AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui...

30
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ Centro de Letras e Artes – CLA Faculdade de Letras Departamento de Lingüística e Filologia Programa de Estudos sobre o Uso da Língua - PEUL Banco de Dados do PEUL/UFRJ AMOSTRA DE INDIVÍDUOS RECONTACTADOS/2000 Falante: 06 Jup Sexo: feminino Idade: 36 Escolaridade: Fundamental 2 incompleto Bairro: - Profissão: - Ano da entrevista: 1999 E: (ruído) Oi, [Jupira]. Como vai? F: [Oi] tudo bem, e você? E: Tudo bem graças a Deus. O que que você tem feito desde o dia em que eu estive na sua casa? F: Nada, a mesma coisa de sempre, saio, quase num saio, né? Como falei, fico mais em casa, agora com o meu netinho, minha filha, e só, pelo que eu lembrei (inint). E: E a chuva? F: É, a chuva deixa com medo, né? Tenho medo da chuva, sabia? (falando rindo) Da água, ela é muito bom, né? E: Tá com frio, muito frio? F: Não, até que eu num tô sentindo muito fri:o, tô estranhano até o inverno, que não tá muito fri:o. E: Era pra tá mais frio ainda? F: É, é a previsão, né? Era pra tá bem mais frio. E: E lá que você falô que chegô aqui comentando a respeito do seu marido. Que que houve, me conta um pouquinho? F: Porque ele nu:m, ele comprô material, né? Fez um sacrifício, comprô material e agora tá com pregui:ça de carregá o material, aí fica o material todo estragando e ele não carrega, fica mais aqui em baixo na rua, aí eu me

Transcript of AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui...

Page 1: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJCentro de Letras e Artes – CLAFaculdade de LetrasDepartamento de Lingüística e FilologiaPrograma de Estudos sobre o Uso da Língua - PEULBanco de Dados do PEUL/UFRJAMOSTRA DE INDIVÍDUOS RECONTACTADOS/2000

Falante: 06 JupSexo: femininoIdade: 36Escolaridade: Fundamental 2 incompletoBairro: -Profissão: -Ano da entrevista: 1999

E: (ruído) Oi, [Jupira]. Como vai?F: [Oi] tudo bem, e você?E: Tudo bem graças a Deus. O que que você tem feito desde o dia em que eu estive na sua casa?F: Nada, a mesma coisa de sempre, saio, quase num saio, né? Como falei, fico mais em casa, agora com o meu netinho, minha filha, e só, pelo que eu lembrei (inint).E: E a chuva?F: É, a chuva deixa com medo, né? Tenho medo da chuva, sabia? (falando rindo) Da água, ela é muito bom, né?E: Tá com frio, muito frio?F: Não, até que eu num tô sentindo muito fri:o, tô estranhano até o inverno, que não tá muito fri:o.E: Era pra tá mais frio ainda?F: É, é a previsão, né? Era pra tá bem mais frio.E: E lá que você falô que chegô aqui comentando a respeito do seu marido. Que que houve, me conta um pouquinho?F: Porque ele nu:m, ele comprô material, né? Fez um sacrifício, comprô material e agora tá com pregui:ça de carregá o material, aí fica o material todo estragando e ele não carrega, fica mais aqui em baixo na rua, aí eu me aborreci com ele, tô meia de mal, meio criancinha.E: E ele como é que ele [reage], fica puxando seu saco, como é que é?F: [Ele] é realmente fica puxando meu saco, mas aí eu não dou nem confiança não, pra, sabe? Senão ele vai ficá abusado. Aí me deu uma colcha, um edredom no sábado, só pra falá comigo, mas [eu não falo], é, me deu um ededrom. OITENTA reais, comprô no rapaz, só pra eu voltá a falá com ele, mas eu não falo, tamos mesmo de < ma...>, tamos de mal mesmo.E: [É mesmo?] Mas aceitou o edredom?F: Aceitei, né? (fala rindo)E: O edredom tá em casa.

Page 2: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

F: O edredom tá em casa. (risos)E: Ah, entendi. (pausa) E as crianças como é que elas reagem quando vêem você sem falá com o Joel?F: Ó, elas ficam tristes, porque elas gostam muito dele né? Puxa saco... mas elas diz: “ah, fala com ele, ele é bonzinho.” Eu sei que ele é bonzinho, mas se eu fizé corpo mole, ele já é lá mole, se eu não falá nada, vai estragá o material. Dinheiro dele mesmo, né? Aí fica lá descendo a areia, ainda mais com essa chuva, a areia, (inint) só comprô três metros, pena que um metro... chuvendo direto, a chuva tá levano a areia todinha. Aí eles fica triste, fala: “ah mãe, fala com ele.” Ah, que a filha dele tá comigo de novo, né?E: A filha dele tá lá com você?F: Tá: “ah, Jupira, fala com ele, tadinho, olha como é que ele fica. Chegano em casa agora cedo.” Falei, quando ele chegá fala com ele pra pegá a areia que tá ali estragano, aí ele não vem, aí eu fico de mal, quando ele começá a carregá a areia eu volto a falá com ele.E: E o... como é que foi o negócio do telefone? Que ele falou que você, quando eu liguei, que era pra você atendê o telefone?F: “Mas, mas de lá ela vai ligá pra você, fica esperano. Olha só, eu já falei com você que é a Jaqueline.” “Eu sei que é a Jaqueline, eu conheço a Jaqueline, eu tenho o telefone da Jaqueline.” “Não ela falô pra você ligá pra ela com urgência.” Mas aí o telefone tava sem linha e eu não liguei, liguei no sábado de manhã, mas aí não atendeu, não liguei mais. Aí ontem ele chegô: “você vai esperá? Ela vai ligá pra você daqui.” (inint) Aí deixô o telefone ligado lá e perto de mim no sofá. Aí: “ela vai ligá, fica esperano.” Aí de repente você ligô, aí ele atendeu o telefone, todo metido, que agora (inint) o telefone nunca viu. “Tá veno, olha só. Não falei que é ela, olha só, vai lá atendê. Ela que tá ligano pra você.” Aí eu não peguei o telefone não, aí: “pega aí Liana, dá pra ela.” Aí ele pegou e falou assim: “tá veno, pensano que é alguma mulher?” “Se fosse mulhé, você não me daria o telefone. Eu sei que é a Jaqueline, eu conheço a Jaqueline (risos e). Jaqueline esteve aqui em casa, eu conheço a Jaqueline.” “Ah, mas tá pensano que é alguma mulher.” “Ah, meu Deus do céu. Então tá, (inint) pensano que a Jaqueline é uma e a mulher sua.” Pra se vê, né? [nem]... nem imaginei isso. Quando ele falô Jaqueline [já até sabia que era você]. Quando eu vi o tefone, eu falei “é a Jaqueline.” A Rarissa: “é, é a tia Jaqueline?” Aí eu falei: “é a tia Jaqueline.” Aí ele: “até a Rarissa conhece, só eu que não conheço.” Aí eu falei: “criatura, quando você não chegou lá em casa de noite, não tava a Jaqueline e o namorado dela?” Aí ele: “ah, é aquela moça?” Aí eu falei: “não, é outra. Deve ser outra (inint), nós dois deve tá enganado. É uma Jaqueline pra você e uma pra mim, né?” Aí ele: “ah tá, tá legal você é muito ciumenta, não sei o quê.” Não é por causa de ciúme, é por causa do material que está estragano e ele tá pensando que alguém me falou alguma coisa <o ...>, só o material que tá estragano mesmo que eu tô... aborrecida com dele. Depois eu vou falá com ele, quando ele começá a carregá, aí eu fico de bem [com ele]. É.E: [cê já sabia?] [aí fica de bem?] E lá como é que é o lugar que ele freqüenta lá, que você falou que quando ele sai de casa ele...?F: Ele vai trabalhá. Chega cedinho, no máximo treze, quatorze hora ele já tá por aqui na rua. Ele se enfia ali naquele barzinho, um tal de Leal, que tem ali, (est) ele só chega em casa cinco, seis e meia da tarde. Isso é todo dia, porque no trabalho dele, (inint) ele vai lá, faz um serviço de uma hora, uma hora e meia e já tá na rua (est). Então ele fica ali, aí tá me aborrecendo muito dele ficá ali, que aí chega ali, ele bebe. Que ele não é de bebê todo dia, [num]... não é que chega bêbado em casa, mas bebe que eu sinto cheiro

