ABRAPSO - Diálogos Em Psicologia Social

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ANAIS DO XIV ENCONTRO NACIONAL DA ABRAPSO - RESUMO ISSN 1981-4321 Tema: Mesa Redonda - Política PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA E POLITICAS PÚBLICAS: REFLETINDO SOBRE A AÇÃO POLÍTICA E A PRODUÇÃO DE AUTONOMIA DOS SUJEITOS COLETIVOS EM COMUNIDADES E ONGS Autores: CELSO ZONTA [+] SORAIA ANSARA [+] ALESSANDRO SOARES DA SILVA [+] A presente mesa visa debater acerca de como, por um lado, se tem articulado as ações das ONGs nas comunidades e como estas, por sua vez tem reagido a essa ação e, por outro como as politicas públicas tem contribuido para que se construam sujeitos políticos autônomos capazes de atuar na definição das trajetórias comunitárias e individuais. Essa leitura se faz a partir de uma perspectiva psicopolítica orientada pelas contribuiçõesv de autores como Inacio Martín-Baró, Maritza Montero, Salvador Sandoval, Sílvia Lane e William Gamson. Nesse sentido, essa mesa busca proporcionar uma análise critica no que se refere a formulação, implementantação e avaliação da políticas públicas no Brasil voltadas a comunidades nas quais a renda e a educação são bastante precarizadas graças a forma com que a sociedade capitalista impõem lugares minoritários e marginais a diversos grupos sociais. Nessa mesa, Soraia Ansa, traz como contribuição, um relato/reflexão sobre a experiência de um curso de Psicologia da Libertação e Comunitária que realizamos desde 2005, com a participação de profissionais de diferentes áreas sociais que atuam em comunidades de diferentes municípios do Estado de São Paulo. Com base nos referenciais teóricos da psicologia da libertação e comunitária a autora apresenta os desafios teórico-práticos que estes profissionais têm encontrado em suas práticas de intervenção psicossocial nas comunidades. Celso Zonta buscará discutir sobre as relações entre políticas públicas no Estado capitalista e o desenvolvimento de comunidade a partir de uma perspectiva histórico-crítica de Psicologia Social Comunitária. Com base no método histórico dialético, o trabalho destaca o conceito de mediação e a categoria contradição como elementos fundamentais para a compreensão do sujeito reificado e fetichizado pela sociedade capitalista e aponta possíveis ações transformadoras, em especial formas de ações de solidariedade e de defesa das relações de poder e exploração. Por fim, Alessandro Soares da Silva oferecerá uma análise psicopolítica dos processos de ONGuização do Estado e dos Movimentos Sociais mediante uma análise dos impactos que a terceirização dos serviços públicos tem nos processos de formulação, implementação e avaliação de políticas públicas, bem como de que forma ela impacta na organização de movimentos sociais e na atenção aos usuários dos serviços públicos. Nesse debate se valorizará elementos teóricos- metodológicos comuns na Psicologia da Libertação e na Psicologia Política. Essa mesa é resultado dos esforços coletivos do Grupo de Pesquisa em Psicologia Política, Políticas Públicas e Multiculturalismo do qual esses pesquisadores fazem parte.

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ANAIS DO XIV ENCONTRO NACIONAL DA ABRAPSO - RESUMOISSN 1981-4321

Tema: Mesa Redonda - Política

PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA E POLITICAS PÚBLICAS: REFLETINDOSOBRE A AÇÃO POLÍTICA E A PRODUÇÃO DE AUTONOMIA DOS SUJEITOSCOLETIVOS EM COMUNIDADES E ONGS

Autores: CELSO ZONTA [+] SORAIA ANSARA [+]ALESSANDRO SOARES DA SILVA [+]

