ACP (Autos nº 97.00.13364-9)
Transcript of ACP (Autos nº 97.00.13364-9)
M inistério P úblico F ederalP ro cura d oria d a R epública n o E stado do P araná
EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 3a VARA FEDERAL CÍVEL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CURITIBA - SEÇÃO JUDICIÁRIA DO PARANÁ
DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA
Autos n° 97.00.13364-9/PR
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela Procuradora da
República signatária, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais,
com fulcro nos artigos 127, caput, e 129, incisos II e III, da Constituição da
República de 1988, bem como na Lei n. 7.347/85 e na Lei Complementar n.
75/93, vem ajuizar
AÇÃO CIVIL PÚBLICA,
COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA,
em face de SOCIEDADE RÁDIO EMISSORA PARANAENSE S/A
PARANAENSE DE COMUNICAÇÃO (GRPCOM/RPCTV), pessoa jurídica de direito
privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 76.494.806/0001-45, com sede comercial
na Rua Pedro Ivo, n. 409, bairro Centro, Rua Mamoré, 753, bairro Mercês e na
Rua José Loureiro, 282, bairro Centro, todos em Curitiba/PR;
GRUPO
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
1
• ® I
M inistério P úblico F ederalP rc curadoria da R epública no E stado do Paraná
IA S/A - GRUPO RIC DE COMUNICAÇÃO (REDE INDEPENDÊNCIA
DE COMUNICAÇi O), pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob
o n. 79.107.918/ )001 -94, com sede comercial na Rua Amauri Lange Silvério, 450,
Curitiba/PR;
TV INDEPENDÊN
bairro Pilarzinho
RÁDIO E TV IGl AÇU S/A - GRUPO MASSA (REDE MASSA), pessoa jurídica de
direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 76.600.188/0001 -70, com sede
comercial na Ru; João Tschannerl, 830, bairro Vista Alegre, Curitiba/PR;
TV COLOMBO (I CA COMPANY DE TELECOMUNICAÇÕES DE COLOMBO LTDA.),
pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n.
05.406.795/0001 56, com sede comercial na Rua Einstein, 1042, MD 2, Vila
Guarani, Colomb >/PR;
RÁDIO E TELEVISÃO BANDEIRANTES LTDA. (TV BAND), pessoa jurídica de direito
privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 60.509.239/0007-09, com sede comercial
na Rua Radiante >, 13, bairro Morumbi, São Paulo/SP, com filial na Rua Santa
Cecília, 802, bair -o Pilarzinho, Curitiba/PR;
RÁDIO E TELEVSÃO RECORD S/A (TV RECORD), pessoa jurídica de direito
privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n.60.628.369/0001-75, com sede comercial
na Rua da Várzea, 240, bairro Barra Funda, São Paulo/SP;
AÇÃO E PARTICIPAÇÕES S/A (TV GLOBO), pessoa jurídica de
inscrita no CPF/MF sob o n.27.865.757/0033-81, com sede
Von Martius, 66, bairro Jardim Botânico, Rio de Janeiro/RJ, e
( hucri Zaidan, 46 e 1901, Vila Cordeiro, bairro Itaim Bibi, São
GLOBO COMUN
direito privado,
comercial na Ru
Avenida Doutor
Paulo/SP;
c
AGÊNCIA NACIOIAL DE TELECOMUNICAÇÕES (ANATEL), pessoa jurídica de
direito público, entidade autárquica em regime especial criada pela Lei n.:chal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 'one (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
Rua Mar
2
M inistério P úblico F ederalP rocuradoria , d a R epú blica n o E stado do Paraná
9.472/97, podendo ser citada
Especializada junto à ANATEL, com sede no Setor de Autarquias Sul, Quadra 6, Bloco H, 6o Andar, Ala Norte, Brasília/DF;
pessoa do(a) Procurador(a) Federalna
ESTADO DO PARANÁ, pessoa jurídica de Direito Público Interno, representado
pelo Procurador-Geral do Estado do Paraná, com sede na Rua Paula Gomes, n.
145, Centro, Curitiba, Paraná, CEP 80.510-070; e
UNIÃO, pessoa jurídica de Direito Público Interno, com sede na Rua Munhoz da
Rocha, n. 1247, Cabral, Curitiba, Paraná, CEP 80.035-000, podendo ser citada na
pessoa do Procurador-Chefe da Advocacia da União no Paraná, pelas razões de
fato e de direito que passa a aduzir:
1. DO OBJETO
O Ministério Público Federal pretende, mediante o
ajuizamento desta Ação Civil Pública, a obtenção de provimento jurisdicional
que garanta a efetiva RESPONSABILIZAÇÃO dos réus em virtude de práticas
recorrentes adotadas em seus programas de televisão, notadamente no que se
refere à violação da presunção de inocência e superexposição dos presos
cautelares.
Os réus são grandes grupos de comunicação (com exceção
da TV Colombo e dos entes públicos) e alcançam milhões de lares no Estado do
Paraná e em diversos outros Estados da Federação, o que, por si só, exigiria
prudência, ética e lisura na divulgação das informações por meio dos seus
programas de televisão. Todavia, em determinadas “coberturas” de casos
notórios, principalmente naqueles relativos a crimes, os réus não economizam
R ua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
3
Ministério P úblico F ederalP r c u r a d o r ia d a R epú blica no E stado do Paraná
esforços no sentido de expor os suspeitos, pessoas que sequer foram
julgadas, à ieno nínia. à execração pública.
Desde o fim da década de 1980, os programas de cunho
“policialesco” t?m se inserido com força no interior da cultura popular. As
emissoras de te evisão, movidas pelo desejo insaciável de audiência, agem de
modo impruden :e e, porque não, sensacionalista, no intuito de explorar as
nuances mais ob >curas e macabras de qualquer fato que tenha aparência delitiva
e seja perfeito 10 gosto do grande público, cada vez mais inseguro e “cansado
de tanta impun dade” - sentimentos incentivados pela cultura de massa. Não
tem sido incomi m observar, com assustadora naturalidade, a “sede” por sangue
demonstrada pe os apresentadores de tais programas, a cada dia mais teatrais e
caricatos, transformando a tragédia e o sentimento de perda de um, no
entretenimento larcotizante do outro.
A morte e a tristeza hoie são transformadas em meras
banalidades.
Os programas inseridos no gênero policial são ricos em
colecionarem at surdos e desrespeitos a qualquer garantia mínima prevista no
ordenamento jirídico, seja nos documentos internacionais que tratam dos
Direitos Humano;, seja na própria Constituição Federal de 1988.
Os pretensos repórteres policiais, figuras inerentes aos
programas do gênero, são hoje responsáveis por enriquecer o repertório do
absurdo transmitido ao vivo, adicionando pitadas de violações de direitos na
pauta televisiva como se já não fossem suficientes aquelas perpetradas pelos
folclóricos “ânc( ras”. É prática comum nesse gênero de programação o envio de
repórteres diret imente às portas das delegacias de polícia, onde, quase que com
hora marcada, < s presos são expostos ao ridículo e sumariamente condenados,
antes mesmo de qualquer processo judicial ou instrução probatória.Rua Mí rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-88924
M inistério P úblico F ederalP ro cura d oria d a R epú blica no E stado do P araná
A presunção de inocência, um dos alicerces no qual deve
pautar-se o Processo Penal Constitucional, é ignorada e atirada ao lixo durante a
exibição dos programas policiais, sendo apresentada ao público como mais um
dos obstáculos à concretização da justiça e à efetivação da paz social. Isso sem
entrar em outras questões, como a idolatria à pena de morte, à castração, ao
linchamento e à tortura, que também ajudam a compor a aquarela de
irracionalidades perpretada.
No meio de tudo isso, temos os apresentadores, os
“âncoras”. Essas pessoas são construídas como figuras homéricas, defensoras do
povo e da moral pública. Todos sempre se apresentam como homens do povo que
cresceram em razão do bem e da sua constante luta contra o “mal” . Durante as
matérias exibidas, os apresentadores são responsáveis pela condução do show:
cabe a eles prender a atenção do público mostrando sua indignação e seu desejo
de vingar a vítima do crime, sem mencionar que, não raras vezes, entre gritos e
interpretações teatrais, suscitam o ódio e convocam a multidão enfurecida à
“guerra contra o inimigo”. Os comentários exarados pelos apresentadores são o
ápice dos programas, sendo responsáveis pela (de)formação da opinião pública.
A colocação como voz dos oprimidos, aliás, é o que conduz
muitos desses apresentadores a tornarem-se posteriormente membros do alto
escalão político do país, como Deputados Estaduais ou Federais, Vereadores e
Prefeitos.
Além disso, os programas policiais exibem, sem qualquer
pudor ou algum tipo de censura moral, imagens de vitimas menores de idade,
das quais muitas são crianças. Um exemplo claro disso está na condução da
cobertura jornalística daquilo que ficou conhecido como Caso Tavná. Alguns
programas transmitidos no âmbito do Estado do Paraná, mas retransmitidos pela
Internet, mostraram o cadáver de Tavná da Silva, uma menina de 14 (catorze)
anos, sendo desenterrado. Isso sem qualquer tipo de tratamento na imagem.Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-88925
M inistério P úblico F ederalP í DCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
Acrescente-se também que parte desses programas, quase
sua maioria,_s >o transmitidos no horário em que as famílias costumam
almoçar em fre nte a televisão (por volta do meio-dia). As exibições diárias do
sofrimento hum mo, em seu estado mais degradante, são livremente deixados ao
deleite das cr anças e adolescentes que porventura tenham acesso a um
televisor ou a um computador.
Não se pode olvidar, ainda, que as violações aqui
apontadas, infe izmente, não são exclusivas dos programas populares. As grandes
redes de televi: ão, em seus noticiários transmitidos no dito horário nobre, são
eficazes na prá ica de deturpar os princípios constitucionais do processo penal.
As violações c a presunção de inocência são inseridas de maneira quase
imperceptível, mas suficientes a expor os acusados ao opróbrio e à
estigmatização.
Quase que em parceria aos meios de comunicação, salta aos
olhos a conivência dos agentes estatais com a barbárie. Tem sido parte da
i apresentação dos suspeitos à imprensa. Aliás, é comum que os
sujeitos acusados sejam expostos às câmeras diante de grandes painéis com o
emblema da do ida.
práxis policial,
Fato é que ao preso cautelar sequer é dado o direito à não-
autoincriminaç d , notadamente quando deve se submeter às entrevistas
tendenciosas des já aludidos repórteres policiais. Tudo isso, repita-se, com o
respaldo da aut< iridade policial e sem o acompanhamento de um defensor.
Portanto, essa ação coletiva, conforme se aprofundará, tem
por seu objeto a proteção dos direitos constitucionalmente assegurados a
qualquer cidadi o. indistintamente, seja ele acusado de um crime ou não.
Rua M rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
6
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú b lic a n o E stado do Paran á
2. DA LEGITIMIDADE ATIVA. DA ATRIBUIÇÃO DE DEFESA DOS DIREITOS E
GARANTIAS FUNDAMENTAIS DO ACUSADO.
A legitimidade ativa do Parquet Federal está evidenciada na
própria Constituição da República de 1988, especialmente no artigo 127, o qual
prescreve ser atribuição do Ministério Público Federal, instituição essencial à
função jurisdicional, a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis.
Diz o artigo 127 da CF/88:
Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente,
essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a
defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis.
Na sequência, o artigo 129 do Texto Magno preceitua:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
[ . . . ]
zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos
serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta
Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a
proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de
outros interesses difusos e coletivos.
II
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
7
M inistério P úblico F ederalP OCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
0 Ministério Público, como se pode inferir do texto
:em a missão precípua de defesa da cidadania, especialmente no
proteção da dignidade humana de todos os grupos sociais que
edade brasileira.
constitucional,
que se refere à
compõem a soc
Como bem apontado no preâmbulo da Constituição da
República de 1‘ 88, os objetivos do Estado Brasileiro visam a construção de uma
sociedade juste e solidária. O cumprimento desses encargos somente pode ser
levado adiante com o devido respeito, por parte de todos, principalmente por
parte do próprio Estado, do valor intrínseco que cada ser humano carrega
consigo.
Não é por outro motivo que se perfaz como uma das
missões essenci lis do Parquet zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da
União, dos serviços de relevância pública e dos meios de comunicação social
aos princípios, garantias, condições, direitos, deveres e vedações previstos na
Constituição Federal e na lei, dentre os quais o respeito à integridade dos
acusados e ao; princípios básicos do Processo Penal, como a presunção de
inocência. A )bservância de tais preceitos se configura como corolário
primordial à cor secução dos fins propostos pelo constituinte.
Aliás, a própria Lei Orgânica do Ministério Público, a Lei
Complementar i. 75/1993, em seu artigo 6o, inciso VII, alínea “a”, afirmou
competir ao Pa quet Federal a defesa dos Direitos Constitucionais e a proteção
dos Direitos Hur íanos positivados no Texto Maior.
Ainda, cabe destacar a redação do artigo 39, inciso III, da
Lei Complemen ar n. 75/93, que assegurou o Ministério Público como instituição
responsável peli defesa dos Direitos Constitucionais, especialmente quando a
situação exige > devido cumprimento por parte dos concessionários de serviço
público federal, como é o caso do serviço de radiofusão de sons e imagens.Rua M irechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone(0xx41)3219-8700 - Fax(0xx41)3219-88928
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú b lic a no E stado do Pa ran á
Diz o artigo 39 da LC n. 75/93:
Art. 39. Cabe ao Ministério Público Federal exercer a defesa dos
direitos constitucionais do cidadão, sempre que se cuidar de
garantir-lhes o respeito:
I - pelos Poderes Públicos Federais;
II - pelos órgãos da administração pública federal direta ou
indireta;
III - pelos concessionários e permissionários de serviço público
federal;
IV - por entidades que exerçam outra função delegada da União.
Desta feita, resta evidente a legitimidade ativa do
Ministério Público Federal.
3. DA LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E DA ANATEL. ATRIBUIÇÃO DE
FISCALIZAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO. TITULARIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO DE
RADIOFUSÃO.
No que toca à legitimidade passiva da União
presença no polo passivo da presente Ação Coletiva se vislumbra em virtude do
artigo 21, inciso XII, alínea “a”, da CF de 1988. Segundo a Lei Maior, é
exclusividade da União a exploração do serviço de radiofusão de som e imagem;
o seu exercício por particulares somente se dá em decorrência de concessão
pública.
a sua
Além disso, a União, na condição de concedente do serviço
público, tem por encargo proceder à fiscalização do exercício da concessão,
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
9
M inistério P úblico F ederalo cu ra d o ria da R epú blica no E stado do Paranáp
notadamente c janto ao atendimento do interesse público, consoante a dicção
do artigo 29, ir ciso I, da Lei n. 8.987/95. O direito de fiscalização por parte da
administração | lública não exige expressa previsão no ato de outorga e pode (e
deve) ser exerc do sempre.
Nas sempre atuais e pertinentes lições de Diogenes
to Administrativo. 17. ed. São Paulo: 2012. p. 425.):Gasparini (Dire
“O interesse público está consubstanciado na transferência da
execução e exploração do serviço público a terceiro, livrando-se
a Administração Pública dos custos decorrentes de sua execução,
mantendo, no entanto, a titularidade do serviço público
transferido e o controle da prestação aos usuários” (grifei).
A União, portanto, não perdeu a titularidade do serviço
de radiofusão, hoje executado pelos grupos de comunicação elencados nesta
peça vestibular
Ao contrário, o ente concedente do serviço mantém a
titularidade e linda recebeu, por lei, o encargo de fiscalizar a prestação dos
serviços, princ palmente se os mesmos atendem ao interesse público. Se
atualmente exi >te o descumprimento das normas constitucionais e legais por
parte da conce isionária do serviço público, tal fato se deve à desídia da União
em realizar a a< lequada e firme fiscalização das atividades.
Some-se a isso que a outorga para a execução do serviço
de radiofusão í de competência do Ministério das Comunicações, cabendo-
lhe, dentre oi tras, fiscalizar a adequação do conteúdo veiculado pelas
emissoras de ládio e televisão aos ditames da legislação pertinente, com
Rua V arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
10
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú b lic a no E stado do Paraná
destaque ao Código Brasileiro de Telecomunicações e a Constituição Federal.
Não obstante a execução dos trabalhos de fiscalização terem sido delegados à
Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), por meio do convênio n.
01 /2007, a competência para aplicar sanções administrativas resultantes desses
processos, contudo, permanece no Ministério das Comunicações.
Ilustrativo, nesse ponto, trecho do voto do Desembargador
Federal Bruno Teixeira, no julgamento da Apelação n. 27666-RN, que tramitou
junto ao Tribunal Regional Federal da 5a Região:
A delegação de função adm inistrativa não é causa para se
reconhecer a ausência de interesse processual do poder
delegante, o qual permanece com sua função constitucional
inabalada, visto que cabe ao Ministério das Comunicações,
além da função fiscalizadora, fa ze r concessão de
funcionamento para emissoras de rádio e televisão, podendo,
de form a justificada, suspender o ato concessivo.
Improcede a pretensão da União de m igrar para o polo ativo
processual frente ao seu dever de fiscalizar, autorizar,
conceder e cancelar atos administrativos que envolvam a
prestação de serviços de telecomunicações, havendo de se
responsabilizar solidariamente pelos atos ilícitos praticados
pelas entidades a ela subordinadas. Ademais, o prejuízo
arcado com a suposta veiculação de programação alheia à
finalidade da emissora educativa traz prejuízo tão somente à
comunidade beneficiária, para a qual o serviço é destinado, não
se mostrando lógico investir a União da qualidade de parte
sofredora de dano [destaquei], (APELAÇÃO n. 0 27666-RN - Rei.:
Desembargador Federal Bruno Teixeira, TRF5 - Quarta Turma, DJE
- Data: 04/07/2013 - Página: 620)
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0 x x 4 1 )3219-8892
11
M inistério P úblico F ederalP .OCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
Destarte, a União deve obrigatoriamente integrar a
presente demaida, seja em razão da sua condição de concedente do serviço
público, seja pelo seu encargo de fiscalizar e aplicar sanções aos concessionários
que não executam o serviço público de maneira adequada. O mesmo aplica-se à
ANATEL, a qiem o Ministério das Comunicações delegou a atribuição de
executar a fisc; lização do conteúdo transmitido pelas redes de rádio e televisão.
4. DA LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DO PARANÁ. DESRESPEITO DOS
DIREITOS CONÍ TITUCIONAIS DO ACUSADO. CONDUTA ILEGAL POR PARTE DOS
POLICIAIS.
