ABCP 2014

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IX ENCONTRO DA ABCP Área temática: Política, Direito e Judiciário Legislativo versus Judiciário: o caso da cláusula de barreira José Paulo Martins Junior (Docente, Ciência Política – Unirio) Emilie Kalyne Munhoz (Mestranda, PPGD – Unirio) 1

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X ENCONTRO DA ABCPrea temtica: Poltica, Direito e JudicirioLegislativo versus Judicirio: o caso da clusula de barreiraJos Paulo Martins Junior (Docente, Cincia Poltica Unirio)Emilie Kalyne Munhoz (Mestranda, PPGD Unirio)Matheus Cavalcanti Pestana (Graduando, Cincia Poltica Unirio)Braslia, DF04 a 07 de agosto de 20141Legislativo versus Judicirio: o caso da clusula de barreiraJos Paulo Martins Junior (Docente, Cincia Poltica Unirio)Emilie Kalyne Munhoz (Mestranda, PPGD Unirio)Matheus Cavalcanti Pestana (Graduando, Cincia Poltica Unirio)ResumoAs relaes entre os poderes costumam ser conflituosas. A partir dos escritos deMontesquieu e Federalistas, foram construdos arranjos institucionais em que os poderessefreiamesecontrolammutuamente, assimdevemosesperar queatritosentreelesocorram com frequncia. So inmeros os exemplos desses conflitos na poltica brasileira. Desde aconstituiode1988, oJudicirioveminterferindoetomandodecisesqueimpactamdiretamente as regras eleitorais e partidrias no Brasil, causando incmodo aos polticos.Os casos so inmeros, tais como a verticalizao das alianas eleitorais, a limitao damigrao partidria e sobre a validade da lei da ficha limpa.UmadecisodoSupremoTribunal Federal queenvolveumuitapolmicafoi adeclarao de inconstitucionalidade da Clusula de Barreira. A chamada de clusula dedesempenho foi definida pela Lei 9096/95 (PL 1670/89), no artigo 13, que foi declaradoinconstitucional pelo STF, pela ADN n 1351-3 e ADN n 1354-8.O objetivo do trabalho investigar as relaes entre o Judicirio e o Legislativo noBrasil ps-1988, especialmenteatramitaodoPL1670/1989, quesetornouaLei9096/1995 e de que maneira ocorreu a interferncia do Judicirio na matria.Palavras-chave: legislativo, judicirio, relaes, poderes, conflito, cooperao.1IntroduoEsse trabalho um dos produtos do Projeto de Pesquisa "Os partidos polticos nadefiniodasregraseleitoraisepartidrias, quefoi apresentadonaABCP/2012. Oprojeto de pesquisa nasceu da constatao da instabilidade institucional no que se refereaeleiesepartidosnoBrasil. DesdearedemocratizaoforamrealizadasnoBrasildezenas de eleies para todos os cargos e unidades da federao. A cada pleito, novasregras eleitorais e partidrias so criadas. Oobjetodeestudodoprojetosoessasregrasdojogoe a suatramitaonoCongresso Nacional. A preocupao central investigar como tramitaram as propostas ealteraes de leis partidrias e eleitorais. O intuito avanar na discusso que envolvepoder Legislativo e partidos. A pesquisa pretende lanar luzes sobre como os partidos secomportam quando tratam de mudanas institucionais que mais potencialmente podemafeta-los.Dentre essas mudanas,oestabelecimentodaclusuladebarreirapelaLlei9096/1995 foiuma dasmais controversas ao dividiros partidos internamentee aoserquestionada e barrada pelo Supremo Tribunal Federal. O estudo das relaes entre os poderes na cincia poltica privilegia a anlise dasrelaes entre o executivo e o legislativo.So poucos os trabalhos que tratam da relaoentre o legislativo e o judicirio. Menor ainda a quantidade de trabalhos que foca arelao entre legislativo e judicirio quando est em jogo a definio de regras eleitorais epartidrias.SabemosqueoBrasil, desde1988, temsidoprdigoemalterarsualegislaopartidria e eleitoral. A despeito de todo o discurso sobre reforma poltica, a verdade quea cada eleio novas regras so estabelecidas. No acreditamos que essas mudanaspossamacarretaremumainseguranajurdica, noobstante, todasessasmudanasaumentam a incerteza que permeia todo processo eleitoral.GrandepartedasmudanasnasregrasdojogopartiramdoPoder Legislativo,entre elas, no considerar o voto em branco como voto vlido, a reeleio para os chefesdo executivo, mandato de quatro anos para o executivo, entre vrias outras. Alm dasmudanas promovidas pelo Poder Legislativo, o Poder Judicirio, quer seja por meio doSTF,oupor meiodoTSE, tambmimpsimportantesinterpretaesquecausaramimpactosemelhante auma mudanana legislao, entre elas averticalizaodas1alianas eleitorais, a redefinio do nmero de vereadores e de deputados federais porestado, as decises sobre fidelidade partidria e sobre a validade da lei da ficha limpa,etc. Dentre essas decises judiciais, uma das mais importante porque envolveu umarelao conflituosa entre os partidos polticos e os poderes Legislativo e Judicirio, nsdevemos destacar aquela que declarou inconstitucional a clusula de barreiraestabelecida pela lei 9096/1995.Esse artigo est divido em mais quatro sees, alm dessa introduo. Na prximatrataremos das relaes entre o judicirio e o legislativo nos EUA e no Brasil e do papelexercidopelascortes supremas nocontroledaconstitucionalidadenosdoispases,seguidadeumaapresentaodasintervenesdojudicirionasregraseleitoraisepartidrias no Brasil e, finalmente, faremos uma anlise sobre o processo que envolveu acriao da Lei 9096/95 e da declarao de inconstitucionalidade do artigo 13 dessa lei,que previa a criao de uma clusula de barreira, encerremos o texto comasconsideraes finais onde faremos consideraes sobre o papel do judicirios nas regraseleitorais e partidrias no Brasil. A Suprema Corte no constitucionalismo democrticoMuito tem se falado sobre o ativismo judicirio e sobre a judicializao da poltica,em geralcom um vis negativo. De fato, possvelperceber uma ampliao do papelexercidopeloPoderJudicirio nasdemocracias, seja nasmais consolidadas, como osEUA,a Alemanha eaFrana,sejanasmaisjovens,na Europa, casosdeEspanhaePortugal, e na Amrica Latina, como