instalação de grandes armazéns frigoríficos para depósito e conservação de carnes congeladas, provenientes de reses abatidas nessas regiões. Armazéns frigoríficos, junto aos matadouros locais; vagões frigoríficos, para o transporte de carnes congeladas, pela viação férrea até os centros principais de consumo; a exploração industrial dos produtos da pecuária, e , portanto, a coordenação, para o mesmo fim das atividades da indústria pastoril e da indústria de transportes ferroviários, constituem um conjunto sistemático de medidas, mediante cuja execução não só estaria resolvido o problema dos criadores e da elevação de nossos rebanhos [...] em quantidade como em qualidade [...]

A luta por muitos anos da criação de um matadouro em Campo Grande,

nunca saía efetivamente do papel. Foi assim que alguns fazendeiros locais se

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reuniram, organizaram e construíram o matadouro com financiamento próprio.

Figueiredo (1950) chega a mencionar a admiração pelo esforço do povo local na

execução do projeto do matadouro e diz que espera que esse esforço seja

reconhecido pelo governo federal, de forma que venha a investir em veículos

frigoríficos para o transporte da carne congelada pela ferrovia. A possibilidade de

levar a carne já abatida, cortada, traria muito melhor rendimento para esse trajeto. O

número de mercadorias que embarcaria por vagão seria muito maior do que o gado

transportado em pé.

[...] Apelando para o General Eurico Dutra, mato-grossense de boa cepa, estou certo de que em breve, teremos os veículos frigoríficos, para não atrasar o funcionamento do M.I., levado a cabo a golpes de audácia e de entusiasmo por pecuaristas desejosos de ajudar a independência econômica da terra dos capitães-generais. (FIGUÊIREDO, 1950, p. 105)

Os pecuaristas locais reivindicavam por mais vagões, melhores taxas.

Segundo Queiroz (2004, p. 405),

Tratando desses assuntos, os relatórios dos diretores noticiam uma realidade bastante contraditória, na qual se sobressaíam os seguinte aspectos: as pressões dos pecuaristas mato-grossenses, exigindo transporte, por um lado; e o caráter francamente deficitário desse serviço, por outro.[...] o transporte do gado mato-grossense representava, para os dirigentes da Noroeste, uma grande complicação.

E segue ainda um relatório de 1936, escrito por Marinho Lutz:

Vem tendo grande incremento a pecuária, no Estado de Mato Grosso, principalmente na parte em que o mesmo é servido pela Noroeste. O crescente aumento da criação de gado está exigindo melhor aparelhamento do material rodante e de tração da Estrada, a fim de que sejam satisfeitas as justas exigências dos criadores, no concernente ao transporte desse produto. Apesar de ser essa a principal fonte de riqueza daquele Estado, ainda não pudemos de maneira satisfatória resolver o problema do transporte desse gênero, em virtude da deficiência do nosso material, e muitas vezes nos deparamos com dificuldade de tal natureza que se produz verdadeiro colapso do transporte de gado (R36,1937, p. 86 apud QUEIROZ, 2004, p. 405)

O sistema funcionava da seguinte maneira: o gado saía do sul de Mato

Grosso magro, era transportado para o oeste paulista e lá ele ia para engorda e em

seguida era destinado através da própria ferrovia para os frigoríficos em São Paulo.

Segundo Alves (1984, p. 71),

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A Noroeste do Brasil permite verificar, ainda como o capital monopolista pensou e utilizou o transporte em função de seus interesses materiais. Essa ferrovia foi financiada por capitais franco-belgas, exatamente num momento em que especialmente grupos belgas tinham grandes interesses econômicos localizados em Mato Grosso. A Brazil Land and Cattle Packing Co. presta-se a uma ilustração mais expressiva; essa empresa invernava gado em suas fazendas de Campo Grande e Três Lagoas, ambos os municípios servidos pela Noroeste do Brasil, e exportava para São Paulo, através da via férrea, gado gordo com destino ao abate no Frigorífico de Osasco. É essencial relembrar que tanto aquela empresa como este matadouro industrial pertenciam ao espólio Farquhar nesse momento. Logo, a Noroeste do Brasil era o tentáculo que articulava, para um mesmo grupo monopólico, neste caso, as fontes de matéria-prima e os estabelecimentos industriais que a transformavam. Exatamente nessa interdependência das regiões econômicas repousava a concepção de divisão regional do trabalho, e neste exemplo a vemos em plena realização.

Podemos avaliar que a ação do capital monopolista é que determinou todos

os tipos de transações econômicas em Mato Grosso. Isso modifica o tráfego do

Porto de Corumbá que atendia aos Países Platinos para o eixo São Paulo – Santos,

com a ferrovia e o Porto de Santos, o estado de Mato Grosso se encarrega de

atender a produção de gado em pé.

A Ferrovia sofreu desde sua criação com questões de manutenção e

eficiência do seu corpo físico. Foram constantes os relatos de descarrilhamento de

trens, devido a problemas nos trilhos. Devido a má execução da obra, feita às

pressas, correndo da Leishmaniose, dos índios kaingangues para alcançar o fim de

seu traçado, as obras ficaram precárias. O trecho que percorre a parte paulista foi

um dos mais deficientes, mas trechos próximos a Campo Grande também tiveram

problemas e foram vagarosamente reformados. Problemas como a falta de

empedramento do leito da linha e falta de equipamento de tração para novos vagões

também foram relatados.

Dadas todas essas circunstâncias, ainda na década de 20 teve início uma série de extensos trabalhos de melhoramentos do trecho paulista da NOB. Na verdade pode-se dizer que, nesse trecho, ao longo do nosso período, a estrada foi quase totalmente reconstruída – com novo traçado, novos trilhos, novas obras-de-arte, etc. [...] mas outros problemas também prejudicaram o avanço dos trabalhos, particularmente na variante Araçatuba-Jupiá – era o caso, por exemplo, da Leishmaniose, doença que grassava na região [...]. (QUEIROZ, 2004, p. 50)

A falta de maquinário como o vaga-guindaste era muito difícil, pois ao

descarrilhar um vagão, ou qualquer outro acidente ao longo da linha, o

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atendimentodemorava muito, pois precisavam realizar empréstimo desse vagão em

outras ferrovias vizinhas. O fato de muitos insumos para a operação normal dos

vagões serem importados fazia muitos trechos ficarem com vagões parados,

esperando peças que demoravam dias para chegar, fora o custo que era muito alto.

Só a partir de 1940 que começaram a produzir esses produtos no país,facilitando o

acesso e diminuindo o custo das compras. Ao longo da vida da Ferrovia, vários

fatores dessas questões operacionais foram desgastando e onerando a manutenção

geral da NOB.

Os relatórios anuais da NOB relatam o alto custo que a ferrovia tinha com a

manutenção de seu pessoal. As despesas eram muito grandes com hospitais,

médicos e dentistas, que eram contratados para atender aos próprios funcionários, e

contratações de mão de obra civil, principalmente durante o período de construção

da Ponte Barão do Rio Branco, que cruza o Rio Paraguai, só pioraram a situação

deficitária.

O número de funcionários foi bastante reduzido depois da alteração do tipo de

combustível que se utilizava para o funcionamento do trem, que por muito tempo

funcionou à lenha, o que gerou problemas decorrentes de desmatamento. O preço

da lenha subiu e tiveram de reavaliar o uso deste tipo de combustível. Um fator que

já incomodava era o número de acidentes que as fagulhas da lenha causava durante

o trecho da viagem. Do ano de 1932 a 1947 foram encontrados relatórios que

constantemente reclamavam sobre os ocorridos.

Por outro lado, a queima da lenha produzia graves e indesejados efeitos colaterais, já mencionados neste estudo, a saber, os incêndios provocados pelas fagulhas emitidas pelas chaminés das locomotivas. A magnitude desse problema, no que respeita aos prejuízos financeiros causados à Estrada sob a forma de indenizações pagas a terceiros, pode ser parcialmente avaliada pelos dados referentes ao serviço de atendimento às reclamações dos usuários. (QUEIROZ, 2004, p. 220).

A primeira tentativa na troca do combustível ocorreu no período em que Lima

Figueiredo esteve no comando da ferrovia. Ele optou pelo uso do carvão mineral,

mas concluíram que se gastava muito material para pouca energia gerada. Logo

depois, durante o comando de Marinho Lutz, a ferrovia passa a usar o óleo

combustível e o uso deste trouxe conclusões interessantes de custo, pois diminuía o

número de acidentes, não fazia a sujeira que a fumaça da lenha fazia, não era

necessário vagões a mais para carregamento de lenha e reduzia o número de

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funcionários. Não era mais necessário tantas pessoas para o auxílio constante de

abastecimento de lenha, o que diminuía parte dos déficits da Ferrovia.

