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  • 135Arq Bras Endocrinol Metab vol 47 n 2 Abril 2003

    RESUMO

    Os cidos graxos (AG) representam uma fonte importante de energiadurante exerccios de intensidade leve ou moderada, e principalmentenaqueles de durao prolongada. A utilizao dos AG pelos msculosesquelticos depende de passos importantes como a mobilizao,transporte via corrente sangnea, passagem pelas membranas plas-mtica e mitocndrial, -oxidao e, finalmente, a oxidao no ciclode Krebs e atividade da cadeia respiratria. O exerccio agudo e otreinamento induzem adaptaes que possibilitam maior aproveita-mento dos AG como fonte de energia, ao mesmo tempo em que oglicognio muscular preservado. Contudo, as tentativas de manipu-lao da dieta e suplementao com agentes ativos para aumentar amobilizao e utilizao dos AG durante o exerccio no apresentamresultados conclusivos. Nesse trabalho, a hiptese de que o ciclo deKrebs o fator limitante da utilizao de cidos graxos pelo tecido mus-cular no exerccio prolongado apresentada. (Arq Bras EndocrinolMetab 2003;47/2:135-143)

    Descritores: Exerccio; Oxidao de cidos graxos; Agentes lipolticos;Ciclo de Krebs; Glicognio

    ABSTRACT

    The Krebs Cycle as Limiting Factor for Fatty Acids Utilization During Aero-bic Exercise.Fatty acids are important fuels for muscle during moderate and pro-longed exercise. The utilization of fatty acids by skeletal muscle dependson important key steps such as lipolysis in the adipose tissue, plasma fattyacids transport, and passage through plasma and mitochondrial mem-branes, -oxidation, and finally oxidation through the Krebs cycle andrespiratory chain activity. Acute exercise and exercise training induceadaptations that lead to an increase in fatty acid oxidation. As a resultmuscle glycogen is preserved. Nevertheless, diet manipulation and sup-plementation with lipolytic agents that raise fatty acids mobilization andoxidation during exercise failed to show beneficial results on exercise per-formance. The hypothesis that Krebs cycle is a limiting factor for fattyacid oxidation by the skeletal muscle during prolonged exercise is pre-sented herein. (Arq Bras Endocrinol Metab 2003;47/2:135-143)

    Keywords: Exercise; Fatty acid oxidation; Lipolytic agents; Krebs cycle;Glycogen

    reviso

    Ciclo de Krebs Como Fator Limitante naUtilizao de cidos Graxos Durante oExerccio Aerbico

    Rui CuriCludia J. LagranhaJair Rodrigues G. Jr

    Tania Cristina Pithon-CuriAntonio Herbert Lancha Jr

    dico L. PellegrinottiJoaquim Procopio

    Laboratrio de Fisiologia Celular(RC, CJL, JP), Departamento deFisiologia e Biofsica, Instituto de

    Cincias Biomdicas,Universidade de So Paulo;

    Departamento de Educao Fsica(JRGJ), Universidade Estadual

    Paulista Julio de MesquitaFilho, Bauru; Universidade

    Metodista de Piracicaba (TCPC,ILP), FACEF, Piracicaba;

    Unicastelo (TCPC), So Paulo e;Escola de Educao Fsica

    (AHLJr.), Departamento deBiodinmica do Movimento do

    Corpo Humano, Universidade deSo Paulo, SP.

    Recebido em 17/07/02Revisado em 18/12/02

    Aceito em 21/02/03

  • Ciclo de Krebs e Limitao do ExerccioCuri et al.

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    OEXERCCIO FSICO DEMANDA intenso consumo detrifosfato de adenosina (ATP), que pode aumen-tar em at dezenas de vezes dependendo da intensi-dade e durao do esforo. Nos msculos esquelticos,h sistemas muito eficientes que possibilitam a ressn-tese constante do ATP que est sendo utilizado para acontrao muscular. Estes sistemas so o da fosfocre-atina, gliclise e a fosforilao oxidativa. Este ltimo o mais complexo dos trs e depende da utilizao dooxignio. Tem como caracterstica baixa produo,porm capacidade praticamente ilimitada, sendo apto afornecer energia para a ressntese de ATP, principal-mente em esforos de longa durao com intensidadesleve ou moderada. Nesta condio, o glicognio preservado havendo maior utilizao dos cidos graxos(AG) como substrato energticos (1).