A presente mesa visa debater acerca de como, por um lado, se tem articuladoas ações das ONGs nas comunidades e como estas, por sua vez tem reagido aessa ação e, por outro como as politicas públicas tem contribuido para que seconstruam sujeitos políticos autônomos capazes de atuar na definição dastrajetórias comunitárias e individuais. Essa leitura se faz a partir de umaperspectiva psicopolítica orientada pelas contribuiçõesv de autores comoInacio Martín-Baró, Maritza Montero, Salvador Sandoval, Sílvia Lane e WilliamGamson. Nesse sentido, essa mesa busca proporcionar uma análise critica noque se refere a formulação, implementantação e avaliação da políticaspúblicas no Brasil voltadas a comunidades nas quais a renda e a educação sãobastante precarizadas graças a forma com que a sociedade capitalista impõemlugares minoritários e marginais a diversos grupos sociais. Nessa mesa, SoraiaAnsa, traz como contribuição, um relato/reflexão sobre a experiência de umcurso de Psicologia da Libertação e Comunitária que realizamos desde 2005,com a participação de profissionais de diferentes áreas sociais que atuam emcomunidades de diferentes municípios do Estado de São Paulo. Com base nosreferenciais teóricos da psicologia da libertação e comunitária a autoraapresenta os desafios teórico-práticos que estes profissionais têm encontradoem suas práticas de intervenção psicossocial nas comunidades. Celso Zontabuscará discutir sobre as relações entre políticas públicas no Estadocapitalista e o desenvolvimento de comunidade a partir de uma perspectivahistórico-crítica de Psicologia Social Comunitária. Com base no métodohistórico dialético, o trabalho destaca o conceito de mediação e a categoriacontradição como elementos fundamentais para a compreensão do sujeitoreificado e fetichizado pela sociedade capitalista e aponta possíveis açõestransformadoras, em especial formas de ações de solidariedade e de defesadas relações de poder e exploração. Por fim, Alessandro Soares da Silvaoferecerá uma análise psicopolítica dos processos de ONGuização do Estado edos Movimentos Sociais mediante uma análise dos impactos que aterceirização dos serviços públicos tem nos processos de formulação,implementação e avaliação de políticas públicas, bem como de que forma elaimpacta na organização de movimentos sociais e na atenção aos usuários dosserviços públicos. Nesse debate se valorizará elementos teóricos-metodológicos comuns na Psicologia da Libertação e na Psicologia Política.Essa mesa é resultado dos esforços coletivos do Grupo de Pesquisa emPsicologia Política, Políticas Públicas e Multiculturalismo do qual essespesquisadores fazem parte.

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Resumo das Falas

CELSO ZONTA(UNESP - BAURU/ABPP)