A inclusão do Estado do Paraná no polo passivo desta ação
coletiva se dá, especificamente, em virtude da conduta adotada pelos agentes
estatais na con iução da instrução preliminar do caso Tayná, notadamente no que
se refere à d vulgação precipitada das informações e no desrespeito aos
direitos do pre ;o. Como aponta a Constituição da República, em seu artigo 37, §
6o, as pessoa; jurídicas de direito público respondem pelos atos danosos
praticados pelo > seus agentes, nessa condição, contra terceiros.
Sem importarem-se com as circunstâncias que envolviam os
fatos, destacar do-se a idade da vítima, os policiais civis divulgaram, de forma
afobada, as in ormações do caso à imprensa. Não fosse isso suficiente, ainda
foram responsá /eis por permitir a cobertura jornalística das buscas pelo cadáver
da criança, au orizando que pessoas externas à atividade policial adentrassem
no local de nrv irte - que, até onde se saiba, deveria ser uma área isolada e
resguardada an :e os olhares mais curiosos da população.
Pois bem.
Rua b arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
12
M inistério P úblico F ederalPROCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
Como se infere da investigação preliminar levada a cabo
por este Parquet, a Polícia Civil do Paraná divulgou, em 28 de junho de 2013, por
meio de seu sítio na internet1, notícias de que teria procedido à prisão dos
“responsáveis pela morte da garota Tayná Adriane da Silva (s/c)” . Dessas
informações, foram apontados Sérgio Amorim da Silva Filho, Adriano Batista,
Paulo Henrique Camargo Cunha e Ezequiel Batista como sendo os criminosos.
Os termos “criminoso e “marginal” , oportuno dizer, se
fizeram presentes em diversos trechos da nota. Tal conduta, considerando a
formação técnica das autoridade policiais, não pode ser, em momento algum,
admitida no âmbito de um Estado Democrático e de Direito.
Não há espaço para que uma equipe policial, chefiada por
um Bacharel em Direito, deixe-se levar pela irracionalidade e passe a imagem de
quatro suspeitos, presos cautelarmente, cuja custódia incumbe ao Estado,
bandidos” , sem ter sido feito nenhum trabalho de investigação
minucioso. Ressalte-se que no dia da divulgação da nota, o corpo de Tavná
sequer havia sido encontrado.
como
Somado a tal forma de proceder, os agentes da Polícia Civil
ainda foram responsáveis por apresentar os quatro suspeitos à imprensa,
permitindo aos repórteres policiais que os entrevistassem. Ocorre que Sérgio
Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique Camargo Cunha e
em momento algum, acompanhados porEzequiel Batista não estavam
defensores constituídos ou públicos. Em suma, os presos não tinham, durante a
condução das entrevistas, nenhuma forma de se esquivarem das investidas
desleais dos repórteres que, não raras vezes, induziam as respostas dos suspeitos
no intuito de conseguir uma confissão.
1 Disponível: <http://www. Doliciacivil.pr.gov. b r/modules/noticias/artide.php?storvid=7575>.Acesso em: 03 dez. 2015.______________________ ___________ _______________ __
Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
13
M inistério P úblico F ederalOCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁPi
No sítio da Polícia Civil, na internet, também era possível
visualizar uma $ aleria de fotos dos presos - que, repita-se, eram cautelares.
À propósito, dias depois da celeuma instaurada com a
divulgação dos Dormenores fáticos do caso, surgiram indícios de que os quatro
presos teriam s ido vítimas de tortura por parte de alguns policiais, cujo fim
seria a busca p ?la confissão. As ações penais decorrentes da situação estão em
trâmite junto a > Juízo da 1a Vara Criminal de Colombo (cf. ofício n° 44/15 da 2a
Promotoria de J jstiça de Colombo - fls. 82).
Não há, pois, como se negar a responsabilidade do Estado
do Paraná, por meio de seus agentes, na violação dos direitos dos presos e na
divulgação das i iformações do caso.
Sobre a responsabilidade do Estado, oportuna se faz a
transcrição de rechos do acórdão proferido no RE 272.839/MT, que tramitou
junto ao Sup emo Tribunal Federal. Nele foi questionado acerca da
responsabilidade do Estado sobre eventuais agressões sofridas pelo preso em
casas de custód a:
[...] diferentemente da responsabilidade subjetiva, cuja
indenização decorre de um procedimento culposo ou doloso, a
responsabilidade objetiva estaria caracterizada pela relação
causal entre a atuação estatal e o dano produzido,
correlacionada a uma situação de risco [...].
No jugamento do RE 84.072 (DJ de 1o.5.1978), Relator o Ministro
Cunha Peixoto, ressaltou-se o entendimento de que a
responsabilidade civil do Estado, com fundamento na teoria
objetiva, resulta da causalidade do ato e não da
culpabilidade do Agente.
[ . . . ]
rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
R ua Mi
14
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica no E stado do Paraná
Verifica-se que esta Corte adotou ainda a responsabilidade civil
objetiva do ente público, considerando o nexo de causalidade
entre a ação praticada por terceiro, estranho ao serviço público,
e a lesão causada à pessoa que estava sob custódia do Estado, o
qual deveria zelar pela sua integridade.
[ . . . ]
A p a rtir do entendimento desta Corte, portanto, observa-se
que uma das hipóteses do reconhecimento da
responsabilidade do Estado, consubstancia-se no dever de
vigilância que lhe é atribuído. Assim, apesar do fundamento
que considera a configuração de uma espécie de culpa
genérica da Administração (faute du service), destaco o
argumento jurídico de que, no caso concreto sob análise, a
responsabilidade advinda do dever de vigilância ou guarda
pode ser objetivamente imputada ao aparato estatal.
Na espécie, o detento estava em cumprimento de pena privativa
de liberdade, portanto, sob a custódia do Estado. (RE 272.839,
Rei. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 1°-2- 2005, Segunda
Turma, DJ de 8-4-2005) [destaquei].
Transportando essas considerações ao presente caso
concreto, é cristalina a violação do dever de vigilância por parte do Estado do
Paraná, pois todos os suspeitos estavam sob sua guarda, aguardando o desenrolar
da instrução preliminar. Porém, sem nenhum respeito aos princípios
constitucionais mais caros à efetivação da proteção das garantias do indivíduo, a
Polícia colocou-os sob o olhar curioso e fumegante das câmeras e filmadoras,
deixando Sérgio Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique
Camargo Cunha e Ezequiel Batista à disposição do ódio popular.
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
15
M inistério P úblico F ederalP i ocuradoria d a R epú blica n o E stado do Paraná
Logo, demonstrada está a contribuição do Estado do Paraná
para a ocorrênc ia dos fatos lesivos, o que ampara a sua presença no polo passivo
desta lide.
5. DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. PRESENÇA DA UNIÃO NO POLO
PASSIVO.
A competência da Justiça Federal se justifica pelo teor da
redação do artii p 109 da Constituição da República de 1988, in verbis:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I - as causas em que a União, entidade autárquica ou
empresa pública federal forem interessadas na condição de
autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de
falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça
Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
[...]
§ 2°. As causas intentadas contra a União poderão ser
aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor,
naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem
à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no
Distrito Federal.
Desta feita, figurando a União no polo passivo da presente
demanda, afirma-se a competência da Justiça Federal como Órgão competente
para o processe mento e julgamento do feito. Além disso, tem-se que a causa
versa sobre a cc ncessão de um serviço público de titularidade da União, o que,
de per si, já é si ificiente para confirmar a competência da Justiça Federal.
Rua Mi rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
16
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria da R epú blica n o E stado do Paraná
6. DA SÍNTESE FÁTICA
A presente Ação Civil Pública tem origem no Inquérito Civil
Público n. 1.25.000.003448/2013-83, instaurado após as manifestações
encaminhadas pelo então Deputado Federal Florisvaldo Fier, conhecido
popularmente como Dr. Rosinha.
Durante o curso das investigações, apurou-se que após a
divulgação, por parte da Polícia Civil do Estado do Paraná, dos nomes de
Sérgio Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique Camargo Cunha
e Ezequiel Batista, como sendo os responsáveis pela morte de Tayná Adriane
da Silva, diversas emissoras de televisão passaram a veicular a imagem dos
quatro como criminosos, antes mesmo de qualquer manifestação judicial
sobre a situação dos mesmos..
Os informes e chamadas feitos durante a programação
MENINA É ESTUPRADA E MORTA":
“ESTUPROU A MENINA JÁ MORTA” :
traziam frases no seguinte sentido:
“SUSPEITOS FALAM COM A POLÍCIA” :
“MENINA MORTA EM PARQUE DE DIVERSÕES” . Essas frases, geralmente no
rodapé dos vídeos, exibidas em letras garrafais, eram vinculadas aos quatro
detidos, induzindo o espectador a enxergá-los tão somente como bandidos,
monstros e degenerados.
Além disso, algumas emissoras, como é o caso da Rede
Massa e da RPCTV, transmitiram os seus noticiários diretamente do município de
Colombo, colocando, respectivamente, o repórter Ricardo Vilches e Karine
Garcia ao vivo durante a exibição dos seus programas.
A repórter Karine Garcia, da RPCTV (empresa do grupo
GRPCOM), iniciou sua fala condenando, em definitivo, os suspeitos, dizendo:
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
17
M inistério P úblico F ederalP i ocuradoria da R epública no E stado do Paraná
Olá Tha/s [apresentadora do programa Paraná TV], olha, os QUATRO
BANDIDOS foram presos ontem pela Polícia
Da mesma forma, o repórter Ricardo Vilches, da Rede
Massa, que, de; curando de qualquer prudência na descrição dos fatos, trouxe os
quatro suspeite s como os culpados por todo ocorrido, dizendo:
Séreio... e aí vem a crueldade desse crime Galo... esse crime começou a ser
cometido na te rça-feira. quando a Tavná foi chamada para dentro do parque
e lá ainda, a nc ite. sozinha. FOI VIOLENTADA POR ESSES TRÊS HOMENS F...T '.*
f .. .l Ele.
Porém, o que chama a atenção na condução da “cobertura
postura dos apresentadores. Destacam-se, nessa Ação Coletiva,
a conduta adotáda pelos âncoras Gilberto Ribeiro (José Gilberto do Carmo Alves
Ribeiro), hoje Deputado Estadual no Paraná, Paulo Roberto Galo, Marcelo
Rezende, Vai Santos, Iverson Vaz e Samuel Rocha. 0 primeiro pertencente à
Rede Independe id a de Comunicação, o segundo à Rede Massa, o terceiro à Rede
Record, o quart > à TV Bandeirantes e os dois últimos à TV Colombo.
jornalística” é
Todos os apresentadores têm como característica a
teatralidade e a presença de palco. No meio das transmissões, os âncoras dos
programas pol ciais reservam um espaço para comentarem as notícias
veiculadas. É nesse momento, movidos pela concupiscência por números
expressivos de audiência, no qual os apresentadores concentram esforços em
passar a sua indignação, induzindo o espectador a concordar que somente a
exterminação c os suspeitos gera eficácia na contenção da criminalidade. Os
âncoras, alguma s vezes agindo de modo caricato, tentam, a todo custo, passar a
mensagem de q ie o inimigo está bem ao nosso lado e que as amarras do sistema
de justiça são a verdadeira causa do caos em que se encontra a sociedade.
Não é incomum, inclusive, que alguns apresentadores
advoguem em prol do combate direto na guerra contra a criminalidade. PauloRua M rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
F o n e(0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41)3219-889218
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica n o E stado do Paraná
Roberto Galo, por exemplo, é rico em apresentar frases absurdas durante seu
programa, intitulado Tribuna da Massa, como:
“ESSES CARAS MERECEM OU NAO PENA DE MORTE? Que pensa
você? Atenção, um dos ESTUPRADORES disse que usou
'camisinha' com a menina. DESGRAÇADO f f ala di ri vindo-se à
câmera1J...1 Que história macabra. Que coisa estranha. Você
entendeu o aue esse desQraçado do olho roxo falou? 0 cara aue
está ao lado dele, no momento da entrevista do Ricardo Vilches.
o tempo todo balançava a cabeca e faziam ó [o apresentador
balança a cabeça em sinal nevativo várias vezesl... e o cara
contando história. Ele foi, voltou, foi e voltou, e o Vilches
apertou ele. E VOCÊ EM CASA? ESSES CARAS? CORTA? CAPA
ffazendo gestos com conotação do ato de castrar alQuéml?
MATA? PENA DE MORTE?’’*
Este é um breve introito fático.
Adiante, será feita a descrição da conduta de cada um dos
reus.
A) DA CONDUTA PERPETRADA PELA REDE MASSA. PROGRAMA TRIBUNA DA
MASSA.
0 programa Tribuna da Massa, exibido na Rede Massa (TV
Iguaçu), levou ao ar inúmeras violações de preceitos constitucionais, desde a
desconsideração da presunção de inocência até o total descompromisso com a
dignidade humana.
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
19
M in is t é r io P ú b l ic o F e d e r a lP r 3CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
A apresentação do programa Tribuna da Massa incumbe a
Paulo Roberto Galo, regionalmente conhecido pelo seu forte apelo popular.
Durante a exibi :ão do folhetim policial, o apresentador costuma realizar uma
espécie de dan ;a, sendo acompanhado por cacarejos de um galo, em forte
alusão ao seu n ime artístico. Indo além, o âncora também é conhecido por sua
frequente teatr alidade diante das câmeras. É comum que Paulo Roberto Galo
faça uso de aredotas e interpretações corporais (como pulos e as famosas
danças) ao chan ar e comentar as matérias exibidas.
No contexto do "Caso Tayná”, o programa Tribuna da Massa
iniciou com o apresentador Paulo Roberto Galo, diante de um púlpito com a
bandeira nacional, afirmando, de modo completamente dramático, a ocorrência
de um crime na região de Colombo, Paraná. Ao iniciar o programa, o
apresentador in roduz o espectador acerca do caso asseverando o seguinte:
PAULO ROBERTO GALO: Nesta terça-feira que passou, uma
menina de 14 anos de idade desapareceu de casa. Dona Cleusa, a
mãe, entrou em contato com o programa Tribuna da Massa
[aparecem fotos de Tayná] e aí começou tudo. Estamos
terminando a semana com a informação de aue essa menina
foi assassinada, violentada, abusada e estuprada.
ARREGAÇARAM [grita tal palavra durante a transmissão] com
ela durante dois dias, e aue esses ma rei na is são funcionários
de um parque de diversões em Colombo, e aue o povo
revoltado veio para rua e. alvuns. acham aue exageraram ao
quebrar [arquivo:
00:04-
o parque______________
7_Rede_Massa_STB_Trecho_1_Tribuna_da_Massa.mp4
00:36].*
Rua Mi rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - F ax (0 x x 4 1 )3219-8892
20
M inistério P úblico F ederalP ro cura d oria da R epú blica no E stado do Paraná
Usando um linguajar completamente coloquial, senão
chulo, o apresentador refere-se à morte da menina de 14 (catorze) anos como se
fosse um espetáculo. Anunciando o que virá a ser exibido no programa, Paulo
Roberto Galo diz aos espectadores que Tayná foi “Arregaçada” .
0 programa, como se vê, já se inicia com o total
desrespeito à dignidade de uma adolescente. Desconsiderando completamente o
preceito da proteção integral da criança e do adolescente, explicitamente
previsto na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, Paulo Roberto Galo
deixa de ver a criança e o adolescente como uma pessoa em fase peculiar de
desenvolvimento, transformando a tragédia familiar em mais uma atração
midiática conforme o gosto do espectador.
Sucessivamente, o programa Tribuna da Massa passa a
exibir uma matéria feita pelo repórter Ricardo Vilches, na qual se tem como
pano de fundo as buscas pelo cadáver de Tayná. Em um dos momentos da
reportagem, a Polícia Civil do Paraná leva ao encontro do repórter dois dos
suspeitos (ambos sem o acompanhamento de um defensor), que são Ezequiel
Batista e Sérgio Amorim da Silva Filho. É nessa ocasião que Ricardo Vilches
começa a inquiri-los acerca do crime. Em total desrespeito à presunção de
inocência e à ampla defesa, que abrange o direito ao silêncio, é perguntado
aos dois presos se eles cometeram o crime.
Abaixo, segue um dos trechos da entrevista [arquivo:
7_Rede_Massa_STB_Trecho_1_Tribuna_da_Massa.mp4 - 04:03-04:51]:
Ricardo Vilches: Explica, tim-tim por tim-tim, na terça-feira,
vocês pegaram essa menina e fizeram o que com ela?
Ezequiel Batista (identificado como suspeito): Não, eu não tava
junto com eles na hora que eles pegaram a menina.
R ua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
21
M inistério P úblico F ederalP r i curado ria da R epú blica no E stado do Paraná
Ricardo Vilches: 0 que que você fez?
Ezequiel Batista: Não, não fiz nada. Tipo, eles tavam
conversando com ela no parque, daí, tipo, daí eu não vi mais o
que... pra onde que eles foram.
Ricardo Vilches: Que que você fez então, qual foi sua
participação?
Ezequiel Batista: Não, eu não fiz nada.
[a imagem se concentra em Sérgio Amorim da Silva - identificado
como suspeito -, o qual aparece com um olho roxo durante a
gravação]
Sérgio Amorim: Ela passou na frente do parque, daí chamou um
de “nóis” nél? Não ele [apontando para Ezequiel com a cabeça].
Ricardo Vilches: Ela chamou?
Sérgio Amorim: É... tipo ela chamou, ela tava passando na rua,
aí ela, tipo, “Oh, vem aqui, vamo dá uma volta a í”, falou pra
ele. Só que ele pegou e chamou “tudo nóis” nél? Trouxeram ela
dentro do parque, ficamo conversando com ela ali, daí ele pegou
e pediu pra ficar com ela nél? Daí ela falou que não. Peguei e
fiquei com ela...
0 repórter, longe de cumprir com seu trabalho de informar
e agir com imparcialidade, considera, de antemão, ambos os “entrevistados”
como culpados >elo crime. A partir disso, passa a interrogá-los nessa condição.
No decorrer da entrevista, nota-se que o repórter chega a se exaltar com um
deles e, aponte ndo o dedo e falando em tom mais alto, pergunta a Sérgio
Amorim se foi ele o responsável pela morte, exigindo que ele descreva,
pormenorizadan ente, como se deram os fatos.
Mas, indo muito além disso, é possível se notar também que
o repórter busc i induzir a resposta em alguns momentos. Um dos pontos a se
destacar está q iando o repórter pergunta a um dos presos se a menina queria
Rua Mi rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
22
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú b lic a no E stado do Pa ran á
fazer sexo com ele. Sem o acompanhamento de um defensor, prejudicando sua
própria situação (sem adentrar no fato de que existem indícios de que os
suspeitos foram torturados pela polícia), Sérgio se perde nas respostas e é
induzido pelo jornalista a dizer que a estuprou, como adiante se vê [arquivo:
7_Rede_Massa_STB_Trecho_1 _Tribuna_da_Massa.mp4 - 04:52-05:07]:
Ricardo Vilches: Só que o que? Você forçou ela?