    Essa preferncia dos msculos esquelticospelos AG muito importante em exerccios fsicos delonga durao, j que os lipdios armazenados noorganismo na forma de triacilglicerol (TG) represen-tam o principal estoque de energia disponvel (2). Poroutro lado, o glicognio, imprescindvel durante oexerccio fsico, possui um estoque relativamente limi-tado, que necessita ser preservado para continuarsendo utilizado concomitantemente aos AG, pormem menor proporo, at o final do esforo.

    Os TGs esto estocados principalmente notecido adiposo (~ 17.500mmol em um homem adul-to, magro), msculo esqueltico (~ 300mmol) e plas-ma (~ 0,5mmol). O total de energia estocada comoTG cerca de 60 vezes maior que aquela comoglicognio. Desta forma, a oxidao dos AG durante oexerccio possibilita manter a atividade fsica por pero-dos mais prolongados e retarda a depleo doglicognio e a hipoglicemia.

    Nos exerccios fsicos de longa durao, imprescindvel que a utilizao do estoque abundantede TG/AG seja a maior possvel justamente para quea quebra do glicognio muscular e a oxidao de gli-cose circulante sejam as menores possveis. A hipteseque parece melhor explicar esse desvio do metabo-lismo dos carboidratos para os lipdios o ciclo deRandle (3). Com o aumento da disponibilidade de AGh maior oxidao deste diminuindo paralelamente adegradao de glicognio e a utilizao de glicose. OsAG desempenham assim papel crtico na manutenoda atividade fsica e, por isso, uma etapa limitante destaatividade a liplise.

    O estoque de glicognio muscular suficientepara pouco mais de uma hora de esforo de intensi-dade moderada, fazendo com que os msculos depen-dam tambm da captao de glicose circulante para

    manter a contrao. Por sua vez, a manuteno daglicemia fundamental, principalmente para preservara funo cerebral durante exerccios prolongados, nosquais se observa diminuio da glicemia para at cercade 40-50mg.dL-1, levando o indivduo exausto (4).Por isso, ajustes ocorrem para aumentar a eficincia namobilizao dos AG a partir do tecido adiposo, que um estoque abundante.

    Os depsitos energticos do organismoOs lipdios armazenados representam a fonte corpreamais abundante de energia potencial. Em relao aosoutros nutrientes, a quantidade de lipdios disponvelpara a produo de energia quase ilimitada. Nohomem, uma massa aproximada de 9000g de lipdios suficiente para fornecer 81000Kcal. Este estoquepermitiria a um homem adulto andar 259 horas oucorrer durante 67 horas. Por outro lado, o estoque deglicognio muscular (350g) fornece 1400Kcal, per-mitindo caminhar apenas 4,8 horas ou at mesmo cor-rer durante 1,2 horas (2).

    Os AG, estocados na forma de TG, representama principal reserva energtica disponvel no homem. Oarmazenamento de TG ilimitado, j que a esterifi-cao dos AG com o glicerol no depende de gua,diferentemente do glicognio que estocado com 3gde gua para cada grama do polmero. Outra vantagemdos AG sua eficincia energtica (9Kcal.g-1), maisque 2 vezes a do glicognio/glicose (4Kcal.g-1) (5).Por esses motivos, e de acordo com a primeira lei datermodinmica (lei da conservao de energia), todoexcesso de energia proveniente da alimentao,incluindo gorduras, carboidratos e protenas, armazenado na forma de TG.

    Mobilizao e captao dos cidos graxosnos msculos esquelticosAs fontes de AG para utilizao nos msculosesquelticos so o TG do tecido adiposo, o TG dosquilomicrons e lipoprotenas de muito baixa densidade(VLDL) circulantes, e o TG do prprio tecido muscu-lar que pode atingir uma quantidade de cerca de 400gem indivduos treinados (5).

    A mobilizao dos AGL a partir do tecido adi-poso dependente da taxa de liplise, da capacidadede transporte dos AGL pelo plasma e da reesterificaodesses pelos adipcitos.

