Ainda o livro didático - Pensando o impresso e o(s) (multi)letramento(s)

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Fabiana Panhosi Marsaro RA 070758 LP001 Introduo aos Estudos do Letramento/Prof Dr Roxane Rojo IEL/UNICAMP Julho de 2011 Ainda o livro didtico? Pensando o impresso e o(s) (multi)letramento(s) Resistindo s constantes transformaes do mundo contemporneo, o livro didtico no contexto deste trabalho especificamente o livro didtico de Lngua Portuguesa, doravante LDP continua a ocupar seu lugar de material de ensinoaprendizagem majoritrio nas escolas brasileiras, principalmente pblicas, consolidado e sustentado ao longo das ltimas dcadas. Tendo como trao constitutivo o fato de ser ao mesmo tempo um instrumento pedaggico e um produto comercial, o LDP determina no s muitas das prticas que acontecem em sala de aula, mas tambm de forma direta a lucratividade das editoras que o produzem. No sem razo, portanto, que nos ltimos anos a Literatura a seu respeito venha sendo continuamente ampliada, inclusive com pesquisas que procuram compreender o funcionamento desse subsetor editorial, em torno do qual se definem polticas educacionais, desenvolvem-se processos de controle curricular e se organizam prticas de escolarizao e letramento 1 (BATISTA; ROJO; ZUIGA, 2005, p. 1). Entretanto, como Lemke (2010) faz questo de provocar,faz um bom tempo que as tecnologias do letramento no so to simples quanto a caneta, a tinta e o papel. E na era da imprensa, assim como antes dela, o letramento raramente esteve atrelado de forma estrita ao texto escrito (LEMKE, s/p, 2010).

De fato, assim como as novas tecnologias diversificam e complexificam continuamente as prticas de linguagem, os perfis dos sujeitos letrados e as ideologias sobre o papel da leitura e da escrita (BUZATO, 2009, p. 12), o volume de informaes [que circulam na sociedade] [...] constantemente superado, colocando novos parmetros para a formao dos cidados (ROJO, 2009, p. 89). As crianas e adolescentes que atualmente frequentam as escolas, pelo simples fato de terem nascido1

Ainda que a citao utilize o termo letramento, no singular, destacamos que a perspectiva que adotamos a dos letramento s mltiplos, necessariamente no plural, a partir dos novos estudos do letramento (NEL/NLS). Esse posicionamento ser justificado ao longo deste trabalho, uma vez que esse um de seus propsitos.

aps a dcada de 70, junto a todos os outros chamados nativos digitais, pertencem gerao conhecida como gerao (inter)net (netgeneration) ou gerao digital (digital generation) (NOGUEIRA, 2007, p. 80), mesmo que essa nomenclatura no acompanhe necessariamente o acesso a computadores e a conexes de boa qualidade, como acontece com grande parte da populao. Dessa forma, a escola est diante do paradoxo de educar essa gerao atravs de materiais predominantemente impressos para uma realidade que se diz e que cada vez mais online, digital, multimodal e plural, mesmo que as necessidades atuais de leitura e aprendizagem j no sejam mais totalmente saciadas (ou motivadas) apenas pelo texto verbal escrito. Podemos dizer que, instituio escolarcabe a responsabilidade de criar condies para que o seu alunado se aproprie de letramentos que, de fato, possibilitem o seu trnsito em diversas esferas da atividade humana presentes nas sociedades contemporneas (GRIBL, 2009, p. 46).

Torna-se, assim, cada vez mais necessrio se pensar em novas propostas, no de suportes e plataformas apenas, mas de novos gneros com fins didticos que possam dar conta das demandas atuais. Lemke (2010), entendendo a complexidade da tarefa, questiona:Quais sero as novas tecnologias da informao que podero apoiar melhor um paradigma de aprendizagem interativo e fazer uso desses letramentos multimiditicos e informticos que sero genuinamente necessrios para todos? (LEMKE, 2010)

Podemos somar a essa questo muitas outras: Como as editoras vm lidando com essa realidade? Existem realmente maneiras de o livro impresso educar para o digital? Por quais adequaes tm passado os LDP para atender s novas demandas do mundo contemporneo? Como o mercado editorial encara esse novo pblico, que o das crianas e adolescentes da gerao digital? Que pressupostos sobre os letramentos esto implcitos nessas novas (ou velhas) prticas? Antes de tentar responder a essas inquietaes, ou pelo menos problematiz-las, consideramos importante nos debruarmos mais detidamente sobre a noo de letramentos e a trajetria que o conceito percorreu ao longo do tempo, transformando-se para acompanhar os impactos profundos dos fatores histricos, sociais e culturais sobre as j complexas relaes entre leitura e escrita na sociedade.

