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A TUTELA J URDICA DA CONFIANA
APLICADA AO DIREITO DE FAMLIA
Cristiano Chaves de Farias: Promotor de Justia do Ministrio Pblico do Estado da Bahia, Mestre em Cincias da Famlia na Sociedade Contempornea pela UCSal. Universidade Catlica do Salvador.Professor de Direito Civil das Faculdades Jorge Amado (graduao e ps-graduao), e do JusPODIVM Centro Preparatrio para as carreiras jurdicas, em Salvador. Coordenador do Curso de Ps-graduao em Direito Civil do Curso JusPODIVM. Membro do IBDFAM Instituto Brasileiro de Direito de Famlia
Sumrio:1. A submisso das relaes privadas legalidade constitucional; 2. A famlia constitucionalizada; 3. A confiana como elemento das relaes jurdicas; 4. Amplitude da confiana e a sua incidncia no Direito de Famlia; 5. A confiana nas relaes familiares patrimoniais: a boa-f objetiva no Direito de Famlia; 6. A confiana nas relaes familiares existenciais: o afeto como base do Direito de Famlia; 7. Notas conclusivas. Referncias.
Voc abusou, tirou partido de mim abusou, tirou partido de mim abusou, tirou partido de mim abusou... (Antonio Carlos & Jocafi)
1. A submisso das relaes privadas legalidade
constitucional
No h dvida acerca da superior hierarquia normativa da
Constituio, devendo-lhe obedincia, formal e material,
todos os demais diplomas normativos, sob pena de
inconstitucionalidade, com o seu conseqente expurgo do
sistema jurdico.1
1 Nesse diapaso, vale lembrar a lio de PIETRO PERLINGIERI, observando que a Constituio ocupa o lugar mais alto na hierarquia das fontes, precedendo, na ordem, (...) as leis ordinrias (e, portanto, os cdigos, que so leis ordinrias, incluindo o Cdigo Civil), cf. Perfis do Direito Civil: Introduo ao Direito Civil Constitucional, cit., p.4-5.
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Conforme a lio de ANABELLE MACEDO SILVA, a Constituio, na
qualidade de fundamento de validade de todo o ordenamento
jurdico, subordina todas as demais normas, sendo tal o
sentido de sua supremacia, servindo, ainda, de garantia
externa para a execuo dos preceitos das normas
infraconstitucionais.2
Todavia, considerando o histrico desprezo dos intrpretes
e aplicadores do Direito (particularmente do direito
privado) norma constitucional, fruto de uma neutralidade
da Carta Constitucional e do positivismo jurdico, avulta a
importncia de realar a necessidade de efetivao da norma
constitucional. Ou seja, contemporaneamente, releva
emprestar concretude Constituio Federal, impedindo-a de
cair no vazio abstrato ideolgico.
Com senso crtico, LUS ROBERTO BARROSO, percebendo a
necessidade de pregar a efetividade das normas
constitucionais, esclarece: a verdade, no entanto, que a
preocupao com o cumprimento da Constituio, com a
realizao prtica dos comandos nela contidos, enfim, com a
sua efetividade incorporou-se, de modo natural, prtica
jurdica brasileira ps-1988. Passou a fazer parte da pr-
compreenso do tema, como se houvssemos descoberto o bvio
aps longa procura. A capacidade ou no de operar com
as categorias, conceitos e princpios de direito
constitucional passou a ser um trao distintivo dos
profissionais das diferentes carreiras jurdicas. A
Constituio, liberta da tutela indevida do regime militar,
adquiriu fora normativa e foi alada, ainda que
tardiamente, ao centro do sistema jurdico, fundamento e
2 Cf. Concretizando a Constituio, cit., p.84-5.
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filtro de toda a legislao infraconstitucional. Sua
supremacia, antes apenas formal, entrou na vida do pas e
das instituies.3
Assim, dessa supremacia normativa constitucional, detecta-
se como consectrio a necessidade de releitura dos
conceitos e institutos jurdicos clssicos (como, v.g., o
casamento e a filiao) e a elaborao e o desenvolvimento
de novas categorias jurdicas (no mais neutras e
indiferentes, porm dinmicas, vivas, presentes na vida
social, como no exemplo da unio entre pessoas do mesmo
sexo como uma entidade familiar).