Page 3: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

de bebida. Então, tá me aborrecendo, eu tô falano com ele: “sai daquele bar, sai daquele bar” e ele tá teimano, aí eu não falo mais com ele, quando ele “liberá”, pará de ficá em bar, porque ele não ficava, assim, no bar direto, todo dia parado no bar, só parava mesmo na sexta-feira, sábado ia fazê compra comprava uma cerveja ficava em casa, agora não. (inint) Chega em casa nove, dez horas da noite, direto ali. Chega ali uma, duas horas, fica direto.E: Mas aí, quando ele chega em casa, como é que é? Ele chega tranqüilo, [deita]?F: [Chega] Chega, toma banho e cama, num janta, num faz nada. Chega, toma banho e cama.E: Mas não chega a falá nada com você? Ou fala?F: Não, negócio de discuti não. A gente não discute não, ele é muito... eu que discuto que eu sou mais nervozinha, né? Mas ele é tranqüilo, ele num fala ... se eu começá a falá, ele abaixa a cabeça, vai dormi ou então liga a televisão, aí me irrita mais ainda, que eu tô falano, ele tá vendo televisão.E: Ignora?F: Ignora, me ignora, <quan...> se eu começá a fala, ele me ignora, discuti que eu abro a minha boca, eu não fecho mais, ele ignora. Aí ele liga a televisão, fica quietinho, aí eu me irrita, eu vô lá desligo a televisão, mas ele não fala nada.E: Não? Aí as crianças comentam alguma coisa?F: Não, mas eu não discuto com ele assim. Quando eu quero falá eu mando elas irem na casa da irmã:, que eu não gosto de ficá falano na frente delas não, porque eu já briguei tanto com os pai, né? Então num discuto. (inint) Da Suelen e a da Rarissa, a outra fica aqui em casa, mas é difícil. [Vai]... vai pra casa da mãe, fica uma semana ali, uma semana aqui com a mãe. Eu num discuto na frente dela não, porque é só eu que falo mesmo, que ele não fala nada.E: Fica só você.F: É (riso F). (est) Aí tu passo por ruim.E: Entendi. Você disse que se casou, né? E que ficô casada durante oito anos, né?F: Com o Bras. Foi nove.E: Com o Bras. Foram nove anos, né?F: Foi. Nove anos. E: Ah, tá. E você acha que as experiências que você teve com Bras (inint) pelo que você tá me contando, né? A respeito de... que vocês hoje, você não discute com ele porque você antigamente discutia muito com Bras, você acha que acrescentou alguma coisa na sua vida com esse relacionamento que você [teve com Bras?] O que que você acha que você assim mudô, né? Agora com Joel mas, alguma coisa que você hoje num faça com Joel, mas que você fazia com Bras, né? No caso dessa discussão que você falô: “não eu não discuto com ele na frente das crianças porque as crianças me viam discutindo muito tempo [com] com o pai. Aí como é que você pensô, como é que você tomô essa decisâo de mudá agora com Joel?F: [Ah, com certeza]. [Com o pai]. Ah, porque eu vi que (inint) valeu a pena, tudo que eu fiz, brigá, discutí na frente delas. Eu acabei causano pobrema na minha filha, que a Suelen me deu muito pobrema, né? Depois tive que ficá psicólogo um bom tempo com ela, a Cynthia também, mesmo que a Cynthia é calminha, ela não falava mais, eu sentia que ela ficava triste quando eu começava a discuti na frente do pai. Então, agora eu penso, quando eu quero falá alguma coisa mais dura com Dau, (falando rindo) eu chamo ele de Dau.E: Como é o nome dele?

Page 4: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

F: É Joel, mas eu chamo ele de Dau.E: Dau?F: É Dau.E: Dau.F: É Dau.E: Mas por quê?F: Não sei, todo mundo chama Dau, Dau, Dau, eu também chamo de Dau. Aí eu num agora eu penso, quando eu vô falá alguma coisa, (inint) “Suele, leva a Rarissa lá pra casa da Cynthia.” “Ah, já sei mãe você vai falá, né mãe?“ “Vai na Cynthia, leva a Rarissa na Cynthia e tal”, pra num (ininit) porque eu botei um trauma terrível nisso aí, isso aí é de apavorá, quando ela via o pai dela chegando, “ai mãe, vamu pra casa de alguém”. Tinha que saí de dentro de casa com ela apavorada. Agora não, a Rarissa, o pai dela é... o pai pega no colo e brinca e tal, mas eu num boto medo. “Ah, porque seu pai”, o Bras chegava bêbado. “Seu pai vai chegá bêbado, vamô sai de casa”. Agora com Dau não, Dau não tem esse probrema de bebê, de discussão. O Bras chegava um dia quebrando as coisas. O Dau nunca briguei assim de chegá ao ponto de ter que agredi. Eu que falo. Lá em casa, eu que falo mesmo, já até me deram o nome de mulhé macho lá em cima porque eu que falo mesmo. Se tivé no meio de um monte de amigo, eu “Dau, dá pra vim aqui?” (inint) “Ah, já vô”, essas coisa. Eu que sou a folgada ali. Ele não. Ele é um cara tranqüilo mesmo (est).E: E com o outro não.F: Ah, com o outro. Mas eu tinha medo do outro. Engraçado. Num sei porque com Dau eu não tenho medo não, mas com Bras eu tinha medo, eu nem falava, ele que ia pra toda e qualquer direção. E por causa disso, eu aprendi muito, então agora eu falo, né? Eu já comecei falano. Logo assim que eu comecei com Dau, eu já queria logo direto, aí ele ficava me olhano, aí com o Bras eu já num falava, ele chegava, eu sentava no... reprendida começava a chorá. Ou então jogava alguma coisa nele, ele tacava fora. Mas com o Dau quem fala sou eu mesma, o Dau nunca nem, nunca fez assim (est) porque eu já falei com ele: “o dia que você tentá levantá a mão pra mim acabô, nem tenta, que se você tentá... nem pensa ... porque primeiro que eu vou dá um prejuízo porque Deus me livre e guarde (inint) sabe? (est) Mas ele nunca chegô ao ponto, nem de grita, de falá absurdos como o Bras falava (est). Porque o Bras, além de tê boca suja, porque falava muita coisa horrível, ele era agressivo, chegava jogava as coisa, comida, essas coisa. Mas o Dau não tem esse probrema não.E: Ele já é tranqüilo, né?F: Ele é, ele é tão tranqüilo que me irrita com a tranqüilidade dele porque ele é uma pessoa muito tranqüila. Ele é tão tranqüilo que o material que tá lá estragano, o dinheiro dele, e ele com essa moleza, num tá nem aí: “ah, se estraga, eu compro outro”. Num é assim. Já é difícil de comprá, foi difícil de comprá aquele, vai deixá estragá, com o dinheiro que vai comprá outro, compra outras coisa. Mas ele é muito tranqüilo, é muito: calmo até demais pro meu gosto, sabe? Eu sou mais agitada do que ele, aí eu me irrito com isso. Aí tamô de mau, (inint) só quando ele começá a carregá o material.E: Quando ele buscá o material aí...F: Quando ele fô, começá a descê com o material, aí eu fico de bem com ele, faço café, compro até uma cervejinha, enquanto isso tamos de mal, num falo com ele.E: E esse material é... qual a obra que você vai fazê lá na casa?F: Eu vô levantá de tijolo, porque a minha casa é de estuque, né? (est) Aí eu vô levantá de tijolo, (est) aí ele tá comprando, já comprou os ferro, agora comprou a areia e a