QUESTÕES TEÓRICAS E METODOLÓGICAS DA PSICOLOGIA SOCIALCOMUNITÁRIA E AS POLÍTICAS PÚBLICAS NA SOCIEDADECAPITALISTA

O objetivo principal deste trabalho é refletir sobre as relações entrepolíticas públicas no Estado capitalista e o desenvolvimento de comunidadea partir de uma perspectiva histórico-crítica de Psicologia SocialComunitária. Com base no método histórico dialético, o trabalho destaca oconceito de mediação e a categoria contradição como elementosfundamentais para a compreensão do sujeito reificado e fetichizado pelasociedade capitalista e aponta possíveis ações transformadoras, emespecial formas de ações de solidariedade e de defesa das relações depoder e exploração. Para discutir as determinações do modo de produçãosobre a construção da subjetividade do indivíduo são analisados osseguintes elementos: os fenômenos da ideologia e da alienação e a relaçãoentre realidade material e ideologia e a consciência social. O referencialteórico adotado incorpora elementos da Pedagogia da Libertação de PauloFreire; da Psicologia Histórico-Cultural de Vigotski e Leontiev; da Psicologiada Libertação de Martin Baró e da Sociologia da Vida Cotidiana de AgnesHeller. Da Pedagogia da Libertação são destacados os seguintes elementosprincipais: a valorização do saber popular; a compreensão do objetocognoscível como elemento mediatizador de sujeitos cognoscentes; aproblematização como instrumento de desnaturalização dos fenômenossociais; a relação conhecimento e consciência a partir da realidade vivida,o processo educativo como educação não bancária. Da PsicologiaHistórico-Cultural são analisados os seguintes conteúdos: a noção de zonade desenvolvimento próximo de Vigotski como mediação teórica para acompreensão das possibilidades de desenvolvimento e de geração deprocessos educativos para o conhecimento e a consciência; a relaçãoentre a atividade humana (Leontiev), e o desenvolvimento da consciência;os sentidos e os motivos socialmente construídos. Das elaborações de Barósão discutidos os seguintes temas: a necessidade de construção de umapsicologia a favor dos povos explorados; a facilitação de processos dedesideologização e desenvolvimento de capacidades das pessoas parareagirem criticamente em relação às circunstâncias objetivas de suasvidas, gerando formas de conhecimento e de ação que as transformem; acompreensão do processo de libertação como a emancipação dos grupossociais que sofrem opressão e a definição de processo grupal. Dascontribuições de Heller destacam-se: os conceitos de comunidade e devida cotidiana e suas relações com a formação do psiquismo alienado.Estas diferentes contribuições teóricas indicam pressupostos teórico-filosóficos importantes para o desenvolvimento de processos psico-sociaisnuma perspectiva crítico-transformadora da sociedade, que pode contribuirpara a formação de comunidades auto-gestoras no que se refere à soluçãode seus problemas em termos coletivos e de classes. Mas, para que estesprocessos sejam gestados é fundamental a construção de espaços sociaisque possibilitem a reflexão sobre as relações entre pensamento e ação quefornecem a base para o desenvolvimento da consciência e da identidadepsicossocial. Partimos da premissa de que a humanização do sujeito se dáatravés da educação, a partir de um esforço consciente e deliberado deseus atores na apropriação dos conhecimentos historicamente acumulados,e a formação de grupos comunitários numa perspectiva de educaçãopopular, pode constituir-se em um locus privilegiado para uma formaçãoreflexiva capaz de gerar a crítica aos valores negativos produzidos nocapitalismo, tais como o individualismo e o consumismo e a construção denovos valores humanos, entre eles a justiça social, a solidariedade, ocoletivismo e a valentia cívica. Sob esta perspectiva teórica refletem-sealgumas características metodológicas que caracterizam os processos deintervenção: a) Reflexão sobre a vida cotidiana em suas mais diferentesexpressões; b) Análise crítica dessa realidade a partir do recurso aelementos teóricos disponíveis que permitam compreendê-la comoconstrução social historicamente datada, ou seja, como objeto possível daação humana transformadora; c) Reflexão e planejamento de ações quepodem ser desenvolvidas buscando as transformações desejadas