Sérgio Amorim: Não...
Ricardo Vilches: Ah, ela quis? Ela quis fazer com você?
Sérgio Amorim: Eu só fiquei com ela primeiro.
Ricardo Vilches: Você ficou o quê? Você fez sexo com ela?
Sérgio Amorim: Fiz.
Ricardo Vilches: Ela queria?
Sérgio Amorim: Com camisinha...
Ricardo Vilches: Ela queria?
Sérgio Amorim: Hãn?
Ricardo Vilches: Ela queria?
Sérgio Amorim: Com camisinha...
Ricardo Vilches [pergunta exaltado]: ELA QUERIA FAZER SEXO
COM VOCÊ?
Ricardo Vilches, não satisfeito, segue o seu intento de
inquirição e, em determinada ocasião, pergunta a Sérgio a sua participação no
fato. Sem querer responder, num primeiro momento, é levado a isso pelo
repórter, que passa a fazer perguntas em tom exasperado [arquivo:
7_Rede_Massa_STB_Trecho_1_Tribuna_da_Massa.mp4 - 05:53-06:42].
Ricardo Vilches: E no dia seguinte você voltou?
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
23
M inistério P úblico F ederalP r dcuradoria da R epú blica no E stado do P araná
Sérgio Amorim: No dia seguinte, nós dois pegamo e voltamo né!?
Voltamo lá, daí ele...daí fala, cometemo o ato também, nós
dois... nós dois...
Ricardo Vilches: Ela já tava morta ou tava viva?
Sérgio Amorim: Acho que ela já tava morta, porque...
Ricardo Vilches: Você fez isso com ela morta?
Sérgio Amorim: Os dois.
Ricardo Vilches [exaltado e apontando o dedo na direção de
Sérgio]: Você fez? Tô perguntando de você! Você fez com ela
morta?
Sérgio Amorim: Com ela morta?
Ricardo Vilches: é... no outro dia?
Sérgio Amorim: Voltamo lá, eu segurei ela e o Paulo fez o ato,
que é o outro lá, o outro baixinho também, e eu também. Daí
ele pegou [aponta para Ezequiel com a cabeça] e falou bem
assim “ah, vamo enterra ela" [Ezequiel, nesse momento, nega
continuamente com a cabeça]. Ele falou nél? Daí eu falei não,
eu não vou enterrar. Daí eles pegaram e fizeram o buraco e
enterraram ela e ele falou que eu que enterrei, entendeu?
Em resumo, as entrevistas são tomadas à forca, com o
repórter pressic nando os presos, que estão sob a tutela policial, a falar em
frente às câmeas. A propósito, cabe destacar que as filmagens também são
impostas, quem permite e exibe a imagem dos presos aos repórteres são os
próprios policia s, tanto que durante as entrevistas, nota-se que foi um dos
agentes da Polícia Civil que colocou Ezequiel e Sérgio em frente a um painel
com o símbolo c d Governo do Estado do Paraná.
Não obstante a pessoa entrevistada negue a ocorrência
ou sua particip ação no crime, tal negativa é ridicularizada e afastada tanto
Rua Mi rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700- F a x (0xx41) 3219-8892
24
fo
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica n o E stado do Paran á
pelo repórter quanto pelo apresentador, que passam a reforçar a imagem do
suspeito como bandido.
Após o fim da matéria, já nos estúdios do programa, Paulo
Roberto Galo arremata com seus comentários, simplistas e ricos em
impropérios, exaltando o trabalho de Ricardo Vilches, essencialmente quando,
segundo o apresentador, “apertou” os acusados, fazendo com que eles falassem
[arquivo: 7_Rede_Massa_STB_Trecho_1_Tribuna_da_Massa.mp4 - 06:44-07:03].
PAULO ROBERTO GALO: que história macabra. Que coisa
estranha. Você entendeu o que esse desoraçado do olho roxo
falou? O cara que está ao lado dele, no momento da entrevista
do Ricardo Vilches, o tempo todo balançava a cabeça e faziam ó
[o apresentador balança a cabeça em sinal negativo várias vezes]
... e o cara contando história. Ele foi, voltou, foi e voltou, e o
VILCHES APERTOU ELE.
O apresentador, em outra oportunidade, ainda referindo-se
ao caso Tayná passa a atacar pessoas que trabalham em circos e parques de
diversão. Por serem atrações itinerantes e que costumam fixar-se durante certos
períodos de tempo em algumas cidades, Paulo Roberto Galo passa a sugerir o
rigoroso controle dessas pessoas, como se, presumivelmente, fossem bandidos.
Ilustrativo, nesse sentido, é o trecho extraído da gravação a
05:10-seguir [arquivo: 8_Rede_Massa_STB_Trecho_2_Tribuna_da_Massa.mp4 -
05:32]:
PAULO ROBERTO GALO: BOA MÁRCIO BARROS [exclama aos
gritos], “vamo tentá sabê”... e a pergunta autoridades: qual o
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
25
M inistério P úblico F ederalP r dcuradoria da R epública no E stado do Paraná
procedimento quando chega um parque de diversões? Quando
chega um circo em nossa cidade? [questiona gesticulando com
pequenos pulos] Que documentos que se pede? Quem são as
pessoas? SIM [novamente aos Qrítos]... porque auem trabalha
normalmente num paraue ou num circo, sabe!?, de repente
são pessoas sem empreso, não se sabe da onde vêm, nem
para onde vão.
De todo o exposto, nem se precisa de maiores explanações
para se inferir s )bre o completo absurdo que se constitui o programa Tribuna da
iariamente pela Rede Massa e comandado por Paulo Roberto
Galo. O ocorridd no Caso Tayná é o exemplo concreto.
Massa, exibido
B) DA CONDUTA DA TV INDEPENDÊNCIA (RICTV). PROGRAMA BALANÇO GERAL.
0 programa Balanço Geral, exibido pela Rede
Independência de Comunicação (RICTV), também não economiza no teor
“policialesco” ( e suas reportagens. Comandado pelo apresentador Gilberto
Ribeiro, Deputa Jo Estadual pelo Paraná, o programa exibe diariamente notícias
sobre homicídio:, estupros e diversas outras formas de violência em rede aberta.
O programa, ass m como o Tribuna da Massa, é exibido no horário do almoço, por
volta do meio-d a2.
O programa Balanço Geral segue a mesma lógica do gênero
policial. Desde c início de sua exibição, o ponto crucial da transmissão reside nas
notícias de posiíveis crimes violentos cometidos na Região Metropolitana de
2 Grade<http://pr.ricmhis.com.br/Drogramacao-tv/>. Acesso em 21.out.2015.
de programação da Independência.TV Disponível em:
Rua M rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (Oxx.41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
26
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica no E stado do P aran á
Curitiba. São personagens frequentes do programa usuários de drogas,
alcoólatras, moradores da periferia etc.
No curso do Caso Tayná, sem mencionar a exacerbada
exploração dos sentimentos da família da vítim a, mostrando a mãe e a irmã
aos prantos diante das câmeras, o apresentador do programa não deixou de
prejulgar Sérgio Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique
Camargo Cunha e Ezequiei Batista.
Em um dos trechos do programa, o apresentador Gilberto
Ribeiro, num típico maniqueísmo simplista, comum ao gênero midiático,
considerando os quatro suspeitos como “monstros" e “inimigos”, arremata a
matéria exibida com comentários, como:
GILBERTO RIBEIRO: Sinceramente, eu não tenho nem palavras
viu gente?!. Por que de tanta monstruosidade? De tanta
covardia? Matar por que hein? Tem gente, só pra encerrar aqui ó,
que vem pra esse mundão de meu Deus só para aumentar o peso
aqui na terra. Só para fazer, única e exclusivamente, o m al!
[arquivo: 6_RIC_TV_Policia_e_criminosos_procuram_corpo.mp4 -
00:53-02:28].*
Se tais considerações já não fossem muito, o programa
ainda faz questão de enriquecer seu repertório de estigmatização mostrando
inúmeras imagens dos quatro acusados sendo conduzidos por policiais. Isso
quando não decide repetir a imagem do ato de colocação e retirada dos
suspeitos do interior de uma viatura policial.
Ainda, o programa também exibiu trechos de uma
entrevista “concedida” por Sérgio Amorim durante as buscas pelo corpo deRua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR — CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889227
SiSgP
M inistério P úblico F ederalP r 5CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
6_RIC_TV_Polida_e_criminosos_procuram_corpo.mp4 - 00:53-Tayná [arquivo:
02:28].
Repórter: Agora um dos acusados aponta, nesse exato momento,
onde teria sido enterrado o corpo de Tayná da Silva e, a partir
de agora, os agentes da Policia Civil vão verificar se é
verdadeira ou não essa informação. A gente continua
acompanhando... A gente percebe alguma confusão nessa
informação que tá sendo repassada por parte do suspeito para
polícia, se é verdadeira ou não a informação, os agentes têm
que acreditar nessa informação porque procuram, a todo
momento, o corpo dessa vítima.
[surge a voz de alguém, supostamente um policial]
Policial: Era na beira do carreiro? Era perto do Carreiro?
Suspeito: Era.
[surgem outras vozes indefiníveis, uma delas começa a gritar:
vamo, vamo Sérgio]
Repórter: Mesmo com a procura incessante, nenhum vestígio.
Sérgio, um dos acusados, garantia que o corpo estava no local.
[a imagem se concentra na figura de Sérgio, um dos acusados]
Pessoa não identificada [perguntando para Sérgio]: 0 que
que você fez?
Sérgio: Eu apenas “truxe” ela pra cá.
Pessoa não identificada [perguntando para Sérgio]: Já morta?
Sérgio: É...tava.
Pessoa não identificada [perguntando para Sérgio]: Onde
vocês mataram ela?
Sérgio: Aqui [aponta com a cabeça a direção]... perto da trave
aqui ó.
Pessoa não identificada [perguntando para Sérgio]: Mataram
como?
Rua Mi rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
28
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú b lic a n o E stado do Paraná
Sérgio: Foi é... assim, com o braço [gesticula com os braços
algemados]. Uma gravata.
[a imagem açora mostra os demais acusados sendo
conduzidos pela polícia ao local, saindo do camburão de uma
das viaturas da Polícia Civil]
Repórter: Em seguida, também chegaram ao local Paulo e
Adriano, também acusados de terem estuprado e assassinado a
jovem Tayná da Silva, de apenas catorze anos. Informações
repassadas pela própria polícia dão conta de que ela teria sido
violentada sexualmente na última terça-feira. Os criminosos
deixaram a vítima agonizando no local até o dia seguinte,
quando decidiram enterrá-la.*
Por fim, impende destacar a contribuição do Estado do
Paraná na produção da matéria exibida no programa sobre o caso. No momento
em que conduzia um dos suspeitos ao suposto local de morte, a polícia não
impediu a entrada do jornalista da TV independência. Ocorre que, pela
legislação penal e processual penal, a preservação do local de morte é crucial à
investigação preliminar. 0 ato de permitir a entrada irrestrita de qualquer
pessoa ao local durante as buscas pelo cadáver de Tayná apenas ressalta a total
desconsideração da Polícia Civil do Paraná na boa condução dos trabalhos. Tal
conduta somente corrobora as afirmações já feitas, de que atuam quase como
parceiras dos programas com conteúdo policial.
Destarte, as considerações feitas em relação ao programa
Tribuna da Massa também podem ser transportadas para o programa Balanço
Geral em sua integralidade.
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
29
Ministério P úblico F ederal(CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁP r
C) DA CONDUTA DA REDE RECORD DE TELEVISÃO. PROGRAMA CIDADE ALERTA.
0 programa Cidade Alerta, exibido pela Rede Record de
Televisão, é um dos marcos do gênero “policialesco”. A gravação do programa é
feita em São Pa jIo, mas sua exibição se dá para todas as emissoras afiliadas à
Rede Record no território nacional. Com apresentação de Marcelo Rezende e
comentários de Percival de Souza, o programa é nacionalmente reconhecido
pelo forte teor de suas matérias, sempre acompanhadas de comentários dos
apresentadores - que também não deixam de explorar todas as nuances
macabras e ater orizantes dos fatos violentos.
Quando o programa passou a cobrir o Caso Tayná, o
apresentador A arcelo Rezende iniciou com comentários completamente
dramatizados. Isando de jogo de voz e até mesmo na criação de um sotaque
mais próximo à íngua falada pelo povo, Marcelo Rezende descreve como teriam
ocorrido os fat( s que ensejaram na morte de Tayná. A história narrada pelo
âncora do folhe tim tenta passar ao espectador a mensagem de que, numa
pacata cidade c o Paraná, quatro homens, sem qualquer tipo de freios morais,
acabaram com i vida de uma menina, o que, por si só. justificaria a atitude
da população ?m destruir completamente o parque de diversões onde
trabalhavam. À evidência, o apresentador chega a afirmar que o objetivo da
em verdade, os quatro suspeitos, sendo que eles deveriam serdestruição seria
queimados.
Segue trecho do programa [9_Record_Cidade_Alerta. mp4
00:00-02:34]:
MARCELO REZENDE: Deixa eu dizer uma coisa. Pensa no
seguinte: aquele porquinho de diversão, era a alegria da
rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
Rua M
30
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica no E stado do P araná
criançada, toda noite a criançada ia para o porquinho de
diversão. É roda-gigante, aqueles “negócio” que gira [o
apresentador faz círculos no ar] e roda assim... tinha bolinha
para jogar. Argola. E as crianças ali a se divertir. Ali era a
felicidade daquela cidade pequenininha, tranquila [fala
referindo-se ao município de Colombo]. Então, as famílias se
reuniam lá também. Mas de repente, na cidade tranquila, na
cidade tranquila, some uma adolescente de catorze anos. Na
última terça-feira ela sumiu. Ela sumiu e a família procurou
terça, quarta... e aí encontrou. Encontrou o corpo da menina,
correto, a duzentos metros do parque. Você me diria: “mas
como Marcelo? encontrou o corpo lá jogado de qualquer jeito?”
[o apresentador faz sinais negativos com a cabeça, ao mesmo
tempo que profere alguns sons ininteligíveis]. Não... encontrou...
a família encontrou o corpo lá no meio duma mata, certo. 0
corpo tava no meio duma mata e estava enterrado. Exatamente
isso. 0 corpo estava enterrado. Vai daaui. vai dali, tudo
comecou com quatro funcionários íreferindo-se a Sérgio.
Ezeauiel. Paulo e Adriano!. A menina ia passando, eles
penaram a menina, arrastaram para um mato, violentaram a
menina e depois a m ataram e enterraram... e a população foi
às ruas, põe as imanens aí...
[começa a ser transmitida a imagens relativas à destruição do
parque de diversões em Colombo]
MARCELO REZENDE (voz): Você vai vendo aí toda população
destruindo o porquinho. Tudo vai sendo quebrado, incendiado.
Carros incendiados, os caminhões... do... o caminhão do parque
incendiado, roda-gigante incendiada, tudo. Por quê? Porque a
população na verdade aueria incendiar os quatro
estupradores. põe no ar.*
Rua Marechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR — CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
31
M inistério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
Denota-se, pois, que os objetivos do programa Cidade
Alerta passam bnge da pretensão de bem informar. Sob a batuta de Marcelo
Rezende, a atração segue, quase que na integralidade, incitando o ódio e
conclamando o povo a lutar pela justiça séria e eficiente, que nada mais é,
segundo se depieende dos comentários do apresentador, a “Lei do Talião”. Em
diversos momen :os, Marcelo Rezende, além de presumir que os quatro suspeitos
já haviam cometidos crimes semelhantes, mostra-se indignado com a presença
de várias garan ias previstas constitucionalmente, dentre elas a decretação da
prisão como mei lida excepcional.
é prescrito como aO “olho por olho, dente por dente
panaceia para t< dos os males que circundam o cidadão de bem.
A propósito, impende destacar os comentários finais do
apresentador sc bre o caso [10_Record_Cidade_Alerta_comentário_final.mp4 -
02:40-03:14]:
MARCELO REZENDE: Eu vou te contar, hein, Percival
[comentarista do programa]!? Que que faz com um sujeito desse?
Percival de Souza: Esse não merece absolutamente nada. Uma
menina indefesa, catorze anos... e ainda deixam em agonia de
um dia para o outro Marcelo.
MARCELO REZENDE: Não bastava estupra, não bastava saber,
ter a certeza, de que ia “matá”, mas deixaram a menina, ainda,
sofrendo de um dia para o outro. O cara diz [referindo-se a
Sérgio Amorim]: “não, matei aqui com uma gravata”... e daaui a
pouco vai tá na rua repetindo o quadro, porque é óbvio que
não é a primeira vez. *
Não havia forma mais exuberante do apresentador
a a desconsideração pelo que se entende como garantiasdemonstrar tocRua M rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889232
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
fundamentais. 0 trecho acima bem descreve do que se trata o conteúdo do
folhetim.
Por fim, destaque-se que o programa também fez uso das
matérias produzidas pela Rede Independência de Comunicação (RIC), no
programa Balanço Geral, visto que esta é afiliada da Rede Record no Paraná.
Portanto, como se vê, o desrespeito a qualquer garantia
constitucional do indivíduo é quase que a única pauta do programa Cidade
não tendo sido diferente por ocasião do Caso Tayná, motivo pelo qual
também está inserido no contexto dessa Ação Coletiva.
Alerta
D) DA CONDUTA DA TV BANDEIRANTES DE CURITIBA. PROGRAMA BRASIL
URGENTE PARANÁ.
0 programa Brasil Urgente Paraná é a versão local do
programa Brasil Urgente, apresentado, em São Paulo, por José Luiz Datena. A
versão paranaense é conduzida pelo apresentador Vai Santos na TV Bandeirantes
de Curitiba.
Vai Santos já é conhecido do grande público paranaense
como apresentador de programas policialescos, como ele mesmo afirma em seu
site pessoal: é um experiente comunicador, que por oito anos ficou à fre n te de
um programa policial na Rádio Clube, em Realeza. Em 2008 fo i apresentador do
'Tribuna da Massa' em Foz do Iguaçu e ficou por 8 meses no comando do
programa. Em 2009 fo i para a capital para apresentar o 'Tribuna da Massa',
estadual. Foi o apresentador do programa durante um ano e quatro meses. A
p a rtir dai Vai Santos fo i para o Grupo Bandeirantes apresentar o 'Paraná
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR — CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
33
M inistério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
Acontece' e deoois 'Boa Tarde Paraná' agora surge o novo projeto 'Brasil
Urgente'3.
