A Teoria Da Relatividade Especial e Geral-libre

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ALBERT EINSTEIN A TEORIA DA RELATIVIDADE ESPECIAL E GERAL

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  • ALBERT EINSTEIN

    A TEORIA DA RELATIVIDADE ESPECIAL E GERAL

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    Escrito: 1916 (esta edio revisada: 1924) fonte: Relatividade: Teoria geral e especial Editor 1920: Methuen & Co Ltd Publicaram Primeiramente: Dezembro, 1916 Traduziu: Carlos Roberto Nogueira de Freitas Fsico Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo - PUCSP Verso Fora de linha De Sjoerd Langkemper: Arquivo da referncia de Einstein (marxists.org) 1999

    Prlogo

    O presente livro pretende dar uma idia, a mais exata possvel, da Teoria da Relatividade, pensando naqueles que, sem dominar o aparato matemtico da fsica terica, tm interesse na Teoria do ponto de vista cientfico e filosfico em geral.

    A leitura exige uma formao de prxima do bacharelado em que pese a brevidade do livro e uma boa quantidade de pacincia e fora de vontade por parte do leitor.

    O autor colocou todo o seu empenho em ressaltar com a mxima clareza e sensibilidade suas idias principais, respeitando no geral, a ordem e o contexto em que realmente surgiram.

    No interesse da clareza, me pareceu inevitvel repetir-me a mido sem reparar no mnimo de elegncia expositiva; me ative obstinadamente ao preceito do genial terico L. Boltzmann, de deixar a elegncia para os alfaiates e sapateiros.

    As dificuldades que repousam na teoria propriamente dita no creio haver ocultado ao leitor, entretanto, as bases fsicas empricas da teoria as tratei deliberadamente com certa negligncia, para que ao leitor distanciado da Fsica no lhe ocorresse enxergar as rvores sem enxergar o bosque.

    Espero que este livro lhes proporcione algumas horas de alegre entretenimento.

    Dezembro de 1916. A. EINSTEIN

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    NOTAS DO TRADUTOR

    Albert Einstein, (1879-1955), fsico alemo, desenvolveu a Teoria da Relatividade em duas etapas: em 1905 ele publicou um trabalho que mais tarde ficou conhecido pelo nome de Teoria da Relatividade Especial, que tratava o movimento uniforme; e em 1915, publicou a Teoria da Relatividade Geral, que tratava o movimento acelerado e a gravitao.

    Procurei encaixar notas esclarecedoras para que este livro se torne uma referncia para estudantes com dificuldades na Fsica Relativista. Procurei texto explicativos disponveis em diversos autores para tentar facilitar a vida do estudante que inicia sua viagem pela genialidade de Albert Einstein e sua Teoria da Relatividade.

    Dois problemas afligiam Einstein:

    O primeiro desses problemas referia-se ao comportamento da luz. De acordo com a teoria eletromagntica, a luz constituda de campos eltricos e magnticos que oscilam enquanto viajam. Einstein ento se perguntava: O que aconteceria se eu acompanhasse um feixe de luz mantendo a mesma velocidade da luz? Ele chegou seguinte resposta: A luz pareceria algo imvel e sem alterao. Mas isso lhe pareceu absurdo, pois o que caracteriza a luz exatamente a alterao continua dos campos; um pulso de luz esttico no poderia existir.

    O segundo problema que afligia Einstein era a falta de simetria observada em alguns fenmenos eletromagnticos. Consideremos, por exemplo, o caso representado na figura (1).

    fig. 1 Um indivduo A est fixo no solo e observa um vago que se move em linha reta e com velocidade constante v. Dentro do vago h um indivduo B que segura duas esferas carregadas x e y. Suponhamos que a reta que une x e y seja perpendicular velocidade do vago.

    Para o indivduo B, as esferas esto em repouso; assim, entre elas existe um par de foras eletrostticas dadas pela Lei de Coulomb. Porm, para o indivduo A, as esferas movem-se em trajetrias paralelas com velocidade v. Assim, para o indivduo A, alm das foras dadas pela Lei de Coulomb, h um par de foras magnticas entre as esferas. Desse modo, a fora resultante em cada esfera depende do observador.

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    Para Einstein, essa concluso era insuportvel, pois na Mecnica isso no ocorria. Quando temos dois referenciais inerciais, um movendo-se com velocidade constante em relao ao outro, as leis da Mecnica so as mesmas nos dois referenciais.

    Um experimento mecnico dar o mesmo resultado nos dois referenciais, isto , por meio de um experimento mecnico, no podemos determinar se o referencial est parado ou em movimento retilneo uniforme.

    Consideremos, por exemplo, o caso abaixo:

    Na situao representada na figura , um indivduo B est sobre um vago que se move com velocidade constante v em relao ao solo. Suponhamos que ele jogue uma bola para cima. A bola subir e cair novamente na sua mo, do mesmo modo que subiria e cairia se o vago estivesse em repouso em relao ao solo. Naturalmente, para um observador A, fixo em relao ao solo (fig. ), a trajetria da bola ser uma parbola, e a velocidade da bola ter valores diferentes para os dois observadores. No entanto, para os dois observadores a acelerao da bola ser a mesma (acelerao da gravidade) e a fora resultante sobre a bola ser a mesma (o peso). Dentro do vago, o indivduo B poder jogar uma partida de pingue-pongue ou peixinhos podero nadar num aqurio do mesmo modo que o fariam se o vago estivesse em repouso. Nenhum dos experimentos ilustrados pelas figuras e poder revelar se o vago est em repouso ou em movimento retilneo uniforme. Portanto, ao contrrio da Mecnica, as leis do Eletromagnetismo pareciam depender do referencial.

    Einstein apresentou a soluo desses problemas em um trabalho intitulado "Sobre a eletrodinmica dos corpos em movimento", publicado em 1905 numa revista cientfica alem chamada Anais da Fsica. A argumentao de Einstein se desenvolveu a partir de dois postulados, isto , de duas afirmaes consideradas vlidas sem necessidade de demonstrao. O primeiro desses postulados foi chamado por Einstein de Princpio de Relatividade:

    AS LEIS DA FSICA SO AS MESMAS EM TODOS OS REFERENCIAIS INERCIAIS.

    Portanto, tanto as leis da Mecnica como as leis do Eletromagnetismo devem ter a mesma forma em qualquer referencial inercial.

    O segundo postulado refere-se velocidade da luz:

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    A VELOCIDADE DA LUZ NO VCUO TEM O MESMO VALOR C EM QUALQUER REFERENCIAL INERCIAL, INDEPENDENTEMENTE DA VELOCIDADE DA FONTE DE LUZ.

    O segundo postulado foi o mais difcil de ser aceito, mesmo por fsicos famosos, pois contraria nossa experincia diria. Consideremos, por exemplo, uma situao j analisada por ns no estudo da Mecnica, como a representada na figura 2.

    fig. 2

    Nela temos um observador A, fixo em relao ao solo, e um vago movendo-se com velocidade V em relao ao solo. Dentro do vago h uma bola que se move com velocidade VB em relao ao vago. Desse modo, para o indivduo B, que est fixo em relao ao vago, a velocidade da bola VB. No entanto, para o indivduo A, a velocidade da bola : VB + V.

    No caso da luz, as coisas so diferentes.

    fig. 3

    Na figura 3 representamos um observador A, fixo em relao ao solo, que observa um vago cuja velocidade em relao ao solo V. Dentro do vago um indivduo B acende uma lanterna de modo que, para o observador B, a velocidade da luz c. De acordo com o segundo postulado de Einstein, para o observador A, a velocidade da luz emitida pela lanterna tambm c, e no c + V. Tanto para o observador A como para o observador B a velocidade da luz c. O segundo postulado mostra ser desnecessrio a proposta da existncia de um ter luminoso. Existia em os fsicos quase que uma necessidade de um meio para a propagao e manifestao dos fenmenos luminosos, era quase que uma analogia com o som que precisa do ar ou de outro meio material para se propagar.

    Esse meio hipottico no qual a luz se propagaria era chamado de ter. Com o segundo postulado, Einstein elimina o ter da Fsica; segundo ele, a luz pode se

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    propagar no espao vazio (vcuo). Durante o sculo XX, vrios experimentos comprovaram a validade do segundo postulado. Baseado nos dois postulados, Einstein deduziu uma srie de conseqncias e, com isso, resolveu alguns dos problemas que afligiam os fsicos no fim do sculo XIX. As mais importantes foram em relao ao tempo, comprimento, massa, energia, matria, radiao e aos campos eltricos e magnticos.

    Nota do Tradutor Nosso objetivo foi o de ter uma verso em portugus que fosse acessvel a todo aluno do curso de bacharelado em fsica. Procurei todos os exemplos em livros, publicaes inclusive na Internet para facilitar o entendimento dos alunos. Em sites de Portugal, Brasil e Espanha que possuam informaes relevantes sobre a teoria eu retirei informaes para facilitar a vida dos alunos. Toda e qualquer observao, favor enviar para [email protected] estou a disposio para responder e ajudar em qualquer dvida sobre o assunto em tela. Carlos Roberto Nogueira de Freitas [email protected]

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    Primeira parte

    SOBRE A TEORIA DA RELATIVIDADE ESPECIAL

    1. O CONTEDO FSICO DOS TEOREMAS GEOMTRICOS.

    Certamente que voc tambm, querido leitor, desde de pequeno, tomou conhecimento do soberbo edifcio da Geometria de Euclides e recorda-se, talvez com mais respeito que amor, a imponente construo que pelas altas escadarias te passearam durante horas sem conta os meticulosos professores da cadeira. E seguramente que, em virtude desse seu passado, castigarias com o desprezo a qualquer um que declarasse falso inclusive, o mais oculto teoreminha desta cincia. Mas muito possvel que este sentimento de orgulhosa segurana te abandonar de imediato se algum te perguntar: o que voc entende ao afirmar que estes teoremas so verdadeiros?.

    Vamos nos deter um instante sobre esta questo.