Page 5: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

pedra, vai comprá o cime:nto, só que com essa preguiça, pronto, tá me desanimano, tá me irritano aquela moleza dele, aí eu tô dano uns trocado.E: E era uma coisa que você gostaria muito, né?F: Ah, vejo a hora, sabe não? (est) De tê minha casinha, bonitinha... a minha casa, ela é muito ruim, (inint) de tijolo, todo mundo já tá tendo, por que eu não posso ter também possibilidade? Porque ele é um cara que não ganha mal, tá ganhando um dinheirinho, então pôxa, pode investi numa coisa que vai, é o futuro da minha filha de seis anos, dele, né? Num digo nem pra Suelen que tem um filho e tal, daqui a pouco tá vivendo a vida dela com uma pessoa, direitinho, mas pra filha dele mesmo, pôxa fica com uma moleza, a me irrita.E: E qual é a diferença assim da casa? O que que você acha assim que vai melhorá com esse material que vocês compraram que vão fazê lá a reforma?F: Ah, vai melhorá muito. Pôxa, vê minha casinha de tijolo, (inint) abrir a pia, num tê que pegá água com canecão pra tomá ba:nho, não tê que abri <chu...> ai... vai melhorá muito, muito mesmo. (inint) Da casa de estuque, esse negócio de chuva direto dá um medo. (inint) Todo dia chove, todo dia chove, as terra só vai cedendo, principalmente ali onde a gente mora. Ali era uma área... uma área condenada (est), aí como teve uma obra lá no morro e tal, aí eu perguntei, pedi o engenheiro um pedacinho que eu pagava aluguel, fiquei seis anos pagano aluguel, aí eu <per...> pedi o engenheiro aquele pedaço ali., “conversa com o presidente, explica pra ele...” Eu disse: “mas ele sabe da minha situação”, Aí ele falô: “olha, você vai na associação”, o presidente (inint) do morro, ele conhece, né? Aí ele falou: “mas você vai lá, conversa com ele, diz que se falou comigo que eu falei que você podia fazê uma casa ali, mas tem que pedi autorização dele.” Aí eu vim na associação, falei com o Sadi, falei com meu pai, que meu pai era um dos diretores de obra, aí ele foi lá com meu pai, aí meu pai: “oh, vocês vão tê que cavá muito, cavá muito mesmo, mas essa casa não vai durá muito tempo, vocês têm que providenciá uma casa de tijolo, porque é muita... é porque é uma área úmida sabe, ali tem uns poço assim embaixo. Então, vocês vão ter que providenciá uma casa de tijolo, né? Que é mais resistente.” Então, depois daí já tem uns dois anos, vai fazê três anos que eu tô morando ali, então já era, já tinha que tá providenciando, né?E: Já era pra providenciá a casa de tijolo?F: Mas ele com a moleza dele.E: Entendi, então, agora vamo passá um pouco pra suas filhas. Por exemplo, você falô da Rarissa, é a Rarissa, né?F: A Rarissa, a Suelen e a Cynthia. A Cynthia, a Cynthia é a que mora sozinha, já tem a casinha dela com o marido dela.E: A Suelen e a Cynthia, né? E o Joel ajuda você na educação das meninas? E você acha que ele dá opinião, toma conta?F: Ah, toma melhó do que o pai... sempre... tudo que ele faz pras minhas filhas, mesmo até pela Cynthia, porque a Cynthia tava morando na casa até final do ano passado, depois que a neném nasceu, ela ficou morando lá em casa, aí o marido tava construindo a casa dela. Aí cabou de construí a casa, ela já foi pra casinha dela, então sempre deu o maior apoio, se tivé errado, ela fala, eu não me importo deixo ele falá, principalmente com a Suelen é muito rebelde, né?E: A Suelen é a que tem o neném, né?F: É a que tem o João Pedro. Então, ela é muito rebelde, eu deixo ele falá “Não Suelen, não é assim”, de batê, nunca, nunca encostou um dedo nos meus filho, mas fala, eu deixo ele falá, com ela tanto que ele fala que as crianças nem liga, a babreza dele é... a

Page 6: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

babreza dele é... eu conversando com você, é isso que é a babreza dele. “Ah, Suelen é isso, isso e isso”. Eu me irrito com aquilo sabe, eu só... eu já entro na frente, falo pra caramba. A Suele: “ah, mãe deixa o Dau falá, eu hein, você não sabe nem falá”. Aí eu já fico com vergonha quem fala é ele, mas ela respeita muito ele, (inint) mas sempre foi desde que eu fui morá, ela tinha... a Suelen tinha seis anos e a Cynthia tava com oito. É Suelen com seis e Cynthia com oito, então sempre levou, levava pra escola pra mim no dia que eu não podia pegá, ele pegava pra mim, sempre foi um paizão pra elas. Cê pode até perguntá a elas que elas vão te falá sempre foi um paizão pra elas. E: E o qual... e o ... e o Bras, já com elas, como é que era o tratamento, como é que era a diferença no tratamento?F: Nunca deu atenção. Só andava bêbado, então nunca deu atenção pras filhas. Ago:ra, ago:ra que ele começou dá vinte reais na mão de uma, trinta na mão de, agora que as minhas filhas pararam de dá confiança pra ele. Então, agora que ele tá chegano, vê os netinho, não sei que, ai dá vinte reais pra uma, trinta na mão de outra, e nunca ligou pras filha não, nunca foi um pai carinhoso não.E: Aí já é o Joel?F: Ah, levava pra jogo, levava pro samba, quando eu não ia, ele levava elas, coisa e tal, mas o pai delas...E: E... você acha que tem alguma diferença em você pra ele, como é que é a criação entre você e ele, como é que vocês fazem?F: Não entendi.E: Você e o Joel é... qual a diferença que você dá o tratamento e que ele dá pra elas, você falou que ele é mais calmo.F: Ele é mais calmo.E: Aí você, como é que você faz?F: Ah, eu sou mais agitada, se tem alguma coisa errada andando no ar, sabe eu não tenho paciência. Eu não tenho paciência de esperá, eu quero tá ali, porque aí você ensina. Não, fez alguma coisa errada tem que cobrá logo, senão vai fazê de novo, então, já chego metendo a mão mesmo, que aí não tem...E: Você vê alguma diferença da criação, por exemplo, da criação que você teve, que seu pai te deu, né? A sua mãe é pra que dá hoje pra elas?F: Vejo muita. Porque eu não tinha liberdade que elas teve, né? Mas eu, mesmo não tendo a liberdade que elas tivesse, que elas tiveram liberdade: “ah, mãe eu vou ali.” “Vai.” Eu não, tinha que pulá a janela e ir, na marra, chegava, entrava na bolacha, e ia. Elas não: “ah, mãe posso ir?” “Pode.” Só nunca deixei lá em casa i baile funk, isso eu nunca deixei. Sempre deixei i, assim, com uma pessoa, assim mais (inint) tem vinte e poucos anos: “ah, Jupira posso levá a Cynthia?” “Leva, vai lá, Cynthia, mas volta com a pessoa e tal.” E mais, eu tive uma criação totalmente diferente...E: A sua mãe não deixava?F: Ah não, meu pai até deixava, mas a minha mãe...E: Aí, como é que você fazia quando você queria ir na...F: Ah, esperava ela dormir e pulava a janela.E: É mesmo? Aí, no caso, era o que pra ir pro desfile?F: Não, não gostava de carnaval, mas agora era pra baile, né? Agora que eu gosto que eu desfilo, mas eu não gostava de carnaval não. Era de ir pro baile assim. (inint) Quando chegava, minha mãe tava me esperando na porta. Aí já entrava, já levava mãozada, né? (risos F) Aí eu dormia, no outro sábado tinha baile. “Ah, Jupira você não vai não”. Eu esperava ela dormir e ia de novo. Aí quando eu fiz dezessete ano, ela

Page 7: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

liberô, aí ela liberô aí eu já não queria mais aquilo pra mim. Aí parei, eu mesmo fui parando, parando. Aí com dezenove ano, eu tive a Cynthia, aí mesmo parei de ir a baile, essas coisa, fiquei sossegada mesmo. Agora que eu voltei a fazê tudo de novo, ir pra praia, pra samba, ih, num quero nem sabé... que antigamente, eu parei. Até eu morando com Brás, eu, porque realmente ele não deixava eu ir, né? (inint) A cachaça danada, ele não deixava eu i. Mas agora com o Dau, vai os dois pro desfile, vamô pro samba, pro pagode, pro futebol, aí eu voltei a fazê, mas eu vou, não precisa ninguém fala comigo, não, que vou assim mesmo.E: Você pega e vai?F: É.E: Aí quando você vai você costuma levá as meninas, ou não?F: Quando, a Cynthia não gosta, a Suelen e a Ariana vão, né? Mas aí fica difícil agora a Suelen com o neném. A Suelen ia comigo, com a Ariana. Mas agora a Suelen com o neném vai ficá difícil pra ir. Então, só vai a Ariana ou então ela deixa o neném com a minha mãe, que aí ela não sai de casa não. Aí deixa lá e a gente vamos.E: Ah, ta. Você disse que desfila, né? Agora no carnaval, qual é a escola?F: Vila Isabel.E: E como é que é desfilá?F: Ah, é uma emoção terrível. Pôxa, eu já há tantos anos, há mais de... nove anos que eu tô desfilando direto. Então você, já nove anos, todo ano quando entra na Avenida e faz aquela curvinha dali, meu Deus do céu, mas é uma emoção tão grande, num canso. Quando eu penso que começou, já tá acabano, fico tão triste, ainda fico lá na ala, lá terreirão até o dia amanhecê. (inint) Que a gente sempre desfila terceira, quarta, quinta, fico lá no terreirão até amanhecê o dia pra mim vai embora com a minha fantasia, tão feliz. Pôxa, mas é uma emoção danada.E: E lá, como é que é lá no desfile? Ficam lá na concentração?F: É, a gente fica mais tempo lá na concentração do que [no próprio] desfile. Fica lá em pé, (inint) sabe? E a hora vai passando a gente tá veno que vai chegá a hora, todo mundo levantando, vai dando aquela dor, quando começa a soltá os fogos, pronto, a gente sabe que vai entrá, “ah, meu deus”, mas é muito bom, mas é ótimo.E: [No próprio] E como é que você faz com a fantasia, você geralmente compra, vai pagando, [recebe] ou a [comunidade], sempre [aceita o da comunidade?]E: [Ah] [a comunidade.] É, a comunidade dá a fantasia, aí a gente dá dois reais por mês, que no caso da veste é quatro reais por ano, né? A gente dá alí no regional, né? Aí a gente paga a nossa fantasia, é vinte e quatro reais, mas é da comunidade.F: É da comunidade? E: É.F: É geralmente no, no samba tem muita gente de fora, né? (est) Tem gente daqui mesmo. O que que... como é que você acha que eles sambam? Por exemplo, os estrangeiros, as pessoas que não são daqui do Rio, ou que mesmo não são da comunidade...?F: Ah, é muito legal. Eles se entrosam muito legal, chegam, conversam, pergunta como é que faz pra conseguir fantasia, eu acho legal, que o pessoal de fora que, que vêem pra escola, assim visitar, pôxa, eu acho legal porque eles ficam interessados em sabé como é que a gente consegue fantasias, se é de graça, como é que faz pra pagá, eu acho legal.E: E você vê alguma diferença entre, você vê assim quando eles tão na avenida?F: Ah, tem muita diferença. Que teve um ano, deve ser ano retrasado, eu pago, todo ano eu pago os meus vinte e quatro reais, mas como eu paguei minha carteirinha atrasado, aí

