A volta da vovó pantera

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por josé gabriel navarro foto renato parada Quatro anos após protagonizar o curta que virou mania na internet, a atriz Maria Alice Vergueiro se reinventa na série Elvirão ou Como Vovó Já Dizia A volta da vovó pantera A senhora já declarou que não se iden- tifica com o trabalho em televisão. Por que, então, topou participar de Elvirão? O Canal Brasil tem um formato que me interessa. É diferenciado, tem programas e filmes muito bons. Meu problema não é bem a televisão – acho um veículo ótimo. O problema está nas novelas, que são muito liga- das aos índices de audiência, mas os atores não têm muita participação no todo. Você nunca sabe como ela vai acabar, nem como vai ser o desenvol- vimento das personagens. No Elvirão me deixaram à vontade. As meninas [as diretoras Fernanda Figueira, Gizella Werneck e Liara Castro] gostavam que aria aLiCE Vergueiro chegou aos 75 verões com inúmeras peças, algumas direções, cinco filmes, uma novela, um seriado e muitas aulas ministradas até que, em 2006, o curta Tapa na Pantera, no qual interpreta uma senhora adepta e defensora da maconha, virou febre nacional (mais de 4 milhões de acessos no YouTube). a atriz recebeu a MONET em seu apartamento para conversar sobre a carreira e a série Elvirão, em que sua personagem dá conselhos nada ortodoxos à neta. mesmo recurso para conseguir montar um espetáculo. O teatro também é muito efêmero. Se você não realiza um trabalho agora, dificilmente você vai fazer depois. Veja: já estou com 75 anos... De repente, não dá mais para fazer. Então vamos fazer agora! E esse investimento no computador: valeu a pena? Valeu. Agora estou precisando de outra joia para comprar outro, porque este já está velho, já tem cinco anos [risos]. O tempo voa mesmo. Como avalia sua carreira? Meus trabalhos nunca foram propria- mente comerciais. Sempre “cults”. Eles atingem mais qualitativamente o público. Nunca fui aquele sucesso de auditórios cheios. Nem era bem isso que buscava. É como, por exemplo, um concerto de câmara e de orquestra sin- fônica. Há uma diferença: não é que o de câmara seja menor do que o da sin- fônica. Mas é outro estilo. Ela fala mais individualmente, é mais intimista. Algum arrependimento? Tenho pena de não ter feito mais cinema. Fiz muito pouco. Ainda mais agora, que o cinema brasileiro está fo- mentado, deslanchando. Mas também não se pode exigir muito. Posso dizer que fiz tudo que eu tinha vontade, mas que eu me sinto não realizada, e sim em processo de realização. É um “vir a ser” constante. Há pouco tempo, estava querendo só dirigir, pois achava que, com esse negócio do meu joelho, da minha idade, eu não ia conseguir atuar. Daí, até hoje, são meus ex-alunos que estão me incenti- vando. É um privilégio, né? Os problemas nas articulações têm atrapalhado o dia a dia da senhora? Isso já tenho há muito tempo. Só agora que tive que botar uma prótese no joelho. Antes estava pior, doía. Agora não, só quando o tempo esfria. Não estou livre para andar, subir e descer escadas. Estou um pouco presa a uma muleta e a uma cadeira de rodas. Mas isso não me atrapalha. Claro que pre- feria estar andando para lá e para cá, mas também fico me perguntando... Pra onde? [risos] n eu improvisasse. Usei minhas próprias roupas, gravamos aqui na sala de casa. É quase uma continuação da Pantera. Desde o sucesso de Tapa na Pantera, a senhora foi redescoberta pelas novas gerações e se fixou no imaginário jovem com um estereótipo de “vovó liberal”. Como lida com isso? Uso como marca pessoal. Porque, depois da Pantera, os jovens me pro- curam muito para participar de filmes que eles estão fazendo no último ano de faculdade. Acho uma “dilícia” tra- balhar com jovens. Foi uma vantagem para mim essa oportunidade, porque, geralmente, eles chegam assim me chamando de “senhora” e tal... Logo, começam a me incorporar e me sinto rejuvenescida. Eles me trazem para o mundo deles, em vez de ser o contrário. Estou trabalhando mais agora e mais animada. Tanto que estou em cartaz numa peça [as Três Velhas, no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo, até 31 de outubro]. É verdade que faço uma velha de 100 anos [risos]. Mas, para uma personagem de 100 anos, estou até bem conservada [risos]. A senhora já declarou que vendeu algumas joias de família para comprar um computador... [risos] Essa história de vender joias já virou prática minha. Porque é o seguinte: não vou andar com joia por aí, entendeu? Acho um perigo. Além do mais, os objetos valem enquanto são úteis. Não tinha muitas joias; tinha algumas que valeram alguma grana. Já havia vendido algumas antes, não foi só por causa do computador. O negócio é tocar pra frente... Já usei o POSSO DIZER QUE FIZ TUDO QUE EU TINHA VONTADE, MAS QUE ME SINTO NÃO REALIZADA, E SIM EM PROCESSO DE REALIZAÇÃO. É UM “VIR A SER” CONSTANTE ELVIRÃO OU COMO VOVÓ JÁ DIZIA, dia 16, sábado, 20h, Canal Brasil, 66 OUTUBrO + MONET + 65 64 + MONET + OUTUBrO [ ANárqUICA ] M