    A atividade lipoltica do tecido adiposo aumen-ta com o exerccio (6), em particular no treinamentoaerbio, que resulta em um aumento significativo nonmero e na atividade das mitocndrias alm de umaumento na oxidao de AGL. Contudo, em alguns

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    estudos foi sugerido que a noo de que o treinamen-to sempre aumenta a eficincia da utilizao dos AGLdurante o exerccio (7) pode no ser correta. Turcottee cols. (8) mostraram que a captao de AGL do plas-ma significativamente maior em homens treinadosdo que em no treinados, durante 3 horas de exerc-cio. Esses dados so sugestivos de que a captao deAGL pelo msculo esqueltico mediada por umtransportador saturvel e que o treinamento aumentaa capacidade mxima para o transporte de AGL nomsculo esqueltico, possivelmente por elevar o con-tedo de carreadores de AG.

    Ainda no est muito bem estabelecida qual aprincipal fonte de AG disponveis para oxidao nosmsculos esquelticos. Alguns autores sugerem que otreinamento aumenta a atividade de degradao dotriacilglicerol intramuscular (TGIM) em relao aoestocado no tecido adiposo (5). Foi observado que ocontedo intramuscular de TG aumenta com o treina-mento (5) e pode diminuir de 25% a 50% durante oexerccio prolongado de intensidade de 55% a 75% doVO2mx. (9). Uma vantagem significativa da utilizaodo TGIM que as etapas de transporte dos AG noplasma e sua passagem atravs da membrana da clulamuscular no so necessrias e, portanto, a sua oxi-dao mais rapidamente disparada.

    Em relao aos AG provenientes do tecido adi-poso, o primeiro passo para sua utilizao a mobili-zao, ou seja, a hidrlise do TG. O metabolismo doadipcito controlado por hormnios e pelo sistemanervoso. De um lado, a insulina inibe a liplise eestimula o processo de lipognese e esterificao (10).Por outro lado, a mobilizao dos AG estimuladapela ao da adrenalina, noradrenalina, cortisol e hor-mnio do crescimento (GH). Em adipcitos de ratos,as catecolaminas, glucagon, hormnio do crescimentoe os hormnios adrenocorticotrpicos aumentam aliplise (5), mas em adipcitos isolados de humanosapenas as catecolaminas, hormnio estimulador datireide e paratormnio tm mostrado efeito lipolticoconsistente (11).

    Apenas as catecolaminas podem estimular aliplise no homem, em condies fisiolgicas. As cate-colaminas tm ao inibitria atravs de receptores 2-adrenrgicos e estimulatria via receptores 1-adrenr-gicos, por alteraes correspondentes na atividade daadenilato ciclase e na produo intracelular de AMPc(12).

    O exerccio agudo promove liberao intensados hormnios lipolticos e aumenta a responsividadedos receptores -adrenrgicos dos adipcitos s cate-colaminas (13). Em conseqncia, aumenta a mobi-

    lizao e da concentrao plasmtica de AG, que opasso determinante para sua maior oxidao nos ms-culos esquelticos (3). Stich e cols. (14) demons-traram que trabalho aerbio intermitente (como porexemplo, 50% do VO2mx. durante 60 minutos comperodo de repouso semelhante entre uma sesso eoutra) so mais eficientes na mobilizao dos AG doque apenas uma sesso de esforo fsico. No caso dotreinamento, observado um aumento na concen-trao plasmtica de AG, porm a oxidao desses nosmsculos esquelticos depende da intensidade relativado esforo (15).

    Romijn e cols. (16) estudaram a mobilizao eutilizao de carboidratos e lipdios durante exercciosde diferentes intensidades (25%, 65% e 85% doVO2mx.) em homens treinados. Como esperado, acaptao de glicose pelos msculos e a glicogenliseintramuscular aumentaram proporcionalmente intensidade do esforo. A liplise e a conseqente li-berao dos AG na circulao foram mais elevadasdurante o exerccio de menor intensidade. Por outrolado, a liplise do TG intramuscular (TGIM) foi ele-vada com o aumento da intensidade do exerccio.Resultados semelhantes foram encontrados, maisrecentemente, no estudo dos mesmos parmetros emmulheres treinadas (17).

