Amamentação é Direito Da Criança

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AMBr revista 14 dest aq ue dest aq ue Em novembro de 1989, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou a Convenção sobre os Direitos da Criança. Formada por 54 artigos, a Convenção tem por objetivo preservar o nascimento, cres- cimento, educação e saúde de todas as crianças do mundo. Mesmo sendo um documento completo e que refletiu o pensamento de todos os países que fazem parte da ONU, as crianças do mundo ainda sofrem pelos atos impensados ou incoerentes dos adultos. Sem educação, sem saúde, perseguidas ou abandonadas, boa parte dos futuros adultos é submetida a condições de vida degradantes e sem perspectivas. No Brasil, apesar das inúmeras iniciativas públicas e privadas, nossas crianças também sofrem com o descaso e falta de políticas eficientes para garantir seu desenvolvimento social. Números a serem enfrentados - com- parado com seu desempenho na área social há dez anos, o Brasil mudou para melhor. Com relação a outros países, contudo, revelam-se indicadores ainda muito negativos. Para o atual e próximos governos, a tarefa é dupla: redobrar esforços para aproximar-se dos padrões internacionais recomendáveis e, principalmente, reduzir as desigualdades internas que fazem uma mesma região apresentar índices comparáveis aos da Europa entre os mais ricos, e semelhantes aos da África, na população pobre. A mortalidade infantil é um dos melhores exemplos da realidade brasileira. A década de 90 começou com o alarmante índice de 48 crianças de até 1 ano mortas para cada mil nascidas vivas. Terminou com 37% a menos, resultado de políti- cas públicas que combinaram atendimento pré- natal, melhorias nas condições de saneamento, programas de aleitamento materno, de combate à desnutrição infantil e de agentes de saúde. No entanto, a média ainda é de quase 30 mortes por mil nascidos vivos. Em mortalidade infantil, o Brasil passou da classifica- ção “alta e preocupante” da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o nível “médio e não ideal” (entre 20 e 40). Ao longo da déca- da, entre 1990 e 2000, a taxa de mortalidade baixou cerca de 30%, o dobro do que se conse- guiu no mundo (14%) e 5% a mais do que se obteve na América Latina (25%). Isso quer dizer que, nesse perío- do, foram poupadas 230 mil vidas. Técnicos do Ministério da Saúde associam o resultado à redução da fecundidade no país, ao maior acesso aos serviços de saúde (principalmente o pré-natal) e de saneamento, além do aumento do nível de escolaridade das mulheres no país. Esses dados mostram o progresso na situação da saúde da criança brasileira, não só na questão da mortalidade infantil, mas também no declínio de mais de 50% das mortes por diarréia e 20% por pneumonias, na erradicação da poliomielite, no aumento considerável da cobertura vacinal e na prevalência da amamentação e na redução da desnutrição infantil e do baixo-peso ao nascer. Apesar de todos os avanços, ainda existem grandes contrastes nas chances de sobrevivência infantil. As áreas rurais apresentam o dobro de mor- talidade observada nas áreas urbana. Chama a atenção a mortalidade extremamente alta das crianças cujas mães não tiveram acompanha- mento tanto no pré-natal como no parto (207 por mil nascidos vivos – 10 vezes maior que na área urbana), situação esta mais freqüente na zona rural. Em 2000, foram hospitalizadas no Sistema Único de Saúde (SUS) mais de um milhão e 700 mil crianças menores de cinco anos com um custo de 648 milhões de reais. E é importante destacar que mais de 60% das causas de hospi- talização foram decorrentes de problemas respiratórios e de doenças infecciosas e pa- rasitárias. Para concretizar as metas, o Ministério vai continuar promo- vendo a melhoria das condições de saúde das mulheres visando a garantia do nascimento seguro e a sobrevivência dos recém- nascidos, tais como: mais quali- dade na assistência pré-natal, na humanização do parto e do nas- cimento; redução do número de cesarianas desnecessárias e melhor qualidade na assistência prestada a mãe e ao filho, incluindo a promoção do aleitamento materno nas primeiras horas após o parto. IDH - uma boa amostra das condições de vida de um país, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), medido pela Organização das Nações Unidas (ONU), aponta que o Brasil está na 73ª posição de um ranking de 173 países. Entre 1999 e 2000, o Brasil praticamente não alterou seu índice, passando de 0,753 para 0,757 (quanto mais próximo de 1, melhor). O índice é a síntese de três dimensões sociais: longevidade, educação e renda. Pesquisa desenvolvida pela Secretaria de Planejamento do DF, com base em parâmetros da ONU sobre IDH, mostra que vivemos entre o paraíso e a miséria. Enquanto o Lago Sul despon- ta como o melhor Índice do mundo, com 0,945, Brazlândia tem 0,761 e precisa de investimentos em educação e saúde. O Distrito Federal ocupa uma posição privile- giada no ranking, com um IDH de 0,849, à frente de muitos países como Argentina, Chile, Arábia Saudita, e México. Aleitamento materno: direito da criança à alimentação e à saúde O Distrito Federal é referência nacional em aleitamento materno e tem legislação específica para cuidar da saúde de crianças prematuras e em situação de risco

