Alguns dedos de Prosa: conversando sobre Psicologia ... · conversando sobre Psicologia, Educação...
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12/7/2011 | Maristela Barenco Corrêa de Mello | (24) 2237-5801
Alguns dedos de Prosa:
conversando sobre Psicologia,
Educação Ambiental, Cultura
da Paz e Espiritualidade
Este Informativo é uma
publicação semanal dedicada a
Educadores, cujos conteúdos
são de inteira responsabilidade
da autora. Seu objetivo é
formativo: oferecer subsídios e
reflexões em Psicologia,
Educação Ambiental, Cultura
da Paz e Espiritualidade, e
renovar o propósito rumo a
uma educação transformadora.
De que Educação Ambiental estamos falando?
Em um mundo extremamente complexo, atravessado por uma diversidade de
projetos de sociedade, precisamos sempre evidenciar a serviço de que projeto de
sociedade e mundo estamos, assim como de que Educação Ambiental estamos falando,
já que há muitas, distintas e legítimas concepções compartilhando um mesmo campo.
Nosso objetivo é contribuir com a formação de Educadores. Formação como
um processo em construção, comprometido com tudo o que nos faz pensar melhor, com
tudo o que nos faz pensar sobre o nosso próprio pensamento, com concepções filosóficas
de base, que nos ajudem a entender que o que está em questão quando falamos de
Educação Ambiental não é apenas a proposição de novas práticas mas, sobretudo, de
novas lógicas e maneiras de ser e de habitar o mundo.
Há alguns campos do saber em que a proposição de práticas não implica
necessariamente a aquisição de novas lógicas e novas posturas, e de um
redimensionamento do ser humano diante da vida. A Educação Ambiental implica não
apenas um novo modo de pensar e de agir, mas também um novo modo de conceber o
ser humano no entrelaçamento de todas as questões. Isso não se consegue sem reflexão,
sem formação, sem o envolvimento do sujeito do conhecimento no próprio processo do
conhecimento.
No artigo intitulado ‘O “complexo Deus” moderno’, desta semana, Leonardo
Boff nos pergunta: “Que poder temos sobre a natureza? Quem domina um tsunami?
Quem controla o vulcão chileno Puyehe? Quem freia a fúria das enchentes nas cidades
serranas do Rio? Quem impede o efeito letal das partículas atômicas do urânio, do césio
e de outras liberadas, pelas catástrofes de Chernobyl e de Fukushima?” A pertinência de
tais perguntas nos adverte que podemos “mitigar” os impactos da ação antrópica no
mundo, mas não dominar a força da vida. As tecnologias associadas a novas lógicas e a
serviço de um projeto de Vida têm sentido. Mas não nos iludamos em relação às
mudanças em nós mesmos que precisaremos operar. São mudanças dolorosas,
inevitáveis. Por isso é tempo de pensar as nossas premissas!
Boletim No. 2, Ano I
2 conhecimento, ambos circunscritos no
espaço formal da Escola e da
Universidade, tornaram-se formas
hegemônicas de consolidar o
conhecimento. Isso nos fez acreditar que a
racionalidade humana responde por todas
as dimensões do ser humano, e que a
ciência responde por todas as formas de
conhecimento. Tal reducionismo contribui
também para a crise ecológica .
Ainda que reconheçamos a importância
da ciência moderna e nem mais
consigamos imaginar como seria viver sem
tudo o que ela nos proporciona,
precisamos resgatar a força dos saberes
que foram invisibilizados pela
modernidade e que equilibram o mundo.
Educação Ambiental: por
uma diversidade de saberes
No último Informativo, propusemos uma
das premissas da Educação Ambiental como
uma nova forma de se elaborar o
conhecimento e os saberes, levando em
conta as relações entre tudo o que existe.
Hoje trazemos outra premissa,
complementar à primeira: o reconhecimento
da diversidade de formas de conhecer, de
pensar e de fazer como expressão legítima de
uma Educação Ambiental.
Historicamente, com o advento da ciência
moderna, um método científico de conhecer,
aliado a um modo racional de se construir o
Sugestões de Leituras
ROIZMAN, Laura Gorresio;
FERREIRA, Elci. Jornada de Amor
à Terra. Ética e Educação em
Valores Universais. 2ª edição. São
Paulo: Palas Athena, 2006, 205 p.
Em papel reciclado, sob uma diagramação extremamente lúdica, que conjuga desenhos, textos, sugestões de dinâmicas e jogos, documentos internacionais como o Tratado de Educação Ambiental, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, entre outros, informações sobre espécies de árvores e pensamentos de autores clássicos, este livro sensibiliza para temas de Educação Ambiental e Cultura da Paz, evidenciando que uma maneira de compreender a vida e as suas inter-relações é, ao mesmo tempo, ecológica e pacífica. Enfatizando a riqueza da vida, da biodiversidade e de uma ética da diferença, o presente livro traz informações de cunho científico sobre o Meio Ambiente, inserindo nele um ser humano que não está fora e nem sobre a vida, mas que faz parte mesmo dela, e que precisa redimensionar o seu lugar.