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construídos de maneira participativa e junto e pela comunidade; d)Desenvolvimento de projetos que traduzam em ações concretas ocompromisso ético, político e profissional com a construção de processoshumanizadores. É sob este contexto teórico e metodológico, que devemosrefletir sobre as políticas públicas do Estado Capitalista. No dia a dia da acomunidade depara-se constantemente com as políticas públicas: aprevidência social; o SUS - saúde básica, programas de nutrição, saúdemental, etc., na educação do ensino fundamental, médio e superior (pro-uni), a pós-graduação, a pesquisa, a tecnologia, etc., nas políticas dehabitação, mutirão, CDHU, etc., nas ações do estado no que se refere aesportes, lazer e cultura, nas políticas de assistência social (vale gaz,bolsa escola, creches, etc.), e de promoção social. Os protagonistasdestas políticas públicos são o Governo Federal, Estadual e Municipal, e osveiculadores são os mesmos, bem como as ONGS de iniciativa pública eprivada, Fundações as entidades assistenciais e entidades religiosas, etc.Os recursos públicos para a consecução destas políticas públicas sãoadvindos dos impostos e taxas pagos pela população como um todo, eportanto, como origem são direitos, porém são convertidos sob a forma esentido de benefícios, como presente, favores fornecidos pelo governante.as políticas públicas no Estado Capitalista. Para o sistema a função daspolíticas públicas é a de suprir necessidades decorrentes da exploração docapital, para garantia da reprodução da mão de obra. Como funçãosecundária adquire o caráter de controle social. O sistema propõe ainclusão pela política pública, como uma necessidade, tendo em vista acompreensão de que existem indivíduos fracos, frágeis e inferiores biológicae psíquicamente. O sujeito sente-se excluído materialmente, ética epoliticamente, tendo em vista a maneira de como o sistema o percebe e otrata. É transmitida sob a forma de ideologia a noção de que o sujeito estáà margem, é marginal à sociedade, esta considerada um todo harmônico, ehomogêneo. Desta maneira a sociedade aparece dividida não entreexploradores e explorados,, opressores e oprimidos, mas entre fortes efracos, ricos e pobres, favorecidos e desfavorecidos pela sorte. E sob essacompreensão, o Estado aparece com a função de protegê-los através daspolíticas públicas. Os discursos de legitimação das políticas públicasapontam para duas direções principais: a) a bondade do sistema; b) ofracasso individual. Há também a ilusão da busca de um estado de bemestar social (welfare state), ou seja, a crença de que as políticas públicaspossibilitarão o acesso universal aos bens sociais, e portanto, a eliminaçãodas desigualdades sociais através da chamada inclusão. Na realidade, aspolíticas públicas, com seus recursos não são capazes de atender a realdemanda. As conseqüências psicológicas decorrentes das(in)compreensões das políticas no Estado Capitalista acabam por fornecer adesqualificação social pela culpabilização da pobreza, da necessidade daassistência, fornecendo a estigmatização dos assistidos. Disso decorre umconjunto de conseqüências psicossociais como o sentimento deinferioridade social e o sofrimento psíquico tendo em vista a representaçãoideológica do poder como o medo da autoridade, o sentimento deincapacidade e fracasso diante da realidade social, produzindo vergonha eculpa. Por outro lado, diante do estado de miserabilidade material a queestão submetidas as camadas populares, as políticas públicas fornecemalguma proteção material para sua sobrevivência. Sob esta contradiçãocabe ao Psicólogo Social Comunitário atuando numa perspectiva sóciohistórica, viabilizar processos de reflexão da comunidade, no próprio seiodestas políticas públicas. Neste sentido, a própria ação constituída nosgrupos comunitários devem fornecer sentido não como um fim em si mesmo,como por exemplo, ganhos materiais (ex.: mais remédios para o Posto deSaúde, etc.), mas para além disto, a compreensão histórica dasdeterminações sobre o sujeito, através do processo de reflexão conscientesobre a atividade, fornecendo a base necessária para a potenciação dosujeito, seu empoderamento, e sua autonomização como sujeito histórico.

SORAIA ANSARA (FABRASP/ABPP)

POLÍTICAS PÚBLICAS E INTERVENÇÕES PSICOSSOCIAIS NACOMUNIDADE: DESAFIOS E PRÁTICAS

Este trabalho é um relato/reflexão sobre a experiência de um curso dePsicologia da Libertação e Comunitária que realizamos desde 2005, com a