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d e s t a q u ed e s t a q u e

Em novembro de 1989, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou a Convenção sobre os Direitos da Criança.

Formada por 54 artigos, a Convenção tem por objetivo preservar o nascimento, cres-cimento, educação e saúde de todas as crianças do mundo.

Mesmo sendo um documento completo e que refletiu o pensamento de todos os países que fazem parte da ONU, as crianças do mundo ainda sofrem pelos atos impensados ou incoerentes dos adultos.

Sem educação, sem saúde, perseguidas ou abandonadas, boa parte dos futuros adultos é submetida a condições de vida degradantes e sem perspectivas.

No Brasil, apesar das inúmeras iniciativas públicas e privadas, nossas crianças também sofrem com o descaso e falta de políticas eficientes para garantir seu desenvolvimento social.

Números a serem enfrentados - com-parado com seu desempenho na área social há dez anos, o Brasil mudou para melhor. Com relação a outros países, contudo, revelam-se indicadores ainda muito negativos. Para o atual e próximos governos, a tarefa é dupla: redobrar esforços para aproximar-se dos padrões internacionais recomendáveis e, principalmente, reduzir as desigualdades internas que fazem uma mesma região apresentar índices comparáveis aos da Europa entre os mais ricos, e semelhantes aos da África, na população pobre.

A mortalidade infantil é um dos melhores exemplos da realidade brasileira. A década de 90 começou com o alarmante índice de 48 crianças de até 1 ano mortas para cada mil nascidas vivas. Terminou com 37% a menos, resultado de políti-cas públicas que combinaram atendimento pré-natal, melhorias nas condições de sanea mento, programas de aleitamento materno, de combate à desnutrição infantil e de agentes de saúde. No entanto, a média ainda é de quase 30 mortes por mil nascidos vivos. Em mortalidade infantil, o

Brasil passou da classifica-ção “alta e preocupante” da Organi zação Mundial da Saúde (OMS) para o nível “mé dio e não ideal” (entre 20 e 40).

Ao longo da déca-da, entre 1990 e 2000, a taxa de mortalidade bai xou cerca de 30%, o dobro do que se conse-guiu no mundo (14%) e 5% a mais do que se obteve na América Latina (25%). Isso quer dizer que, nesse perío-do, foram poupadas 230 mil vidas.

Técnicos do Ministério da Saúde associam o resultado à redução da fecundidade no país, ao maior acesso aos serviços de saúde (principalmente o pré-natal) e de saneamento, além do aumento do nível de escolaridade das mulheres no país.