O termo letramento foi utilizado pela primeira vez no Brasil, segundo Kleiman (1995), em 1986, por Mary Kato, como traduo do vocbulo ingls literacy 2, procurando dar conta da noo que hoje para ns a dos alfabetismos. poca, estava claro que o conceito de alfabetizao, relativo ao processo aparentemente simples3 de construo do conhecimento sobre a relao entre os sons e as letras (ROJO, 2009, p. 69) era insuficiente, uma vez que considerar algum como analfabeto ou alfabetizado dizia muito pouco sobre o estado ou condio (SOARES, 2003 [1995], p. 29) daquele sujeito e sobre aquilo que ele era efetivamente capaz de fazer com a leitura e a escrita. Tornou-se necessrio, portanto, um novo conceito, de natureza sobretudo psicolgica e de escopo individual (ROJO, 2009, p. 45), que permitisse mensurar, entre os indivduos de uma populao, o quo aptos eles estavam ou no para funcionar em uma sociedade que tinha suas prticas cada vez mais centradas na escrita, dada a crescente urbanizao e industrializao dos pases. Passou-se a falar, ento, em nveis de alfabetismo, sendo que estes permitiam medir o conjunto de competncias e habilidades ou de capacidades envolvidas nos atos de leitura ou de escrita dos indivduos (ROJO, 2009, p. 97), associados aos medidores e ndices oficiais, como os da UNESCO e, no Brasil, mais recentemente, o Indica dor de Alfabetismo Funcional (INAF), que pesquisa anualmente a capacidade de leitura, escrita e clculo da populao brasileira (ROJO, 2009, p. 43). Mesmo que ampliasse os sentidos no recobertos pelo conceito de alfabetizao, porm, o conceito de alfabetismo, ainda sobreposto ao de letramento sendo que muitas vezes os termos eram utilizados como sinnimos continuava no bastando, pois no atendia a complexidade do conjunto de prticas sociais ligadas leitura e escrita em que os indivduos se envolvem em seu contexto social (SOARES, 1998, p. 72). Paulo Freire, ainda nomeando como alfabetizao a capacidade de organizar reflexivamente o pensamento, desenvolver a conscincia crtica e ser capaz de introduzir os sujeitos no processo real de democratizao da cultura e de libertao (GRIBL, 2009, p. 40), foi um dos pioneiros na reflexo de cunho social a respeito das prticas que envolviam a leitura e a escrita. Foi-se percebendo que o alfabetismo funcional, essencialmente adaptativo, seja ao mundo do trabalho ou da escola, era muito institucional, ligado s necessidades, ao uso, no promovendo as transformaes sociais2 3

Ainda hoje usado na lngua inglesa tanto para alfabetizao quanto os letramentos. As arbitrariedades fono-ortogrficas da lngua, as relaes entre lngua oral e lngua escrita e as variedades regionais e sociais so apenas alguns dos complicadores no processo de alfabetizao que no , portanto, nem simples, nem transparente e exige um longo trabalho de construo por parte dos alunos e de ensino pelos professores (ROJO, 2009, p. 69).

prprias daquele que seria um alfabetismo crtico, ideolgico, empoderador4. Ainda que continuassem a existir oscilaes de nomenclatura5, foi a partir desse tipo de pensamento que o conceito de letramento foi sendo reformulado, afastando-se cada vez mais da noo de alfabetismo apenas. Hoje, podemos dizer queas prticas de letramento que exercemos em nossas vidas vo constituindo nossos nveis de alfabetismo ou de desenvolvimento de leitura e de escrita; dentre elas, as prticas escolares. Mas no exclusivamente [...]. possvel ser no escolarizado e analfabeto, mas participar, sobretudo nas grandes cidades, de prticas de letramento (ROJO, 2009, p. 98).

Segundo Rojo (2009, p. 98), a partir da obra de Street (1984), divulgada no Brasil principalmente por Kleiman (1995), e dos novos estudos do letramento (NEL/NLS), que essas noes tornam-se mais claras. Num primeiro momento, as pesquisas passam a falar em dois enfoques diferentes a respeito do letramento: o autnomo e o ideolgico. No primeiro enfoque, a idia a de que o letramento, de forma autnoma e institucionalizada, influencia o desenvolvimento social, cultural e cognitivo dos indivduos, ou seja, o contato (escolar) com a leitura e a escrita, pela prpria natureza da escrita, faria com que o indivduo aprendesse gradualmente habilidades que o levariam a estgios universais de desenvolvimento (nveis) (ROJO, 2009, p. 99). J o segundo enfoque, o ideolgico, numa perspectiva scio-histrica, consideraas prticas de letramento como indissoluvelmente ligadas s estruturas culturais e de poder da sociedade e reconhece a variedade de prticas culturais associadas leitura e escrita em diferentes contextos (STREET, 1993, p. 7, apud ROJO, 2009, p. 99).

Soares (1998) faz uma distino parecida, falando em verso fraca e forte do letramento, noes respectivamente ligadas aos modelos autnomo e ideolgico de Street. De forma semelhante ao autor, Soares (1998) vai propor, segundo Rojo (2009), que a verso fraca de letramento (neo)liberal e estaria ligada a mecanismos de adaptao da populao s necessidades e exigncias sociais do uso de leitura e escrita,4

Do ingls Empowerment Soares (2003 [1995]: 41), por exemplo, chega a afirmar que o neologismo [letramento] parece desnecessrio, j que a palavra verncula alfabetismo [...] tem o mesmo sentido de literacy (ROJO, 2009, p. 99).5

para funcionar em sociedade (ROJO, 2009, p. 99), na raiz, portanto, do conceito de alfabetismo funcional. J a verso forte, reconhecendo a variedade e complexidade das diversas prticas sociais vivenciadas pelas pessoas,seria revolucionria, crtica, na medida em que colaboraria no para a adaptao do cidado s exigncias sociais, mas para o resgate da autoestima, para a construo de identidades fortes, para a potencializao de poderes (empoderamento, empowerment) dos agentes sociais, em sua cultura local, na cultura valorizada (ROJO, 2009, p. 100).