Page 8: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

me jogaram para uma ala paga, mas a fantasia foi de graça, cada ala paga, dá dinheiro e dá dez fantasia pra comunidade, só sabe, só tinha Paulista, nessa ala que eu saí [risos E], eles não sabiam cantá o samba eles, só sabiam falá o girá da coroa, mas nada, aquilo tava me iritano, rodava pro outro lado e eles só bebemo uísque, só bebeno uísque, eles não cantá nada, acho que atrapalhô muito a Vila, eles atrapalharam, porque não veio no ensaio, né? Vem uma vez na hora tal, olha o figurino, paga a fantasia e vão embora, né? Só vem mesmo pegá a roupa pra eles desfilá, só tinha mais paulista e eles só sabiam falá o girá da coroa e mais nada. Na hora do girá da coroa eles saiam rodano, rodano, rodano, [risos E] parava o girá da coroa todo mundo ficava quietinho, aquilo tava me aborrecendo porque (inint) aí a gente que é da comunidade qué mais é vê nossa escola (inint), né? Eles só no girá da coroa, no girá da coroa eles iam, parava o girá, pronto.E: E... o que que você acha da participação delas no desfile? Você acha que vale a pena, você acha que não?F: É legal porque é dinheiro pra escola, mas só que atrapalha (inint). Eles não sabem nem cantá um samba, atrapalha a gente à beça (inint) aí vai dá dinheiro pra escola.E: Mas você acha que é lucro porque eles acabam que eles tão dando algum dinheiro pra escola pra eles desfilarem, mas você acha que não vale a pena porque eles na hora não cantam.F: Na hora não cantam, não evolui. Então atrapalha bem a gente, que a gente tamos acostumado a chegá no samba, se evoluí e tal. Chega lá na Marquês, tamos lá querendo se evoluí, e a gente querendo, se mexe, mas aí não dá porque ele não conseguem pegá porque eles dão uma coreografia pra gente fazé e tal e levanta a mão, chega lá eles não sabem, eles não sabem pegá nada, então começa a atrapalhá, aí a gente começa a entrá na bagunça deles também. Porque é três quatro da comunidade pra vinte trinta de fora, então atrapalha à beça, mas eu acho legal.E: Você disse também que gosta de pagode, não é?F: Ah, gosto.E: Quais são os pagodes que você costuma frequentá?F: O Zilinho, vou muito, o que eu vô mais é o Zilinho. É o Zilinho e a a associação.E: O Zilinho é aquele que tem dia de domingo?F: Na sexta-feira, lá na vinte oito. (est) Lá no... <vi...> como é que é? [Na outra vila.]E: [Na associação?] Não é atlética?F: Ah é. Tem um pagode ali sexta-feira, mas eu não vou ali toda a sexta-feira, não, uma vez ou outra porque dá na telha, aí eu vou ...E: E como é que é lá, o pessoal da comunidade vai?F: Vai a comunidade toda porque quem toca é os meninos da comunidade toca lá, então a gente vai lá dá uma força pra eles lá, lá é legal, mas não vou toda a sexta-feira não.E: Fica cheio lá?F: Poxa, cheio, muito cheio.E: É que horas?F: Começa às onze horas, vai até três horas da manhã. Mas é bom pra caramba.E: E você geralmente vai com quem? Com Brás?F: Não com o Dau [risos F].E: É, eu não gravo nome, desculpa, Joel. F: É.E: E quais são os grupos de pagode que você mais gosta?F: Ah, gosto de tudo. Molejo, Soweto, é... (inint)E: Teve Soweto lá, né?

Page 9: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

F: Vai tê no SalgueiroE: Não, é no Salgueiro, acho que vai ser quarta agora, não é isso?F: Vai sê quarta.E: Mas teve lá no Zilinho o Soweto.F: Não.E: Eu fui.F: Ah, já tem tempo já. [Já tem tempo]. Quem foi, foi minhas filha, eu não fui não.E: [Já tem tempo já]. Você não foi não?F: Não, eu fui vê Pepê e Neném.E: Teve? Esse eu [não soube].F: [Teve] eu fui vê Pepê e Neném.E: Eu fui no do Soweto.F: Não, não fui não. Quem que foi, foi minhas filha.E: E elas gostaram?F: Gostaram. (inint) Já tiveram lá. Pôxa, o Soweto tinha que ir lá no Zilinho de novo. Eu gosto desse pagoderos.E: E aquele programa é... que tem na Globo?F: Tupi.E: Tupi?F: Tupi. Eu só gosto da Tupi.E: Qual é?F: Pedro Augusto é...E: Ah, não, você fala do rádio de manhã? F: É.E: Né? Que você comentou comigo, até na hora da entrevista. F: É.E: Não, tô falando na televisão que tem de pagode, não tem na Globo?F: Não tem mais não, acabou. Era sábado.E: Acabou?F: Acabou.E: E qual era o... Cê gostava assistia ou não?F: Geralmente eu não gosto de televisão não, não vejo televisão muito não, [mais quando era pagode], é, prefiro rádio. Eu via, mas eu não gosto muito de televisão não, ficá sentada, assim, parada vendo televisão, não é comigo não, gosto coisa assim, eu leio, cara, saio, vou na ‘Pedrinha’ que eu adoro aquela Pedrinha (inint).E: [Ouve mais rádio]. E o que te atrai tanto na pedra?F: Ah, porque aí eu vejo todo mundo subindo, aí a gente conversa bate papo, aí vou pra casa, sentada, ficá vendo televisão o dia inteiro, ah, não consigo. Ontem eu fiquei apavorada de fica em casa, chuvendo, não podia saí pra lugá nenhum, eu falei: “ah, eu vô na Cynthia”, mas eu abria a porta, que eu olhava o tempo, eu desanimava, aí ficava: olhava a televisão, ia pro quarto, sala, quarto, cozinha, aquilo vai irritano, vai dando um... acabei que eu saí fui pra casa da minha filha que eu não aguentei ficá dentro de casa, têm pessoas que tenta ficá ali vendo televisão, deita, eu não consigo. Tem uma televisão em frente da minha cama, eu não consigo vê de jeito nenhum. Se eu ligá aquela televisão, eu vou dormi. Eu não consigo vê televisão assim direto, só vejo o reporte mais nada, vejo só aquele Alerta Geral e o Repórte da Grobo, o jornal Nacional, mas nada, novela não sô chegada...E: E esse repórter, o que que te atrai pra você vê?