Esses dados mostram o progresso na situação da saúde da criança brasileira, não só na questão da mortalidade infantil, mas também no declínio de mais de 50% das mortes por diarréia e 20% por pneumonias, na erradicação da poliomielite, no aumento considerável da cobertura vacinal e na prevalência da amamentação e na redução da desnutrição infantil e do baixo-peso ao nascer.

Apesar de todos os avanços, ainda existem grandes contrastes nas chances de sobrevivência infantil.

As áreas rurais apresentam o dobro de mor-talidade observada nas áreas urbana. Chama a atenção a mortalidade extremamente alta das crianças cujas mães não tiveram acompanha-mento tanto no pré-natal como no parto (207 por mil nascidos vivos – 10 vezes maior que na área urbana), situação esta mais freqüente na zona rural.

Em 2000, foram hospita lizadas no Sistema Único de Saúde (SUS) mais de um milhão e 700

mil crian ças menores de cinco anos com um custo de 648 milhões de reais. E é importante destacar que mais de 60% das causas de hospi-talização foram decor rentes de problemas respiratórios e de doenças infecciosas e pa-rasitárias.

Para concretizar as metas, o Ministério vai continuar promo-vendo a melhoria das condições de saúde das mulheres visando a garantia do nascimento seguro e a sobrevivência dos recém-nascidos, tais como: mais quali-dade na assistência pré-natal, na humanização do parto e do nas-

c imento; redução do número de cesarianas desnecessárias e melhor qualidade na assistência prestada a mãe e ao filho, incluindo a promoção do aleitamento materno nas primeiras horas após o parto.

IDH - uma boa amostra das condições de vida de um país, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), medido pela Organização das Nações Unidas (ONU), aponta que o Brasil está na 73ª posição de um ranking de 173 países. Entre 1999 e 2000, o Brasil praticamente não alterou seu índice, passando de 0,753 para 0,757 (quanto mais próximo de 1, melhor). O índice é a síntese de três dimensões sociais: longevidade, educação e renda.

Pesquisa desenvolvida pela Secretaria de Planejamento do DF, com base em parâmetros da ONU sobre IDH, mostra que vivemos entre o paraíso e a miséria. Enquanto o Lago Sul despon-ta como o melhor Índice do mundo, com 0,945, Brazlândia tem 0,761 e precisa de investimentos em educação e saúde.

O Distrito Federal ocupa uma posição privile-giada no ranking, com um IDH de 0,849, à frente de muitos países como Argentina, Chile, Arábia Saudita, e México.

Aleitamento materno: direito da criança à alimentação e à saúdeO Distrito Federal é referência nacional em aleitamento materno e tem legislação

específica para cuidar da saúde de crianças prematuras e em situação de risco

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O secretário de Planejamento, Ricardo Penna, afirma que com a pesquisa ficou claro que as regi-ões que têm a maior atividade agrícola do DF são as que têm menores IDH: Brazlândia e Planaltina. Isso mostrou, acrescenta o Secretário, que o aces-so das crianças da região rural às escolas é ruim e que a longevidade nesses locais também é baixa.

Direito de mamar - amamentação é parte de dois direitos fundamentais da criança: o Direi-to à Alimentação e o Direito à Saúde.

O direito à amamentação inclui, por um lado, o direito da mãe de amamentar e, por outro lado, o da criança de mamar.

Desde 1992 é comemorada em 120 países a Semana Mundial de Amamentação que foi idealizada pela organização não-governamental WABA (Word Alliance for Breastfeeding Action - Aliança Mundial para Ação em Aleitamento Materno) com o apoio do UNICEF. O evento tem por objetivos sensibilizar a sociedade para promover e proteger o aleitamento materno exclusivo, despertar a consciência de que amamentar é direito humano, estimular os setores públicos e privados para a necessidade de disponibilizar condições que permitam a prática do aleitamento materno, proteção e apoio ao aleitamento natural como um indicador básico de saúde e qualidade de vida.

No Brasil, a Semana Mundial de Amamen-tação acontece de 01 a 07 de outubro.