0 programa Brasil Urgente Paraná também é exibido em
horário inadequado, durante o período da tarde, e é rico em imagens de
brutalidade e v olência. Fazem parte do repertório do programa as seguintes
manchetes: “M(
SEIS TIROS NO IRISTO REI”;
ENTERRAR NO QUINTAL DE CASA”; “CRIME BRUTAL - POLÍCIA PROCURA CORPO
DA MENINA EST IPRADA E MORTA EM MATAGAL".
RTO NO CARTÓRIO - HOMEM É EXECUTADO COM, PELO MENOS,
FRIEZA - JOVEM É ACUSADO DE MATAR O PAI E
Durante o Caso Tayná, ao descrever os investigados, o
apresentador Vai Santos não economiza em adjetivos. De forma categórica, em
completo desrespeito à presunção de inocência, afirma que os investigados
Adriano, Sérgio Ezequiel e Paulo não são “bonzinhos”, ao contrário,
desgraçados, b mdidos. malditos, com sangue ruim que corre por aquele
corpo, há muitc tempo” .
sao uns
Seguem alguns trechos da fala do apresentador [arquivo:
5_Band_Curitiba _Brasil_Urgente.mp4 - 07:58-11:30]:
Apresentador Vai Santos: Olha gente, aí, diante disso a mãe... A
mãe foi pra, pra Rádio Banda B, na qual o Vanderlei trabalha, na
qual o Bruno trabalha, também. Na terça-feira, Vanderlei? Na
terça-feira a mãe, desesperada, pedindo pra... Se alguém
soubesse da filha, até pelo fato de que ela teria mandado uma
mensagem, dizendo que estava chegando em casa... Mas não
chegou. A mãe foi pra Rádio... E pediu, desesperada, chorando,
mas ainda com a esperança de que a filha pudesse estar viva. As buscas continuaram, a mãe foi para os terminais de ônibus,
http://www.valsantos.com.br/Sobre.asDX>. Acesso em: 30 out. 2015.3 Disponível em:Rua M í rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889234
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica n o E stado do P araná
colando cartazes, mostrando a foto da filha... E ai a policia
descobrelGhegauma denúncia anônima de queamenina havia sido morta. Havia sido estuprada e morta...Apoliciadescobriu,
foi até o parque e prendeu os 4 suspeitos. [Nas imagens da
revolta dos moradores que estão sendo passadas,alegenda passa
a ser “Revolta popular - Rarque onde acusados de matar um
jovem trabalhaméatacado”]Apopulaçãotomouconhecimento
disso, e agora a imagem vai contando o que a população fez
depois de tomar conhecimento de que os4suspeitos no parque,
né. Os4suspeitosdeteremmatadoajovemtrabalhavam nesse
parque de diversões ai. Olha só gente, vai acompanhando, vai vendooqueacontece... Vai vendo ai, ó. Odonodoparquenão
tem nodoavercomahistória.5ó que um detalhe que eu queria
frisaraqui, muito hem lembrado peloGlaudinho, lá daOaúcho
Móveis.que conversava comigo fora do ar aqui dizia...“5erápue
a policia vai investigar por onde esse oaroue passou?” Outros
Municipios onde esse paroue esteve? 5e tiveram crimes
semelhantes? detiveram... Roroue. você achaoue esses caras
fizeram da primeira... É a primeira vez? Éo primeiro crime?
Eram bonzinhos. decentes até então? E de repente, por imoulso. resolveram cometer esse crime? Nãol 5ão uns
desgraçados, bandidos, malditos, com sangue ruimoue corre
por aouele corpo, há muito tem po.Eai.aRolicia. agora, tem
queinvestigarpra saber senessas outras regiões ondeo parque
esteve, não tiveram crimes, roubos, assassinatos, estupros na
ocasião em que estiveram por lá. Rorque os bandidos circularam
também. Eaiopovo meteu fogonoparqueali, ó. Meteu fogo, queimou tudo...Oaminhão, lona, tudo que você possaimaginar... Os brinquedos... Né, tudo, tudo foi destruído pelo povo, graçasà
revolta da população. Você viu que o povo não tolera mais, o
povo não quer mais esperar pra ver o que... Gomo xai dar o desenrolar da história. Os caras confessaramocrime,ocorpo da
jovemTayná ainda não tinha sido encontrado. Mas eles já foram
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR — CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
35
M inistério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
lá e fizeram um arrastão, arrebentaram com tudo. Olha o
carrinho lá do parque, no meio da rua, sendo levado aí, ó
[referindo-se à imagem de carrinho do parque de diversões que
foi levado para a rua]. Sendo levado e destruído depois. Dá uma
olhada aí, ó. Essa é a população de Colombo, e isso aconteceu
ontem à noite. Olha só o que o povo fez quando descobriu o que
aconteceu. Olha aí, ó. Arrebentando com tudo, lá. População
revoltada, lá. Arrebentando tudo, jogando... E aí já aparecem uns
vândalos também que não sabem nem o que estão fazendo lá no
meio. Não sabem nem porque estão ali, mas vão fogo em tudo.
Hoje pela manhã, buscas pelo corpo da Tayná no matagal que
fica atrás do parque de diversões. Seria ali, Bruno Henrique, o
local onde... Eu já falo com o Bruno, antes eu quero a reportagem
que mostra essas buscas hoje de manhã porque eles deram o
ponto onde teriam escondido o corpo da Tayná. Libera a
reportagem, vai lá.[...]
Apresentador Vai Santos: Quatro. Quatro brutamontes,bandidos, possuídos pelo demônio, drogados! DROGADOS, olha
o recado aí! Pra você que faz passeata em favor das d... Da
liberação das drogas! Vai esse recado, aue os caras fizeram
porque tavam com a cabeca cheia da erva do Satanás e outras
coisas mais pesadas também. TAparece a foto dos 4 supostos
criminosos]. Esses caras aí. ó. Mataram! Mataram a menininhade 14 anos Os 4 estupraram, violentaram. E aí amarraram e
voltaram. ÍMostra. agora, imagens da câmera de segurança do
local onde Tavná desapareceu!. Olha aí a imagem dela aí. ó. Põe na tela cheia, vai lá! Essa é a última imagem da garotinha. Olha aí ó. Ela mandando a mensagem pra mãe, meu Deus do
Céu! Ela mandando a mensagem pra mãe. Presta atenção ali.
Esse é o momento que ela manda mensagem pra mãe, no celular! Um pouquinho antes de se aproximar do parque onde ela seria
violentada, estuprada e morta. Essa é a última imagem da Tayná.
Rua M e rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
36
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Indo pra casa, mas não chegou. Mandando a mensagem pra mãe... A última mensagem que a mãe recebeu da filhinha dela. Ai meu
Deus, ajuda porque não é fácil não, viu [arquivo:
5_Band_C u ri ti ba_B rasi l_U rge n te. m p4 - 47:10-49:13]:.*
0 apresentador
completamente seu dever de informar com ética e transparência, bombardeia o
espectador com a imagem dos investigados e com o dedo em riste aponta-os
como culpados, como assassinos e estupradores. Indo além, transforma viciados
em drogas em cúmplices do caso.
Vai Santos desconsiderando
Em outra oportunidade, além de defender a pena de morte,
o apresentador refere-se ao sistema de justiça, “a justiça dos homens”, como
fator impeditivo do andamento do seu programa [arquivo:
5_Band_Curitiba_Brasil_Urgente.mp4 - 57:34-58:10]:
Apresentador Vai Santos: Brasil Urgente de volta, e eu já vou
me despedindo aqui, até porque o Datena já tá chegando direto
de São Paulo. E tem um assunto lá que... Deixa a população
doida, que não deu pra gente comentar hoje pela gravidade do
caso próximo da gente aqui, que é do menininho de 5 anos que
pediu, implorou pra viver e os desgraçados mataram a criança,
que ele estava com medo, quase chorando. É o assunto. É o
assunto. O assassino do menino Bernardo merece pena de morte?
É o que vale aqui pra nós também. Os assassinos da menina
merecem pena de morte? Deveria existir nesse país, ou não?
Datena, eu volto amanhã às 7h30 da manhã, se Deus quiser, e a
justiça dos homens (não foi possível entender). Tchau, tchau
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
37
Ministério P úblico F ederalP r < c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
No programa, pode-se acompanhar, em tempo real, todas as
nuancesdatrisiezahumana. Porém, ainformação séria, objetivo pelo qual a
imprensa devepimar,nãoéencontrada em momento algum.
As garantiasedireitos fundamentais,consideradas como um
acinte pelo apresentador,éotema que menos ganha espaço no programa,salvo
quandoépara sofrer achincalhação de seus comentários.
5) DA GONDUTADA TV COLOMBO. PROGRAMA BOANOITB COLOMBO.
0 Programa Boa Noite Colombo é o único dos listados nesta
demanda que nã o passa em rede aberta de televisão. Entretanto, a programação
da emissora est á integralmente disponível no YouTube. aue permite o acesso
pela rede mune ial de computadores4. A atração é conduzida por Iverson Vaz,
que também é epórter policial do programa 190, da rede CNT, e por Samuel
Rocha. O prognma é transmitido ao vivo para o município de Colombo pelo
canal 18 da CTV.
Durante a exibição, além de condenar definitivamente os
apresentadores, aproveitando-se que o alcance do programa é
ídem esforços no sentido de atacar frontalmente a dignidade de
Ezequiel e Paulo.
investigados, os
limitado, não m
Adriano, Sérgio,
Com imagens cedidas pelo programa 190, da rede CNT, o
folhetim fez qu ?stão de ressaltar nos informes que seguiam as reportagens os
seguintes dizer ;s: “QUAL SERIA A PENA JUSTA PARA OS ASSASSINOS DA
ADOLESCENTE ' AYNÁ ADRIANE DA SILVA?”; “CASO TAYNÁ: VÍDEO DO MOMENTO
EM QUE POLIC AIS E CIDADÃOS ENCONTRAM O CORPO DA ADOLESCENTE”;
4 Disponível em: https://www.voutube.com/user/tvcolombo>. Acesso em: 03 nov. 2015.rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
Rua Mi
38
M inistério P úblico F ederalP ro cura d oria da R epú b lic a n o E stado do Paraná
“QUAL SERIA A PENA PARA OS CRIMINOSOS QUE ESTUPRARAM E MATARAM A
TAYNÁ” .
Indo além, o programa permitiu aos espectadores o contato
direto por meio telefônico. As conversas eram exibidas ao vivo, sem nenhum
corte. A quantidade de frases violentas e de ódio é assustadora. E pior. Ambos os
apresentadores faziam questão de compactuar com as mensagens dos
espectadores, ajudando a incrementar o repertório de instigação à violência, à
tortura e à castração.
Num dos diálogos com uma espectadora, identificada como
Salete, os apresentadores Iverson Vaz e Samuel Rocha, não satisfeitos com o
desejo de desforra da participante, ainda fizeram questão de frisar que os
investigados eram “bandidos” e diziam a toda hora para que fosse mostrado o
rosto de um deles, no caso Sérgio Amorim.
0 diálogo se deu da seguinte forma [arquivo:
3_TV_Colombo_Boa_Noite_Colombo_esta_de_luto.mp4 - 07:58-10:47]:
Samuel Rocha: Vamo pedir a opinião das pessoas em casa,
Iverson? Nós temos a participação aqui com a gente, tá tocando
o telefone. Olá, buenas noches.
Participante por telefone (Dona Salete): Boa noite [som
distorcido].
Samuel Rocha: Boa noite, quem é? Opa, tamo com problema de
novo aqui, produção. Olá, boa noite.
Participante por telefone (Dona Salete): Boa noite.
Samuel Rocha: Quem tá falando?
Participante por telefone (Dona Salete): É Salete.
Samuel Rocha: Oi Dona Salete. Não tão boa noite assim, Dona
Salete, com uma notícia triste dessa, né, Dona Salete?
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
39
M inistério P úblico F ederalP r 3CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
Participante por telefone (Dona Salete): Nem me fala, menino.
Samuel Rocha: Qual a sua opinião, a senhora que tem uma
neta... Tem filhos... Né, uma situação dessa, aí no Município de
Colombo, essa violência...
Participante por telefone (Dona Salete): Nem me fale. Eu to
indignada com isso. Sinceramente, olha, a pena desse cara
sabe o aue aue. 0 aue aue seria bom fazer? Amarrar uma
pedra de 100 kv na orelha dele, pra não dizer outra coisa. E
pôr ele desfilar nas ruas.
Samuel Rocha: Arrastando, né?
Participante por telefone (Dona Salete): Vish...
Samuel Rocha: Ô Ariel. coloca as imagens da matéria ora
Qente. aí. pra gente ver a cara do bandido.
[começam a ser passadas as imagens da matéria fe ita pelo
programa 190, em tela dividida com o estúdio de gravação
Participante por telefone (Dona Salete): Meu filho, aquele... A
cara daquele vagabundo pedindo desculpa, vente, isso a í não
existe desculoa no mundo.
Samuel Rocha: Ó eu vou tentar mostrar ora você. Salete. a
cara de um deles, olha, esse auem é. Iverson? festá
aparecendo, neste momento, a imaçem de Sérvio Amorim. nas
buscas pelo coroo de Tavná(
Iverson Vaz: Na verdade, esse aí é o Sérgio Amorim da Silva, de
22 anos de idade.
Samuel Rocha: Consegue uma imagem melhor aí, Ariel, por
favor.
Iverson Vaz: Ele ajudou a m atar a pequena Tavná. [a imagem
congelano rosto de Sérgio Amorim da Silva e continua, ao fundo,
música funesta] Então, repetindo, esse é o Sé raio Amorim da
Silva, de 22 anos de idade. Aeora. este... Conversando com
esse vagabundo. com esse sem vereonha aí... fa imanem
mostra, agora, o rosto de Paulo Henrique Camargo Cunhal,
que que ele falou... Esse outro, esse iá é o Paulo Henriaue
Rua M irechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
40
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Camargo da Cunha. Ele aue matou estrangulado a menina
com o cadarco dela.
Samuel Rocha: E é esse que tava em prantos, em desespero,
chorando, pedindo desculpa, ne?
Iverson Vaz: Exatamente.
Samuel Rocha: Haha, nem chorar ele consegue, né.
Iverson Vaz: Olha como os cara são macabro, são frios, são
calculistas...
Participante por telefone (Dona Salete): Filho! Eu digo uma
coisa para vocês, ó. Eu não estou lá na frente da TV. A minha
vontade é de quebrar a televisão, entendeu, entrar lá e quebrar
a cara dele. Quebrar... moer! Meu Deus, eu sou uma mãe.
Iverson Vaz: Então, viu Salete, o Samuel...
Participante por telefone (Dona Salete): Eu tenho uma neta,
pelo amor de Deus gente, que que é isso? [com voz de choro] Isso
não pode deixar acontecer, pelo amor de Deus.
Samuel Rocha: Inclusive, Salete, a gente tava assistindo ontem,
não sei se você assistiu nosso programa ontem, quando a mãe.
Ariel, por favor, coloca embaixo essa manchete de qual seria
a pena dos criminosos, para as pessoas participarem . Salete
a gente tava ontem, no programa quando ela deu entrevista, a
mãe da Tayná deu entrevista na rádio. Ainda não sabia. E ela
chorando, apelando. Quem sabe da minha filha? Onde ela tá? E
tal, e ela chorando... Imagina a situação que tá agora essa mãe,
né.
[A manchete “Qual seria a pena para os criminosos aue
estupraram e m ataram a Tavná” aparece em letras grandes na
tela]*
Ora, não sendo suficiente a intensa exposição da imagem de
um investigado, que sequer constava como parte num Processo Penal, os
apresentadores tinham o intento de instigar o ódio popular pedindo
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
41
iMlo
M inistério P úblico F ederalP rc c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o Pa r a n á
incessantemente a participação dos espectadores para que opinassem sobre a
landidos”, aos “criminosos”. A partir disso, como se poderá ver,
tornaram-se mais agressivas.
pena justa aos
as manifestações
Samuel Rocha: Tá certo. Vamo pras mensagens, aqui, e você que
tá participando aí em casa, tá assistindo, a gente gostaria de
saber, também, a sua opinião. Tá embaixo aí. aual seria a
pena para os criminosos aue estupraram e mataram a Tavná?
Nós temos aqui a mensagem do Rone José, participando aqui
com a gente: [lendo no computador a mensagem] “Em, todo o
protesto pelo Brasil, pouco foi visto pedido de pena de morte.
Em um caso como esse, e absurdo. É absurdo. Os assassinos
estão oresos. Vão comer e beber às nossas custas. E daqui a
pouco saem. E aí?” É o Rone José está dizendo que hoje (não foi
possível entender), porque, realmente, o caso é complicado, ele
tá dizendo “0 caso Tayná, um monstro, saiu até no Jornal
Nacional”. E Colombo está de luto, né, gente.
Iverson Vaz: Com toda a certeza. Quem perde é a nossa
população, porque a gente fica manchado, né. Colombo sai
estampado em todos os jornais, de uma forma negativa. Agora,
há de se ressaltar, também, viu, Samuel Rocha, o trabalho
fantástico do Dr. Si Ivan. 0 Dr.... 0 Delegado, aqui, do Alto
Maracanã, que ele, com aquele faro policial dele, com toda a
experiência, ele foi até o parque falando, não, os caras são
suspeitos. Levou imediatamente para a delegacia, e começou a
interrogá-los. Aí. naquela de interrogar, o Delegado, que é
não, esses caras têm culpa no
cartório”. Começou a dar uma prensa daaui. uma prensa de
lá. os caras não aguentaram e confessaram o crime, viu.
Então tem que tira r o chapéu pro nosso delegado que tá
fazendo um papel brilhante, aaui em Colombo, viu.
macaco velho falou.
Rua Ma echal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700-F ax (0xx41) 3219-8892
42
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Samuel Rocha: É verdade. Mais mensagens chegando sobre
caso, você também participa com a gente, 97672311. Coloca um
pouquinho aí, Ariel, o 97672311, que, de repente você que está
assistindo a gente pela primeira vez também, ou não decorou o
número, e vamos ter o sorteio do DVD daqui a pouco, tá bom? 0
Kevin tá dizendo o seguinte, a opinião do Kevin, com relação a
esse caso aí [inicia a leitura no computador] “Samuel, um
monstro pedindo desculpas é muito cara de pau. Vagabundo.
E ele falou aue pode bater nele, mas não para matar. Ele
tinha aue mandar eles lá no presídio e fa la r ora todos os
presos o aue eles fizeram ”. Mas é o que eles falam, já chega,
na ficha, já recomendado “ó, tá chegando uma mulherzinha pra
vocês a í”, não é verdade Iverson?
Iverson Vaz: É bem isso, é bem isso. Tanto é que eu falo na
m atéria. Os caras vão raspar a sobrancelha dele, vão colocar
um batonzinho nele, uma carcinha vermelha.
Samuel Rocha: Coloca até a imagem dele aí, Ariel. Um deles aí,
pra gente ver como ficaria...