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participação de profissionais de diferentes áreas sociais que atuam emcomunidades de diferentes municípios do Estado de São Paulo. Com basenos referenciais teóricos da psicologia da libertação e comunitária a autoraapresenta os desafios teórico-práticos que estes profissionais têmencontrado em suas práticas de intervenção psicossocial nas comunidades.Entre os grandes desafios estão os limites dos programas sociais propostospelo poder público, pelas Organizações Não Governamentais, bem como asdificuldades que os agentes externos encontram para desenvolver umtrabalho que leve ao fortalecimento da comunidade e a própria ausênciaque têm de referenciais teóricos e metodológicos que fundamentem suaspráticas. Para tanto, utilizamos os conceitos de fatalismo, ideologia,conscientização e desideologização, de Martín-Baró e a contribuição deMaritza Montero sobre o paradigma da construção e transformação crítica,mais conhecido como paradigma da psicologia social latino-americana. Porparadigma entendemos um modelo ou modo de conhecer, que inclui tantouma concepção de indivíduo ou sujeito cognoscente como uma concepçãodo mundo em que vive e das relações entre ambos (Montero, 2004). Istosupõe um conjunto sistemático de idéias e de práticas que regem asinterpretações acerca da atividade humana, acerca de seus produtores, desua gênese e de seus efeitos sobre a sociedade e que manifestam modosde fazer para conhecê-los. Esse paradigma ou modelo de produção deconhecimentos vem sendo construído há mais de três décadas pelospsicólogos que trabalham com comunidades, e se constitui, segundoMontero (2004) de cinco dimensões: ontológicas (que se refere à naturezado ser) e nos levanta questões concernente a natureza da relação entreinvestigadores/agentes externos (psicólogos, educadores, assistentessociais) e as pessoas que formam as comunidades (aquelas que sãochamadas na pesquisa tradicional "sujeitos"); epistemológicas, que serefere a produção do conhecimento, a relação entre sujeitos cognoscentese objetos do conhecimento. Ambos, sujeito e objeto são consideradosparte de uma relação de mútua influência, ou seja, o sujeito constrói suarealidade que ao mesmo tempo o transforma, o limita e o impulsiona;metodológicas, que diz respeito à natureza da forma de conhecimento. Oaspecto mais interessante na dimensão metodológica comunitária é anecessidade de gerar métodos que se transformem no mesmo ritmo em quese modificam as comunidades. Nesse sentido, sugere métodos capazes deproduzir perguntas e respostas frente às suas transformações e frente asperspectivas de ação que estas provocam. Métodos estes, cujacaracterística seja a capacidade de mudar conforme as próprias mudançasrelacionadas ao problema que se estuda ou que se tenta solucionar, de talmaneira que gerem a construção de uma ação crítica e reflexiva de carátercoletivo; éticas, remete a definição do OUTRO e a sua inclusão na relaçãode produção de conhecimento com respeito a esse OUTRO e a suaparticipação na autoria e a propriedade do conhecimento produzido. A éticareside no reconhecimento e na aceitação do OUTRO como sujeitocognoscente com igualdade de direitos, isso implica uma relaçãolibertadora; e por fim as dimensões políticas, que se refere ao caráter e afinalidade do conhecimento produzido, assim como ao seu âmbito deaplicação e seus efeitos sociais, isto é, ao caráter político da açãocomunitária e a possibilidade que todo sujeito tem de expressar-se e fazerouvir sua voz no espaço público. A política se refere à esfera do público, oâmbito da cidadania. Refere-se ainda ao poder e as suas linhas de ação, oqual constitui um núcleo central. Isso diz respeito a ter voz, fazer ouvir egerar espaços para que aqueles que são relegados ao silêncio possam falare ser escutados e se estabeleça o diálogo. Estas dimensões devemsustentar os processos de intervenção comunitária a partir daproblematizarão das práticas sociais. Nesse sentido, a psicologiacomunitária propõem uma PARTICIPAÇAO, cujo caráter político se mostrana função desalienante, mobilizadora da consciência e socializadora quepode ter a práxis que se realiza. Desalienar e conscientizar são processosque fazem parte da reflexão que busca contrapor-se aos efeitosideológicos de estruturas de poder e de dependência. Essa participaçãonão busca só remediar algum mal, cumprir algum desejo, mas sim gerarcomportamentos que respondam a uma projeção ativa do indivíduo em seumeio ambiente social, assim como uma concepção equilibrada desse meio ede seu lugar nele. Há, portanto, um movimento permanente da existênciacoletiva que lhe dá um caráter político no sentido que as pessoas quetrabalham em psicologia comunitária produzem, junto com as comunidades,

