ACP (Autos nº 97.00.13364-9)

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M inistério P úblico F ederal P rocuradoria da R epública no E stado do P araná EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 3a VARA FEDERAL CÍVEL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CURITIBA - SEÇÃO JUDICIÁRIA DO PARANÁ DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA Autos n° 97.00.13364-9/PR O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela Procuradora da República signatária, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, com fulcro nos artigos 127, caput, e 129, incisos II e III, da Constituição da República de 1988, bem como na Lei n. 7.347/85 e na Lei Complementar n. 75/93, vem ajuizar AÇÃO CIVIL PÚBLICA, COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, em face de SOCIEDADE RÁDIO EMISSORA PARANAENSE S/A PARANAENSE DE COMUNICAÇÃO (GRPCOM/RPCTV), pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 76.494.806/0001-45, com sede comercial na Rua Pedro Ivo, n. 409, bairro Centro, Rua Mamoré, 753, bairro Mercês e na Rua José Loureiro, 282, bairro Centro, todos em Curitiba/PR; GRUPO Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892 1

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M inistério P úblico F ederalP ro cura d oria d a R epública n o E stado do P araná

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) FEDERAL DA 3a VARA FEDERAL CÍVEL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CURITIBA - SEÇÃO JUDICIÁRIA DO PARANÁ

DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA

Autos n° 97.00.13364-9/PR

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela Procuradora da

República signatária, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais,

com fulcro nos artigos 127, caput, e 129, incisos II e III, da Constituição da

República de 1988, bem como na Lei n. 7.347/85 e na Lei Complementar n.

75/93, vem ajuizar

AÇÃO CIVIL PÚBLICA,

COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA,

em face de SOCIEDADE RÁDIO EMISSORA PARANAENSE S/A

PARANAENSE DE COMUNICAÇÃO (GRPCOM/RPCTV), pessoa jurídica de direito

privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 76.494.806/0001-45, com sede comercial

na Rua Pedro Ivo, n. 409, bairro Centro, Rua Mamoré, 753, bairro Mercês e na

Rua José Loureiro, 282, bairro Centro, todos em Curitiba/PR;

GRUPO

Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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• ® I

M inistério P úblico F ederalP rc curadoria da R epública no E stado do Paraná

IA S/A - GRUPO RIC DE COMUNICAÇÃO (REDE INDEPENDÊNCIA

DE COMUNICAÇi O), pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob

o n. 79.107.918/ )001 -94, com sede comercial na Rua Amauri Lange Silvério, 450,

Curitiba/PR;

TV INDEPENDÊN

bairro Pilarzinho

RÁDIO E TV IGl AÇU S/A - GRUPO MASSA (REDE MASSA), pessoa jurídica de

direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 76.600.188/0001 -70, com sede

comercial na Ru; João Tschannerl, 830, bairro Vista Alegre, Curitiba/PR;

TV COLOMBO (I CA COMPANY DE TELECOMUNICAÇÕES DE COLOMBO LTDA.),

pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n.

05.406.795/0001 56, com sede comercial na Rua Einstein, 1042, MD 2, Vila

Guarani, Colomb >/PR;

RÁDIO E TELEVISÃO BANDEIRANTES LTDA. (TV BAND), pessoa jurídica de direito

privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n. 60.509.239/0007-09, com sede comercial

na Rua Radiante >, 13, bairro Morumbi, São Paulo/SP, com filial na Rua Santa

Cecília, 802, bair -o Pilarzinho, Curitiba/PR;

RÁDIO E TELEVSÃO RECORD S/A (TV RECORD), pessoa jurídica de direito

privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n.60.628.369/0001-75, com sede comercial

na Rua da Várzea, 240, bairro Barra Funda, São Paulo/SP;

AÇÃO E PARTICIPAÇÕES S/A (TV GLOBO), pessoa jurídica de

inscrita no CPF/MF sob o n.27.865.757/0033-81, com sede

Von Martius, 66, bairro Jardim Botânico, Rio de Janeiro/RJ, e

( hucri Zaidan, 46 e 1901, Vila Cordeiro, bairro Itaim Bibi, São

GLOBO COMUN

direito privado,

comercial na Ru

Avenida Doutor

Paulo/SP;

c

AGÊNCIA NACIOIAL DE TELECOMUNICAÇÕES (ANATEL), pessoa jurídica de

direito público, entidade autárquica em regime especial criada pela Lei n.:chal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 'one (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

Rua Mar

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M inistério P úblico F ederalP rocuradoria , d a R epú blica n o E stado do Paraná

9.472/97, podendo ser citada

Especializada junto à ANATEL, com sede no Setor de Autarquias Sul, Quadra 6, Bloco H, 6o Andar, Ala Norte, Brasília/DF;

pessoa do(a) Procurador(a) Federalna

ESTADO DO PARANÁ, pessoa jurídica de Direito Público Interno, representado

pelo Procurador-Geral do Estado do Paraná, com sede na Rua Paula Gomes, n.

145, Centro, Curitiba, Paraná, CEP 80.510-070; e

UNIÃO, pessoa jurídica de Direito Público Interno, com sede na Rua Munhoz da

Rocha, n. 1247, Cabral, Curitiba, Paraná, CEP 80.035-000, podendo ser citada na

pessoa do Procurador-Chefe da Advocacia da União no Paraná, pelas razões de

fato e de direito que passa a aduzir:

1. DO OBJETO

O Ministério Público Federal pretende, mediante o

ajuizamento desta Ação Civil Pública, a obtenção de provimento jurisdicional

que garanta a efetiva RESPONSABILIZAÇÃO dos réus em virtude de práticas

recorrentes adotadas em seus programas de televisão, notadamente no que se

refere à violação da presunção de inocência e superexposição dos presos

cautelares.

Os réus são grandes grupos de comunicação (com exceção

da TV Colombo e dos entes públicos) e alcançam milhões de lares no Estado do

Paraná e em diversos outros Estados da Federação, o que, por si só, exigiria

prudência, ética e lisura na divulgação das informações por meio dos seus

programas de televisão. Todavia, em determinadas “coberturas” de casos

notórios, principalmente naqueles relativos a crimes, os réus não economizam

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Ministério P úblico F ederalP r c u r a d o r ia d a R epú blica no E stado do Paraná

esforços no sentido de expor os suspeitos, pessoas que sequer foram

julgadas, à ieno nínia. à execração pública.

Desde o fim da década de 1980, os programas de cunho

“policialesco” t?m se inserido com força no interior da cultura popular. As

emissoras de te evisão, movidas pelo desejo insaciável de audiência, agem de

modo impruden :e e, porque não, sensacionalista, no intuito de explorar as

nuances mais ob >curas e macabras de qualquer fato que tenha aparência delitiva

e seja perfeito 10 gosto do grande público, cada vez mais inseguro e “cansado

de tanta impun dade” - sentimentos incentivados pela cultura de massa. Não

tem sido incomi m observar, com assustadora naturalidade, a “sede” por sangue

demonstrada pe os apresentadores de tais programas, a cada dia mais teatrais e

caricatos, transformando a tragédia e o sentimento de perda de um, no

entretenimento larcotizante do outro.

A morte e a tristeza hoie são transformadas em meras

banalidades.

Os programas inseridos no gênero policial são ricos em

colecionarem at surdos e desrespeitos a qualquer garantia mínima prevista no

ordenamento jirídico, seja nos documentos internacionais que tratam dos

Direitos Humano;, seja na própria Constituição Federal de 1988.

Os pretensos repórteres policiais, figuras inerentes aos

programas do gênero, são hoje responsáveis por enriquecer o repertório do

absurdo transmitido ao vivo, adicionando pitadas de violações de direitos na

pauta televisiva como se já não fossem suficientes aquelas perpetradas pelos

folclóricos “ânc( ras”. É prática comum nesse gênero de programação o envio de

repórteres diret imente às portas das delegacias de polícia, onde, quase que com

hora marcada, < s presos são expostos ao ridículo e sumariamente condenados,

antes mesmo de qualquer processo judicial ou instrução probatória.Rua Mí rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-88924

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A presunção de inocência, um dos alicerces no qual deve

pautar-se o Processo Penal Constitucional, é ignorada e atirada ao lixo durante a

exibição dos programas policiais, sendo apresentada ao público como mais um

dos obstáculos à concretização da justiça e à efetivação da paz social. Isso sem

entrar em outras questões, como a idolatria à pena de morte, à castração, ao

linchamento e à tortura, que também ajudam a compor a aquarela de

irracionalidades perpretada.

No meio de tudo isso, temos os apresentadores, os

“âncoras”. Essas pessoas são construídas como figuras homéricas, defensoras do

povo e da moral pública. Todos sempre se apresentam como homens do povo que

cresceram em razão do bem e da sua constante luta contra o “mal” . Durante as

matérias exibidas, os apresentadores são responsáveis pela condução do show:

cabe a eles prender a atenção do público mostrando sua indignação e seu desejo

de vingar a vítima do crime, sem mencionar que, não raras vezes, entre gritos e

interpretações teatrais, suscitam o ódio e convocam a multidão enfurecida à

“guerra contra o inimigo”. Os comentários exarados pelos apresentadores são o

ápice dos programas, sendo responsáveis pela (de)formação da opinião pública.

A colocação como voz dos oprimidos, aliás, é o que conduz

muitos desses apresentadores a tornarem-se posteriormente membros do alto

escalão político do país, como Deputados Estaduais ou Federais, Vereadores e

Prefeitos.

Além disso, os programas policiais exibem, sem qualquer

pudor ou algum tipo de censura moral, imagens de vitimas menores de idade,

das quais muitas são crianças. Um exemplo claro disso está na condução da

cobertura jornalística daquilo que ficou conhecido como Caso Tavná. Alguns

programas transmitidos no âmbito do Estado do Paraná, mas retransmitidos pela

Internet, mostraram o cadáver de Tavná da Silva, uma menina de 14 (catorze)

anos, sendo desenterrado. Isso sem qualquer tipo de tratamento na imagem.Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

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M inistério P úblico F ederalP í DCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

Acrescente-se também que parte desses programas, quase

sua maioria,_s >o transmitidos no horário em que as famílias costumam

almoçar em fre nte a televisão (por volta do meio-dia). As exibições diárias do

sofrimento hum mo, em seu estado mais degradante, são livremente deixados ao

deleite das cr anças e adolescentes que porventura tenham acesso a um

televisor ou a um computador.

Não se pode olvidar, ainda, que as violações aqui

apontadas, infe izmente, não são exclusivas dos programas populares. As grandes

redes de televi: ão, em seus noticiários transmitidos no dito horário nobre, são

eficazes na prá ica de deturpar os princípios constitucionais do processo penal.

As violações c a presunção de inocência são inseridas de maneira quase

imperceptível, mas suficientes a expor os acusados ao opróbrio e à

estigmatização.

Quase que em parceria aos meios de comunicação, salta aos

olhos a conivência dos agentes estatais com a barbárie. Tem sido parte da

i apresentação dos suspeitos à imprensa. Aliás, é comum que os

sujeitos acusados sejam expostos às câmeras diante de grandes painéis com o

emblema da do ida.

práxis policial,

Fato é que ao preso cautelar sequer é dado o direito à não-

autoincriminaç d , notadamente quando deve se submeter às entrevistas

tendenciosas des já aludidos repórteres policiais. Tudo isso, repita-se, com o

respaldo da aut< iridade policial e sem o acompanhamento de um defensor.

Portanto, essa ação coletiva, conforme se aprofundará, tem

por seu objeto a proteção dos direitos constitucionalmente assegurados a

qualquer cidadi o. indistintamente, seja ele acusado de um crime ou não.

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M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú b lic a n o E stado do Paran á

2. DA LEGITIMIDADE ATIVA. DA ATRIBUIÇÃO DE DEFESA DOS DIREITOS E

GARANTIAS FUNDAMENTAIS DO ACUSADO.

A legitimidade ativa do Parquet Federal está evidenciada na

própria Constituição da República de 1988, especialmente no artigo 127, o qual

prescreve ser atribuição do Ministério Público Federal, instituição essencial à

função jurisdicional, a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos

interesses sociais e individuais indisponíveis.

Diz o artigo 127 da CF/88:

Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente,

essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a

defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos

interesses sociais e individuais indisponíveis.

Na sequência, o artigo 129 do Texto Magno preceitua:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

[ . . . ]

zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos

serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta

Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a

proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de

outros interesses difusos e coletivos.

II

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M inistério P úblico F ederalP OCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

0 Ministério Público, como se pode inferir do texto

:em a missão precípua de defesa da cidadania, especialmente no

proteção da dignidade humana de todos os grupos sociais que

edade brasileira.

constitucional,

que se refere à

compõem a soc

Como bem apontado no preâmbulo da Constituição da

República de 1‘ 88, os objetivos do Estado Brasileiro visam a construção de uma

sociedade juste e solidária. O cumprimento desses encargos somente pode ser

levado adiante com o devido respeito, por parte de todos, principalmente por

parte do próprio Estado, do valor intrínseco que cada ser humano carrega

consigo.

Não é por outro motivo que se perfaz como uma das

missões essenci lis do Parquet zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da

União, dos serviços de relevância pública e dos meios de comunicação social

aos princípios, garantias, condições, direitos, deveres e vedações previstos na

Constituição Federal e na lei, dentre os quais o respeito à integridade dos

acusados e ao; princípios básicos do Processo Penal, como a presunção de

inocência. A )bservância de tais preceitos se configura como corolário

primordial à cor secução dos fins propostos pelo constituinte.

Aliás, a própria Lei Orgânica do Ministério Público, a Lei

Complementar i. 75/1993, em seu artigo 6o, inciso VII, alínea “a”, afirmou

competir ao Pa quet Federal a defesa dos Direitos Constitucionais e a proteção

dos Direitos Hur íanos positivados no Texto Maior.

Ainda, cabe destacar a redação do artigo 39, inciso III, da

Lei Complemen ar n. 75/93, que assegurou o Ministério Público como instituição

responsável peli defesa dos Direitos Constitucionais, especialmente quando a

situação exige > devido cumprimento por parte dos concessionários de serviço

público federal, como é o caso do serviço de radiofusão de sons e imagens.Rua M irechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

Fone(0xx41)3219-8700 - Fax(0xx41)3219-88928

M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú b lic a no E stado do Pa ran á

Diz o artigo 39 da LC n. 75/93:

Art. 39. Cabe ao Ministério Público Federal exercer a defesa dos

direitos constitucionais do cidadão, sempre que se cuidar de

garantir-lhes o respeito:

I - pelos Poderes Públicos Federais;

II - pelos órgãos da administração pública federal direta ou

indireta;

III - pelos concessionários e permissionários de serviço público

federal;

IV - por entidades que exerçam outra função delegada da União.

Desta feita, resta evidente a legitimidade ativa do

Ministério Público Federal.

3. DA LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E DA ANATEL. ATRIBUIÇÃO DE

FISCALIZAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO. TITULARIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO DE

RADIOFUSÃO.

No que toca à legitimidade passiva da União

presença no polo passivo da presente Ação Coletiva se vislumbra em virtude do

artigo 21, inciso XII, alínea “a”, da CF de 1988. Segundo a Lei Maior, é

exclusividade da União a exploração do serviço de radiofusão de som e imagem;

o seu exercício por particulares somente se dá em decorrência de concessão

pública.

a sua

Além disso, a União, na condição de concedente do serviço

público, tem por encargo proceder à fiscalização do exercício da concessão,

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M inistério P úblico F ederalo cu ra d o ria da R epú blica no E stado do Paranáp

notadamente c janto ao atendimento do interesse público, consoante a dicção

do artigo 29, ir ciso I, da Lei n. 8.987/95. O direito de fiscalização por parte da

administração | lública não exige expressa previsão no ato de outorga e pode (e

deve) ser exerc do sempre.

Nas sempre atuais e pertinentes lições de Diogenes

to Administrativo. 17. ed. São Paulo: 2012. p. 425.):Gasparini (Dire

“O interesse público está consubstanciado na transferência da

execução e exploração do serviço público a terceiro, livrando-se

a Administração Pública dos custos decorrentes de sua execução,

mantendo, no entanto, a titularidade do serviço público

transferido e o controle da prestação aos usuários” (grifei).

A União, portanto, não perdeu a titularidade do serviço

de radiofusão, hoje executado pelos grupos de comunicação elencados nesta

peça vestibular

Ao contrário, o ente concedente do serviço mantém a

titularidade e linda recebeu, por lei, o encargo de fiscalizar a prestação dos

serviços, princ palmente se os mesmos atendem ao interesse público. Se

atualmente exi >te o descumprimento das normas constitucionais e legais por

parte da conce isionária do serviço público, tal fato se deve à desídia da União

em realizar a a< lequada e firme fiscalização das atividades.

Some-se a isso que a outorga para a execução do serviço

de radiofusão í de competência do Ministério das Comunicações, cabendo-

lhe, dentre oi tras, fiscalizar a adequação do conteúdo veiculado pelas

emissoras de ládio e televisão aos ditames da legislação pertinente, com

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destaque ao Código Brasileiro de Telecomunicações e a Constituição Federal.

Não obstante a execução dos trabalhos de fiscalização terem sido delegados à

Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), por meio do convênio n.

01 /2007, a competência para aplicar sanções administrativas resultantes desses

processos, contudo, permanece no Ministério das Comunicações.

Ilustrativo, nesse ponto, trecho do voto do Desembargador

Federal Bruno Teixeira, no julgamento da Apelação n. 27666-RN, que tramitou

junto ao Tribunal Regional Federal da 5a Região:

A delegação de função adm inistrativa não é causa para se

reconhecer a ausência de interesse processual do poder

delegante, o qual permanece com sua função constitucional

inabalada, visto que cabe ao Ministério das Comunicações,

além da função fiscalizadora, fa ze r concessão de

funcionamento para emissoras de rádio e televisão, podendo,

de form a justificada, suspender o ato concessivo.

Improcede a pretensão da União de m igrar para o polo ativo

processual frente ao seu dever de fiscalizar, autorizar,

conceder e cancelar atos administrativos que envolvam a

prestação de serviços de telecomunicações, havendo de se

responsabilizar solidariamente pelos atos ilícitos praticados

pelas entidades a ela subordinadas. Ademais, o prejuízo

arcado com a suposta veiculação de programação alheia à

finalidade da emissora educativa traz prejuízo tão somente à

comunidade beneficiária, para a qual o serviço é destinado, não

se mostrando lógico investir a União da qualidade de parte

sofredora de dano [destaquei], (APELAÇÃO n. 0 27666-RN - Rei.:

Desembargador Federal Bruno Teixeira, TRF5 - Quarta Turma, DJE

- Data: 04/07/2013 - Página: 620)

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Destarte, a União deve obrigatoriamente integrar a

presente demaida, seja em razão da sua condição de concedente do serviço

público, seja pelo seu encargo de fiscalizar e aplicar sanções aos concessionários

que não executam o serviço público de maneira adequada. O mesmo aplica-se à

ANATEL, a qiem o Ministério das Comunicações delegou a atribuição de

executar a fisc; lização do conteúdo transmitido pelas redes de rádio e televisão.