    A Geometria parte de certos conceitos bsicos, como plano, ponto, reta, aos que estamos em condio de associar representaes mais ou menos claras, assim como de certas proposies simples (axiomas) que, sobre a base daquelas representaes, nos inclinamos a dar por verdadeiras. Todos os demais teoremas so ento referidos a aqueles axiomas ( dizer, so demonstrados) sobre a base de um mtodo lgico cuja justificao nos sentimos obrigados a reconhecer. Um teorema correto, ou verdadeiro, quando se deriva dos axiomas atravs desse mtodo reconhecido. A questo da verdade dos distintos teoremas geomtricos remete,pois, a da verdade dos axiomas. Entretanto, se sabe desde ha muito que esta ltima questo no s no resolvel com os mtodos da Geometria, sem o que nem sequer tem sentido em si . No se pode perguntar se verdade ou no que por dois pontos s passa uma reta. Unicamente cabe dizer que a Geometria Euclidiana trata de figuras as que chama retas e as quais assinala a propriedade de permanecer univocamente determinadas por dois de seus pontos. O conceito de verdadeiro no se aplica s proposies da Geometria pura, porque com a palavra verdadeiro podemos designar sempre, em ltima instncia, a coincidncia com um objeto real; a Geometria, entretanto, no se ocupa da relao de seus conceitos com os objetos da experincia, somente da relao lgica que guardam estes conceitos entre si. O que, apesar de tudo, nos sentimos inclinados a qualificar de verdadeiros os teoremas da Geometria tem fcil explicao. Os conceitos geomtricos se correspondem, mais ou menos, exatamente com objetos na natureza, que so, sem nenhum gnero de dvidas, a nica causa de sua formao. Ainda que a Geometria se distancie disto para dar a seu edifcio o mximo rigor lgico, o certo que de costume, por exemplo, ver um segmento como dos

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    lugares marcados em um corpo praticamente rgido est muito fixo em nossos hbitos de pensamento. E tambm, estamos acostumados a perceber trs lugares como situados sobre una reta quando, mediante adequada eleio do ponto de observao, podemos fazer coincidir suas imagens ao olhar com um s olho. Se, deixarmos-nos levar pelos hbitos do pensamento, acrescentar agora aos teoremas da Geometria Euclidiana um nico teorema porm, o de que a dois pontos de um corpo praticamente rgido1 lhes corresponde sempre a mesma distancia (segmento), independentemente das variaes de posio a que submetemos o corpo, ento os teoremas da Geometria Euclidiana se convertem em teoremas referentes s possveis posies relativas de corpos praticamente rgidos. A Geometria assim ampliada h que se contempl-la como um ramo da Fsica. Agora cabe perguntar-se pela verdade dos teoremas geomtricos assim interpretados, porque possvel perguntar se so vlidos ou no para aqueles objetos reais que temos assinalado aos conceitos geomtricos. Mesmo que com certa impreciso podemos dizer, pois, que por verdade de um teorema geomtrico entendemos neste sentido sua validade em uma construo com rgua e compasso. Naturalmente, a convico de que os teoremas geomtricos so verdadeiros neste sentido descansa exclusivamente em experincias plenamente incompletas. De incio daremos como hiptese essa verdade dos teoremas geomtricos, para logo, na ltima parte da exposio (A Teoria da Relatividade Geral), ver que essa verdade tem seus limites e precisar quais so estes limites.

    1 Desta maneira se assinala tambm a linha reta um objeto da natureza. Trs pontos de um corpo

    rgido A, B, C se acham situados sobre uma linha reta quando, dados os pontos A e C, o ponto B est eleito de tal maneira que a soma das distancias AB e BC a menor possvel. Esta definio, defeituosa desde logo, pode bastar neste contexto.

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    2. O SISTEMA DE COORDENADAS

    Baseando-nos na interpretao fsica da distncia que acabamos de assinalar estamos tambm em condies de determinar a distncia entre dois pontos de um corpo rgido por meio de medies. Para ele necessitamos um segmento (haste S) que possamos utilizar uma vez para sempre e que sirva de medida unitria. Se A e B so dois pontos de um corpo rgido, sua reta de unio ento construvel segundo as leis da Geometria; sobre esta reta de unio, e a partir de A, levamos o segmento S tantas vezes como seja necessrio para chegar a B. O nmero de repeties desta operao a medida do segmento AB. Sobre este descansa toda medio de comprimento2. Qualquer descrio espacial do lugar de um evento ou de um objeto consiste em especificar o ponto de um corpo rgido (corpo de referncia) com o qual coincide o evento, e este vale no s para a descrio cientfica, sendo tambm para a vida cotidiana. Analisou-se a especificao do lugar em Berlim, na Praa de Potsdam , o que significa o seguinte: o solo terrestre o corpo rgido a que se refere a especificao de lugar; sobre ela, Praa de Potsdam em Berlim, est um ponto marcado, provido de nome, com o qual coincide espacialmente o evento3. Este primitivo modo de localizao s atende a lugares situados na superfcie de corpos rgidos e depende da existncia de pontos distinguveis sobre aquela. Vejamos como o gnio humano se libera destas duas limitaes sem que a essncia do mtodo de localizao sofra modificao alguma. Se sobre a Praa de Potsdam flutua por exemplo uma nuvem, sua posio, referida na superfcie terrestre, caber fix-la sem mais que erigir na praa um mastro vertical que chegue at a nuvem. A comprimento do mastro medido com a haste unitria, junto com a especificao do lugar que ocupa o p do mastro, constitui ento uma localizao completa. O exemplo nos mostra de que maneira se foi refinando o conceito de lugar: a) Prolonga-se o corpo rgido a que se refere a localizao, de modo que o corpo rgido ampliado chegue at o objeto a localizar. b) Para a caracterizao do lugar se utiliza nmeros, e no a nomenclatura de pontos notveis (no caso anterior, a comprimento do mastro medida com a haste). c) Segue-se falando da altura da nuvem ainda quando no se erija um mastro que chegue at ela. No nosso caso, determina-se, mediante fotografias da nuvem de diversos pontos do solo e tendo em conta as propriedades de propagao da luz, que comprimento se haveria que dar ao mastro para chegar nuvem. Destas consideraes uma encontra-se abaixo para ver que aquela a descrio dos lugares vantajosa se tornar independente da existncia dos pontos chaves,

    2 Se por hiptese, entretanto, que a medio exata, dizer, que d um nmero inteiro. Desta

    dificuldade se desfaz empregando-se escalas subdivididas, cuja introduo no exige nenhum mtodo fundamentalmente novo.

    3 No preciso entrar aqui com mais detalhamento do significado de coincidncia espacial, pois

    este conceito claro na medida em que, em um caso real, apenas haveria diviso de opinies em torno de sua validade.

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    fornecido com os nomes e localizados no corpo rgido a que posio, e usar-se em vez dele nmeros. A Fsica experimental cabe este objetivo empregando o sistema de coordenadas cartesianas. Este sistema consta de trs paredes rgidas, planas, perpendiculares entre si e unidas a um corpo rgido. O lugar de qualquer acontecimento, referido ao sistema de coordenadas, vem descrito (em essncia) pela especificao do comprimento das trs verticais ou coordenadas (x, y, z) (cf. Fig. 8, p. 26) que podem traar-se desde o acontecimento at essas trs paredes. Os comprimentos destas trs perpendiculares podem determinar-se mediante uma sucesso de manipulaes com rguas rgidas, manipulaes que vm prescritas pelas leis e mtodos da Geometria euclidiana. Nas aplicaes no costumam construir-se realmente essas paredes rgidas que formam o sistema de coordenadas; e as coordenadas tambm no se determinam realmente por meio de construes com rguas rgidas, seno indiretamente. Mas o sentido fsico das localizaes deve procurar-se sempre em concordncia com as consideraes anteriores, sob pena de que os resultados da Fsica e a Astronomia se diluam na falta de clareza4. A concluso , conseqentemente, a seguinte: toda a descrio do espao dos eventos serve-se de um corpo rgido para referi-los espacialmente. Essa referncia pressupe que os segmentos so governados pelas leis da Geometria Euclidiana, vindo represent-los fisicamente por duas marcas sobre um corpo rgido.

    NOTAS DO TRADUTOR

    A RELATIVIDADE DO TEMPO

    Vamos supor que queiramos medir o intervalo de tempo gasto para ocorrer um fenmeno. Uma das conseqncias dos postulados de Einstein que o valor desse intervalo de tempo vai depender do referencial em que est o observador. Se tivermos dois observadores situados em dois referenciais inerciais diferentes, um tendo velocidade constante em relao ao outro, os intervalos de tempo medidos por esses observadores sero diferentes. Para demonstrar isso, consideremos as situaes abaixo.

    4 Est na Teoria do Relatividade Geral, estudada na segunda parte do livro, onde um se torna

    necessrio para refinar e modificar esta concepo.

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    Nas figuras 4 e 5 representamos um trem que se move com velocidade constante V em relao ao solo. Dentro do vago h um observador O', fixo em relao ao vago, e fora dele h um observador O, fixo em relao ao solo.

    O observador O' (fig. a) aciona uma fonte de luz que emite um pulso para cima. Esse pulso refletido por um espelho e volta para a fonte. Para o observador O', na ida e na volta o pulso de luz gasta um intervalo de tempo t' dado por:

    2d' = c . (t' ) Eq.I

    em que c a velocidade da luz.

    Na figura b representamos o trajeto da luz como visto pelo observador O, o qual mede um tempo t para o percurso da luz. Nesse intervalo de tempo, para o observador O o deslocamento do trem foi igual a V.( t) enquanto o deslocamento da luz (fig. 6) foi:

    2d = c . (t ) Eq. II

    pois a velocidade da luz a mesma (c) para os dois observadores.

    Das equaes I e II, obtemos:

    2d' = c. ( t ) t' = 2d' / c 2d = c. ( t ) t = 2d / c

    Como d' < d, temos: t'

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    Essa relao vale para todos os processos fsicos, incluindo reaes qumicas e processos biolgicos.

    O intervalo de tempo t', em que os dois eventos (emisso e recepo de luz) ocorrem no mesmo local, chamado de tempo prprio. Para qualquer outro referencial inercial o intervalo de tempo (t) maior do que o tempo real. Vamos agora encontrar uma equao que relacione t com t'. Aplicando o teorema de Pitgoras ao tringulo retngulo sombreado na figura c, temos:

    Uma das primeiras evidncias da dilatao temporal foi obtida por meio de experimentos com uma partcula chamada mon. Quando fazemos experimentos no laboratrio com mons em repouso, observamos que eles se desintegram com uma vida mdia de 2,2 . l0-6 s. Muitos mons so criados na alta atmosfera, como resultado do bombardeio dos raios csmicos. Esses mons movem-se com velocidade prxima da luz:

    v = 2,994 .108 m/s

    Portanto, entre o momento em que so criados e o momento em que se desintegram, deveriam percorrer, em mdia, uma distncia de:

    d = v . (t ) d = ( 2,994 . 108 m / s ) . (2,2 . 10-6 s)

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    d = 650 m

    No entanto, a experincia mostra que mons criados a quase l0 km de altitude so detectados na superfcie da Terra. Isso acontece por causa da dilatao temporal. Para um referencial fixo no mon, o tempo de desintegrao :

    t' = 2,2 . 10-6 s Para um referencial fixo na Terra, temos:

    Como:

    Assim:

    Portanto:

    Assim, para um observador na Terra, a distncia percorrida pelo mon antes de desintegrar-se : = v . (t ) = ( 2,994 . 108 m / s ) . (35 . 10-6 s) = 10.000 m Outro tipo de teste, consistiu em comparar relgios atmicos, que marcam intervalos de tempo muito pequenos. Um foi mantido no solo, enquanto outro foi colocado em um avio que percorreu uma grande distncia a uma grande velocidade em relao Terra. Terminado o vo, os relgios foram comparados e constatou-se que o relgio do avio estava ligeiramente atrasado em relao ao relgio que foi mantido no solo.