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intervenções que levam ao fortalecimento e a transformação social. Dessamaneira, o curso dá destaque a metodologia da investigação-ação-participativa (IAP) para a elaboração de propostas de intervençãopsicossociais que levem a autonomia da comunidade. A IAP, como modeloparticipativo de intervenção social, parte da premissa de que as pessoascom as quais se trabalha, devem estar ativamente presentes em todo oprocesso da intervenção, inclusive, que as decisões sobre as ações queserão tomadas em conjunto para a solução de determinados problemasdevem ser adotadas, majoritariamente por essas pessoas. Os princípiosbásicos da postura utilizada pela IAP se baseia na relação que se podeestabelecer entre as pessoas envolvidas nos processos sociais detransformação e os intelectuais comprometidos com as lutas que se dãonesses espaços sociais e políticos. Esta metodologia tem alguns princípiosque consideramos fundamentais no processo de intervenção comunitária.Concebe os seres humanos como construtores da realidade em que vivemconsiderando os membros da comunidade ou grupo como os atoresfundamentais dos processos que afetam a comunidade. Propõe partir darealidade social concreta dos próprios participantes da comunidade, o queimplica uma visão histórica e contextual das particularidades de cadasituação e lugar onde atuamos. Outro elemento importante é compreenderque toda comunidade possui recursos para levar adiante suatransformação. Além disso, o trabalho de intervenção ocorre por meio deum processo dialógico de troca de saberes no qual se estabelece umaarticulação entre o conhecimento científico e popular. Nesse sentido,agentes externos e internos constroem um novo conhecimento. O objetivoda intervenção tem por base a transformação das condições de vida daspessoas e de um compromisso político tendo em vista a autonomia efortalecimento da comunidade. Em suas três edições o curso reuniuprofissionais que atuam nos Centros de Referências de Assistência Social(CRAS), Serviço Único de Assistência Social (SUAS) - que atendemcrianças em situação de risco pessoal e social e famílias que sãoencaminhadas pelos Programas Sociais de transferência de Renda (RendaMínima, Renda Cidadã, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, BolsaFamília) e de órgãos de defesa da criança e adolescente, como ConselhoTutelar, Centro de Referência e Atenção aos maus-tratos infantis (CRAMI),entre outros. Isso permitiu uma profunda reflexão acerca das práticasdesses profissionais, sobre a atuação dos agentes externos (como échamado na psicologia comunitária o profissional que atua emcomunidades) e as dificuldades existentes na relação entre poder público ecomunidade; poder público e população. Além disso, o curso ressalta aimportante tarefa de participar das discussões e elaboração das políticaspúblicas, bem como fazer uma análise crítica do alcance das políticassociais implementadas nos últimos anos. Neste sentido, apontamos osquestionamentos do grupo participante no que diz respeito a elaboração desuas propostas de intervenção e sua relação com os referenciais deMartín-Baró e Maritza Montero. Um dos grandes desafios levantados apartir dos referenciais teórico metodológico do curso é: como os agentesexternos, que representam o poder público, atuando nas políticas eprogramas sociais podem superar os limites institucionais e realizar umaproposta de intervenção psicossocial que de fato leve a autonomia dacomunidade? Ou em outras palavras como fazer psicologia comunitária e dalibertação no âmbito do poder público, considerando seus limitesinstitucionais e políticos? Nesse sentido, enfatizamos as discussões sobre arelação entre Estado-Programas-Organizações, bem como as contradiçõesexistentes entre uma prática social comunitária -comprometida com asclasses mais pobres e excluídas - e as exigências dos planos e programas -que fazem parte das políticas públicas municipais, estaduais ou federais,que em sua maioria impõem sérios limites aos processos de fortalecimento eautonomia da comunidade. Palavras clave: intervenções psicossociais,conscientização, fortalecimento da comunidade, políticas públicas

ALESSANDRO SOARES DA SILVA (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO)