Assim, descrevendo, no mensurando, podemos falar em letramentos, necessariamente no plural, desenvolvidos, construdos e vivenciados em prticas sociais sempre situadas histrico e socioculturalmente, que envolvem no s a escrita, mas tambm outras modalidades (ROJO, 2009). Os mltiplos letramentos, portanto, dividem-se, em locais e dominantes ou, como denomina Hamilton (2002, p. 4, apud ROJO, 2009, p. 102), em institucionalizados e vernaculares. Enquanto os letramentos dominantes, valorizados, esto sujeitos a instituies e prevem agentes (professores, autores de livros didticos, especialistas, pesquisadores, burocratas, padres, pastores, advogados e juzes) (ROJO, 2009, p. 102), os letramentos locais tm sua origem na vida cotidiana, nas culturas locais. Como tal, frequentemente so desvalorizados ou desprezados pela cultura oficial e so prticas, muitas vezes, de resistncia (ROJO, 2009, p. 103). De acordo com Rojo (2009), importante considerar que as novas configuraes da sociedade tm tido impacto direto nos letramentos, principalmente nos dominantes, e, por isso, devem ser encaradas de maneira crtica pela escola. As quatro principais mudanas elencadas pela autora so: i) a vertiginosa intensificao e a diversificao da circulao da informao nos meios de comunicao analgicos e digitais (ROJO, 2009, p. 105), que tm colocado em xeque o impresso e o papel; ii) a diminuio das distncias espaciais (ROJO, 2009 p. 105), que tem efeitos sobre a construo das identidades e o enraizamento das populaes; iii) a diminuio das distncias temporais ou a contrao do tempo (ROJO, 2009 p. 105), que tm tornado o instantneo e o imediato as medidas que regem o cotidiano; iv) a multissemiose ou a multiplicidade de modos de significar que as possibilidades multimiditicas e hipermiditicas do texto eletrnico trazem para o ato da leitura (ROJO, 2009 p. 105),

que tem tornado o texto verbal escrito insuficiente diante das possibilidades de associao a signos de outras modalidades. Ainda segundo a autora, no contexto dessas mudanas est uma cultura de massa, fruto da globalizao e da sociedade de consumo, que padronizada, monofnica, homognea e pasteurizada [...] Por isso, se tornam to importantes hoje as maneiras de incrementar, na escola e fora dela, os letramentos crticos, capazes de lidar com os textos e discursos naturalizados, neutralizados, de maneira a perceber seus valores, suas intenes, suas estratgias, seus efeitos de sentido (ROJO, 2009, p. 112).

na esteira desses mesmos desafios que o Grupo de Nova Londres 6 se prope a pensar que pedagogia poderia dar conta de maneira crtica e situada da heterogeneidade, pluralidade e das tenses que permeiam a sociedade e, consequentemente, a educao, na contemporaneidade. Para eles, o prefixo multi, no conceito de multiletramentos, envolvepor um lado, a multiplicidade de linguagens, semioses e mdias envolvidas na criao de significao para os textos multimodais contemporneos e, por outro, a pluralidade e diversidade cultural trazida pelos autores/leitores contemporneos a essa criao de significao (ROJO, a sair, p. 1).

Assim, para os autores, uma pedagogia dos multiletramentos deve desenvolverse recobrindo trs mbitos essencialmente (KALANTZIS; COPE, 2006): o do trabalho, considerando a diversidade produtiva, uma vez que no ps-fordismo, espera-se um trabalhador multicapacitado e autnomo, flexvel para adaptao mudana constante (ROJO, a sair, p. 2); o da cidadania, levando-se em conta o pluralismo cvico, ou seja, frente s prticas arraigadas e sedimentadas no contexto escolar, provocar a coesopela-diversidade, comprometer-se com o papel cvico e tico das pessoas (ROJO, a sair, p. 4); e o da vida pessoal, pensando-se as identidades multifacetadas, apropriadas a diferentes modos de vida, espaos cvicos e contextos de trabalho em que cidados se encontram (ROJO, a sair, p. 2).

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O New London Group, formado por tericos como Bill Cope e Mary Kalantzis, James Paul Gee, Gunther Kress, Sarah Michaels e Martin Nakata, reuniu-se pela primeira vez em 1996, na cidade de Nova Londres, nos Estados Unidos. Desse encontro originou-se o manifesto Uma pedagogia dos multiletramentos: Projetando futuros sociais, publicado pela Harvard Educational Review.

Um ponto fundamental, mas pouco teorizado pelo Grupo, entretanto, o da(s) cultura(s) do alunado. Como Rojo enfatiza, no h uma maior ateno ao hibridismo cultural caracterstico da alta modernidade (a sair, p. 5). Uma soluo que a autora prope, a partir de Garca-Canclini (2008[1989]), tratar as produes culturais letradas em efetiva circulao social como um conjunto de textos hbridos de diferentes letramentos (vernaculares e dominantes), de diferentes campos j eles, desde sempre, hbridos (ditos popular/de massa/erudito), que se caracterizam por um processo de escolha pessoal e poltica e de hibridizao de produes de diferentes colees. Para o autor, a produo cultural atual se caracteriza por um processo de desterritorializao, de descoleo e de hibridao que permite que cada pessoa possa fazer sua prpria coleo, sobretudo a partir das novas tecnologias. Para ele, essa apropriao mltipla de patrimnios culturais abre possibilidades originais de experimentao e comunicao, com usos democratizadores (CANCLINI, 2008[1989], p. 308). Nesta perspectiva, trata-se de descolecionar os monumentos patrimoniais escolares, pela introduo de novos e outros gneros de discurso ditos por Canclini impuros , de outras e novas mdias, tecnologias, lnguas, variedades, linguagens (ROJO, a sair, p. 5).