    Metabolismo dos triacilgliceris intramusculares(TGIM)Durante os primeiros 90min de exerccio, a taxalipoltica aproximadamente 2 vezes maior do que ataxa de oxidao dos AG. No entanto, a entrada deAG no plasma similar taxa de oxidao no mesmoperodo. Alguns pesquisadores sugerem que outrafonte de lipdios, alm dos AG provenientes do tecidoadiposo, provavelmente plasmtico ou TGIM, tam-bm oxidada pelo msculo (18,19).

    Postula-se que a reserva mais importante deAGL no plasmticos, disponvel para a oxidaodurante exerccio moderado e prolongado, o TGIM(20). Esses so encontrados em concentraes diferen-tes conforme o tipo de fibra muscular, sendoarmazenados em maior quantidade nas fibras muscu-lares de contrao lenta do que em fibras muscularesde contrao rpida (20). Alm disso, o prprio treina-mento faz com que a deposio de TG seja diferenteentre os tipos de fibra muscular (20).

    A regulao da hidrolse dos TGIM pareceestar, em grande parte, sujeita estimulao -adre-ngica, em contraste com a liplise do tecido adiposo,que parcialmente inibida por bloqueadores -adren-gicos.

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    tetase (28). O acil-CoA atravessa as membranas mito-condriais por meio de um processo dependente decarnitina e das enzimas carnitina acil transferase I(CAT I), localizada na membrana externa, carnitinaacil transferase II (CAT II), localizada na membranainterna e carnitina-acilcarnitina translocase (29), queatua entre as duas. As duas primeiras enzimas so tam-bm denominadas carnitina palmitoil transferase I e II(CPT I e II), devido ao fato do cido palmtico ser oprincipal cido graxo metabolizado nos msculosesquelticos (30).

    Conforme Cleroux e cols. (21), a utilizao de-bloqueador no seletivo resulta em inibio total dautilizao de TG no msculo vasto lateral de humanossubmetidos a trabalho no ciclo ergmetro. ConformeStankiewicz-Choroszycha e Gorski (22), a utilizaode -bloqueador seletivo previne a diminuio na con-centrao de TG no msculo esqueltico de ratosdurante o exerccio, enfatizando a importncia daestimulao adrenrgica na regulao da hidrlise doTGIM. O efeito da adrenalina ocorre sobre as enzimasque atuam na hidrlise dos TG. Oscai e cols. (23) pro-puseram que uma isoforma intracelular da lipaselipoproteica (LLP) atua como lipase de TG em ms-culo esqueltico e corao. Evidncias desta hipteseesto no fato de que a atividade da LLP intracelularest aumentada em msculo esqueltico de ratos emexerccio e que este incremento depende da intensi-dade do esforo (23).

    Outros investigadores propem que uma lipasesensvel a hormnio, similar lipase hormnio sensvel(LHS) do tecido adiposo, pode regular a hidrliseintramuscular de TG (24). Esta proposio foi confir-mada com a produo de anticorpos contra LHSpurificada de tecido adiposo de ratos. Holm e cols.(25) constataram atravs de imunoblotting a pre-sena de uma protena com peso molecular similar aLHS do tecido adiposo em extrato de msculoesqueltico de ratos.

    Recentemente, Guo e cols. (26) avaliaram, nomsculo vasto lateral de 12 adultos, a cintica deTGIM e de AGL durante o exerccio moderado (45%do VO2mx.). Nesse estudo, no foi observadadiminuio significativa no contedo de TGIM emresposta ao exerccio. Os autores sugerem que,durante o exerccio de durao e intensidade modera-da, o TGIM simultaneamente hidrolisado e reesteri-ficado e assim a concentrao deste mantida pratica-mente constante.

    A razo para as divergncias quanto importn-cia dos TGIM durante o exerccio ainda no est clara.Tais divergncias talvez reflitam variaes decorrentesde protocolos e variabilidade nas tcnicas para deter-minar a concentrao do TGIM muscular (27).