A mobilização tem sido crescente a cada ano, contando com o apoio efetivo das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, ONGs, Organis-mos Internacionais, Sociedades de Classe, Hospi-tais Amigos da Criança, Bancos de Leite Humano, Empresa Brasileira de Correios e outros parceiros importantes.

Vários temas já foram discutidos nesses 10 anos de comemorações da SMAM: “Iniciativa Hospital Amigo da Criança” (1992); “Mulher, Tra balho e Amamentação” (1993); “Faça o Código Funcionar” (1994); “Amamentar for ta lece a Mulher” (1995); “Amamentar – Responsabilidade de Todos” (1996); “Amamentar é um ato Ecológico” (1997); “Amamentar é o melhor Investimento” (1998); “Amamentar – Educar para a Vida” (1999); “Amamentar é um Direito Humano” (2000); “Amamentar na era da Informação” (2001); “Amamentação: Mulheres e bebês saudáveis” (2002) e este ano o tema é “Amamentação: paz em um mundo globalizado”.

A presidente do Departamento Científico de Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria, doutora Elsa Giugliani, informa que este ano a madrinha da Semana de Amamentação é a atriz Luiza Tomé que recentemente deu luz a gêmeos. A médica acrescenta que o tema de 2003 foi escolhido para promover as relações entre as pessoas – mães e filhos – visando criar uma maior aproximação e disseminar a semente da paz e justiça.

Tempo de amamentação - até 2001, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reco-mendava que o aleitamento materno fosse exclusivo até pelo menos os quatro meses. A recomendação mudou: passou para seis meses. Durante esse período, o bebê não deve receber nem água ou chá. A explicação é simples: tudo o que ele precisa está no leite da mãe. Além de servir como alimento, o leite materno protege o bebê contra doenças e reforça o vínculo entre mãe e filho.

Ainda na gravidez, a mulher deve também ser orientada a preparar o mamilo para a ama-mentação. Pesquisas mos tram que quanto maior o grau de es-colaridade e renda da mãe, mais tempo o bebê mama no peito. Em compensação, a duração do aleitamento materno exclusivo é menor em grandes cidades do que na zona rural.

Nos anos 80, segundo dados do Ministério da Saúde, o alei-tamento materno exclusivo até os quatro meses atingia 4% dos bebês de todo o País. No final da década de 90, esse número pulou para 40%.

Bebês que nascem prema-turos ou doentes não têm força suficiente para mamar no peito. Além disso, por causa da condição frágil, precisam ficar internados. Mas bancos de leite humano garantem que esses pequenos bebês sejam alimentados com leite materno.

Pioneirismo - o Distrito Federal tem o melhor programa de aleitamento materno do país e um dos melhores do mundo.

Além disso, é a única unidade da federação que tem uma lei que determina que todas as crianças prematuras ou em situação de risco, internadas em hospitais públicos ou particulares, sejam ama-mentadas com leite materno. A obrigatoriedade é determinada pela Lei 454/93.

A coordenadora de Bancos de Leite do Distrito Federal, doutora Sônia Maria Salviano Matos de Alencar, fala com entusiasmo sobre os resultados alcançados pelo programa de aleitamento.

Existem hoje, no DF, segundo a pediatra, 14 bancos de leite sendo oito em hospitais da rede pública, um no Hospital das Forças Armadas, um no Hospital Universitário e quatro em hospitais particulares.

Em 2002, o DF coletou 19 mil litros de leite em apenas 13 bancos, o 14º foi inaugurado este ano. No mesmo período, São Paulo, com 42 bancos, só recebeu 28 mil litros de leite por doação.