O PROCESSO DE ONGUIZAÇÃO DO ESTADO E DOS MOVIMENTOSSOCIAIS E O SEU IMPACTO NO ÂMBITO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

O presente trabalho resulta de meu projeto de pesquisa docente naUniversidade de São Paulo e trata da relação entre Estado, Sociedade Civil

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e Movimentos Sociais, dedicando-se mais especificamente ao processo deonguização do Estado e dos Movimentos Sociais. Pretendemos analisar oimpacto desse processo no próprio Estado, na geração, implementação egestão de políticas públicas e nos movimentos sociais. Estudar essaquestão parece-nos relevante no instante em que, cada vez mais, opúblico e o privado são elementos que se sobrepõem nas relações entre oEstado e a Sociedade Civil. Isso faz com que seja cada vez mais necessáriose trabalhar para a instauração de um poder público constituído por normasclaras e efetivas, que esteja aberto à participação da sociedade em seusdiversos canais de decisão. Essa questão é imperativa, caso se pretendatornar a democracia brasileira mais real e menos formalista, capaz deaproximar o/a cidadão/ã dos processos decisórios e da gestão da coisapública. Certamente a formalidade é um elemento importante na construçãode relações, mas o formalismo burocrático, muitas vezes, é um fator dedesmobilização social e precisa ser enfrentado. As fronteiras que separam oEstado do cidadão devem ser rompidas, produzindo resultados concretos naqualidade de vida daqueles que sofrem com a face perversa da dialética dainclusão/exclusão. Rompê-las equivale não só a criar um novo espaçopúblico para decisões de alcance imediato, mas a criar um espaçorealmente eficaz. Parece-nos que a gestão pública necessita regenerar alegitimidade da representação para que, desse modo, haja uma realdemocratização, que devolva as decisões à comunidade em forma depolíticas e ações governamentais. No entanto, muitas vezes se têm aimpressão de que o Brasil ainda necessitaria definir o tipo de relação que oEstado deve manter com a sociedade civil, tanto no âmbito coletivo quantono individual, no âmbito dos/as cidadãos/ãs envolvidos/as com suas tarefasparticulares diárias, em suas vidas cotidianas (Heller, 1998, 2002). A teoriapolítica desde seu nascedouro procurou indicar quais os caminhos que oEstado moderno deveria seguir para manter saudável essa relação.Entretanto, parece-nos que há elementos psicossociais, ou mesmopsicopolíticos, que compõem essa relação e nem sempre são levados emconta, ocasionando muitas vezes uma racionalização simplista dos múltiplosprocessos que movimentam essa relação. Põe-se em questão o que seriauma relação dita saudável. Além do mais, tornar uma relação saudável, porvezes, pode se traduzir em uma forma velada de harmonização dosconflitos e invisibilização das contradições entre coletivo e indivíduo, entreEstado e sociedade civil. Nesse sentido, pode-se observar que esse modelocomprometido com tal visão apresenta evidentes sinais de fraqueza, poisos Estados nacionais encontram grande dificuldade em promover suastradicionais funções de promotores e gestores de políticas públicas esociais e de indutor de desenvolvimento econômico. Essa dificuldade é, emgrande medida, conseqüência do processo de globalização edesregulamentação, fruto da pressão e reivindicação das grandescorporações transnacionais (Bauman, 2000). Entretanto, estas mudançasnão impactam apenas no âmbito macrossocial, mas trazem múltiplos efeitosmicrossociológicos, alteram as relações entre indivíduos, entre indivíduos egrupos, intra e inter-grupos e, em última instância, entre Estado esociedade civil (Sandoval, 2001). Isso implica admitir um componenteinterno ao próprio modus operandi do Estado referente a seu limite demobilização voluntária dos/as cidadãos/ãs à participação nas coisaspúblicas ou, em outras palavras, a seu limite para a promoção daparticipação política de cidadãos e cidadãs (Laraña, 2004).Paradoxalmente, quanto mais a sociedade avança em seu processo demodernização, mais formais ficam as relações entre os indivíduos;profissionalizam-se as ações próprias da esfera do político, o que implicareconhecer o estranhamento do/a cidadão/ã com essa esfera, impactando,assim, diretamente em seu envolvimento político. Desta feita, esse tipo deenvolvimento é, muitas vezes, visto pelos indivíduos como sendo algoreservado à elite e próprio da elite. Essa compreensão desemboca em umaconstrução identitária que abre mão de recursos e oportunidades políticasimportantes para que o indivíduo se reconheça enquanto sujeito político. Énesse cenário que se faz mister estudar os processos de produção daconsciência política enquanto instrumento gerador de autonomia eemancipação social (Gamson, 1992; Sandoval, 2001; Silva & Barboza,2005). Essa questão repercute diretamente na interpretação/justificaçãodo papel do Estado. Quando este não executa suas atribuições ou mesmoquando este é assolado por denúncias de corrupção, aparentemente oindivíduo que não se reconhece enquanto ator político entende tais