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    3. ESPAO E TEMPO NA MECNICA CLSSICA

    Se eu formular o objetivo da Mecnica dizendo que a Mecnica deve descrever como varia com o tempo a posio dos corpos no espao, sem adicionar grandes reservas e prolixas explanaes, carregaria em minha conscincia alguns pecados capitais de encontro ao sagrado esprito da clareza. Indiquemos antes de mais nada estes pecados. No est claro que deve-se entender aqui por posio e espao. Suponhamos que estou postado junto a uma janela de um vago de trem que se desloca com uma marcha uniforme, e deixo cair uma pedra na estrada, sem dar nenhum impulso. Ento vejo (desprezando a influncia da resistncia do ar) que a pedra cai em linha reta. Um pedestre que assista a esta barbaridade, de um ponto do barranco observa que a pedra cai na terra segundo um arco de parbola. Eu pergunto agora: as posies que percorre a pedra esto realmente sobre uma reta ou sobre uma parbola? Por outro lado, o que significa aqui o movimento no espao? A resposta evidente depois do afirmado na seo 2. Deixemos, por um momento, de lado a obscura palavra espao, que, para ser sincero, no nos diz absolutamente nada; no lugar dela coloquemos movimento com respeito a um corpo de referncia praticamente rgido. As posies com relao ao corpo de referncia (vago do trem ou a estrada) haviam sido definidas explicitamente na seo precedente. Introduzindo no lugar de corpo de referncia o conceito de sistema de coordenadas, que til para a descrio matemtica, podemos dizer: a pedra descreve, com relao a um sistema de coordenadas rigidamente unido ao vago, uma reta; com relao a um sistema de coordenadas rigidamente ligado a estrada, uma parbola. Neste exemplo se v claramente que a rigor no existe uma trajetria5, mas somente uma trajetria com relao a um determinado corpo da referncia. Bem agora, a descrio completa do movimento no se obtm se no se especificar como rgua a posio do corpo com o tempo, o que o mesmo, para cada ponto da trajetria h que se indicar ali, em qual momento se encontra o corpo. Estes dados h que completar-los com uma definio do tempo em virtude da qual possamos considerar estes valores temporais como magnitudes essencialmente observveis (resultados de medies). Ns, sobre o solo da Mecnica Clssica, satisfazemos esta condio - com relao ao exemplo anterior - da seguinte maneira. Imaginemos dois relgios exatamente iguais; um deles de posse do homem da janela do vago; o outro, o homem que est de p no barranco. Cada um deles verifica em que lugar do correspondente corpo de referncia se encontra a pedra em cada instante marcado pelo relgio que tem na mo. Nos abstivemos de entrar aqui na impreciso introduzida pelo carter finito da velocidade de propagao da luz. Sob este extremo, e sob uma segunda dificuldade que aqui se apresenta, falaremos detidamente mais adiante.

    5 dizer, uma curva ao longo da qual se move o corpo.

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    4. O SISTEMA DE COORDENADAS DE GALILEU

    Como sabido, a lei fundamental da Mecnica de Galileu e Newton, conhecida como a lei de inrcia, diz: um corpo suficientemente separado de outros corpos persiste em seu estado de repouso ou de movimento retilneo uniforme. Este princpio se pronuncia no s sobre o movimento dos corpos, como tambm sobre corpos de referncia ou sistemas de coordenadas so permissveis na Mecnica e podem utilizar-se nas descries mecnicas. Alguns dos corpos aos que sem dvida cabe aplicar com grande aproximao a lei da inrcia so as estrelas fixas. Agora, se utilizamos um sistema de coordenadas solidrio com a Terra, cada estrela fixa descreve, com relao a ele e ao longo de um dia (astronmico), uma circunferncia de raio enorme, em contradio com o enunciado da lei de inrcia. Assim pois, se um se atm a esta lei, ento os movimentos s cabe referir-los a sistemas de coordenadas com relao aos quais as estrelas fixas no executam movimentos circulares. Um sistema de coordenadas cujo estado de movimento tal que com relao a ele vlida a lei de inrcia o chamamos sistema de coordenadas de Galileu. As leis da Mecnica de Galileu Newton s tem validade para sistemas de coordenadas de Galileu.

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    5. O PRINCPIO DA RELATIVIDADE (EM SENTIDO RESTRITO)

    Para conseguir a maior clareza possvel, voltemos ao exemplo do vago de trem que est em uma marcha uniforme. Dizemos que seu movimento dizemos uma translao uniforme (uniforme, porque so de velocidade e direo constantes; translao, porque ainda que a posio do vago varie com respeito via, no executa nenhum giro). Suponhamos que pelos ares voa um corvo em linha reta e uniformemente (com respeito via). No h dvida de que o movimento do corvo com respeito ao vago em marcha um movimento de diferente velocidade e diferente direo, mas segue sendo retilneo e uniforme. Expresso de modo abstrato: se uma massa m se move em linha reta e uniformemente com respeito a um sistema de coordenadas K, ento tambm se move em linha reta e uniformemente com respeito a um segundo sistema de coordenadas K', sempre que este execute com respeito a K um movimento de translao uniforme. Tendo em conta o afirmado no pargrafo anterior, depreende-se daqui o seguinte: Se K um sistema de coordenadas de Galileu, ento tambm o qualquer outro sistema de coordenadas K' que com respeito a K se ache num estado de translao uniforme. As leis da Mecnica de Galileu-Newton valem tanto com respeito a K' como com respeito a K Demos um passo a mais na generalizao e enunciemos o seguinte princpio: Se K' um sistema de coordenadas que se move uniformemente e sem rotao com respeito a K, ento os fenmenos naturais decorrem com respeito a K' segundo idnticas leis gerais que com respeito a K. Esta proposio o que chamaremos o Princpio de Relatividade (no sentido restrito). Enquanto se manteve a crena de que todos os fenmenos naturais podiam ser representados com ajuda da Mecnica Clssica, no se podia acreditar na validade do Princpio do Relatividade. No entanto, os recentes progressos da Eletrodinmica e da tica fizeram ver cada vez mais claramente que a Mecnica Clssica, como base de toda descrio fsica da natureza, no era suficiente. A questo da validade do Princpio de Relatividade se tornou assim perfeitamente discutvel, sem excluir a possibilidade de que a soluo fosse em sentido negativo. Existem, contudo, dois fatos gerais que primeiramente falam muito a favor da validade do Princpio da Relatividade. Efetivamente, ainda que a Mecnica Clssica no proporcione uma base suficientemente ampla para representar teoricamente todos os fenmenos fsicos, possui um contedo de valor muito importante, pois d com admirvel preciso os movimentos reais dos corpos celestes. Da que no campo da Mecnica tenha que ser vlido com grande exatido o Princpio de Relatividade. E que um princpio de generalidade to grande e que vlido, com tanta exatido, em um determinado campo de fenmenos fracasse em outro campo , a priori pouco provvel. O segundo argumento, sobre o que voltaremos mais adiante, o seguinte: se o Princpio da Relatividade (em sentido restrito) no vlido, ento os sistemas de coordenadas de Galileu K, K', K", etc., que se movem uniformemente uns com respeito aos outros, no sero equivalentes para a descrio dos fenmenos naturais. Nesse caso no teramos mais remdio seno pensar que as leis da

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    natureza s podem formular-se com especial singeleza e naturalidade se dentre todos os sistemas de coordenadas de Galileu elegssemos como corpo de referncia um (K0) que tivesse um estado de movimento determinado. A este o qualificaramos, e com razo (por suas vantagens para a descrio da natureza), de absolutamente em repouso, enquanto dos demais sistemas galileanos K diramos que so mveis. Se a via fosse o sistema K0, ponhamos por caso, ento nosso vago de transporte ferrovirio seria um sistema K com respeito ao qual regeriam leis menos singelas do que com respeito a K0. Esta menor simplicidade teria que atribuir que o vago K se move com respeito a K0 (isto , realmente). Nestas leis gerais da natureza formuladas com respeito a K teriam que desempenhar um papel o mdulo e a direo da velocidade do vago. Seria de esperar, por exemplo, que o tom de um tubo de rgo fosse diferente quando seu eixo fosse paralelo direo de marcha do que quando estivesse perpendicular. Agora , a Terra, devido a seu movimento orbital arredor do Sol, equiparvel a um vago que viaja a uns 30 km por segundo. Portanto, no caso de no ser vlido o Princpio de Relatividade, seria de esperar que a direo instantnea do movimento terrestre interviesse nas leis da natureza e que, portanto, o comportamento dos sistemas fsicos dependesse de sua orientao espacial com respeito Terra; porque, como a velocidade do movimento de rotao terrestre varia de direo em decorrncia do ano, a Terra no pode estar todo o ano em repouso com respeito ao hipottico sistema K0. Pese o esmero que se h posto em detectar uma tal anisotropia do espao fsico terrestre, isto , uma no equivalncia das diferentes direes, jamais pde ser observada. O qual um argumento de importncia a favor do Princpio da Relatividade.

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    6. O TEOREMA DE ADIO DE VELOCIDADES SEGUNDO A MECNICA CLSSICA

    Suponhamos que nosso to trazido e levado vago de transporte ferrovirio viaja com velocidade constante v pela linha, e imaginemos que por seu interior caminha um homem na direo de marcha com velocidade w. Com que velocidade W avana o homem com respeito via ao caminhar? A nica resposta possvel parece depreender-se da seguinte considerao: se o homem ficasse parado durante um segundo, avanaria, com respeito via, um trecho v igual velocidade do vago. Mas nesse segundo percorre alm do mais, com respeito ao vago, e por tanto tambm com respeito via, um trecho w igual velocidade com que caminha. Portanto, nesse segundo avana ao todo o trecho com respeito via

    W = v + w Mais adiante veremos do que este raciocnio, que expressa o teorema de adio de velocidades segundo a Mecnica Clssica, insustentvel e que a lei que acabamos de escrever no vlida na realidade. Mas entretanto, vamos supor a sua exatido.