A médica ressalta, no entanto, que o sucesso se deve principalmente ao constante trabalho de conscientização das mães sobre a importância da doação. Para isso, foi montada uma rede de

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coleta eficiente. Doutora Sônia esclarece que 95% do leite que chega aos bancos é coletado na casa das doadoras. “O processo é simples, mas seguro”, afirma. “Toda mulher que estiver amamentando, com saúde em excelentes condições e que esteja disposta a doar, pode ligar para o hospital mais perto de sua casa e, após passar por uma entrevista e avaliação médica, receberá orientações sobre como colher o leite”, informa doutora Sônia. O contato também pode ser feito pelo banco de leite do Hospital Regional de Taguatinga, pelo telefone 352-6900.

A Coordenadora de Bancos de Leite do DF explica que a Vigilância Sanitária tem um papel importante no cumprimento da Lei 454/93. Segundo a doutora Sônia, os hospitais privados estão sendo vistoriados e notificados sobre a obrigatoriedade da amamentação com leite humano de crianças em situação de risco ou prematuras.

A pediatra afirma que os hospitais privados que não têm banco de leite podem e devem fazer associações com outros que possuem. No DF, somente o Santa Lucia, Santa Luzia, Anchieta e Unimed tem banco de leite.

O primeiro banco de leite do DF foi criado no Hospital Regional de Taguatinga e é referên-cia para a rede pública e privada. No dia 19 de setembro passado, o banco de leite do HRT co-memorou 25 anos de fundação com uma série de

eventos que incluíram homenagem aos criadores do banco e doadores.

Desperdício - o Brasil perde, por ano, 180 milhões de litros de leite materno por causa do desmame precoce de crianças (antes do seis meses de idade). A estimativa é do pesquisador João Aprígio Guerra de Almeida, coordenador do Banco de Leite Humano do Instituto Fernandes Filgueira, no Rio de Janeiro.

O estudo mostra, ainda, que o Brasil tem um déficit anual de 150 a 170 mil litros de leite materno.

Almeida obteve os dados analisando as taxas de aleitamento de várias pesquisas realizadas no país com a média anual de nascimentos das últimas duas décadas. De acordo com dados coletados pelo Ministério da Saúde em 1996, a freqüência de amamentação entre crianças de quatro meses é de 71,7%.“Quantas crianças poderiam ser alimentadas com esse leite? Mesmo com a melhora nas taxas de aleitamento e uma boa rede de bancos de leite no Brasil, a maior do mundo, o desperdício é excessi-vo”, afirma o pesquisador.

O desperdício de leite materno é também um desperdício de dinheiro para as famílias e para o Estado, mostra o estudo. Pelos cálculos de João Aprígio Guerra de Almeida, para repor o leite desperdiçado, seria necessário gastar US$

208 milhões em leite tipo C e US$ 300 milhões em leite em pó, na opção mais barata.

O pesquisador lembra que, mes-mo entre mães que amamentam, o desperdício é grande: “uma mulher que tem leite de sobra às vezes joga o resto na pia, quando o leite poderia ser doado”, afirma.

Almeida analisou também as respostas de um grupo de mulheres do Instituto Fernandes Filgueira - um centro de referência na assistência materno-infantil no país, ligado à Fiocruz - sobre o desmame precoce dos filhos. Das mães ouvidas, 77,9% disseram que pararam de amamentar porque “o leite era fraco e não susten-tava os bebês”. Para o pesquisador, o mito do leite fraco, que assusta muitas mães, é uma falsa explicação para a resistência materna à amamentação.

O leite materno é o alimento mais

completo para o bebê, sem fatores alérgicos e portador de anticorpos que protegem a criança de infecções. A volta ao trabalho foi citada por apenas 3,4% das mães como pretexto para o des-mame precoce. Outras alegações foram doença nas mamas, doença da mãe, doença do bebê, indicação médica e uso de anticoncepcionais.