Outra questo que se coloca a do texto contemporneo, multissemitico ou multimodal, envolvendo diversas linguagens, mdias e tecnologias (ROJO, a sair, p. 6). Atualmente, nos termos de Bolter (2002, p. 23), vivemos uma remidiao do impresso pelo digital, visto que as novas tecnologias esto modificando as possibilidades da leitura e da escrita de modo irreversvel. Os textos verbais escritos muito mais morosos e seletivos (ROJO, 2009, p. 105), tm sido constantemente colocados em relao com um conjunto de signos de outras modalidades de linguagem (imagem esttica, imagem em movimento, som, fala) que o[s] cercam, ou intercalam ou impregnam, inclusive em materiais impressos do cotidiano, como jornais e revistas, que buscam tentativas de simulao de ambientes virtuais ou de hipertextualidade. A questo da multimodalidade mostra-se, portanto, urgente no contexto dos multiletramentos. Como argumenta Lemke (2010), ns no ensinamos os alunos a integrar nem mesmo desenhos e diagramas sua escrita, quanto menos imagens fotogrficas de arquivos, videoclipes, efeitos sonoros, voz em udio, msica, animao, ou representaes mais especializadas (frmulas matemticas, grficos e tabelas etc.) (LEMKE, s/p, 2010).

Mesmo o Grupo de Nova Londres, porm, no mostrou propostas satisfatrias ou mesmo convincentes para o tratamento dessas especificidades dos textos contemporneos. Muito baseado nas categorias de anlise da semitica social de Kress e Van Leeuwen (1996), o modelo proposto pelo Grupo acaba sendo muito fragmentado e excessivamente formal, trazendo o problema de chamar excessivamente a ateno s formas e as relaes entre as formas das diferentes modalidades, em detrimento dos temas, e s regularidades em detrimento da variedade e dos hbridos (ROJO, a sair, p. 9), mutilando os sentidos dos textos. Uma sada proposta por Rojo (a sair), que no detalharemos neste trabalho, a de utilizar a teoria de gneros de discurso do Crculo bakhtiniano como ferramenta de anlise, uma vez que o carter multissemitico dos textos/enunciados contemporneos no parece desafiar fortemente os conceitos e categorias propostas (ROJO, a sair, p. 12). Diante do exposto at aqui e considerando que o papel da escola, hoje, possibilitar que seus alunos sejam letrados para participar de vrias prticas sociais que se utilizam da leitura e da escrita (letramentos) na vida da cidade, de maneira tica, crtica e democrtica (ROJO, 2009, p. 107), parece-nos claro que faz-se necessrio, ento, responder com novas estratgias aos impactos que tm transformado o letramento tradicional (da letra/livro) em um tipo de letramento insuficiente para dar conta dos letramentos necessrios para agir na vida contempornea (ROJO, 2009, p. 107).(...) tendo em vista o papel do discurso nas sociedades densamente semiotizadas em que vivemos (...) ensinar a usar e a entender como a linguagem funciona no mundo atual tarefa crucial da escola na construo da cidadania, a menos que queiramos deixar grande parte da populao no mundo do face a face, excluda das benesses do mundo contemporneo das comunicaes rpidas, da tecnoinformao e da possibilidade de se expor e fazer escolhas entre discursos contrastando sobre a vida social (MOITA-LOPES; ROJO, 2004, p. 46, apud ROJO, 2009, p. 89).

Atendendo s demandas atuais, portanto, preciso que a educao lingusticaleve em conta hoje, de maneira tica e democrtica: os multiletramentos ou letramentos mltiplos, deixando de ignorar ou apagar os letramentos das culturas locais de seus agentes [...]; os letramentos multissemiticos [...], ampliando a noo de letramentos para o campo da imagem, da msica, das outras semioses que no somente a escrita; os letramentos crticos e protagonistas requeridos para o trato tico dos discursos em uma sociedade saturada de textos

que no pode lidar com elas de maneira instantnea, amorfa e alienada [...] (ROJO, 2009, p. 107-108).

Assim, voltando ao contexto que apresentamos no incio deste trabalho, para que as pesquisas envolvendo o LDP ganhem relevncia preciso que levem em conta, cada vez mais, que estamos vivendo uma transio e que, muito em breve, o impresso conviver ou dar espao a um amplo e variado uso de novas tecnologias em sala de aula. Uma vez que a escola no pode mais ser considerada a principal agncia de letramento a que as pessoas esto sujeitas, improvvel que continue a deixar de lado o entendimento dos mecanismos de produo, circulao e recepo dos textos contemporneos, bem como dos letramentos mltiplos e multissemiticos que os alunos tm praticado para alm dos limites institucionais (BUZATO, 2008, p. 121). Por isso, a questo principal ao se pensar o LDP hoje, talvez no deva ser mais o que esse material impresso pode fazer, uma vez que, sozinho, de fato ele pode muito pouco diante das demandas atuais da educao lingustica, quando comparado ao computador ou ao texto digital, por exemplo. Provavelmente, nossas reflexes sejam mais produtivas se procurarmos apontar o que o LDP no deve fazer, uma vez que certas estratgias e abordagens podem acabar por limitar ainda mais as j escassas possibilidades de explorao desse tipo de material, o que est longe de ser desejvel para os milhares de alunos e professores que ainda o utilizam diariamente, principalmente nas escolas pblicas. No ser sem tenso, porm, que os multiletramentos adentraro as prticas escolares via LDP, afinal, podemos dizer que esses materiaisparticipam do processo dos letramentos dominantes, institucionalizados pela escola, pelos autores de livros, pelo mercado editorial e pelas propostas governamentais de avaliao, compra e distribuio dos LD em territrio nacional (GRIBL, 2009, p. 42).