    Oxidao dos cidos graxos nos msculosesquelticosNo sarcoplasma, os AG precisam atravessar mais umabarreira, representada pelas membranas externa einterna da mitocndria, a fim de serem oxidados.Ainda no citossol, os AG so ativados (figura1),recebendo uma coenzima A (CoA) e tornando-se acil-CoA numa reao catalisada pela enzima acil-CoA sin-

    Figura 1. Ciclo de Krebs: O piruvato gerado a partir de gli-cose e glicognio transportado para o interior damitocndria. Nesta, o piruvato convertido em oxalaceta-to via piruvato carboxilase e em acetil CoA via piruvatodesidrogenase. O acetil CoA tambm proveniente da -oxidao de cidos graxos. O acetil-CoA e o oxalacetatogeram citrato pela citrato sintetase. O citrato provenientedo ciclo de Krebs parcialmente transportado para ocitossol. O oxoglutarato convertido em glutamato e esteem glutamina. Assim, nesses dois mecanismos, h perdacontinua de esqueletos de carbono do ciclo de Krebs. Emconseqncia, a gerao de oxaloacetato uma etapaimportante para manter a atividade deste ciclo. CS = citrato sintetase; HK = hexoquinase; PC = piruvato car-boxilase; PDH = piruvato descarboxilase; CAT = acilcarnitinatransferase; TGIM = triglicerdeos intramusculares.

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    Os passos para a entrada do acil-CoA namitocndria so os seguintes: a CAT I promove a liga-o do acil com a carnitina, formando acil-carnitina, aomesmo tempo que a CoA liberada (figura 1). Pormeio da ao da carnitina-acilcarnitina translocase, ocomplexo acil-carnitina atravessa a membrana externa,o espao intermembranas e a membrana interna, ondea CAT II rompe o complexo acil-carnitina, liberando acarnitina e restabelecendo a ligao acil-CoA (31).

    O passo seguinte a entrada da molcula deacil-CoA no processo de -oxidao que consiste naremoo sucessiva de pares de carbonos e formao deum certo nmero de molculas de acetil-CoA propor-cional ao de carbonos do cido graxo original.Durante a -oxidao so liberados ons H+ e eltrons,reduzindo as flavoprotenas NAD+ e FAD em NADH+ H+ e FADH2, para sua posterior utilizao na cadeiarespiratria. Alm disso, o acetil-CoA resultante metabolizado no Ciclo de Krebs, onde h a reduo deoutras flavoprotenas. Como j mencionado, o exerc-cio uma situao na qual h aumento significativo daliberao de hormnios que estimulam a liplise, eaumenta a concentrao plasmtica de AG. A maiordisponibilidade de AG circulantes aumenta propor-cionalmente sua captao e utilizao pelos msculosesquelticos (3,32). Entretanto, essa relao ocorreapenas quando o esforo leve ou moderado. Sabe-seque, acima de 70% (33) e 85% (34) do VO2mx., amobilizao de AG diminuda, provavelmente devi-do ao aumento da concentrao plasmtica de lactato,um metablito anti lipoltico (5).

    Exerccio fsico com intensidade moderada(25% a 65% do VO2mx.), quando comparado aorepouso, aumenta em cerca de 5 a 10 vezes a oxidaode cidos graxos, devido alta demanda energtica dosmsculos ativos e disponibilidade dos AG provenientesda liplise do tecido adiposo. Nesta condio, haumento de 2 a 3 vezes da liplise (6), mediada pelaestimulao -adrenrgica (35). Alm disso, a por-centagem de liberao dos AG que so reesterificadosdiminui pela metade (6), provavelmente devido salteraes do fluxo sangneo que facilitam a remoodos AG do tecido adiposo para os msculos ativos. Oexerccio de intensidade moderada dobra o fluxosangneo no tecido adiposo e causa aumento maiorque 10 vezes deste no msculo esqueltico (18).