Brasil, Argentina e Venezuela.Ocasoestadunidenseemblemticoporquesetratadomaisantigoeclaromodelo de separao de poderes em um regime presidencialista. De fato, o federalismo ea separao de poderes com a criao de uma corte superior para tratar de questes deconstitucionalidade constituemtraos marcanteseexcepcionais doarranjopolticodosEUA. Os pais fundadores dos EUA, inspirados por Montesquieu, estavam preocupadosemcriar ummodelodegovernoemqueexistisseumcontroleeumalimitaodospoderesexercidospor cadapartegovernante. Madison, emseuseminal "FederalistPaper, #51, j afirmava, ainda no sculo XV, que a ambio deve ser equilibrada com aambio. Ele entendia que nenhum homem capaz de resistir s tentaes de oprimir2seu semelhante e que a concentrao de poder levaria inexoravelmente tirania. Dessaforma, o governo constitucional, regido por leis escritas, exigiria a criao de mecanismosde controle da constitucionalidade dos atos do legislativo e do executivo. Contudo, valedestacarqueocontroledaconstitucionalidadedasleispelopoder judicirionoestexplicitamente inserido na constituio dos EUA. Atualmente existemcorrentes de opinio no campo jurdico no questionam,baseadosnaprpriaconstituioestadunidense, opoder dojudicirioemcontrolar aconstitucionalidade. Ainda que j tivesse sido sugerido e defendido por Hamilton durante aconvenoconstitucional eno"Federalist Paper,#78, essepoder foi conquistadodeforma jurisprudencial a partir da clebre contenda entre Marbury v. Madison, em 1803. Aposio da Suprema Corte nesse referido caso estabeleceu a noo de que a legislaoordinria est subordinada Constituio, especialmente porque se trata de umaconstituio escrita. Apartir dessa deciso e de outras que a ela se seguiram,estabeleceu-se solidamente na jurisprudncia dos EUA o poder de reviso judicial.Aconsolidaodopoder daSupremaCortenosedeusemaocorrnciadeembates importantes com o executivo e com o legislativo. Ao longo da histria dos EUAexistiram perodos de intenso conflito entre o judicirio e os dois outros poderes. Aindaduranteoperododeelaboraodaconstituioocorreramimportantesdebatesentrefederalistaseanti-federalistasacercadopapel quedeveriaser desempenhadopelascortes. Emendassugerindoacriaodeumcomitlegislativoparasupervisionar asdecises da Suprema Corte foram criadas, mas no prosperaram. O desacordo entre osdois principais grupos polticos no prosperou nesse campo porque existiam outros muitomais relevantes e as cortes eram consideradas o poder menos perigoso.Na viso de Miller (2009), aps a ratificao da constituio, as cortes se tornaramuma questo partidria e ideolgica para o novo regime, com os Federalistas apoiandocortes federais fortes e os Democratas-Republicanos (Jefersonianos) temendo que elasse tornassemmuito poderosas. Esses ltimos acreditavamque as cortes federaisdeveriam se submeter aos poderes eleitos e defender princpios majoritrios, enquantoque os primeiros defendiam a noo de que as cortes deveriam servir como fiscais dopoder do Congresso, desempenhando um papel contra majoritrio no sistema de governodos EUA.Desdeadisputainicial sobreasprerrogativaseopapel dascortes, diversosperodos de conflito ocorreram entre as cortes e os outros poderes. O primeiro logo no3perodo Jefersoniano no comeo do sculo XX, o qualfoidecisivo para que as cortespudessem estabelecer seu poder de reviso judicial com a j referida deciso da disputaentre Marbury v. Madison, de 1803, suplementada pela disputa entre Martin v. HuntersLessee, de 1816. A independncia do judicirio foi novamente posta em questo duranteo perodo Jacksoniano. Na viso de Miller (op. Cit.), a eleio de Andrew Jackson comopresidente em 1828 trouxe uma nova era populista para os EUA. Os Jacksonianos eramfortesdefensoresdademocraciamajoritriaebuscarameliminarqualquervestgiodeelitismo do sistema poltico. Eles compartilhavam com os Jefersonianos a desconfiananojudiciriofederal, procurarammanter distnciadosjuzeseintroduziramdiversosprojetosdelei comobjetivosdeenfraquecer ascortes. Valedestacar queemduasocasiesoPresidenteJacksonserecusouaseguir asdecisesdaSupremaCorte,contudo, ao invs de atacar a Suprema Corte diretamente, ele buscou controla-la a partirda indicaode aliados parasua composio,inclusive a nomeao do presidente dacorte aps a morte de John Marshall, seu principal oponente, em 1835.O'Brien (2005) cita uma clebre frase do presidente da Suprema Corte Rehnquistem queeleafirma quenoh razoparaqueoPresidente nonomeieparaacorteaqueles queso simpticosaosseus princpios polticos e filosficos. Talvez poressanoo, os estadunidenses sempre pareceram aceitar bem a noo de que os presidentestm o direito de colocar na Suprema Corte aqueles que concordam com suas vises defuturo e assim evitar conflitos mais greves entre o executivo e o judicirio.Na segunda metade do sculo XX, alguns anos antes da ecloso da guerra civil,mais uma vez ocorreu uma grande polmica em torno de uma deciso da Suprema Corte.Trata-se do caso Dred Scott v. Sandford, julgado em 1857. Tendo como contexto polticouma importante diviso dos EUA em torno da questo da escravido, dividindo o pas emestados escravocratas e no escravocratas, a Suprema Corte tomou uma deciso queviolavaosdireitosdaspessoasnegras. Emoutraspalavras, adecisodojudicirioconsiderava que os negros no eram pessoas para a constituio dos EUA.ParaMiller(op.cit.), essadecisoindignouosabolicionistasecontribuiuparaaascenso do novo partido republicado, liderado por Abraham Lincoln. Pode-se dizer que adecisodaSupremaCortecontribuiudecisivamenteparalevaropasguerracivil emuitos(Warren, 1926eFehrenbacher, 1978, apudMiller, 2009) argumentamqueadecisofoi diretamenteresponsvel pelavitriadeLincolnnaeleiopresidencial.Aofinal da guerra civil, a deciso da corte foi derrubada pela aprovao das 13, 14 e 15emendas constituio estadunidense, alm disso, ainda