[...] a substituição da Maria Fumaça pela locomotiva a diesel, foi o fator responsável por essa perda: a maquina diesel requeria menos número de trabalhadores para sua operação e manutenção, e assim, com a diminuição do número de operários, os políticos não mais faziam seus comícios com menção especial aos ferroviários. (QUEIROZ, 2004, p. 231)

O avanço de outros meios de locomoção acabou influenciando o

funcionamento da linha férrea. Já no ano de 1920, o Brasil começou a investir na

aeronáutica, no treinamento de pessoal para a formação de pilotos, e passou a

sobrevoar o litoral, como forma de defesa nacional de fronteiras. Durante as

revoluções de 1924 e 1926, ficaram suspensos alguns voos no Brasil, e, em 1930,

os aviões que estavam no Brasil eram então de responsabilidade da Escola Militar.

Depois da Revolução Constitucionalista de 1932, o Brasil adquiriu novos aviões e,

com a Guerra do Chaco, resolveu instalar campos em outros lugares, como Minas

Gerais e Mato Grosso, para maior controle de fronteira. Há relatos, em 1953, de

voos para o sul de Mato Grosso.

Segundo Buainain (2006, p. 33),

A decisão de se construir a pista foi tomada no governo de Getúlio e o contrato assinado por Nero de Moura, que era Ministro da Aeronáutica. A Camargo foi a encarregada de construí-la. Em seguida, foi feito o aeroporto civil, separando-se, então, as atividades da aeronáutica civil da militar. Eu era prefeito e estive presente à inauguração, realizada pelo Getúlio, do aeroporto Internacional de Campo Grande, ainda sem a parte de passageiros, em fevereiro de 54.4

A maioria dos serviços realizados na área de aviação em Mato Grosso era

para atender ao correio, ligando as cidades umas as outras. Outra informação que

ficou clara é que o trajeto de São Paulo a Campo Grande de trem durava, em média,

2 a 3 dias; e de avião reduzia muito, pois o trecho poderia ser feito em 2 horas e

meia. Em 1954, com a inauguração da pista de concreto na Base Aérea, a cidade se

transforma em um importante aeroporto da América do Sul.

4Depoimento feito pelo ex-prefeito de Campo Grande Dr. Wilson Fadul no ano de 1999, ele governou Campo Grande de 1953 a 1955. Graduado médico no Rio de Janeiro em 1945, foi Deputado Federal e chegou ao cargo de Ministro da Saúde no governo de João Goulart, veio a falecer em 2011.

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No grande Estado mediterrâneo a distância aterra e o povo está adquirindo uma mentalidade aeronáutica. Não há fazenda que não tenha seu campo de pouso e nos aeroclubes há aviões pequenos que são empregados como taxis aéreos com excelentes resultados. [...] Mercê do avião as distâncias mínguam naquela região onde a grandeza de chão apavora. (FIGUÊIREDO, 1950, p. 18)

O setor rodoviário também era explorado por muitas pessoas, já na década

de 20 eram encontradas algumas carretas entre o interior do estado e a Vila

entroncamento de Campo Grande. As estradas que faziam ligação entre Campo

Grande e as vilas próximas e as estradas de grande distância como as que eram

percorridas pelos boiadeiros das comitivas até Minas Gerais e São Paulo, são muito

antigas. As estradas eram frequentadas em maior parte por boiadeiros a cavalo,

bois, mascates, carros de boi, carretas, caminhões.

As cidades de Campo Grande, Aquidauana e São Paulo eram as principais

fontes de abastecimento do comércio regional. Havia muitas críticas à Noroeste na

qualidade de transporte de cargas. Reclamavam do tempo que a mercadoria levava

para chegar, do estado em que ela era transportada chegando com más

condiçõesou, até mesmo, sofrendo perdas e extravios de mercadorias.

O frete feito pelos caminhões no interior do sul de Mato Grosso era muito

caro, saía mais caro um frete de Campo Grande a Dourados do que de São Paulo a

Campo Grande.Mas era uma entrega mais pontual do que a do trem, e a maioria

dos comerciantes das vilas acabavam preferindo. Em 1948 os caminhões

predominaram no abastecimento do interior do sul de Mato Grosso.“O fato é que

caminhões acabaram predominando. Em 1948, é criado o Distrito Rodoviário do Sul,

com sede em Campo Grande, reforçando o transporte rodoviário.” (QUEIROZ, 1999,

p. 453)

Nacionalmente, a ideia de rodovias surgiu já em 1920 com Washington Luiz,

pois ele tinha como lema que governar era abrir estradas. Assim, acabou projetando

e modernizando várias estradas do interior de São Paulo. No final da década de 50,o

presidente Juscelino Kubitschek implementou o projeto de rodovias, com dois

objetivos em mente. A primeira ideia era a de integrar o país, mudando a capital

para o centro do Brasil, hoje Brasília, e conseguir povoar e criar relações comerciais

em regiões mais afastadas, como o Centro-Oeste e a região Norte. A segunda

intenção era política e econômica, ampliando a malha rodoviária, que atrairia

empresas do ramo automobilístico para o Brasil.

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Às estradas carroçáveis que se abriram à circulação de carros de tração animal e ainda se encontram em quase todas as regiões do país, vão sucedendo, em planos cada vez mais largos e de construção cada vez mais perfeita, as estradas de rodagem ou as rodovias destinadas ao tráfego de automóveis. O impulso que, em consequência da invasão dos autos, de passageiros e de carga tomaram as iniciativas e atividades rodoviárias, foi tão extraordinário e tão vigorosamente sustentado (“governar é abrir estradas”) que, no Brasil, já se registraram, em 1930, mais de 113 mil quilômetros de rodovias em tráfego [...]. (AZEVEDO, 1950, p. 25 – 26).

Muito conhecida a frase de JK, “50 anos em 5”, seu lema era investir no

desenvolvimento de indústrias no país, acelerar a economia e atingir as regiões mais

distantes. Foi eleito em 1955 a presidente e terminou seu trabalho em 1961.

Conseguiu, com essa ideia de rodovias, atrair grandes indústrias como a

Volkswagen, Ford e General Motors.Abriu a economia brasileira para o capital

estrangeiro, abriu rodovias transregionais, ajudou no povoamento do Brasil Central,

construiu Brasília em tempo recorde, mas acabou deixando o país com uma grande

dívida externa. Em nome da estratégia de atrair investimentos e gerar empregos, as

ferrovias, que tiveram tanta importância no ciclo do café, foram sucateadas e

desprezadas em favor da rodovia.

Segundo Azevedo (1950, p. 32), havia a ideia de que poderíamos ter diversos

tipos de meios de transporte e que cada um deles desempenharia uma função,

chegando a um equilíbrio, de forma que nenhum anularia o outro. Assim,

A era do trem de ferro não passou: o automóvel e o avião não fizeram mais do que ressaltar as “aptidões particulares” de cada um dêsses meios de locomoção, seja qual fôr a fôrça motriz vitoriosa ou dominante, em vastos planos de viação e de transportes, em cada país ou na esfera internacional.

Azevedo acreditava que, na civilização moderna, cada um deles teria tarefas

específicas: o avião teria a vantagem da velocidade vencendo grandes distâncias

em pouco tempo; o automóvel seria para locomover poucas pessoas e mercadorias

em distâncias breves e; a ferrovia seria o meio mais inteligente de levar pessoas em

massa e escoar grandes cargas por um preço bastante reduzido.

No mesmo período em que estava em voga o crescimento das rodovias, a

década de 50, começou no governo de Wilson Barbosa Martins, prefeito de 1959 a

1963, a discussão sobre a construção de uma rodoviária em Campo Grande. A

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rodoviária foi construída, mas não com recursos públicos, pois a prefeitura não os

tinha. Ela foi construída pelos irmãos Laburu.

Até 1948 os embarques e desembarques para transportes intermunicipais ou

interestaduais eram feitos em pontos que se distribuíam entre as ruas 14 de julho

(Rua Principal), Antônio Maria Coelho (Y Juca Pirama) e Avenida Afonso Pena

(Marechal Hermes). Depois de 1948 até a construção desta rodoviária, os

embarques e desembarques aconteciam nas proximidades do Hotel Gaspar, que

ainda se localiza próximo à Estação Ferroviária, na esquina da Avenida Mato Grosso

com a rua Calógeras.

Na década de 50 as ruas não tinham pavimentação e apenas o trecho

próximo à Estação era coberto por paralelepípedos. Foi implantada a Base Aérea

neste mesmo período e, logo depois, para atender essa região, construíram mais um

na Vila Alba. A região leste da cidade era onde a maior parte da economia local

acontecia: as transações comerciais e as prestações de serviço. Ao norte, a

prefeitura foi criando loteamentos que atendessem a demanda de crescimento da

cidade.