Iverson Vaz: O que você fez com ela, eles vão fazer com você.
Pena que não vão te m atar, entendeu? Poraue eu também sou
a favor da oena de morte, sim.
Samuel Rocha: Pelo menos não tem gasto ora gente pagar, né?
Não vai ficar lá. vivendo às nossas custas.
[A tela fica dividida entre o estúdio do programa e as imagens
das entrevistas dos supostos criminosos]
Iverson Vaz: Você não tem que ficar mantendo vagabundo,
porque cara dessa, aí, olha, desculpa. Eu acho que não há
religião, eu acho que não há quem recupere.
Samuel Rocha: Olha só. a cara do monstro, frisa aí. Ariel.
frisa a í f referindo-se à imagem de Paulo Henriaue Cunhal
Iverson Vaz: Como é que vai recuperar um cara desse aí, ó? Não
tem como. Cara frio, calculista, sabe? Pegou, estuprou a
menina, primeiro quando ela tava viva. Depois que a menina
esse
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3 2 1 9 -8 7 0 0 - Fax (0xx41) 3219-8892
43
M inistério P úblico F ederalP i o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
tinha morrido, o cara volta lá e estupra de novo. Aí, “não, vou
ocultar o cadáver”. Pega, e joga dentro do poço. Sabe? São
coisas assim inadmissíveis, minha gente. Que se a gente passar
a mão na cabeca... sabe? E a í nós vamos entrar naquela, tem
que rasgar a Constituição, fazer uma nova Constituição,
ooraue os advogados encontram brechas na lei, e a í acabam
retirando um lixo desses da cadeia, aue volta ora sociedade,
volta a cometer crimes. Aliás, tem até um aqui ó, que o
Delegado me passou que já tem passagem pela Polícia por
[arquivo:
3_TV_Colombo_Boa_Noite_Colombo_esta_de_luto.mp4 - 19:47-
23:07].*
tambémassassinatoestupro e
Os termos usados por Iverson Vaz ao se referir às garantias e
direitos fundarr entais foram exatamente esses: rasgar a Constituição. Segundo
o apresentador os Direitos Humanos e Fundamentais servem somente aos
advogados que se valem de “brechas” legais. Sem mencionar o intenso apoio à
violência e arbi rariedade policial.
Também merece destaque os diálogos com a espectadora
Margarete
Boa_Noite_Colombo_esta_de_luto.mp4 - 25:55-29:08]:
identificada [arquivo:como
3 TV Colombo
Samuel Rocha: O Estado vai manter, vai bancar eles na cadeia,
agora, né? Vai ter alimentação, né, pouso, não vai trabalhar.
Vamo atender, você que participa aí com a gente pra dar a sua
opinião no ar. Olá, boa noite.
Participante por telefone (Margarete): Boa noite, Samuel.
Samuel Rocha: Boa noite, quem tá falando?
Participante por telefone (Margarete): É Margarete, de (não
foi possível compreender).Rua V arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone (0xx41)3219-8700 - F ax (0 x x 4 1 )3219-889244
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Samuel Rocha: Você que está nos assistindo aí, que notícia
triste, hein, Margarete? Você é mãe?
Participante por telefone (Margarete): Sim, tenho dois filhos.
Samuel, na minha opinião, tinha aue pegar esses caras, e ir
batendo neles, e m atar eles aos pouquinhos. Porque no... O
aue ele fez... Não tem esse negócio de desculpa, não tem
explicação pra isso. E pegar uma faca aue não tenha fio, e
cortar o saco deles assim, ó.
[Samuel começa a rir, assim como a participante por telefone].
Samuel Rocha: Mas é verdade, a gente fica revoltado, né.
Margarete, então, tem aue cortar mesmo. Na verdade ele vai
virar mulherzinha na cadeia iá. A gente até brinca com uma
situação dessas, ta l, mas ele vai v irar mulherzinha na
cadeia. Praticamente é isso mesmo aue vai acontecer né.
Participante por telefone (Margarete): É, tem que largar eles
pra população fazer isso aí.
Samuel Rocha: A í não dá ooraue daí a população iá m ata de
uma vez. Ele tem aue morrer uma morte lenta, né.
Margarete?
Participante por telefone (Margarete): É. tem que ser
lentamente. Arrancando uma unha... Arrancando a outra...
Espetando de um lado, deoois do outro. Poraue. nossa, isso
daí foi muito triste.
Samuel Rocha: Você é mãe, também, Margarete?
Participante por telefone (Margarete): Eu sou.
Iverson Vaz: Ela tem dois filhos.
Samuel Rocha: Dois filhos?
Iverson Vaz: Que idade tem teus filhos, Margarete?
Participante por telefone (Margarete): Meu filho tem... 0 mais
velho tem 23 anos. E o outro tem 20.
Iverson Vaz: É, a gente que é pai, a gente que é mãe e se
depara com uma situação dessa, viu, Margarete. É...Você, passa
um film e pela tua cabeça. Porque, aí vem toda aquela situação
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
45
M in is t é r io P ú b l ic o F e d e r a l(CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁPr
do teu filho pequenininho, você dando amor, dando carinho. Aí
você acompanhando o crescimento da sua criança, do seu filho.
Aí você sempre dando dicas, né, de segurança pro teu filho, né.
“Ó filho, cuidado com a internet, cuidado com o Facebook... Ó,
quando você for atravessar a rua, olhe pros dois lados. Se
alguém for te oferecer bala, não aceite bala de estranhos”. Você
passa um filme na cabeça. Aí vem um vagabundo desse aí, sabe?
E acaba cometendo uma atrocidade dessa? Realmente, tem que
ter pena de morte, sim. Nesse caso, que eles são réus confessos.
Samuel Rocha: Confessos.
Iverson Vaz: Entendeu? Tem que ter pena de morte. 0 que nós
não podemos fazer é injustiça, né? Porque tem muita gente,
também, que tá preso indevidamente. Aí o povo “não, pena de
morte pra todos os bandidos”, não é assim, minha gente.
Samuel Rocha: Cada caso é um caso, né?
Iverson Vaz: Agora, o cara é réu confesso. Confessou que,
realmente, ele estuprou, violentou, e um crime hediondo
desse aí... Tem mais aue ir oro colo do caoeta mesmo.
Samuel Rocha: E o que que você acha, Margarete, esse pedido
de desculpa dele, inclusive friamente, né? Tá ali, sangue frio “É,
eu peço desculpa”.
[Divide-se a tela entre os estúdios do programa e a reportagem
na qual Paulo Henrique Camargo da Silva pede desculpa]
Participante por telefone (Margarete): É. mas é aquilo.
Matam estupram, e depois “ai. você me desculpa”. Não tem
esse negócio de desculpa, não. Tem aue ter oena de morte.
mesmo.*
Como bem se observa nos diálogos, não se trata, em
momento algum de um programa informativo, mas apenas em um instrumento
de disseminaçãc de ódio e instigação à violência. Os apresentadores Samuel
R ua Mi rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41)3219-8700 - Fax (0 xx41)3219-8892
46
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Rocha e Iverson Vaz inclusive colaboram com a assídua espectadora que sugere
inúmeros métodos de tortura, castração e extermínio. Por óbvio que este
programa está longe de ser feito à “família Colombense”.
Conforme o programa avançava, foi exibida uma matéria na
qual foi mostrado, sem qualquer tratamento de imagem, o cadáver de Tayná da
Silva sendo retirado de um poço. Isto é, sem qualquer pudor, exibiram o corpo
de uma menina de 14 (catorze) anos ao vivo na televisão [arquivo:
3_TV_Colombo_Boa_Noite_Colombo_esta_de_luto.mp4 - 17:16-18:51].
Samuel Rocha: E a gente vai mostra agora... Eu nem sei, tá
pronto aí, produção? Tá pronto, vamo mostrar um trechinho
então, essa imagem. 0 momento eu acho que é o momento mais
triste essas imagens aí. Pode colocar no ar.
[Aparece vídeo do momento em que o corpo de Tayná é
encontrado, com a legenda “Caso Tayná: vídeo o momento em
que policiais e cidadãos encontram o corpo da adolescente”]. Vozes se confundindo: sai, sai, sai daí galera. Lá atrás. Ô licença
aí pessoal, licença.[Encontram o corpo dentro de um poço, mostrado na câmera] Narrador da filmagem: Nesse momento, foi localizado o corpo
da peauena Tavná. de 14 anos. Num local totalmente diferente
daquilo aue nós estivemos fazendo as buscas. Depois de
intenso trabalho da Polícia Militar. Polícia Civil. Corpo de
Bombeiros, com a aiuda da população... Com a ajuda da
população, mostro nesse momento, o coroo da pequena Tayná,
de 14 anos. Joeado dentro de uma fossa. É isso aí, JP, da Rádio
Mais, nós estamos aqui, na cidade de Colombo, no bairro São
Dimas, aonde nesse momento foi localizado o corpo da pequena
Tayná, com ajuda da população, que buscou o corpo durante
todo o dia. Hoje, graças a Deus, foi encontrado o corpo da
pequena Tayná.*Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889247
R®P
M in is t é r io P ú b l ic o F e d e r a lP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
[Volta a imagem para os apresentadores do programa]
Os apresentadores Iverson Vaz e Samuel Rocha
demonstraram [ ossuir muita frieza e crueldade. Entender como algo natural e
necessária a e: ibição de cadáveres de adolescentes e discutir métodos de
tortura na televisão somente pode ser visto como total desconsideração pela
vida humana.
Assim, crê-se que não são necessárias maiores
das frontais violações aos direitos e garantias fundamentais
)S pretensos jornalistas em seus programas de televisão.
demonstrações
perpetradas pel
F) DA CONDITA DO GRUPO GRPCOM. PROGRAMA PARANÁTV E JORNAL
TRIBUNA DO PA IANÁ.
0 programa PARANÁTV talvez seja, hodiernamente, o
de notícias do Estado do Paraná. É exibido diariamente, de
o, em duas edições diárias, uma no horário do almoço (perto do
a no horário da tarde (por volta das 19 h)5. A sua transmissão se
Paranaense, empresa do grupo GRPCOM, afiliada da Rede Globo
principal canal
segunda asábac
meio-dia) e out
dá pela RFC TV
de Televisão em Curitiba.
Na época em que foi divulgada a morte de Tayná Adriane da
Silva, o prograr ia foi exibido, ao vivo, em sua edição diurna, dos estúdios em
Curitiba e direiamente de Colombo, onde se encontrava a repórter Karine
Garcia. As des :rições do caso não foram tão abertas como os programas
5 Grade<http://redeglAbo.globo.com/rpc/programacao.httTil>. Acesso em: 22 out. 2015.
da RPCTV. Disponívelc; programaçao em:
irechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3 2 19-8892
Rua M
48
M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica n o E stado do Pa ran á
anteriormente descritos, contudo, também desconsiderou-se
presumida dos quatro acusados.a inocência
De início, a repórter Karina Garcia, após ser interpelada
pela âncora Thays Beleze, considera os quatro suspeitos como culpados pela
morte da menina. A fala da jornalista não se distancia muito das violações
cometidas pelos outros programas. Conforme as perguntas são feitas no estúdio,
Karine Garcia usa termos como “os quatro bandidos” , sem mencionar outros
momentos em que a repórter descreve que “eles mataram” , “eles
estupraram” , passando, continuamente, ao espectador a figura de Sérgio
Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique Camargo Cunha e
Ezequiel Batista como culpados.
Novamente, a repetição do discurso condenatório é crucial
à formação da opinião do espectador. Considerando que o grupo GRPCOM se
constitui, hoje, num dos maiores grupos de mídia do país, forçoso se faz exigir
de seus profissionais uma postura prudente e ética na descrição dos fatos. Em
momento algum, durante as transmissões, foi ressaltado que os sujeitos sequer
haviam sido condenados, que eram presumivelmente inocentes. Tampouco
foram dadas informações sobre os procedimentos a serem adotados pelos órgãos
da Justiça.
0 que se observa nas gravações são dados seletivos, como
se tivessem sido preparados com o único propósito de alçar os indivíduos
apontados pela polícia como indesejáveis e merecedores de punição. Porém,
repita-se, nenhum deles foi sequer julgado. Ao contrário, existem até indícios de
que tenham sido torturados pela polícia.
A conduta da emissora, oportuno dizer, destoa dos
propósitos por ela estampados como sua responsabilidade: Compromisso com o
ser humano.Rua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR — CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889249
IBS M lMinistério P úblico F ederal
P ri -curadoria da R epú blica no E stado do Paraná
A partir das declarações da repórter Karine Garcia, fica
nítida a desc msideração total com as premissas mínimas garantidas
constitucionalmente [arquivo: 1 _RPC_TV_Garota de 14 anos é estuprada e morta
por 4 criminosos no Pa.mp4 - 00:45-01:56]:
Repórter Karine Garcia: Exatamente. Olá Thays, olha, os
quatro bandidos foram presos ontem pela Polícia, nesse
momento, eles estão na Delegacia do Alto Maracanã, aqui em
Colombo, que fica na Região Metropolitana de Curitiba. Os
quatro bandidos tem entre 22 e 25 anos. Hoje, eles
confessaram que estupraram e, depois, mataram Tayná da Silva,
de 14 anos. [Começam a passar, em “slide show”, fotos da
adolescente] Segundo informações do Delegado responsável
pelas investigações, um dos bandidos disse que teria começado
o crime, mas depois desistiu, ou seja, ele falou que pegou a
menina, mas, depois teria desistido de estuprá-la. Esses auatro
rapazes, esses quatro bandidos trabalhavam em um parque
de diversões aue fica perto da casa da Tavná. Relembrando
um pouquinho o caso, Tayná da Silva, de 14 anos, desapareceu
na última terça-feira à noite, por volta das 08h30 da noite,
quando voltava para casa, e, ontem, como vocês podem ver
nessas imagens, a população, enfim, os vizinhos, revoltados,
foram até o parque de diversões [aparecem no vídeo imagens
que retratam a movimentação que houve no local e os
brinquedos do parque de diversões, destruídos e em chamas] nos
locais e colocaram fogo nos brinquedos, teve muito quebra-
quebra, a polícia, também o corpo de bombeiros foram
chamados. Hoje pela manha, conversamos com a mãe da Tayná,
quando ela ainda não sabia, ou seja, quando a Polícia ainda não
havia divulgado que os bandidos tinham confessado o crime.
Vamos ouvir o que ela disse,
[ . . . ]
rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
Rua Mi
50
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Repórter Karine Garcia: Bom, por enquanto os bandidos, os
quatro bandidos, que confessaram esse crime, continuam
presos aqui na Delegacia do Alto Maracanã, em Colombo, mas
segundo o delegado responsável pelas investigações, eles serão
transferidos, em breve, para Curitiba, né Thays, um crime
absurdo, dificil de acreditar, a população aqui da cidade de
Colombo, uma cidade pequena aqui da Região Metropolitana de
Curitiba, está chocada, está assustada. E a gente, claro, é um
crime, uma história que a gente não gostaria de noticiar
[arquivo: 1_RPC_TV_Garota de 14 anos é estuprada e morta por 4
criminosos no Pa.mp4 - 04:47-05:12].[ . . . ]
Apresentadora Thays: É verdade, Karine, obrigada pelas
informações. E os moradores têm razão, né Karine, de estarem
assustados e revoltados com a situação. Uma adolescente de 14
anos, né, a mãe esperando que ela chegasse em casa, e não
conseguiu chegar [arquivo: 1_RPC_TV_Garota de 14 anos é
estuprada e morta por 4 criminosos no Pa.mp4 - 05:13-05:27].*
Cabe ainda destacar que as violações à presunção de
inocência e à dignidade humana não ficaram restritas ao programa PARANÁTV,
mas também foram veiculadas pelo grupo em mídia escrita, especificamente no
jornal Tribuna do Paraná.
A manchete do jornal, no dia 29 de junho de 2013, dizia:
PERVERSOS E COVARDES. Abaixo da frase, encontrava-se a foto de Sérgio
Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique Camargo Cunha e
Ezequiel Batista dispostos diante do “painel” da Polícia Civil do Paraná.
Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
51
Ministério P úblico F ederalP r c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Desta feita, justificada a presença da Sociedade Rádio
Emissora Paranc ense S/A no polo passivo desta demanda.
G) DA CONDUTA DA REDE GLOBO DE TELEVISÃO. PROGRAMA JORNAL HOJE.
0 programa Jornal Hoje é exibido na TV Globo, em rede
nacional de tele dsão. A sua transmissão ocorre após a programação local de suas
afiliadas e emissoras locais, por volta das 13 h. No contexto do caso Tayná, a
emissora apenas repetiu os erros cometidos durante a programação de sua
afiliada no Estai o do Paraná, a RPC TV.
0 folhetim foi transmitido em dois lugares, na redação do
telejornal, e d retamente de Colombo, Paraná, por meio da repórter Karine
Garcia, da RPi! TV. Entretanto, antes de anunciar a repórter Karine, a
apresentadora gandra Annenberg inicia afirmando, sem nenhuma prudência,
que Tavná foi norta e estuprada pelos quatro suspeitos. Isso ao vivo, para
todo o Brasil, n ) meio da transmissão do telejornal da maior emissora do país,
que alcança que se a totalidade dos televisores ligados no território nacional.
Sandra Annenberg iniciou a cobertura sobre o caso dizendo
[arquivo:2_Glob3_Jornal_Hoje_Adolescente_estuprada_e_morta_por_funcionário
s.mp4 - 00:00-0 1:19]:
Apresentadora Sandra Annenberg (âncora): Uma adolescente
de catorze anos foi estuprada e morta por quatro funcionários
de um parque de diversão da Recião Metropolitana de
Curitiba. Um grupo de moradores invadiu o parque, queimou e
depredou os brinquedos. Vamos conversar, então, com Karine
Garcia [vira-se para o video, em que aparece a matéria fe ita naRua M irechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889252
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
região de Colombo], que está acompanhando tudo. Karine, boa
tarde para você, os suspeitos iá estão presos?*
Não bastasse o grande alarma causado pela emissora
afiliada, a TV Globo fez questão de ampliá-lo a todo país, imputando, de modo
sensacionalista, aos quatro suspeitos uma conduta pela qual sequer haviam sido
julgados, menos ainda, sequer haviam sido formalmente acusados.
A postura adotada pelo programa, quando analisada, sequer
se coaduna com os princípios editoriais do Grupo Globo, especificamente no que
se refere à conduta dos jornalistas, dentre eles:
Nenhum veículo do Grupo Globo fa rá uso de sensacionalismo,
a deformação da realidade de modo a causar escândalo e
explorar sentimentos e emoções com o objetivo de a tra ir
uma audiência maior. 0 bom jornalismo é incompatível com tal
prática. Algo distinto, e legítimo, é um jornalismo popular, mais
coloquial, às vezes com um toque de humor, mas sem ab rir mão
de informar corretamente6.