Page 10: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

F: Ah, porque fala a realidade, ele mostra a realidade. Agora também tem outro, um tal de cadeia, que é no nove. Que eles mostram a realidade, eles não escondem não, “ah matou tanto”, aí vou lá mostra os dez. (inint) Aí eu vejo, eu gosto muito de vê repórte (inint).E: E, essa pedrinha que você vê, quem que costuma frequentá lá essa pedra? Você fica lá com quem?F: Eu, minha irmã, a minha ex-cunhada, a minha comadre, os menino lá que também soltam pipa lá, brincam, a Rarissa, a Ariana, a Suelen, nós todos frequentamos a Pedrinha, é uma beleza a Pedrinha, quando tá sol, né? Quando tá essa chuva (risos F).E: Com a chuva [ não dá né?]F: [Ah não dá não]. Ali é nossa área de lazer, lá é uma beleza, a gente bota as crianças pra brincá lá na terrinha... A gente gosta, eu adoro aquela pedra.E: E você não gosta muito da relação lá com os vizinhos, né?F: Não.E: Então, no caso, você fica lá nessa pedrinha [só por causa da sua família].F: [Só por causa da minha família]. Eles falam até que eu sou dona da pedra. “Chegou a dona da pedra”. (risos F)E: É mesmo? F: É.E: Você não sai de lá?F: Não. E: Mas por que você não se dá bem com seus vizinhos, você acha o que lá, é, eles são individualistas ou ...?F: Ah, não. É muita fofoca... Um tal de disse me disse, [todo]... tudo deles tem briga, eles brigam quase todo dia, aqueles vizinho, quase todo dia eles estão discutindo. Então, eu prefiro, sabe? Evitá, fico mais com as minhas filhas, deixo eles pra lá. “Ah Jupira, vem aqui”, que? Vou nada. Porque tem uma parte que tem assim um campinho, né? Aí eles ficam lá cima, né? E eu fico em baixo na minha pedrinha, escuto, mas é uma brigalhada. Nesse final de semana, teve uma briga que saiu até facada dos marido lá, quase que um mata o outro lá, por causa de negócio de fofoca, negócio de água, brigalhada, então fica só eu e minhas filha ali, até evito de tá comentando com eles. “Ah, Jupira é.” “Tá.” Entro pra dentro, fecho minha porta, fico na minha casa... É muita fofoca, eu corro deles por causa disso, tem minha comadre, têm minhas colegas, mas mesmo assim é oi pra cá, oi pra lá e não é de ficá conversando uma hora então. Deus me livre, eu tenho um medo deles danado. É muita fofoca.E: E por que que eles brigam tanto, tem tanta discussão?F: Ah, é por causa de fofoca, é... “ah, tá fulano disse, tá cicrano fala e cicrano falou” e começa a fazê aquela roda de fofoca, de repente aqueli estóra entre eles mesmos, aí briga. Aí passa uma semana, duas todo mundo com a cara fechada, daqui a pouco tá todo mundo rindo de novo. Não demora um mês brigam de novo, quase toda semana tem briga.E: Mas chegou a ter facada lá ou não? F: Ah, quase. Se a moça, a vizinha lá de cima não entrasse no meio, um ía matá o outro, ainda ficaram com o rosto todo machucado, ih, uma coisa horrível. Aí eu evitó o máximo, não... tenho muito contato, eu olho pra cá e tchau, só minha mãe, minhas filha e minha irmã. Nem com a minha irmã sou muito assim de conversá que também ela é fogo é só oi Luisa, oi Bira e ela sobe pra casa dela e eu fico na minha, só assim mesmo quando a gente vai pra Pedra, senta todo mundo. Mas pra i pra casa dela ficá de papo?

Page 11: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

Não vou. Nem sei o que tem na casa dela que eu não vou. Fico mais na minha casa daqui, não saio (inint)E: E eles brigam lá pra baixo... Cê comentou alguma coisa da água, você comentou alguma coisa da água ... E: Jupira é... acabou a fita vamos retomá, então a gente tava conversando a respeito da água, né? (est) Que eles brigam por causa da água, né? Me explica como é que é o sistema da água lá em cima.F: É porque é um cano só vou dividir pra três, quatro casas. A minha não, a minha água vem direto lá de cima, direto, pra mim...E: A sua casa tem um cano que você colocou?F: É... eu o... Dau e o outro manobreiro da água colocaram e outro vizinho que mora abaixo da minha casa. Eles puxaram a minha água lá de cima mesmo.E: É da onde que vem essa água?F: Lá da virada, vem lá do jardim. Aí lá do, lá no cruzeiro tem uma caixa lá imensa aí distribui a água pra comunidade. (est) Aí eles não têm, não ligaram água pra casa deles, então, é uma bica pra eles três, quatro pegarem água. Aí um panha outro panha, um panha outro panha, aí começaram a panhá, panhá, panhá, chegô na hora dum cara pegá água, a água acabô, aí ele resolveu i na caixa dum outro vizinho. Eu acho que cunhado, eu acho que é cunhado, não é primo, na casa do primo pegá água, cismô de pegá uma lata d’água, aí o primo não deixô, aí discutiram lá, (inint) aí brigaram mesmo de rolá no chão lá, não resolveram, foram pegaram faca, foi uma confusão terrível, uma gritaria que eu olhei: “o que que foi?” Mandei a menina olhá na pedra: “ih, Jupira tão brigando, tem até faca. Aí eu falei “então você vem pra cá e deixa a faca deles pra lá”. Aí de repente, a moça entrou lá no meio, aí parou. Eles ficaram com um rosto horrível, todo arranha:do. Eles brigam por tudo, por tudo eles brigam. (est)E: Existe um monte de problema lá em cima, não existe?F: É existe.E: Você, por exemplo, se você tivesse o poder de acertar esses problemas, quais seriam os primeiros? O que que você faria?F: Ah deixa...E: Se você fosse administradora, né? Tivesse, pudesse, né? Arrumá, que que você faria [pra podê] ajudá a comunidade?F: [Ah] ajeitá [aquele]... os caminhos que tão tudo horrível. Caminho tudo horrível. Os esgoto, começaram a botá esgoto, né? Botaram, na minha casa já é ligado, mas têm casas que não tão, não adiantô nada porque a minha casa é ligada, tem uma casa em cima da minha casa que desce esgoto atrás da minha casa e... Mais o que, aquelas pedras tudo descendo, tem umas pedras lá que tá perigosa à beça. Mais o que? O gari. Na minha comunidade tem gari comunitário, mas eles não vão do lado do Conselheiro, não vão [só ficam] do lado de cá. E quando passa daqui pra lá, vai direto pra Ladeira do Vinte e ali no Conselheiro eles não, não param eu acho incrível isso, desde quando começou a gari, eu só vi os gari lá no Conselheiro uma vez. Nunca mais eu vi, eles não pegam, não recolhem o lixo, aí a gente tem que descê com a bolsa de lixo jogá lá em baixo. Aqui eles passam, lá não. A gente tem que descer e jogá a bolsinha de lixo lá em baixo na lixeira. (inint)E: [Só fica do lado de cá] E você acha que isso [atrapalha] [complica] [gera confusão]...F: [Ah atrapalha muito] [Ah complica hoje mesmo] [bastante] que a CEDAE já tem os cano todo ligado, em cada casa eles ligaram a água já, tá os cano todo lá e a caixa tá

Page 12: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

fazeno, né? Colocaram caxinha, colocaram hidrômetro, mas até agora não chegô os canos pronto tão quebrano é... já tá porque a terra vai cedeno, né? Então os cano já tão aparecendo e até agora não chegô água não, porque se essa água da CEDAE chegá aí ia melhorá bastante. Não ia ter esse probrema, negócio de briga (inint) que é uma tristeza isso, né? E aí ia evitá bastante porque a gente ia ter nossa água, cada um com a sua dentro de casa ia evitá esse probrema de brigá e até agora não chegô. Falaram que ia inaugurar em outubro, de outubro passou pra novembro e já tamo em julho e até agora não chegô a água lá.E: E o ... é... com essa chuva, como é que é, você falou que tá perigoso?F: Ah tá, escorrega tudo, né? A gente bota o pé, a gente desce direto. [De]... da minha casa ali pro “caminhosinho” até que não é muito, mas quem mora mais pra cima? Quem mora na virada lá no alto? Que daí esse barro é barro vermelho, é horrível de andá. Não tem um cimento, não tem uma escadinha direitinha...E: E você tem... por exemplo, você desce não, você nem desce, né?F: Eu, hoje sabe quando eu desci na rua? Maio. Eu desci lá em maio, foi maio foi, na véspera do dia das mães, que a minha filha tava trabalhano na “Civilização Baiano”, (est) aí eles fizeram um bolinho ali pras mães, aí eu desci pra ir ali comê um bolo, mas aí depois descemos hoje já tem dois mese, vai fazê dois mese que eu não ia na rua, não desço. Eu fico apavorada de descê o morro e depois tê que subi. Quando eu olho pra cima e vejo aquela escadaria, meu Deus do céu, me desanima. Tô pensando a que horas que eu [vou]... vou chegá em casa. Chegá em casa umas nove, nove e meia, dez horas, até que vou subindo devagarzinho me dá uma falta de ar...E: Mas as crianças descem e sobem rapidinho, né?F: Ah, é rapidinho, né? É questão de três minutos, estudam, descem, sobem, hoje mesmo a Suelen teve que levá o neném no pediatra, a Ariana vai pra escola, eles descem tranquila. Agora eu, e nem a Rarissa vai na rua todo dia não. Ela sai no sábado. Sábado ela foi pra Sepetiba e chegô no domingo à noite. Mas ela também não sai assim com freqüência não que ela não agüenta. Pra subi o morro tem que ficá puxano, dando a mão, mole que nem eu também nós duas não descemu não. É muito difícil a gente ir pra rua.E: Mas você acha o que, que se o caminho tivesse melhor você desceria mais vezes ou é a distância, você acha muito lá em cima, acha complicado...?F: Eu acho que se o caminho fosse melhor (tosse E) todo direitinho, limpinho, direitinho, até animaria a gente a descê. Mas esse negócio [de]... de cheio de lama, hoje principalmente nós vamos pra onde? Descê pra onde? Um monte de lama. Eu prefiro ficá em casa, né? Agora quando tá sol não, vô lá no pagode e tal, mas com essa chuva, não saio de casa de jeito nenhum, tenho pavor só de pensá em descê o morro já desanima.E: E o lixo lá, né? E a lama, né? Com essa chuva toda ...F: Ih, lama é o que mais tem. Lama tá horrível, da minha casa ali pro “caminhosinho” até que não é muito porque logo pega a escadaria, né? Do barracão pra baixo é tudo escada, mas da minha casa pra cima, não tem nada é só lama mesmo, é só lama violenta.E: Que desce, né?F: O que? A minha filha foi pro posto, ela dormiu na minha casa ontem, de ontem pra hoje pra podê descê pro posto, que ela mora pra cima da minha casa, então é muita lama não tem nem condições de descê com criança pra creche nem nada.E: Entendi. E... quando você trabalhava, né? Você tá sem trabalhá quanto tempo?