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    7. A APARENTE INCOMPATIBILIDADE DA LEI DE PROPAGAO DA LUZ COM O PRINCPIO DA RELATIVIDADE

    No h na fsica uma lei mais singela do que a de propagao da luz no espao vcuo. Qualquer estudante sabe (ou cr saber) que esta propagao se produz em linha reta com uma velocidade de c = 300.000 km/s. Em qualquer caso, sabemos com grande exatido que esta velocidade a mesma para todas as cores, porque se no fora assim, o mnimo de emisso no eclipse de uma estrela fixa por sua colega escura no se observaria simultaneamente para as diversas cores. Atravs de um raciocnio similar, relativo a observaes das estrelas duplas, o astrnomo holands De Sitter conseguiu tambm demonstrar que a velocidade de propagao da luz no pode depender da velocidade do movimento do corpo emissor. A hiptese de que esta velocidade de propagao depende da direo no espao de todo improvvel. Suponhamos, em resumo, que o estudante cr justificadamente na singela lei da constncia da velocidade da luz c (no vcuo). Quem diria que esta lei to simples colocou os fsicos mais conceituados em grandssimas dificuldades conceituais? Os problemas surgem do modo seguinte. Como natural, o processo da propagao da luz, como qualquer outro, h que se referir a um corpo de referncia rgido (sistema de coordenadas). Voltamos a eleger como tal as vias do trem e imaginamos que o ar que tinha acima delas o eliminamos por bombeamento. Suponhamos que ao longo do barranco se emite um raio de luz cujo vrtice, segundo o anterior, propaga-se com a velocidade c com respeito quele. Nosso vago de transporte ferrovirio segue viajando com a velocidade v, na mesma direo em que se propaga o raio de luz, mas naturalmente bem mais devagar. O que nos interessa averiguar a velocidade de propagao do raio de luz com respeito ao vago. fcil ver que o raciocnio da seo anterior tem aqui aplicao, pois o homem que corre com respeito ao vago desempenha o papel do raio de luz. Em lugar de sua velocidade W com respeito ao barranco aparece aqui a velocidade da luz com respeito a este; a velocidade w que procuramos, a da luz com respeito ao vago, por tanto igual a:

    w = c v

    Por conseguinte, a velocidade de propagao do raio de luz com respeito ao vago resulta ser menor do que c. Agora , este resultado atenta contra o Princpio da Relatividade exposto no seo 5, porque, segundo este princpio, a lei de propagao da luz no vcuo, como qualquer outra lei geral da natureza, deveria ser a mesma se tomamos o vago como corpo de referncia que elegemos as vias, o qual parece impossvel segundo nosso raciocnio. Se qualquer raio de luz se propaga com respeito ao barranco com a velocidade c, a lei de propagao com respeito ao vago parece que tem que ser, por isso mesmo, outra diferente... em contradio com o Princpio da Relatividade. vista do dilema parece inevitvel abandonar, ou bem o Princpio da Relatividade, ou bem a singela lei da propagao da luz no vcuo. O leitor que tenha seguido atenciosamente as consideraes anteriores esperar seguramente que seja o Princpio de

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    Relatividade que por sua naturalidade e singeleza se impe mente como algo quase inevitvel ou que se mantenha em p, substituindo em troca a lei da propagao da luz no vcuo por uma lei mais complicada e compatvel com o Princpio da Relatividade. No entanto, a evoluo da Fsica terica demonstrou que este caminho era impraticvel. As inovadoras investigaes tericas de H. A. Lorentz sobre os processos eletrodinmicos e pticos em corpos mveis demonstraram que as experincias nestes campos conduzem com necessidade imperiosa a uma teoria dos processos eletromagnticos que tem como conseqncia irrefutvel a lei da constncia da luz no vcuo. Por isso, os tericos de vanguarda se inclinaram mais por prescindir do Princpio da Relatividade, pese a no poder achar nem um s fato experimental que o contradissesse. Aqui onde entrou a Teoria da Relatividade. Mediante uma anlise dos conceitos de espao e tempo se viu que em realidade no existia nenhuma incompatibilidade entre o Princpio da Relatividade e a lei de propagao da luz, seno que, atendo-se sistematicamente a estas duas leis, chegava-se a uma teoria logicamente impecvel. Esta teoria, que para diferenci-la de sua ampliao (comentada mais adiante) chamamos Teoria da Relatividade Especial, a que exporemos a seguir em suas idias fundamentais.

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    8. SOBRE O CONCEITO DE TEMPO NA FSICA

    Um raio caiu em dois lugares muito distantes A e B da via. Eu adiciono a afirmao de que ambos impactos ocorreram simultaneamente. Se agora pergunto, querido leitor, se esta afirmao tem ou no sentido, me contestars com um sim contundente. Mas se depois o importuno com o rogo de que me expliques com mais preciso esse sentido, advertirs depois de certa reflexo que a resposta no to singela como parece a primeira vista. Ao cabo de algum tempo qui v sua mente a seguinte resposta: O significado da afirmao claro de per si e no precisa de nenhuma aclarao; no entanto, teria que reflexionar um pouco se se me exige determinar, mediante observaes, se num caso particular os dois eventos so ou no simultneos. Mas com esta resposta no posso dar-me por satisfeito, pela seguinte razo: supondo que um experiente meteorologista tivesse achado, mediante agudssimos raciocnios, que o raio tem que cair sempre simultaneamente nos lugares A e B, se proporia o problema de comprovar se esse resultado terico corresponde ou no com a realidade. Algo anlogo ocorre em todas as proposies fsicas nas que intervm o conceito de simultneo. Para o fsico no existe o conceito enquanto no se brinde a possibilidade de averiguar num caso particular se verdadeiro ou no. Faz falta, por tanto, uma definio de simultaneidade que proporcione o mtodo para decidir experimentalmente no caso presente se os dois raios caram simultaneamente ou no. Enquanto no se cumpra este requisito, estarei entregando como fsico (e tambm como no fsico!) iluso de crer que posso dar sentido a essa afirmao da simultaneidade. (No sigas lendo, querido leitor, at conceder-me isto plenamente convicto.) Depois de algum tempo de reflexo fazes a seguinte proposta para constatar a simultaneidade. Mede-se o segmento de unio AB ao longo da via e se coloca em seu ponto mdio M a um observador munido de um dispositivo (dois espelhos formando 90 entre si, por exemplo) que lhe permite a visualizao ptica simultnea de ambos lugares A e B. Se o observador percebe os dois raios simultaneamente, ento que so simultneos. Ainda que a proposta me satisfaz muito, sigo pensando que a questo no fica aclarada do todo, pois me sinto obrigado a fazer a seguinte objeo: Tua definio seria necessariamente correta se eu soubesse j que a luz que a percepo dos raios transmite ao observador em M se propaga com a mesma velocidade no segmento A M que no segmento B M. No entanto, a comprovao desta suposio s seria possvel se dispusesse j dos meios para a medio dos tempos. Parece, pois, que nos movemos num crculo lgico. Depois de refletir outra vez, lanas, com toda razo, um olhar algo depreciativo e me dizes: Apesar de tudo, mantenho minha definio anterior, porque em realidade no pressupe nada sobre a luz. definio de simultaneidade somente h que lhe impor uma condio, e que em qualquer caso real permita tomar uma deciso emprica a respeito da pertinncia ou no pertinncia do conceito a definir. Que minha definio cobre este objetivo inegvel. Que a luz demora o mesmo tempo em percorrer o caminho que o no em realidade nenhuma suposio prvia nem hiptese sobre a natureza fsica da luz, seno uma estipulao que

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    posso fazer a discrio para chegar a uma definio de simultaneidade. Est claro que esta definio se pode utilizar para dar sentido exato ao enunciado de simultaneidade, no s de dois eventos, seno de um nmero arbitrrio deles, seja qual for sua posio com respeito ao corpo de referncia6 . Com isso se chega tambm a uma definio do tempo na Fsica. Imaginemos, efetivamente, que nos pontos A,B,C da via (sistema de coordenadas) existem relgios de idntica constituio e dispostos de tal maneira que as posies dos ponteiros sejam simultaneamente (no sentido anterior) as mesmas. Entende-se ento por tempo de um acontecimento a hora (posio dos ponteiros) marcada por aquele nesses relgios que est imediatamente contguo (espacialmente) ao acontecimento. Deste modo se atribui a cada acontecimento um valor temporrio que essencialmente observvel. Esta definio entranha outra hiptese fsica de cuja validade, em ausncia de razes empricas na contramo, no se poder duvidar. Efetivamente, supe-se que todos os relgios marcham com igual velocidade se tm a mesma constituio. Formulando-o exatamente: se dois relgios colocados em repouso em diferentes lugares do corpo de referncia so postos em hora de tal maneira que a posio dos ponteiros de um seja simultnea (no sentido anterior) mesma posio dos ponteiros do outro, ento posies iguais dos ponteiros so em geral simultneas (no sentido da definio anterior).

    6

    Supomos ademais que quando ocorrem trs fenmenos A, B. C em lugares diferentes e A simultneo a B e B simultneo a C (no sentido da definio anterior), ento se cumpre tambm o critrio de simultaneidade para o casal de acontecimentos A-C. Esta suposio uma hiptese fsica sobre a lei de propagao da luz; tem que se cumprir necessariamente para poder manter em p a lei da constncia da velocidade da luz no vcuo.

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    9. A RELATIVIDADE DA SIMULTANEIDADE

    At agora referimos nossos raciocnios a um determinado corpo de referncia que chamamos barranco ou vias. Suponhamos que pelos trilhos viaja um trem muito longo, com velocidade constante v e na direo assinalada na Fig. 7. As pessoas que viajam neste trem acharo vantajoso utilizar o trem como corpo de referncia rgido (sistema de coordenadas) e referiro todos os eventos ao trem. Todo acontecimento que se produz ao longo da via, produz-se tambm num ponto determinado do trem. Inclusive a definio de simultaneidade se pode dar exatamente igual com respeito ao trem que com respeito s vias. No entanto, prope-se agora a seguinte questo: Trem v v (Fig.7) M

    Barranco A M B

    Dois eventos (p. ex., os dois raios A e B) que so simultneos com respeito ao barranco, so tambm simultneos com respeito ao trem? Em seguida demonstraremos que a resposta tem que ser negativa. Quando dizemos que os raios A e B so simultneos com respeito s vias, queremos dizer: os raios de luz que saem dos lugares A e B se renem no ponto mdio M do trecho da via A-B. Agora , os eventos A e B se correspondem tambm com lugares A e B no trem. Seja M' o ponto mdio do segmento A-B do trem em marcha. Este ponto M' verdadeiro que no instante da queda dos raios7 coincide com o ponto M, mas, como se indica na figura, move-se para a direita com a velocidade v do trem. Um observador que estivesse sentado no trem em M', mas que no possusse esta velocidade, permaneceria constantemente em M, e os raios de luz que partem das fascas A e B o atingiriam simultaneamente, isto , estes dois raios de luz se reuniriam precisamente nele. A realidade , no entanto, que (julgando a situao desde o barranco) este observador vai ao encontro do raio de luz que vem de B, fugindo em mudana do que avana desde A Portanto, ver antes a luz que sai de B que a que sai de A. Em resumidas contas, os observadores que utilizam o trem como corpo de referncia tm que chegar concluso de que a fasca eltrica B caiu antes que a A. Chegamos assim a um resultado importante: eventos que so simultneos com respeito ao barranco no o so com respeito ao trem, e vice-versa (Relatividade da simultaneidade). Cada corpo de referncia (sistema de coordenadas) tem seu tempo especial; uma localizao temporria tem s sentido quando se indica o corpo de referncia ao que remete. Antes da Teoria da Relatividade, a Fsica supunha sempre implicitamente que o significado dos dados temporais era absoluto, isto , independente do estado de movimento do corpo de referncia. Mas acabamos de ver que esta suposio incompatvel com a definio natural

    7 Do ponto de vista do barranco!

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    de simultaneidade; se prescindimos dele, desaparece o conflito, exposto na seo 7, entre a lei da propagao da luz e o Princpio da Relatividade. Efetivamente, o conflito provm do raciocnio da seo 6, que agora resulta insustentvel. Inferimos ali que o homem que caminha pelo vago e percorre o trecho w num segundo, percorre esse mesmo trecho tambm num segundo com respeito s vias. Agora , toda vez que, em virtude das reflexes 'anteriores, o tempo que precisa um processo com respeito ao vago no cabe igual-lo durao do mesmo processo avaliada desde o corpo de referncia do barranco, tambm no se pode afirmar que o homem, ao caminhar com respeito s vias, percorra o trecho w num tempo que mensurado desde o barranco igual a um segundo. Digamos de passagem que o raciocnio da seo 6 descansa alm do mais numa segunda suposio que, luz de uma reflexo rigorosa, revela-se arbitrria, a qual no tira para que, antes de estabelecer-se a Teoria da Relatividade, fosse aceita sempre (de modo implcito).