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fenômenos como sendo apenas defeitos de caráter do governante deplantão. Ao afastar-se, descompatibilizar-se com o debate e a arenapolítica, o indivíduo desenvolve uma justificativa discursiva baseada napremissa de que "todo mundo é igual" e, portanto, a participação individualpouco contribuiria para a mudança do estado de coisas que mancham oespaço público e põe o Estado em descrédito. Mina-se também apossibilidade de participação desses indivíduos em movimentos popularese/ou sociais. Como se observa nos últimos anos, o debate público sobre asorganizações da sociedade civil vem tomando um novo contorno emdecorrência das experiências de controle social sobre as políticas públicas eda emergência de direito político conquistado a partir da Constituição de1988 e das leis dela decorrentes, e nem sempre exercido plenamente. Alémdisso, as várias experiências de participação social promovidas porgovernos politicamente afinados com a perspectiva democrática e populargeraram importantes formas de exercício de cidadania como é o caso doOrçamento Participativo. Essas experiências colocam novos desafios paraas organizações da sociedade civil; alteram as relações entre Estado esociedade civil visto que elas propiciam um exercício mais amplo do controlesocial. Nessa tendência de mudança das relações entre Estado, sociedadecivil e movimentos sociais, emergem as ONGs - organizações não-governamentais - como sendo pertencentes a um certo Terceiro Setorimpulsionado economicamente ora pelo Estado, ora pelo Mercado, ora porambos. Entretanto, as ONGs apresentam-se mais correntemente comosendo organizações da sociedade civil que se pautam por ideaisdemocráticos e comprometidos com a justiça social. Como se pode notar,parece-nos que há uma questão importante a ser investigada no âmbito daconstrução identitária e da produção de projetos políticos das ONGs,sobretudo quando sua emergência tem significado, em muitos aspectos, aretirada do Estado de setores estratégicos ou a terceirização do Estado ouainda a filantropização da questão social com a transferência das funçõessociais do Estado para as Organizações Não-Governamentais. Assim, essadiscussão se mostra relevante pelo fato de abrir um espaço importantepara a produção de conhecimento acerca das relações entre Estado,sociedade civil e movimentos sociais e o papel das ONGs nastransformações das mesmas e nas reestruturações identitárias e políticasdos múltiplos atores coletivos implicados nesses processos. Em nossosesforços, diferentemente do que têm feito a mídia, estamos bastanteatentos para distinguir ONGs e demais organizações de movimentos sociais,destacando que elas não podem ser amalgamadas, fundidas na definiçãorápida de Terceiro Setor que, além de ambas, engloba também asfundações empresariais e entidades filantrópicas. Essa armadilha acabadeslegitimando e despolitizando ações deflagradas por movimentos sociais epor um pequeno conjunto de ONGs-militantes. Nossa intenção é, a partir daPsicologia Política, contribuir para a melhor compreensão das dinâmicasinternas e externas que se encontram implicadas nessa complexa realidadesocial.