    Durante exerccio prolongado com intensidadede 40% do VO2mx., a oxidao de cidos graxosaumenta e permanece elevada durante pelo menosuma hora no perodo de recuperao. Em exercciosprolongados com intensidade de 70% do VO2mx.,cerca de 50-60% da energia suprida pelos car-

    boidratos, com utilizao predominante nos primeiros30-40 minutos do esforo. O restante da energia (40-50%) suprido pelos AG que tm sua concentraoplasmtica e oxidao muscular aumentadas progres-sivamente, tornando-se o substrato mais utilizadopelos msculos a partir de 40-50 minutos de esforo eat vrias horas enquanto este se prolonga (32). A con-tribuio dos AG para o metabolismo muscular emexerccios prolongados de intensidade moderada (75%do VO2mx.) pode ser confirmada pelo fato de que aconcentrao de acilcarnitina aumenta em cerca de trsvezes durante o esforo e se mantm elevada at aexausto (36).

    Os tipos de exerccios fsicos que se beneficiamde forma significativa do metabolismo dos AG soaqueles com durao superior a 30 minutos e que seprolongam por algumas horas. Como j mencionado,a intensidade um fator determinante na mobilizaoe utilizao do glicognio/glicose e TG/AG, vistoque h uma relao direta entre a intensidade doesforo e a utilizao de glicose como substrato (16).De modo geral, indivduos bem treinados podemmanter uma intensidade de 80-85% do VO2mx.durante pouco mais de 2 horas, como numa corrida demaratona, por exemplo, devido ao aumento doestoque de glicognio nos dias precedentes prova, e capacidade elevada de utilizao dos AG pelos ms-culos (32). Nestes indivduos, os triacilgliceris dosprprios msculos esquelticos representam uma fonteimportante de AG para a oxidao. Algunspesquisadores sugerem que o treinamento no aumen-ta a oxidao dos AG provenientes do plasma mas,provavelmente, do estoque de TGIM.

    Alm da utilizao dos AG durante o exerccio,no perodo de recuperao, quando o estoque deglicognio est acentuadamente diminudo e a ativi-dade metablica continua aumentada, os AG cons-tituem o principal substrato energtico utilizado.

    Suplementao com cidos graxos efacilitadores de sua utilizaoA manipulao da dieta e suplementao com certostipos de lipdios ou outros agentes que estimulam aliplise e oxidao dos AG, vem sendo estudadoscomo estratgias para melhorar o desempenho noexerccio.

    Hagerman (32) sugeriu que uma manipulaodiettica, no sentido de aumentar o fornecimento delipdios, pode ser benfica para indivduos treinadospois aumenta os estoques intramusculares de TG.Dietas ricas em lipdios apresentam resultados contro-versos; em alguns casos apontando aumento e, em

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    outros, diminuio do desempenho fsico, em com-parao com dietas balanceadas ou ricas em car-boidratos (5). Dietas ricas em lipdios aumentam aatividade da LLP, que catalisa a degradao do TG cir-culante aumentando a disponibilidade de AG para osmsculos ativos. No entanto, o exerccio agudo por sis estimula a LLP (37). Tambm se menciona que hum aumento do metabolismo lipdico durante o exer-ccio de intensidade de 60-80% VO2mx. aps o con-sumo de dietas ricas em lipdios por apenas alguns dias(38); entretanto, esse pode ser simplesmente um efeitoda diminuio da disponibilidade de carboidratos.

    H consenso contudo de que o desempenho noexerccio aumenta aps alguns dias consumindo umadieta rica em lipdios seguida pelo consumo de umadieta rica em carboidratos trs dias antes do esforofsico. Esta a dieta de supercompensao, propostapor Bergstrm e cols. (39) h mais de 30 anos, e estmais diretamente relacionada ao aumento da disponi-bilidade de glicognio muscular do que da utilizaodos AG.

    No incio da dcada de 80, Ivy e cols. (4) com-pararam o efeito de 30g de triacilglicerol de cadeiamdia (TCM) com a mesma quantidade de triacil-gliceris de cadeia longa (TCL), a humanos, quandoadministrados juntamente com carboidratos duranteexerccio de uma hora a 70% do VO2mx.. Verificou-seuma contribuio para o metabolismo energtico de37% dos TCM e 39% dos TCL. Esses valores estoabaixo daqueles da contribuio dos lipdios durante arealizao do exerccio em jejum que de 49%. Nessecaso, a suplementao com TCM e TCL provavel-mente no aumentou a proporo de lipdios metabo-lizados, pois os carboidratos inibem o metabolismolipdico (3,40).