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    10. SOBRE A RELATIVIDADE DO CONCEITO DE DISTNCIA ESPACIAL

    Observamos dois lugares particulares do trem8 que viaja com velocidade v pela linha e nos perguntamos que distncia h entre eles. Sabemos j que para medir uma distncia se precisa um corpo de referncia com respeito ao qual faz-lo. O mais singelo utilizar o prprio trem como corpo de referncia (sistema de coordenadas). Um observador que viaja no trem mede a distncia, transportando em linha reta uma rgua sobre o solo dos vages, por exemplo, at chegar desde um dos pontos marcados ao outro. O nmero que indica quantas vezes transportou a rgua ento a distncia procurada. Outra coisa se se quer medir a distncia desde a via. Aqui se oferece o mtodo seguinte: sejam A' e B' os dois pontos do trem de cuja distncia se trata; estes dois pontos se movem com velocidade v ao longo da via. Perguntemo-nos primeiro pelos pontos A e B da via por onde passam A' e B' num momento determinado t (mensurado desde a via). Em virtude da definio de tempo dada na seo 8, estes pontos A e B da via so determinveis. A seguir se mede a distncia entre A e B transportando repetidamente o metro ao longo da via. A priori no est dito que esta segunda medio tenha que proporcionar o mesmo resultado que a primeira. O comprimento do trem, medido da via, pode ser diferente que medido desde o prprio trem. Esta circunstncia se traduz numa segunda objeo que se ope ao raciocnio, aparentemente to meridiano, da seo 6. Pois se o homem no vago percorre numa unidade de tempo o trecho w medido desde o trem este trecho, medido desde a via, no tem por que ser igual a w.

    8 O centro dos vages primeiro e centsimo, por exemplo.

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    11. A TRANSFORMAO DE LORENTZ

    As consideraes feitas nos trs ltimas sees nos mostram que a aparente incompatibilidade da lei de propagao da luz com o Princpio de Relatividade na seo 7 est deduzida atravs de um raciocnio que tomava de emprstimo da Mecnica Clssica duas hipteses injustificadas; estas hipteses so: 1. O intervalo temporal entre dois eventos independente do estado de movimento do corpo de referncia. 2. O intervalo espacial entre dois pontos de um corpo rgido independente do estado de movimento do corpo de referncia. Se eliminamos estas duas hipteses, desaparece o dilema da seo 7, porque o teorema de adio de velocidades deduzido na seo 6 perde sua validade. Ante ns surge a possibilidade de que a lei da propagao da luz no vcuo seja compatvel com o Princpio de Relatividade. Chegamos assim pergunta: como modificar o raciocnio da seo 6 para eliminar a aparente contradio entre estes dois resultados fundamentais da experincia? Esta questo conduz a outra de ndole geral. No raciocnio da seo 6 aparecem lugares e tempos com relao ao trem e com relao s vias. Como se acham o lugar e o tempo de um acontecimento com relao ao trem quando se conhecem o lugar e o tempo do acontecimento com respeito s vias? Esta pergunta tem alguma resposta de acordo com a qual a lei da propagao no vcuo no contradiga ao Princpio de Relatividade? Ou expresso de outro modo: cabe achar alguma relao entre as posies e tempos dos diferentes eventos com relao a ambos corpos de referncia, de maneira que todo raio de luz tenha a velocidade de propagao c com respeito s vias e com respeito ao trem? Esta pergunta conduz a uma resposta muito determinada e afirmativa, a uma lei de transformao muito precisa para as magnitudes espao-temporais de um acontecimento ao passar de um corpo de referncia a outro. Antes de entrar em isso, intercalemos a seguinte considerao. At agora somente falamos de eventos que se produziam ao longo da via, a qual desempenhava a funo matemtica de uma reta. Mas, seguindo o indicado na seo 2, cabe imaginar que este corpo de referncia se prolonga para os lados e para acima por meio de um andaime de varetas, de maneira que qualquer acontecimento, ocorra onde ocorra, pode localizar-se com respeito a esse andaime. Analogamente, possvel imaginar que o trem que viaja com velocidade v se prolonga por todo o espao, de maneira que qualquer acontecimento, por longnquo que esteja, tambm possa localizar-se com respeito ao segundo andaime. Sem incorrer em defeito terico, podemos prescindir do fato de que em realidade esses andaimes se destroariam um contra o outro devido impenetrabilidade dos corpos slidos. Em cada um destes andaimes imaginamos que se erigem trs paredes mutuamente perpendiculares que denominamos planos coordenados (sistema de coordenadas). Ao barranco lhe corresponde ento um sistema de coordenadas K, e ao trem outro K'. Qualquer acontecimento, onde quer que ocorra, vem fixado espacialmente com respeito a K pelas trs perpendiculares x, e, z aos planos coordenados, e temporariamente por um valor

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    t. Esse mesmo acontecimento vem fixado no espao-tempo com respeito a K' por valores correspondentes x', y', z', t', que, como natural, no coincidem com x, y, z, t. J explicamos antes com detalhe como interpretar estas magnitudes como resultados de medies fsicas. evidente que o problema que temos proposto se pode formular exatamente da maneira seguinte: dadas as quantidades x, y, z, t de um acontecimento com respeito a K, quais so os valorizes x',y',z',t' do mesmo acontecimento com respeito a K' ? As relaes h que as eleger de tal modo que satisfaam a lei de propagao da luz no vcuo para um e o mesmo raio de luz (e alm do mais para qualquer raio de luz) com respeito a K e K'. Para a orientao espacial relativa indicada no desenho da figura 2, o problema fica resolvido pelas equaes:

    y = y z = z

    Este sistema de equaes se designa com o nome de transformao de Lorentz9.

    fig. 8

    Agora , se em lugar da lei de propagao da luz tivssemos tomado como base os supostos implcitos na velha Mecnica, relativos ao carter absoluto dos tempos e as comprimento, em vez das anteriores equaes de transformao teramos obtido estas outras:

    9 No Apndice se d uma derivao singela da transformao de Lorentz

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    sistema que com freqncia se denomina transformao de Galileu. A transformao de Galileu se obtm da de Lorentz igualando nesta a velocidade da luz c a um valor infinitamente grande. O seguinte exemplo mostra claramente que, segundo a transformao de Lorentz, a lei de propagao da luz no esvaziamento se cumpre tanto com respeito ao corpo de referncia K como com respeito ao corpo de referncia K'. Suponhamos que se envia um sinal luminoso ao longo do eixo x positivo, propagando-se a excitao luminosa segundo a equao

    x = ct,

    isto , com velocidade c. De acordo com as equaes da transformao de Lorentz, esta singela relao entre x e t determina uma relao entre x' e t'. Efetivamente, substituindo x pelo valor ct nas equaes primeira e quarta da transformao de Lorentz obtemos:

    de onde, por diviso, resulta imediatamente: x' = ct'. A propagao da luz, referida ao sistema K', produz-se segundo esta equao. Comprova-se, por tanto, que a velocidade de propagao tambm igual a c com respeito ao corpo de referncia K'; e analogamente para raios de luz que se propaguem em qualquer outra direo. O qual, naturalmente, no de estranhar, porque as equaes da transformao de Lorentz esto derivadas com este critrio.

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    12. O COMPORTAMENTO DE HASTES E RELGIOS MVEIS

    Coloco uma haste de um metro sobre o eixo x' de K', de maneira que um extremo coincida com o ponto x' = 0 e o outro com o ponto x' = 1. Qual a comprimento da haste com respeito ao sistema K? Para averigu-lo podemos determinar as posies de ambos extremos com respeito a K num momento determinado t. Da primeira equao da transformao de Lorentz, para t = 0, obtm-se para estes dois pontos:

    X(origem da escala) = 0 . 1 - v 2 c2

    X(extremo da escala) = 1 . 1 - v 2 c2

    estes dois pontos distam entre si 1 - v 2 c2

    Agora , o metro se move com respeito a K com a velocidade v, de onde se deduz que a comprimento de uma haste rgida de um metro que se move com velocidade v no sentido de sua comprimento de

    1 - v 2 c2 metros. A haste rgida em movimento mais curta do que a mesma haste quando est em estado de repouso, e tanto mais curta quando mais rapidamente se mova. Para a velocidade v = c seria

    1 - v 2 = 0 c2 para velocidades ainda maiores a raiz se faria imaginria. De aqui inferimos que na Teoria da Relatividade a velocidade c desempenha o papel de uma velocidade limite que no pode atingir nem ultrapassar nenhum corpo real. Adicionemos que este papel da velocidade c como velocidade limite se segue das prprias equaes da transformao de Lorentz, porque estas perdem todo sentido quando v se elege maior do que c. Se tivssemos procedido ao inverso, considerando um metro que se acha em repouso com respeito a K sobre o eixo x, teramos comprovado que em relao a K' tem a comprimento de

    1 v2 c2

    o qual est totalmente de acordo com o Princpio da Relatividade, no qual baseamos nossas consideraes. A priori evidente que as equaes de transformao tm algo que dizer sobre o comportamento fsico de hastes e relgios, porque as quantidades x, y, z, t no so outra coisa que resultados de

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    medidas obtidas com relgios e hastes. Se tivssemos tomado como base a transformao de Galileu, no teramos obtido um encurtamento de comprimento como conseqncia do movimento. Imaginemos agora um relgio com ponteiros de segundos que repousa constantemente na origem (x' = 0) de K'. Sejam t' = 0 e t' = 1 dois sinais sucessivos deste relgio. Para estes dois ticks, as equaes primeira e quarta da transformao de Lorentz daro:

    t = 0 e

    Mensurado desde K, o relgio se move com a velocidade v; com respeito a este corpo de referncia, entre dois de seus sinais decorre, no um segundo, seno

    1 v2 c2 segundos, ou seja um tempo algo maior. Como conseqncia de seu movimento, o relgio marcha algo mais devagar do que em estado de repouso. A velocidade da luz c desempenha, tambm aqui, o papel de uma velocidade limite inatingvel.

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    13. TEOREMA DE ADIO DE VELOCIDADES. EXPERIMENTO DE FIZEAU

    Dado que as velocidades com que na prtica podemos mover relgios e hastes so pequenas frente a velocidade da luz c, difcil que possamos comparar os resultados do titulo anterior com a realidade. Isto posto, por outro lado, esses resultados aparecem ao leitor cheio de singulares, vou extrair da teoria outra conseqncia que muito fcil de deduzir do anteriormente exposto e que os experimentos confirmam brilhantemente. Na seo 6 havamos deduzido o teorema de adio para velocidades de mesma direo, tal e como resulta das hipteses da Mecnica Clssica. O mesmo se pode deduzir facilmente da transformao de Galileu (seo11). Em lugar do homem que caminha pelo vago introduzimos um ponto que se move com respeito ao sistema de coordenadas K' segundo a equao:

    x' =wt.