durante a guerra, a Suprema4Cortesetornousubservienteaosdesejosdapresidnciaechegouaserexcludadodilogoconstitucional acercadofuturodanao. Odesprestgiodacortecontinuoudurante o perodo do ps-guerra, conhecido como Reconstruo. Para Friedman (2002), aindependncia da Suprema Corte esteve em perigo quase constante, ainda que boa partedas ameaas e ataques jamais tenha se convertido em leis.Ao final dosculoXXocorreuumnovoconflitoentreoCongressoeascortesfederais. De acordo com Gillman (2002), naquele tempo, as cortes federais,especialmente a Suprema Corte, estavam ganhando poder e desempenhando um papelmaisimportantenaformulaodepolticas. Trsdecisesfavorveisaosinteressescorporativos1eoativismoconservador dascortesenfureceramosliberaislevandoosPopulistaseosDemocratasaseunirememoposioaoquedenominaramtiraniajudicial, enquanto que os Republicanos as louvavam por serem agentes das foras da leie da ordem.Durante o sculo ocorreram diversos outros embates importantes entre o judicirioe o legislativo. Entre os progressistas havia um sentimento generalizado de oposio scortes, identificadas como protetoras dos negcios em detrimento dos trabalhadores. Oconflito se tornou mais dramtico durante o governo de Franklin Roosevelt. A despeito davitria avassaladora dele, com os democratas conquistando no apenas a presidncia,mas tambm a maioria nas duas casas do congresso, as cortes continuaram com seuativismo judicial conservador at a reeleio de FDR em 1936. A partir desse momento,as presses sobre a Suprema Corte, exercidas a partir da Casa Branca e do Capitlio,viraram ojogoafavordosDemocratas.AntesojudicirioderrubavaosprogramasdoNew Dealpor 5 x 4, posteriormente, um dos juzes mudou de lado e passou a considerarconstitucionalidadedosprogramaspresidenciais. Pode-seafirmar, comoafirmarMiller(op.cit.) que Owen Roberts, o juiz que mudou de opinio, percebeu que as ameaas dosdemocratas Suprema Corte poderiam se tornar realidade aps mais uma esmagadoravitria nas urnas.A longoperodo dedomniodos Democrataspermitiuumavirada naorientaoideolgica das cortes. Antes dominada por interesses conservadores, deixaram um poucodeladoapreocupaocomostemaseconmicosepassaramaenfrentarcommaisfrequnciaostemasdosdireitoseliberdadescivis. Atemperaturadoembateentrejudicirio e legislativo subiu ainda mais a partir dos anos 50, dessa vez com a Suprema1 Declarou a inconstitucionalidade do imposto de renda, cortou dispositivos antitruste e se recusou a reconhecer direitos dos trabalhadores em greve.5Corteenfrentandoenormeoposiodosconservadores, especialmenteemvirtudedesuasdecisesrelacionadasdiscriminaoracial eemoposiocaasbruxascomunistas promovidas pelo Macartismo. Foram diversas reaes, tais como o "SouthernManifesto que defendia a noo de que as decises sobre discriminao racial eram umclaroabusodopoderjudicial eumausurpaodasatribuiesdoslegisladoresedolegislativo, almdeumaenormequantidadedeprojetosdelei quevisavamconterostribunais. Assim como nos conflitos anteriores, poucos projetos que visavam restringir ojudicirio lograram xito em se tornar leis.Os conservadores, tendo Goldwater, Nixon e Reagan frente, passaram a levar asquestes sobreoativismoliberal daSupremaCorteparaas campanhas eleitorais,mantendo-assobrepesadoataqueaolongodasltimasdcadasdosculoXX. Naperspectiva de Miller (op.cit.), sempre existiram fortes tenses entre legislativo e judicirioao longo da histria estadunidense. Ele destaca que ocorreu uma virada de mesa no quedizrespeitoaoapoioaojudiciriofederal. Atosanosde1950, osmaisvigorososataques provinham dos setores progressistas e liberais que acusam as cortes, dominadaspelos conservadores, de impedir o progresso social. A partir dos anos 50, as cortes setornaram mais liberais e passaram a sofrer ataques dos conservadores. Desde ento, oscandidatos e presidentes republicanos tornaramo judicirio emuma das principaisquestes do debate poltico-eleitoral.A longa experincia democrtica e de dilogo entre os poderes nos EUA contrastacom o que se observa no Brasil. Aqui passamos por diversos perodos autoritrios em queospodereslegislativosejudicirio, seemfuncionamento, erammerosapndicesdopoder executivo. Somente a partir da constituio de 1988 e que teve incio um dilogoinstitucional entre os trs poderes e apenas depois da virada do sculo que podemosafirmar que existe de fato uma independncia e um ativismo judicial e que se torna maisclaro o que chamamos de judicializao da poltica.O dilogo institucional nos EUA tem muito a nos ensinar sobre as nossas relaesentre os poderes ps constituio de 1988. Nossa lei maior consagrou todos os direitosdaDeclaraodaONUemdireitoslegais. NaspalavrasdeCittadino(2003, p.26), "apromulgao da constituio cidad [...] certamente a expresso definitiva daquilo quePierre Bouretz designa como movimento de retorno do direito no pas. Para ela, mais doque uma reconstruo, trata-se de um resgate da fora do direito que se d pela adoodo relativismo tico na busca do fundamento da ordem jurdica, pela defesa intransigenteda efetivao dos direitos constitucionalmente assegurados e do papel ativo do judicirio.6Dessa forma, o Judicirio no Brasil se encontra emconformidade comumatradiorepublicana, garantindonosomenteosdireitosindividuaismastambmosdireitos coletivos e difusos (Arantes, 2002, 2005; Arantes e Kerche, 1999; Vianna et al,1999; Koerner, 2005). Somando a esse fato a possibilidade de organizao da sociedadecivil e mecanismos como a Ao Direta e nconstitucionalidade, temos a possibilidade detransfernciadoembatepoltico, maiscomumnoExecutivoenoLegislativo, paraoJudicirio. H uma demanda crescente pela tentativa dessa transferncia do poltico parao judicirio, como observa Pogrebinschi (2011). Analisando 503 ADs e ADPFs que foramjulgadasentre1988a2009, elaobservaqueaamplamaioria(436) foi indeferidaeapenas 67 foram