4. DA LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DO PARANÁ. DESRESPEITO DOS

DIREITOS CONÍ TITUCIONAIS DO ACUSADO. CONDUTA ILEGAL POR PARTE DOS

POLICIAIS.

A inclusão do Estado do Paraná no polo passivo desta ação

coletiva se dá, especificamente, em virtude da conduta adotada pelos agentes

estatais na con iução da instrução preliminar do caso Tayná, notadamente no que

se refere à d vulgação precipitada das informações e no desrespeito aos

direitos do pre ;o. Como aponta a Constituição da República, em seu artigo 37, §

6o, as pessoa; jurídicas de direito público respondem pelos atos danosos

praticados pelo > seus agentes, nessa condição, contra terceiros.

Sem importarem-se com as circunstâncias que envolviam os

fatos, destacar do-se a idade da vítima, os policiais civis divulgaram, de forma

afobada, as in ormações do caso à imprensa. Não fosse isso suficiente, ainda

foram responsá /eis por permitir a cobertura jornalística das buscas pelo cadáver

da criança, au orizando que pessoas externas à atividade policial adentrassem

no local de nrv irte - que, até onde se saiba, deveria ser uma área isolada e

resguardada an :e os olhares mais curiosos da população.

Pois bem.

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Como se infere da investigação preliminar levada a cabo

por este Parquet, a Polícia Civil do Paraná divulgou, em 28 de junho de 2013, por

meio de seu sítio na internet1, notícias de que teria procedido à prisão dos

“responsáveis pela morte da garota Tayná Adriane da Silva (s/c)” . Dessas

informações, foram apontados Sérgio Amorim da Silva Filho, Adriano Batista,

Paulo Henrique Camargo Cunha e Ezequiel Batista como sendo os criminosos.

Os termos “criminoso e “marginal” , oportuno dizer, se

fizeram presentes em diversos trechos da nota. Tal conduta, considerando a

formação técnica das autoridade policiais, não pode ser, em momento algum,

admitida no âmbito de um Estado Democrático e de Direito.

Não há espaço para que uma equipe policial, chefiada por

um Bacharel em Direito, deixe-se levar pela irracionalidade e passe a imagem de

quatro suspeitos, presos cautelarmente, cuja custódia incumbe ao Estado,

bandidos” , sem ter sido feito nenhum trabalho de investigação

minucioso. Ressalte-se que no dia da divulgação da nota, o corpo de Tavná

sequer havia sido encontrado.

como

Somado a tal forma de proceder, os agentes da Polícia Civil

ainda foram responsáveis por apresentar os quatro suspeitos à imprensa,

permitindo aos repórteres policiais que os entrevistassem. Ocorre que Sérgio

Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique Camargo Cunha e

em momento algum, acompanhados porEzequiel Batista não estavam

defensores constituídos ou públicos. Em suma, os presos não tinham, durante a

condução das entrevistas, nenhuma forma de se esquivarem das investidas

desleais dos repórteres que, não raras vezes, induziam as respostas dos suspeitos

no intuito de conseguir uma confissão.

1 Disponível: <http://www. Doliciacivil.pr.gov. b r/modules/noticias/artide.php?storvid=7575>.Acesso em: 03 dez. 2015.______________________ ___________ _______________ __

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M inistério P úblico F ederalOCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁPi

No sítio da Polícia Civil, na internet, também era possível

visualizar uma $ aleria de fotos dos presos - que, repita-se, eram cautelares.

À propósito, dias depois da celeuma instaurada com a

divulgação dos Dormenores fáticos do caso, surgiram indícios de que os quatro

presos teriam s ido vítimas de tortura por parte de alguns policiais, cujo fim

seria a busca p ?la confissão. As ações penais decorrentes da situação estão em

trâmite junto a > Juízo da 1a Vara Criminal de Colombo (cf. ofício n° 44/15 da 2a

Promotoria de J jstiça de Colombo - fls. 82).

Não há, pois, como se negar a responsabilidade do Estado

do Paraná, por meio de seus agentes, na violação dos direitos dos presos e na

divulgação das i iformações do caso.

Sobre a responsabilidade do Estado, oportuna se faz a

transcrição de rechos do acórdão proferido no RE 272.839/MT, que tramitou

junto ao Sup emo Tribunal Federal. Nele foi questionado acerca da

responsabilidade do Estado sobre eventuais agressões sofridas pelo preso em

casas de custód a:

[...] diferentemente da responsabilidade subjetiva, cuja

indenização decorre de um procedimento culposo ou doloso, a

responsabilidade objetiva estaria caracterizada pela relação

causal entre a atuação estatal e o dano produzido,

correlacionada a uma situação de risco [...].

No jugamento do RE 84.072 (DJ de 1o.5.1978), Relator o Ministro

Cunha Peixoto, ressaltou-se o entendimento de que a

responsabilidade civil do Estado, com fundamento na teoria

objetiva, resulta da causalidade do ato e não da

culpabilidade do Agente.

[ . . . ]

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R ua Mi

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M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica no E stado do Paraná

Verifica-se que esta Corte adotou ainda a responsabilidade civil

objetiva do ente público, considerando o nexo de causalidade

entre a ação praticada por terceiro, estranho ao serviço público,

e a lesão causada à pessoa que estava sob custódia do Estado, o

qual deveria zelar pela sua integridade.

[ . . . ]

A p a rtir do entendimento desta Corte, portanto, observa-se

que uma das hipóteses do reconhecimento da

responsabilidade do Estado, consubstancia-se no dever de

vigilância que lhe é atribuído. Assim, apesar do fundamento

que considera a configuração de uma espécie de culpa

genérica da Administração (faute du service), destaco o

argumento jurídico de que, no caso concreto sob análise, a

responsabilidade advinda do dever de vigilância ou guarda

pode ser objetivamente imputada ao aparato estatal.

Na espécie, o detento estava em cumprimento de pena privativa

de liberdade, portanto, sob a custódia do Estado. (RE 272.839,

Rei. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 1°-2- 2005, Segunda

Turma, DJ de 8-4-2005) [destaquei].

Transportando essas considerações ao presente caso

concreto, é cristalina a violação do dever de vigilância por parte do Estado do

Paraná, pois todos os suspeitos estavam sob sua guarda, aguardando o desenrolar

da instrução preliminar. Porém, sem nenhum respeito aos princípios

constitucionais mais caros à efetivação da proteção das garantias do indivíduo, a

Polícia colocou-os sob o olhar curioso e fumegante das câmeras e filmadoras,

deixando Sérgio Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique

Camargo Cunha e Ezequiel Batista à disposição do ódio popular.

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M inistério P úblico F ederalP i ocuradoria d a R epú blica n o E stado do Paraná

Logo, demonstrada está a contribuição do Estado do Paraná

para a ocorrênc ia dos fatos lesivos, o que ampara a sua presença no polo passivo

desta lide.

5. DA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. PRESENÇA DA UNIÃO NO POLO

PASSIVO.

A competência da Justiça Federal se justifica pelo teor da

redação do artii p 109 da Constituição da República de 1988, in verbis:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I - as causas em que a União, entidade autárquica ou

empresa pública federal forem interessadas na condição de

autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de

falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça

Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

[...]

§ 2°. As causas intentadas contra a União poderão ser

aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor,

naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem

à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no

Distrito Federal.

Desta feita, figurando a União no polo passivo da presente

demanda, afirma-se a competência da Justiça Federal como Órgão competente

para o processe mento e julgamento do feito. Além disso, tem-se que a causa

versa sobre a cc ncessão de um serviço público de titularidade da União, o que,

de per si, já é si ificiente para confirmar a competência da Justiça Federal.

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M inistério P úblico F ederalP rocura d oria da R epú blica n o E stado do Paraná

6. DA SÍNTESE FÁTICA

A presente Ação Civil Pública tem origem no Inquérito Civil

Público n. 1.25.000.003448/2013-83, instaurado após as manifestações

encaminhadas pelo então Deputado Federal Florisvaldo Fier, conhecido

popularmente como Dr. Rosinha.

Durante o curso das investigações, apurou-se que após a

divulgação, por parte da Polícia Civil do Estado do Paraná, dos nomes de

Sérgio Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique Camargo Cunha

e Ezequiel Batista, como sendo os responsáveis pela morte de Tayná Adriane

da Silva, diversas emissoras de televisão passaram a veicular a imagem dos

quatro como criminosos, antes mesmo de qualquer manifestação judicial

sobre a situação dos mesmos..

Os informes e chamadas feitos durante a programação

MENINA É ESTUPRADA E MORTA":

“ESTUPROU A MENINA JÁ MORTA” :

traziam frases no seguinte sentido:

“SUSPEITOS FALAM COM A POLÍCIA” :

“MENINA MORTA EM PARQUE DE DIVERSÕES” . Essas frases, geralmente no

rodapé dos vídeos, exibidas em letras garrafais, eram vinculadas aos quatro

detidos, induzindo o espectador a enxergá-los tão somente como bandidos,

monstros e degenerados.

Além disso, algumas emissoras, como é o caso da Rede

Massa e da RPCTV, transmitiram os seus noticiários diretamente do município de

Colombo, colocando, respectivamente, o repórter Ricardo Vilches e Karine

Garcia ao vivo durante a exibição dos seus programas.

A repórter Karine Garcia, da RPCTV (empresa do grupo

GRPCOM), iniciou sua fala condenando, em definitivo, os suspeitos, dizendo:

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M inistério P úblico F ederalP i ocuradoria da R epública no E stado do Paraná

Olá Tha/s [apresentadora do programa Paraná TV], olha, os QUATRO

BANDIDOS foram presos ontem pela Polícia

Da mesma forma, o repórter Ricardo Vilches, da Rede

Massa, que, de; curando de qualquer prudência na descrição dos fatos, trouxe os

quatro suspeite s como os culpados por todo ocorrido, dizendo:

Séreio... e aí vem a crueldade desse crime Galo... esse crime começou a ser

cometido na te rça-feira. quando a Tavná foi chamada para dentro do parque

e lá ainda, a nc ite. sozinha. FOI VIOLENTADA POR ESSES TRÊS HOMENS F...T '.*

f .. .l Ele.

Porém, o que chama a atenção na condução da “cobertura

postura dos apresentadores. Destacam-se, nessa Ação Coletiva,

a conduta adotáda pelos âncoras Gilberto Ribeiro (José Gilberto do Carmo Alves

Ribeiro), hoje Deputado Estadual no Paraná, Paulo Roberto Galo, Marcelo

Rezende, Vai Santos, Iverson Vaz e Samuel Rocha. 0 primeiro pertencente à

Rede Independe id a de Comunicação, o segundo à Rede Massa, o terceiro à Rede

Record, o quart > à TV Bandeirantes e os dois últimos à TV Colombo.

jornalística” é

Todos os apresentadores têm como característica a

teatralidade e a presença de palco. No meio das transmissões, os âncoras dos

programas pol ciais reservam um espaço para comentarem as notícias

veiculadas. É nesse momento, movidos pela concupiscência por números

expressivos de audiência, no qual os apresentadores concentram esforços em

passar a sua indignação, induzindo o espectador a concordar que somente a

exterminação c os suspeitos gera eficácia na contenção da criminalidade. Os

âncoras, alguma s vezes agindo de modo caricato, tentam, a todo custo, passar a

mensagem de q ie o inimigo está bem ao nosso lado e que as amarras do sistema

de justiça são a verdadeira causa do caos em que se encontra a sociedade.

Não é incomum, inclusive, que alguns apresentadores

advoguem em prol do combate direto na guerra contra a criminalidade. PauloRua M rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

F o n e(0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41)3219-889218

M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica n o E stado do Paraná

Roberto Galo, por exemplo, é rico em apresentar frases absurdas durante seu

programa, intitulado Tribuna da Massa, como:

“ESSES CARAS MERECEM OU NAO PENA DE MORTE? Que pensa

você? Atenção, um dos ESTUPRADORES disse que usou

'camisinha' com a menina. DESGRAÇADO f f ala di ri vindo-se à

câmera1J...1 Que história macabra. Que coisa estranha. Você

entendeu o aue esse desQraçado do olho roxo falou? 0 cara aue

está ao lado dele, no momento da entrevista do Ricardo Vilches.

o tempo todo balançava a cabeca e faziam ó [o apresentador

balança a cabeça em sinal nevativo várias vezesl... e o cara

contando história. Ele foi, voltou, foi e voltou, e o Vilches

apertou ele. E VOCÊ EM CASA? ESSES CARAS? CORTA? CAPA

ffazendo gestos com conotação do ato de castrar alQuéml?

MATA? PENA DE MORTE?’’*

Este é um breve introito fático.

Adiante, será feita a descrição da conduta de cada um dos

reus.

A) DA CONDUTA PERPETRADA PELA REDE MASSA. PROGRAMA TRIBUNA DA

MASSA.

0 programa Tribuna da Massa, exibido na Rede Massa (TV

Iguaçu), levou ao ar inúmeras violações de preceitos constitucionais, desde a

desconsideração da presunção de inocência até o total descompromisso com a

dignidade humana.

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M in is t é r io P ú b l ic o F e d e r a lP r 3CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

A apresentação do programa Tribuna da Massa incumbe a

Paulo Roberto Galo, regionalmente conhecido pelo seu forte apelo popular.

Durante a exibi :ão do folhetim policial, o apresentador costuma realizar uma

espécie de dan ;a, sendo acompanhado por cacarejos de um galo, em forte

alusão ao seu n ime artístico. Indo além, o âncora também é conhecido por sua

frequente teatr alidade diante das câmeras. É comum que Paulo Roberto Galo

faça uso de aredotas e interpretações corporais (como pulos e as famosas

danças) ao chan ar e comentar as matérias exibidas.

No contexto do "Caso Tayná”, o programa Tribuna da Massa

iniciou com o apresentador Paulo Roberto Galo, diante de um púlpito com a

bandeira nacional, afirmando, de modo completamente dramático, a ocorrência

de um crime na região de Colombo, Paraná. Ao iniciar o programa, o

apresentador in roduz o espectador acerca do caso asseverando o seguinte:

PAULO ROBERTO GALO: Nesta terça-feira que passou, uma

menina de 14 anos de idade desapareceu de casa. Dona Cleusa, a

mãe, entrou em contato com o programa Tribuna da Massa

[aparecem fotos de Tayná] e aí começou tudo. Estamos

terminando a semana com a informação de aue essa menina

foi assassinada, violentada, abusada e estuprada.

ARREGAÇARAM [grita tal palavra durante a transmissão] com

ela durante dois dias, e aue esses ma rei na is são funcionários

de um parque de diversões em Colombo, e aue o povo

revoltado veio para rua e. alvuns. acham aue exageraram ao

quebrar [arquivo:

00:04-

o parque______________

7_Rede_Massa_STB_Trecho_1_Tribuna_da_Massa.mp4

00:36].*

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20

M inistério P úblico F ederalP ro cura d oria da R epú blica no E stado do Paraná

Usando um linguajar completamente coloquial, senão

chulo, o apresentador refere-se à morte da menina de 14 (catorze) anos como se

fosse um espetáculo. Anunciando o que virá a ser exibido no programa, Paulo

Roberto Galo diz aos espectadores que Tayná foi “Arregaçada” .

0 programa, como se vê, já se inicia com o total

desrespeito à dignidade de uma adolescente. Desconsiderando completamente o

preceito da proteção integral da criança e do adolescente, explicitamente

previsto na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, Paulo Roberto Galo

deixa de ver a criança e o adolescente como uma pessoa em fase peculiar de

desenvolvimento, transformando a tragédia familiar em mais uma atração

midiática conforme o gosto do espectador.

Sucessivamente, o programa Tribuna da Massa passa a

exibir uma matéria feita pelo repórter Ricardo Vilches, na qual se tem como

pano de fundo as buscas pelo cadáver de Tayná. Em um dos momentos da

reportagem, a Polícia Civil do Paraná leva ao encontro do repórter dois dos

suspeitos (ambos sem o acompanhamento de um defensor), que são Ezequiel

Batista e Sérgio Amorim da Silva Filho. É nessa ocasião que Ricardo Vilches

começa a inquiri-los acerca do crime. Em total desrespeito à presunção de

inocência e à ampla defesa, que abrange o direito ao silêncio, é perguntado

aos dois presos se eles cometeram o crime.

Abaixo, segue um dos trechos da entrevista [arquivo:

7_Rede_Massa_STB_Trecho_1_Tribuna_da_Massa.mp4 - 04:03-04:51]:

Ricardo Vilches: Explica, tim-tim por tim-tim, na terça-feira,

vocês pegaram essa menina e fizeram o que com ela?

Ezequiel Batista (identificado como suspeito): Não, eu não tava

junto com eles na hora que eles pegaram a menina.

R ua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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M inistério P úblico F ederalP r i curado ria da R epú blica no E stado do Paraná

Ricardo Vilches: 0 que que você fez?

Ezequiel Batista: Não, não fiz nada. Tipo, eles tavam

conversando com ela no parque, daí, tipo, daí eu não vi mais o

que... pra onde que eles foram.

Ricardo Vilches: Que que você fez então, qual foi sua

participação?

Ezequiel Batista: Não, eu não fiz nada.

[a imagem se concentra em Sérgio Amorim da Silva - identificado

como suspeito -, o qual aparece com um olho roxo durante a

gravação]

Sérgio Amorim: Ela passou na frente do parque, daí chamou um

de “nóis” nél? Não ele [apontando para Ezequiel com a cabeça].

Ricardo Vilches: Ela chamou?

Sérgio Amorim: É... tipo ela chamou, ela tava passando na rua,

aí ela, tipo, “Oh, vem aqui, vamo dá uma volta a í”, falou pra

ele. Só que ele pegou e chamou “tudo nóis” nél? Trouxeram ela

dentro do parque, ficamo conversando com ela ali, daí ele pegou

e pediu pra ficar com ela nél? Daí ela falou que não. Peguei e

fiquei com ela...

0 repórter, longe de cumprir com seu trabalho de informar

e agir com imparcialidade, considera, de antemão, ambos os “entrevistados”

como culpados >elo crime. A partir disso, passa a interrogá-los nessa condição.

No decorrer da entrevista, nota-se que o repórter chega a se exaltar com um

deles e, aponte ndo o dedo e falando em tom mais alto, pergunta a Sérgio

Amorim se foi ele o responsável pela morte, exigindo que ele descreva,

pormenorizadan ente, como se deram os fatos.