Desmame precoce - a presidente do Departa mento Científico de Aleitamento Mater-no da Sociedade Brasileira de Pediatria, afirma que o desmame precoce hoje verificado – a média de amamentação exclusiva no Brasil é de apenas 23,4 dias, contra os seis meses recomendados pela Organização Mundial da Saúde – é recen-te em termos de história: “A espécie humana evoluiu e se manteve 99,9% de sua existência amamentando as suas crianças. Portanto, está geneticamente programada para receber os be-nefícios do leite humano e do ato de amamentar no início da vida”. Segundo a médica, “em todas as espécies de mamíferos, o desmame ocorre por determinação genética e instinto. A espécie humana é a única em que a ‘cultura’ exerce forte influência na época do desmame”. E continua: “Acredita-se que a duração da amamentação na espécie humana, sem a influência da cultura, seria por um período entre três a sete anos. A Organi-zação Mundial da Saúde recomenda dois anos ou mais de aleitamento materno, sendo os primeiros seis meses de amamentação exclusiva – quando a criança recebe somente leite materno, sem ou-tros líquidos ou sólidos, incluindo água e chás. No segundo ano de vida, o leite materno continua sendo uma importante fonte de nutrientes, além de continuar conferindo proteção contra doenças infecciosas”.

As vantagens - para a doutora Elsa Giugliani, talvez o papel mais importante da amamentação se dê sobre a redução dos índices de mortalidade infantil, graças aos vários fatores existentes no leite materno, que protegem contra uma série de doenças comuns na infância: “Estima-se hoje que o aleitamento materno poderia reduzir em 50% as mortes por doenças respiratórias e 66% as que ocorrem por diarréia no mundo”.

Um estudo brasileiro publicado na década de 80 na prestigiada revista científica inglesa “The Lancet” registrou uma mortalidade infantil por diarréia 14,2 vezes maior em crianças não amamentadas quando comparadas com bebês amamentados que não recebiam outros leites,

Vantagens do leite materno

O leite materno é o mais completo alimento para o bebê até o 6º mês de vida. Além de alimentar e de proteger a criança contra doenças, a amamentação contribui para o seu desenvolvimento psicomotor e emocional. Veja mais algumas vantagens:

• O leite materno é de fácil digestão.• O leite materno imuniza o bebê contra

doenças como diarréia, resfriados, infecções uriná-rias e respiratórias, alergias e problemas na arcada dentária.

• O ato de mamar auxilia o movimento dos músculos e ossos da face, promovendo melhor flexibilidade na articulação das estruturas que parti-cipam da fala.

• O ato de mamar estimula o padrão respi-ratório nasal no bebê, facilitando a oxigenação de suas estruturas faciais.

• A amamentação é uma forma muito espe-cial e fortalecedora do relacionamento entre mãe e filho, que transmite segurança, carinho e amor ao bebê.

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e uma mortalidade por infecção respiratória 3,6 vezes maior. O estudo, realizado por pesquisadores da Universidade Federal de Pelotas, no Rio Grande do Sul, e que se tornou referencia internacional, alertou a comunidade científica sobre o impacto da ausência do leite materno na mortalidade infantil.

O leite materno protege contra o apa-recimento e a gravidade das diarréias, pneu-monias, infecções de ouvido e outras infecções. “Além da proteção contra doenças, por ser o da espécie, o leite materno propicia uma nutrição de alta qualidade para a criança, promovendo crescimento e desenvolvimento ótimos. A amamentação também contribui para a saúde da mulher, protegendo contra o câncer de mama e de ovário, comenta a presidente do Departamento Científico de Aleitamento Materno da SBP.

Doutora Elsa acrescenta que os benefícios não se restringem ao período da amamentação. “Recentemente, tem sido demonstrado que o aleitamento materno estimula ativamente e direciona o sistema imunológico da criança. E é este sistema que ela carrega para o resto da vida. Por exemplo, foi verificado que a não exposição a outros tipos de leite antes dos quatro meses de vida retarda o aparecimento de asma e reduz em 25% o risco desta doença aos seis anos. Além disto, a exposição precoce ao leite de vaca (an-tes dos quatro meses) pode ser um importante determinante do Diabetes Mellitus Tipo 1 e pode aumentar o risco de aparecimento em 50%. Es-

Eventos que promovem a amamentação:

A Sociedade de Pediatria do DF e a Coordenação de Bancos de Leite promovem durante todo o mês de outubro uma série de atividades para incentivar e divulgar o aleitamento materno.