É inegável a influência que a TV Globo exerce sobre a
opinião dos brasileiros, justamente por isso deveria agir com muito mais cautela
que qualquer outro meio de comunicação. Não se trata de exigir uma obrigação
maior do que a prevista em lei. A questão, na realidade, trata-se de um dever
moral da emissora, que tem pleno conhecimento do seu poder de influir na
opinião pública. Não há como se admitir a violação de garantias fundamentais
por parte da emissora de uma forma tão clara.
Disponível<http://grupogLobo.gLobo.com/como jornalista deve proceder diante do publico.php>.Acesso em: 22 out. 2015________________________________________ _________________ _
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
Globo.do GrupoEditoriais6 Princípios em:
53
M inistério P úblico F ederalP r )Cu r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
São por esses motivos que a Rede Globo de Televisão
também se féz presente nesta ação, pois também contribuiu para a
superexposição dos quatro sujeitos, bem como agiu no intuito de vilipendiar a
inocência presumida de todos eles.
H) DA CONDUl \ DA UNIÃO E DA ANATEL. ENTE CONCEDENTE DO SERVIÇO
PÚBLICO DE RA JIOFUSÃO DE SONS E IMAGENS.
A União, como dito alhures, descumpriu o seu dever de
fiscalizar o ser/iço de radiofusão de sons e imagens. Não é porque houve a
concessão do n esmo às emissoras elencadas na peça vestibular, que a União
perdeu a titula idade do serviço e tampouco desobrigou-se de zelar pelo seu
efetivo respeito às normas constitucionais e legais.
Neste ponto, é cabível o transporte na íntegra das razões
apresentadas pira justificar a presença da União e da Agência Nacional de
Telecomunicaçõ ss no polo passivo da lide.
I) DA RESPONSa BILIDADE DO ESTADO DO PARANÁ. ATOS LESIVOS PRATICADOS
POR SEUS AGENTES.
O Estado do Paraná, como já descrito, foi peça-chave no
desenrolar dos atos. Com a conduta precipitada e ilegal dos agentes da Polícia
Civil, resumida na cessão de informações precipitadas e não apuradas, os
grupos de comu ticação do Estado e do Brasil passaram a destacar amplamente a
imagem dos sus íeitos, como se condenados fossem.
Rua IV arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41)3219-8700 - Fax (0xx41)3219-8892
54
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
A propósito, a própria Polícia Civil do Paraná divulgou nota
por meio da qual referia-se a Sérgio Amorim da Silva Filho, Adriano Batista,
Paulo Henrique Camargo Cunha e Ezequiel Batista como criminosos e
marginais. Ainda, junto com a nota, a informação também continha uma galeria
de fotos, permitindo a qualquer pessoa o acesso à imagem dos presos
cautelares. Ou seja, não bastasse o completo desrespeito à presunção de
inocência e do direito à não-autoincriminação. o Estado também fez questão
de violar o direito de imagem dos quatro indivíduos.
Da mesma forma como referido acerca da conduta da
União, aqui também cabe o transporte integral das razões exaradas em relação à
legitimidade passivo do Estado do Paraná.
7. DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.
A) DO ATAQUE À DIGNIDADE HUMANA. ULTRAPASSAGEM DOS LIMITES DA
LIBERDADE DE EXPRESSÃO E IMPRENSA. IMPOSSIBILIDADE DE COMPACTUAR
COM A INCITAÇÃO AO ÓDIO E A VIOLÊNCIA.
Não há que se falar em legítimo exercício da liberdade de
expressão no presente caso. A liberdade de expressão, não obstante ser um
direito fundamental previsto na Carta Magna, não se afirma quando utilizado
como meio de ataque à dignidade humana. A cláusula de livre expressão do
pensamento não se presta a absolver o interlocutor das devidas
responsabilizações.
Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
55
M inistério P úblico F ederalP r j c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Toda expressão de pensamento, desde que sincera e não
violenta, mere< e o devido respeito e acato. Porém, é de se ressaltar a
importância de que seja sincera e, sobretudo, não violenta.
A liberdade de expressão, como trazida no artigo 5o, inciso
IX, da Constitui :ão da República de 1988, veio no intuito de assegurar a todos,
a liberdade de manifestação do pensamento, sem o risco de
sofrer qualquer tipo de censura prévia. Note-se que tal preceito constitucional
veio após mais de duas décadas do regime autoritário que se instalou no país
entre os anos de 1964 a 1988.
indistintamente
Todavia, a liberdade de expressão não tem por objetivo
atuar como cláusula absolutória de todas as formas de violência verbal.
Assim como qualquer outro direito fundamental, a
liberdade de expressão também sofre limites, não sendo um preceito absoluto
em detrimento dos demais. A partir do momento em que a expressão do
pensamento a$ e como instrumento de violência e ódio, chocando-se
diretamente co n os ditames da dignidade humana, a imposição de limites ao
autor da narrat va é medida que se impõe, sob pena de se proteger e fomentar
atos antijurídia s.
Nas lições de Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires
Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco7, sobre o choque entre liberdade de
expressão e digi ndade humana:
“[—] Há o desrespeito ao princípio, auando a pessoa é
tratada como obieto , como meio para satisfação de alQum
interesse imediato. 0 ser humano não pode ser exposto -
7 Curso de D ireito Com :itudona l. 5 ed. São Pauto: Saraiva, 2010. p, 467,
Rua M irechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
56
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
máxime contra sua vontade - à mera curiosidade de terceiros,
para satisfazer instintos primários, nem pode ser apresentado
como instrumento de divertimento alheio, com vistas a
preencher o tempo de ócio de certo público. Em casos assim,
não haverá exercício lenítimo da liberdade de expressão"
(destaquei).
Sob outro aspecto, pertinentes as assertivas de Luís Roberto
Barroso8:
A dignidade como valor comunitário enfatiza, portanto. o
papel do Estado e da comunidade no estabelecimento de
metas coletivas e restrições sobre direitos e liberdades
individuais em nome de certa concepção de vida boa [...]. 0
valor comunitário, como uma restrição sobre a autonomia
pessoal, busca sua legitimidade na realização de três objetivos:
1. A proteção dos direitos e da dignidade de terceiros; 2. A
proteção dos direitos e da dignidade do próprio indivíduo; e 3. A
proteção dos valores sociais compartilhados (destaquei).
É de se concluir, então, que a Constituição da República de
1988 permite a livre manifestação do pensamento. Contudo, ao fazer isso, não
tinha como intuito fomentar atos persecutórios dirigidos a determinadas
pessoas. Tampouco se constituiu como missão do constituinte permitir a
exploração exacerbada e doentia da barbárie e da tragédia humana.
8 A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz
da jurisprudência mundial. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 88_______________________________________________Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889257
M inistério P úblico F ederalP r ic u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
0 postulado da dignidade humana não deve ser visto
como uma cart, i de boas intenções. Muito menos deve ter aplicação seletiva,
tendo eficácia s omente a determinadas pessoas ao passo que exclui outras.
O Processo Penal move-se consubstanciado por um imenso
rol de garantias justamente em virtude do seu caráter aflitivo. 0 mais simplório
ato de persecui :ão penal é capaz de gerar no indivíduo a mais alta carga de
agonia e angus ia. Não é para menos que a Constituição Federal é rica em
apresentar diversos princípios limitadores à arbitrariedade do Poder Punitivo
Estatal. Aliás, podemos afirmar que um Estado será mais Democrático quanto
maiores forem es garantias contempladas pelo Processo Penal.
A exposição do indivíduo processado, sem sua autorização e
tampouco acom ranhado de um defensor, levando-o às telas de televisão do país
todo, passa lorge da dignidade humana. Tanto a conduta do Estado como a
conduta dos grjpos de mídia em nada acrescentam à proteção dos direitos
humanos. Ao co ítrário, revestem-se como verdadeiros desserviços à sociedade.
Sobre o direito de defesa como expressão do postulado da
dignidade humana, já se manifestou o Supremo Tribunal Federal, no
julgamento do HC 89.176-4/PR, in verbis:
0 direito de defesa constitui pedra anaular do sistema de
proteção dos direitos individuais e m aterializa uma das
expressões do princípio da dignidade da pessoa humana.
Como se sabe, na sua acepção originária, este princípio proíbe a
utilização ou transformação do homem em objeto dos processos
e ações estatais. 0 Estado está vinculado ao dever de respeito
e proteção do indivíduo contra exposição a ofensas ou
humilhações. A propósito, em comentários ao art. 1o da
Constituição alemã, afirma Günther Dürig que a submissão doRua V arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889258
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
homem a um processo judicial indefinido e sua degradação
como objeto do processo estatal atenta contra o princípio da
proteção judicial efetiva ( “rechtlichen Gehõr”) e fere o
princípio da dignidade humana [ “Eine Auslieferung des
Menschen an ein staatliches Verfahren und eine Degradierung
zum Objekt dieses Verfahrens ware die Verweigerung des
rechtlichen Gehõrs."] (MAUNZ-DÜRIG, Grundgesetz Kommentar,
Band I, München, Verlag C.H.Beck, 1990, 11 18). (destaquei)
(STF - HC 89.176, Rei. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 22-82006, Segunda Turma, DJ de 22-9-2006.)
Na hipótese aqui tratada, é possível vislumbrar frontal
violação ao postulado da dignidade humana. Seja por parte dos entes estatais
que compõem o polo passivo desta demanda, seja pelos grupos de mídia também
elencados.
B) DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. NÃO CULPABILIDADE. MATRIZ
CONSTITUCIONAL.
Do postulado da dignidade humana também decorre o
princípio da não culpabilidade, ou, em termo mais diretos, o princípio da
presunção de inocência. A Constituição Federal, em seu artigo 5o, inciso LVII,
deixa claro que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de
sentença penal condenatória.
Os programas policiais e noticiários apontados nesta ação
coletiva foram ricos em desrespeitar tal presunção. Antes de qualquer juízo, ou
até mesmo instrução, a fim de elucidar minimamente os fatos, os órgãos de
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
59
Ministério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
apoio crucial dos órgãos do Estado, transmitiram a imagem dos
o se culpados fossem.
imprensa, com c
investigados con
As emissoras e jornais não apontaram Sérgio Amorim,
Paulo Henrique e Ezequiel Batista como suspeitos, mas sim
autores do crime - estupro e morte de Tayná.
Adriano Batista
como bandidos,
A partir dessa profusão de imagens catastróficas aliadas às
interpretações teatrais dos apresentadores dos programas, dificilmente a figura
dos alvos desse discurso sairá ilesa, tampouco será restabelecida num futuro
qualquer. A en> urrada de desprezos, escárnios e rebaixamentos dirigidos aos
investigados tor ia quase impossível a restauração posterior das suas imagens.
Mesmo após eventual comprovação da inocência dos
investigados, j i houve a perpetração do dano, visto que o jornalismo
irresponsável fomenta as manifestações populares a favor do combate ao
inimigo, do lincl lamento e do extermínio. Isso sem falar a respeito da questão do
incentivo à viol ?ncia policial, à medida que coroam os atos ilegais dos agentes
policiais como se fossem efetivos e favoráveis aos cidadãos. Lembre-se,
novamente, qu< existem indícios de que os quatro investigados do Caso Tayná
foram torturado;.
A história recente da imprensa brasileira é repleta de
exemplos de da ios irreparáveis causados pela precipitação comunicativa. Vide o
caso da escola > fe base, em São Paulo.
É inegável que a transmissão diária da imagem dos quatro
suspeitos já cobcou sua defesa em patamar inferior à acusação, prejudicando-
lhes completanr ente. Ainda, cite-se que eventual julgamento dos réus se daria
pelo Tribunal do Júri, por se tratar de crime doloso contra a vida. Assim, cabe
indagar: como s? daria a apreciação dos jurados no caso?Rua M irechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR — CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889260
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
A esse ponto, transcreve-se trecho do HC 91.952/SP,
também julgado pelo Supremo Tribunal Federal, tal precedente, a propósito,
foi um dos que fundamentaram a edição da súmula vinculante n. 119, sobre o
uso de algemas.
Em primeiro lugar, levem em conta o princípio da não
culpabilidade. É certo que foi submetida ao veredicto dos
jurados pessoa acusada da prática de crime doloso contra a
vida, mas que merecia o tratamento devido aos humanos, aos
que vivem em um Estado Democrático de Direito. Segundo o
artigo P da Carta Federal, a própria República tem como
fundamento a dignidade da pessoa humana. Da leitura do rol
das garantias constitucionais - artigo 5o depreende-se a
preocupação em resguardar a figura do preso. A ele é assegurado
o respeito à integridade física e moral - inciso XLIX. Versa o inciso
LXI, como regra, que 'ninguém será preso senão em flagrante
delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade
judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou
crime propriamente militar, definidos em lei’.[...]
Ora, estes preceitos - a configurarem garantias dos brasileiros e
dos estrangeiros residentes no país - repousam no inafastável tratamento humanitário do cidadão, na necessidade de lhe ser preservada a dignidade. Manter o acusado em audiência, com
algema, sem que demonstrada, ante práticas anteriores, a
periculosidade, significa colocar a defesa, antecipadamente, em patamar inferior, não bastasse a situação de todo
degradante. 0 julgamento no Júri é procedido por pessoas
9 “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”.
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
61
Ministério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA RjEPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
leigas, que tiram as mais variadas ilações do quadro verificado. A permanência do réu algemado indica, à primeira visão, cuidar-se de criminoso da mais alta periculosidade,
desequilibrando o julgamento a ocorrer, ficando os jurados
sugestionados. (STF - HC 91952, Relator(a): Min. MARCO
AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 07/08/2008, DJe-241
DIVULG 18-12-2008 PUBLIC 19-12-2008 EMENT VOL-02346-04 PP-
00850 RTJ VOL-00208-01 PP-00257)
Ressalte-se, nesse ponto, que todos os investigados
apareciam alge nados nas imagens.
é inegável a afronta ao principio da não
culpabilidade pAr parte da polícia, ao divulgar a malfadada nota oficial sobre a
prisão, bem cc mo por parte da imprensa, ao explorar de forma doentia a
angustia da fam lia da vítima e a execração dos quatro investigados.
Portanto
C) DA LIBERD/DE DE IMPRENSA. DA RESPONSABILIDADE DECORRENTE DOS
DANOS CAUSAC OS À HONRA. DA VIOLAÇÃO DA IMAGEM. DA NECESSIDADE DE
HARMONIZAÇÃO COM OS DEMAIS DIREITOS CONSTITUCIONAIS.
A liberdade de imprensa, uma das formas mais comuns da
liberdade de e: pressão, veio consagrada pelo Constituinte, permitindo a livre
manifestação d d pensamento e das ideias. Contudo, esta liberdade não pode
ser vista de m >do absoluto. Sua interpretação deve ser decorrência de todo o
sistema de prot ?ção constitucional.
Rua Iv arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
62
0*1
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o Pa r a n á
A pretensão constitucional sempre foi impedir a censura
prévia, buscando afastar, para todo o sempre, os tempos obscuros que
mancharam a recente história do Brasil, especialmente durante o regime de
exceção que se instalou no país em 1964. 0 Texto Maior prevê, expressamente,
no artigo 220, caput, que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão
e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão nenhuma
restrição, observada a harmonia do sistema constitucional - tanto que o § 1o do
mesmo artigo remete o aplicador da lei ao artigo 5o, incisos IV, V, X, XIII e XIV, da
CF de 1988.
Ou seja, todo acontecimento é passível de divulgação e
toda ideia é defensável. Entretanto, tal premissa não pode ser vista de maneira
incondicional.
0 que se fomenta é a livre expressão do pensamento, a
construção do conhecimento por meio do debate e da crítica. A norma
constitucional tem por escopo incentivar a pluralidade do pensamento, o choque
sadio entre as mais diversas vertentes do saber e, sobretudo, a reflexão.
Todavia, não é isso que se vê durante a exibição dos
folhetins policiais diários. 0 misto de brutalidade e morbidez, a exploração do
sentimento de perda, o vilipêndio à morte, a criação do inimigo, a incitação ao
show” de imagens chocantes, elementos comuns a tais
programas, não estão, seguramente, amparados pela proteção constitucional.
extermínio e o
Não é por outro motivo que o artigo 221, da CF de 1988,
prevê o seguinte:
Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e
televisão atenderão aos seguintes princípios:
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
63
M inistério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
/ - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais
e informativas;
II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à
produção independente que objetive sua divulgação;
III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística,
conforme percentuais estabelecidos em lei;
IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da
fam ília.
É fácil de notar que os programas elencados nesta demanda
não se aproximam dos postulados estabelecidos pelo constituinte. Tampouco se
vislumbram fir alidades educativas, culturais, artísticas e muito menos
informativas.
Note-se, portanto, a preocupação da norma constitucional,
pedimento de censura prévia, em obstaculizar o abuso do direito
preocupação com o impedimento da execração pública.
para além do irr
de expressão, a
0 seguinte aresto da Corte Suprema, no julgamento da
ADPF 130/DF, cemonstra bem essa temática:
[...] Não estamos a ajuizar senão isto: a cabeça do art. 220 da
Constituição veda qualquer cerceio ou restrição à concreta
manifestação do pensamento, bem assim todo cerceio ou
restrição que tenha por objeto a criação, a expressão e a
informação, pouco importando a forma, o processo, ou o
veículo de comunicação social. Isto é certo. Impossível negá-
lo. Mas o exercício de tais liberdades não implica uma fuga
do dever de observar todos os incisos igualmente
constitucionais que citamos no tópico anterior, relacionados
R ua Iv a recha l D e o d o ro , 933 C e n tro — C u r it ib a /P R - C E P 8 00 6 0 -01 0Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
64
0*1
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
com a liberdade mesma de imprensa (a começar pela
proibição do anonimato e terminando com a proteção do
sigilo da fonte de informação). Uma coisa a não excluir a
outra, tal como se dá até mesmo quando o gozo dos direitos
fundamentais à liberdade de pensamento e de expressão da
atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,
além do acesso à informação, acontece ò margem das atividades
e dos órgãos de imprensa (visto que o desfrute de tais direitos é
expressamente qualificado como "livre"). Mas é claro que os
dois blocos de dispositivos constitucionais só podem incidir
mediante calibração temporal ou cronológica: prim eiro,
assegura-se o gozo dos sobredireitos (falemos assim) de
personalidade, que são a manifestação do pensamento, a
criação, a informação, etc., a que se acrescenta aquele de
preservar o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício
da profissão do informante, mais a liberdade de trabalho,
ofício, ou profissão. Somente depois é que se passa a cobrar
do titu la r de tais sobre-situações jurídicas ativas um
eventual desrespeito a direitos constitucionais alheios, ainda
que também densificadores da personalidade humana; ou
seja, como exercer em plenitude o direito à manifestação do
pensamento e de expressão em sentido geral (sobredireitos de
personalidade, reitere-se a afirmativa), sem a possibilidade de
contraditar, censurar, desagradar e até eventualmente chocar,
vexar, denunciar terceiros? Pelo que o termo "observado",
referido pela Constituição no caput e no S 1o do a rt. 220, é
de ser interpretado como proibição de se reduzir a coisa
nenhuma dispositivos igualmente constitucionais, como os
mencionados incisos IV, V, X, XIII e X IV do a rt. 5°. Proibição
de se fa ze r tabula rasa desses preceitos igualmente
constitucionais, porém sem que o receio ou mesmo o temor
do abuso seja impeditivo do pleno uso das liberdades de
manifestação do pensamento e expressão em sentido lato.