consideradasprocedentesou procedentes emparte.Logo noh,apartir de umprimeiro olhar, uma tentativa de controle da vontade do legislativo.Entretanto, existem67 outros julgamentos onde houve uma divergncia, tornandoprocedente o pedido de inconstitucionalidade. Vale ressaltar que, quando ocorre de uma norma ou parte dela, como foi o caso dalei 9.096/95, ser declaradainconstitucional, elacontinuapertencendoaoordenamentojurdico. Segundo o art. 52, inciso X da Constituio Federal de 1988, compete ao SenadoFederal "suspender a execuo, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional pordeciso definitiva do Supremo Tribunal Federal, ou seja, o STF pode declararinconstitucional mas somente o Senado pode suspender a lei, respeitando o princpio deque somente o poder que originou a norma, pode suspender sua validade. Percebe-se que h mais conformidade das decises do Supremo com a vontademajoritria do que divergncias, o que de certa forma contraria o senso comum. Por talmotivo, hanecessidadedefocoemestudodecaso, eonossotrabalhopretendeanalisar as mincias da questo da clusula de barreira, da tramitao at o julgamentodas duas ADs (1351-3 e 1354-8), alm de seus possveis reflexos. O judicirio e as regras eleitorais e partidriasDesde pelo menos o incio dos anos 2000 o judicirio brasileiro, notadamente oSTFeoTSE, temadotadoumainterpretaodasregrasdojogopoltico-partidrio-eleitoral de maneira constante e, na viso de muitos, entre eles Marchetti (2008),inovadora. Muitas dessas decises foram alvo de pesadas crticas por parte de jornalistase polticos, tanto no legislativo, como no executivo. A crtica mais recorrente ade que ojudicirio estaria avanando sobre as prerrogativas do legislativo.7J mostramos acima, a partir dos trabalhos de Pogrebinschi (op.cit.) que aatividadedecontroledeconstitucionalidadeexercidopeloSupremonoinvasivaecontrriaaosdesejosdolegislativoedoexecutivo. Namesmalinha, Oliveira(2005)conclui em seu trabalho que o judicirio, a despeito do grande aumento do acionamentodas instituies judiciais, no tem a prtica de intervir na formulao de polticas pblicas.Aqui nsprocuramosseguir ocaminhoquefoi sugeridopor Marchetti (op.cit.) queanalisar o comportamento do judicirio no em relao formulao de polticas pblicas,mas no que diz respeito definio das regras eleitorais e partidrias.Marchetti (op.cit.) segue a linha de Ferejohn (2002) para quem a judicializao dapoltica no ocorre somente no final do processo, "mas a judicializao da poltica podeocorrernomomentodadefiniodasregrasdojogoqueiroconstrangeratoresnasdisputas polticas (Marchetti, op.cit., p. 17). O judicirio tem cada vez mais interferido naconduta dos atores polticos. sso serve para alm das regras do jogo, tambm vlidopara os casos de aes penais que envolvem polticos em exerccio no legislativo e noexecutivo.O TSE um organismo do STF para matrias eleitorais o que eleva a governanaeleitoral ao nvel constitucional. sso fica patente quando se observa que o TSE quandopublica as regras eleitorais das eleies prximas altera-as interpretando o textoconstitucional, tambm ocorre do STF interpretar o texto constitucional na alterao dasregras do jogo eleitoral. Dessa relao no ocorre qualquer conflito explcito, uma vez quenohregistrodenenhumadecisodoTSEquetenhasidoreformadapeloSTF.(Marchetti, 2008), Emgeral, oTSEquemtemapalavrafinal sobreocontenciosoeleitoral epartidrio, tendo recebido um nmero crescente de demandas desde a promulgao daconstituinte. Dentre os processos distribudos ejulgado, Marchetti (op.cit.) chamaaateno para uminstrumento que no est diretamente associado ao contenciosoeleitoral, nem muito frequente, mas que causou muito impacto na disputa eleitoral, aconsulta. Esse dispositivo pode ser utilizado para responder, em tese, as dvidas que solevantadas por alguma autoridade com jurisdio federal ou por rgo nacional de partidopoltico. Na edio das regras da prxima eleio, o TSE, via de regra, incorpora suasrespostas s consultas.Foi emumadessasconsultasqueocorreuaprimeiragrandeinterfernciadojudicirio nas regras eleitorais e partidrias, causando grande reao parlamentar e um8conflito entre os poderes. Trata-se da consulta realizada pela direo nacional do PDT emagosto de 2001 sobre a possibilidade de um partido realizar diferentes alianas eleitoraispara as disputas para presidente e para governadores mesmo que esses partidos noestivessem na mesma coligao para presidente e que possussem candidatopresidencial.A pergunta expressa na consulta tinha a seguinte formulao: "Pode umdeterminado partido poltico (partido A) celebrar coligao, para eleio de presidente daRepblica, com alguns outros partidos (partido B, C e D) e, ao mesmo tempo, celebrarcoligao com terceiros partidos (E, F e G, que tambm possuem candidato Presidnciada Repblica) visando eleio de governador de estado da Federao?".2 A reposta do tribunal, aps amplo debate e por deciso no unnime, foi negativa,contrariandooseuprpriaentendimentodealgunsanosantes. NoentendimentodeMarchetti (op.cit.), essafoi umadecisoemblemticaparaorelacionamentoentreojudicirioe a competio partidria-eleitoral. Aresoluodo TSEque organizouaseleies de 2002 orientava os partidos de acordo com essa interpretao. Em resumo, "oTSE acrescentou s regras que regulamentariam as eleies de 2002 normas derivadasde sua prpria interpretao. (Marchetti, op.cit, p. 65).Ospartidospolticoseosparlamentaresreagiramrapidamenteaessadecisojudicial que contrariava seus interesses. Foram ao STF com aes diretas deinconstitucionalidade, que sequer foram acolhidas porque segundo o tribunal no existecontrole constitucional sobre atos regulamentares e sobre a validade de regras inscritasem leis ordinrias e no na constituio. Voltaram ao TSE com outras consultas sobre otema, o que ocasionou uma flexibilizao da medida, uma vez que passou a ser aceitoque um partido sem candidato presidencialpoderia se coligar com maior liberdade nosestados. Contudo, a estratgia mais bem sucedida foiexatamente aquela que se abriapara um maior conflito entre legislativo e judicirio, a mudana da interpretao judicialpela via legislativa.As iniciativas de alterao da interpretao judicial partiramda Cmara dosDeputadosedoSenadoFederal.A iniciativadoDeputadoWaldemarCostaNetonoprosperou, mas a proposta de emenda constitucional do Senador Bernardo Cabralavanoucomumavelocidadesemprecedentes. EmapenastrsmesesaPECfoi2 http:tse.!us.brhot"ites#atalogo$ublicacoesrevista%eletronicainternasr!13%2paginasresolucoesres21&&2.htm'aprovada em dois turnos no Senado Federal. Na Cmara dos Deputados o ritmo foi maislento a PEC foiaprovada e se tornou a Emenda Constitucionaln. 