No ano de 1950 a cidade tinha 31.708 habitantes e uma década depois

atingiu 64.934. Isso atraiu muitos investidores, até mesmo de fora do estado, que

começaram a comprar grandes chácaras e loteá-las na intenção de vender a preços

bem elevados, devido a valorização local e o grande número de pessoas que atraía

anualmente. A prefeitura teve de assumir, após um tempo, o controle sobre essas

ações, pois não conseguia atender às medidas de saneamento, luz, asfalto para

cada novo lote que surgia.

Nesta mesma época se tornou frequente a reclamação da população sobre a

presença dos trilhos no centro da cidade, alegando que devido ao aumento do fluxo

de pessoas no local, os acidentes por atropelamento, e até mesmo óbito, por conta

da linha, eram corriqueiros. O prefeito deste período5 chegou a relatar que o

caminho feito pelos trilhos não foi realmente planejado,

A Noroeste foi feita com carroças e burros. Nós não tínhamos máquinas. Foi feita na pá, no enxadão e o transporte de materiais em carrocinhas ou no lombo de burro. Então, toda vez que se encontrava uma forma de desviar de um aclive, de desviar de um pântano, se desviava e foram fazendo a estrada ao sabor da linha mais favorável ao trânsito da ferrovia. (BUAINAIN, 2006, p. 81).

5 O prefeito em questão era Dr. Wilson Barbosa Martins.

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O pedido da retirada do trilho era por conta dos acidentes. Mas ainda neste

momento a ferrovia tinha seu funcionamento ativo e frequente, pois servia de

entroncamento para as cidades próximas e a ligação com outros estados brasileiros

e a Bacia Platina. Mesmo assim, atendendo às reinvindicações da população, surge

uma proposta para fazer outra estação distante do centro.

O atual diretor superintendente da Estrada de Ferro Noroeste, engenheiro Pedro Pedrossian, objetivando de maneira concreta, positiva e real o que representa para o progresso da cidade a retirada dos trilhos do centro da cidade, resolveu construir a variante de Campo Grande, deixando a cidade livre dos trilhos da via férrea, eliminando assim as perigosíssimas passagens de níveis que muitos e lamentáveis desastres têm dado e continuam sendo o perigo constantes dos motoristas imprudentes. Esta variante, que saíra das proximidades da Base Aérea Militar[...].(CORREIO DO ESTADO, p. 1, 17 de maio, 1962 apud BUAINAIN, 2006, p. 82)

A cidade estava em intenso crescimento e o número de pessoas que

migravam para procurar novas oportunidades de emprego e de acesso à terra, era

grande. Com este fluxo de migrantes, a cidade foi criando outros bairros e começou

a sofrer, já em 1962, com especulações imobiliárias. Pessoas com maior poder

aquisitivo compravam grandes chácaras e as loteavam para venda, com preços

altíssimos. Até mesmo pessoas que nem residiam aqui, sabendo da valorização do

espaço urbano, começaram a adquirir terrenos para especulação.

E, desde que me investi no cargo me dei conta de que a cidade precisava de uma reforma administrativa. Saíamos de um estado de vila para um estado de cidade, que requeria uma administração mais complexa e que tivesse uma organização moderna. ”6(BUAINAIN, 2006, p. 85)

Ainda com Wilson Barbosa Martins como prefeito, foi criado o Conselho de

Planejamento. Este órgão tinha como função estudar a cidade e ajudar a prefeitura a

saber quais investimentos deveriam ser priorizados. Houve também a criação de leis

para realização de loteamentos e um código de posturas e de obras para a cidade.

O crescimento da urbes era tão intenso que já, à beira dos córregos, apareciam as

primeiras favelas de Campo Grande.

Durante todo esse período foi também discutida a ideia da chegada da

indústria, pois preocupava a possibilidade de Campo Grande ficar sempre 6 Relato de Wilson Barbosa Martins no ano de 1999, foi prefeito de Campo Grande de 1959 a 1963 e se elegeu governador do estado de Mato Grosso do Sul em 1982. É advogado por formação, foi presidente da OAB e deputado federal.

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economicamente ligada ao setor primário. Acreditava-se que se a indústria chegasse

até aqui, a cidade se desenvolveria muito mais, atrairia mais gente, geraria mais

empregos.

O problema dos trilhos na área central só se agravava. No ano de 1964,

muitos alegavam que os trilhos estrangulavam o crescimento da cidade. A cidade

não conseguia se expandir para além do trilho. As duas principais avenidas que

cortavam a cidade acabavam morrendo no encontro com a ferrovia. Além dos trilhos

o estrangulamento da expansão da cidade era devido aos córregos que a cortavam.

Era necessário realizar a ligação da cidade para além dos córregos. Em princípio, a

ligação da área central com a porção oeste da cidade, se fazia por um pontilhão na

rua 26 de Agosto e na rua Cândido Mariano.

Para tanto, o diretor da ferrovia, na época, se reuniu com o prefeito, que neste

momento era Humberto Canale, para discutir como seria feita a retirada desses

trilhos. Segundo o Jornal O Matrogrossense (1964, apud BUAINAIN, 2006, p. 115)

[...] Vê-se, assim, marchando para a concretização a promessa [...] de dotar a nossa Campo Grande de uma estação à altura de seu progresso, bem como de livrar a nossa cidade do estrangulamento de sua parte central, cortada que é pela paralela de aço de nossa ferrovia.

Campo Grande era um grande entroncamento ligando cidades, estados e

países. Em 1970 foi cogitada a possibilidade de manter os trilhos de forma que os

adaptasse para um metrô de superfície, mas a cidade não tinha população suficiente

para tamanho investimento. Houve também a ideia de fazer no espaço dos trilhos

uma avenida que teria início no cruzamento da Avenida Mato Grosso.

Nos anos de 1970, a rodoviária local começa a ser construída e as estradas

de rodagem vão cortando o país. Campo Grande passa a ter dividido o fluxo das

viagens entre ferroviárias e rodoviárias, o que manteve a Ferrovia funcionando por

um bom tempo. Neste período a cidade atingiu uma população de 131.110

habitantes e o crescimento dobrava a cada década.

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Figura 14 - Campo Grande: primeira rodoviária, construída pelos irmãos Laburu,

expressa as necessidades criadas pelas rodovias e anuncia a decadência das

ferrovias, (década de 60). Fonte: Campo Grande News. Disponível em:

<.http://www.campograndenews.com.br/entretenimento/rodoviaria-encerra-este-mes-

37-anos-de-historia-01-22-2010. Acesso em: agosto de 2012.

No ano de 1975 é iniciada a construção do primeiro núcleo industrial de

Campo Grande, o Indubrasil. A intenção era gerar empregos e naquela região já

havia acesso da ferrovia e da rodovia. As saídas rodoviárias da cidade receberam

investimentos e uma parte delas foi duplicada. O governo estadual se preocupou

com o investimento em rodovias, pois o crescimento do meio de transporte

correspondente, federal, era de fluxo intenso.

Os relatos reforçam a impressão de que o Governo Federal nunca enviava

recursos para essa região e se a própria região não investisse, ficaria isolada,

esquecida economicamente, não escoaria sua matéria prima e reduziria suas

relações comerciais.

Quando as estradas chegaram, Corumbá foi perdendo, cada vez mais a sua importância de distribuidor dos produtos vindos do exterior ou do próprio Brasil. Então, a Noroeste foi entrando em decadência exatamente no período em que nós estivemos na Prefeitura e, embora se discutisse o problema dos trilhos, não havia condições de investimento para realizar a

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mudança que naquela ocasião, não era importante aos olhos do Governo Federal.7 (BUAINAIN, 2006, p. 238).

A importância então do Sítio da Estrada de Ferro é indiscutível e, entender

aquele espaço como patrimônio, foi uma luta constante em todos os governos

municipais. No período em que Marcelo Miranda foi prefeito da cidade, houve os

primeiros manifestos para que começasse a se preservar o patrimônio histórico da

cidade. Mas o prefeito em questão disse que, naquele momento, Campo Grande era

uma cidade jovem e seu passado não era ainda histórico. Os únicos bens que

julgava ter importância para preservação seriam a Pensão Baís e a Ferrovia, mas os

dois ainda estavam em uso.

Em 1979 foi eleito prefeito Albino Coimbra Filho, que chegou a mencionar

novamente sobre o patrimônio histórico local. Mostrou-se contra a retirada do trilho

do centro da cidade, fez um estudo e averiguou que os países desenvolvidos

acabaram fazendo de seus trilhos, metrôs de superfície. Esse metrô cruzaria a

cidade e ajudaria o fluxo de pessoas do centro para a periferia no dia-a-dia,

diminuindo a lotação dos ônibus.