Page 13: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

F: A última vez que eu trabalhei foi em outubro, mas nunca, trabalhei um mês só que eu fui trabalhá como doméstica, né? Mas só que eu não se dei com a filha [da]... da moça lá, aí eu preferi saí, por causa que uma criança de nove ano gritou comigo, mas me deu uma irritação, poxa eu sendo avó de neto, criando as minhas filhas, há (inint) muito eu não aturo que a minha filha grite comigo, não vou aturá filho dos outro, né? Eu então preferi saí pra não me aborrecê. Aí trabalhei acho que foi um mês, um mês e quinze dia só. Acho que não chegô nem isso. Um mês e quinze dias. Eu trabalhei, saí pra evitá de probrema, recebi meu salário e fui embora pra casa, não trabalhei mais nada. E: E antes é... Isso é foi agora em outubro...F: Foi em outubro.E: E antes você trabalhava como doméstica, né?F: Como doméstica.E: E aí o que que você fazia lá?F: Ah, lavava, passava, cozinhava, arrumava, ia... ficava com [dois]... [dois]... dois criança já um menino de quatorze e uma menina com doze. Que a mãe era professora de Viçosa só vinha em casa uma vez, é... duas vez no mês, aí eu ficava com eles [botava]... dava almoço, botava eles no colégio e ia pra casa aí o pai deles chegava. E fazia tudo lavava, passava, cozinhava, arrumava.E: E gostava?F: Ah, gostava. E: Você gosta de cozinhá?F: Gosto mais de cozinhá do que passá, [a única] coisa que eu não gosto é passá [roupa]. Numa casa eu dou conta de tudo, falou em passá roupa me dá um desânimo danado.E: [Prefere] [Ih...] Ih você cozinhava, que tipo de comida você gosta de fazê?F: Ah, lá eu fazia variado, fazia tudo, é comida de forno, arroz, feijão, bife, batata frita, era nhoque, era lasanha, panqueca, feijoada, carne assada, lá eu fazia de tudo, de tudo, que eles viajavam muito, né? Que a mãe, final de ano, tava de férias lá na faculdade, aí eu ficava com eles, aí eu fazia muita comida, que eles viajavam pra Camboinhas, aí eu tinha que fazê várias comida, vários prato pra eles levarem pra lá, aí eles adoravam, “hum faz comida gostosa”, aí eu fazia, arroz e feijão não é bom não mas que era gostosa era, aí eu fazia.E: E quais são as comidas gostosas que você acha [é o que] lasanha?F: [Ah, lasanha] nhoque, panqueca. Aí você pode fazê estrogonofe, aí dá ânimo de fazê (inint). [risos E]E: O arroz e feijão é que você não...F: Eu faço, né? Tem que fazê mesmo, né? E: Por obrigação.F: (risos f) Por obrigação, não gosto não.E: Não é nem, que goste tanto de fazê. Mas como é que faz comida, me fala aí, uma comida aí que você mais gosta, me fala aí como você faz, me conta?F: O que, uma comida que eu gosto?E: É, uma comida que você mais gosta, que você faz.F: Eu gosto mais de arroz com feijão.E: É mesmo? (risos) No final [cai no arroz e feijão]. E aí como é que faz, por exemplo, o feijão.F: [É o arroz e o feijão] O feijão, hum, eu cato o feijão, não gosto de carne. Não gosto

Page 14: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

de carne no feijão não.E: Não?F: Não. Mas eu boto mais porque o Dau gosta, mas eu não gosto não, cato o feijão. Também não gosto de botá feijão de molho, não tenho paciência de deixá o feijão de um dia pro outro não. Aí eu cato o feijão, boto a carne pra saí sal. A carne eu já deixo de um dia pro outro, chega de manhã já tem sem sal nenhum, não precisa ficá fervendo, aí soca um dente de alho na panela de pressão, jogo o feijão, boto a carne, o feijao lavadinho, e tal, boto ali, ali boto duas de louro, um dente de alho inteiro e boto pra cozinhá. Quando acabou de cozinhá, soco o alho, boto o alho, boto óleo, tempero ele, aí esquenta, [boto sal]E: [E as crianças?]F: As crianças também gosta. No dia que cozinha feijão lá em casa é uma festa, se deixá, eles comem só feijão puro.E: É mesmo, todos eles?F: Todos eles.E: Até a pequenininha?F: Até a Rarissa. A Rarissa, o negócio dela é arroz e feijão mesmo, ela adora arroz e feijão. Mas tem que tê alguma coisa. Ela pergunta: “o que que é a comida?” “Arroz e feijão.” “Ah, não quero comida não, mãe.” “Não, nem, tem carne, ovo.” “Ah, agora eu quero.” Eu, (inint).E: E como é que foi, é trabalhá sozinha? Depois quando você se separô? Você me contou que você se separou, né? Aí saiu foi morá com a sua filha, [não foi isso?] Como que foi depois?F: [Foi difícil.] Foi que eu fiquei muito tempo sem trabalhá, então me separei <ti...> tive que trabalhá, claro, né? [Mas não era porque eu não] queria trabalhá e porque eu não concordava em eu trabalhá, né? Aí eu fui trabalhá deixava as criança sozinha, a Suelen quase botou fogo no quarto alugado, ela ficô agarrada no fio de alta tensão, queimou a mãozinha to:da e foi muito difícil trabalhá sozinha pra matê as duas, levá no colégio, panhá no colégio, depois voltá pro serviço, porque eu também era babá, eu trabalhei lá nos Barbosa, ali aí era babá, tinha que tomá conta de criança de quatro meses. Então era difícil. Tinha que levá a garotinha, ia levava a garota gorda até no colo, ia até a escola Argentina deixava as minhas filha, voltava pro serviço. Cinco e meia eu ia buscá as criança, trazia, mandava pra casa, voltava pro serviço porque eu pegava de nove às sete meia da noite. Então foi difícil à beça, aí depois eu fui me habituano, me acostumano, aí logo assim, eu conheci, fiquei com Dau, né? Aí ficou mais fácil porque ele sai cedo aí eu levava as criança pro colégio, ele ia e panhava pra mim, aí (inint) aí ele começô a ajudá aí ficou bem mais fácil.E: [Por obrigação]. Você falou que a... quem foi que quase botou fogo [na casa?] A Suelen. Como é que foi?F: [A Suele]. Eu saí de casa de manhã, aí falei “ah, Suelen eu vou descê, tchau”, aí a Cinthya tava durmindo, que ela sempre foi dorminhoca, a Suelen que sempre acordou cedinho. Aí falei: “tchau, Su”, aí ela “tchau, mãe”. Aí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem, que eu olho a minha casa, tava saindo um monte de fumaça, que eu corri, ela tinha pegado um fósforo acendido um papel embaixo da parede e aí tinha um pano assim, pegô fogo no pano já tava queimando tudo já, o fogo já tava subindo. Aí outra vez ela pegô uma chave de fenda, tinha um rádio-relógio, aí enfiou a chave de fenda dentro do relógio, aí o rádio-relógio pegô fogo, aí o vizinho acudiu, eu tava