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por josé gabriel navarro foto renato parada

Quatro anos após protagonizar o curta que virou mania na internet, a atriz Maria Alice Vergueiro se

reinventa na série Elvirão ou Como Vovó Já Dizia

A volta da vovó pantera

A senhora já declarou que não se iden-tifica com o trabalho em televisão. Por que, então, topou participar de Elvirão? O Canal Brasil tem um formato que me interessa. É diferenciado, tem programas e filmes muito bons. Meu problema não é bem a televisão – acho um veículo ótimo. O problema está nas novelas, que são muito liga-das aos índices de audiência, mas os atores não têm muita participação no todo. Você nunca sabe como ela vai acabar, nem como vai ser o desenvol-vimento das personagens. No Elvirão me deixaram à vontade. As meninas [as diretoras Fernanda Figueira, Gizella Werneck e Liara Castro] gostavam que

aria aLiCE Vergueiro chegou aos 75 verões com inúmeras peças, algumas direções, cinco filmes, uma novela, um seriado e muitas aulas ministradas até que, em 2006, o curta Tapa na Pantera, no qual interpreta uma senhora adepta e defensora da maconha, virou febre nacional (mais de 4 milhões de acessos no YouTube). a atriz recebeu a MONET em seu apartamento para conversar sobre a carreira e a série Elvirão, em que sua personagem dá conselhos nada ortodoxos à neta.

mesmo recurso para conseguir montar um espetáculo. O teatro também é muito efêmero. Se você não realiza um trabalho agora, dificilmente você vai fazer depois. Veja: já estou com 75 anos... De repente, não dá mais para fazer. Então vamos fazer agora!E esse investimento no computador: valeu a pena? Valeu. Agora estou precisando de outra joia para comprar outro, porque este já está velho, já tem cinco anos [risos]. O tempo voa mesmo.Como avalia sua carreira? Meus trabalhos nunca foram propria-mente comerciais. Sempre “cults”. Eles atingem mais qualitativamente o público. Nunca fui aquele sucesso de auditórios cheios. Nem era bem isso que buscava. É como, por exemplo, um concerto de câmara e de orquestra sin-fônica. Há uma diferença: não é que o de câmara seja menor do que o da sin-fônica. Mas é outro estilo. Ela fala mais individualmente, é mais intimista.Algum arrependimento? Tenho pena de não ter feito mais cinema. Fiz muito pouco. Ainda mais agora, que o cinema brasileiro está fo-mentado, deslanchando. Mas também não se pode exigir muito. Posso dizer que fiz tudo que eu tinha vontade, mas que eu me sinto não realizada, e sim em processo de realização. É um “vir a ser” constante. Há pouco tempo, estava querendo só dirigir, pois achava que, com esse negócio do meu joelho, da minha idade, eu não ia conseguir atuar. Daí, até hoje, são meus ex-alunos que estão me incenti-vando. É um privilégio, né?Os problemas nas articulações têm atrapalhado o dia a dia da senhora? Isso já tenho há muito tempo. Só agora que tive que botar uma prótese no joelho. Antes estava pior, doía. Agora não, só quando o tempo esfria. Não estou livre para andar, subir e descer escadas. Estou um pouco presa a uma muleta e a uma cadeira de rodas. Mas isso não me atrapalha. Claro que pre-feria estar andando para lá e para cá, mas também fico me perguntando... Pra onde? [risos] n

eu improvisasse. Usei minhas próprias roupas, gravamos aqui na sala de casa. É quase uma continuação da Pantera.Desde o sucesso de Tapa na Pantera, a senhora foi redescoberta pelas novas gerações e se fixou no imaginário jovem com um estereótipo de “vovó liberal”. Como lida com isso?Uso como marca pessoal. Porque, depois da Pantera, os jovens me pro-curam muito para participar de filmes que eles estão fazendo no último ano de faculdade. Acho uma “dilícia” tra-balhar com jovens. Foi uma vantagem para mim essa oportunidade, porque, geralmente, eles chegam assim me chamando de “senhora” e tal... Logo, começam a me incorporar e me sinto rejuvenescida. Eles me trazem para o mundo deles, em vez de ser o contrário. Estou trabalhando mais agora e mais animada. Tanto que estou em cartaz numa peça [as Três Velhas, no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo, até 31 de outubro]. É verdade que faço uma velha de 100 anos [risos]. Mas, para uma personagem de 100 anos, estou até bem conservada [risos].A senhora já declarou que vendeu algumas joias de família para comprar um computador... [risos] Essa história de vender joias já virou prática minha. Porque é o seguinte: não vou andar com joia por aí, entendeu? Acho um perigo. Além do mais, os objetos valem enquanto são úteis. Não tinha muitas joias; tinha algumas que valeram alguma grana. Já havia vendido algumas antes, não foi só por causa do computador. O negócio é tocar pra frente... Já usei o

Posso dizer que fiz tudo que eu tinha vontade, mas que me sinto não realizada, e sim em Processo de realização. É um “vir a ser” constante

elvirão ou como vovó já dizia, dia 16, sábado, 20h, Canal Brasil, 66

O U T U B r O + m o n e t + 6 56 4 + m o n e t + O U T U B r O

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