Pensando-se em LD no Brasil, ingenuidade no considerar sempre a relevncia que esse tipo de material possui na dinmica editorial. As editoras, que s em 2009 lucraram aproximadamente 1,7 bilho com didticos, dificilmente abandonaro totalmente os impressos e a segurana do Programa Nacional do Livro Didtico, para se aventurarem sem garantias no universo dos materiais completamente digitais, o que s acontecer provavelmente quando as oportunidades de lucro propiciadas por possveis

parcerias com empresas de novas tecnologias, como as fabricantes de tablets, superarem as vantagens da garantia de estabilidade associada ao PNLD. Atualmente, porm, enquanto as editoras norteamericanas, por exemplo, comemoraram, no primeiro trimestre de 2011, o aumento em mais de 159,8% das vendas de livros eletrnicos (REUTERS, 2011), as nicas investidas no PNLD em livros digitais at o momento foram destinadas a programas de acessibilidade, mais especificamente aos alunos com deficincia auditiva que, desde 2007, recebem do Programa livros digitais em libras. Segundo divulgao no site do MEC7,os exemplares so formatados em CD-rom e trazem, ao final de cada ttulo, atividade ou questo em portugus e um cone de TV, o qual, ao ser clicado pelo aluno, abre uma janela. Nela, um tradutor-intrprete apresenta o contedo, em libras. Alm do CD-rom, o material inclui um livro impresso, com o mesmo contedo, para auxiliar no aprendizado da lngua portuguesa.

Ou seja, trata-se essencialmente de uma mudana de suporte. Conquanto nas obras gerais seja, de fato, tambm uma mudana de suporte o que esteja ocorrendo, visto que comprar um livro online e l-lo em um tablet no difere muito de digitalizar um exemplar e l-lo em um computador de mesa ou em um laptop, pensar em simplesmente reproduzir o LDP em um suporte que no seja o papel no nos parece muito adequado ou profcuo, tendo em vista as muitas outras possibilidades que poderiam ser exploradas com vistas aos multiletramentos. Lemke (2010) argumenta que o currculo do giz e da fala logo ser substitudo por um currculo interativo e afirma que j superamos o perodo de simples transposio do modelo de educao do livro texto para uma nova mdia de demonstrao (LEMKE, 2010, s/p), porm, nos parece que, na prtica, pelo menos no que concerne s polticas pblicas, estejamos ainda longe dessas mudanas efetivas. Tendo em mos somente o impresso, resta pouco a se fazer. Um exemplo que ilustra bem essa situao pode ser a pesquisa feita por Caiado (2010), objetivando identificar como as Tecnologias da Informao e Comunicao TICs e outros contedos digitais estavam sendo abordados ou propostos em colees didticas de lngua portuguesa aprovadas pelo PNLD. A autora analisou oito colees de Livros Didticos de Lngua Portuguesa (5 a 8 sries) aprovadas no PNLD de 2005 e 2008 e, diante dos dados gerados, props as seguintes categorias para organiz-los: a)7

Disponvel em http://portal.mec.gov.br/index.php? Itemid=86&catid=205&id=7752&option=com_content&view=article, acesso em 04 de julho de 2011.

Textos que foram retirados de sites e que trazem a referncia do site do qual foram extrados logo abaixo do texto (CAIADO, 2010); b) Textos sobre as TIC, cuja temtica versava sobre as novas tecnologias da informao e comunicao, especificamente: o computador, a internet, a linguagem digital, gneros digitais; c) o que a autora chamou de E-gneros, ou seja, a reproduo, no LDP de e-mail, blog, bate-papo, MSN, jornal eletrnico; d) Sites para pesquisa ou de pesquisa, indicados aos alunos pelo(s) autor(es) do LDP; e) Filmes (que envolvem) TIC, isto filmes que discutem questes ou utilizam elementos relacionadas s TDIC sugeridos pelo(s) autor(es) dos LDP (CAIADO, 2010); e f) Livros paradidticos relacionados s TIC, tambm indicados pelos autores aos alunos. Nos livros recomendados pelo PNLD/2008, Caiado (2010) registrou duas novas categorias: g) Produo de E-gneros (como os exemplos acima citados) e o que a autora chamou de h) Linguagem Digital e que definiu como a linguagem utilizada pelos internautas no meio digital (CAIADO, 2010), embora consideremos que ela estivesse se referindo especificamente ao internets. Contabilizando a frequncia das categorias nos LDPs analisados, Caiado (2010) chega aos seguintes dados:nas colees aprovadas no PNLD 2005, a categoria com maior participao de frequncia foi Sites para Pesquisa (51,4%), seguida pelas categorias: Textos de Sites (37,5%), Textos sobre TIC (7,4%), E-gneros (2,0%), Livros Paradidticos/TIC (1,1%) e Filmes/TIC (0,6%). Da mesma forma, nas colees aprovadas no PNLD 2008, a categoria com maior nmero de frequncia foi Sites para Pesquisa (41,3%), tambm seguida pela de Textos de Sites (29,9%). No entanto, as seguintes categorias, por frequncia, foram: E-gneros (11,1%), Textos sobre TIC (10,6%), Produo de egneros (3,7%), Livros Paradidticos/TIC (1,8%), Linguagem Digital (1,6%) e Filmes/TIC (0,0%). (CAIADO, 2010, p. 14).