Page 15: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

trabalhando. Aí na outra vez eu fui trabalhá, aí ela foi pra casa do pai, aí tinha um cabo de aço feito uma corda, mas era amarrado em uma cabine de relógio, quando ela botou a mão ficou presa, a mão dela ficou toda queimada, aí o vizinho veio correndo, “rebentô”, deu uma paulada no fio, “reventô”. Aí eu fiquei com medo, mandei pra casa da avó elas, que aí eu comecei a trabalhá mesmo pra mantê elas, aí ficou na casa da avó, mas aí quando eu fiquei com Dau, aí levei pra casa de novo, mas não ficava assim direto, né? (est) Eu levava pra escola, da escola eu mandava assim pra casa da avó, se saísse cedo eu panhava. Aí depois que eu fiquei com Dau, ficou mais fácil, ele olhava pra mim, enquanto eu não chegava ele tava em casa com elas, aí pararam de fazê besteira, pararam não, Suele, né? Que sempre fez besteira.E: E... quando aconteceu esse tipo de coisa né? Do tipo acendê o fósforo, botá a chave-de-fenda no relógio, o que que você, como é que você repreendia, como é que você falava com elas?F: Ah, eu ficava muito triste, porque eu [nunca]... nunca deixei elas ficarem, mas aquilo me doía muito, sabe? Aí queria protegê, mas fiquei pensando “como é que eu vou fazê pra trabalhá? Quem é que vai dá comida pras minhas filha?” Aí ficava aquela coisa ruim... aí comecei levá [pra]... pra escola, mas aí levava da escola pra casa da avó, mas na casa da avó também não era uma boa, porque tem uma tia lá que é meia nojenta aí...E: Essa tia é o que? É irmã ...F: É irmã dele. Irmã do Bras, (est) aí ela era nojenta, então implicava muito com elas aí tá, qué sabê de uma coisa? Aí foi quando eu pensei, falei: “ah, vou arrumá uma pessoa pra mim. Uma pessoa que me respeite e tal, que me ajude.” Aí foi quando eu conheci o Dau. Que eu já conhecia ele há muito tempo, né? Mas aí eu fui pro samba e tal, fiquei com ele lá e tal conversando muito, conversando, conversando aí ele foi lá pra casa começou a levá escova de dente essas coisa, foi ficando, ficô, ficô, aí começou a me ajudá, aí ficou mais fácil, ele pagava o meu aluguel, fazia as compra, comprava roupas pra minhas filha, essas coisas, começamos a saí nós quatro, aí começou a levá a filha dele também, aí ia ele, eu, as <fi...> eu, ele, a Cynthia e Suelen e Ariana que é filha dele. Aí começamos a passeá, ia muito pra futebol, pro shopping, ia pra Saens Peña, tinha que comprá uma roupa, a gente ia pra Madureira, nós quatro, nós cinco, aí foi ficando legal, ele ia buscá as menina na escola, levava pra casa e tal, Mc Donald, aí graças a Deus chegamos até onde tamo, né? Mas era só aquele restinho que elas não souberam aproveitá, só... uma arrumô neném, Cynthia, dezesseis ano, é dezesseis ano, fizemos festa de quinze anos pra ela, uma festa linda, com vestido bonito, tudo o que tem direito, né? Passa o tempo, Cynthia grávida, fui descobri com 8 meses, aí deu uma infecção, aí levei na pediatra do posto, chegou lá a pediatra: “a infecção dela é gravidez.” Quase tive um treco, tive que tomá remédio de pressão urgente, que a pressão “pum”, quase morro. Aí foi difícil tal, conversei com o namorado, o namorado assumiu aí ficou ela com o namorado. Vem Suelen, quinze anos, quatorze anos, vou descobri Suelen com sete meses... cinco... cinco meses de gravidez. Outro problemão que aí Suelen pior ainda, (inint) sabe? Essas pessoa. E tá lá com o meu netinho (inint) e agora eu me arrependo. Não souberam <apro...> ... elas não souberam aproveitá, porque eu sempre dei escola. “Ah, vai pra escola.” “Ah mãe, não tem caderno.” “Toma o dinheiro, compra caderno”. O Dau mesmo, o Dau nunca deixou “ah, tô precisando de um sapato.” Ele “tum” vai lá e compra. “Ah, meu chinelo arrebentô”, eles usam só chinelo de vinte reais. Esse tal de kenner aí é vinte reais. É o chinelo que eles usam. O meu é quatro reais, o deles não, oh, é vinte reais, senão não bota no pé, né? (riso E). O Dau nunca deixou faltá nada pra elas, nunca precisaram a trabalhá pra se mantê sempre

Page 16: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

em forma, sempre bonitinha, né? Oh, o que eles me inventam... a minha neta tá com um ano e sete meses...E: A da... a que é casada, né?F: É, da Cynthia. A “Catherine” tem um ano e sete meses e agora o João Pedro com três meses que é o da Suele, tá lá.E: E você, por exemplo, é [aconteceu]... aconteceu primeiro com ela né? Com a ...F: Cynthia.E: Com a Cynthia, né? E você foi descobrir tarde à beça...F: Tarde. Porque ela sempre magrinha, nem parecia que tava grávida, botô a mesma roupa do começo ao fim da gravidez ela usou as roupa dela, botava, ia pro colégio, estudô, ela estudô com nove meses de gravidez. (inint) É, nove meses que ela passou de ano dia 16 de dezembro, passou pra 8º série quando foi no dia 23 de dezembro ela teve a “Catherine”. Estudando, descendo o morro tranqüila, toda direitinha, toda bonitinha, porque quando a pessoa (inint) ficou andando de lado, ela não sempre magrinha, sempre direitinha tirava a roupa na minha frete e tal, a Suele eu descobri um pouco antes, porque a Suelen começou a se escondê pra trocá de roupa. Tô vendo ela meia assim, toda (inint) “Suelen tá com algum probrema?” “Não mãe.” “Suele, se tá com algum probrema?” “Não, mãe.” “Cê tá ficano menstruada?” “Eu tô.” Aí <come...> aí eu observei. “(inint) A mestruação.” “Já fiquei.” Falei: “mentira, que eu tô de olho em você.” Aí comecei a apertá, comecei a dá umas tapa nela, né? Aí foi que ela falou: “tô grávida sim.” Que ela é toda assim, se ela tivé que falá ela não esconde também não. “Tô sim.” E tá lá, e tava mesmo. Aí, tava mesmo, ainda corri atrás, mas não deu mais tempo... Agora tá lá com a criança dela lá. Agora tá fazendo um curso na associação.E: Curso de que?F: De artesanato. Ganha cinqüenta reais por mês, mas ela faz tantos planos, sabe? Com cinqüenta reais que eu tô até com medo dela.E: É mesmo?F: É, tá fazendo curso, hoje mesmo ela já até já chegou do curso essa hora.E: E o neném?F: O neném fica comigo, mas aí tá lá com a Ariana, com a tia dela. Ele mama mamadeira, né? Aí tá com a Ariana, que é a filha do Dau.E: E você acha que ela melhorou depois que ela teve filho, que ela era, né? Mais... F: Não melhorou muito não.E: Não. Continua a mesma coisa.F: Ela é (inint), se eu liberá... Porque quando ela ficou grávida ela não tava na minha casa, porque ela era assim, ela ficava na minha casa de segunda a quarta, aí quinta-feira ia pra casa da avó, que a avó mora aqui em baixo, aí ficava quinta, sexta, sábado e domingo na casa da avó, e subia domingo à noite pra casa. Aí, “ah, Suele...” “Ah, dormi na minha vó.” “Dona Shiley, a Suelen tava aí?” “Tava. Ela chegou em casa nove horas da noite.” Mentira. Que aí depois quando ela ficou grávida que eu descobri, que as pessoa “Jupira, cansei de ver a Suelen descê do (inint) de madrugada.” “Ah, Jupira cansei de ver a Suelen em tal lugar.” “Ah, agora é tarde. Tinha que tê me falado antes, pra mim tomá providência.” Não falaram, agora tá com o neném no colo vou fazê mais o que, né?E: É a avó então que...F: E a avó acobertava, que ela sabe que quando eu solto mesmo, né? Então ela acobertava, deu no que deu quando eu descobri já era tarde, com cinco meses de gravidez já. Aí... agora tá lá, ela não qué saí. Que ela esses dias: “ah, mãe fica com ...”