52 em maro de2006. Mesmo com a alterao da Constituio, os tribunais mantiveram para a eleio de2006 a mesma interpretao utilizada para a eleio de 2002, contrariando novamente osinteresses partidrios. Dessa deciso seguiram-se diversas consultas ao TSE que apsidas e vindas acabou por seguir a regra estabelecida em 2002. O argumento principal quelastreava a interpretao judicial era a busca pela nacionalizao dos partidos polticos,contudo o que aconteceu foi uma maior regionalizao das legendas.Desse caso, foi possvel depreender a insegurana jurdica causada pelos tribunaise um comportamento antagnico dos poderes judicirio e legislativo. Enquanto o primeirotomou, comrelaoaessamatria, umasriadedecisesrestritivas, oltimoreagiaadotando uma legislao mais permissiva.Outra deciso polmica que confrontou legislativo e judicirio foi a relacionada aonmerodevereadoresnosmunicpiosbrasileiros. Aconstituiofederal estipulatrsfaixas limites para a quantidade de vereadores por municpio de acordo comsuapopulao. Da mesma forma, nosso diploma maior elevou o municpio condio de entefederativo, dotando de autonomia administrativa, inclusive a de estabelecer o tamanho desua cmara dentro dos limites estabelecidos.O STF foi provocado pelo Ministrio Pblico a se manifestar com relao ao casoconcreto de um pequeno municpio que pretendia ampliar o tamanho de seu legislativo.Essa questo suscitou umamplo debate sobre nossa federao, especialmente acapacidadedegestoeconmicaeadministrativadospequenosmunicpios, almdaautonomiaqueexistiaparaquenovos municpios fossemcriados. Vrias tentativaslegislativas foram feitas para limitar essa autonomia, mas nenhuma deles prosperou.DiantedessequadroedaprovocaodoMP,oSTFalterouajurisprudnciaepassou a interpretar o texto constitucional de forma a entender que a proporcionalidadeprecediaaautonomiamunicipal,ouseja,impscertoslimitesautonomianoquedizrespeito a fixao do nmero de vereadores. O STF criou e TSE endossou 36 faixas declassificao dos municpios para o nmero de vereadores de acordo com o tamanho dapopulao. Comessa medida forameliminados nada menos que 8.,475cargos devereador em todo o pas.1&Obviamente, tal deciso provocou uma reao dos partidos e dos parlamentares,umavezquesabemosqueosvereadoressoimportantescaboseleitoraisparanaseleies legislativas nos estados. Assim como nas questes anteriores, os partidos e osparlamentares entraram com aes diretas de inconstitucionalidade para tentar barrar adeciso, as quais sequer chegaram a ser julgadas no mrito, uma vez que no se tratavade norma constitucional, mas de uma interpretao. Tambm agiram no parlamento em uma tentativa de contornar a deciso. Vriaspropostasdeemendasconstitucional foramresgatadasoucriadas, apensadasoutraspropostas anteriores. Prosperou a PEC 333/2004 que se tornou a EC 58/2009 e criou 24faixas de classificao dos municpios. O artigo 3. da EC 58/2009, que previa a retroaodos seus efeitos para a eleio municipal de 2008, teve sua constitucionalidadecontestada pela Procuradoria Geral da Repblica e foi julgada procedente porunanimidade pelo plenrio do Supremo Tribunal Federal.Nesse caso vemos mais uma vez os tribunais superiores atuando no sentido derestringir a liberdade de ao dos polticos e os partidos e os parlamentares buscandocontornar essa restrio com a adoo de uma legislao mais liberalizante (Marchetti,op.cit., p.104).A fidelidadepartidriafoi outrotemaqueprovocouumaintensarelaoentreojudicirio e o legislativo, mais especificamente a migrao partidria. Essa tem sido umaprtica recorrente dos polticos brasileiros desde a reorganizao partidria,especialmente nas criaes do PFL e do PSDB em meados dos anos 80. Depois disso,testemunhamosumaintensamigraoentreosparlamentaresparapartidosdabasegovernista, tanto de FHC, como de Lula. Em diversas ocasies o supremo foi questionadoacercadalegalidadedessaprticaecriouumajurisprudnciaqueafirmavaqueomandato era do parlamentar.Aps a crise do mensalo, durante o primeiro mandato de Lula, o tema voltou comforatotal. OsministrosdoSTFjvinhamseposicionandosobreapertinnciaderestringiralivremovimentaodeparlamentaresentre ospartidospolticos.A decisonesse sentido finalmente ocorreu aps uma consulta formalizada pelo DEM. A questoformuladapelopartidofoi aseguinte: "ospartidoseascoligaestmodireitodepreservar avagaobtidapelosistemaeleitoral proporcional quandohouver pedidodecancelamento de filiao ou de transferncia de candidato eleito por um partido para outralegenda? (Marchetii, op.cit., p.178).11 verdade que o Congresso Nacional buscou regulamentar a matria, mais de umadezena de propostas de emendas constitucionais foram propostas nessa direo, contudoo legislativo no conseguiu a restrio. J o TSE no teve dvidas e com apenas um votoem contrriodefiniram que os mandatos obtidos nas eleies proporcionaispertencemaos partidos polticos e no aos candidatos eleitos. O principal argumento que lastreou adeciso foi o de que poucos parlamentares conseguemvotao suficiente paraultrapassar o cociente