Em termos de preservação da biodiversidade, de nada serve a ciência moderna, e sim os conhecimentos
indígenas e camponeses, cujas áreas têm um índice de 80% da biodiversidade (Santos)
Boaventura de Sousa Santos, em seu livro Epistemologias do Sul (2007, p.
33) fala-nos que é indubitável a importância do conhecimento científico para levar o
ser humano à Lua. Mas nos chama a atenção que em termos de preservação da
biodiversidade, de nada serve a ciência moderna, e sim os conhecimentos indígenas e
camponeses, cujas áreas têm um índice de 80% da biodiversidade. E conclui dizendo
que se queremos ambas as aquisições, precisamos das duas formas de conhecimento.
Outro exemplo interessante nos traz Marina Silva, narrada em sua biografia,
no livro “Marina: a vida por uma causa” de Marília de Camargo César (2010, p. 104),
quando fala dos saberes caboclos que não falham, como, por exemplo, a previsão de
chuva: para além da certeza meteorológica dos técnicos, o caboclo da Amazônia sabe
que quando as formigas às margens do rio passam do formigueiro abaixo para o de
cima, é certa a chuva que faz subir o leito dos rios. Tal conhecimento é complexo e
rico, porque faz parte da interação entre o ser humano e natureza, consolidada ao
longo dos anos.
Na perspectiva da diversidade das formas de conhecer, para além da
racionalidade, e para além da ciência moderna, a Educação Ambiental precisa estar
atenta às múltiplas dimensões humanas – a sensibilidade, a emoção, a espiritualidade,
a experiência -, e às múltiplas formas de diálogo entre o ser humano e a vida que,
para Maturana e Varela, constituem o próprio ato de aprender.
Paulo Freire, ao se referir à leitura do mundo como uma aquisição que
precede à leitura da palavra, em sua memória poética, evidencia-nos que as relações
de conhecimento entre nós e o mundo vão se dando através de relações com
multiplicidades infinitas de visões, formas, de sons, de movimentos, de cheiros, de
toques, e cores, de estações, de elementos da natureza, de humores.
Precisamos apostar numa Educação Ambiental comprometida com a
diversidade de dimensões humanas e com a diversidade epistemológica do mundo.
Como nos diz Santos, não é possível uma justiça social global sem uma justiça cognitiva
global. Eu acrescentaria: Não é possível uma justiça ecológica global sem uma justiça
cognitiva global, ou seja, sem uma inclusão dos múltiplos saberes e sujeitos que os
produzem, não apenas na Academia, mas também no drama diário da existência.
Por uma Eco-espiritualidade
3
Sugestões de Atividades: Aprendendo a permanecer no
momento presente
Em um ambiente harmonizado, com as
cadeiras em círculo, o educador, após
fazer algumas respirações com os
participantes, motiva-os para um
exercício a ser feito em silêncio.
Mostra uma caixa aberta, que
representa o PASSADO, ou seja, todos
os pensamentos e memórias que,
embora já tenham acontecido,
normalmente atraem o nosso
pensamento e nos impedem de
permanecer no presente. Cada
participante recebe a caixa de seu
vizinho e, num gesto simbólico,
deposita nela tal memória passada.
Após a caixa retornar ao educador,
uma nova caixa é apresentada, agora
representando FUTURO, ou seja, todos
nos nossos projetos ou questões que
nos geram ansiedade e
desconcentração. Da mesma forma,
cada participante recebe a caixa e,
num gesto simbólico, deposita tal
pensamento. Enquanto cada
participante faz seu gesto, todo grupo
permanece em silêncio. Ao final, o
educador retoma as duas caixas, fecha-
as e coloca-as ao centro. Neste
momento ele busca sensibilizar os
participantes para o fato de que o
passado e o futuro são realidades
ilusórias, porque não existem de fato e
são inacessíveis. Enfatiza a
importância de estarmos inteiros
diante da vida que se apresenta
apenas no PRESENTE, toda vez que
desapegamos da nostalgia do
PASSADO e da ansiedade em relação
ao FUTURO Conclui-se partilhando os
sentimentos e impressões.
A busca crescente por uma Eco-espiritualidade não é um fenômeno
recente, novo, de cunho esotérico, que esteja na moda. É, sobretudo, um jeito de
re-significar a Espiritualidade, tendo em vista os desafios por que passam a Vida e a
Mãe-Terra, a Pacha Mamma dos povos nativos e andinos.