Page 17: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

Eu falei: “ficá o que?” “Fica com João Pedro.” “Ah, não eu vou sai também”, porque se eu falá pra ela um dia: “eu vô ficá”...E: Vai tê que ficá sempre.F: Vou tê que ficá sempre porque do jeito que ela é “avoadinha”... tem quinze anos, agora que ela começou a... agora, agora é tarde, agora tem que agüentá. Que eu falei pra ela: “quando eu quis saí, eu saí.” Quando eu falei: “agora vou tê um filho”, eu sosseguei. Então, filho sossega, então sossega também. Ela fica...E: Bicuda...F: Mas eu não dô confiança, não. Deixo ela com o bico dela lá (inint). Falei: “você nem inventa, não fico nada. Fica você, porque se ele chorá você levanta e dá mamadeira. Fique você.” “Eu não, Suelen é doida.” “ Ainda bem que você sabe que ela é doida.” Mas ela foi pra Sepetiba com ele, passou dias, semanas em Sepetiba, com o neném ...E: Na casa de quem?F: Na casa da tia dela, da irmã do pai dela que mora lá... aí passô lá duas semanas, sábado foi pra lá de novo. (inint) Pra ela saí? Invento logo que vou sai também, Deus me livre, que se dé confiança um dia, falá pra ela: “ah Su, vai...”E: Ela vai saí todo dia (riso E).F: Todo dia ela vai querê í. “Ah, mãe fica.” “Não, fico nada. Vô também, vamô todo mundo, leva o neném também que eu também vô.” Aí eu faço assim com ela, não fico não. Aí a tia dela: “ah, você vai Suelen que se você quisê saí, você vai que eu fico.” Eu falei: “você não faz isso porque ela já tem um neném e a Suelen não tem juízo. Se você ficá, se acontecê... caso ela arrumá outro filho...”, [se ela sai], sabe, né? Que ela tá doida pra saí, doi: da... se saí, é saí e fazê besteira, que a Suelen não vale é nada mesmo, depois que ela arrumá. Ela fala mesmo: “fiz e faço de novo”, porque essas filha rebelde, sabe?E: [Ela vai arrumá outro filho?] Ela fala?F: Fala. Ela é fogo. Pra dominá Suelen tem que tê, tem que tê cara braba que a neguinha é braba.E: E [a]... o pai da criança se vê?F: Não vejo que ele corrê de mim.E: Ele corre?F: Corre. Até hoje ele (inint) “ah, vocês erraram no molequinho também erraram.” Aonde me vê, oh (estala os dedos) “sarta” fora. Aí ficou aquele negócio de resistro do neném, resistra, não resistra, resistra, não resistra, eu falei: “Suele, você qué que eu resistro?” Que eu ía resistra o menino. Ela: “Ah, mãe resistra.” Aí depois eu pensei bem, falei: “ah, não. Vou tirá a responsabilidade das costa dela, falei: “não. Não, vai você e resistra.” Aí mandei ela chamá o pai dela, fiquei com o neném, ela foi lá no cartório e resistrou o neném. É João Pedro, botô João Pedro da Silva Ramos, só o nome dela. Pai ignorado. Me dá uma pena, não gosto de ver aquele resistro me dá uma tristeza, sabe? Falei: “não, vou deixá ela resistra pra ela tê responsabilidade, pra ela pensá. Já pensô, Suele, quando o neném fô pra escola?” (inint) “Aí tá vendo, isso aí que cê queria pra você? Isso aí é legal pra você, seu filho não tê pai e tal?” Aí ela: “é melhor, é melhor. É melhor ele não te.” É, então tinha que pensá antes agora...E: É. E você acha, mas vocês nem chegaram a cogitá a hipótese dele ir lá registrá? F: Não, a mãe dele teve na minha casa...E: É? A mãe dele foi lá?F: Foi lá na minha casa. (est) Aí chorou à beça quando viu o bebê, que o bebê era muito parecido com ele, essas coisa e tal e é que quando o bebê tivé com dois meses pra deixá

Page 18: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

ir pra casa dela com o bebê não sei o que. Aí eu tô só olhando pra mãe dele falando. “Ai, pelo amor de Deus, não resistra o meu neto sem o nome do pai.”(inint) Começou a falá, a falá dos probremas delas e tal e eu tô olhando. Aí tá, a Suelen tinha falado no hospital que o pai era ignorado, (est) foi o que deu. Aí eles deram o papel do resistro “pai ignorado”, né? Só tinha a mãe. (est) Aí ela foi, falô com o rapaz. (est) Aí ele foi e disse que ia registrá o bebê, aí marcou pra a Suelen direitinho pra Suelen i, i lá que ele ia resistra. Suelen acordô cedo, se arrumô toda, cortô cabelo, botô sapato alto e tal, pra i no cartório. Chegou na casa dele, ele tinha ido pro quartel, (est) olha só... ela chegou em casa envocada, se enfezô: “eu não quero mais que ele resistra nada, não sei o que, não sei o que, eu vô sozinha.” Aí ele mandô recado, isso foi de manhã que ela foi, aí à tarde ele mandou recado que era pra ela descê que ele ia no cartório. Ela falô: “agora quem não quer ir sou eu.”E: Não foi?F: (tosse) E não foi. Eu falei: “já que é assim Suele, você chama o seu pai, eu fico com o neném que é pra você não levá o neném”, que ela tava de resguardo “que eu fico com o neném vai, você e seu pai lá e resistra seu filho”. Foi lá e registrô. Mas ele agora tá, de vez em quando ele vê o neném que a minha irmã que leva prá vê, Suelen também não leva não, não fala com ele não. Ela leva lá pra ele vê lá.E: E ela gosta dele? [Você acha?]F: [Gosta.] Acho que gosta e gosta muito, muito, muito mesmo. Ela tem quinze ano ele tem dezoito, também é assim tudo do mesmo tamanho, né? Mas eu não queria pra ela, não queria mesmo, Deus me livre, nunca gostei muito desse moleque. (inint) Suelen num caí nessa bobeira.E: E como é que ele é, porque? [qual]... o que que é que ele tem?F: Ah, ele [é]... é bandido. E: É?F: Anda de revólver pra cima e pra baixo, é bandido, né? Aí queria que (inint) corre de mim, ainda usando revólver corre de mim. Tem um medo de mim que se péla. Mas eu nunca peguei ele não, sabe? Só falei: “eu vô conversá com ele, que ele destruiu a <vi...> ele destruiu, vocês destruiram a <vi...> é... ele destruiu tua vida. Porque ele mesmo oh (batendo com as mãos) não tá nem aí. Você agora que ia começá a vivê. Estudando, fazendo balé, tudo direitinho, ganhô ali na academia (inint) pra fazê balé ali, tudo direitinho. Agora com neném no colo, bem que pode voltá a fazê tudo isso né? Mas agora é mais difícil, principalmente a Cynthia. A Cynthia que gostava também de fazê essas coisas. Estudá, fazê balé e fazia ah... não sei mais o que, fazia não sei o que, cursinho, tudo a Cynthia entrava. Ficou grávida não pode fazê mais nada que a “Catherine” só mama peito. Só peito. A menina não come duas colheres de comida, nunca mamô mamadeira, não aceita nada de leite, não come danone, não come pão com manteiga, a menina é um saco, Deus me livre eu não quero aquele neném pra mim. Eu não queria essa criança pra mim. Mas ela é chata demais, é o dia inteiro agarrada no peito. Tem um ano e sete meses, a menina não come uma colhé de comida. [É o dia inteiro] ela bota o mama da mãe dela pra fora, enfia a mão no outro, enfia mão no outro, levanta as pernas lá pra cima (risos) e aí, e aí fica o dia inteiro aí, então a Cynthia deita, bota o mamá lá na cama e ali ela fica o dia inteiro. Não come duas colhé de comida, ela tem um ano e sete meses, ela parece (inint)E: [Não come nada?] Quem?F: A “Catherine”, ela é muito magrinha. Olha as (inint) ...E: É mesmo?

Page 19: AMOSTRA RECONTATO peul/Recontato2000... · Web viewAí, mas eu não desci, em vez de descê eu fui na casa da minha irmã, nisso que eu tô descendo, debaixo de uma pedra que tem,

F: É, muito magrinha. E a pediatra disse que tá bom. Nasceu com dois quilo, quarenta e cinco centímetros a criança, mas é uma coisa muito chata pra comê. Agora o João Pedro já mama peito e mama mamadeira, tem três meses tá óh. Isso aqui dele já não vê [o pescoço], não vê nem o pescoço dele. Enquanto “Catherine” não come nada. E: [Tá papudo]. E por que você não pega e não tenta dá a mamadeira...?F: Pra quem? E: Pro filhinho da...F: Pra “Catherine?E: É.F: Ela não aceitô leite nenhum. Que a pediatra mandô até dá aquele leite de soja...E: Sei...F: Leite caro ruim e a Catherine não tomô. Ela tomo, mas botô tudo pra fora, não aceitou leite nenhum. Ela não gosta de leite. Ela não toma danone, [toda as criança adora danone] e a ”Catherine” odeia danone. A gente às vezes passa o dedo, ele (cuspindo)...E: [E toda criança gosta de danone.] Só leite?F: Só, só ela não pode. Só mamá, o negócio dela é mamá, nem comida ela não gosta, come duas colhezinha de comida, se vai comê uma banana é um pedacinho de banana assim. Uma criança de um ano e seis meses. Parece até esse ratinho comendo, tem quatro dentes, é muito engraçado. E: Só qué sabê do leite é da...F: [É.] Só da mãe.E: E o que mais que você gostaria de me falá assim de lá, da sua casa, do seu pai, vamos falá um pouco do seu pai, que a gente ainda não falou do seu pai. Você falou que o seu pai veio da Paraíba, né? (est) E ele tá vivo ainda, né?F: Tá, só que ele agora ele tá doente.E: Tá doente, né?F: Tá, tá com efizema pulmonar. (est) Ano passado ele ficou internado, em junho, julho. Julho do ano passado. Fez um ano agora que ele ficou internado, ficou ruim lá no “TP” lá no Caju com efizema pulmonar. Aí agora eu nem sei, que já tem um tempo que eu não vejo meu pai. Vi meu pai em fevereiro.E: É.F: Que eu não vou muito com a minha madastra não, aí eu não vou na casa dele não. Mas ele ficô ruim à beça, mas agora (inint) deve está bem que ele não tem ligado lá pra perto da minha casa, nem me chamado, né? Que qualquer coisa eles mandam me chamá, eles não têm me chamado e porque ele graças a Deus tá bem...