eleitoral.EmaAtocontnuo,ospartidossolicitarammesadiretoradaCmaraosseusmandatos devolta, oquefoi negado. Os partidos sevoltaramentoaoSTFcommandadosdeseguranaeobtiveramoquedesejavam, adecisodoSTF,nosemdivergncia, confirmou a do TSE e estabeleceu como marco temporal a data da resposta consulta formulada pelo DEM, maro de 2007. Somente as migraes ocorridas apsessa data poderiam ser requisitadas pelos partidos.A deciso afinal no foi totalmente restritiva, de acordo com a resoluo do TSE n.22.610/073, a cadeira s poderia ser reivindicada se a migrao tivesse ocorrido sem justacausa, tais como fuso, incorporao ou criao de umnovo partido, mudanasubstancial oudesvioreiteradodoprogramapartidrioougravediscriminao, davaprazo de 30 dias para que o pedido fosse formulado e exigia que o parlamentar migrantetivesse ampla liberdade de defesa. A interferncia do judicirio no caso da migrao partidria no ocasionou conflitoentre os poderes. Esse foium caso em que os interesses do legislativo e do judicirioparecemconvergir. ssoficaexplcitoquandoobservamosasreaes parlamentaresdeciso judicial. Quase todas as propostas, principalmente a PEC 33/2007, de autoria deMarco Maciel, propunham contemplar a que havia sido decidido judicialmente.Para encerrar essa seo, vale discutir brevemente outro caso, de naturezadistinta, mas que ainda tem colocado em campos opostos o STF e partidos importantesnoCongressoNacional:.tTrata-sedaaopenal n.470, ochamadojulgamentodoMensalo. Muito j se falou sobre o julgamento que teve ampla cobertura da mdia e aolongo do qual foram julgados e condenados diversos polticos importantes, entre eles trsdos principais dirigentes do Partido dos Trabalhadores.O julgamento do mensalo ops diretamente o Supremo Tribunal Federal e setoresimportantes e influentes da Cmara dos Deputados e do Partido dos Trabalhadores. O3 http:(((.tse.!us.brinternetpartidos)idelidade%partidariares2261&.pd)12embate entre os poderes ainda ao longo do processo, antes do julgamento em plenrio,levoupropostadeemendaconstitucional 3/2011, propostapelodeputadodoPT-P,Nazareno Fonteles. A PEC, que foi aprovada pela Comisso de Constituio e Justia daCmara dos Deputados, prope que o Congresso tenha a autorizao para sustar atosnormativos do judicirio. O texto diz que o Congresso pode "sustar os atos normativos deoutros poderes que exorbitemdo poder regulamentar ou dos limites de delegaolegislativa4. Outra disputa surgida no bojo do caso do mensalo foi a da cassao automticado mandato dos parlamentares condenados no processo. O STF formou entendimento nosentido de que os condenados estariam cassados, mas a mesa diretora da Cmara doDeputadosnoaceitouessainterpretao. Aolongodoprocesso, osparlamentarescondenados acabaram por renunciar aos seus cargos, mas o embate entre os poderes foiforte. Comoresposta, osenadorJarbasVasconceloselaborouapropostadeemendaconstitucional n. 18/2013 que prev alterao do artigo 55 da CF para tornar automticaa perda de mandato de parlamentar nas hipteses de improbidade administrativa ou decondenao por crime contra a administrao pblica.Assim, vimosqueexisteumembateentrejudicirioelegislativoemtornodediversas questes no Brasil. Privilegiamos as questes partidrias-eleitorais porque soessas as demaior interesseparaos partidos eparlamentares. Oquefoi possvelperceber foiuma postura mais restritiva por parte do judicirio e uma mais liberalizantepor parte do legislativo. Da mesma forma, percebemos que o legislativo jamais ficou inerteperante s intervenes do judicirio. Sempre que se viram contrariados, os legisladoresapelaramparaoprpriojudicirioebuscaramalterar aconstituiooualegislaoordinria para contornar aquilo que consideravam obstculos sua liberdade de atuao.Passaremos agora apresentao e anlise do caso da clusula de barreira e veremosuma situao um pouco diferente.O caso da clusula de barreiraO estabelecimento de uma clusula de barreira est presente em diversos regimesdemocrticos, notadamente nos regimes parlamentaristas onde existe uma maiornecessidade de uma maioria parlamentar para sustentar o gabinete. Ocaso mais4 ".con!ur.com.brdlpec*311.pd)13emblemticoo da Alemanha, ondeumpartidotemqueconquistar5% dosvotos ouvencer eleies em pelo menos trs distritos para obter um assento no parlamento. A exigncia de um patamar mnimo de votos para conquistar uma cadeira no exclusividadederegimesparlamentaristasemdemocraciasconsolidadas, aArgentinatambm tem uma clusula de barreira que exige um mnimo de 3% dos votos. No Brasil, odebate sobre a convenincia desse dispositivo ocorre h muito tempo. Apesar do longodebate, em poucas vezes as regras estabeleciam a excluso de partidos por desempenhoeleitoral.NoBrasilps-1988, algum tipo declusulade barreiraesteve presente nas leis8713/93 e 9096/95, ambas foram objeto de ADN's e foram sustadas pelo STF. A primeiralei estabeleciaasnormasparaaseleiesde1994, importanteporqueseriaprimeiraeleiocasadadaredemocratizao, commuitoscargosemdisputa. Entreseus90artigos, umdeles, oartigo5 estabeleciaclusuladebarreiraparaolanamentodecandidatos presidncia da repblica, governadores e senadores. No primeiro caso, serianecessrio que o partido ou pelo menos um partido de uma coligao tivesse obtido nomnimo 5% dos votos vlidos para a Cmara do Deputados em pelo menos um tero dosestados oucontasse comum mnimode 3% dascadeiras dereferida casalegislativa;quanto aos demais cargos, seria necessrio atendar as mesmas exigncias acima ou terobtido no estado pelo menos 3% dos votos vlidos.O PRONA foi ao STF contra esse dispositivo da lei e, por maioria, o tribunal decidiuque no era vlida a exigncia de desempenho anterior para limitar a participao emuma eleio futura (Marchetti, op.cit.,p127). A resposta legislativa impugnao judicial jestava em tramitao no Congresso Nacional, a lei 9096/95 teve uma longa maturaodesde