Mas, indo muito além disso, é possível se notar também que

o repórter busc i induzir a resposta em alguns momentos. Um dos pontos a se

destacar está q iando o repórter pergunta a um dos presos se a menina queria

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M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú b lic a no E stado do Pa ran á

fazer sexo com ele. Sem o acompanhamento de um defensor, prejudicando sua

própria situação (sem adentrar no fato de que existem indícios de que os

suspeitos foram torturados pela polícia), Sérgio se perde nas respostas e é

induzido pelo jornalista a dizer que a estuprou, como adiante se vê [arquivo:

7_Rede_Massa_STB_Trecho_1 _Tribuna_da_Massa.mp4 - 04:52-05:07]:

Ricardo Vilches: Só que o que? Você forçou ela?

Sérgio Amorim: Não...

Ricardo Vilches: Ah, ela quis? Ela quis fazer com você?

Sérgio Amorim: Eu só fiquei com ela primeiro.

Ricardo Vilches: Você ficou o quê? Você fez sexo com ela?

Sérgio Amorim: Fiz.

Ricardo Vilches: Ela queria?

Sérgio Amorim: Com camisinha...

Ricardo Vilches: Ela queria?

Sérgio Amorim: Hãn?

Ricardo Vilches: Ela queria?

Sérgio Amorim: Com camisinha...

Ricardo Vilches [pergunta exaltado]: ELA QUERIA FAZER SEXO

COM VOCÊ?

Ricardo Vilches, não satisfeito, segue o seu intento de

inquirição e, em determinada ocasião, pergunta a Sérgio a sua participação no

fato. Sem querer responder, num primeiro momento, é levado a isso pelo

repórter, que passa a fazer perguntas em tom exasperado [arquivo:

7_Rede_Massa_STB_Trecho_1_Tribuna_da_Massa.mp4 - 05:53-06:42].

Ricardo Vilches: E no dia seguinte você voltou?

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Sérgio Amorim: No dia seguinte, nós dois pegamo e voltamo né!?

Voltamo lá, daí ele...daí fala, cometemo o ato também, nós

dois... nós dois...

Ricardo Vilches: Ela já tava morta ou tava viva?

Sérgio Amorim: Acho que ela já tava morta, porque...

Ricardo Vilches: Você fez isso com ela morta?

Sérgio Amorim: Os dois.

Ricardo Vilches [exaltado e apontando o dedo na direção de

Sérgio]: Você fez? Tô perguntando de você! Você fez com ela

morta?

Sérgio Amorim: Com ela morta?

Ricardo Vilches: é... no outro dia?

Sérgio Amorim: Voltamo lá, eu segurei ela e o Paulo fez o ato,

que é o outro lá, o outro baixinho também, e eu também. Daí

ele pegou [aponta para Ezequiel com a cabeça] e falou bem

assim “ah, vamo enterra ela" [Ezequiel, nesse momento, nega

continuamente com a cabeça]. Ele falou nél? Daí eu falei não,

eu não vou enterrar. Daí eles pegaram e fizeram o buraco e

enterraram ela e ele falou que eu que enterrei, entendeu?

Em resumo, as entrevistas são tomadas à forca, com o

repórter pressic nando os presos, que estão sob a tutela policial, a falar em

frente às câmeas. A propósito, cabe destacar que as filmagens também são

impostas, quem permite e exibe a imagem dos presos aos repórteres são os

próprios policia s, tanto que durante as entrevistas, nota-se que foi um dos

agentes da Polícia Civil que colocou Ezequiel e Sérgio em frente a um painel

com o símbolo c d Governo do Estado do Paraná.

Não obstante a pessoa entrevistada negue a ocorrência

ou sua particip ação no crime, tal negativa é ridicularizada e afastada tanto

Rua Mi rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700- F a x (0xx41) 3219-8892

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fo

M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica n o E stado do Paran á

pelo repórter quanto pelo apresentador, que passam a reforçar a imagem do

suspeito como bandido.

Após o fim da matéria, já nos estúdios do programa, Paulo

Roberto Galo arremata com seus comentários, simplistas e ricos em

impropérios, exaltando o trabalho de Ricardo Vilches, essencialmente quando,

segundo o apresentador, “apertou” os acusados, fazendo com que eles falassem

[arquivo: 7_Rede_Massa_STB_Trecho_1_Tribuna_da_Massa.mp4 - 06:44-07:03].

PAULO ROBERTO GALO: que história macabra. Que coisa

estranha. Você entendeu o que esse desoraçado do olho roxo

falou? O cara que está ao lado dele, no momento da entrevista

do Ricardo Vilches, o tempo todo balançava a cabeça e faziam ó

[o apresentador balança a cabeça em sinal negativo várias vezes]

... e o cara contando história. Ele foi, voltou, foi e voltou, e o

VILCHES APERTOU ELE.

O apresentador, em outra oportunidade, ainda referindo-se

ao caso Tayná passa a atacar pessoas que trabalham em circos e parques de

diversão. Por serem atrações itinerantes e que costumam fixar-se durante certos

períodos de tempo em algumas cidades, Paulo Roberto Galo passa a sugerir o

rigoroso controle dessas pessoas, como se, presumivelmente, fossem bandidos.

Ilustrativo, nesse sentido, é o trecho extraído da gravação a

05:10-seguir [arquivo: 8_Rede_Massa_STB_Trecho_2_Tribuna_da_Massa.mp4 -

05:32]:

PAULO ROBERTO GALO: BOA MÁRCIO BARROS [exclama aos

gritos], “vamo tentá sabê”... e a pergunta autoridades: qual o

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M inistério P úblico F ederalP r dcuradoria da R epública no E stado do Paraná

procedimento quando chega um parque de diversões? Quando

chega um circo em nossa cidade? [questiona gesticulando com

pequenos pulos] Que documentos que se pede? Quem são as

pessoas? SIM [novamente aos Qrítos]... porque auem trabalha

normalmente num paraue ou num circo, sabe!?, de repente

são pessoas sem empreso, não se sabe da onde vêm, nem

para onde vão.

De todo o exposto, nem se precisa de maiores explanações

para se inferir s )bre o completo absurdo que se constitui o programa Tribuna da

iariamente pela Rede Massa e comandado por Paulo Roberto

Galo. O ocorridd no Caso Tayná é o exemplo concreto.

Massa, exibido

B) DA CONDUTA DA TV INDEPENDÊNCIA (RICTV). PROGRAMA BALANÇO GERAL.

0 programa Balanço Geral, exibido pela Rede

Independência de Comunicação (RICTV), também não economiza no teor

“policialesco” ( e suas reportagens. Comandado pelo apresentador Gilberto

Ribeiro, Deputa Jo Estadual pelo Paraná, o programa exibe diariamente notícias

sobre homicídio:, estupros e diversas outras formas de violência em rede aberta.

O programa, ass m como o Tribuna da Massa, é exibido no horário do almoço, por

volta do meio-d a2.

O programa Balanço Geral segue a mesma lógica do gênero

policial. Desde c início de sua exibição, o ponto crucial da transmissão reside nas

notícias de posiíveis crimes violentos cometidos na Região Metropolitana de

2 Grade<http://pr.ricmhis.com.br/Drogramacao-tv/>. Acesso em 21.out.2015.

de programação da Independência.TV Disponível em:

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M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica no E stado do P aran á

Curitiba. São personagens frequentes do programa usuários de drogas,

alcoólatras, moradores da periferia etc.

No curso do Caso Tayná, sem mencionar a exacerbada

exploração dos sentimentos da família da vítim a, mostrando a mãe e a irmã

aos prantos diante das câmeras, o apresentador do programa não deixou de

prejulgar Sérgio Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique

Camargo Cunha e Ezequiei Batista.

Em um dos trechos do programa, o apresentador Gilberto

Ribeiro, num típico maniqueísmo simplista, comum ao gênero midiático,

considerando os quatro suspeitos como “monstros" e “inimigos”, arremata a

matéria exibida com comentários, como:

GILBERTO RIBEIRO: Sinceramente, eu não tenho nem palavras

viu gente?!. Por que de tanta monstruosidade? De tanta

covardia? Matar por que hein? Tem gente, só pra encerrar aqui ó,

que vem pra esse mundão de meu Deus só para aumentar o peso

aqui na terra. Só para fazer, única e exclusivamente, o m al!

[arquivo: 6_RIC_TV_Policia_e_criminosos_procuram_corpo.mp4 -

00:53-02:28].*

Se tais considerações já não fossem muito, o programa

ainda faz questão de enriquecer seu repertório de estigmatização mostrando

inúmeras imagens dos quatro acusados sendo conduzidos por policiais. Isso

quando não decide repetir a imagem do ato de colocação e retirada dos

suspeitos do interior de uma viatura policial.

Ainda, o programa também exibiu trechos de uma

entrevista “concedida” por Sérgio Amorim durante as buscas pelo corpo deRua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR — CEP 80060-010

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889227

SiSgP

M inistério P úblico F ederalP r 5CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

6_RIC_TV_Polida_e_criminosos_procuram_corpo.mp4 - 00:53-Tayná [arquivo:

02:28].

Repórter: Agora um dos acusados aponta, nesse exato momento,

onde teria sido enterrado o corpo de Tayná da Silva e, a partir

de agora, os agentes da Policia Civil vão verificar se é

verdadeira ou não essa informação. A gente continua

acompanhando... A gente percebe alguma confusão nessa

informação que tá sendo repassada por parte do suspeito para

polícia, se é verdadeira ou não a informação, os agentes têm

que acreditar nessa informação porque procuram, a todo

momento, o corpo dessa vítima.

[surge a voz de alguém, supostamente um policial]

Policial: Era na beira do carreiro? Era perto do Carreiro?

Suspeito: Era.

[surgem outras vozes indefiníveis, uma delas começa a gritar:

vamo, vamo Sérgio]

Repórter: Mesmo com a procura incessante, nenhum vestígio.

Sérgio, um dos acusados, garantia que o corpo estava no local.

[a imagem se concentra na figura de Sérgio, um dos acusados]

Pessoa não identificada [perguntando para Sérgio]: 0 que

que você fez?

Sérgio: Eu apenas “truxe” ela pra cá.

Pessoa não identificada [perguntando para Sérgio]: Já morta?

Sérgio: É...tava.

Pessoa não identificada [perguntando para Sérgio]: Onde

vocês mataram ela?

Sérgio: Aqui [aponta com a cabeça a direção]... perto da trave

aqui ó.

Pessoa não identificada [perguntando para Sérgio]: Mataram

como?

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M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú b lic a n o E stado do Paraná

Sérgio: Foi é... assim, com o braço [gesticula com os braços

algemados]. Uma gravata.

[a imagem açora mostra os demais acusados sendo

conduzidos pela polícia ao local, saindo do camburão de uma

das viaturas da Polícia Civil]

Repórter: Em seguida, também chegaram ao local Paulo e

Adriano, também acusados de terem estuprado e assassinado a

jovem Tayná da Silva, de apenas catorze anos. Informações

repassadas pela própria polícia dão conta de que ela teria sido

violentada sexualmente na última terça-feira. Os criminosos

deixaram a vítima agonizando no local até o dia seguinte,

quando decidiram enterrá-la.*

Por fim, impende destacar a contribuição do Estado do

Paraná na produção da matéria exibida no programa sobre o caso. No momento

em que conduzia um dos suspeitos ao suposto local de morte, a polícia não

impediu a entrada do jornalista da TV independência. Ocorre que, pela

legislação penal e processual penal, a preservação do local de morte é crucial à

investigação preliminar. 0 ato de permitir a entrada irrestrita de qualquer

pessoa ao local durante as buscas pelo cadáver de Tayná apenas ressalta a total

desconsideração da Polícia Civil do Paraná na boa condução dos trabalhos. Tal

conduta somente corrobora as afirmações já feitas, de que atuam quase como

parceiras dos programas com conteúdo policial.

Destarte, as considerações feitas em relação ao programa

Tribuna da Massa também podem ser transportadas para o programa Balanço

Geral em sua integralidade.

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Ministério P úblico F ederal(CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁP r

C) DA CONDUTA DA REDE RECORD DE TELEVISÃO. PROGRAMA CIDADE ALERTA.

0 programa Cidade Alerta, exibido pela Rede Record de

Televisão, é um dos marcos do gênero “policialesco”. A gravação do programa é

feita em São Pa jIo, mas sua exibição se dá para todas as emissoras afiliadas à

Rede Record no território nacional. Com apresentação de Marcelo Rezende e

comentários de Percival de Souza, o programa é nacionalmente reconhecido

pelo forte teor de suas matérias, sempre acompanhadas de comentários dos

apresentadores - que também não deixam de explorar todas as nuances

macabras e ater orizantes dos fatos violentos.

Quando o programa passou a cobrir o Caso Tayná, o

apresentador A arcelo Rezende iniciou com comentários completamente

dramatizados. Isando de jogo de voz e até mesmo na criação de um sotaque

mais próximo à íngua falada pelo povo, Marcelo Rezende descreve como teriam

ocorrido os fat( s que ensejaram na morte de Tayná. A história narrada pelo

âncora do folhe tim tenta passar ao espectador a mensagem de que, numa

pacata cidade c o Paraná, quatro homens, sem qualquer tipo de freios morais,

acabaram com i vida de uma menina, o que, por si só. justificaria a atitude

da população ?m destruir completamente o parque de diversões onde

trabalhavam. À evidência, o apresentador chega a afirmar que o objetivo da

em verdade, os quatro suspeitos, sendo que eles deveriam serdestruição seria

queimados.

Segue trecho do programa [9_Record_Cidade_Alerta. mp4

00:00-02:34]:

MARCELO REZENDE: Deixa eu dizer uma coisa. Pensa no

seguinte: aquele porquinho de diversão, era a alegria da

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Rua M

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criançada, toda noite a criançada ia para o porquinho de

diversão. É roda-gigante, aqueles “negócio” que gira [o

apresentador faz círculos no ar] e roda assim... tinha bolinha

para jogar. Argola. E as crianças ali a se divertir. Ali era a

felicidade daquela cidade pequenininha, tranquila [fala

referindo-se ao município de Colombo]. Então, as famílias se

reuniam lá também. Mas de repente, na cidade tranquila, na

cidade tranquila, some uma adolescente de catorze anos. Na

última terça-feira ela sumiu. Ela sumiu e a família procurou

terça, quarta... e aí encontrou. Encontrou o corpo da menina,

correto, a duzentos metros do parque. Você me diria: “mas

como Marcelo? encontrou o corpo lá jogado de qualquer jeito?”

[o apresentador faz sinais negativos com a cabeça, ao mesmo

tempo que profere alguns sons ininteligíveis]. Não... encontrou...

a família encontrou o corpo lá no meio duma mata, certo. 0

corpo tava no meio duma mata e estava enterrado. Exatamente

isso. 0 corpo estava enterrado. Vai daaui. vai dali, tudo

comecou com quatro funcionários íreferindo-se a Sérgio.

Ezeauiel. Paulo e Adriano!. A menina ia passando, eles

penaram a menina, arrastaram para um mato, violentaram a

menina e depois a m ataram e enterraram... e a população foi

às ruas, põe as imanens aí...

[começa a ser transmitida a imagens relativas à destruição do

parque de diversões em Colombo]

MARCELO REZENDE (voz): Você vai vendo aí toda população

destruindo o porquinho. Tudo vai sendo quebrado, incendiado.

Carros incendiados, os caminhões... do... o caminhão do parque

incendiado, roda-gigante incendiada, tudo. Por quê? Porque a

população na verdade aueria incendiar os quatro

estupradores. põe no ar.*

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Denota-se, pois, que os objetivos do programa Cidade

Alerta passam bnge da pretensão de bem informar. Sob a batuta de Marcelo

Rezende, a atração segue, quase que na integralidade, incitando o ódio e

conclamando o povo a lutar pela justiça séria e eficiente, que nada mais é,

segundo se depieende dos comentários do apresentador, a “Lei do Talião”. Em

diversos momen :os, Marcelo Rezende, além de presumir que os quatro suspeitos

já haviam cometidos crimes semelhantes, mostra-se indignado com a presença

de várias garan ias previstas constitucionalmente, dentre elas a decretação da

prisão como mei lida excepcional.

é prescrito como aO “olho por olho, dente por dente

panaceia para t< dos os males que circundam o cidadão de bem.

A propósito, impende destacar os comentários finais do

apresentador sc bre o caso [10_Record_Cidade_Alerta_comentário_final.mp4 -

02:40-03:14]:

MARCELO REZENDE: Eu vou te contar, hein, Percival

[comentarista do programa]!? Que que faz com um sujeito desse?

Percival de Souza: Esse não merece absolutamente nada. Uma

menina indefesa, catorze anos... e ainda deixam em agonia de

um dia para o outro Marcelo.

MARCELO REZENDE: Não bastava estupra, não bastava saber,

ter a certeza, de que ia “matá”, mas deixaram a menina, ainda,

sofrendo de um dia para o outro. O cara diz [referindo-se a

Sérgio Amorim]: “não, matei aqui com uma gravata”... e daaui a

pouco vai tá na rua repetindo o quadro, porque é óbvio que

não é a primeira vez. *

Não havia forma mais exuberante do apresentador

a a desconsideração pelo que se entende como garantiasdemonstrar tocRua M rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

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fundamentais. 0 trecho acima bem descreve do que se trata o conteúdo do

folhetim.

Por fim, destaque-se que o programa também fez uso das

matérias produzidas pela Rede Independência de Comunicação (RIC), no

programa Balanço Geral, visto que esta é afiliada da Rede Record no Paraná.

Portanto, como se vê, o desrespeito a qualquer garantia

constitucional do indivíduo é quase que a única pauta do programa Cidade

não tendo sido diferente por ocasião do Caso Tayná, motivo pelo qual

também está inserido no contexto dessa Ação Coletiva.

Alerta

D) DA CONDUTA DA TV BANDEIRANTES DE CURITIBA. PROGRAMA BRASIL

URGENTE PARANÁ.

0 programa Brasil Urgente Paraná é a versão local do

programa Brasil Urgente, apresentado, em São Paulo, por José Luiz Datena. A

versão paranaense é conduzida pelo apresentador Vai Santos na TV Bandeirantes

de Curitiba.

Vai Santos já é conhecido do grande público paranaense

como apresentador de programas policialescos, como ele mesmo afirma em seu

site pessoal: é um experiente comunicador, que por oito anos ficou à fre n te de

um programa policial na Rádio Clube, em Realeza. Em 2008 fo i apresentador do

'Tribuna da Massa' em Foz do Iguaçu e ficou por 8 meses no comando do

programa. Em 2009 fo i para a capital para apresentar o 'Tribuna da Massa',

estadual. Foi o apresentador do programa durante um ano e quatro meses. A

p a rtir dai Vai Santos fo i para o Grupo Bandeirantes apresentar o 'Paraná

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Acontece' e deoois 'Boa Tarde Paraná' agora surge o novo projeto 'Brasil

Urgente'3.