A partir desses dados, a autora conclui que nos LDPsaprovados no PNLD 2005, constatamos um predomnio de material textual extrado de sites da internet, bem como indicaes de sites para pesquisa, ao lado de uma presena muito reduzida de e-gneros. [...] Da mesma forma, constatamos que as colees de Livros Didticos de Lngua Portuguesa, aprovadas no PNLD 2008, apresentaram um trabalho pouco expressivo com os materiais textuais relacionados s TIC (CAIADO, 2010, p. 27)

Ainda que algumas das categorias e mtodos utilizados pela autora sejam passveis de discusso, os dados que ela apresenta so suficientes para que possamos mostrar como o trabalho com gneros essencialmente digitais e/ou multissemiticos extremamente precrio nos LDP, talvez, principalmente, por ser quase impossvel trabalhar as especificidades desses enunciados tendo como ferramenta somente o material impresso. No surpreende, portanto, que predominem textos retirados de sites utilizados como fontes pelos autores, o que no implica um trabalho com seus contextos de produo e uso. Um outro exemplo que podemos trazer, representativo de um movimento bastante frequente das editoras no mercado de particulares, o das plataformas online que tm sido propostas concomitantemente aos LD como forma de associar o livro impresso tecnologias digitais e, assim, gerar um diferencial frente aos materiais exclusivamente impressos, utilizados pelos escolar pblicas devido s restries impostas pelo PNLD. Uma breve anlise do que oferecem esses portais, entretanto, nos mostra que ainda no h uma lgica totalmente nova regendo sua produo ou utilizao. Tomemos como exemplos o site da Abril Educao, empresa com grande relevncia no mercado de didticos, juntamente com os portais das Editoras tica e Scipione e do Sistema de Ensino SER, que fazem parte do mesmo grupo. Site da Abril Educao (http://www.abrileducacao.com.br): O site tem como funo agrupar os links para os portais das editoras que fazem parte do Grupo Abril: tica, Scipione e Sistema Ser. Uma das sees principais a Nossos Produtos, na qual constam os itens Catlogo, Sistema de Ensino e Contedo Digital. Chamou-nos bastante ateno a descrio para essa ltima subseo: Contedo digital: Os recursos tecnolgicos so poderosos aliados no processo de aprendizagem. Conhea os materiais que oferecemos para voc!. Voltada para o professor, a rea disponibiliza os links dos portais pedaggicos dos quais o grupo dispe, como podemos ver na reproduo a seguir:

Figura 1 - Reproduo da home do site da Abril Educao

Contedo digitalPara acompanhar a evoluo tecnolgica e facilitar a vida de professores e alunos, a Abril Educao vem investindo cada vez mais na produo de contedos digitais e solues para a melhoria do ensino-aprendizagem. Acreditamos que os recursos tecnolgicos, mais do que meros complementos ao ensino, podem tornar-se parte fundamental no processo de formao dos alunos. Todos os contedos digitais da Abril Educao so elaborados por tcnicos, pedagogos e especialistas nas diversas reas do conhecimento, todos antenados com as ltimas tendncias de recursos multimiditicos no contexto educacional. Nos portais Pedaggico e SER, todos os segmentos e perfis encontram diversas possibilidades de explorao online, seja por tema ou por tipo de contedo. Experimente! Clique nos links abaixo para conhecer nossos sites: - tica Educacional (www.aticaeducacional.com.br) - Scipione Educao (www.scipione.com.br/scipioneeducacao.asp ) - Portal Pedaggico (www.portalpedagogico.com.br) - Portal SER (www.ser.com.br)

N No texto, os portais das empresas pertencentes Abril Educao so caracterizados como antenados com as ltimas tendncias de recursos multimiditicos no contexto educacional e tambm como solues para a melhoria do ensinoaprendizagem, de forma a estimular os docentes a conhec-los e experiment-los. Analisamos esses portais mais detalhadamente a seguir, juntamente com os sites institucionais das editoras s quais esto relacionados. Site da Editora tica (http://www.atica.com.br/): O site da Editora tica essencialmente institucional, ou seja, utilizado para divulgar e promover a empresa, atravs da sua histria, aes e produtos.

Na Figura 2,Figura 2 - Reproduo da home do site da Editora tica

podemos notar que no canto superior direito da home h um banner com os dizeres tica Educacional: Um site especial para os professores. Clicando nesse banner, temos acesso ao portal pedaggico da Editora (http://www.aticaeducacional.com.br/), cuja home reproduzimos na Figura 3.