a sua proposio pelo projeto de lei 1670/1989, pelo deputado Paulo Delgado (PT-MG) at ser promulgada pela presidncia da repblica.A Clusula de Barreira foiumdispositivo que constavana Lei9096/95 em que,para que houvesse funcionamento parlamentar seria preciso que um partido conseguisseum porcentual mnimo de votos para a Cmara dos Deputados. Seu artigo 13 expressavaaclusuladaseguinteforma: "temdireitoafuncionamentoparlamentar,emtodasasCasasLegislativas paraas quais tenhaelegido representante,opartido que,em cadaeleio para a Cmara dos Deputados obtenha o apoio de, no mnimo, cinco por centodos votos apurados, no computados os brancos e os nulos, distribudos em, pelo menos,um tero dos Estados, com um mnimo de dois por cento do total de cada um deles.14 importante ressaltar que a Lei 9096/95 foi aprovada pelo Congresso Nacional esancionadapeloPoderExecutivo, logoumprojetodelei queseguiutodooprocessolegislativo e, de certa maneira, de acordo com os desejos da sociedade, que elegeu emrepresentantesA matria foi amplamente debatida na Cmara dos Deputados que chegou a criaruma comisso espacialpara aprecia-la, a Comisso Especialde Legislao EleitoralePartidriaCESP.Nofinal de1992otextochegouaoplenriodaCmaraondefoiaprovado por votao simblica no sem a posicionamento contrrio de parlamentares doPC do B, PPS e PSTU.RemetidoaoSenadoFederal, otextoentrouemregimedeurgnciaesofreudiversasemendasdasquais17foramaprovadas. Emsetembrode1993otextofoiremetido de volta Cmara para a apreciao do projeto substitutivo oriundo do Senado.O projeto voltaria pauta em regime de urgncia somente aps a posse de uma novalegislatura. Em23 de agosto de 1995, a materia vai para votao. Durante a discussao,os deputados Haroldo Lima (PCdoB - BA), Sergio Miranda (PCdoB - MG) citaram e seposicionaram contra a clausula de barreira. Logo, nota-se que j havia divergncia sobreesse aspecto do projeto de lei dentro da Cmara. Os contrrios, liderados por PDT, PSB,PTB e PCdoB, solicitaram a retirada do pedido de urgncia, enquanto que os favorveis,liderados por PMDB, PSDB, PFL e PT, solicitaramo encerramento da discusso.Passando-se a votao simblica, a materia foi aprovada e levada sano. Aclusula de barreira no impediria a existncia dos partidos, nemsequerimpediriaqueosparlamentareseleitostomassemposse. Asrestriessedariamnofuncionamento parlamentar das legendas, na restrio de acesso ao colgio de lderes, scomisses, ao fundo partidrio e ao tempo de televiso. Uma das disposies transitriasprevia para 2006 o funcionamento do mecanismo.Tologoalei foi sancionadadiversospartidos, PCdoB, PTB, PSB, PVePSC,apresentaram aes diretas de inconstitucionalidade para barrar o artigo que estabeleciaaclusulade barreirae osseus desdobramentos. Na AD1354-8,do PSC,em1996,haviadoispedidosdeliminares. OprimeirodelesrequeriaasuspeiodeSeplvedaPertence, quesegundodecisesanteriores, seriacontraospartidospequenos. Essepedidofoi negadode formaunnime, eo segundopedidoera umasolicitao dasuspensocautelardaclusuladebarreira, apesardamesmasentraremvigorem2006. A suspenso cautelar no foi concedida por unanimidade, mas a partir dela houve a15previso de que haveria um respeito da vontade majoritria pelo STF, j que na emendada deciso h o argumento da clusula no contrastar com a Constituio e da mesmaser umartifciode"proteoparaaprpriaconvivnciapartidria (Marchetti, op.cit.,p.134).A decisofinal doplenriosobreomritodasADadin'ssaconteceuapsaseleies de 2006 quando o fato objetivo se deu, diversos partidos haviam conquistadocadeiras legislativas, mas teriam seu funcionamento parlamentar prejudicado pela lei.OSTF declarou inconstitucional o artigo 13 da lei. 9096/95. O argumento utilizado era que aclusula de barreira contrariava o princpio de representao e manifestao poltica dasminorias. Paraosministros, haviaumaviolaodoartigo17, 1 daConstituioFederal, que afirma que "assegurada aos partidos politicos autonomia para definir suaestrutura interna, organizac o e funcionamento e para adotar os criterios de escolha e oregime de suas coligac es eleitorais, semobrigatoriedade de vinculac o entre ascandidaturas em ambito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutosestabelecer normas de disciplina e fidelidade partidria. O Ministro relator Marco Aurlio argumentou, em julgamento ocorrido em07/12/2006, onze anos aps a lei ser aprovada, que, em decorrncia do fato de que comaaprovaodaclusuladebarreira, considerandoaseleiesparaaCmaradosDeputados, dos29partidosexistentes, somente7(PT,PMDB, PSDB, PFL, PP,PSB,PDT) teriamo funcionamento parlamentar citadono artigo 13da Lei 9.096/95. Osmesmos partidos teriam 99% do Fundo Partidrio, restando os outros 1% para os outrospartidos, que tambmteriamapenas 2 minutos de propaganda partidria emredenacional, enquanto os partidos comfuncionamento parlamentar teriam20 minutos.Tambm segundo o relator, "Em ltima anlise, as previses constitucionais encerram aneutralizao da ditadura da maioria, afastando do cenrio nacional ptica hegemnica e,portanto, totalitria. Concretizamemtermos de garantias, o pluralismo poltico toinerente ao sistema proporcional, sendo com elas incompatvel regramento estritamentelegal a resultar em condies de exerccio e gozo a partir da gradao dos votos obtidos. Para o ministro, o "enxugamento do rol automtico, pela vontade do povo, dequem emana o poder. Se o povo no vota em um partido, esse partido no conseguireleger representantes. J o Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, afirma que possvelao legislador estabelecer uma clusula de desempenho, desde que assegure "a todos ospartidos, com observncia do princpio de igualdade de chances, o acesso aos meios erecursos necessrios para competir no prlio eleitoral seguinte, includos, nesse sentido, o16acesso ao rdio e televiso e aos recursos do fundo