Faz o levantamento de quantas pessoas morreram nos trilhos de Campo Grande, ao longo de 50 anos, Se foi mais de 10... Então, tem que tirar o carro da cidade, esse monstro que mata todo dia. O trem não mata ninguém. É só colocar os equipamentos de sinalização necessários que não haverá nenhum problema.8 (BUAINAIN, 2006, p. 262).

O projeto deste mandato acreditava que o traçado do trilho de Campo Grande

era muito proveitoso, pois percorria a cidade com vistas muito bonitas e passava por

pontos importantes. A sua retirada seria um grande gasto de dinheiro, sendo que ele

poderia ser reutilizado. Cogitou-se também a proposta de fazer no espaço do sítio

um grande parque verde e o restauro do património físico. Houve críticas na questão

da retirada do antigo relógio da Rua 14 de julho e de parte dos paralelepípedos da

Rua Y-Juca Pirama, durante o mandato do prefeito anterior. É possível notar que, a

partir de 1979, começava o entendimento sobre o que é patrimônio histórico e o

valor do espaço urbano construído.

7 Relato de Marcelo Miranda Soares no ano de 1999, prefeito de Campo Grande no período de 1977 a 1979. Era engenheiro e chegou a Governador do Estado em 1982. 8 Relato de Albino Coimbra Filho no ano de 2000. Odontólogo e advogado, foi prefeito de Campo Grande de 1979 a 1982.

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A partir de 1983, a cidade cria novas leis para o uso do solo e o seu

zoneamento. A retirada dos trilhos do centro da cidade volta a ser a programação do

governo, como também a criação de uma nova rodoviária na saída para Três

Lagoas. Chegou a se pensar em fazer do sítio da ferrovia e de seus barracões um

local para bares e restaurantes. Mas nem uma coisa nem outra foram feitas.

Planejava-se, discutia-se o assunto, mas efetivamente nada era realizado.

Em 1990 a ferrovia já estava com o movimento bem deficitário, seu

rendimento era muito fraco para manter seu funcionamento. Em 1994 o prefeito

tentava ainda a negociação com a rede Ferroviária Federal para a retirada dos

trilhos da área central da cidade.

[...] A proposta da Prefeitura Municipal é estabelecer um convênio entre o município e a RFFSA para os estudos de meios que minimizem os transtornos das passagens de nível. A prefeitura criaria uma comissão para trabalhar junto com técnicos da Rede Ferroviária Federal vendo a possibilidade de inclusive retirar os trilhos do centro de Campo Grande. Para tanto, seria necessário o cálculo do patrimônio da RFFSA em questão e os gastos com as obras [...].(CORREIO DO ESTADO p. 5, 1994 apud BUAINAIN, 2006, p. 374)

Figura 15 - Campo Grande: destinos e horários de partida para os trechos que a

Ferrovia realizava no ano de 1992.Fonte: Jornal Correio do Estado, 1992.

Em 1995 aconteceu o último translado de passageiros e assim extinguiram-se

os trens de passageiros da NOB. No mesmo ano, o prefeito Juvêncio Cesar da

Fonseca moveu ações para a preservação do sítio da NOB como património

histórico e em 13 de maio de 1996 sai no Diário Oficial a Lei n° 3249, que trata do

tombamento do sítio histórico da Vila Noroeste.

Com a privatização, no ano de 1996, a Ferrovia Novoeste S.A arremata a

ferrovia. A partir deste momento, o que já estava sem cuidado algum, só piorou.

Muitos funcionários foram demitidos, outros coletivamente se demitiram e a maioria

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das casas do sítio acabou indo a leilão, sendo que parte delas foram compradas

pelos próprios ferroviários e outras por particulares9.

O relato de Juvêncio Cesar da Fonseca, ex-prefeito, avalia a privatização:

Tudo fica na mão de terceiro e terceiro quer só lucro. Veja a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil. A Novoeste desativou o ramal para Ponta Porã, retirando os dormentes para fazer manutenção de outra linha, simplesmente, por economia. E acabou deixando toda aquela região, Maracaju, Ponta Porã, uma região produtiva, sem o transporte ferroviário que é o mais barato. Preferiu destruir um ramal para não gastar dinheiro em manutenção de outro ramal.(apud BUAINAIN, 2006, p. 364).

Em 1998 houve a fusão da Ferronorte e da Ferraban e depois, em 2002, se

juntou com outros trechos ferroviários paulistas e se tornou Novoeste Brasil. No ano

de 2000 foi determinada a construção de um contorno ferroviário, para que o trem

pudesse passar por fora da cidade e os trilhos, que desde 1950 estavam tentando

remover do centro, fossem, então, definitivamente retirados. Sobre a área do sítio da

NOB, o município entrou com pedido de permuta com a RFFSA, já que ela estava

com muitas dívidas de IPTU atrasadas.

[...] O prefeito André Puccineli, disse ontem, durante a votação da câmara, que essa foi a alternativa encontrada para garantir que a RFFSA pague os impostos devidos. Além disso, o projeto de lei tem o objetivo de preservar o patrimônio histórico. Segunda etapa. Puccineli ressaltou que a próxima etapa, depois que a permuta foi oficializada com a rede, que já demonstrou interesse, será a análise dos imóveis.[...] (Correio do Estado Online, Campo Grande, 11 de set. 2001, apud BUAINAIN, 2006, p. 425)

Fica clara que as intenções nesse período era a de restaurar o sítio e remover

os trilhos da região central. O PLANURB é o órgão que a prefeitura designou a partir

deste momento como responsável pelo estudo da proposta de revitalização da área.

A medida de retirada do trilho e limpeza daquela área, já valorizaria a região do

centro velho, que estava há anos em decadência, descaso e marginalizada.

Desde 2001, quando o patrimônio histórico já estava tombado pelo governo

federal, os moradores, antigos ferroviários ou descendentes dos mesmos, em

conjunto com a Câmara de Vereadores, fizeram reivindicação de que, qualquer

proposta que viesse a ser feita naquela área fosse, antes de mais nada, discutida

com os ferroviários que continuaram a morar no sítio, com a participação dos

moradores nas decisões. 9 Maneira como os ferroviários ou descendentes deles denominam as pessoas que compraram as casas no leilão e não fizeram parte efetiva da história da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil.

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Concomitantemente, o prefeito André Puccineli programou que os projetos

sairiam em 2002 e o PLANURB, em conjunto com a Companhia Brasileira de

Transporte Urbano seria consultada sobre a viabilidade do projeto. Este projeto tinha

inicialmente dois objetivos: a retirada do trilho do centro da cidade e urbanizar todo o

corredor existente.

Segundo Jornal Correio do Estado Online (2001, apud BUAINAIN, 2006, p.

425),

A reutilização dos trilhos urbanos da Rede Ferroviária Federal com apelo turístico e cultural, após sua desativação para transporte de carga com a construção do contorno ferroviário, é um projeto viável e terá o apoio da prefeitura se este for o desejo da sociedade. O compromisso foi assumido pelo prefeito André Puccineli com os membros da ONG Ferroviva, que defende a preservação da malha como interesse histórico e alternativa de transporte de massa. A obra do contorno, cuja conclusão está prevista para meados de 2002, foi projetada para retirar os trilhos da área central de Campo Grande, como chegou a ser anunciado pelo município. Essa meta mobilizou ferroviários, arquitetos, historiadores e saudosistas, todos contrários a destruição de uma parte histórica da cidade. Resultado: Dos debates, nasceu uma contrapropostas para revitalizar o corredor ferroviário e os prédios abandonados da antiga estação, O prefeito André Puccineli não apenas acenou seu apoio ao movimento – assinou, inclusive, ficha de sócio da ONG -, como anunciou um projeto arquitetônico para transformar o complexo da estação ferroviária em um centro artístico-cultural com teatro, museu do trem, oficinas de arte e restaurante, Os imóveis, num total de 15, serão adquiridos através de um encontro de contas com a Rede Ferroviária Federal (RFFSA), que deve IPTU e ISS ao município – o valor não foi divulgado[...].

Em 2002 já se discutia a ideia de inserir a Feira Central no espaço da ferrovia,

de forma que tiraria a feira da condição que estava há muitos anos e faria um projeto

para sua implantação, com maior organização, higiene e conforto. As negociações e

os estudos para essa mudança se concretizaramem 2004 e, desde então, a Feira

ocupa um grande espaço no pátio da antiga estação. Neste mesmo ano, a obra do

contorno ferroviário, o qual faria o trem passar na estação do Indubrasil e não mais

pelo centro da cidade, foi concluída. Com a conclusão do contorno, a Novoeste se

retirou da esplanada e a prefeitura se comprometeu a fazer a restauração do

Armazém de Cargas para que ele então se tornasse um Armazém Cultural, um

espaço para eventos.Já a Feira Central foi instalada no pátio de embarque e

desembarque da Ferrovia, em uma área de 13 mil m².