Figura 3 Reproduo da home do site da tica Educacional

O site da tica Educacional basicamente um armazenador de contedos coletados em outros sites e fontes da internet. Na rea Atualidades o professor tem acesso a textos e imagens referentes s diversas reas de ensino, como Biologia, Matemtica ou Lngua Portuguesa. Existem tambm podcasts que, conforme a descrio que aparece na prpria pgina, abordam temas relacionados s matrias do currculo escolar, com depoimentos do professor de cada matria. A instruo dada ao professor : s clicar no tema e ouvir, enriquecendo assim seu repertrio cultural. Entre os materiais fornecidos ao professor, h, por exemplo, uma pgina sobre Atualidades Cientficas, que se propem a falar sobre os recursos pticos utilizados pelos artistas ao longo da histria. A pgina contm um texto longo e algumas imagens dispostas de maneira esparsa. Aparecem alguns links em certos momentos, geralmente direcionando o leitor para textos tericos ainda mais densos, como pudemos comprovar observando vrios exemplos de pginas. No h instrues sobre qual deve ser a ao do professor para com esse contedo: lev-lo aos alunos na sala de aula? L-lo apenas? Adapt-lo e agreg-lo em alguma aula? Vale lembrar que os contedos no so exatamente novos ou exclusivos, mas curiosidades que poderiam ser encontradas na

internet com o auxlio de ferramentas como o Google, inclusive pelo prprio professor, desde que ele saiba como busc-los. Site da Editora Scipione (http://www.scipione.com.br/): Tambm de carter institucional, o site da Editora Scipione tem no menu principal as reas Catlogo, Scipione Educao, Casa do Professor, Institucional e Fale Conosco. Essa segunda rea d acesso ao portal pedaggico da editora que, diferentemente do da tica, no um site parte, mas uma rea integrada pgina principal da empresa. A rea Scipione Educao (http://www.scipione.com.br/scipioneeducacao.asp) tem no menu as sees Assessoria Pedaggica, Oficinas, Galerias, Referncias, Artigos, Atividades, Trilhas de pesquisa, Cadastro de professores, Atualizao de Cadastro e Livro do professor. Seguindo a mesma idia do site da Editora tica, o portal da Scipione Educao traz vrios contedos para o professor, agrupados em galerias, oficinas e artigos. Como exemplo de oficina, temos a Figura 4, em que reproduzimos a oficina Terra & Universo.Figura 4 - Reproduo da pgina da Oficina Terra & Universo

Como podemos observar, a oficina constitui-se por um hipertexto linkado ao site, que por sua vez tem vrios links internos, com informaes, imagens e curiosidades sobre um tema especfico. Novamente, no h instrues de como o professor pode utilizar esse material com seus alunos, ou mesmo de como os alunos podem explor-lo de forma independente. Tambm no h sugestes de aes ou semelhanas com uma sequncia didtica, como o termo oficina parecia sugerir.

Site do Sistema de Ensino SER (www.ser.com.br): Finalmente, o site do Sistema de Ensino SER (cuja home reproduzimos na Figura 5) difere um pouco do padro apresentado nas pginas das editoras tica e Scipione, talvez exatamente por ser o portal de um Sistema de Ensino e no de uma editora tradicional.

Figura 5 - Home do site do Sistema de Ensino SER

Alm das informaes institucionais, que aparecem com menos destaque, o site oferece as reas Artigos, Banco de Imagens, Conversores e Simuladores, Jogos, Notcias da Educao, Multimdia, Tabela Peridica, Vdeos, Biografias, Galeria Virtual, Sites Indicados, Provas de Vestibular e Web Aulas (Alunos). De novo voltadas para o professor de maneira geral, as reas oferecem contedos e ferramentas diversas, que se propem a auxiliar o processo de ensino-aprendizagem e o aproveitamento dos materiais impressos. Uma rea que buscamos observar melhor foi a chamada Galeria Virtual, representada pela Figura 6. Segundo a descrio do site, a seo contm mais de mil imagens sobre os mais variados temas para voc, professor ou aluno, enriquecer provas, trabalhos e estudos em geral. Separadas nas categorias Alimentos, Animais, Arquitetura, Artes, Cincia & Tecnologia, Corpo Humano, Educao, Energia & Eletricidade, Esportes, Ferramentas & Objetos, Instrumentos Musicais, Natureza, Personalidades Histrias, Poltica, Profisses, Sociedade e Transportes, as imagens no so muitas e apresentam pouca variedade. Aparentemente retiradas de bancos de imagens livres, muitas vezes elas apresentam pessoas e situaes que no correspondem realidade brasileira. Ainda que, uma vez no site, essas imagens possam ser consideradas fontes seguras no que se refere aos direitos autorais, elas so pouco

criativas e provavelmente os resultados so inferiores aos materiais que poderiam ser encontrados no Google Imagens, por exemplo.

Figura 6 - Reproduo da Galeria Virtual

A partir da anlise dos sites, encontramos uma regularidade nos materiais oferecidos. Primeiramente, a existncia de um portal extra, adicional, exclusivo para os contedos digitais, mostra que as empresas ainda procuram dissociar seus materiais tradicionais das investidas em novos recursos didticos. Essa coexistncia, de certa forma, reflete a disputa entre o papel e o virtual que, como vimos, no se restringe aos LD. A tendncia observada foi a de oferecer materiais extras, complementares, no necessariamente multissemiticos, menos ainda hipermdiaticos, tendo como alvo o professor. A imagem desse professor, por sua vez, a de algum com pouco conhecimento dos ambientes digitais e que gostaria de (ou se v obrigado a) encontrar maneiras de estimular e motivar seus alunos com recursos digitais. Predominam, portanto, os materiais prontos, formatados para o uso junto com o LD e no h orientaes para que os professores faam buscas autnomas, adaptem os contedos fornecidos ou desenvolvam materiais prprios. As propostas e estratgias desses sites, portanto, ficaram aqum do que seria desejvel e produtivo para o desenvolvimento dos multiletramentos e dos letramentos multissemiticos.