    A carnitina, como visto anteriormente, umagente importante na oxidao dos AG, atuando noseu transporte para o interior da mitocndria. Nestesentido, Decombaz e cols. (41) estudaram o efeito dasuplementao de L-carnitina (3g.d-1 durante 7 dias)sobre o metabolismo de lipdios durante exerccio a57% do VO2mx. aps a depleo prvia do glicognio.Em relao ao grupo que recebeu placebo, no foramobservadas diferenas nos parmetros sangneos,quociente respiratrio (indicativo do substrato utiliza-do), freqncia cardaca e deteco de fadiga, levandoos autores a conclurem que a suplementao de car-nitina no altera o metabolismo energtico, mesmodurante um exerccio de intensidade moderada realiza-do aps a depleo do glicognio.

    Em um estudo de Yan e cols. (29), foi demons-trado que o aumento da atividade contrtil dos ms-

    culos esquelticos, seja causado pelo exerccio ouestimulao eltrica crnica, aumenta a expresso doRNAm da CAT II. Esses autores postulam que a car-nitina, obtida em quantidades suficientes numa dietano vegetariana (42), tendo tambm sua sntese eaproveitamento aumentados.

    Agentes lipolticos utilizados por atletasA liplise principalmente regulada pelas catecolami-nas, atravs de -adrenorreceptores, que promovemelevao da concentrao intracelular do AMPc ati-vando a proteina quinase A (PKA) (24). Desta forma,os principais agentes lipolticos so aqueles que atuamna resposta dos -adrenoreceptores, como a cafena.Essa metil-xantina, alm do seu efeito estimulante nosistema nervoso central aumentando a concentraoplasmtica de noradrenalina, estimula diretamente oprocesso lipoltico (5). A cafena inibe a fosfodi-esterase, aumentando a meia-vida do AMPc e comoconseqncia a atividade da protena quinase A (PKA)e da lipase sensvel a hormnios (LSH). A dose queprovoca esses efeitos de 3-6mgKg-1, enquanto que adose de 8mgKg-1 considerada doping e doses de10-15mgKg-1 so txicas, podendo provocar distr-bios gastrointestinais, arritmia, ansiedade e aluci-naes (43).

    Outras drogas que podem atuar como lipolticasso Clembuterol, Fenoterol, Salbutanol, Salmeterol,Isoprenaline, Dobutamina e demais substncias queatuam via receptor beta adrenrgico (44).

    Regulao da oxidao de cidos graxospelo msculo esqueltico quando h ofertaabundante de glicoseA metabolizao elevada da glicose pelo msculoesqueltico reduz a oxidao de cidos graxos. Oefeito da glicose sobre a oxidao de cidos graxosocorre da seguinte maneira: a glicose ao ser metabo-lizada pela via glicoltica gera piruvato e este atravs dapiruvato desidrogenase forma acetil CoA. Este con-densa-se ao oxaloacetato pela citrato sintase levando produo de citrato (2). Este sai da mitocndria parao citoplasma e pela ao da ATP-citrato liase geraacetil CoA. O acetil CoA convertido em malonilCoA pela acetil CoA carboxilase. O citrato um ati-vador importante da acetil CoA carboxilase (48). Por-tanto, este metablito alm de precurssor ativa a pro-duo de malonil CoA.

    O malonil CoA um potente inibidor da CAT-I (47). Assim, ocorre inibio da oxidao de cidosgraxos na mitocndria (48). Os cidos graxos que per-manecem no citoplasma na forma de acil CoA so

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    ento esterificados em triglicerdeos, fosfolpides ousteres de colesterol (48,49). Este mecanismo da inte-rao glicose-cidos graxos leva reduo da oxidaode cidos graxos e o seu acmulo como macro-molculas lipdicas.

    Fatores que limitam a atividade do ciclo deKrebsO ciclo de Krebs apresenta, como caracteristica pecu-liar, a gerao de precursores e produtos com a libera-o de CO2. Alm disso, o ciclo libera metablitoscomo citrato e glutamina. H, portanto, uma perdacontnua de esqueleto de carbono que precisa serreposta. A sntese de oxalacetato a etapa de inserode novas molculas no ciclo.