Em relação ao funcionamento da Novoeste, em 2006 ela e a Brasil Ferrovias

fizeram uma fusão com a ALL – América Latina Logística.Essas concessões eram

todas para transportes de carga, como já citado. O transporte de passageiros foi até

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1995. Poucas estações na Noroeste são usadas, com grande parte das instalações

estão sem nenhum cuidado e a maioria dos trechos está em abandono total, caso do

trecho de Ponta Porã.

Figura 16 - Campo Grande: foto aérea com a área de tombamento do Sítio da

Estrada de Ferro Noroeste do Brasil.Fonte: PLANURB, 2010.

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Partindo do princípio da urbanização moderna, encontraremos uma influência

muito grande da Revolução Industrial na formação das cidades. O fluxo muito

grande de pessoas do campo para a cidade acelerou o crescimento das urbes e,

para sistematizar a organização do espaço físico, surgem os zoneamentos. A cidade

foi dividida em setores e serviços, com surgimento das vilas de trabalhadores.

Limitou o trabalhador a conviver socialmente com seus colegas de trabalho fora e

dentro do serviço.

A Vila dos Ferroviários é uma dessas propostas da cidade moderna, a

sistematização da vida de um povo através de seus empregos e suas respectivas

funções, limitaram suas relações externas aos interesses do capital. As setorizações

organizam o espaço, mas segregam, limitam e condicionam o cidadão a uma vida

que o sistema escolheu para eles.

Na visão dos antigos ferroviários, eles vieram no intuito de trazer o progresso

local e hoje estão esquecidos pela cidade. É muito difícil para eles terem vivido em

uma comunidade fechada e hoje serem inseridos na cidade, com outras funções. A

vila era onde eles trabalhavam, viviam, estudavam, faziam suas amizades e tinham

seu lazer. Era um mundo a parte para eles, criado pelo sistema da Noroeste o qual

viveram condicionados por anos e anos. É inegável que o espaço do Sítio

Arquitetônico da Noroeste é parte importante na formação da cidade, e que seus

funcionários contribuíram para o progresso local, o que leva ao merecido

reconhecimento como Patrimônio Histórico.

Em entrevista com um dos moradores e ex-ferroviário, que é como um porta

voz do restante, ele afirma que tem registrado ali, 135 casas tombadas e que agora

apenas 40% delas pertencem a pessoas que participaram de alguma maneira da

Ferrovia. São ex-funcionários, viúvas, filhos de pessoas que trabalharam, pessoas

que tiveram, de certa maneira, alguma ligação com o espaço, quando ainda

funcionava. O restante dos moradores, eles denominam como “particulares”. Eles se

referem dessa forma, pois, no entendimento deles, são pessoas estranhas, que

compraram sua casa no leilão, mas não participou da Ferrovia, nem do cotidiano

daquele espaço.

É bastante forte, nesses moradores, o saudosismo sobre o passado da

Ferrovia. Há uma espécie de ressentimento entre alguns dos moradores a respeito

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do processo de decadência pelo qual a Vila passou. Ver o espaço sem uso,

marginalizado, foi um impacto muito grande para eles. O Entrevistado 2 chega a

dizer:

“O povo diz que a Ferrovia tá no meio da cidade, mas é a cidade que tá no

meio da Ferrovia.” (informação verbal)10

Isso nada mais é do que um reflexo da ideia de exclusão que eles têm, após

este processo evolutivo pelo qual a cidade passou, pelo qual o Centro Antigo, em

processo de decadência há anos, hoje tenta se renovar, buscar novas funções.

O processo da privatização, e depois de tombamento do Sítio, fez com que

muitos Ferroviários se aposentassem. Mesmo não estando explícito, muitos se

sentiram sem rumo ao perder o emprego e precisaram buscar, fora daquele espaço,

uma ocupação e um auxílio financeiro. Eles não perdem a esperança de,

futuramente, surgirem novas possibilidades de emprego dentro do próprio espaço da

Ferrovia.

Segundo o Entrevistado 4:

“Projetaram um restaurante na Estação; queremos participar do processo de

seleção. Seria muito bom se pudéssemos trabalhar novamente neste espaço.”

(informação verbal)11

Os moradores querem ser inseridos nas propostas que o município venha a

oferecer dentro do Sítio. Mas a participação entre esses moradores e as tomadas de

decisões do Poder Público sobre aquele espaço, não ocorrem há um bom tempo. Ao

perguntar a eles se têm conhecimento sobre o Projeto Parque Esplanada, a maioria

não sabe do que se trata.

Segundo o Entrevistado 2:

“O projeto desse parque, nunca chegou até nós. A única coisa que estamos

sabendo é da Orla.” (informação verbal)12

10 Entrevista realizada com um dos aposentados da NOB, que ainda reside no sítio, em agosto de 2012. 11 Entrevista realizada com um descendente de funcionário da NOB que reside no sítio, em agosto de 2012.

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Quando perguntados sobre o motivo de algumas das casas não terem

passado por alguma restauração, muitos alegaram que para fazer o projeto é

oneroso e tem que passar por vários processos de aprovação, que muitos

desconhecem. Outro morador disse que na verdade a falta de diálogo entre os

órgãos públicos e os proprietários, às vezes prejudica o andamento de preservação

do espaço. De acordo com o Entrevistado 1:

“O Patrimônio e a fiscalização melhorou muito desde 2008, mas é preciso um

maior esclarecimento aos moradores sobre seus direitos. São deficientes as

informações entre o IPHAN e o morador. O morador pensa que o IPHAN é só

fiscalizador.” (informação verbal)13

Quando ele se refere ao IPHAN, fala sobre uma possível busca de

financiamento que o governo dá para a realização de restauro, e que este órgão

pode auxiliar o morador em como proceder, mas muitos nem sabem disso. Há

também a hipótese de uma parceria público-privada e talvez fosse ainda mais fácil

se os órgãos responsáveis e os moradores juntassem forças.

A vinda da Feira, a reforma da Estação, que hoje é usada para alguns

eventos culturais, feiras de artesanato e até mesmo casamentos, faz com que Sítio

gradativamente vá saindo do esquecimento e da marginalização. Sobre o espaço

atual, muitos dizem ter sido contra a instalação da Feira Central, por ela não

pertencer ao complexo. Porém, hoje, reconhecem que a vinda dela para a Estação

ajudou na manutenção local.

Segundo o Entrevistado 1:

“Agora aquela parte de mato do pátio da Ferrovia, sempre está sendo mantida

limpa; as ruas de acesso também, até o esgoto que vazava por dias, hoje recebe

auxílio imediato. Com o passeio do City Tour pela feira toda semana, eles precisam

12 Entrevista realizada com um dos aposentados da NOB, que ainda reside no sítio, em agosto de 2012. 13 Entrevista com um morador do sítio, descendente de ferroviário e aposentado da NOB, em julho de 2012.

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manter a ordem, pois acaba servindo de cartão postal para os turistas.” (informação

verbal)14

Os moradores estão sempre dispostos a permanecer naquele espaço em

favor das suas histórias e é assim que aquele local sobrevive ao tempo. Acreditam

que as melhorias feitas até o momento, divulgaram o espaço à população local e

está dando vida nova ao lugar, conclui assim o Entrevistado 3:

“Hoje a gente sente que há mais respaldo dos civis sobre o espaço da

Ferrovia.” (informação verbal)15

Uma das preocupações, entre alguns moradores é a respeito do que será

feito com a antiga Rotunda, pois o local está bem degradado, desmoronando e vive

servindo para abrigo de drogados, indigentes e criminosos. É uma obra bastante

grande e está inclusa, segundo o projeto do Parque Esplanada, dentro das

propostas de revitalização que o PLANURB tem para o Sítio. Há intenção de, a partir

de abril de 2013, a prefeitura abrir edital de licitação para a concessão da rotunda

ferroviária. O vencedor da licitação terá que investir R$ 10 milhões na restauração

do parque ferroviário e terá direito a exploração do espaço por 30 anos, podendo ser

renovável este contrato.

As entrevistas levantadas serviram para entender o que está sendo feito por

aquele local e qual a importância do mesmo em diferentes pontos de vistas. O

Centro Antigo passa por um processo de adaptação, uma vez que hoje a cidade

está muito maior e, com a chegada dos shoppings, ela se dividiu em vários centros.