0 programa Brasil Urgente Paraná também é exibido em

horário inadequado, durante o período da tarde, e é rico em imagens de

brutalidade e v olência. Fazem parte do repertório do programa as seguintes

manchetes: “M(

SEIS TIROS NO IRISTO REI”;

ENTERRAR NO QUINTAL DE CASA”; “CRIME BRUTAL - POLÍCIA PROCURA CORPO

DA MENINA EST IPRADA E MORTA EM MATAGAL".

RTO NO CARTÓRIO - HOMEM É EXECUTADO COM, PELO MENOS,

FRIEZA - JOVEM É ACUSADO DE MATAR O PAI E

Durante o Caso Tayná, ao descrever os investigados, o

apresentador Vai Santos não economiza em adjetivos. De forma categórica, em

completo desrespeito à presunção de inocência, afirma que os investigados

Adriano, Sérgio Ezequiel e Paulo não são “bonzinhos”, ao contrário,

desgraçados, b mdidos. malditos, com sangue ruim que corre por aquele

corpo, há muitc tempo” .

sao uns

Seguem alguns trechos da fala do apresentador [arquivo:

5_Band_Curitiba _Brasil_Urgente.mp4 - 07:58-11:30]:

Apresentador Vai Santos: Olha gente, aí, diante disso a mãe... A

mãe foi pra, pra Rádio Banda B, na qual o Vanderlei trabalha, na

qual o Bruno trabalha, também. Na terça-feira, Vanderlei? Na

terça-feira a mãe, desesperada, pedindo pra... Se alguém

soubesse da filha, até pelo fato de que ela teria mandado uma

mensagem, dizendo que estava chegando em casa... Mas não

chegou. A mãe foi pra Rádio... E pediu, desesperada, chorando,

mas ainda com a esperança de que a filha pudesse estar viva. As buscas continuaram, a mãe foi para os terminais de ônibus,

http://www.valsantos.com.br/Sobre.asDX>. Acesso em: 30 out. 2015.3 Disponível em:Rua M í rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889234

M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica n o E stado do P araná

colando cartazes, mostrando a foto da filha... E ai a policia

descobrelGhegauma denúncia anônima de queamenina havia sido morta. Havia sido estuprada e morta...Apoliciadescobriu,

foi até o parque e prendeu os 4 suspeitos. [Nas imagens da

revolta dos moradores que estão sendo passadas,alegenda passa

a ser “Revolta popular - Rarque onde acusados de matar um

jovem trabalhaméatacado”]Apopulaçãotomouconhecimento

disso, e agora a imagem vai contando o que a população fez

depois de tomar conhecimento de que os4suspeitos no parque,

né. Os4suspeitosdeteremmatadoajovemtrabalhavam nesse

parque de diversões ai. Olha só gente, vai acompanhando, vai vendooqueacontece... Vai vendo ai, ó. Odonodoparquenão

tem nodoavercomahistória.5ó que um detalhe que eu queria

frisaraqui, muito hem lembrado peloGlaudinho, lá daOaúcho

Móveis.que conversava comigo fora do ar aqui dizia...“5erápue

a policia vai investigar por onde esse oaroue passou?” Outros

Municipios onde esse paroue esteve? 5e tiveram crimes

semelhantes? detiveram... Roroue. você achaoue esses caras

fizeram da primeira... É a primeira vez? Éo primeiro crime?

Eram bonzinhos. decentes até então? E de repente, por imoulso. resolveram cometer esse crime? Nãol 5ão uns

desgraçados, bandidos, malditos, com sangue ruimoue corre

por aouele corpo, há muito tem po.Eai.aRolicia. agora, tem

queinvestigarpra saber senessas outras regiões ondeo parque

esteve, não tiveram crimes, roubos, assassinatos, estupros na

ocasião em que estiveram por lá. Rorque os bandidos circularam

também. Eaiopovo meteu fogonoparqueali, ó. Meteu fogo, queimou tudo...Oaminhão, lona, tudo que você possaimaginar... Os brinquedos... Né, tudo, tudo foi destruído pelo povo, graçasà

revolta da população. Você viu que o povo não tolera mais, o

povo não quer mais esperar pra ver o que... Gomo xai dar o desenrolar da história. Os caras confessaramocrime,ocorpo da

jovemTayná ainda não tinha sido encontrado. Mas eles já foram

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lá e fizeram um arrastão, arrebentaram com tudo. Olha o

carrinho lá do parque, no meio da rua, sendo levado aí, ó

[referindo-se à imagem de carrinho do parque de diversões que

foi levado para a rua]. Sendo levado e destruído depois. Dá uma

olhada aí, ó. Essa é a população de Colombo, e isso aconteceu

ontem à noite. Olha só o que o povo fez quando descobriu o que

aconteceu. Olha aí, ó. Arrebentando com tudo, lá. População

revoltada, lá. Arrebentando tudo, jogando... E aí já aparecem uns

vândalos também que não sabem nem o que estão fazendo lá no

meio. Não sabem nem porque estão ali, mas vão fogo em tudo.

Hoje pela manhã, buscas pelo corpo da Tayná no matagal que

fica atrás do parque de diversões. Seria ali, Bruno Henrique, o

local onde... Eu já falo com o Bruno, antes eu quero a reportagem

que mostra essas buscas hoje de manhã porque eles deram o

ponto onde teriam escondido o corpo da Tayná. Libera a

reportagem, vai lá.[...]

Apresentador Vai Santos: Quatro. Quatro brutamontes,bandidos, possuídos pelo demônio, drogados! DROGADOS, olha

o recado aí! Pra você que faz passeata em favor das d... Da

liberação das drogas! Vai esse recado, aue os caras fizeram

porque tavam com a cabeca cheia da erva do Satanás e outras

coisas mais pesadas também. TAparece a foto dos 4 supostos

criminosos]. Esses caras aí. ó. Mataram! Mataram a menininhade 14 anos Os 4 estupraram, violentaram. E aí amarraram e

voltaram. ÍMostra. agora, imagens da câmera de segurança do

local onde Tavná desapareceu!. Olha aí a imagem dela aí. ó. Põe na tela cheia, vai lá! Essa é a última imagem da garotinha. Olha aí ó. Ela mandando a mensagem pra mãe, meu Deus do

Céu! Ela mandando a mensagem pra mãe. Presta atenção ali.

Esse é o momento que ela manda mensagem pra mãe, no celular! Um pouquinho antes de se aproximar do parque onde ela seria

violentada, estuprada e morta. Essa é a última imagem da Tayná.

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Indo pra casa, mas não chegou. Mandando a mensagem pra mãe... A última mensagem que a mãe recebeu da filhinha dela. Ai meu

Deus, ajuda porque não é fácil não, viu [arquivo:

5_Band_C u ri ti ba_B rasi l_U rge n te. m p4 - 47:10-49:13]:.*

0 apresentador

completamente seu dever de informar com ética e transparência, bombardeia o

espectador com a imagem dos investigados e com o dedo em riste aponta-os

como culpados, como assassinos e estupradores. Indo além, transforma viciados

em drogas em cúmplices do caso.

Vai Santos desconsiderando

Em outra oportunidade, além de defender a pena de morte,

o apresentador refere-se ao sistema de justiça, “a justiça dos homens”, como

fator impeditivo do andamento do seu programa [arquivo:

5_Band_Curitiba_Brasil_Urgente.mp4 - 57:34-58:10]:

Apresentador Vai Santos: Brasil Urgente de volta, e eu já vou

me despedindo aqui, até porque o Datena já tá chegando direto

de São Paulo. E tem um assunto lá que... Deixa a população

doida, que não deu pra gente comentar hoje pela gravidade do

caso próximo da gente aqui, que é do menininho de 5 anos que

pediu, implorou pra viver e os desgraçados mataram a criança,

que ele estava com medo, quase chorando. É o assunto. É o

assunto. O assassino do menino Bernardo merece pena de morte?

É o que vale aqui pra nós também. Os assassinos da menina

merecem pena de morte? Deveria existir nesse país, ou não?

Datena, eu volto amanhã às 7h30 da manhã, se Deus quiser, e a

justiça dos homens (não foi possível entender). Tchau, tchau

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No programa, pode-se acompanhar, em tempo real, todas as

nuancesdatrisiezahumana. Porém, ainformação séria, objetivo pelo qual a

imprensa devepimar,nãoéencontrada em momento algum.

As garantiasedireitos fundamentais,consideradas como um

acinte pelo apresentador,éotema que menos ganha espaço no programa,salvo

quandoépara sofrer achincalhação de seus comentários.

5) DA GONDUTADA TV COLOMBO. PROGRAMA BOANOITB COLOMBO.

0 Programa Boa Noite Colombo é o único dos listados nesta

demanda que nã o passa em rede aberta de televisão. Entretanto, a programação

da emissora est á integralmente disponível no YouTube. aue permite o acesso

pela rede mune ial de computadores4. A atração é conduzida por Iverson Vaz,

que também é epórter policial do programa 190, da rede CNT, e por Samuel

Rocha. O prognma é transmitido ao vivo para o município de Colombo pelo

canal 18 da CTV.

Durante a exibição, além de condenar definitivamente os

apresentadores, aproveitando-se que o alcance do programa é

ídem esforços no sentido de atacar frontalmente a dignidade de

Ezequiel e Paulo.

investigados, os

limitado, não m

Adriano, Sérgio,

Com imagens cedidas pelo programa 190, da rede CNT, o

folhetim fez qu ?stão de ressaltar nos informes que seguiam as reportagens os

seguintes dizer ;s: “QUAL SERIA A PENA JUSTA PARA OS ASSASSINOS DA

ADOLESCENTE ' AYNÁ ADRIANE DA SILVA?”; “CASO TAYNÁ: VÍDEO DO MOMENTO

EM QUE POLIC AIS E CIDADÃOS ENCONTRAM O CORPO DA ADOLESCENTE”;

4 Disponível em: https://www.voutube.com/user/tvcolombo>. Acesso em: 03 nov. 2015.rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

Rua Mi

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“QUAL SERIA A PENA PARA OS CRIMINOSOS QUE ESTUPRARAM E MATARAM A

TAYNÁ” .

Indo além, o programa permitiu aos espectadores o contato

direto por meio telefônico. As conversas eram exibidas ao vivo, sem nenhum

corte. A quantidade de frases violentas e de ódio é assustadora. E pior. Ambos os

apresentadores faziam questão de compactuar com as mensagens dos

espectadores, ajudando a incrementar o repertório de instigação à violência, à

tortura e à castração.

Num dos diálogos com uma espectadora, identificada como

Salete, os apresentadores Iverson Vaz e Samuel Rocha, não satisfeitos com o

desejo de desforra da participante, ainda fizeram questão de frisar que os

investigados eram “bandidos” e diziam a toda hora para que fosse mostrado o

rosto de um deles, no caso Sérgio Amorim.

0 diálogo se deu da seguinte forma [arquivo:

3_TV_Colombo_Boa_Noite_Colombo_esta_de_luto.mp4 - 07:58-10:47]:

Samuel Rocha: Vamo pedir a opinião das pessoas em casa,

Iverson? Nós temos a participação aqui com a gente, tá tocando

o telefone. Olá, buenas noches.

Participante por telefone (Dona Salete): Boa noite [som

distorcido].

Samuel Rocha: Boa noite, quem é? Opa, tamo com problema de

novo aqui, produção. Olá, boa noite.

Participante por telefone (Dona Salete): Boa noite.

Samuel Rocha: Quem tá falando?

Participante por telefone (Dona Salete): É Salete.

Samuel Rocha: Oi Dona Salete. Não tão boa noite assim, Dona

Salete, com uma notícia triste dessa, né, Dona Salete?

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M inistério P úblico F ederalP r 3CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

Participante por telefone (Dona Salete): Nem me fala, menino.

Samuel Rocha: Qual a sua opinião, a senhora que tem uma

neta... Tem filhos... Né, uma situação dessa, aí no Município de

Colombo, essa violência...

Participante por telefone (Dona Salete): Nem me fale. Eu to

indignada com isso. Sinceramente, olha, a pena desse cara

sabe o aue aue. 0 aue aue seria bom fazer? Amarrar uma

pedra de 100 kv na orelha dele, pra não dizer outra coisa. E

pôr ele desfilar nas ruas.

Samuel Rocha: Arrastando, né?

Participante por telefone (Dona Salete): Vish...

Samuel Rocha: Ô Ariel. coloca as imagens da matéria ora

Qente. aí. pra gente ver a cara do bandido.

[começam a ser passadas as imagens da matéria fe ita pelo

programa 190, em tela dividida com o estúdio de gravação

Participante por telefone (Dona Salete): Meu filho, aquele... A

cara daquele vagabundo pedindo desculpa, vente, isso a í não

existe desculoa no mundo.

Samuel Rocha: Ó eu vou tentar mostrar ora você. Salete. a

cara de um deles, olha, esse auem é. Iverson? festá

aparecendo, neste momento, a imaçem de Sérvio Amorim. nas

buscas pelo coroo de Tavná(

Iverson Vaz: Na verdade, esse aí é o Sérgio Amorim da Silva, de

22 anos de idade.

Samuel Rocha: Consegue uma imagem melhor aí, Ariel, por

favor.

Iverson Vaz: Ele ajudou a m atar a pequena Tavná. [a imagem

congelano rosto de Sérgio Amorim da Silva e continua, ao fundo,

música funesta] Então, repetindo, esse é o Sé raio Amorim da

Silva, de 22 anos de idade. Aeora. este... Conversando com

esse vagabundo. com esse sem vereonha aí... fa imanem

mostra, agora, o rosto de Paulo Henrique Camargo Cunhal,

que que ele falou... Esse outro, esse iá é o Paulo Henriaue

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Camargo da Cunha. Ele aue matou estrangulado a menina

com o cadarco dela.

Samuel Rocha: E é esse que tava em prantos, em desespero,

chorando, pedindo desculpa, ne?

Iverson Vaz: Exatamente.

Samuel Rocha: Haha, nem chorar ele consegue, né.

Iverson Vaz: Olha como os cara são macabro, são frios, são

calculistas...

Participante por telefone (Dona Salete): Filho! Eu digo uma

coisa para vocês, ó. Eu não estou lá na frente da TV. A minha

vontade é de quebrar a televisão, entendeu, entrar lá e quebrar

a cara dele. Quebrar... moer! Meu Deus, eu sou uma mãe.

Iverson Vaz: Então, viu Salete, o Samuel...

Participante por telefone (Dona Salete): Eu tenho uma neta,

pelo amor de Deus gente, que que é isso? [com voz de choro] Isso

não pode deixar acontecer, pelo amor de Deus.

Samuel Rocha: Inclusive, Salete, a gente tava assistindo ontem,

não sei se você assistiu nosso programa ontem, quando a mãe.

Ariel, por favor, coloca embaixo essa manchete de qual seria

a pena dos criminosos, para as pessoas participarem . Salete

a gente tava ontem, no programa quando ela deu entrevista, a

mãe da Tayná deu entrevista na rádio. Ainda não sabia. E ela

chorando, apelando. Quem sabe da minha filha? Onde ela tá? E

tal, e ela chorando... Imagina a situação que tá agora essa mãe,

né.

[A manchete “Qual seria a pena para os criminosos aue

estupraram e m ataram a Tavná” aparece em letras grandes na

tela]*

Ora, não sendo suficiente a intensa exposição da imagem de

um investigado, que sequer constava como parte num Processo Penal, os

apresentadores tinham o intento de instigar o ódio popular pedindo

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iMlo

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incessantemente a participação dos espectadores para que opinassem sobre a

landidos”, aos “criminosos”. A partir disso, como se poderá ver,

tornaram-se mais agressivas.

pena justa aos

as manifestações

Samuel Rocha: Tá certo. Vamo pras mensagens, aqui, e você que

tá participando aí em casa, tá assistindo, a gente gostaria de

saber, também, a sua opinião. Tá embaixo aí. aual seria a

pena para os criminosos aue estupraram e mataram a Tavná?

Nós temos aqui a mensagem do Rone José, participando aqui

com a gente: [lendo no computador a mensagem] “Em, todo o

protesto pelo Brasil, pouco foi visto pedido de pena de morte.

Em um caso como esse, e absurdo. É absurdo. Os assassinos

estão oresos. Vão comer e beber às nossas custas. E daqui a

pouco saem. E aí?” É o Rone José está dizendo que hoje (não foi

possível entender), porque, realmente, o caso é complicado, ele

tá dizendo “0 caso Tayná, um monstro, saiu até no Jornal

Nacional”. E Colombo está de luto, né, gente.

Iverson Vaz: Com toda a certeza. Quem perde é a nossa

população, porque a gente fica manchado, né. Colombo sai

estampado em todos os jornais, de uma forma negativa. Agora,

há de se ressaltar, também, viu, Samuel Rocha, o trabalho

fantástico do Dr. Si Ivan. 0 Dr.... 0 Delegado, aqui, do Alto

Maracanã, que ele, com aquele faro policial dele, com toda a

experiência, ele foi até o parque falando, não, os caras são

suspeitos. Levou imediatamente para a delegacia, e começou a

interrogá-los. Aí. naquela de interrogar, o Delegado, que é

não, esses caras têm culpa no

cartório”. Começou a dar uma prensa daaui. uma prensa de

lá. os caras não aguentaram e confessaram o crime, viu.

Então tem que tira r o chapéu pro nosso delegado que tá

fazendo um papel brilhante, aaui em Colombo, viu.

macaco velho falou.

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Samuel Rocha: É verdade. Mais mensagens chegando sobre

caso, você também participa com a gente, 97672311. Coloca um

pouquinho aí, Ariel, o 97672311, que, de repente você que está

assistindo a gente pela primeira vez também, ou não decorou o

número, e vamos ter o sorteio do DVD daqui a pouco, tá bom? 0

Kevin tá dizendo o seguinte, a opinião do Kevin, com relação a

esse caso aí [inicia a leitura no computador] “Samuel, um

monstro pedindo desculpas é muito cara de pau. Vagabundo.

E ele falou aue pode bater nele, mas não para matar. Ele

tinha aue mandar eles lá no presídio e fa la r ora todos os

presos o aue eles fizeram ”. Mas é o que eles falam, já chega,

na ficha, já recomendado “ó, tá chegando uma mulherzinha pra

vocês a í”, não é verdade Iverson?

Iverson Vaz: É bem isso, é bem isso. Tanto é que eu falo na

m atéria. Os caras vão raspar a sobrancelha dele, vão colocar

um batonzinho nele, uma carcinha vermelha.

Samuel Rocha: Coloca até a imagem dele aí, Ariel. Um deles aí,

pra gente ver como ficaria...

Iverson Vaz: O que você fez com ela, eles vão fazer com você.

Pena que não vão te m atar, entendeu? Poraue eu também sou

a favor da oena de morte, sim.

Samuel Rocha: Pelo menos não tem gasto ora gente pagar, né?

Não vai ficar lá. vivendo às nossas custas.