partidrio. Verifica-se certo suporte clusula de barreira, mas com certas alteraes. Logo, para o Ministro Gilmar Mendes,o problema no se encontra na clusula em si, mas nas condies reservadas para osque no a alcanarem. Para o Ministro, a lei uma afronta ao princpio da igualdade dechancesoudeoportunidades, justamentepor noassegurar odireitodasminorias.Assim, a lei considerada inconstitucional, com todos os outros Ministros, Lewandowski,CarmemLucia, ErosGrau, CarlosBrito, Cesar Peluzo, SeplvedaPertenceeEllenGracie, seguindo o voto do relator. O mais interessante nesse caso foia mudana de orientao do judicirio entresuas manifestaes quando das consideraes das liminares em 1996 e a deciso finalem 2006. Para Marchetti, "em 1996 estava claro o clima de se orientar pelas prefernciasparlamentares majoritrias mantendo a regra que limitaria o funcionamento de partidoscomummenor nmerodevotos. Jem2006venceuatesedequeaclusuladedesempenho contrariava os princpios estabelecidos no caput do artigo 17 da constituiofederal, que devemser assegurados pelo nosso sistema partidrio, dentre eles omultipartidarismo. Ao declarar inconstitucional a clusula de desempenho, os ministros doSTFsealinharamcomasprefernciasparlamentaresminoritrias (Marchetti, op.cit.,134). A mudana de posicionamento pode ser melhor compreendida quando analisamoso clima poltico e a composio da corte. Em 1996, o pas vivia uma fase de estabilidadeeconmica e poltica, com a governo sendo apoiado solidamente pelos grandes partidos,em 2006 estvamos em meio crise poltica ocasionada pelo mensalo, com o governosustentado pelo PT e por diversos partidos menores. A composio tambm foi alteradasubstancialmente, apenastrsministrosde1996permaneciamemsuascadeirasem2006. Mesmo eles mudaram seu voto. fcil perceber que as decises do judicirio comrelao s regras eleitorais e partidrias podem mudar ao sabor dos ventos polticos.A principal reaoparlamentarfoi aintroduodaPEC02/2007, deautoriadoSenador Marco Maciel, o mesmo que na condio de vice-presidente havia sancionado alei 9095/96. APECprope a alterao da constituio para inserir a clusula dedesempenho. Talvez por ter sido desde o incio um tema controverso, que colocou emladosopostospartidosaliadosdePSDBePTnogovernofederal, oconflitoentreojudicirioeolegislativonotenhasidomuitointensonessecaso. Contudo, devemosressaltar que diferentemente dos casos anteriores, com relao clusula de barreira, o17judicirio adotou uma interpretao mais liberalizante, enquanto que o legislativo procurouser mais restritivo.Consideraes fnaisOpresentetrabalhotratoudarelaoentreospoderesjudicirioelegislativo,buscandoexplorar maisprofundamenteonicocasoemqueumanormapartidria-eleitoral discutida e aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pela Presidncia daRepblica foi julgada em parte inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, trazendo tona um conflito entre os poderes.A separao de poderes, tal como foi pensada por Montesquieu, formulada pelosFederalistaseimplementadanaConstituiodosEUA, pressupequeocorrerumchoque entre os poderes. Esse , afinal, um dos objetivos da separao, contrapor asambies dos homens que ocupam os cargos de poder.A trajetria da relao entre judicirio e legislativo nos EUA muito mais longa emuito mais conflituosa. Em mais de 200 anos diversas situao levaram a tenses entreos poderes e colocaram em xeque a autonomia e as prerrogativas dos tribunais. Mesmoassim, possvel afirmar que ambos os poderes, em conjunto com o executivo, criaramumdilogoconstitucional quepermitiuaconsolidaoeoaprofundamentodoregimedemocrtico nos EUA.NoBrasil asituaodiferenteporquetemospoucomaisdeumdcimodaexperincia democrtica dos EUA. O dilogo institucional entre os poderes s comea aganhar contornos analisveis a partir dos anos 90. Mesmo com pouco tempo, possvel,a partir das anlises que fizemos aqui e dos dados levantados por Pogrebinschi (op.cit.),afirmar que ainda no ocorreu um conflito aberto entre os poderes, pelo contrrio, existeuma cooperao e um respeito institucionalentre eles.A partir disso, h uma possveltendncia a afirmar que o Supremo Tribunal Federal possui uma postura majoritriaporterdefinido como procedentepoucas ADs, apesardouniversodeanliseserrestrito,comparado com os estudos apresentados sobre a Suprema Corte americana. As palavras da referida autora servem como concluso desse trabalho. Ela afirmaque "ao contrrio do que muito se supe, nem o Congresso Nacional exercita de formadbil suavocaomajoritria, nemoSupremoTribunal Federal cumpredeformatorobusta sua competncia contramajoritria. Diante de sua imagem de gigante construdapelaliteratura sobre ajudicializaodapoltica, oSupremo , na verdade,muitomais18deferente ao Congresso do que a ausncia de pesquisa emprica pode fazer supor. Diantedesuaimagemapequenadapelamdia, oCongresso, contudo, conhecebemoseuverdadeiro tamanho e reage responsivamente s investidas do Judicirio, de modo a dara ltima palavra e confirmar que a genuna expresso da sobrerania populardefinitivamente lhe pertence (Pogrebinschi (op.cit., p.183.)Referncias bibliogrfcasARANTES, R. (2002). Ministrio Pblico e Poltica no Brasil. So Paulo, Sumar/Educ.ARANTES, R. (2005). Constitucionalism, the Expansion of Justice and the Judicializationof Politics in Brazil. n: SEDER, R., SCHJOLDEN, L. e ANGELL, A. (orgs.). TheJudicialization of Politics in Latin America. New York, Palgrave.ARANTES, R. e KERCHE, F. (1999) "Judicirio e Democracia no Brasil. Novos Estudos,v.54, pags. 27-41.CARVALHO, E. (2004). "Em busca da Judicializao da Poltica no Brasil: Apontamentospara uma nova Abordagem. Revista de Sociologia e Poltica, v.23, pags. 115-126. CARVALHO, E. e OLVERA, V. A (2002). "A judicializao da poltica no Brasil: Conceitose Paradoxos. Umtemaemaberto. 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