Percebe-se que o Direito Constitucional afastou-se de um
carter neutro e indiferente socialmente, deixando de
cuidar apenas da organizao poltica do Estado, para
avizinhar-se das necessidades humanas reais, concretas, ao
cuidar de direitos individuais e sociais (nos arts. 226 e
227, por exemplo, a Constituio disciplina a organizao
da famlia e no art. 225 cuida da estruturao do meio
ambiente). Trata-se, sem dvida, da afirmao de uma nova e
fecunda teoria constitucional.
Com isso, ocorre uma verdadeira migrao dos princpios
gerais e regras atinentes s instituies privadas
(historicamente tratadas exclusivamente no Cdigo Civil de
1916 de feio nitidamente patrimonialista) para o Texto
Constitucional, que passa a assumir um verdadeiro papel
reunificador do sistema, passando a demarcar os limites do
Direito Civil, inclusive no que concerne proteo dos
3 Cf. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constituio Brasileira, cit., nota prvia, p.X.
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ncleos familiares.4 Enfim, o papel unificador do sistema
jurdico, tanto nos seus aspectos mais tradicionalmente
civilsticos, quanto noutros temas de relevncia pblica,
desempenhado pela norma constitucional.5
Ademais, o cidado indiferenciado, que a Lei Civil de 1916
tomou por modelo (o denominado homo medio), , na
contemporaneidade, um cidado qualificado e concreto,
merecedor de proteo real. Trata-se do cnjuge ou
companheiro, da criana e do adolescente, do idoso, do
deficiente fsico, enfim, da pessoa humana. A Carta Maior,
ento, apresenta novos valores, informando e fundamentando
as relaes privadas, fincando, por conseguinte, as vigas
de sustentao do sistema de direito privado, reunificando
o sistema civilista.6
Em linhas bastante claras: os atos e institutos da
autonomia privada (seja na esfera das relaes
patrimoniais, seja no campo das relaes existenciais) tm
a sua validade condicionada aos valores constitucionais.
Trilhando esse caminho, infere-se a indispensabilidade de
uma nova compreenso do Direito Civil, a partir dos novos
valores e da legalidade constitucional.
Para tanto, preciso afirmar, permanentemente, os
princpios e regras constitucionais, emprestando-lhes
4 Acenam no mesmo sentido, chegando a uma idntica concluso, ORLANDO GOMES, cf. Novos temas de Direito Civil, cit., p.46; GUSTAVO TEPEDINO, cf. Temas de Direito Civil, cit., p.7; LUIZ EDSON FACHIN, cf. Teoria Crtica do Direito Civil, cit., p.21 e ss.; e PIETRO PERLINGIERI, cf. Perfis do Direito Civil: introduo ao Direito Civil Constitucional, cit., p.4. 5 Com esse pensar, PERLINGIERI, PIETRO, cf. Perfis do Direito Civil: introduo ao Direito Civil Constitucional, cit., p.6. 6 As idias sobre o tema, defendendo a interpretao constitucional de todos os institutos de Direito Civil, so coligidas, especialmente, do que escrevi anteriormente, em obra dedicada anlise da Teoria Geral do Direito Civil, In FARIAS, CRISTIANO CHAVES DE, cf. Direito Civil: Teoria Geral, cit., especialmente p. 23 e ss.
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efetividade (concretude), tornando-os vivos, pulsantes em
nosso cotidiano jurdico. Porm, uma advertncia se faz
necessria: no se pode resumir os valores constitucionais
ao texto formal de 5 de outubro de 1988, sendo
imprescindvel conferir maior elasticidade e mobilidade
dimenso substancial da Constituio, atingindo um
resultado efetivo dos princpios constitucionais explcitos
e implcitos.
Impe-se, dessa maneira, uma viso dos princpios do
Direito Civil a partir da legalidade constitucional, com o
fito de dar vazo e concretude prpria Lei Maior. At
mesmo porque, na fase atual da nossa cincia, mais
relevante do que afirmar os direitos