[A tela fica dividida entre o estúdio do programa e as imagens

das entrevistas dos supostos criminosos]

Iverson Vaz: Você não tem que ficar mantendo vagabundo,

porque cara dessa, aí, olha, desculpa. Eu acho que não há

religião, eu acho que não há quem recupere.

Samuel Rocha: Olha só. a cara do monstro, frisa aí. Ariel.

frisa a í f referindo-se à imagem de Paulo Henriaue Cunhal

Iverson Vaz: Como é que vai recuperar um cara desse aí, ó? Não

tem como. Cara frio, calculista, sabe? Pegou, estuprou a

menina, primeiro quando ela tava viva. Depois que a menina

esse

Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3 2 1 9 -8 7 0 0 - Fax (0xx41) 3219-8892

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M inistério P úblico F ederalP i o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

tinha morrido, o cara volta lá e estupra de novo. Aí, “não, vou

ocultar o cadáver”. Pega, e joga dentro do poço. Sabe? São

coisas assim inadmissíveis, minha gente. Que se a gente passar

a mão na cabeca... sabe? E a í nós vamos entrar naquela, tem

que rasgar a Constituição, fazer uma nova Constituição,

ooraue os advogados encontram brechas na lei, e a í acabam

retirando um lixo desses da cadeia, aue volta ora sociedade,

volta a cometer crimes. Aliás, tem até um aqui ó, que o

Delegado me passou que já tem passagem pela Polícia por

[arquivo:

3_TV_Colombo_Boa_Noite_Colombo_esta_de_luto.mp4 - 19:47-

23:07].*

tambémassassinatoestupro e

Os termos usados por Iverson Vaz ao se referir às garantias e

direitos fundarr entais foram exatamente esses: rasgar a Constituição. Segundo

o apresentador os Direitos Humanos e Fundamentais servem somente aos

advogados que se valem de “brechas” legais. Sem mencionar o intenso apoio à

violência e arbi rariedade policial.

Também merece destaque os diálogos com a espectadora

Margarete

Boa_Noite_Colombo_esta_de_luto.mp4 - 25:55-29:08]:

identificada [arquivo:como

3 TV Colombo

Samuel Rocha: O Estado vai manter, vai bancar eles na cadeia,

agora, né? Vai ter alimentação, né, pouso, não vai trabalhar.

Vamo atender, você que participa aí com a gente pra dar a sua

opinião no ar. Olá, boa noite.

Participante por telefone (Margarete): Boa noite, Samuel.

Samuel Rocha: Boa noite, quem tá falando?

Participante por telefone (Margarete): É Margarete, de (não

foi possível compreender).Rua V arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

Fone (0xx41)3219-8700 - F ax (0 x x 4 1 )3219-889244

M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

Samuel Rocha: Você que está nos assistindo aí, que notícia

triste, hein, Margarete? Você é mãe?

Participante por telefone (Margarete): Sim, tenho dois filhos.

Samuel, na minha opinião, tinha aue pegar esses caras, e ir

batendo neles, e m atar eles aos pouquinhos. Porque no... O

aue ele fez... Não tem esse negócio de desculpa, não tem

explicação pra isso. E pegar uma faca aue não tenha fio, e

cortar o saco deles assim, ó.

[Samuel começa a rir, assim como a participante por telefone].

Samuel Rocha: Mas é verdade, a gente fica revoltado, né.

Margarete, então, tem aue cortar mesmo. Na verdade ele vai

virar mulherzinha na cadeia iá. A gente até brinca com uma

situação dessas, ta l, mas ele vai v irar mulherzinha na

cadeia. Praticamente é isso mesmo aue vai acontecer né.

Participante por telefone (Margarete): É, tem que largar eles

pra população fazer isso aí.

Samuel Rocha: A í não dá ooraue daí a população iá m ata de

uma vez. Ele tem aue morrer uma morte lenta, né.

Margarete?

Participante por telefone (Margarete): É. tem que ser

lentamente. Arrancando uma unha... Arrancando a outra...

Espetando de um lado, deoois do outro. Poraue. nossa, isso

daí foi muito triste.

Samuel Rocha: Você é mãe, também, Margarete?

Participante por telefone (Margarete): Eu sou.

Iverson Vaz: Ela tem dois filhos.

Samuel Rocha: Dois filhos?

Iverson Vaz: Que idade tem teus filhos, Margarete?

Participante por telefone (Margarete): Meu filho tem... 0 mais

velho tem 23 anos. E o outro tem 20.

Iverson Vaz: É, a gente que é pai, a gente que é mãe e se

depara com uma situação dessa, viu, Margarete. É...Você, passa

um film e pela tua cabeça. Porque, aí vem toda aquela situação

Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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M in is t é r io P ú b l ic o F e d e r a l(CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁPr

do teu filho pequenininho, você dando amor, dando carinho. Aí

você acompanhando o crescimento da sua criança, do seu filho.

Aí você sempre dando dicas, né, de segurança pro teu filho, né.

“Ó filho, cuidado com a internet, cuidado com o Facebook... Ó,

quando você for atravessar a rua, olhe pros dois lados. Se

alguém for te oferecer bala, não aceite bala de estranhos”. Você

passa um filme na cabeça. Aí vem um vagabundo desse aí, sabe?

E acaba cometendo uma atrocidade dessa? Realmente, tem que

ter pena de morte, sim. Nesse caso, que eles são réus confessos.

Samuel Rocha: Confessos.

Iverson Vaz: Entendeu? Tem que ter pena de morte. 0 que nós

não podemos fazer é injustiça, né? Porque tem muita gente,

também, que tá preso indevidamente. Aí o povo “não, pena de

morte pra todos os bandidos”, não é assim, minha gente.

Samuel Rocha: Cada caso é um caso, né?

Iverson Vaz: Agora, o cara é réu confesso. Confessou que,

realmente, ele estuprou, violentou, e um crime hediondo

desse aí... Tem mais aue ir oro colo do caoeta mesmo.

Samuel Rocha: E o que que você acha, Margarete, esse pedido

de desculpa dele, inclusive friamente, né? Tá ali, sangue frio “É,

eu peço desculpa”.

[Divide-se a tela entre os estúdios do programa e a reportagem

na qual Paulo Henrique Camargo da Silva pede desculpa]

Participante por telefone (Margarete): É. mas é aquilo.

Matam estupram, e depois “ai. você me desculpa”. Não tem

esse negócio de desculpa, não. Tem aue ter oena de morte.

mesmo.*

Como bem se observa nos diálogos, não se trata, em

momento algum de um programa informativo, mas apenas em um instrumento

de disseminaçãc de ódio e instigação à violência. Os apresentadores Samuel

R ua Mi rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41)3219-8700 - Fax (0 xx41)3219-8892

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M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

Rocha e Iverson Vaz inclusive colaboram com a assídua espectadora que sugere

inúmeros métodos de tortura, castração e extermínio. Por óbvio que este

programa está longe de ser feito à “família Colombense”.

Conforme o programa avançava, foi exibida uma matéria na

qual foi mostrado, sem qualquer tratamento de imagem, o cadáver de Tayná da

Silva sendo retirado de um poço. Isto é, sem qualquer pudor, exibiram o corpo

de uma menina de 14 (catorze) anos ao vivo na televisão [arquivo:

3_TV_Colombo_Boa_Noite_Colombo_esta_de_luto.mp4 - 17:16-18:51].

Samuel Rocha: E a gente vai mostra agora... Eu nem sei, tá

pronto aí, produção? Tá pronto, vamo mostrar um trechinho

então, essa imagem. 0 momento eu acho que é o momento mais

triste essas imagens aí. Pode colocar no ar.

[Aparece vídeo do momento em que o corpo de Tayná é

encontrado, com a legenda “Caso Tayná: vídeo o momento em

que policiais e cidadãos encontram o corpo da adolescente”]. Vozes se confundindo: sai, sai, sai daí galera. Lá atrás. Ô licença

aí pessoal, licença.[Encontram o corpo dentro de um poço, mostrado na câmera] Narrador da filmagem: Nesse momento, foi localizado o corpo

da peauena Tavná. de 14 anos. Num local totalmente diferente

daquilo aue nós estivemos fazendo as buscas. Depois de

intenso trabalho da Polícia Militar. Polícia Civil. Corpo de

Bombeiros, com a aiuda da população... Com a ajuda da

população, mostro nesse momento, o coroo da pequena Tayná,

de 14 anos. Joeado dentro de uma fossa. É isso aí, JP, da Rádio

Mais, nós estamos aqui, na cidade de Colombo, no bairro São

Dimas, aonde nesse momento foi localizado o corpo da pequena

Tayná, com ajuda da população, que buscou o corpo durante

todo o dia. Hoje, graças a Deus, foi encontrado o corpo da

pequena Tayná.*Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889247

R®P

M in is t é r io P ú b l ic o F e d e r a lP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

[Volta a imagem para os apresentadores do programa]

Os apresentadores Iverson Vaz e Samuel Rocha

demonstraram [ ossuir muita frieza e crueldade. Entender como algo natural e

necessária a e: ibição de cadáveres de adolescentes e discutir métodos de

tortura na televisão somente pode ser visto como total desconsideração pela

vida humana.

Assim, crê-se que não são necessárias maiores

das frontais violações aos direitos e garantias fundamentais

)S pretensos jornalistas em seus programas de televisão.

demonstrações

perpetradas pel

F) DA CONDITA DO GRUPO GRPCOM. PROGRAMA PARANÁTV E JORNAL

TRIBUNA DO PA IANÁ.

0 programa PARANÁTV talvez seja, hodiernamente, o

de notícias do Estado do Paraná. É exibido diariamente, de

o, em duas edições diárias, uma no horário do almoço (perto do

a no horário da tarde (por volta das 19 h)5. A sua transmissão se

Paranaense, empresa do grupo GRPCOM, afiliada da Rede Globo

principal canal

segunda asábac

meio-dia) e out

dá pela RFC TV

de Televisão em Curitiba.

Na época em que foi divulgada a morte de Tayná Adriane da

Silva, o prograr ia foi exibido, ao vivo, em sua edição diurna, dos estúdios em

Curitiba e direiamente de Colombo, onde se encontrava a repórter Karine

Garcia. As des :rições do caso não foram tão abertas como os programas

5 Grade<http://redeglAbo.globo.com/rpc/programacao.httTil>. Acesso em: 22 out. 2015.

da RPCTV. Disponívelc; programaçao em:

irechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3 2 19-8892

Rua M

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M inistério P úblico F ederalP rocura d oria d a R epú blica n o E stado do Pa ran á

anteriormente descritos, contudo, também desconsiderou-se

presumida dos quatro acusados.a inocência

De início, a repórter Karina Garcia, após ser interpelada

pela âncora Thays Beleze, considera os quatro suspeitos como culpados pela

morte da menina. A fala da jornalista não se distancia muito das violações

cometidas pelos outros programas. Conforme as perguntas são feitas no estúdio,

Karine Garcia usa termos como “os quatro bandidos” , sem mencionar outros

momentos em que a repórter descreve que “eles mataram” , “eles

estupraram” , passando, continuamente, ao espectador a figura de Sérgio

Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique Camargo Cunha e

Ezequiel Batista como culpados.

Novamente, a repetição do discurso condenatório é crucial

à formação da opinião do espectador. Considerando que o grupo GRPCOM se

constitui, hoje, num dos maiores grupos de mídia do país, forçoso se faz exigir

de seus profissionais uma postura prudente e ética na descrição dos fatos. Em

momento algum, durante as transmissões, foi ressaltado que os sujeitos sequer

haviam sido condenados, que eram presumivelmente inocentes. Tampouco

foram dadas informações sobre os procedimentos a serem adotados pelos órgãos

da Justiça.

0 que se observa nas gravações são dados seletivos, como

se tivessem sido preparados com o único propósito de alçar os indivíduos

apontados pela polícia como indesejáveis e merecedores de punição. Porém,

repita-se, nenhum deles foi sequer julgado. Ao contrário, existem até indícios de

que tenham sido torturados pela polícia.

A conduta da emissora, oportuno dizer, destoa dos

propósitos por ela estampados como sua responsabilidade: Compromisso com o

ser humano.Rua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR — CEP 80060-010

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889249

IBS M lMinistério P úblico F ederal

P ri -curadoria da R epú blica no E stado do Paraná

A partir das declarações da repórter Karine Garcia, fica

nítida a desc msideração total com as premissas mínimas garantidas

constitucionalmente [arquivo: 1 _RPC_TV_Garota de 14 anos é estuprada e morta

por 4 criminosos no Pa.mp4 - 00:45-01:56]:

Repórter Karine Garcia: Exatamente. Olá Thays, olha, os

quatro bandidos foram presos ontem pela Polícia, nesse

momento, eles estão na Delegacia do Alto Maracanã, aqui em

Colombo, que fica na Região Metropolitana de Curitiba. Os

quatro bandidos tem entre 22 e 25 anos. Hoje, eles

confessaram que estupraram e, depois, mataram Tayná da Silva,

de 14 anos. [Começam a passar, em “slide show”, fotos da

adolescente] Segundo informações do Delegado responsável

pelas investigações, um dos bandidos disse que teria começado

o crime, mas depois desistiu, ou seja, ele falou que pegou a

menina, mas, depois teria desistido de estuprá-la. Esses auatro

rapazes, esses quatro bandidos trabalhavam em um parque

de diversões aue fica perto da casa da Tavná. Relembrando

um pouquinho o caso, Tayná da Silva, de 14 anos, desapareceu

na última terça-feira à noite, por volta das 08h30 da noite,

quando voltava para casa, e, ontem, como vocês podem ver

nessas imagens, a população, enfim, os vizinhos, revoltados,

foram até o parque de diversões [aparecem no vídeo imagens

que retratam a movimentação que houve no local e os

brinquedos do parque de diversões, destruídos e em chamas] nos

locais e colocaram fogo nos brinquedos, teve muito quebra-

quebra, a polícia, também o corpo de bombeiros foram

chamados. Hoje pela manha, conversamos com a mãe da Tayná,

quando ela ainda não sabia, ou seja, quando a Polícia ainda não

havia divulgado que os bandidos tinham confessado o crime.

Vamos ouvir o que ela disse,

[ . . . ]

rechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

Rua Mi

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M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

Repórter Karine Garcia: Bom, por enquanto os bandidos, os

quatro bandidos, que confessaram esse crime, continuam

presos aqui na Delegacia do Alto Maracanã, em Colombo, mas

segundo o delegado responsável pelas investigações, eles serão

transferidos, em breve, para Curitiba, né Thays, um crime

absurdo, dificil de acreditar, a população aqui da cidade de

Colombo, uma cidade pequena aqui da Região Metropolitana de

Curitiba, está chocada, está assustada. E a gente, claro, é um

crime, uma história que a gente não gostaria de noticiar

[arquivo: 1_RPC_TV_Garota de 14 anos é estuprada e morta por 4

criminosos no Pa.mp4 - 04:47-05:12].[ . . . ]

Apresentadora Thays: É verdade, Karine, obrigada pelas

informações. E os moradores têm razão, né Karine, de estarem

assustados e revoltados com a situação. Uma adolescente de 14

anos, né, a mãe esperando que ela chegasse em casa, e não

conseguiu chegar [arquivo: 1_RPC_TV_Garota de 14 anos é

estuprada e morta por 4 criminosos no Pa.mp4 - 05:13-05:27].*

Cabe ainda destacar que as violações à presunção de

inocência e à dignidade humana não ficaram restritas ao programa PARANÁTV,

mas também foram veiculadas pelo grupo em mídia escrita, especificamente no

jornal Tribuna do Paraná.

A manchete do jornal, no dia 29 de junho de 2013, dizia:

PERVERSOS E COVARDES. Abaixo da frase, encontrava-se a foto de Sérgio

Amorim da Silva Filho, Adriano Batista, Paulo Henrique Camargo Cunha e

Ezequiel Batista dispostos diante do “painel” da Polícia Civil do Paraná.

Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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Ministério P úblico F ederalP r c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

Desta feita, justificada a presença da Sociedade Rádio

Emissora Paranc ense S/A no polo passivo desta demanda.

G) DA CONDUTA DA REDE GLOBO DE TELEVISÃO. PROGRAMA JORNAL HOJE.

0 programa Jornal Hoje é exibido na TV Globo, em rede

nacional de tele dsão. A sua transmissão ocorre após a programação local de suas

afiliadas e emissoras locais, por volta das 13 h. No contexto do caso Tayná, a

emissora apenas repetiu os erros cometidos durante a programação de sua

afiliada no Estai o do Paraná, a RPC TV.

0 folhetim foi transmitido em dois lugares, na redação do

telejornal, e d retamente de Colombo, Paraná, por meio da repórter Karine

Garcia, da RPi! TV. Entretanto, antes de anunciar a repórter Karine, a

apresentadora gandra Annenberg inicia afirmando, sem nenhuma prudência,

que Tavná foi norta e estuprada pelos quatro suspeitos. Isso ao vivo, para

todo o Brasil, n ) meio da transmissão do telejornal da maior emissora do país,

que alcança que se a totalidade dos televisores ligados no território nacional.

Sandra Annenberg iniciou a cobertura sobre o caso dizendo

[arquivo:2_Glob3_Jornal_Hoje_Adolescente_estuprada_e_morta_por_funcionário

s.mp4 - 00:00-0 1:19]:

Apresentadora Sandra Annenberg (âncora): Uma adolescente

de catorze anos foi estuprada e morta por quatro funcionários

de um parque de diversão da Recião Metropolitana de

Curitiba. Um grupo de moradores invadiu o parque, queimou e

depredou os brinquedos. Vamos conversar, então, com Karine

Garcia [vira-se para o video, em que aparece a matéria fe ita naRua M irechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889252

M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

região de Colombo], que está acompanhando tudo. Karine, boa

tarde para você, os suspeitos iá estão presos?*

Não bastasse o grande alarma causado pela emissora

afiliada, a TV Globo fez questão de ampliá-lo a todo país, imputando, de modo

sensacionalista, aos quatro suspeitos uma conduta pela qual sequer haviam sido

julgados, menos ainda, sequer haviam sido formalmente acusados.

A postura adotada pelo programa, quando analisada, sequer

se coaduna com os princípios editoriais do Grupo Globo, especificamente no que

se refere à conduta dos jornalistas, dentre eles:

Nenhum veículo do Grupo Globo fa rá uso de sensacionalismo,

a deformação da realidade de modo a causar escândalo e

explorar sentimentos e emoções com o objetivo de a tra ir

uma audiência maior. 0 bom jornalismo é incompatível com tal

prática. Algo distinto, e legítimo, é um jornalismo popular, mais

coloquial, às vezes com um toque de humor, mas sem ab rir mão

de informar corretamente6.

É inegável a influência que a TV Globo exerce sobre a

opinião dos brasileiros, justamente por isso deveria agir com muito mais cautela

que qualquer outro meio de comunicação. Não se trata de exigir uma obrigação

maior do que a prevista em lei. A questão, na realidade, trata-se de um dever

moral da emissora, que tem pleno conhecimento do seu poder de influir na

opinião pública. Não há como se admitir a violação de garantias fundamentais

por parte da emissora de uma forma tão clara.