Há duas definições significativas para nos fazer entender o que vem a
ser Espiritualidade. Para S. S. Dalai Lama, a espiritualidade é tudo aquilo que
produz no ser humano uma mudança interior e o torna voltado para valores como
compaixão, tolerância, capacidade de perdoar, contentamento – que gera
felicidade para si e para os outros. Para Leonardo Boff, a espiritualidade é a
conexão com a fonte originária de sentido pleno, espaço sagrado do Espírito, que
se manifesta numa vida voltada para valores.
Diferentemente do fenômeno religioso, particular, que insere o crente
em um conjunto de práticas e credos, a espiritualidade é um fenômeno de
abertura para a Vida, de reconhecimento da existência de uma dimensão de
mistério, de encantamento diante das expressões de sacralidade da Vida. O prefixo
“eco” vem do grego oikos, que significa casa e o conjunto de suas inter-relações.
Assim, a Eco-espiritualidade é um modo planetário que nos faz estar a
serviço da Vida, que se revela no modo como habitamos as muitas casas e
moradas humanas: o corpo, a família, a casa, o planeta. É a volta a estas moradas,
cultivando um espírito de reverência e cuidado para com todas as relações.
Segundo A Carta da Terra, Eco-espiritualidade é o reconhecimento de que todos os
seres são interligados, formando uma mesma Comunidade de Vida, e cada forma
de vida tem valor, independente do uso humano.
VOCÊ SABIA?
4
Experiências que valem a pena compartilhar
Ainda que tenhamos manifestado o desejo de não crescer enquanto
Informativo, os processos não nos pertencem. Esta semana, por conta do
Informativo, tivemos contato com algumas experiências interessantes em Educação
Ambiental. Tendo em vista a importância desta experiência social que, segundo
Boaventura de Sousa Santos, vêm sendo desperdiçada mundialmente, optamos por
trazer uma experiência a cada Informativo.
O nascimento da Agrovida
Nas montanhas dos arredores de Petrópolis (RJ) há uma Comunidade Rural
chamada Bonfim, antiga sede de uma Fazenda, hoje área do Parque Nacional da
Serra dos Órgãos, onde vivem muitas famílias de agricultores de hortaliças. Desde
1994, pelo Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis, acompanhamos
aquela comunidade, sobretudo através de um trabalho com crianças, juventude e
ecologia.
Apesar das muitas tentativas de sensibilização para um trabalho voltado
para a produção agroecológica, a agricultura local e familiar estruturou-se de forma
convencional, com uso de agrotóxicos.
Entre os jovens que acompanharam todas as fases do processo e da
presença do CDDH, estava Fabiano, hoje já adulto, e educador na própria
organização. Embora seus pais trabalhassem com agricultura convencional, Fabiano
sempre manteve o interesse e a curiosidade por formas agroecológicas de plantio,
tendo em vista o equilíbrio com a natureza. Depois de conhecer outras e novas
experiências com agroecologia no Sul, com duas organizações parceiras – Centro
Ecológico e Cetap – e depois de pesquisar de forma autodidata sobre os princípios
da Permacultura, Fabiano conseguiu sensibilizar os seus pais para uma mudança na
forma de plantio e cultivo. Há um ano e meio acompanhamos a família de Fabiano,
nesta transição, subsidiados por um pequeno projeto por parceiros suíços, mediado
pelo CDDH, para a construção de uma estufa e a compra de sementes.
As plantações, em forma de Mandalas, anunciam a primeira colheita, neste
momento, de vários tipos de alfaces, rúcula, agrião, repolho, cenoura, cheiro verde,
manjericão, alecrim. É com muita alegria, celebrando a colheita próxima, que
estamos formando o primeiro pequeno grupo de consumidores da Comunidade
Agrovida. Ainda em processo de certificação formal, damos o aval inicial para a
primeira colheita.
A proposta é formar um grupo permanente, que irá receber uma cesta
semanal. Se você é de Petrópolis e tem desejo de fazer parte deste grupo, entre em
contato conosco para fazermos o seu cadastro. Afinal, a forma como consumimos, e
as relações diretas de fortalecimento dos empreendimentos pequenos e locais são
maneiras concretas de inventar novos modos de vida. Parabéns à Agrovida e à sua
coragem de mudar a forma de se relacionar com a Vida!
Maristela Barenco Corrêa de Mello
Graduada em Teologia (ITF
Petrópolis), Psicologia (Universidade
Católica de Petrópolis), Mestre em
Educação (UERJ) e Doutora em Meio
Ambiente (UERJ). Formada em
Terapias Holísticas (ASBAMTHO).
Educadora social há 25 anos.
Fotografias
1) Produção agroecológica da
Agrovida (2011)
2) Escola nos arredores de Chennai,
Sul da Índia (2010)
3) Oficina da Carta da Terra para
Educadores em Torres, RS (2008)
Maristela Barenco
Corrêa de Mello
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