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0 x x 4 1 )3219-8700 - F a x (0 x x 4 1 )3219-8892
65
p®Ministério P úblico F ederal
P r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
Sem que o receio ou mesmo o temor do abuso seja impeditivo do
pleno uso das duas categorias de liberdade, acabamos de falar,
porque, para a Constituição, o que não se pode é, por
antecipação, amesquinhar os quadrantes da personalidade
humana quanto aos seguintes dados de sua própria compostura
jurídica: liberdade de manifestação do pensamento e liberdade
de expressão em sentido genérico (aqui embutidos a criação e o
direito de informar, informar-se e ser informado, como
expletivamente consignado pelo art. 37, 1, da Constituição
portuguesa de 1976, "versão 1997"). Caso venha a ocorrer o
deliberado intento de se transmitir apenas em aparência a
informação para, de fa to , ridicularizar o próximo, ou, ainda,
se objetivamente faz-se real um excesso de linguagem tal
que faz o seu autor resvalar para a zona proibida da calúnia,
da difamação, ou da injúria, a í o corretivo se fará pela
exigência do direito de resposta por parte do ofendido, assim
como pela assunção de responsabilidade civil ou penal do
ofensor. [...].
(ADPF 130, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno,
julgado em 30/04/2009, DJe-208 DIVULG 05-11-2009 PUBLIC 06
11-2009 EMENT VOL-02381-01 PP-00001 RTJ VOL-00213- PP-
00020)
0 sistema adotado, desta feita, para a disciplina dos meios
de comunicação social em nosso país é, de um lado, de respeito à liberdade de
expressão, e, de outro, de responsabilização pelos abusos e ilegalidades
cometidos. Ess; t equação, de raiz democrática, visa afastar mecanismos odiosos
de censura pré ia, mas também quer garantir condições de sanção exemplar pra
os eventuais desrespeitos à legalidade e à Constituição, travestidos de
informações jo nalísticas.
R ua > [a recha l D e o d o ro , 933 C e n tro - C u r it ib a /P R - C E P 8 0 0 6 0 -0 1 0Fone (0xx41) 3219-8700- F a x (0xx41) 3219-8892
66
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
D) DA VIOLAÇÃO ÀS NORMAS DE TELECOMUNICAÇÕES. ABUSO NA LIBERDADE
DE RADIOFUSÃO. FOMENTO À VIOLÊNCIA POLICIAL E À PENA DE MORTE.
A liberdade de radiofusão, ou radiodifusão, nos termos da
não autoriza que se use o meio deLei n. 4.117/62, em seu artigo 53,
comunicação como instrumento de incitação à desobediência das leis, promover
campanha discriminatória ou ofender a moral familiar, pública, ou os bons
costumes. Sem olvidar os vetustos termos utilizados pela lei, tendo em vista sua
promulgação em tempo pretérito, não se pode deixar de considerá-la.
Impende destacar também que artigo 63 da Lei n. 4.117/62
prevê a suspensão da concessão do serviço de radiofusão de sons e imagens em
virtude do abuso da liberdade estabelecida na norma.
Assim, observado que a emissora de televisão ou rádio deu
início ou contribuiu ao alarma social, incitando práticas como linchamentos,
agressões policiais, castrações, pena de morte e a execração pública do
investigado, resta evidente o desrespeito à legislação relativa aos serviços de
telecomunicações, sendo cabível a suspensão do serviço. E mais, constatado a
reiteração da prática, o artigo 64. da Lei n, 4 .117/62. autoriza a cassação
plena da concessão.
Como largamente debatido, os programas aqui elencados
não são recentes no interior das grades de programação das emissoras rés.
Alguns estão no ar há mais de uma década. Obviamente que não é a primeira vez
que as emissoras atacam os direitos fundamentais do cidadão por meio de
reportagens policiais.
0 que se quer, nesse ponto da ação, é demonstrar que as
emissoras de rádio e televisão têm pleno conhecimento de seus deveres.
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - C uritiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
67
Ministério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO 0 0 PARANÁ
de informar com qualidade e sem criação de alarmas sociais,dentre os quais
muito menos pr< ijudicando pessoas investigadas pela polícia.
E) DA IMPOSIÇÃ D DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. DAS MEDIDAS DE ABSTENÇÃO.
Como exposto no artigo 3o da Lei n. 7.347/85, a Ação Civil
Pública pode ter por objeto a condenação dos réus à reparação cível ou
obrigação de fa :er ou não fazer. O requerimento de medidas de abstenção não é
incompatível co rt a Ação Coletiva.
0 Superior Tribunal de Justiça já sedimentou entendimento
nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇAO CIVIL
PÚBLICA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. PEDIDO
GENÉRICO. TUTELA COLETIVA. CABIMENTO. 1. A ação coletiva
permite que o pedido mediato seja formulado de forma
genérica. Precedentes do STJ. 2. Ademais, no caso, está
definido no pedido situação em que é perfeitamente possível
delinear como obrigação de não fazer, não havendo fa la r em
generalidade. 3. No tocante ao argumento de que a penalidade
aplicada não está prevista em lei, o insurgente não combate o
fundamento do decisum monocrático, no sentido que tal matéria
não se encontra prequestionada (Súmula 282/STF, aplicada por
analogia), o que impossibilita o conhecimento do recurso quanto
ao ponto. 4. Agravo Regimental parcialmente conhecido e, nessa
parte, não provido. (AgRg nos EDcl no REsp 1408382/PB, Rei.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
04/11/2014, DJe 2 7 /11/20l4)[destaquei].
[arechal D eodoro , 933 C entro — C uritiba/P R — C E P 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
R ua í
68
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Sendo assim, considerando a gravidade dos fatos narrados
nesta demanda, é prudente impor às emissoras de rádio e televisão que compõe
o polo passivo desta demanda que:
a) abstenham-se de entrevistar investigados em inquéritos
policiais ou processos administrativos, salvo quando autorizados por este e na
presença de seu defensor constituído, seja ele público ou particular;
b) abstenham-se de exibir imagens de brutal violência,
pessoas mortas ou afins entre os horários que compreendem às 7 (sete) e 23
(vinte e três) horas;
c) abstenham-se de utilizar termos como
homicidas”, “monstros” ou qualquer
bandidos”,
“criminosos”, “ladrões”, “estupradores
expressão que indique ou aponte a culpabilidade de indivíduos antes de eventual
sentença penal condenatória com trânsito em julgado;
d) abstenham-se, em todos os horários, de exibir imagens
de cadáveres de crianças e adolescentes, ainda que a imagem seja tratada,
primando-se, assim, pela proteção integral da criança e do adolescente;
e) abstenham-se de proferir qualquer comentário ou
manchete que incite a pena de morte, linchamento, castração ou qualquer outro
tratamento desumano ou degradante em prejuízo de quem quer que seja.
Como amplamente arguido, o objeto desta demanda não
consiste em transformá-la num instrumento de censura. Longe disso. O que se
pretende é fomentar o jornalismo sério, imparcial e condizente aos ditames mais
preciosos do Estado Democrático de Direito. O sensacionalismo e a exploração do
sofrimento, com certeza, não se coadunam com isso. Tanto que não se pretende
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR — CEP 80060-010F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0 x x 4 1 )3219-8892
69
Ministério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO EsTADO DO PARANÁ
suspender ou ca >sar as concessões das emissoras, mas adequar sua programação
aos fins elencad )s pelo constituinte no artigo 221 da CF de 1988.
Destarte, requer-se a determinação, por este MM. Juízo,
para que as emí ssoras de rádio e televisão presentes no polo passivo desta ação
cumpram com as medidas de abstenção acima elencadas, sob pena de
cominação de nulta pecuniária por dia em que houver o descumprimento da
decisão.
F) DA OBRIG/ÇÃO DE FAZER DA UNIÃO E DA ANATEL. DO DEVER DE
FISCALIZAÇÃO.
A União, por meio dos entes competentes, tem o dever de
fiscalizar e aplcar sanções às emissoras de rádio e televisão que, porventura,
violem as norrras de telecomunicações. No presente caso, é evidente que tal
obrigação não oi cumprida.
Como se infere dos documentos acostados à inicial, os
programas cita ios nesta ação coletiva ultrapassaram todos os limites do bom
jornalismo e ia informação imparcial e séria. Na disputa acirrada pela
audiência, pron loveram o pré-julgamento dos suspeitos presos no caso Tayná.
A União e seus entes possuem estrutura, capacitação e
pessoas prepar idas para fiscalizar as grades de programação das emissoras de
rádio e televisí o. É inconcebível que os programas do gênero sejam livremente
exibidos, com £ pauta atual, sem qualquer sanção.
Portanto, considerando o dever de fiscalizar do ente
concedente, r< quer-se seja determinado à União e à Anatei que realizem a
R ua ) la re ch a l D e o d o ro , 933 C e n tro — C u r it ib a /P R — C E P 8 00 6 0 -01 0
F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41)3219-889270
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o Pa r a n á
fiscalização dos programas citados nesta peça vestibular, comunicando qualquer
violação aos direitos fundamentais diretamente ao Parquet Federal e a este MM.
Juízo, sob pena de multa.
G) DA OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER DO ESTADO DO PARANÁ. DO DEVER DE
CUSTÓDIA. PROIBIÇÃO DA EXPOSIÇÃO DO PRESO.
Considerando a conduta perpetrada pelos agentes policiais
do Estado do Paraná, consistente na exposição dos presos aos canais de
comunicação, pugna-se pela abstenção de exposição dos investigados aos órgãos
de imprensa.
A simples ligação do investigado a um fato delituoso é
suficiente para destruir sua imagem e honra objetiva. Sem embargo de posterior
absolvição ou arquivamento da instrução preliminar, o dano causado pela
superexposição dificilmente será reparado, pois à imprensa não importa o
destino do acusado, mas somente que ele seja acusado. Nota-se, pois, que a
responsabilidade do Estado pelo investigado é imensurável.
Assim, o Estado do Paraná deve abster-se de apresentar
qualquer investigado ou preso cautelar aos órgãos de imprensa, salvo se este
estiver devidamente representado por advogado regularmente constituído ou
defensor público, e na sua presença.
H) DO DANO MORAL COLETIVO. ATAQUE AOS DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS.
MODALIDADE DE DANO EXTRAPATRIMONIAL. DESNECESSIDADE DE
DEMONSTRAÇÃO DE SOFRIMENTO. FORMA DE RESPONSABILIZAÇÃO COM
FUNÇÃO REPRESIVA E PREVENTIVA.
Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
71
M inistério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
Os atos perpetrados pelos réus, direcionados ao ataque da
dignidade huma na e dos princípios constitucionais dos acusados, configuram-se
além de repulsivas, causadoras de danos aos direitos difusos ecomo condutas,
coletivos.
Antes de qualquer imersão no tema, é oportuno dizer que
os danos morai; coletivos são previstos em lei, especialmente no Código de
Defesa do Consi midor e na Lei n. 7.347/85, que regula a Ação Civil Pública.
Nos termos do artigo 6o, inciso VII, do Código de Defesa do
Consumidor:
Art. 6o São direitos básicos do consumidor:
[ . . . ]
VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas
à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais,
individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica,
administrativa e técnica aos necessitados.
0 artigo 1o da Lei n. 7.347/85 veio com o fim de reafirmar a
previsão da les islação consumerista, aplicada a todo ordenamento relativo às
Ações Coletivos em virtude do principio do Microssistema. Na redação do artigo
1°, inciso IV, da Lei n. 7.347/85:
Art. 1o Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da
ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e
patrimoniais causados:
[ . . . ]
IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.
R ua 1 la re c h a l D e o d o ro , 933 C e n tro - C u r it ib a /P R - C E P 8 0 0 6 0 -0 1 0
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889272
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Não obstante a lei insistir na conceituação de
moral”, trasportando institutos jurídicos construídos a partir da noção de direito
individual, os danos morais coletivos devem ser vistos como modalidade de dano
extrapatrimonial com caráter de sanção pecuniária, haja vista a ocorrência de
grave ofensa aos direitos difusos e coletivos.
dano
Ou seja, os danos morais coletivos não podem, em hipótese
alguma, ser construídos a partir do trasporte, indevido, de categorias do direito
civil individual. O dano moral coletivo deve, assim, ser trabalhado dentro de
uma perspectiva sancionatória, que se configura, aliás, como sua função.
A responsabilidade decorrente de danos morais coletivos
tem como objetivo permitir a aplicação de sanções pecuniárias ao agente que,
com sua conduta lesiva, perpetrou um dano em prejuízo dos direitos difusos e
coletivos. A explícita previsão legislativa do instituto tem o nítido propósito de
dar eficácia à proteção dessa categoria de direitos.
Portanto, o conceito de dano moral coletivo passa longe da
demonstração do sofrimento ou da dor pessoal.
A responsabilização por dano moral coletivo justifica-se à
medida que visa proteger interesses de grande relevância social e interesse
público associado à proteção e tutela dos direitos metaindividuais. Tem,
sobretudo, um caráter punitivo, visando cumprir, assim como no direito penal,
uma função preventiva - buscando evitar, no futuro, a ocorrência de novas
lesões.
Logo, não se faz necessária à configuração do dano moral
coletivo a demonstração de dor psicofísica dos ofendidos, tampouco, como
costumava elencar a doutrina mais antiga, da perda de valores essenciais à
coletividade. 0 dano moral coletivo independe de tais pressupostos, ainda queRua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889273
M inistério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
importantes - mas somente no que tange à quantificação daos mesmos sejan
sançao pecuniar ia.
A esse respeito, temos as palavras de Xisto Tiago de10Medeiros Neto
O tema não comporta hesitação na seara jurisprudencial,
constituindo posição corrente no Superior Tribunal de Justiça a
de que a prova do dano moral se satisfaz, em regra, com a
demonstração do fato que; o ensejou, decorrendo, destarte, que
para o reconhecimento do dano extrapatrimonial não se exige
a prova do desconforto, da dor ou da aflição, que são
admitidos por meio de um juízo de experiência.'na concepção moderna da reparação do dano
moral prevalece a orientação de que a responsabilização do
agente se opera por força do simples fa to da violação, de
modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em
concreto”, (destaquei)
Em suma,
0 dano moral coletivo é, em verdade, um dano
extrapatrimoni tl, sendo muito mais amplo que a concepção pura de dano moral.
Essa espécie d? dano é praticada em detrimento de direitos fundamentais e
indisponíveis ; é, nesse sentido, pura e simples, que se justifica a
responsabilização em decorrência dele.
Elucidativas nesse sentido são as lições de Leonardo Roscoe
Bessa11:
Em se tratando de direitos difusos e coletivos, a condenação por
dano moral (rectius: extrapatrimonial) se justifica em face da
10 Dano Moral G iletivo. 4aed. - São paulo : LTr, 201411 Dano moral a letivo. Direito e Liberdade, v. 7, n. 3, p. 237-274, 2009______________
Rua 1 larechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
74
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
presença do interesse social em sua preservação. Trata-se de
mais um instrumento para conferir eficácia à tutela de tais
interesses, considerando justamente o caráter
patrim onial desses interesses metaindividuais. [...] Constitui-
se, em hipótese de condenação judicial, valor pecuniário com
função punitiva em face de ofensa a direitos difusos e
coletivos (destaquei).
nao
Assim, basta a ocorrência de lesão à interesses difusos e
coletivos para que se justifique a condenação do agente à indenização
decorrente de danos morais coletivos.
O Superior Tribunal de Justiça assim decidiu:
[...] o dano extrapatrim onial não se restringe às pessoas individualmente consideradas. O dano moral coletivo é pacificamente aceito pela doutrina e jurisprudência.Tal instituto é configurado pela lesão na esfera moral de uma comunidade, isto é. a violação de valores coletivos, atim idos iniustificadamente do ponto de vista jurídico. Tal lesão pode decorrer de dano ambiental (lesão ao equilíbrio ecológico, à qualidade de vida e à saúde da coletividade), desrespeito aos direitos do consumidor (publicidade abusiva, por exemplo), danos ao patrimônio histórico e artístico, violação da honra de determinada comunidade (negra, judaica, japonesa, indígena etc.) e até fraude a licitações.[ . . .]Ressalto que, em determinados casos, a té a dor pode ser desconsiderada para a configuração do dano moral. Ressalto o ensinamento de Sérgio Cavalieri, para quem: 'o dano moral não está necessariamente vinculado a alguma reação psíquica da vítima. Pode haver ofensa à dignidade da pessoa humana sem dor, vexame, sofrimento, assim como pode haver dor, vexame e sofrimento sem violação da dignidade. Dor, vexame, sofrimento e humilhação podem ser consequências, e não causas. Assim como a febre é o efeito de uma agressão orgânica, a reação psíquica da vítima só pode ser considerada dano moral quando tiver por causa uma agressão à sua dignidade', (destaquei) (AgRg
Rua Marechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
75
MgM inistério P úblico F ederal
P r d c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
no AREsp 737.887/SE, Rei. Ministro HUMBERTO MARTINS SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2015, DJe 14/09/2015)
Partindo desses pressupostos, é evidente que no
presente casa concreto vislumbra-se total ofensa aos direitos
transindividuai
A conduta dos réus, amparada em visões deturbadas da
moral, visam r egar a alteridade dos investigados em inquéritos policiais ou
acusados em pr )cessos judiciais. Os réus, por meio de um discurso intolerante e
violento, inclu: ive no sentido de justificar a prática de condutas violentas pelos
agentes estata s e pela própria população, como linchamentos, execuções,
castrações e torturas; agem de forma a negar a humanidade dos grupos
atacados, trata ido-os como doentes e degenerados.
Os réus em nenhum momento esforçam-se em tolerar e
conviver com )S direitos e garantias fundamentais. Muito pelo contrário. Os
programas apcntados nesta exordial, longe de ampliar um debate rico e
saudável, aperas se prestam a selecionar determinados grupos para apontar
quem são os mi mos humanos. Algo incompatível com um regime democrático.
Não há como definir de outra forma a conduta dos réus,
senão como m a verdadeira afronta ao postulado da dignidade da pessoa
humana.