Disponível<http://grupogLobo.gLobo.com/como jornalista deve proceder diante do publico.php>.Acesso em: 22 out. 2015________________________________________ _________________ _

Rua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

Globo.do GrupoEditoriais6 Princípios em:

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M inistério P úblico F ederalP r )Cu r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

São por esses motivos que a Rede Globo de Televisão

também se féz presente nesta ação, pois também contribuiu para a

superexposição dos quatro sujeitos, bem como agiu no intuito de vilipendiar a

inocência presumida de todos eles.

H) DA CONDUl \ DA UNIÃO E DA ANATEL. ENTE CONCEDENTE DO SERVIÇO

PÚBLICO DE RA JIOFUSÃO DE SONS E IMAGENS.

A União, como dito alhures, descumpriu o seu dever de

fiscalizar o ser/iço de radiofusão de sons e imagens. Não é porque houve a

concessão do n esmo às emissoras elencadas na peça vestibular, que a União

perdeu a titula idade do serviço e tampouco desobrigou-se de zelar pelo seu

efetivo respeito às normas constitucionais e legais.

Neste ponto, é cabível o transporte na íntegra das razões

apresentadas pira justificar a presença da União e da Agência Nacional de

Telecomunicaçõ ss no polo passivo da lide.

I) DA RESPONSa BILIDADE DO ESTADO DO PARANÁ. ATOS LESIVOS PRATICADOS

POR SEUS AGENTES.

O Estado do Paraná, como já descrito, foi peça-chave no

desenrolar dos atos. Com a conduta precipitada e ilegal dos agentes da Polícia

Civil, resumida na cessão de informações precipitadas e não apuradas, os

grupos de comu ticação do Estado e do Brasil passaram a destacar amplamente a

imagem dos sus íeitos, como se condenados fossem.

Rua IV arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41)3219-8700 - Fax (0xx41)3219-8892

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A propósito, a própria Polícia Civil do Paraná divulgou nota

por meio da qual referia-se a Sérgio Amorim da Silva Filho, Adriano Batista,

Paulo Henrique Camargo Cunha e Ezequiel Batista como criminosos e

marginais. Ainda, junto com a nota, a informação também continha uma galeria

de fotos, permitindo a qualquer pessoa o acesso à imagem dos presos

cautelares. Ou seja, não bastasse o completo desrespeito à presunção de

inocência e do direito à não-autoincriminação. o Estado também fez questão

de violar o direito de imagem dos quatro indivíduos.

Da mesma forma como referido acerca da conduta da

União, aqui também cabe o transporte integral das razões exaradas em relação à

legitimidade passivo do Estado do Paraná.

7. DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.

A) DO ATAQUE À DIGNIDADE HUMANA. ULTRAPASSAGEM DOS LIMITES DA

LIBERDADE DE EXPRESSÃO E IMPRENSA. IMPOSSIBILIDADE DE COMPACTUAR

COM A INCITAÇÃO AO ÓDIO E A VIOLÊNCIA.

Não há que se falar em legítimo exercício da liberdade de

expressão no presente caso. A liberdade de expressão, não obstante ser um

direito fundamental previsto na Carta Magna, não se afirma quando utilizado

como meio de ataque à dignidade humana. A cláusula de livre expressão do

pensamento não se presta a absolver o interlocutor das devidas

responsabilizações.

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Toda expressão de pensamento, desde que sincera e não

violenta, mere< e o devido respeito e acato. Porém, é de se ressaltar a

importância de que seja sincera e, sobretudo, não violenta.

A liberdade de expressão, como trazida no artigo 5o, inciso

IX, da Constitui :ão da República de 1988, veio no intuito de assegurar a todos,

a liberdade de manifestação do pensamento, sem o risco de

sofrer qualquer tipo de censura prévia. Note-se que tal preceito constitucional

veio após mais de duas décadas do regime autoritário que se instalou no país

entre os anos de 1964 a 1988.

indistintamente

Todavia, a liberdade de expressão não tem por objetivo

atuar como cláusula absolutória de todas as formas de violência verbal.

Assim como qualquer outro direito fundamental, a

liberdade de expressão também sofre limites, não sendo um preceito absoluto

em detrimento dos demais. A partir do momento em que a expressão do

pensamento a$ e como instrumento de violência e ódio, chocando-se

diretamente co n os ditames da dignidade humana, a imposição de limites ao

autor da narrat va é medida que se impõe, sob pena de se proteger e fomentar

atos antijurídia s.

Nas lições de Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires

Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco7, sobre o choque entre liberdade de

expressão e digi ndade humana:

“[—] Há o desrespeito ao princípio, auando a pessoa é

tratada como obieto , como meio para satisfação de alQum

interesse imediato. 0 ser humano não pode ser exposto -

7 Curso de D ireito Com :itudona l. 5 ed. São Pauto: Saraiva, 2010. p, 467,

Rua M irechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

máxime contra sua vontade - à mera curiosidade de terceiros,

para satisfazer instintos primários, nem pode ser apresentado

como instrumento de divertimento alheio, com vistas a

preencher o tempo de ócio de certo público. Em casos assim,

não haverá exercício lenítimo da liberdade de expressão"

(destaquei).

Sob outro aspecto, pertinentes as assertivas de Luís Roberto

Barroso8:

A dignidade como valor comunitário enfatiza, portanto. o

papel do Estado e da comunidade no estabelecimento de

metas coletivas e restrições sobre direitos e liberdades

individuais em nome de certa concepção de vida boa [...]. 0

valor comunitário, como uma restrição sobre a autonomia

pessoal, busca sua legitimidade na realização de três objetivos:

1. A proteção dos direitos e da dignidade de terceiros; 2. A

proteção dos direitos e da dignidade do próprio indivíduo; e 3. A

proteção dos valores sociais compartilhados (destaquei).

É de se concluir, então, que a Constituição da República de

1988 permite a livre manifestação do pensamento. Contudo, ao fazer isso, não

tinha como intuito fomentar atos persecutórios dirigidos a determinadas

pessoas. Tampouco se constituiu como missão do constituinte permitir a

exploração exacerbada e doentia da barbárie e da tragédia humana.

8 A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: a construção de um conceito jurídico à luz

da jurisprudência mundial. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 88_______________________________________________Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889257

M inistério P úblico F ederalP r ic u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

0 postulado da dignidade humana não deve ser visto

como uma cart, i de boas intenções. Muito menos deve ter aplicação seletiva,

tendo eficácia s omente a determinadas pessoas ao passo que exclui outras.

O Processo Penal move-se consubstanciado por um imenso

rol de garantias justamente em virtude do seu caráter aflitivo. 0 mais simplório

ato de persecui :ão penal é capaz de gerar no indivíduo a mais alta carga de

agonia e angus ia. Não é para menos que a Constituição Federal é rica em

apresentar diversos princípios limitadores à arbitrariedade do Poder Punitivo

Estatal. Aliás, podemos afirmar que um Estado será mais Democrático quanto

maiores forem es garantias contempladas pelo Processo Penal.

A exposição do indivíduo processado, sem sua autorização e

tampouco acom ranhado de um defensor, levando-o às telas de televisão do país

todo, passa lorge da dignidade humana. Tanto a conduta do Estado como a

conduta dos grjpos de mídia em nada acrescentam à proteção dos direitos

humanos. Ao co ítrário, revestem-se como verdadeiros desserviços à sociedade.

Sobre o direito de defesa como expressão do postulado da

dignidade humana, já se manifestou o Supremo Tribunal Federal, no

julgamento do HC 89.176-4/PR, in verbis:

0 direito de defesa constitui pedra anaular do sistema de

proteção dos direitos individuais e m aterializa uma das

expressões do princípio da dignidade da pessoa humana.

Como se sabe, na sua acepção originária, este princípio proíbe a

utilização ou transformação do homem em objeto dos processos

e ações estatais. 0 Estado está vinculado ao dever de respeito

e proteção do indivíduo contra exposição a ofensas ou

humilhações. A propósito, em comentários ao art. 1o da

Constituição alemã, afirma Günther Dürig que a submissão doRua V arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889258

M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

homem a um processo judicial indefinido e sua degradação

como objeto do processo estatal atenta contra o princípio da

proteção judicial efetiva ( “rechtlichen Gehõr”) e fere o

princípio da dignidade humana [ “Eine Auslieferung des

Menschen an ein staatliches Verfahren und eine Degradierung

zum Objekt dieses Verfahrens ware die Verweigerung des

rechtlichen Gehõrs."] (MAUNZ-DÜRIG, Grundgesetz Kommentar,

Band I, München, Verlag C.H.Beck, 1990, 11 18). (destaquei)

(STF - HC 89.176, Rei. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 22-8­2006, Segunda Turma, DJ de 22-9-2006.)

Na hipótese aqui tratada, é possível vislumbrar frontal

violação ao postulado da dignidade humana. Seja por parte dos entes estatais

que compõem o polo passivo desta demanda, seja pelos grupos de mídia também

elencados.

B) DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. NÃO CULPABILIDADE. MATRIZ

CONSTITUCIONAL.

Do postulado da dignidade humana também decorre o

princípio da não culpabilidade, ou, em termo mais diretos, o princípio da

presunção de inocência. A Constituição Federal, em seu artigo 5o, inciso LVII,

deixa claro que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de

sentença penal condenatória.

Os programas policiais e noticiários apontados nesta ação

coletiva foram ricos em desrespeitar tal presunção. Antes de qualquer juízo, ou

até mesmo instrução, a fim de elucidar minimamente os fatos, os órgãos de

Rua M arechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

59

Ministério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

apoio crucial dos órgãos do Estado, transmitiram a imagem dos

o se culpados fossem.

imprensa, com c

investigados con

As emissoras e jornais não apontaram Sérgio Amorim,

Paulo Henrique e Ezequiel Batista como suspeitos, mas sim

autores do crime - estupro e morte de Tayná.

Adriano Batista

como bandidos,

A partir dessa profusão de imagens catastróficas aliadas às

interpretações teatrais dos apresentadores dos programas, dificilmente a figura

dos alvos desse discurso sairá ilesa, tampouco será restabelecida num futuro

qualquer. A en> urrada de desprezos, escárnios e rebaixamentos dirigidos aos

investigados tor ia quase impossível a restauração posterior das suas imagens.

Mesmo após eventual comprovação da inocência dos

investigados, j i houve a perpetração do dano, visto que o jornalismo

irresponsável fomenta as manifestações populares a favor do combate ao

inimigo, do lincl lamento e do extermínio. Isso sem falar a respeito da questão do

incentivo à viol ?ncia policial, à medida que coroam os atos ilegais dos agentes

policiais como se fossem efetivos e favoráveis aos cidadãos. Lembre-se,

novamente, qu< existem indícios de que os quatro investigados do Caso Tayná

foram torturado;.

A história recente da imprensa brasileira é repleta de

exemplos de da ios irreparáveis causados pela precipitação comunicativa. Vide o

caso da escola > fe base, em São Paulo.

É inegável que a transmissão diária da imagem dos quatro

suspeitos já cobcou sua defesa em patamar inferior à acusação, prejudicando-

lhes completanr ente. Ainda, cite-se que eventual julgamento dos réus se daria

pelo Tribunal do Júri, por se tratar de crime doloso contra a vida. Assim, cabe

indagar: como s? daria a apreciação dos jurados no caso?Rua M irechal Deodoro, 933 Centro — Curitiba/PR — CEP 80060-010

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889260

M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

A esse ponto, transcreve-se trecho do HC 91.952/SP,

também julgado pelo Supremo Tribunal Federal, tal precedente, a propósito,

foi um dos que fundamentaram a edição da súmula vinculante n. 119, sobre o

uso de algemas.

Em primeiro lugar, levem em conta o princípio da não

culpabilidade. É certo que foi submetida ao veredicto dos

jurados pessoa acusada da prática de crime doloso contra a

vida, mas que merecia o tratamento devido aos humanos, aos

que vivem em um Estado Democrático de Direito. Segundo o

artigo P da Carta Federal, a própria República tem como

fundamento a dignidade da pessoa humana. Da leitura do rol

das garantias constitucionais - artigo 5o depreende-se a

preocupação em resguardar a figura do preso. A ele é assegurado

o respeito à integridade física e moral - inciso XLIX. Versa o inciso

LXI, como regra, que 'ninguém será preso senão em flagrante

delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade

judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou

crime propriamente militar, definidos em lei’.[...]

Ora, estes preceitos - a configurarem garantias dos brasileiros e

dos estrangeiros residentes no país - repousam no inafastável tratamento humanitário do cidadão, na necessidade de lhe ser preservada a dignidade. Manter o acusado em audiência, com

algema, sem que demonstrada, ante práticas anteriores, a

periculosidade, significa colocar a defesa, antecipadamente, em patamar inferior, não bastasse a situação de todo

degradante. 0 julgamento no Júri é procedido por pessoas

9 “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”.

Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

61

Ministério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA RjEPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

leigas, que tiram as mais variadas ilações do quadro verificado. A permanência do réu algemado indica, à primeira visão, cuidar-se de criminoso da mais alta periculosidade,

desequilibrando o julgamento a ocorrer, ficando os jurados

sugestionados. (STF - HC 91952, Relator(a): Min. MARCO

AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 07/08/2008, DJe-241

DIVULG 18-12-2008 PUBLIC 19-12-2008 EMENT VOL-02346-04 PP-

00850 RTJ VOL-00208-01 PP-00257)

Ressalte-se, nesse ponto, que todos os investigados

apareciam alge nados nas imagens.

é inegável a afronta ao principio da não

culpabilidade pAr parte da polícia, ao divulgar a malfadada nota oficial sobre a

prisão, bem cc mo por parte da imprensa, ao explorar de forma doentia a

angustia da fam lia da vítima e a execração dos quatro investigados.

Portanto

C) DA LIBERD/DE DE IMPRENSA. DA RESPONSABILIDADE DECORRENTE DOS

DANOS CAUSAC OS À HONRA. DA VIOLAÇÃO DA IMAGEM. DA NECESSIDADE DE

HARMONIZAÇÃO COM OS DEMAIS DIREITOS CONSTITUCIONAIS.

A liberdade de imprensa, uma das formas mais comuns da

liberdade de e: pressão, veio consagrada pelo Constituinte, permitindo a livre

manifestação d d pensamento e das ideias. Contudo, esta liberdade não pode

ser vista de m >do absoluto. Sua interpretação deve ser decorrência de todo o

sistema de prot ?ção constitucional.

Rua Iv arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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0*1

M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o Pa r a n á

A pretensão constitucional sempre foi impedir a censura

prévia, buscando afastar, para todo o sempre, os tempos obscuros que

mancharam a recente história do Brasil, especialmente durante o regime de

exceção que se instalou no país em 1964. 0 Texto Maior prevê, expressamente,

no artigo 220, caput, que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão

e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão nenhuma

restrição, observada a harmonia do sistema constitucional - tanto que o § 1o do

mesmo artigo remete o aplicador da lei ao artigo 5o, incisos IV, V, X, XIII e XIV, da

CF de 1988.

Ou seja, todo acontecimento é passível de divulgação e

toda ideia é defensável. Entretanto, tal premissa não pode ser vista de maneira

incondicional.

0 que se fomenta é a livre expressão do pensamento, a

construção do conhecimento por meio do debate e da crítica. A norma

constitucional tem por escopo incentivar a pluralidade do pensamento, o choque

sadio entre as mais diversas vertentes do saber e, sobretudo, a reflexão.

Todavia, não é isso que se vê durante a exibição dos

folhetins policiais diários. 0 misto de brutalidade e morbidez, a exploração do

sentimento de perda, o vilipêndio à morte, a criação do inimigo, a incitação ao

show” de imagens chocantes, elementos comuns a tais

programas, não estão, seguramente, amparados pela proteção constitucional.

extermínio e o

Não é por outro motivo que o artigo 221, da CF de 1988,

prevê o seguinte:

Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e

televisão atenderão aos seguintes princípios:

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63

M inistério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

/ - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais

e informativas;

II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à

produção independente que objetive sua divulgação;

III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística,

conforme percentuais estabelecidos em lei;

IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da

fam ília.

É fácil de notar que os programas elencados nesta demanda

não se aproximam dos postulados estabelecidos pelo constituinte. Tampouco se

vislumbram fir alidades educativas, culturais, artísticas e muito menos

informativas.

Note-se, portanto, a preocupação da norma constitucional,

pedimento de censura prévia, em obstaculizar o abuso do direito

preocupação com o impedimento da execração pública.

para além do irr

de expressão, a

0 seguinte aresto da Corte Suprema, no julgamento da

ADPF 130/DF, cemonstra bem essa temática:

[...] Não estamos a ajuizar senão isto: a cabeça do art. 220 da

Constituição veda qualquer cerceio ou restrição à concreta

manifestação do pensamento, bem assim todo cerceio ou

restrição que tenha por objeto a criação, a expressão e a

informação, pouco importando a forma, o processo, ou o

veículo de comunicação social. Isto é certo. Impossível negá-

lo. Mas o exercício de tais liberdades não implica uma fuga

do dever de observar todos os incisos igualmente

constitucionais que citamos no tópico anterior, relacionados

R ua Iv a recha l D e o d o ro , 933 C e n tro — C u r it ib a /P R - C E P 8 00 6 0 -01 0Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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0*1

M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

com a liberdade mesma de imprensa (a começar pela

proibição do anonimato e terminando com a proteção do

sigilo da fonte de informação). Uma coisa a não excluir a

outra, tal como se dá até mesmo quando o gozo dos direitos

fundamentais à liberdade de pensamento e de expressão da

atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,

além do acesso à informação, acontece ò margem das atividades

e dos órgãos de imprensa (visto que o desfrute de tais direitos é

expressamente qualificado como "livre"). Mas é claro que os

dois blocos de dispositivos constitucionais só podem incidir

mediante calibração temporal ou cronológica: prim eiro,

assegura-se o gozo dos sobredireitos (falemos assim) de

personalidade, que são a manifestação do pensamento, a

criação, a informação, etc., a que se acrescenta aquele de

preservar o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício

da profissão do informante, mais a liberdade de trabalho,

ofício, ou profissão. Somente depois é que se passa a cobrar

do titu la r de tais sobre-situações jurídicas ativas um

eventual desrespeito a direitos constitucionais alheios, ainda

que também densificadores da personalidade humana; ou

seja, como exercer em plenitude o direito à manifestação do

pensamento e de expressão em sentido geral (sobredireitos de

personalidade, reitere-se a afirmativa), sem a possibilidade de

contraditar, censurar, desagradar e até eventualmente chocar,

vexar, denunciar terceiros? Pelo que o termo "observado",

referido pela Constituição no caput e no S 1o do a rt. 220, é

de ser interpretado como proibição de se reduzir a coisa

nenhuma dispositivos igualmente constitucionais, como os

mencionados incisos IV, V, X, XIII e X IV do a rt. 5°. Proibição

de se fa ze r tabula rasa desses preceitos igualmente

constitucionais, porém sem que o receio ou mesmo o temor

do abuso seja impeditivo do pleno uso das liberdades de

manifestação do pensamento e expressão em sentido lato.

Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0 x x 4 1 )3219-8700 - F a x (0 x x 4 1 )3219-8892

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p®Ministério P úblico F ederal

P r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

Sem que o receio ou mesmo o temor do abuso seja impeditivo do

pleno uso das duas categorias de liberdade, acabamos de falar,

porque, para a Constituição, o que não se pode é, por

antecipação, amesquinhar os quadrantes da personalidade

humana quanto aos seguintes dados de sua própria compostura

jurídica: liberdade de manifestação do pensamento e liberdade

de expressão em sentido genérico (aqui embutidos a criação e o

direito de informar, informar-se e ser informado, como

expletivamente consignado pelo art. 37, 1, da Constituição

portuguesa de 1976, "versão 1997"). Caso venha a ocorrer o

deliberado intento de se transmitir apenas em aparência a

informação para, de fa to , ridicularizar o próximo, ou, ainda,

se objetivamente faz-se real um excesso de linguagem tal

que faz o seu autor resvalar para a zona proibida da calúnia,

da difamação, ou da injúria, a í o corretivo se fará pela

exigência do direito de resposta por parte do ofendido, assim

como pela assunção de responsabilidade civil ou penal do

ofensor. [...].

(ADPF 130, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno,

julgado em 30/04/2009, DJe-208 DIVULG 05-11-2009 PUBLIC 06­

11-2009 EMENT VOL-02381-01 PP-00001 RTJ VOL-00213- PP-

00020)

0 sistema adotado, desta feita, para a disciplina dos meios

de comunicação social em nosso país é, de um lado, de respeito à liberdade de

expressão, e, de outro, de responsabilização pelos abusos e ilegalidades

cometidos. Ess; t equação, de raiz democrática, visa afastar mecanismos odiosos

de censura pré ia, mas também quer garantir condições de sanção exemplar pra

os eventuais desrespeitos à legalidade e à Constituição, travestidos de

informações jo nalísticas.

R ua > [a recha l D e o d o ro , 933 C e n tro - C u r it ib a /P R - C E P 8 0 0 6 0 -0 1 0Fone (0xx41) 3219-8700- F a x (0xx41) 3219-8892

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M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

D) DA VIOLAÇÃO ÀS NORMAS DE TELECOMUNICAÇÕES. ABUSO NA LIBERDADE

DE RADIOFUSÃO. FOMENTO À VIOLÊNCIA POLICIAL E À PENA DE MORTE.

A liberdade de radiofusão, ou radiodifusão, nos termos da

não autoriza que se use o meio deLei n. 4.117/62, em seu artigo 53,

comunicação como instrumento de incitação à desobediência das leis, promover

campanha discriminatória ou ofender a moral familiar, pública, ou os bons

costumes. Sem olvidar os vetustos termos utilizados pela lei, tendo em vista sua

promulgação em tempo pretérito, não se pode deixar de considerá-la.

Impende destacar também que artigo 63 da Lei n. 4.117/62

prevê a suspensão da concessão do serviço de radiofusão de sons e imagens em

virtude do abuso da liberdade estabelecida na norma.

Assim, observado que a emissora de televisão ou rádio deu

início ou contribuiu ao alarma social, incitando práticas como linchamentos,

agressões policiais, castrações, pena de morte e a execração pública do

investigado, resta evidente o desrespeito à legislação relativa aos serviços de

telecomunicações, sendo cabível a suspensão do serviço. E mais, constatado a

reiteração da prática, o artigo 64. da Lei n, 4 .117/62. autoriza a cassação

plena da concessão.

Como largamente debatido, os programas aqui elencados

não são recentes no interior das grades de programação das emissoras rés.

Alguns estão no ar há mais de uma década. Obviamente que não é a primeira vez

que as emissoras atacam os direitos fundamentais do cidadão por meio de

reportagens policiais.

0 que se quer, nesse ponto da ação, é demonstrar que as

emissoras de rádio e televisão têm pleno conhecimento de seus deveres.

Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - C uritiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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Ministério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO 0 0 PARANÁ

de informar com qualidade e sem criação de alarmas sociais,dentre os quais

muito menos pr< ijudicando pessoas investigadas pela polícia.

E) DA IMPOSIÇÃ D DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. DAS MEDIDAS DE ABSTENÇÃO.

Como exposto no artigo 3o da Lei n. 7.347/85, a Ação Civil

Pública pode ter por objeto a condenação dos réus à reparação cível ou

obrigação de fa :er ou não fazer. O requerimento de medidas de abstenção não é

incompatível co rt a Ação Coletiva.

0 Superior Tribunal de Justiça já sedimentou entendimento

nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇAO CIVIL

PÚBLICA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. PEDIDO

GENÉRICO. TUTELA COLETIVA. CABIMENTO. 1. A ação coletiva

permite que o pedido mediato seja formulado de forma

genérica. Precedentes do STJ. 2. Ademais, no caso, está

definido no pedido situação em que é perfeitamente possível

delinear como obrigação de não fazer, não havendo fa la r em

generalidade. 3. No tocante ao argumento de que a penalidade

aplicada não está prevista em lei, o insurgente não combate o

fundamento do decisum monocrático, no sentido que tal matéria

não se encontra prequestionada (Súmula 282/STF, aplicada por

analogia), o que impossibilita o conhecimento do recurso quanto

ao ponto. 4. Agravo Regimental parcialmente conhecido e, nessa

parte, não provido. (AgRg nos EDcl no REsp 1408382/PB, Rei.

Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em

04/11/2014, DJe 2 7 /11/20l4)[destaquei].

[arechal D eodoro , 933 C entro — C uritiba/P R — C E P 80060-010 Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

R ua í

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M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

Sendo assim, considerando a gravidade dos fatos narrados

nesta demanda, é prudente impor às emissoras de rádio e televisão que compõe

o polo passivo desta demanda que:

a) abstenham-se de entrevistar investigados em inquéritos

policiais ou processos administrativos, salvo quando autorizados por este e na

presença de seu defensor constituído, seja ele público ou particular;

b) abstenham-se de exibir imagens de brutal violência,

pessoas mortas ou afins entre os horários que compreendem às 7 (sete) e 23

(vinte e três) horas;

c) abstenham-se de utilizar termos como

homicidas”, “monstros” ou qualquer

bandidos”,

“criminosos”, “ladrões”, “estupradores

expressão que indique ou aponte a culpabilidade de indivíduos antes de eventual

sentença penal condenatória com trânsito em julgado;

d) abstenham-se, em todos os horários, de exibir imagens

de cadáveres de crianças e adolescentes, ainda que a imagem seja tratada,

primando-se, assim, pela proteção integral da criança e do adolescente;

e) abstenham-se de proferir qualquer comentário ou

manchete que incite a pena de morte, linchamento, castração ou qualquer outro

tratamento desumano ou degradante em prejuízo de quem quer que seja.

Como amplamente arguido, o objeto desta demanda não

consiste em transformá-la num instrumento de censura. Longe disso. O que se

pretende é fomentar o jornalismo sério, imparcial e condizente aos ditames mais

preciosos do Estado Democrático de Direito. O sensacionalismo e a exploração do

sofrimento, com certeza, não se coadunam com isso. Tanto que não se pretende

Rua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR — CEP 80060-010F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0 x x 4 1 )3219-8892

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Ministério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO EsTADO DO PARANÁ

suspender ou ca >sar as concessões das emissoras, mas adequar sua programação

aos fins elencad )s pelo constituinte no artigo 221 da CF de 1988.

Destarte, requer-se a determinação, por este MM. Juízo,

para que as emí ssoras de rádio e televisão presentes no polo passivo desta ação

cumpram com as medidas de abstenção acima elencadas, sob pena de

cominação de nulta pecuniária por dia em que houver o descumprimento da

decisão.

F) DA OBRIG/ÇÃO DE FAZER DA UNIÃO E DA ANATEL. DO DEVER DE

FISCALIZAÇÃO.

A União, por meio dos entes competentes, tem o dever de

fiscalizar e aplcar sanções às emissoras de rádio e televisão que, porventura,

violem as norrras de telecomunicações. No presente caso, é evidente que tal

obrigação não oi cumprida.

Como se infere dos documentos acostados à inicial, os

programas cita ios nesta ação coletiva ultrapassaram todos os limites do bom

jornalismo e ia informação imparcial e séria. Na disputa acirrada pela

audiência, pron loveram o pré-julgamento dos suspeitos presos no caso Tayná.

A União e seus entes possuem estrutura, capacitação e

pessoas prepar idas para fiscalizar as grades de programação das emissoras de

rádio e televisí o. É inconcebível que os programas do gênero sejam livremente

exibidos, com £ pauta atual, sem qualquer sanção.

Portanto, considerando o dever de fiscalizar do ente

concedente, r< quer-se seja determinado à União e à Anatei que realizem a

R ua ) la re ch a l D e o d o ro , 933 C e n tro — C u r it ib a /P R — C E P 8 00 6 0 -01 0

F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41)3219-889270

M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o Pa r a n á

fiscalização dos programas citados nesta peça vestibular, comunicando qualquer

violação aos direitos fundamentais diretamente ao Parquet Federal e a este MM.

Juízo, sob pena de multa.

G) DA OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER DO ESTADO DO PARANÁ. DO DEVER DE

CUSTÓDIA. PROIBIÇÃO DA EXPOSIÇÃO DO PRESO.

Considerando a conduta perpetrada pelos agentes policiais

do Estado do Paraná, consistente na exposição dos presos aos canais de

comunicação, pugna-se pela abstenção de exposição dos investigados aos órgãos

de imprensa.

A simples ligação do investigado a um fato delituoso é

suficiente para destruir sua imagem e honra objetiva. Sem embargo de posterior

absolvição ou arquivamento da instrução preliminar, o dano causado pela

superexposição dificilmente será reparado, pois à imprensa não importa o

destino do acusado, mas somente que ele seja acusado. Nota-se, pois, que a

responsabilidade do Estado pelo investigado é imensurável.

Assim, o Estado do Paraná deve abster-se de apresentar

qualquer investigado ou preso cautelar aos órgãos de imprensa, salvo se este

estiver devidamente representado por advogado regularmente constituído ou

defensor público, e na sua presença.

H) DO DANO MORAL COLETIVO. ATAQUE AOS DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS.

MODALIDADE DE DANO EXTRAPATRIMONIAL. DESNECESSIDADE DE

DEMONSTRAÇÃO DE SOFRIMENTO. FORMA DE RESPONSABILIZAÇÃO COM

FUNÇÃO REPRESIVA E PREVENTIVA.

Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

71

M inistério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

Os atos perpetrados pelos réus, direcionados ao ataque da

dignidade huma na e dos princípios constitucionais dos acusados, configuram-se

além de repulsivas, causadoras de danos aos direitos difusos ecomo condutas,

coletivos.

Antes de qualquer imersão no tema, é oportuno dizer que

os danos morai; coletivos são previstos em lei, especialmente no Código de

Defesa do Consi midor e na Lei n. 7.347/85, que regula a Ação Civil Pública.

Nos termos do artigo 6o, inciso VII, do Código de Defesa do

Consumidor:

Art. 6o São direitos básicos do consumidor:

[ . . . ]

VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas

à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais,

individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica,

administrativa e técnica aos necessitados.

0 artigo 1o da Lei n. 7.347/85 veio com o fim de reafirmar a

previsão da les islação consumerista, aplicada a todo ordenamento relativo às

Ações Coletivos em virtude do principio do Microssistema. Na redação do artigo

1°, inciso IV, da Lei n. 7.347/85:

Art. 1o Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da

ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e

patrimoniais causados:

[ . . . ]

IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.

R ua 1 la re c h a l D e o d o ro , 933 C e n tro - C u r it ib a /P R - C E P 8 0 0 6 0 -0 1 0

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889272

M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

Não obstante a lei insistir na conceituação de

moral”, trasportando institutos jurídicos construídos a partir da noção de direito

individual, os danos morais coletivos devem ser vistos como modalidade de dano

extrapatrimonial com caráter de sanção pecuniária, haja vista a ocorrência de

grave ofensa aos direitos difusos e coletivos.

dano

Ou seja, os danos morais coletivos não podem, em hipótese

alguma, ser construídos a partir do trasporte, indevido, de categorias do direito

civil individual. O dano moral coletivo deve, assim, ser trabalhado dentro de

uma perspectiva sancionatória, que se configura, aliás, como sua função.

A responsabilidade decorrente de danos morais coletivos

tem como objetivo permitir a aplicação de sanções pecuniárias ao agente que,

com sua conduta lesiva, perpetrou um dano em prejuízo dos direitos difusos e

coletivos. A explícita previsão legislativa do instituto tem o nítido propósito de

dar eficácia à proteção dessa categoria de direitos.

Portanto, o conceito de dano moral coletivo passa longe da

demonstração do sofrimento ou da dor pessoal.

A responsabilização por dano moral coletivo justifica-se à

medida que visa proteger interesses de grande relevância social e interesse

público associado à proteção e tutela dos direitos metaindividuais. Tem,

sobretudo, um caráter punitivo, visando cumprir, assim como no direito penal,

uma função preventiva - buscando evitar, no futuro, a ocorrência de novas

lesões.

Logo, não se faz necessária à configuração do dano moral

coletivo a demonstração de dor psicofísica dos ofendidos, tampouco, como

costumava elencar a doutrina mais antiga, da perda de valores essenciais à

coletividade. 0 dano moral coletivo independe de tais pressupostos, ainda queRua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889273

M inistério P úblico F ederalP r (CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

importantes - mas somente no que tange à quantificação daos mesmos sejan

sançao pecuniar ia.

A esse respeito, temos as palavras de Xisto Tiago de10Medeiros Neto

O tema não comporta hesitação na seara jurisprudencial,

constituindo posição corrente no Superior Tribunal de Justiça a

de que a prova do dano moral se satisfaz, em regra, com a

demonstração do fato que; o ensejou, decorrendo, destarte, que

para o reconhecimento do dano extrapatrimonial não se exige

a prova do desconforto, da dor ou da aflição, que são

admitidos por meio de um juízo de experiência.'na concepção moderna da reparação do dano

moral prevalece a orientação de que a responsabilização do

agente se opera por força do simples fa to da violação, de

modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em

concreto”, (destaquei)

Em suma,

0 dano moral coletivo é, em verdade, um dano

extrapatrimoni tl, sendo muito mais amplo que a concepção pura de dano moral.

Essa espécie d? dano é praticada em detrimento de direitos fundamentais e

indisponíveis ; é, nesse sentido, pura e simples, que se justifica a

responsabilização em decorrência dele.

Elucidativas nesse sentido são as lições de Leonardo Roscoe

Bessa11:

Em se tratando de direitos difusos e coletivos, a condenação por

dano moral (rectius: extrapatrimonial) se justifica em face da

10 Dano Moral G iletivo. 4aed. - São paulo : LTr, 201411 Dano moral a letivo. Direito e Liberdade, v. 7, n. 3, p. 237-274, 2009______________

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M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

presença do interesse social em sua preservação. Trata-se de

mais um instrumento para conferir eficácia à tutela de tais

interesses, considerando justamente o caráter

patrim onial desses interesses metaindividuais. [...] Constitui-

se, em hipótese de condenação judicial, valor pecuniário com

função punitiva em face de ofensa a direitos difusos e

coletivos (destaquei).

nao

Assim, basta a ocorrência de lesão à interesses difusos e

coletivos para que se justifique a condenação do agente à indenização

decorrente de danos morais coletivos.

O Superior Tribunal de Justiça assim decidiu:

[...] o dano extrapatrim onial não se restringe às pessoas individualmente consideradas. O dano moral coletivo é pacificamente aceito pela doutrina e jurisprudência.Tal instituto é configurado pela lesão na esfera moral de uma comunidade, isto é. a violação de valores coletivos, atim idos iniustificadamente do ponto de vista jurídico. Tal lesão pode decorrer de dano ambiental (lesão ao equilíbrio ecológico, à qualidade de vida e à saúde da coletividade), desrespeito aos direitos do consumidor (publicidade abusiva, por exemplo), danos ao patrimônio histórico e artístico, violação da honra de determinada comunidade (negra, judaica, japonesa, indígena etc.) e até fraude a licitações.[ . . .]Ressalto que, em determinados casos, a té a dor pode ser desconsiderada para a configuração do dano moral. Ressalto o ensinamento de Sérgio Cavalieri, para quem: 'o dano moral não está necessariamente vinculado a alguma reação psíquica da vítima. Pode haver ofensa à dignidade da pessoa humana sem dor, vexame, sofrimento, assim como pode haver dor, vexame e sofrimento sem violação da dignidade. Dor, vexame, sofrimento e humilhação podem ser consequências, e não causas. Assim como a febre é o efeito de uma agressão orgânica, a reação psíquica da vítima só pode ser considerada dano moral quando tiver por causa uma agressão à sua dignidade', (destaquei) (AgRg

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MgM inistério P úblico F ederal

P r d c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

no AREsp 737.887/SE, Rei. Ministro HUMBERTO MARTINS SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2015, DJe 14/09/2015)

Partindo desses pressupostos, é evidente que no

presente casa concreto vislumbra-se total ofensa aos direitos

transindividuai

A conduta dos réus, amparada em visões deturbadas da

moral, visam r egar a alteridade dos investigados em inquéritos policiais ou

acusados em pr )cessos judiciais. Os réus, por meio de um discurso intolerante e

violento, inclu: ive no sentido de justificar a prática de condutas violentas pelos

agentes estata s e pela própria população, como linchamentos, execuções,

castrações e torturas; agem de forma a negar a humanidade dos grupos

atacados, trata ido-os como doentes e degenerados.

Os réus em nenhum momento esforçam-se em tolerar e

conviver com )S direitos e garantias fundamentais. Muito pelo contrário. Os

programas apcntados nesta exordial, longe de ampliar um debate rico e

saudável, aperas se prestam a selecionar determinados grupos para apontar

quem são os mi mos humanos. Algo incompatível com um regime democrático.

Não há como definir de outra forma a conduta dos réus,

senão como m a verdadeira afronta ao postulado da dignidade da pessoa

humana.

Desta feita, resta perfeitamente demonstrada a ocorrência

do dano moral :oletivo.