A cidade se desenvolveu com a chegada da Ferrovia e no decorrer do tempo,

das ações políticas e dos interesses econômicos, as coisas mudaram. A Ferrovia foi

substituída pela rodovia e Campo Grande não podia parar, continuou em busca do

progresso. Ao fazer esse levantamento histórico, verificamos que a Ferrovia foi, por

um bom tempo, a grande atração da cidade e, com ela, toda a área central, Rua 14

de julho e arredores que se destinaram ao comércio e ao footing de domingo.

14 Entrevista com morador do sítio, descendente de ferroviário e aposentado da NOB, em julho de 2012. 15 Entrevista com morador do sítio, descendente de ferroviário da NOB, em agosto de 2012.

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A primeira rodoviária, ao ser construída nos anos de 1970, foi considerada o

primeiro shopping da cidade. Ela reunia lojas, cinemas, restaurantes, e isso

contribuiu para a queda do movimento da área central da cidade. Nos anos de 1980

chega o Shopping Marrakesh e novamente muda o fluxo de pessoas para outro

ponto comercial.Ele entrou em decadência nos anos 90, quando foi construído o

Shopping Campo Grande, que está em funcionamento até os dias atuais.

Após a chegada dos shoppings, a cidade teve uma marginalização de sua

área central. O espaço ficou sem maiores cuidados, degradado e isso incluiu o Sítio

da Ferrovia, a antiga Rodoviária, que hoje está sem uso certo. Os espaços possuem

uma vida útil dentro da cidade capitalista, ou seja, conforme mudam os interesses

econômicos, muda-se o foco. A cidade tem como renda principal a pecuária, e o

comércio tem também uma boa parcela na economia, pois apesar de possuir vários

parques, a maior parte do lazer se faz nos shoppings centers.

O crescimento da cidade continua atendendo a interesses políticos e de

especulações imobiliárias. Os zoneamentos do solo para áreas residenciais,

comerciais, industriais e mistas permanecem e com eles, a inegável existência de

“zoneamentos por classes sociais”, de forma implícita. Pode-se levar em conta

ainda, aquele mapa apresentado dos anos de 1930, pois as ocupações continuam

semelhantes, se dividirmos a cidade em um eixo cartesiano norte, sul, leste e oeste.

Há ainda irregularidades nas ocupações de áreas de mata ciliar e o alto índice de

impermeabilização do solo, tem contribuído para alagamentos.

A partir de 1996, devido a um movimento feito por moradores, vereadores,

estudiosos locais, foi levado até o prefeito da época, Juvêncio Cesar da Fonseca, o

pedido para tombamento do sítio da Ferrovia. O movimento teve resultado e a partir

de então o sítio foi considerado patrimônio do município. No ano seguinte o sítio

consegue o aval para tombamento estadual e durante muitos anos ficou a espera do

tombamento federal, que só veio a acontecer no ano 2000.

O sítio da EFNOB em Campo Grande tem 135 edifícios em alvenaria e

madeira e uma área total de 22,3 hectares. Entre os imóveis encontramos as casas

dos operários, dos funcionários intermediários e dos graduados, as oficinas, os

escritórios, uma escola, a caixa d’água e a estação, construída a partir de 1914 e

que sofreu ampliações nos anos de 1924 e 1930. A estação tinha áreas para bar,

bilheteria, administração de cargas, apoio, depósito, serviços e médicos.

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Figura 17 - Campo Grande: vista aérea de toda a extensão do Sítio da Estrada de

Ferro Noroeste do Brasil e suas principais setorizações. Fonte: Arruda, arquivo

pessoal do autor, 2005.

Em 2006, a primeira iniciativa efetiva de restauração, que veio do Ministério

do Turismo, que participou com R$500 mil reais e que o FUNDAC (Fundação

Municipal da Cultura) acompanhou, foi o restauro de dois imóveis. Um deles a antiga

casa do chefe da estação, que faz parte da Esplanada Ferroviária, na esquina da

Avenida Mato Grosso com a Avenida Calógeras. Hoje estão instalados nestes

imóveis o Gabinete do Prefeito e o Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso

do Sul.

Em 2011 foi entregue revitalizado o antigo armazém, que agora é chamado

de Armazém Cultural. Isso se deu através de uma iniciativa do PLANURB junto ao

IPHAN e com o apoio da União através do PAC (pacote de aceleração do

crescimento) das cidades históricas, que participou com R$ 2,6 milhões de reais

somados aos recursos de participação do governo e da prefeitura, chegando ao

valor de R$ 101 milhões de reais, no ano de 2010.

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Figura 18 - Campo Grande: Estação Ferroviária transformada em Armazém Cultural

após sua revitalização.Fonte: CG Notícias, 2011.

Segundo jornal eletrônico da própria prefeitura de Campo Grande (2010, p. 1),

A inserção de Campo Grande acontece devido ao PAC das Cidades Históricas, pelo tombamento do complexo ferroviário, no âmbito federal, por meio do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. As intervenções começam no prédio da Estação e incluem ainda reestruturações no Armazém Cultural, nos galpões de manutenção dos trens, na rotunda da ferroviária e em outros prédios do complexo.

O restauro das casas principais e do Armazém Cultural, já fez uma grande

diferença no espaço do sítio. A iluminação, a limpeza dos prédios e os novos usos

vão afastando gradativamente o espaço do esquecimento e da marginalização em

que se encontrava. Porém, ainda se encontram várias casas na Vila que precisam

de reformas, algumas até suportadas por escoras. Os forros e madeiramento de

telhados precisam de atenção, pois estão desmontando. Mas muitos moradores

desconhecem as normas para restauro, outros não possuem renda para fazer o

investimento e uma grande parte desconhece as possibilidades de financiamento

que podem ser feitos para realizar este processo de restauro.

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Figura 19 - Campo Grande: Primeira casa de alvenaria construída para o Chefe da

Estação; está em processo de recuperação e fica no espaço da Orla Ferroviária.

Fonte: Campo Grande News. Disponível em:

<http://www.campograndenews.com.br/lado-b/arquitetura/primeira-casa-de-

alvenaria-da-vila-dos-ferroviarios-vai-passar-por-reforma> Acesso em: setembro de

2012.

A parte da Ferrovia que se encontra restaurada pertence ao município e

utilizou de financiamento público para isso. As outras casas foram compradas por

pessoas particulares durante o leilão e cabe a eles buscar recursos para fazer a

restauração de seu bem. Ao dialogar com os moradores podemos notar que existe

um desconhecimento dos direitos e auxílios que o governo pode dar a proprietários

de patrimônios históricos. É necessária uma maior interação entre o IPHAN, o

PLANURB e os moradores da Vila Ferroviária.

O Sítio da Ferrovia foi incluído no programa Reviva Centro, que é responsável

pela revitalização do centro da cidade e outras áreas, como o Museu José Antônio

Pereira, a Comunidade Quilombola Tia Eva, a Escola Estadual Maria Constança de

Barros Machado, entre outros. Dentro da proposta realizada pelo PLANURB, a área

da Esplanada Ferroviária se tornaria uma área de Lazer Cultural, com uma parte

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reservada para um museu, que conte a história e exponha antigos objetos da

ferrovia e, ao longo de todo o espaço do Sítio, parques, praças, áreas de esporte e

de cultura para a população da região, que é carente desse tipo de lazer.

Figura 20 - Projeto Parque Esplanada: zoneamento das propostas de reutilização do

espaço do Sítio Arquitetônico da NOB.Fonte: PLANURB, 2010.

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Figura 21 - Campo Grande: Croqui do Parque Esplanada e suas propostas para

novo uso do espaço.Fonte: PLANURB, 2010.

O Parque Esplanada, que aqui está brevemente exposto, é um projeto que

passou por algumas etapas de criação. O projeto mencionado foi definido pelo

PLANURB em conjunto com a Prefeitura Municipal de Campo Grande. A data da

discussão dessa proposta é de dezembro de 2010 e nela está explicitada a

importância da participação maciça dos moradores do Sítio para que, além de

discutir essa refuncionalização, seja possível, em conjunto, moradores e município,

encontrarem incentivos financeiros, recursos, que possibilitem também a

recuperação das casas do entorno da Esplanada Ferroviária.

Segundo entrevista cedida por um dos dirigentes do Planejamento Urbano, o

Parque Esplanada faz parte de um plano diretor de uso e ocupação do solo. Será

uma área de uso coletivo, dando ao centro uma área de lazer, cultura e

contemplação. Cita a carência que o centro tem em áreas de lazer para seus

moradores e acredita que este projeto venha a atender os residentes, não só da Vila

Ferroviária, mas também de uma parcela das pessoas da área central.