A partir do dia 1º, os alunos das escolas públicas e particulares de Taguatinga participam de concurso de desenho, frase e redação sobre a importância do aleitamento.

Os alunos das faculdades, também de Taguatin-ga, podem se inscrever no concurso que vai escolher a melhor peça publicitária sobre o tema.

No dia 15 de outubro acontece no HRT uma gincana de reciclagem sobre o tema para profis-sionais de saúde. Já no dia 16, haverá um encontro entre doadoras e receptores de leite materno, às 15 horas, no banco de leite do Hospital Regional de Taguatinga.

Os representantes do comércio e industria da sa-télite participam no dia 18 de outubro de seminário sobre a importância da amamentação e legislação específica.

Também no dia 18 de outubro serão conhecidos os vencedores da gincana com os profissionais de saúde, do concurso de desenho, frase e redação e o autor da peça publicitária.

tima-se que quase 30% dos casos de Diabetes Mellitus Tipo 1 poderiam ser prevenidos se 90% das crianças até três meses não recebem leite de vaca”, acrescenta.

Também o exercício que a criança faz para retirar o leite do seio da mãe é importante: “Por ser mais prolongado e adequado que o feito com a sucção da mamadeira, promove o crescimen-to e desenvolvimento crânio-facial ósseo, muscular e funcional”, explica a pediatra.

A médica ressalta que o aleita-mento “é uma relação amorosa e saudável entre mãe e filho, que certa-mente vai repercutir na saúde mental e nas relações interpessoais do indiví-duo para o resto de sua vida”.

Números do aleitamento - se-gundo os dados do Ministério da Saú-de divulgados em 2000, as mulheres brasileiras estão ama mentando seus filhos somente com o leite de peito, em média, apenas 23,4 dias. A dura-ção do aleitamento materno exclusivo é maior em Fortaleza, onde a média foi de 63,6 dias, em Belém (56,1 dias), em Florianópolis (55,6 dias) e no Distrito Federal (45 dias). Enquanto isso, apresentam os meno-res valores: Cuiabá (5,1 dias), Recife (6,8 dias), Manaus (7,6 dias) e Maceió (8,2 dias). Os dados

foram coletados em 25 capitais e no Distrito Federal durante a segunda etapa da Campanha Nacional de Imunização, em 16 de outubro de 1999. A amostra foi de 52.375 crianças menores de um ano.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069, no artigo IV, diz bem claro que é dever da família, da sociedade, e do Poder Público assegurar à mesma, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos, entre outros, à alimentação adequada, que inclui ser amamentada. Uma norma da OMS institui o aleitamento materno até o sexto mês como forma exclusiva de oferta alimentar. Porém, nossa legislação trabalhista estabelece que a mãe deve retornar às atividades ao completar quatro meses pós-parto, isto se não entrou de licença algum tempo antes do parto.

Outro aspecto importante é a legislação que regulamenta a propaganda e o estímulo aos produtos substitutos do leite materno que na grande maioria das vezes não é comprida, incluída a questão das inadequadas mamadeiras. Passando neste caso pela não fabricação de brinquedos ou bonecas que induzam a menina a ser orientada no futuro a valorizar atitudes que afastem a futura mãe de amamentar seu filho.

Cuidar com seriedade e responsabilidade da alimentação das nossas crianças, muito mais que necessidade é uma obrigação, pois significa o futuro de todos nós. Porém percebemos que muitas das pessoas que estão em posição e condições de investir e trabalhar neste sentido, não correspondem ou se omitem.

Amigo da criança é amigo do peito e conseqüentemente amigo do amor, do afeto e do futuro.

Ser humano, ser amigo do peito