R ua 1 la re c h a l D e o d o ro , 933 C e n tro — C u r it ib a /P R - C E P 8 0 0 6 0 -0 1 0

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889276

& ° ,

M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

H) DA SANÇÃO PECUNIÁRIA. DA FIXAÇÃO DE VALORES SUFICIENTES PARA

REPRIMIR E PREVENIR A OCORRÊNCIA DO ILÍCITO. APLICAÇÃO DA

RECOVERY".FLUID

Como amplamente apontado, a condenação em danos

morais coletivos tem caráter de sanção pecuniária em razão da ofensa

perpetrada contra os direitos difusos e coletivos. É dizer, a função da

responsabilização, nesses casos, é muito semelhante àquela exercida pelo

Direito Penal, ou seja, de repressão e prevenção das lesões contra bens

jurídicos.

A fixação da indenização a título de danos morais coletivos,

pois, deve ser o suficiente para reprimir a prática do ato lesivo, bem como deve

exercer a função de prevenção geral, passando a mensagem de que as lesões aos

direitos difusos e coletivos, no âmbito de um Estado Democrático e Plural, não

podem, e não serão, aceitas.

Pois bem.

Os programas policiais fazem parte da grade de

programação de grandes emissoras de televisão, sendo responsáveis por

mobilizar boa parcela da audiência desses canais. As cifras movimentadas com a

venda de espaços publicitários durante a exibição dos folhetins é estrondosa.

Cada segundo de publicidade veiculada gera alta lucratividade às empresas de

rádio e televisão.

Segundo dados apresentados pela ABERT (Associação

Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), o faturamento em publicidade das

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,òB

M inistério P úblico F ederalP r 3CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

emissoras de televisão, no ano de 2012, ultrapassou a casa dos 19 (dezenove)

bilhões de reais L.

Logo, uma condenação em baixos valores poderá, em

realidade, faze com que as graves lesões aos direitos difusos praticadas pelos

réus “saia bar ito” e, ao invés de impedir a ocorrência de maiores danos,

fomentará a pri tica do ilícito.

Portanto, considerando a finalidade sancionatória que se

reveste a responsabilização por dano moral coletivo, bem como as graves

violações orat cadas em preiuizo à dignidade humana e aos direitos dos

investigados, c ue atingiram frontalmente os valores coletivos, o valor mínimo

a título indeni latório deve ser fixado em R$ 10.000.000.00 (dez milhões de

reais).

Porém, antes que se possa argumentar ao contrário, é de se

ressaltar que tal valor, em momento algum, acarretará em alguma forma de

enriquecimento ilícito, justamente porque não será revertido em prol de pessoas

determinadas, nas deverá ser aplicado em observância aos preceitos da “fluid

recovery” .

À “fluid recovery”, originária das closs action

estadunidenses, surgiu como remédio adequado nos casos em que a condenação

obrigava o réi a indenizar uma coletividade indeterminada, as quais sequer

podiam ser ide ntificadas. É modalidade típica de reparação em caso de danos

morais coletivos, no qual o ofendido não é um indivíduo determinado, mas a

própria catego ia de interesses difusos e coletivos. 12

12 As receita > da indústria de radiofusão. ABERT. Disponível <http://www. abert.org.br/web/index.DhD/dados-do-setor/estatisticas/faturamento-do- setor>. Acesse em: 26 out. 2015.

em:

Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010F o n e(0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41)3219-8892

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M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

Sob esse ângulo, a “fluid recovery

de reparação das vítimas, que, como dito, são indeterminadas, mas tem como

escopo a punição do agente.

não atua como forma

Assim, o valor da indenização deverá reverter para um

fundo, cuja finalidade seja conexa aos interesses da coletividade e que se

relacione ao interesse tutelado na respectiva ação coletiva.

0 ordenamento jurídico brasileiro prevê, expressamente, a

aplicação do instituto da “fluid recovery” quando, no artigo 13 da Lei n.

7.347/85, determina que o valor das indenizações coletivas deverão ser

revertidas em favor de um fundo gerido por conselhos federais ou estaduais,

sendo seus recursos destinados à reconstituição dos bens lesados.

O STJ tem o seguinte posicionamento:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TUTELA COLETIVA.

DIREITO INDIVIDUAL HOMOGÊNEO. AUSÊNCIA DE HABILITAÇÃO DOS

BENEFICIÁRIOS. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA A

LIQUIDAÇÃO E EXECUÇÃO. CONTRATANTES IDENTIFICADOS.

LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO. CABIMENTO. LAUDO QUE DEVE

CONSIDERAR CADA UM DOS CONTRATOS. 1. Como a decisão

recorrida enfrentou as questões debatidas, ainda que em sentido

inverso à pretensão do recorrente, não há vício processual ou

violação dos artigos 165, 458 e 535 do CPC. 2. O Ministério

Público tem legitimidade subsidiária para a liquidação e

execução da sentença coletiva, caso não haja habilitação por

parte dos beneficiários, nos termos do art. 100 do CDC. 3. Se o

título executivo não prevê indenização estimada e possui os

critérios para a liquidação e tendo em vista a identificação dos

beneficiários, a liquidação deve levar em conta cada um dos

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M inistério P úblico F ederalP tOCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

contratos. No caso, pode ser realizada por arbitramento, de

modo a se atingir a efetividade e celeridade da tutela coletiva,

aliadas ao cumprimento do previso no título. 4. A reparação

fluída (fluid recovery) é utilizada em situações nas quais os

beneficiários do dano não são identificáveis, o prejuízo é

individualmente irrelevante e globalmente relevante e,

subsidiariamente, caso não haja habilitação dos beneficiários,

(destaquei) 5. Recurso parcialmente provido, com base no voto-

médio. (REsp 1187632/DF, Rei. Ministro JOÃO OTÁVIO DE

NORONHA, Rei. p/ Acórdão Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA,

QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 06/06/2013)

0 Ministério Público Federal, portanto, requer que os réus

sejam condem dos ao pagamento de indenização, em virtude dos danos morais

coletivos causz dos, em valor não inferior à R$ 10.000.000,00 (dez milhões de

reais).

Todavia, para fins de efetividade da tutela, o Parquet

também reque r que parte (ser determinada por esse Juízo) do valor acima

indicado, fixa lo a título indenização por danos morais, seja destinado para

entidades que têm como escopo o combate ao abuso policial e a defesa dos

direitos fundai lentais dos investigados e acusados em geral.

Estas entidades serão oportunamente indicadas no decorrer

do processamento da ação civil pública13.

Assim deve ser em razão do interesse coletivo a ser

n país em que as demonstrações de ódio e violência tem sido,protegido. Nu

13 0 Ministério P iblico Federal está pesquisando entidades que desenvolvem este tipo de trabalho. A indic; ção a p o s te r io r i objetiva não retardar a propositura da ação, haja vista as mazelas que a ciiculação dos programas policiais proVoca.

V íarechal D e o d o ro , 933 C e n tro — C u r it ib a /P R — C E P 8 0 0 6 0 -0 1 0

F o n e (0 x x 4 1 )3219-8700 - Fax (0xx41)3219-8892R ua

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o«l

M inistério P úblico F ederalP ro cura d oria d a R epú blica n o E stado do P aran á

infelizmente, constante, o investimento em campanhas educativas se mostra útil

a impedir que outros casos absurdos de discursos violentos se repitam.

8. DA TUTELA ANTECIPADA

No presente caso, é cabível a concessão da tutela

antecípatóría com fulcro no inciso I, do artigo 273, do Código de Processo Civil.

Diz o mencionado dispositivo legal:

Art. 273 . 0 juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar,

total, ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido

inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da

verossimilhança da alegação e:

I - haja fundado receio de dano de irreparável ou de difícil

reparação;

0 Código de Processo Civil autoriza a concessão de tutela

nos casos em que, além da prova inequívoca e da verossimilhança da alegação,

exista o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. A lei

processual civil, assim, busca evitar que ao final do processo, mesmo que a

decisão judicial seja favorável ao autor, o provimento seja inócuo.

A concessão antecipada do provimento final, aliás, se

mostra como essencial à efetividade da tutela pretendida, pois caso seja

deferida somente ao final do processo, tende a se mostrar inócua, ineficaz,

pois os folhetins apontados no corpo desta petição continuam a ser exibidos

diariamente, o que apenas serviria como forma de manter viva as incitações

ao ódio e à violência.

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M inistério P úblico F ederalP r )c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

Além disso, impende destacar que a Polícia Civil do

Estado do Paraiá não abandonou a prática de apresentar os investigados à

imprensa. Com) apontado alhures, os casos notórios do Estado atraem uma

grande carga d<1 atenção midiática, a polícia, sem olvidar disso, age, mais que

depressa, no intento de coroar seu serviço ante os olhos ávidos da opinião

pública.

Ressalte-se que os programas aqui tratados, em sua

maioria, são e::ibidos em rede aberta de televisão, sendo acessíveis a toda

comunidade, inclusive crianças e adolescentes, em razão da hora em que são

transmitidos. A demora na imposição das obrigações tende a ocasionar um

prejuízo ainda maior àquele iá perpetrado pelos órgãos de imprensa.

Desta feita, resta demonstrado o fundado receio de dano

que a demora p rocessual poderá ocasionar.

No que tange à verossimilhança das alegações, restou

demonstrado i prejudicialidade da conduta dos réus, seja por meio de

trechos retira dos das gravações juntadas aos autos, seja por meio das

degravações qi ie seguem a inicial.

Além disso, cabe mencionar que o artigo 273 exige a

somente a probabilidade de ocorrência do fato, a partir de um juízo de

cognição sumá ia. A lei processual não exige a prova de certeza, ainda que, no

caso dos autos, seja possível se falar em uma.

Consoante ensinam Marinoni e Arenhart14:

14 MARINONI, Lu z Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de Conhecimento. 9 ed. São Paulo: Editorc Revista dos Tribunais, p. 210.________________________________________

R ua darecha l D e o d o ro , 933 C e n tro — C u r it ib a /P R — C E P 8 0 0 6 0 -0 1 0Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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M l N I S T É R I o F Ú R L I C o F E D E R A LPROCURADORIA DA REPÚBLICA NO EMPADO DO PARANÁ

"A denominação 'prova inequívoca', capaz de convencer o ju iz da

'verossimilhança da alegação', somente pode ser entendida como

a 'prova suficiente' para o surgimento do verossímil, entendido

como o não suficiente para a declaração da existência ou da

inexistência do direito”.

Por fim, repita-se que a presente ação vem instruída por

provas pré-constituídas colhidas durante o curso do Inquérito Civil n°

1.25.000.003448/2013-83.

Ademais, no presente caso, também é aplicável o artigo

4ó1, do Código deRrocesso Civil, que defereao Juiz poderes paradeterminar,

até mesmo de oficio, “providências que assegurem o resultado prático

equivalente ao do adimplemento^.

Assim sendo, fica demonstrada a presença de todos os

requisitos legalmente exigidos para o deferimento da antecipação da tutela

jurisdicional ora requerida, bem como a adoção de todas as medidas que se

mostrem necessárias oara sua efetivação prática.inclusive co m aimposicão de

multa pecuniária diária.

Outrossim, incumbe destacar que a antecipação do

provimento final não ocasionará prejuízo às partes rés, justamente porque não

haverá nenhum risco de irreversibilidade da medida.

9. DA DISTRIBUIÇÃO POR DEPENDÊNCIA

A presente demanda deve ser distribuída ao MM. Juízo da 3a

Vara Federal de Curitiba, em razão dos autos n° 97.00.14361-9/PR, em queRua M arechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010

Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-889283

Ministério P úblico F ederalP r, CURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ

Dassivo a Rádio e Televisão OM (Rede CNT), Estado do Paraná efiguram no polo

União, pois a rrlatéria tratada ali contém causa de pedir semelhante à tratada

nesta ação cole iva, não obstante os pedidos serem diferentes. Inclusive, existe

condenação dos réus ao pagamento de multa, vez que, durante o “caso Tayná”,

descumpriram a sentença proferida no bojo daquele processo.

10. DOS REQUERIMENTOS.

Diante do exposto, o Ministério Público Federal requer:

a) a concessão de tutela antecipada, inaudita altera pars,

determinando-s

a.1) à Sociedade Rádio Emissora Paranaense S/A, TV

Independência S/A - Grupo RIC De Comunicação, Rádio e TV Iguaçu S/A -

Grupo Massa (F ede Massa), TV Colombo, Rádio e Televisão Bandeirantes Ltda.

(TV Band), Rá( io e Televisão Record S/A (TV Reco rd) e Globo Comunicação e

Participações 5 !A (TV Globo) que:

i) abstenham-se de entrevistar investigados em inquéritos

cessos administrativos, salvo quando autorizados por este e na

defensor constituído, seja ele público ou particular;

policiais ou pn>

presença de se i

ii) abstenham-se de exibir imagens de brutal violência,

ou afins entre os horários que compreendem às 7 (sete) e 23pessoas morta:

(vinte e três) hbras;

R ua 1 la re c h a l D e o d o ro , 933 C e n tro - C u r it ib a /P R - C E P 8 00 6 0 -01 0

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M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

iii) abstenham-se de utilizar termos como “bandidos”,

“criminosos”, “ladrões”, “estupradores”, “homicidas”, “monstros” ou qualquer

expressão que indique ou aponte a culpabilidade de indivíduos antes de eventual

sentença penal condenatória com trânsito em julgado;

iv) abstenham-se, em todos os horários, de exibir imagens

de cadáveres de crianças e adolescentes, ainda que a imagem seja tratada,

primando-se, assim, pela proteção integral da criança e do adolescente;

v) abstenham-se de proferir qualquer comentário ou

manchete que incite a pena de morte, linchamento, castração ou qualquer outro

tratamento desumano ou degradante em prejuízo de quem quer que seja.

a.2) à União e a ANATEL que realizem a fiscalização dos

programas citados nesta peça vestibular, comunicando qualquer violação aos

direitos fundamentais diretamente ao Parquet Federal e a este MM. Juízo, sob

pena de multa;

a .3) ao Estado do Paraná que abstenha-se de apresentar

qualquer investigado ou preso cautelar aos órgãos de imprensa, salvo se este

estiver devidamente representado por advogado regularmente constituído ou

defensor público e na sua presença.

b) a citação dos réus, através de seus representantes legais,

para, querendo, responderem a presente ação, sob pena de revelia;

c) a produção de todos os meios de prova admitidos em

direito, não obstante a presente demanda ir acompanhada de prova pré-

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m

M inistério P úblico F ederal0CURAD0R1A DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁP l

Inquérito Civil n.constituída olhida durante a instrução do

1.25.000.003441/2013-8315;

d) a dispensa do pagamento de custas e emolumentos e

, em vista do disposto no artigo 18 da Lei n. 7.347/85;outros encargo:

e) a condenação, em caso de descumprimento das

obrigações contidas no provimento final, com fulcro no artigo 11 da Lei n.

7.347/85, em inulta a ser fixada pelo prudente arbítrio desse respeitável Juízo

Federal;

f) ao final, mediante julgamento de mérito, o provimento

do pedido aduz ido nesta inicial, determinando:

f.1) a suspensão temporária de exibição dos programas

citados nesta ação civil pública, da seguinte maneira:

i) Rede Paranaense de Comunicação e TV Globo: não

exibição dos programas “Paraná TV” e “Jornal Hoje” por

um dia (uma segunda-feira) e não circulação do Jornal

Tribuna do Paraná por dois dias (duas segundas-feiras);

ii) Rádio e TV Independência (RIC), Rádio e TV Iguaçu (Rede

Massa), TV Colombo, Rádio e TV Bandeirantes (TV Band),

15 Instruem a ir icial, também, trechos dos programas elencados nesta Ação e as respectivas degravações.___________________________________________________________________

Rua vlarechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

Rádio e TV Record: a não exibirem, respectivamente, os

seus programas policiais “Balanço Geral”, “Tribuna da

Massa”, “Boa Noite Colombo”, “Brasil Urgente Paraná” e

“Cidade Alerta” por dois dias (duas segundas-feiras);

f.2) a condenação dos réus ao pagamento de indenização,

em virtude dos danos morais coletivos causados, como

estabelecido no artigo 13, caput, da Lei na 7.347/85 , em

valor não inferior à R$ 10.000.000,00 (dez milhões de

reais). Para fins de maior efetividade da tutela, o Parquet

também requer que parte (a ser determinada por esse

Juízo) do valor acima indicado,

entidades que têm como escopo o combate ao abuso

policial e a defesa dos direitos fundamentais dos

investigados e acusados em geral.

seja destinado para

f.3) a confirmação da tutela antecipada, a fim de que as

emissoras de rádio e televisão presentes no polo passivo

da ação:

i) abstenham-se de entrevistar investigados em inquéritos

policiais ou processos administrativos, salvo quando

autorizados por este e na presença de seu defensor

constituído, seja ele público ou particular;

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P p

M inistério P úblico F ederalP i o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o P a r a n á

ii) abstenham-se de exibir imagens de brutal violência,

pessoas mortas ou afins entre os horários que compreendem

às 7 (sete) e 23 (vinte e três) horas;

iii) abstenham-se de utilizar termos como “bandidos”,

“criminosos”, “ladrões”, “estupradores”, “homicidas”,

“monstros” ou qualquer expressão que indique ou aponte a

culpabilidade de indivíduos antes de eventual sentença

penal condenatória com trânsito em julgado;

iv) absftenham-se, em todos os horários, de exibir imagens

de cadáveres de crianças e adolescentes, ainda que a

imagem seja tratada, primando-se, assim, pela proteção

integral da criança e do adolescente;

v) abstenham-se de proferir qualquer comentário ou

manchete que incite a pena de morte, linchamento,

castração ou qualquer outro tratamento desumano ou

degradante em prejuízo de quem quer que seja;

f.4) a confirmação da tutela antecipada, a fim de que a

União e a ANATEL realizem a fiscalização dos programas

citados nesta peça vestibular, comunicando qualquer

violação aos direitos fundamentais diretamente ao Parquet

Federal e a este MM. Juízo; e

R u a darecha l D e o d o ro , 933 C e n tro - C u r it ib a /P R - C E P 8 00 6 0 -01 0Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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V

M inistério P úblico F ederalP r o c u r a d o r ia d a R e p ú b l ic a n o E s t a d o d o Pa r a n á

f.5) a confirmação da tutela antecipada, a fim de que o

Estado do Paraná abstenha-se de apresentar qualquer

investigado ou preso cautelar aos órgãos de imprensa, salvo

se este estiver devidamente representado por advogado

regularmente constituído ou defensor público e na sua

presença.

Dá-se a causa o valor de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de

reais).

Curitiba, 27 de janeiro de 2016

ELOISA HELENA MACHADO Procuradora Regional dos Direitos do Cidadão

Procuradora da República

MPF Documento eletrônico assinado digitalmente.Signatário(a): ELOISA HELENA MACHADO:8559Certificado: 7cc26093604f28f9

Data/Hora: 27/01/2016 14:51:24

Ministério Público Federal

Rua Marechal Deodoro, 933 Centro - Curitiba/PR - CEP 80060-010Fone (0xx41) 3219-8700 - Fax (0xx41) 3219-8892

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