O Dirigente explica que dentro desta verba cedida pelo PAC – Cidades

Históricas foram efetuadas as obras da Orla Ferroviária e o Projeto do Parque

Esplanada, o que se pode confirmar em suas palavras:

“A verba cedida pelo PAC, atendeu várias intervenções feitas na área central

da cidade. São 94 ações de reconversão de uso e ao longo do trilho temos a Orla

Morena 1 e 2, uma parte do centro e outra fora da zona de interesse cultural. O que

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foi feito até o momento, relacionado a Ferrovia, e que está incluso nesta verba, foi o

Projeto do Parque Esplanada e a obra da Orla Ferroviária que deverá ser entregue

até fim de 2012.” (informação verbal)16

Ao questionar sobre a possível execução do Projeto do Parque, o dirigente

disse que, por se tratar apenas de um projeto, fica a cargo dos próximos

governantes a decisão de executar o projeto como foi proposto e buscar o

financiamento para a execução do mesmo ou se realiza um novo projeto para daí

então buscar o financiamento.

Ainda no PLANURB, foi possível ter acesso ao procedimento pelo qual deve

passar qualquer reforma a ser feita nas casas que estão inclusas como patrimônio

no Sítio. Assim um dos dirigentes do IPHAN explica:

“O proprietário interessado em fazer qualquer intervenção ou restauração,

deverá procurar um arquiteto para que este execute um levantamento da área e um

projeto que atenda as normas de Patrimônio Histórico. Com o projeto em mãos,

deve-se procurar a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento

Urbano – SEMADUR. Após a aprovação, este pedido vai para o PLANURB, que

dará ou não o aval da obra e este, passa ao Instituto do Patrimônio Histórico e

Artístico Nacional – IPHAN, para que este tenha conhecimento do projeto e

acompanhe toda a obra durante sua execução.” (informação verbal)17

Dentre as propostas do projeto para o Parque Esplanada, há o projeto para a

busca do reconhecimento do Patrimônio Imaterial. O intuito é fazer um levantamento

da história e dos costumes através da memória dos Ferroviários que ainda vivem na

Vila. Mas, por estar incluso no projeto, ainda não é possível afirmar que isso venha a

se concretizar.

O objetivo desta obra, segundo o PLANURB, que é quem realizou a proposta

de intervenção é de “Elevar os níveis da qualidade de vida social, cultural,

urbanística e ambiental da área central, tanto para moradores e usuários daquela

região, quanto para os visitantes e turistas que passam pela cidade.” (Plano

Urbanístico de Uso e Ocupação da Esplanada Ferroviária - 2010).

16 Entrevista realizada com um dos dirigentes do IPHAN em agosto de 2012. 17 Entrevista realizada com um dos dirigentes do IPHAN em agosto de 2012.

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A restauração do bem tombado deve ser de interesse coletivo, a sociedade

precisa entender o que está acontecendo com sua história. Momentaneamente este

projeto não está em execução.O que se espera é que o próximo governo, que

assumirá o cargo no ano de 2013, possa dar continuidade. Por muito tempo o Sítio

sofreu com a ação do tempo e da degradação humana, lentamente tem sido inserido

no cotidiano da cidade, começando pela instalação da Feira Central.

Ainda assim há uma constante preocupação com a circulação de marginais e

o abandono principalmente na parte norte do sítio, onde se encontra a rotunda. O

espaço inútil acaba dando espaço a desocupados, marginais e pontos de droga.

Essa sistemática vem se desfazendo, mas ainda atormenta boa parte dos

moradores locais.

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional foi criado no governo

de Getúlio Vargas em janeiro de 1937 pela Lei n°378. Divide o Patrimônio em duas

categorias principais: o Patrimônio Material e o Patrimônio Imaterial.

O Patrimônio Material é composto por um conjunto de bens culturais,

classificados segundo sua natureza, dentre um dos quatro Livros do Tombo. Eles se

dividem em etnográficos, arqueológicos, paisagísticos e históricos, dentre eles ainda

temos os bens imóveis que envolvem os núcleos urbanos, como o Sítio da Ferrovia

e sítios arqueológicos ou paisagísticos. Tem também os bens individuais móveis,

que são as coleções, bibliografias e etc.

O Patrimônio Imaterial é transmitido de geração para geração. É composto

pelos costumes, expressões e técnicas associadas à cultura de um povo. A

valorização desse patrimônio promove o respeito à diversidade de culturas e a

criatividade humana.

O Tombamento é um procedimento administrativo que registra aquele bem a

um Livro de Tombo, próprio, dentro das três instâncias, municipal, estadual e

federal. Após a avaliação e o levantamento da importância daquele patrimônio

dentro da história de uma comunidade e avaliação dos órgãos competentes, é feito o

tombamento. Uma vez determinado Patrimônio Histórico, seja esse bem público ou

privado, qualquer alteração a ser feita no mesmo deverá passar por diversos

processos administrativos para que seja avaliada a possibilidade de execução ou

não.

No caso do Sítio da Ferrovia Noroeste do Brasil, todas aquelas casas que

foram a leilão após a privatização da Ferrovia, são patrimônio histórico material,

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mesmo pertencendo a pessoas civis em sua maioria, apenas uma das casas é da

União. Independente de quem seja o proprietário, ele terá responsabilidade de zelar

por aquela propriedade. E qualquer mudança a ser feita no corpo daquele patrimônio

passará por várias instâncias:a primeiramente é levar a proposta para o SEMADUR,

depois PLANURB e então IPHAN. É necessário que todos eles autorizem qualquer

que seja a alteração ou restauração a ser feita no bem, já que agora é um bem de

interesse público.

O bem não deve ser descaracterizado, isso corresponde a intervenções

inadequadas a obra em questão. A obra tombada pertence a um período

arquitetônico e tem de ser restaurada de forma que condiza com suas

características reais. Demolições, mutilações ou acréscimos sem consulta aos

órgãos competentes é considerado ato de infração e os proprietários que o fizerem

sem autorização poderão pagar multas sobre o feito.

O Sítio da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil está como Patrimônio

Histórico e o IPHAN determinou que todas aquelas propriedades devem ser

mantidas da mesma forma que estavam antes do período de 2009. Por tanto

qualquer alteração a ser feita, deve ser antes comunicada as autoridades já citadas

acima. Em entrevista ao Campo Grande News, o Superintendente do IPHAN

comenta:

“O IPHAN recebe cerca de 5 solicitações por semana de reformas em

imóveis, todas são avaliadas, mas não se pode informar quantas são aprovadas, já

que muitas recebem alvará parcial do projeto.”(CG NEWS, 2012)

O superintendente esclareceu que o tombamento é do Complexo, por isso o

que mais importa é o visual conjunto do local, para que algum visitante, passeando

pela área, possa visualizar as características da época em que foi construída a

ferrovia. Sendo assim, modificações na parte interna dos prédios serão permitidas,

desde que não alterem a estrutura do imóvel.

As casas da área tombada são isentas do IPTU e o morador também pode

deduzir do Imposto de Renda, parte do que gastar em reformas na casa. O IPHAN

também informou que estão sendo criadas linhas de crédito específicas para os

proprietários. Mas todos os benefícios exigem a contrapartida do morador em

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manter o imóvel em plenas condições de uso e sem descaracterizar o projeto

original.

Segundo o Superintendente (CG NEWS, 2012):

“É obrigação do proprietário, cuidar do imóvel, não deixar que ele fique

tomado de cupim ou outro tipo de abandono”.

Muitos governantes desse município planejaram soluções para aquele

espaço, centros de gastronomia, museu, centro cultural, reutilização dos trilhos para

trem de superfície, mas nada efetivamente foi definido. O restauro da Estação, do

Armazém e das duas Casas de Chefia, foram bastante significativos, o espaço

precisa de cuidados construtivos, de restauração e manutenção.

Ao comparar a situação patrimonial do Sítio da NOB de Campo Grande com o

Sítio da NOB de Bauru, se verificou que a manutenção dos prédios está bastante

parecida. Por serem projetos construídos na mesma época, com estilos e até

mesmo plantas semelhantes, fica muito mais fácil realizar um comparativo. As

construções do Sítio em Campo Grande, apesar de precisar de manutenção,

conseguem se manter com poucas alterações de projeto. Já o de Bauru sofreu

várias descaracterizações de projeto.

Outro fator de suma importância é que dentro das áreas de tombo, há

também uma área de tombo de influência. Essa área percorre o entorno de todo o

patrimônio tombado, evitando que seja construído naquele perímetro objetos que

Figura 22 - Bauru: Casa do Engenheiro Chefe já restaurada e com esquadrias e toldos que não pertencem ao projeto original. Fonte: Salcedo, 2004 Figura 23 - Campo Grande: Casa do Engenheiro

Chefe já restaurada, esquadrias originais.Fonte: Google earth, 2012.