    Mediante as equaes primeira e quarta da transformao de Galileu podemos expressar x e t em funo de x e t, obtendo:

    x = (v + w) t.

    Esta equao no expressa outra coisa que a lei do movimento do ponto com respeito ao sistema K (do homem com respeito ao barranco), velocidade que designamos por W, com a qual se obtm, como na seo 6:

    W = v+w (A)

    Mas este raciocnio o podemos efetuar igualmente baseando-nos na Teoria da Relatividade. O que h que fazer ento expressar x' e t' na equao

    x' = wt'

    em funo de x e t, utilizando as equaes primeira e quarta da transformao de Lorentz. Em lugar da equao (A) obtm-se ento esta outra:

    v+w W = (B)

    1 + vw c2

    que corresponde ao teorema de adio de velocidades de igual direo segundo a Teoria da Relatividade. A questo qual destes dois teoremas resiste a aferio com a experincia. Sobre o particular nos induz a um experimento extremamente importante, realizado faz mais de meio sculo pelo genial fsico Fizeau e desde

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    ento repetido por alguns dos melhores fsicos experimentais, pelo qual o resultado irrepreensvel. O experimento versa sobre a seguinte questo. Suponhamos que a luz se propaga num verdadeiro lquido em repouso com uma determinada velocidade w. Com que velocidade se propaga no tubo R da figura 9

    na direo da flecha, quando dentro desse tubo flui o lquido com velocidade v? Em qualquer caso, fiis ao Princpio de Relatividade, teremos que aceitar a suposio de que, com respeito ao lquido, a propagao da luz se produz sempre com a mesma velocidade w, mova-se ou no o lquido com respeito a outros corpos. So conhecidas, por tanto, a velocidade da luz com respeito ao lquido e a velocidade deste com respeito ao tubo, e se procura a velocidade da luz com respeito ao tubo. Est claro que o problema volta a ser o mesmo que o da seo 6. O tubo desempenha o papel das vias ou do sistema de coordenadas K; o lquido, o papel do vago ou do sistema de coordenadas K'; a luz, o do homem que caminha pelo vago ou o do ponto mvel mencionado neste. Por conseguinte, se chamamos W velocidade da luz com respeito ao tubo, esta vir dada pela equao (A) ou pela (B), segundo que seja a transformao de Galileu ou a de Lorentz a que se corresponde com a realidade. O experimento10 falha a favor da equao (B) deduzida da Teoria da Relatividade, e alm do mais com grande exatido. Segundo as ltimas e excelentes medies de Zeeman, a influncia da velocidade da corrente v sobre a propagao da luz vem representada pela frmula (B) com uma exatido superior ao 1 por 100. H que destacar, no entanto, que H. A. Lorentz, muito antes de estabelecer-se a Teoria da Relatividade, deu j uma teoria deste fenmeno por via puramente eletrodinmica e utilizando determinadas hipteses sobre a estrutura eletromagntica da matria. Mas esta circunstncia no diminui nada o poder probatrio do experimento, enquanto experimentum crucis a favor da Teoria da Relatividade. Pois a Eletrodinmica de Maxwell-Lorentz, sobre a qual descansava a teoria original, no est em nada em contradio com a Teoria da Relatividade. Esta ltima emanou melhor da Eletrodinmica como resumo e generalizao assombrosamente singelos das hipteses, antes mutuamente independentes, que serviam de fundamento Eletrodinmica.

    10 Fizeau achou W = w + v (1- 1/n2) , onde n = c/w o ndice de refrao do lquido. Por outro lado,

    devido a que vw/c2 muito pequeno frente a 1, pode-se substituir (B) por W = (w+v) (1- vw/2), ou bem, com a mesma aproximao, w+v (1- 1/n2), o qual concorda com o resultado de Fizeau.

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    14. O VALOR HEURSTICO DA TEORIA DA RELATIVIDADE

    A corrente de idias que expusemos at aqui pode se resumir brevemente como segue. A experincia levou convico de que, por um lado, o Princpio da Relatividade (em sentido restrito) vlido, e por outro, que a velocidade de propagao da luz no vcuo comporta-se como uma constante c. Unindo estes dois postulados resultou a lei de transformao para as coordenadas retangulares x, y, z e o tempo t dos eventos que compem os fenmenos naturais, obtendo-se, no a transformao de Galileu, seno (em discrepncia com a Mecnica clssica) a transformao de Lorentz. Neste raciocnio desempenhou um papel importante a lei de propagao da luz cuja aceitao vem justificada por nosso conhecimento atual. Agora ,uma vez em posse da transformao de Lorentz, podemos unir esta com o princpio de Relatividade e resumir a teoria no enunciado seguinte:Toda lei geral da natureza tem que estar constituda de tal modo que se transforme em outra lei de idntica estrutura ao introduzir, em lugar das variveis espao-temporais x, y, z, t do sistema de coordenadas original K, novas variveis espao-temporais x', y', z', t' de outro sistema de coordenadas K', onde a relao matemtica entre as quantidades com prima e sem prima vem dada pela transformao de Lorentz. Formulado brevemente: as leis gerais da natureza so covariantes com respeito transformao de Lorentz. Esta uma condio matemtica muito determinada que a Teoria da Relatividade prescreve s leis naturais, com o qual se converte em valioso auxiliar heurstico na busca de leis gerais da natureza. Se se encontrasse uma lei geral da natureza que no cumprisse essa condio, ficaria refutado pelo menos um dos dois supostos fundamentais da teoria. Vejamos agora o que esta ltima mostrou quanto a resultados gerais.

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    15. RESULTADOS GERAIS DA TEORIA

    Das consideraes anteriores a Teoria da Relatividade (Especial) nasceu da Eletrodinmica e da tica. Nestes campos no modificou muito os enunciados da teoria, mas simplificou notavelmente o edifcio terico, isto , a derivao das leis, e, o que incomparavelmente mais importante, reduziu muito o nmero de hipteses independentes sobre as que descansa a teoria. teoria de Maxwell-Lorentz lhe conferiu um grau tal de evidncia que aquela se teria imposto com carter geral entre os fsicos ainda que os experimentos tivessem falado menos convincentemente a seu favor. A Mecnica clssica precisava de uma modificao antes de poder harmonizar com o requisito da Teoria da Relatividade especial. Mas esta modificao afeta unicamente, em essncia, s leis para movimentos rpidos nos que as velocidades v da matria no sejam demasiado pequenas frente da luz. Movimentos to rpidos s nos mostra a experincia em eltrons e ons; em outros movimentos as discrepncias com respeito s leis da Mecnica clssica so demasiado pequenas para ser detectveis na prtica. Do movimento dos astros no falaremos at chegar Teoria da Relatividade Geral. Segundo a Teoria da Relatividade a energia cintica de um ponto material de massa m no vem dado pela conhecida expresso seno pela expresso.

    m v2 , 2

    seno pela expresso

    mc2

    1 v2 c2

    Esta expresso tende ao infinito quando a velocidade v se aproxima velocidade da luz c. Por conseguinte, por maior que seja a energia investida na acelerao, a velocidade tem que permanecer sempre inferior a c. Se se desenvolve em srie a expresso da energia cintica, obtm-se:

    mc2 + m v2 + 3 m v4 + ..... 2 8 c2 O terceiro termo sempre pequeno frente ao segundo (o nico considerado na Mecnica Clssica) quando v2 este termo pequeno em relao a 1. c2

    O primeiro termo mc2 no depende da velocidade, pelo qual no entra em considerao ao tratar o problema de como a energia de um ponto material depende da velocidade. Sobre sua importncia terica falaremos mais adiante. O resultado mais importante de ndole geral ao que conduziu a Teoria da

  • 35

    Relatividade Especial concerne ao conceito de massa. A Fsica pr-relativista conhece dois princpios de conservao de importncia fundamental, o da conservao da energia e o da conservao da massa; estes dois princpios fundamentais aparecem completamente independentes uno de outro. A Teoria da Relatividade os funde num s. A seguir explicaremos brevemente como se chegou at a e como se interpretar esta fuso. O Princpio de Relatividade exige que o postulado de conservao da energia se cumpra, no s com respeito a um sistema de coordenadas K, seno com respeito a qualquer sistema de coordenadas K' que se encontre com relao a K em movimento de translao uniforme (afirmado brevemente, com respeito a qualquer sistema de coordenadas de Galileu). Em contraposio Mecnica Clssica, o passo entre dois desses sistemas vem regido pela transformao de Lorentz. A partir destas premissas, e em conjuno com as equaes fundamentais da eletrodinmica maxwelliana, pode-se inferir rigorosamente, mediante consideraes relativamente singelas, que: um corpo que se move com velocidade v e que absorve a energia E0 em forma de radiao11 sem variar por isso sua velocidade, experimenta um aumento de energia na quantidade:

    E0

    1 v2 c2 Tendo em conta a expresso que demos antes para a energia cintica, a energia do corpo vir dada por :

    m + E0 c2 c2

    1 v2 c2 O corpo tem ento a mesma energia que outro de velocidade v e massa

    m + E0 c2

    Cabe portanto dizer: se um corpo12 absorve a energia E0, sua massa inercial cresce em

    E0 c2

    A massa inercial de um corpo no uma constante, ao contrrio, varivel segundo a modificao de sua energia. A massa inercial de um sistema de corpos cabe contempl-la precisamente como uma medida de sua energia. O postulado da conservao da massa de um sistema coincide com o da conservao da energia

    11 Eo a energia absorvida com respeito a um sistema de coordenadas que se move com o corpo.

    12 Com respeito a um sistema de coordenadas solidrio com o corpo.

  • 36

    e s vlido na medida em que o sistema no absorve nem emite energia. Se escrevemos a expresso da energia na forma

    mc2 + E0

    1 v2 c2

    se v que o termo mc2, que j nos chamou ateno anteriormente, no outra coisa que a energia que possua o corpo antes de absorver a energia E0. A aferio direta deste postulado com a experincia fica por enquanto excludo, porque as variaes de energia E0 que podemos comunicar a um sistema no so suficientemente grandes para fazer-se notar em forma de uma alterao da massa inercial do sistema.

    E0 C2

    demasiado pequeno em comparao com a massa m que existia antes da variao de energia. A esta circunstncia se deve o que se pudesse estabelecer com sucesso um princpio de conservao da massa de validade independente. Uma ltima observao de natureza terica. O sucesso da interpretao de Faraday-Maxwell da ao eletrodinmica a distncia atravs de processos intermedirios com velocidade de propagao finita criou entre os fsicos mais arraigados a convico de que no existiam aes a distncia instantneas e imediatas do tipo da lei de gravitao de Newton. Segundo a Teoria da Relatividade, no lugar da ao instantnea a distncia, ou ao a distncia com velocidade de propagao infinita, aparece sempre a ao a distncia com a velocidade da luz, a qual tem que ver com o papel terico que desempenha a velocidade c nesta teoria. Na segunda parte se mostrar como se modifica este resultado na Teoria da Relatividade Geral.