    Durante o exerccio, os principais substratosutilizados na reposio dos intermedirios do ciclo deKrebs so o piruvato e aminocidos como aspartato,asparagina e glutamato (45). Lancha Jr. e cols. (46)verificaram que, durante o exerccio fsico em ratos,ocorre ativao da piruvato carboxilase, enzima queconverte piruvato em oxaloacetato. Este ltimometablito condensa-se ao acetil-CoA e forma citrato,pela ao da citrato sintase, iniciando o ciclo de Krebs.Desse modo, so duas as principais limitaes paramaior utilizao de AG no exerccio de intensidademoderada e de longa durao: a disponibilidade deglicognio para o fornecimento de intermedirios dociclo de Krebs (45) e a mobilizao de AG do tecidoadiposo e do msculo esqueltico (5).

    Proposio do presente trabalhoConforme Bergstrom e cols. (39), o aumento do con-tedo de glicognio muscular um fator determinantepara o desempenho no exerccio aerbio moderado eprolongado. Os cidos graxos atuariam como fonteenergtica principal e o glicognio para a manutenoda atividade do ciclo de Krebs na gerao de oxala-cetato (figura 1).

    O fornecimento do oxalacetato seria, portanto,um fator limitante, j que o acetil CoA, proveniente docido graxo, reage com este para a formao de citra-to, pela citrato sintase, com posterior fornecimento deATP. Assim, ocorrendo reduo de oxalacetato, areao deste com acetil CoA para formar citrato diminuda independentemente da oferta de acetil CoAderivada da mobilizao aumentada de cidos graxosdo tecido adiposo (figura 2). Haveria ento, liplise,aumento de cidos graxos no plasma ou do prpriotecido com aumento da oferta desses ao msculo. Aatividade reduzida do ciclo de Krebs, no entanto, limi-ta a oxidao de cidos graxos por este tecido. A

    exausto do ciclo de Krebs se deve perda de esquele-to de carbonos. Como conseqncia, h queda doATP e ocorre a exausto do indivduo no esforo fsi-co prolongado.

    Os autores deste trabalho acreditam que acapacidade do msculo esqueltico para oxidar cidosgraxos apresenta relao intima com a oferta e meta-bolizao de glicose, quer seja esta proveniente doplasma ou da degradao do glicognio muscular.Assim, a oxidao de cidos graxos, para ser mxima,requer metabolizao de glicose em taxas apropriadas.Situaes de oferta muito elevada ou diminuda de gli-

    Figura 2. Hiptese do presente trabalho. Havendo reduodo contedo de glicognio e, conseqentemente, na pro-duo de piruvato ocorre a queda de oxalacetato. Areao deste com acetil-CoA para formar citrato ficareduzida independente da oferta de acetil-CoA derivadada mobilizao aumentada de cidos graxos no tecidoadiposo. Assim, mesmo havendo oferta de cidos graxos, omsculo esqueltico no consegue oxidar o acetil-CoAgerado na -oxidao. Como conseqncia ocorre areduo na produo de ATP. Portanto, a exausto dociclo de Krebs seria o fator determinante da exausto noexerccio fsico.HK = hexoquinase; CS = citrato sintetase; PC = piruvato car-boxilase; PDH = piruvato descarboxilase; CAT = acilcarnitinatransferase; TGIM = triglicerdeos intramusculares.

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    cose levam reduo da oxidao de cidos graxos pormecanismos distintos. Quando a oferta de glicose elevada, o malonil CoA gerado inibe a CPT-I. Por suavez, na depleo de glicognio, falta esqueletos de car-bono para manter o fluxo de metablitos pelo ciclo deKrebs funcionante.

    AGRADECIMENTO

    Os autores dedicam este estudo memria da Profes-sora Dra. Lor Cury, querida colega do Departamentode Fisiologia e Biofsica, ICB-USP.

    Nosso grupo recebe suporte financeiro daFAPESP, CNPq, CAPES e Pronex.

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    Endereo para correspondncia:

    Rui CuriInstituto de Cincias Biomdicas-USP, ICB1Av. Prof. Lineu Prestes 152405509-900, So Paulo, SPFax: (11) 3091-7285e.mail: [email protected]