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obstruam ou reduzam a visibilidade do bem tombado, preservando a ambiência do

espaço. Cabe ao IPHAN fiscalizar esses tipos de eventos e avaliar se é ou não

prejudicial a instalação de novos elementos naquele entorno.

Durante a pesquisa de campo, ao dialogar com os moradores que

trabalharam na ferrovia, ficou muito evidente a existência de um patrimônio imaterial

naquele espaço, pois os ferroviários criaram seus próprios costumes, hábitos,

vocabulários, que com o fim da ferrovia, talvez não passem de geração para

geração e desapareçam com o passar do tempo.

Segundo Greco (2011, p. 17), os costumes e a organização social

diferenciava os ferroviários do restante da cidade, em seu hábitos e até mesmo no

linguajar, a saber:

[...] pois se compõe de um território delimitado, com cultura própria, incluindo particularidades na linguagem coloquial: termos, palavras que são usadas na vida diária, distinguindo esta comunidade ferroviária dos demais habitantes da cidade. Faz parte da cultura ferroviária.

Sem sombra de dúvidas os ferroviários fizeram parte da história e é

imprescindível que este patrimônio faça parte da memória de todos os Campo

Grandenses, para que permaneça vivo também no espaço urbano. Não existe a

possibilidade de retrocesso, uma vez que a evolução e a rapidez com que as coisas

acontecem no mundo moderno, não nos guia para a volta do funcionamento da

Ferrovia. É preciso entender a história e valorizar o patrimônio, dando a ele vida

Figura 25 - Bauru: Casa de Pouso dos dirigentes que passavam pela cidade, alterações no gradil.Fonte: Salcedo, 2004.

Figura 24 – Campo Grande: Casa de Pouso dos dirigentes que passavam pela cidade, esquadrias e portão ainda de madeiras.Fonte: Google earth, 2012.

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nova, sem descaracterizá-lo. Para isso é necessário que a população local se

conscientize, busque a melhoria e valorização de seu bem e os descendentes

efetivos dessa ferrovia, também se adaptem a uma nova realidade sem perder sua

memória e suas raizes.

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CONCLUSÃO

A cidade moderna é fruto do capital que, após a Revolução Industrial, atraiu

grande fluxo de pessoas. Esse crescimento alterou a maneira de entender a urbes.

O urbanismo não pode mais se preocupar só com o belo, precisa entender as

transformações na estrutura social, econômica e humana.

Com o crescimento das cidades, surgem novas áreas nobres e serviços,

avenidas, parques, condomínios. As áreas degradadas que tomam tanto áreas de

ocupação irregular quanto imóveis abandonados, muitas vezes ficam sem atenção.

Os investimentos privados e públicos, estão sempre ligados a interesses para o

progresso e esquece do que já existe. Para que gere algo nesse sentido é

importantissima a participação da população local e a organização de um processo

de recuperação dessas áreas.

O Sítio Arquitetônico da NOB se tornou Patrimônio Municipal assim que foi

privatizado e esta reinvindicação partiu da união de moradores e simpatizantes da

causa. Se este fato não houvesse ocorrido de imediato, como foi em 1996, talvez ele

teria sido completamente demolido para atender a interesses privados. As leis que

regem o patrimônio nacional são claras e guardam aquele espaço como bem da

sociedade. Hoje está estabelecido como Patrimônio Histórico nas três esferas, ou

seja, nas esferas Municipal, Estadual e Federal. E é de responsabilidade do IPHAN

realizar fiscalizações periódicas ao espaço e propostas de restauro, em conjunto

com os órgãos competentes de planejamento urbano do município, para manter o

patrimônio vivo.

A partir do incentivo financeiro do Programa de Aceleramento do Crescimento

das Cidades Históricas do Governo Federal (PAC), em conjunto com o Instituto do

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e a Prefeitura Municipal de Campo

Grande, se deu início à obra de restauração do prédio da Antiga Estação Ferroviária

em 2010. Em 2011 passou a se chamar Armazém Cultural.

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Inclui ainda reestruturações nos galpões de manutenção dos trens, na

rotunda e em outros prédios do complexo. O projeto para o Sítio Arquitetônico da

NOB é chamado de Parque Esplanada, um projeto proposto em 2010 pelo

PLANURB que visa integrar o Patrimônio Histórico à vida cotidiana da cidade.

O projeto contempla ações para cultura, parques e área verde, gastronomia

(Feira Central), Casa da Memória da Ferrovia e passeio cultural sobre trilhos ao

longo do Parque, além de espaços para exposições periódicas, eventos e

atendimento ao turista. Todas as ações partem do princípio da valorização cultural

local, diversão e interação do visitante com o espaço.

Ao redor do projeto para o Parque Esplanada haverá o projeto Orla

Ferroviária, composto por um calçadão em toda a extensão por onde passavam os

antigos trilhos e as casas dos ferroviários, que fazem parte do patrimônio. A maioria

data de 1935. É um dos expoentes da arquitetura de um período áureo de Campo

Grande. Toda a área central, que foi construída simultaneamente com a ferrovia,

está participando desse projeto e pertence ao programa criado pela prefeitura

chamado Viva Centro.

O investimento naquela área traz boa visibilidade à cultura local e cria

atrativos econômicos ligados ao turismo. Espera-se que haja real investimento e que

o projeto proposto seja concretizado, pois a cultura e a sociedade só têm a ganhar

quando investem em sua história.

Quando uma obra arquitetônica deixa de servir para o uso do homem, ela

perde a sua principal razão de ser e vai sendo consumida pelo tempo. As paredes,

que antes tremiam ao silvo das locomotivas, não escutam mais nada além de um

murmurinho de buzinas ao longe; estão à espera de novas histórias. O espaço, ao

ser sentido, conta para que veio, sem precisar falar uma palavra. Isso acontece

quando pisamos nos paralelepípedos daquelas ruas, quando avistamos aquelas

casas.

A importância de criar uma consciência ambiental nas próximas gerações, de

educar o cidadão para uma sociedade de valores, de história e não imediatista,

muda o conceito social. É sabido que o processo é lento, mas é preciso dar início e

pode partir da própria população, alianças com iniciativas privadas, dependendo

assim de uma sociedade civil organizada.

As políticas públicas para o desenvolvimento da cidade deveriam ser

discutidas e trabalhadas nas questões sociais, ambientais e urbanísticas. Todas as

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mazelas dentro do espaço urbano, em grande parte, são consequência de ações

inadequadas, mal resolvidas. Isso se refere tanto aos vazios urbanos, periferias e

favelas, segregações sociais quanto o mau uso do solo e degradação do meio

ambiente. Para que haja o equilíbrio dos espaços, é preciso pensar o ambiente em

toda sua amplitude, tenha sido ele construído pelo homem ou não.

O Sítio Arquitetônico da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil é um ambiente

histórico, bem da sociedade e deve ser mantido. Dar a ele novo uso, de forma a

incentivar a cultura local e o turismo, o torna participativo dentro da economia da

cidade. A restauração da Estação e a instalação da Feira Central foram fortes ações

para tirar aquele espaço da marginalidade em que se encontrava, e aindapode

melhorar.

A participação da sociedade na evolução do espaço urbano, grande parte das

vezes é apenas uma intenção. A busca por uma cidade melhor, organizada e

saudável é um processo árduo,deve fazer parte de uma política de formação da

cidadania e partir da sociedade local. Deve gerar discussões, pesquisa e

planejamento continuo, isso pode ser aplicadotanto nos projetos do Sítio

Arquitetônico da NOB, numa visão micro, como na cidade em uma visão macro.

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ANEXO 1

ROTEIRO – ENTREVISTA

PARECER SOBRE O SÍTIO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO BRASIL E A EXPANSÃO DA CIDADE DE CAMPO GRANDE.

Número _____________________

Técnico - PLANURB - Instituto Municipal de Planejamento Urbano

1. O que está sendo feito pelo Sítio da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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ANEXO 2

ROTEIRO - ENTREVISTA

PARECER SOBRE O SÍTIO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO BRASIL E

A EXPANSÃO DA CIDADE DE CAMPO GRANDE.

Número _____________________

Técnico - IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

1. O que está sendo feito pelo Sítio da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil ?

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

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ANEXO 3

ROTEIRO – ENTREVISTA

PARECER SOBRE O SÍTIO DA ESTRADA DE FERRO NOROESTE DO BRASIL E

A EXPANSÃO DA CIDADE DE CAMPO GRANDE.

Número _____________________

Funcionário que prestou serviço à Noroeste do Brasil ou descendente do

mesmo que reside no sítio.

1. Qual a sua ligação com a ferrovia?

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

2. Como veio residir nesse espaço?

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

3. Qual seu parecer sobre o sítio?

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

_____________________________________________________________