  • 37

    16. A TEORIA DA RELATIVIDADE ESPECIAL E A EXPERINCIA

    A pergunta de at que ponto se v apoiada a Teoria da Relatividade Especial pela experincia no fcil de responder, por um motivo que j mencionamos ao falar do experimento fundamental de Fizeau. A Teoria da Relatividade Especial cristalizou a partir da Teoria de Maxwell-Lorentz dos fenmenos eletromagnticos, pelo qual todos os fatos experimentais que apiam essa Teoria Eletromagntica apiam tambm a Teoria da Relatividade. Mencionarei aqui, por ser de especial importncia, que a Teoria da Relatividade permite derivar, de maneira extremamente simples e em consonncia com a experincia, aquelas influncias que experimenta a luz das estrelas fixas devido ao movimento relativo da Terra com respeito a elas. Trata-se do deslocamento anual da posio aparente das estrelas fixas como conseqncia do movimento terrestre arredor do Sol (aberrao) e o influxo que exerce a componente radial dos movimentos relativos das estrelas fixas com respeito Terra sobre a cor da luz que chega at ns; este influxo se manifesta num pequeno deslocamento das riscas espectrais da luz que nos chega desde uma estrela fixa, com respeito posio espectral das mesmas riscas espectrais obtidas com uma fonte luminosa terrestre (princpio de Doppler). Os argumentos experimentais a favor da Teoria de Maxwell-Lorentz, que ao mesmo tempo so argumentos a favor da Teoria da Relatividade, so demasiado copiosos como para exp-los aqui. De fato, restringem a tal ponto as possibilidades tericas, que nenhuma outra teoria diferente da de Maxwell-Lorentz se pde impor frente experincia. No entanto, h duas classes de fatos experimentais constatados at agora que a Teoria de Maxwell-Lorentz s pode acomodar a base de recorrer a uma hiptese auxiliar que de seu isto , sem utilizar a Teoria da Relatividade parece estranha. sabido que os raios catdicos e os assim chamados raios emitidos por substncias radiativas constam de corpsculos eltricos negativos (eltrons) de pequenssima inrcia e grande velocidade. Pesquisando o deslocamento destas radiaes sob a influncia de campos eltricos e magnticos se pode estudar muito exatamente a lei do movimento destes corpsculos. No tratamento terico destes eltrons h que lutar com a dificuldade de que a Eletrodinmica por si s no capaz de explicar sua natureza. Pois dado que as massas eltricas de igual sinal se repelem, as massas eltricas negativas que constituem o eltron deveriam separar-se umas de outras sob a influncia de sua interao se no fosse pela ao de outras foras cuja natureza nos resulta ainda obscura13. Se supomos agora que as distncias relativas das massas eltricas que constituem o eltron permanecem constantes ao mover-se este (unio rgida no sentido da Mecnica Clssica), chegamos a uma lei do movimento do eltron que no concorda com a experincia. H. A. Lorentz, guiado por consideraes puramente formais, foi o primeiro em introduzir a hiptese de que o corpo do eltron experimenta, em virtude do movimento, uma contrao proporcional expresso

    13 A teoria da relatividade geral prope a idia de que as massas eltricas de um eltron se

    mantm unidas por foras gravitacionais.

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    1 v2 c2 na direo do movimento

    Esta hiptese, que eletrodinmicamente no se justifica de modo algum, proporciona essa lei do movimento que se viu confirmada com grande preciso pela experincia nos ltimos anos. A Teoria da Relatividade fornece a mesma lei do movimento sem necessidade de propor hipteses especiais sobre a estrutura e o comportamento do eltron. Algo anlogo ocorria, como vimos na seo 13, com o experimento de Fizeau, cujo resultado o explicava a Teoria da Relatividade sem ter que fazer hiptese sobre a natureza fsica do fluido. A segunda classe de fatos que assinalamos se refere questo de se o movimento terrestre no espao se pode detectar ou no em experimentos efetuados na Terra. J indicamos na seo 5 que todas as tentativas realizadas neste sentido deram resultado negativo. Com anterioridade Teoria Relativista, a cincia no podia explicar facilmente este resultado negativo, pois a situao era a seguinte. Os velhos preconceitos sobre o espao e o tempo no permitiam nenhuma dvida a respeito de que a transformao de Galileu era a que regia o passo de um corpo de referncia a outro. Supondo ento que as equaes de Maxwell-Lorentz sejam vlidas para um corpo de referncia K, resulta que no valem para outro corpo de referncia K' que se mova uniformemente com respeito a K se se aceita que entre as coordenadas de K e K' regem as relaes da transformao de Galileu. Isto parece indicar que de entre todos os sistemas de coordenadas de Galileu se destaca fisicamente um (K) que possui um determinado estado de movimento. Fisicamente se interpretava este resultado dizendo que K est em repouso com respeito a um hipottico ter luminfero, enquanto todos os sistemas de coordenadas K' em movimento com respeito a K estariam tambm em movimento com respeito ao ter. A este movimento de K' com respeito ao ter (vento do ter em relao a K') se lhe atribuam as complicadas leis que pretensamente valiam com respeito a K'. Para ser conseqentes, tinha que postular tambm um vento do ter semelhante com relao Terra, e os fsicos puseram durante muito tempo todo seu empenho em provar sua existncia. Michelson achou com este propsito um caminho que parecia infalvel. Imaginemos dois espelhos montados sobre um corpo rgido, com as faces refletivas olhando-se de frente. Se todo este sistema se acha em repouso com respeito ao ter luminfero, qualquer raio de luz precisa um tempo muito determinado T para ir de um espelho ao outro e voltar. Pelo contrrio, o tempo (calculado) para esse processo algo diferente (T)quando o corpo, junto com os espelhos, move-se com respeito ao ter. mais! Os clculos predizem que, para uma determinada velocidade v com respeito ao ter, esse tempo T diferente quando o corpo se move perpendicularmente ao plano dos espelhos que quando o faz paralelamente. Ainda sendo minscula a diferena calculada entre estes dois intervalos temporrios, Michelson e Morley realizaram um experimento de interferncias no que essa discrepncia teria que se ter posto claramente de manifesto. O resultado do experimento foi, no obstante, negativo, para grande desconcerto dos fsicos. Lorentz e Fitzgerald sacaram teoria deste desconcerto,

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    supondo que o movimento do corpo com respeito ao ter determinava uma contrao daquele na direo do movimento e que dita contrao compensava justamente essa diferena de tempos. A comparao com as consideraes da seo12 demonstra que esta soluo era tambm a correta desde o ponto de vista da Teoria da Relatividade. Mas a interpretao da situao segundo esta ltima incomparavelmente mais satisfatria. De acordo com ela, no existe nenhum sistema de coordenadas privilegiado que d p a introduzir a idia do ter, nem tambm no nenhum vento do ter nem experimento algum que o ponha de manifesto. A contrao dos corpos em movimento se segue aqui, sem hipteses especiais, dos dois princpios bsicos da teoria; e o decisivo para esta contrao no o movimento em si, ao que no podemos atribuir nenhum sentido, seno o movimento com respeito ao corpo de referncia eleito em cada caso. Por conseguinte, o corpo que sustenta os espelhos no experimento de Michelson e Morley no se encurta com respeito a um sistema de referncia solidrio com a Terra, mas sim com respeito a um sistema que se ache em repouso em relao ao Sol. (figura 10 explica a experincia de Michelson e Morley)

    fig. 10

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    17. O ESPAO QUADRIDIMENSIONAL DE MINKOWSKI

    O no matemtico se sente coagido por um arrepio mstico ao ouvir a palavra quadridimensional, uma sensao no diferente da provocada pelo fantasma de uma comdia. E, no entanto, no h enunciado mais banal que o que afirma do que nosso mundo cotidiano um contnuo espao-temporal quadridimensional. O espao um contnuo tridimensional. Quer dizer isto que possvel descrever a posio de um ponto (em repouso) mediante trs nmeros x, y, z (coordenadas) e que, dado qualquer ponto, existem pontos arbitrariamente prximos cuja posio se pode descrever mediante valores coordenados (coordenadas) x1, y1, z1 que se aproximam arbitrariamente s coordenadas x, y, z do primeiro. Devido a esta ltima propriedade falamos de um contnuo; devido ao carter trplice das coordenadas de tridimensional. Analogamente ocorre com o Universo fsico, com o que Minkowski chama brevemente mundo ou Universo, que naturalmente quadridimensional no sentido espao-temporrio. Pois esse Universo se compe de eventos individuais, cada um dos quais pode descrever-se mediante quatro nmeros, a saber, trs coordenadas espaciais x, y, z e uma coordenada temporal, o valor do tempo t. O Universo neste sentido tambm um contnuo, pois para cada acontecimento existem outros (reais ou imaginveis) arbitrariamente prximos cujas coordenadas x1, y1, z1, t1 se diferenciam arbitrariamente pouco das do acontecimento contemplado x, y, z, t. O que no estejamos useiro e vezeiro a conceber o mundo neste sentido como um contnuo quadridimensional se deve a que o tempo desempenhou na fsica pr-relativista um papel diferente, mais independente, frente s coordenadas espaciais, pelo qual nos habituamos a tratar o tempo como um contnuo independente. De fato, na Fsica Clssica o tempo absoluto, isto , independente da posio e do estado de movimento do sistema de referncia, o qual fica patente na ltima equao da transformao de Galileu (t' = t). A Teoria da Relatividade serve na bandeja a viso quadridimensional do mundo, pois segundo esta teoria o tempo despojado de sua independncia, tal e como mostra a quarta equao da transformao de Lorentz:

    Efetivamente, segundo esta equao a diferena temporria t de dois eventos com respeito a K no se anula em general, ainda que a diferena temporria t daqueles com respeito a K seja nulo. Uma distncia puramente espacial entre dois eventos com relao a K tem como conseqncia uma distncia temporria daqueles com respeito a K'. A importncia da descoberta de Minkowski para o desenvolvimento formal da Teoria da Relatividade no reside tambm no aqui, seno no reconhecimento de que o contnuo quadridimensional da Teoria da Relatividade mostra em suas principais propriedades formais o mximo

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    parentesco com o contnuo tridimensional do espao geomtrico euclidiano14. No entanto, para fazer ressaltar do todo este parentesco preciso substituir as coordenadas temporrias usuais t pela quantidade imaginria

    -1 ct

    proporcional a elas. As leis da natureza que satisfazem os requisitos da Teoria da Relatividade (especial) tomam ento formas matemticas nas que a coordenada temporal desempenha exatamente o mesmo papel que as trs coordenadas espaciais. Estas quatro coordenadas (figura 11) se correspondem exatamente, desde o ponto de vista formal, com as trs coordenadas espaciais da geometria euclidiana. Inclusive ao no matemtico lhe saltar vista que, graas a este achado puramente formal, a teoria teve que ganhar uma dose extraordinria de clareza.To superficiais indicaes no do ao leitor seno uma noo muito vaga das importantes idias de Minkowski, sem as quais a Teoria da Relatividade Geral, desenvolvida a seguir em suas linhas fundamentais, teria ficado qui no nascedouro. Agora , como para compreender as idias fundamentais da Teoria da Relatividade Especial ou Geral no necessrio entender com mais exatido esta matria, sem dvida de difcil acesso para o leitor no exercitado na matemtica, o deixaremos neste ponto para voltar sobre isso nas ltimas consideraes deste livro.