Enquanto Bolter (2002, p. 23), aponta para um movimento contnuo de remidiao entre as tecnologias, no sentido de que uma nova mdia [sempre] toma o lugar de uma mais antiga, emprestando e reorganizando caractersticas de escrita da mdia mais antiga para reformular seu espao na cultura, nos sites analisados parece que estamos diante de uma espcie de "remidiao" ao contrrio, ou seja, as editoras remidiando o digital para que ele passe a ter o estilo e a forma de composio prprias do LD. Quando nos lembramos que a prpria Editora Abril edita tambm a revista Veja, que possui um rico acervo online em que esto catalogadas a maioria das edies da revista, com certeza uma fonte de pesquisa mais variada e interessante que o pobre e limitado banco de imagens oferecido ao professor no portal SER, por exemplo, que pertence ao mesmo grupo, seria de se pensar, ento, se so mesmo necessrios portais desse tipo, ou se conectar as escolas com banda larga de boa qualidade j no seria suficiente para um trabalho mais proveitoso com esses novos letramentos. Como Lemke (2010) faz questo de lembrarhoje, qualquer um edita um udio ou um vdeo em casa, produz animaes de boa qualidade, constri objetos e ambientes tridimensionais, combina-os com textos e imagens paradas, adiciona msica e voz e produz trabalhos muito alm do que qualquer editora ou estdio de cinema poderia fazer at alguns anos atrs. (LEMKE, 2010, s/p).

Assim, o mnimo que poderamos esperar que a prxima gerao de ambientes de aprendizagem interativos no apenas reproduzisse o que j se encontra em materiais impressos, posto que s seria realmente til na medida em que, por exemplo, adiciona[sse] imagens visuais e sons e vdeos, [...] que podem acomodar [...] significados densos de informao topolgica (LEMKE, s/p, 2010). Chegando ao final deste trabalho, podemos concluir que praticamente impossvel ignorar as novas demandas para educao. O conceito de multiletramentos, re-elaborado a fim de acompanhar as profundas transformaes que a sociedade tem passado, mostra-nos ser urgente um ensino-aprendizagem que extrapole o domnio da letra e do papel e que possibilite formar cidados crticos e situados, capazes de agir de forma consciente em suas realidades sociais e culturais. Diante das limitaes impostas pelo modelo tradicional de ensino e pelo LDP tal qual se constituiu e se mantm j h algumas dcadas, nos vemos instigados a pensar

em novos gneros e dispositivos com fins didticos multimodais, multissemiticos, multiculturais, digitais, online que talvez pudessem dar conta dessas novas demandas. Na falta deles, entretanto, constatamos no haver nem mesmo um dilogo produtivo dos LDP com a complexidade das interfaces encontradas na internet, das novas relaes entre os textos verbais e as imagens, das cores, do movimento, das novas formas de ler e organizar a linguagem e de suas ideologias e valores prprios. Muito disso se deve, no podemos deixar de apontar, ao fato de que a cultura escolar e a cultura editorial ainda so muito subordinadas s polticas pblicas, infelizmente insuficientes, e lgica comercial que rege a produo de materiais desse tipo. Finalmente, esperamos que este trabalho, se no pde apontar caminhos definitivos, que ao menos tenha conseguido instigar a busca de novas propostas. Referncias Bibliogrficas BATISTA, A. A. G; ROJO, R. H. R.; ZUIGA, N. Produzindo livros didticos em tempo de mudana. In: M. G. Costa Val & B. Marcuschi (Orgs.) Livros didticos de Lngua Portuguesa: letramento e cidadania. Belo Horizonte: Autntica/CEALE, 2005. BUZATO, M. E. K. Entre a fronteira e a periferia: linguagem e letramento na incluso digital. Tese (Doutorado) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2007. BUZATO, M. E. K. Letramentos multimodais crticos: contornos e possibilidades. Crop (FFLCH/USP), v. 12, p. 108-144, 2008. BUZATO, M. E. K. Letramento e incluso: do estado-nao era das TIC. DELTA, v. 25, 1, So Paulo, 2009. Disponvel em , acesso em 20/06/2011. BOLTER, J. D. Writing as technology. In: _____. Writing space: computers, hypertext and the remediation of print. Mahwah: Lawrence Erlbaum, 2002, p. 14-26. 2. ed. CAIADO, R. As tecnologias digitais da informao e comunicao em livros didticos de Lngua Portuguesa. Anais da 33 Reunio Anual da ANPEd , 2010. Disponvel em: , acesso em 31/06/2011. GARCA-CANCLINI, N. Culturas hbridas Estratgias para entrar e sair da modernidade. So Paulo: EDUSP, 2008[1989]. 4 edio brasileira. GRIBL, H. Atividades de leitura de textos em gneros multi- e intersemiticos em livros didticos de Lngua Portuguesa. Dissertao (Mestre) Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, 2009.

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