Desta feita, resta perfeitamente demonstrada a ocorrência
do dano moral :oletivo.
R ua 1 la re c h a l D e o d o ro , 933 C e n tro — C u r it ib a /P R - C E P 8 0 0 6 0 -0 1 0
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889276
& ° ,
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
H) DA SANÇÃO PECUNIÁRIA. DA FIXAÇÃO DE VALORES SUFICIENTES PARA
REPRIMIR E PREVENIR A OCORRÊNCIA DO ILÍCITO. APLICAÇÃO DA
RECOVERY".FLUID
Como amplamente apontado, a condenação em danos
morais coletivos tem caráter de sanção pecuniária em razão da ofensa
perpetrada contra os direitos difusos e coletivos. É dizer, a função da
responsabilização, nesses casos, é muito semelhante àquela exercida pelo
Direito Penal, ou seja, de repressão e prevenção das lesões contra bens
jurídicos.
A fixação da indenização a título de danos morais coletivos,
pois, deve ser o suficiente para reprimir a prática do ato lesivo, bem como deve
exercer a função de prevenção geral, passando a mensagem de que as lesões aos
direitos difusos e coletivos, no âmbito de um Estado Democrático e Plural, não
podem, e não serão, aceitas.
Pois bem.
Os programas policiais fazem parte da grade de
programação de grandes emissoras de televisão, sendo responsáveis por
mobilizar boa parcela da audiência desses canais. As cifras movimentadas com a
venda de espaços publicitários durante a exibição dos folhetins é estrondosa.
Cada segundo de publicidade veiculada gera alta lucratividade às empresas de
rádio e televisão.
Segundo dados apresentados pela ABERT (Associação
Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), o faturamento em publicidade das
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
77
,òB
M inistério P úblico F ederalP r 3CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
emissoras de televisão, no ano de 2012, ultrapassou a casa dos 19 (dezenove)
bilhões de reais L.
Logo, uma condenação em baixos valores poderá, em
realidade, faze com que as graves lesões aos direitos difusos praticadas pelos
réus “saia bar ito” e, ao invés de impedir a ocorrência de maiores danos,
fomentará a pri tica do ilícito.
Portanto, considerando a finalidade sancionatória que se
reveste a responsabilização por dano moral coletivo, bem como as graves
violações orat cadas em preiuizo à dignidade humana e aos direitos dos
investigados, c ue atingiram frontalmente os valores coletivos, o valor mínimo
a título indeni latório deve ser fixado em R$ 10.000.000.00 (dez milhões de
reais).
Porém, antes que se possa argumentar ao contrário, é de se
ressaltar que tal valor, em momento algum, acarretará em alguma forma de
enriquecimento ilícito, justamente porque não será revertido em prol de pessoas
determinadas, nas deverá ser aplicado em observância aos preceitos da “fluid
recovery” .
À “fluid recovery”, originária das closs action
estadunidenses, surgiu como remédio adequado nos casos em que a condenação
obrigava o réi a indenizar uma coletividade indeterminada, as quais sequer
podiam ser ide ntificadas. É modalidade típica de reparação em caso de danos
morais coletivos, no qual o ofendido não é um indivíduo determinado, mas a
própria catego ia de interesses difusos e coletivos. 12
12 As receita > da indústria de radiofusão. ABERT. Disponível <http://www. abert.org.br/web/index.DhD/dados-do-setor/estatisticas/faturamento-do- setor>. Acesse em: 26 out. 2015.
em:
Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010F o n e(0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41)3219-8892
78
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Sob esse ângulo, a “fluid recovery
de reparação das vítimas, que, como dito, são indeterminadas, mas tem como
escopo a punição do agente.
não atua como forma
Assim, o valor da indenização deverá reverter para um
fundo, cuja finalidade seja conexa aos interesses da coletividade e que se
relacione ao interesse tutelado na respectiva ação coletiva.
0 ordenamento jurídico brasileiro prevê, expressamente, a
aplicação do instituto da “fluid recovery” quando, no artigo 13 da Lei n.
7.347/85, determina que o valor das indenizações coletivas deverão ser
revertidas em favor de um fundo gerido por conselhos federais ou estaduais,
sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados.
O STJ tem o seguinte posicionamento:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TUTELA COLETIVA.
DIREITO INDIVIDUAL HOMOGÊNEO. AUSÊNCIA DE HABILITAÇÃO DOS
BENEFICIÁRIOS. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA A
LIQUIDAÇÃO E EXECUÇÃO. CONTRATANTES IDENTIFICADOS.
LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO. CABIMENTO. LAUDO QUE DEVE
CONSIDERAR CADA UM DOS CONTRATOS. 1. Como a decisão
recorrida enfrentou as questões debatidas, ainda que em sentido
inverso à pretensão do recorrente, não há vício processual ou
violação dos artigos 165, 458 e 535 do CPC. 2. O Ministério
Público tem legitimidade subsidiária para a liquidação e
execução da sentença coletiva, caso não haja habilitação por
parte dos beneficiários, nos termos do art. 100 do CDC. 3. Se o
título executivo não prevê indenização estimada e possui os
critérios para a liquidação e tendo em vista a identificação dos
beneficiários, a liquidação deve levar em conta cada um dos
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
79
M inistério P úblico F ederalP tOCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
contratos. No caso, pode ser realizada por arbitramento, de
modo a se atingir a efetividade e celeridade da tutela coletiva,
aliadas ao cumprimento do previso no título. 4. A reparação
fluída (fluid recovery) é utilizada em situações nas quais os
beneficiários do dano não são identificáveis, o prejuízo é
individualmente irrelevante e globalmente relevante e,
subsidiariamente, caso não haja habilitação dos beneficiários,
(destaquei) 5. Recurso parcialmente provido, com base no voto-
médio. (REsp 1187632/DF, Rei. Ministro JOÃO OTÁVIO DE
NORONHA, Rei. p/ Acórdão Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA,
QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 06/06/2013)
0 Ministério Público Federal, portanto, requer que os réus
sejam condem dos ao pagamento de indenização, em virtude dos danos morais
coletivos causz dos, em valor não inferior à R$ 10.000.000,00 (dez milhões de
reais).
Todavia, para fins de efetividade da tutela, o Parquet
também reque r que parte (ser determinada por esse Juízo) do valor acima
indicado, fixa lo a título indenização por danos morais, seja destinado para
entidades que têm como escopo o combate ao abuso policial e a defesa dos
direitos fundai lentais dos investigados e acusados em geral.
Estas entidades serão oportunamente indicadas no decorrer
do processamento da ação civil pública13.
Assim deve ser em razão do interesse coletivo a ser
n país em que as demonstrações de ódio e violência tem sido,protegido. Nu
13 0 Ministério P iblico Federal está pesquisando entidades que desenvolvem este tipo de trabalho. A indic; ção a p o s te r io r i objetiva não retardar a propositura da ação, haja vista as mazelas que a ciiculação dos programas policiais proVoca.
V íarechal D e o d o ro , 933 C e n tro — C u r it ib a /P R — C E P 8 0 0 6 0 -0 1 0
F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41)3219-8892R ua
80
o«l
M inistério P úblico F ederalP ro cura d oria d a R epú blica n o E stado do P aran á
infelizmente, constante, o investimento em campanhas educativas se mostra útil
a impedir que outros casos absurdos de discursos violentos se repitam.
8. DA TUTELA ANTECIPADA
No presente caso, é cabível a concessão da tutela
antecípatóría com fulcro no inciso I, do artigo 273, do Código de Processo Civil.
Diz o mencionado dispositivo legal:
Art. 273 . 0 juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar,
total, ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido
inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da
verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano de irreparável ou de difícil
reparação;
0 Código de Processo Civil autoriza a concessão de tutela
nos casos em que, além da prova inequívoca e da verossimilhança da alegação,
exista o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. A lei
processual civil, assim, busca evitar que ao final do processo, mesmo que a
decisão judicial seja favorável ao autor, o provimento seja inócuo.
A concessão antecipada do provimento final, aliás, se
mostra como essencial à efetividade da tutela pretendida, pois caso seja
deferida somente ao final do processo, tende a se mostrar inócua, ineficaz,
pois os folhetins apontados no corpo desta petição continuam a ser exibidos
diariamente, o que apenas serviria como forma de manter viva as incitações
ao ódio e à violência.
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
81
' im
« L
M inistério P úblico F ederalP r )c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Além disso, impende destacar que a Polícia Civil do
Estado do Paraiá não abandonou a prática de apresentar os investigados à
imprensa. Com) apontado alhures, os casos notórios do Estado atraem uma
grande carga d<1 atenção midiática, a polícia, sem olvidar disso, age, mais que
depressa, no intento de coroar seu serviço ante os olhos ávidos da opinião
pública.
Ressalte-se que os programas aqui tratados, em sua
maioria, são e::ibidos em rede aberta de televisão, sendo acessíveis a toda
comunidade, inclusive crianças e adolescentes, em razão da hora em que são
transmitidos. A demora na imposição das obrigações tende a ocasionar um
prejuízo ainda maior àquele iá perpetrado pelos órgãos de imprensa.
Desta feita, resta demonstrado o fundado receio de dano
que a demora p rocessual poderá ocasionar.
No que tange à verossimilhança das alegações, restou
demonstrado i prejudicialidade da conduta dos réus, seja por meio de
trechos retira dos das gravações juntadas aos autos, seja por meio das
degravações qi ie seguem a inicial.
Além disso, cabe mencionar que o artigo 273 exige a
somente a probabilidade de ocorrência do fato, a partir de um juízo de
cognição sumá ia. A lei processual não exige a prova de certeza, ainda que, no
caso dos autos, seja possível se falar em uma.
Consoante ensinam Marinoni e Arenhart14:
14 MARINONI, Lu z Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de Conhecimento. 9 ed. São Paulo: Editorc Revista dos Tribunais, p. 210.________________________________________
R ua darecha l D e o d o ro , 933 C e n tro — C u r it ib a /P R — C E P 8 0 0 6 0 -0 1 0Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
82
M l N I S T É R I o F Ú R L I C o F E D E R A LPROCURADORIA DA REPÚBLICA NO EMPADO DO PARANÁ
"A denominação 'prova inequívoca', capaz de convencer o ju iz da
'verossimilhança da alegação', somente pode ser entendida como
a 'prova suficiente' para o surgimento do verossímil, entendido
como o não suficiente para a declaração da existência ou da
inexistência do direito”.
Por fim, repita-se que a presente ação vem instruída por
provas pré-constituídas colhidas durante o curso do Inquérito Civil n°
1.25.000.003448/2013-83.
Ademais, no presente caso, também é aplicável o artigo
4ó1, do Código deRrocesso Civil, que defereao Juiz poderes paradeterminar,
até mesmo de oficio, “providências que assegurem o resultado prático
equivalente ao do adimplemento^.
Assim sendo, fica demonstrada a presença de todos os
requisitos legalmente exigidos para o deferimento da antecipação da tutela
jurisdicional ora requerida, bem como a adoção de todas as medidas que se
mostrem necessárias oara sua efetivação prática.inclusive co m aimposicão de
multa pecuniária diária.
Outrossim, incumbe destacar que a antecipação do
provimento final não ocasionará prejuízo às partes rés, justamente porque não
haverá nenhum risco de irreversibilidade da medida.
9. DA DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA
A presente demanda deve ser distribuída ao MM. Juízo da 3a
Vara Federal de Curitiba, em razão dos autos n° 97.00.14361-9/PR, em queRua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889283
Ministério P úblico F ederalP r, CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ
Dassivo a Rádio e Televisão OM (Rede CNT), Estado do Paraná efiguram no polo
União, pois a rrlatéria tratada ali contém causa de pedir semelhante à tratada
nesta ação cole iva, não obstante os pedidos serem diferentes. Inclusive, existe
condenação dos réus ao pagamento de multa, vez que, durante o “caso Tayná”,
descumpriram a sentença proferida no bojo daquele processo.
10. DOS REQUERIMENTOS.
Diante do exposto, o Ministério Público Federal requer:
a) a concessão de tutela antecipada, inaudita altera pars,
determinando-s
a.1) à Sociedade Rádio Emissora Paranaense S/A, TV
Independência S/A - Grupo RIC De Comunicação, Rádio e TV Iguaçu S/A -
Grupo Massa (F ede Massa), TV Colombo, Rádio e Televisão Bandeirantes Ltda.
(TV Band), Rá( io e Televisão Record S/A (TV Reco rd) e Globo Comunicação e
Participações 5 !A (TV Globo) que:
i) abstenham-se de entrevistar investigados em inquéritos
cessos administrativos, salvo quando autorizados por este e na
defensor constituído, seja ele público ou particular;
policiais ou pn>
presença de se i
ii) abstenham-se de exibir imagens de brutal violência,
ou afins entre os horários que compreendem às 7 (sete) e 23pessoas morta:
(vinte e três) hbras;
R ua 1 la re c h a l D e o d o ro , 933 C e n tro - C u r it ib a /P R - C E P 8 00 6 0 -01 0
Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889284
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
iii) abstenham-se de utilizar termos como “bandidos”,
“criminosos”, “ladrões”, “estupradores”, “homicidas”, “monstros” ou qualquer
expressão que indique ou aponte a culpabilidade de indivíduos antes de eventual
sentença penal condenatória com trânsito em julgado;
iv) abstenham-se, em todos os horários, de exibir imagens
de cadáveres de crianças e adolescentes, ainda que a imagem seja tratada,
primando-se, assim, pela proteção integral da criança e do adolescente;
v) abstenham-se de proferir qualquer comentário ou
manchete que incite a pena de morte, linchamento, castração ou qualquer outro
tratamento desumano ou degradante em prejuízo de quem quer que seja.
a.2) à União e a ANATEL que realizem a fiscalização dos
programas citados nesta peça vestibular, comunicando qualquer violação aos
direitos fundamentais diretamente ao Parquet Federal e a este MM. Juízo, sob
pena de multa;
a .3) ao Estado do Paraná que abstenha-se de apresentar
qualquer investigado ou preso cautelar aos órgãos de imprensa, salvo se este
estiver devidamente representado por advogado regularmente constituído ou
defensor público e na sua presença.
b) a citação dos réus, através de seus representantes legais,
para, querendo, responderem a presente ação, sob pena de revelia;
c) a produção de todos os meios de prova admitidos em
direito, não obstante a presente demanda ir acompanhada de prova pré-
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR — CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
85
m
M inistério P úblico F ederal0CURAD0R1A DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁP l
Inquérito Civil n.constituída olhida durante a instrução do
1.25.000.003441/2013-8315;
d) a dispensa do pagamento de custas e emolumentos e
, em vista do disposto no artigo 18 da Lei n. 7.347/85;outros encargo:
e) a condenação, em caso de descumprimento das
obrigações contidas no provimento final, com fulcro no artigo 11 da Lei n.
7.347/85, em inulta a ser fixada pelo prudente arbítrio desse respeitável Juízo
Federal;
f) ao final, mediante julgamento de mérito, o provimento
do pedido aduz ido nesta inicial, determinando:
f.1) a suspensão temporária de exibição dos programas
citados nesta ação civil pública, da seguinte maneira:
i) Rede Paranaense de Comunicação e TV Globo: não
exibição dos programas “Paraná TV” e “Jornal Hoje” por
um dia (uma segunda-feira) e não circulação do Jornal
Tribuna do Paraná por dois dias (duas segundas-feiras);
ii) Rádio e TV Independência (RIC), Rádio e TV Iguaçu (Rede
Massa), TV Colombo, Rádio e TV Bandeirantes (TV Band),
15 Instruem a ir icial, também, trechos dos programas elencados nesta Ação e as respectivas degravações.___________________________________________________________________
Rua vlarechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
86
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
Rádio e TV Record: a não exibirem, respectivamente, os
seus programas policiais “Balanço Geral”, “Tribuna da
Massa”, “Boa Noite Colombo”, “Brasil Urgente Paraná” e
“Cidade Alerta” por dois dias (duas segundas-feiras);
f.2) a condenação dos réus ao pagamento de indenização,
em virtude dos danos morais coletivos causados, como
estabelecido no artigo 13, caput, da Lei na 7.347/85 , em
valor não inferior à R$ 10.000.000,00 (dez milhões de
reais). Para fins de maior efetividade da tutela, o Parquet
também requer que parte (a ser determinada por esse
Juízo) do valor acima indicado,
entidades que têm como escopo o combate ao abuso
policial e a defesa dos direitos fundamentais dos
investigados e acusados em geral.
seja destinado para
f.3) a confirmação da tutela antecipada, a fim de que as
emissoras de rádio e televisão presentes no polo passivo
da ação:
i) abstenham-se de entrevistar investigados em inquéritos
policiais ou processos administrativos, salvo quando
autorizados por este e na presença de seu defensor
constituído, seja ele público ou particular;
Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR — CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
87
P p
M inistério P úblico F ederalP i o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á
ii) abstenham-se de exibir imagens de brutal violência,
pessoas mortas ou afins entre os horários que compreendem
às 7 (sete) e 23 (vinte e três) horas;
iii) abstenham-se de utilizar termos como “bandidos”,
“criminosos”, “ladrões”, “estupradores”, “homicidas”,
“monstros” ou qualquer expressão que indique ou aponte a
culpabilidade de indivíduos antes de eventual sentença
penal condenatória com trânsito em julgado;
iv) absftenham-se, em todos os horários, de exibir imagens
de cadáveres de crianças e adolescentes, ainda que a
imagem seja tratada, primando-se, assim, pela proteção
integral da criança e do adolescente;
v) abstenham-se de proferir qualquer comentário ou
manchete que incite a pena de morte, linchamento,
castração ou qualquer outro tratamento desumano ou
degradante em prejuízo de quem quer que seja;
f.4) a confirmação da tutela antecipada, a fim de que a
União e a ANATEL realizem a fiscalização dos programas
citados nesta peça vestibular, comunicando qualquer
violação aos direitos fundamentais diretamente ao Parquet
Federal e a este MM. Juízo; e
R u a darecha l D e o d o ro , 933 C e n tro - C u r it ib a /P R - C E P 8 00 6 0 -01 0Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
88
V
M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o Pa r a n á
f.5) a confirmação da tutela antecipada, a fim de que o
Estado do Paraná abstenha-se de apresentar qualquer
investigado ou preso cautelar aos órgãos de imprensa, salvo
se este estiver devidamente representado por advogado
regularmente constituído ou defensor público e na sua
presença.
Dá-se a causa o valor de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de
reais).
Curitiba, 27 de janeiro de 2016
ELOISA HELENA MACHADO Procuradora Regional dos Direitos do Cidadão
Procuradora da República
MPF Documento eletrônico assinado digitalmente.Signatário(a): ELOISA HELENA MACHADO:8559Certificado: 7cc26093604f28f9
Data/Hora: 27/01/2016 14:51:24
Ministério Público Federal
Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892
89