    Fig. 11

    14 Cf. a exposio algo mais detalhada no Apndice.

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    NOTA DO TRADUTOR

    EVIDNCIAS DA DILATAO TEMPORAL Uma das primeiras evidncias da dilatao temporal foi obtida por meio de experimentos com uma partcula chamada mon. Quando fazemos experimentos no laboratrio com mons em repouso, observamos que eles se desintegram com uma vida mdia de 2,2 . 10-6 s. Muitos mons so criados na alta atmosfera, como resultado do bombardeio dos raios csmicos. Esses mons movem-se com velocidade prxima da luz:

    v = 2,994 .108 m/s

    Portanto, entre o momento em que so criados e o momento em que se desintegram, deveriam percorrer, em mdia, uma distncia de:

    d = v . ( t ) d = ( 2,994 . 108 m / s ) . (2,2 . 10-6 s) d = 650 m

    No entanto, a experincia mostra que mons criados a quase 10 km de altitude so detectados na superfcie da Terra. Isso acontece por causa da dilatao temporal. Para um referencial fixo no mon, o tempo de desintegrao :

    t' = 2,2 . 10-6 s Para um referencial fixo na Terra, temos:

    Como:

    Assim:

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    Portanto:

    Assim, para um observador na Terra, a distncia percorrida pelo mon antes de desintegrar-se :

    D = v . (t ) D = ( 2,994 . 108 m / s ) . (35 . 10-6 s) D = 10.000 m

    Outro tipo de teste, consistiu em comparar relgios atmicos, que marcam intervalos de tempo muito pequenos. Um foi mantido no solo, enquanto outro foi colocado em um avio que percorreu uma grande distncia a uma grande velocidade em relao Terra. Terminado o vo, os relgios foram comparados e constatou-se que o relgio do avio estava ligeiramente atrasado em relao ao relgio que foi mantido no solo.

    A RELATIVIDADE DO COMPRIMENTO

    Suponhamos que um objeto tenha comprimento L' quando em repouso em relao a um observador (fig. d). Einstein mostrou que, quando se move com velocidade V (em relao a esse mesmo observador) na mesma direo em que foi medido o comprimento (fig. e ), esse objeto apresenta um comprimento L tal que:

    Observe que o comprimento h no se altera. Dizemos ento que houve uma contrao de comprimento. A equao que liga L' e L :

  • 44

    A contrao de comprimento dada pela equao I pode ser percebida por meio de medidas. No entanto, o aspecto visual outra coisa. A imagem formada na retina de um observador (ou no filme de uma mquina fotogrfica) constituda de raios de luz que chegam praticamente ao mesmo tempo na retina (ou no filme), mas partiram do objeto em momentos diferentes. A conseqncia disso que a imagem vista (ou fotografada) levemente distorcida. Na figura f mostramos um cubo em repouso. Quando esse cubo se move para a direita com velocidade prxima de c, a imagem observada tem o aspecto da figura g, como mostra uma simulao feita em computador.

    A RELATIVIDADE DA MASSA

    Outra conseqncia dos postulados de Einstein que a massa inercial varia com a velocidade. Sendo Mo a massa de um corpo quando est em repouso em relao a um referencial inercial e M a massa desse mesmo corpo quando tem velocidade v em relao a esse mesmo referencial, temos:

    A massa aumenta com a velocidade. Porm, para que o denominador no se anule, a velocidade v no pode atingir (nem superar) o valor c.

    importante salientar que massa no matria.

    O que aumenta com a velocidade no a quantidade de matria do corpo, mas sim sua massa inercial, a qual mede a inrcia do corpo. Quanto maior a velocidade, maior ser a inrcia, isto , mais difcil torna-se a variao de velocidade.

  • 45

    MASSA E ENERGIA

    Entre o grande pblico, o aspecto mais conhecido da Teoria da Relatividade , sem dvida, a equao

    E = m . c2

    que relaciona a massa (m) com a energia (E).

    O significado dessa equao, contudo, bem mais complexo do que pode parecer primeira vista. Antes de consider-la, vamos analisar o significado de uma equao parecida com ela: E = (m ) . c2

    Einstein introduziu a Teoria da Relatividade em seu trabalho "Sobre a eletrodinmica dos corpos em movimento", escrito em junho de 1905. Em setembro do mesmo ano, ele publicou mais um pequeno trabalho, complementando o anterior, intitulado "A inrcia de um corpo depende de seu contedo de energia?".

    Nesse trabalho ele mostrou que a massa inercial de um corpo varia toda vez que esse corpo ganha ou perde energia, qualquer que seja o tipo de energia. Se um corpo receber uma quantidade de energia E, sua massa inercial ter um aumento m dado por: E = (m ) . c2

    Do mesmo modo, se o corpo perder energia, sua massa inercial ir diminuir. Assim, a massa de um tijolo quente maior do que a de um tijolo frio; uma mola comprimida tem massa maior do que quando no estava comprimida, pois o acrscimo de energia potencial elstica ocasiona um aumento da massa inercial da mola. Quando um corpo tem sua velocidade aumentada, aumenta tambm sua energia cintica; esse aumento de energia cintica que acarreta o aumento da massa inercial do corpo. Por Exemplo: Um recipiente contm 1 kg de gua temperatura de 3C. Se ela for aquecida at atingir a temperatura de 93C, qual ser sua nova massa? So dados: ca = calor especfico da gua = 1 cal / g . C c = velocidade da luz no vcuo = 3.108 m/s 1 caloria = 4 joules Resoluo: A massa inercial da gua : M1 = 1kg = 1000 g A temperatura inicial da gua q1 = 3C e a temperatura final q2 = 93C. Assim, a variao de temperatura : q = q2 - q1 = 93C - 3C = 90C Deixando de lado os cuidados com os algarismos significativos, a quantidade de calor absorvida pela gua foi:

  • 46

    Q = m . ca . (q ) = ( 1 000 g ).(1 cal / g, C).(90 C) Q = 9.104 cal = 36.104 J Essa quantidade de calor a energia absorvida pela gua, ou seja: E = Q = 36.104 J Da equao E = (m ) . c2 tiramos: m = E / c2 = 36.104 J / ( 3.108 m/s2 ) m = 36.104 J / ( 9.1016 m2/s2 ) m = 4.10-12 Kg = 0,000000000004 Kg Como vemos uma variao muito pequena, que mesmo as balanas mais precisas no conseguem determinar. Mas, de qualquer modo, sendo m2 a massa final da gua teremos: m2 = m1 + Dm = 1Kg + 0,000000000004 Kg m = 1,000000000004 Kg

    Nas aulas de Qumica voc deve ter aprendido a lei da conservao da massa de Lavoisier. Segundo essa lei, a massa total dos reagentes igual massa total dos produtos de uma reao qumica. Agora sabemos que essa igualdade aproximada, pois durante uma reao qumica em geral h absoro ou liberao de calor (ou luz) para o ambiente. Desse modo h uma variao de massa.

    Porm, como ocorreu no exemplo anterior, essa variao de massa to pequena que as balanas no conseguem determin-la. S foi possvel verificar a validade da equao de Einstein quando os fsicos conseguiram analisar as transformaes com os ncleos dos tomos, pois, durante essas transformaes, as variaes de massa so muito maiores do que as que ocorrem numa reao qumica e, assim, podem ser mais facilmente percebidas. importante ressaltar que no interior do ncleo h dois tipos de energia potencial: a energia potencial eltrica, devida repulso eltrica entre os prtons, e a energia potencial nuclear, correspondente fora nuclear que mantm os componentes do ncleo unidos.

    Quando a equao E = (m) . c2 comentada em artigos publicados em jornais ou revistas, freqentemente lemos frases do tipo: "A energia pode ser convertida em massa, e vice-versa". Essa frase, porm, no est correta. No h converso de energia em massa (ou vice-versa). Vejamos por qu.

    Em primeiro lugar a massa no uma "coisa", mas sim uma propriedade, uma medida da inrcia. Portanto, no pode ser convertida (transformada) em nada.

    Em segundo lugar quando h converso, algo deve desaparecer para dar lugar a outra coisa. No entanto, quando fornecemos energia a um corpo, ela no desaparece, continua l, como energia. Consideremos, por exemplo, o caso da compresso de uma mola. Ao comprimirmos a mola, fornecemos a ela uma energia que fica armazenada na forma de energia potencial elstica, ela no desaparece. Ento, por que essa energia produz um aumento da massa da mola? A energia produz aumento da massa porque tem inrcia, isto , a energia tem massa.

  • 47

    Por isso, um dos trabalhos de Einstein sobre a relao entre massa e energia, publicado em 1907, tinha o seguinte ttulo: "Sobre a inrcia da energia, como conseqncia do princpio de relatividade".

    Outra noo freqente que tambm deve ser evitada a da equivalncia entre massa e energia, pois ela d uma idia de igualdade entre massa e energia, o que no verdade. A massa inercial mede a inrcia de um corpo, isto , sua resistncia a mudanas de velocidade, enquanto a energia representa, numa definio simplificada, capacidade de realizar trabalho.

    O que podemos dizer, ento, que a equao de Einstein exprime uma proporcionalidade entre os valores numricos das variaes de massa e energia.

    O equvoco com a palavra converso tem como origem o fenmeno que comentaremos a seguir.

    MATRIA E RADIAO

    De acordo com a Fsica Clssica, as ondas eletromagnticas se propagam de uma maneira contnua. No entanto, de acordo com a Mecnica Quntica, as ondas eletromagnticas se propagam na forma de "pacotinhos" denominados ftons. Cada fton tem uma quantidade de energia que depende da freqncia da onda eletromagntica, como veremos no prximo apndice. Aqui, para simplificar os termos empregados, chamaremos uma onda eletromagntica de radiao.

    Existe variadas transformaes de radiao em matria, como o reproduzido na figura 13, onde um fton se transforma em duas partculas materiais, que so um eltron e um psitron.

    Tambm possvel o fenmeno inverso: a transformao de matria em radiao.

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    Na figura 13 mostramos o caso em que um eltron se encontra com um psitron, produzindo dois ftons.

    Nestes dois casos podemos dizer que houve converso, pois algo desapareceu dando origem a outra coisa.

    Durante o sculo XX, os fsicos constataram que para cada partcula existe uma antipartcula de modo que, ao se encontrarem, se aniquilam, isto , transformam-se em radiao. Quando isso ocorre, a equao E = (m ) . c2 pode ser usada para relacionar a energia da radiao com a massa da matria. Quando um corpo tem