A Sustentabilidade Do Sistema Construtivo Em Terra. Um Projecto de Reabilitação
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UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR Engenharia
A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA:
UM PROJECTO DE REABILITAO
Carlos de Castro Ferreira
Dissertao para obteno do Grau de Mestre em
Arquitectura (ciclo de estudos integrado)
Orientador: Prof. Doutor Luiz Antnio Pereira de Oliveira Co-orientador: Prof. Jorge Humberto Canastra Marum
Covilh, Outubro de 2012
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Patrcia e aos meus pais, Carlos e Goretti
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
v
Resumo
Esta dissertao tem como objectivo investigar o mtodo construtivo em taipa como
uma alternativa sustentvel em projectos de reabilitao de edifcios. Com esta inteno
procurou-se aprofundar o conhecimento sobre este sistema construtivo e perceber de que
forma pode um mtodo construtivo vernacular adaptar-se arquitectura contempornea, s
necessidades actuais de habitabilidade e ao mesmo tempo ser uma construo sustentvel,
visto ser esta uma questo muito debatida actualmente.
Inicia-se esta investigao abordando as diferentes tcnicas de construo em terra e
a sua aplicao ao longo dos tempos. Procurou-se ainda perceber as vantagens e desvantagens
deste mtodo construtivo e todos os procedimentos deste processo construtivo. As principais
anomalias deste tipo de construo e as tcnicas de restauro/reabilitao so tambm
abordadas.
Como o caso prtico proposto nesta dissertao pretende a sua implantao na regio
do Algarve Portugal, o comportamento ssmico deste tipo de construo foi tido em conta
nas decises e detalhes do projecto de arquitectura.
Finalmente, e aps a interiorizao de todos os conhecimentos adquiridos ao longo da
investigao, pensa-se que o tema seleccionado possa contribuir para a revitalizao do
sistema construtivo em terra, como alternativa sustentvel em projecto de reabilitao
contemporneo e para o desenvolvimento do ecoturismo.
Palavras-chave
Construo em terra, Ecoturismo, Reabilitao, Sustentabilidade, Taipa.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
vii
Abstract
This dissertation explores the rammed earth construction method as a sustainable
alternative in building rehabilitation project. To attain this objective our knowledge about
this building system was deepened in order to understand how this construction method could
be adapted to contemporary architecture. The current needs of habitability and at principles
of sustainability, issues greatly debated these days, were taking into account in this study.
The study addresses different construction techniques using earth and some aspects
showing their historical evolution. The advantages and disadvantages of this constructive
method, well as all procedures of the constructive process are discussed. The main anomalies
of rammed earth buildings and the techniques of restoration/rehabilitation it is also
presented.
The proposal concerns the use of this building system construction in the rehabilitation
of rural buildings by means of a project of rural touristic complex. As this proposal is defined
to be located at Algarve region, in Portugal, the seismic behavior of this type of construction
was considered important in this research and this aspect was taking into account in the
architectural choices.
Other than a building project, here proposed, it is think that the research theme
selected for this dissertation has been essential to recovery this old construction technique as
an alternative to project and build contemporary architecture as well a contribution to the
ecotourism development.
Keywords
Earth building, Ecotourism, Rammed earth, Rehabilitation, Sustainability.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
ix
ndice
Captulo I
1. Problema 1
2. Enquadramento 1
3. Objectivos 2
4. Metodologia 3
5. Estrutura 3
Captulo II
6. Tcnicas construtivas em terra 5
7. A construo em terra ao longo dos tempos 12
7.1. Origem da construo em terra 12
7.2. A utilizao do sistema construtivo em taipa pelo mundo 15
7.2.1. sia 15
7.2.2. Oceania 16
7.2.3. Amrica 16
7.2.4. frica 17
7.2.5. Europa 17
7.3. A Histria da construo em terra em Portugal 18
7.4. A utilizao do sistema construtivo em taipa em Portugal 19
8. Taipa enquanto sistema construtivo 21
8.1. Vantagens e desvantagens do mtodo construtivo 21
8.2. Escolha da matria-prima adequada 22
8.3. Ensaios ao solo 24
8.4. Processo construtivo 29
8.4.1. Utenslios usados na construo 29
8.4.2. Preparao do solo 31
8.4.3. Construo de paredes 31
8.4.4. Revestimento das paredes 32
8.5 A estrutura dos edifcios em taipa 33
9. Comportamento ssmico do sistema construtivo em taipa 35
9.1. Estabilidade atravs da matria-prima 36
9.2. Estabilidade atravs da volumetria 37
9.2.1. Aspectos estruturais 37
9.3. Paredes anti-ssmicas de taipa 38
9.3.1. Estabilizao das paredes atravs da sua forma 38
9.3.2. Estabilizao das paredes atravs de reforos internos 40
9.4. Unies crticas entre elementos 40
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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9.4.1. Unio das paredes com as fundaes 40
9.4.2. Unio entre as paredes, nos cunhais 40
9.4.3. Unio entre as paredes e a cobertura 41
9.4.4. Empenas 41
9.4.5. Coberturas apoiadas nas paredes 41
9.4.6. Coberturas independentes das paredes 41
9.4.7. Vos 41
10. Restauro de edifcios em taipa 42
10.1. Principais causas de anomalias 42
10.2. Mtodos de restauro 42
10.3. Reabilitao da resistncia ssmica de edifcios em taipa 43
Captulo III
11. A regio do Algarve 47
11.1. Enquadramento geogrfico 47
11.2. Enquadramento geolgico 48
11.3. A construo caracterstica da regio 49
12. Clima da regio do Algarve 50
12.1. A influncia do clima local na construo 51
13. Enquadramento ssmico na regio do Algarve 52
13.1. Sismicidade 52
13.2. Perigosidade ssmica 53
Captulo IV
14. Estudo de caso 55
14.1. Um projecto de reabilitao 55
14.2. Enquadramento da aldeia da Sapeira 55
14.2.1. Caracterizao 55
14.2.2. Breve enquadramento histrico 56
14.3. O local de interveno 57
14.3.1. Localizao 57
14.3.2. Caracterizao 58
14.4. Enquadramento do local de interveno com os planos municipais de
ordenamento do territrio
59
14.4.1. Localizao da rea a intervir nas cartas dos planos 59
14.4.1.1. Plano Director Municipal 59
14.4.1.2. Plano de Ordenamento das Albufeiras de guas Pblicas
da Albufeira de Odelouca
62
14.5. Memria descritiva 64
14.5.1. Breve abordagem ao turismo ecolgico 64
14.5.2. Enquadramento do ecoturismo com o mtodo construtivo em taipa 65
14.5.3. Descrio geral da proposta 66
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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14.5.4. Edifcio de Recepo (reabilitao) 68
14.5.5. Edifcios de habitao 70
14.5.6. Acessibilidades 73
15. Anlise das fichas de caracterizao 73
Concluso 75
Bibliografia 77
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
xii
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Lista de Figuras
Figura 1 Diagrama de classificao das diferentes tcnicas construtivas em funo do
seu tipo de estrutura
5
Figura 2 Construo por subtraco na vertical 6
Figura 3 - Construo por subtraco na horizontal 6
Figura 4 Exemplo de argamassa utilizada no sistema construtivo terra plstica 6
Figura 5 Parede construda com o mtodo terra plstica 6
Figura 6 Exemplo de argamassa utilizada no sistema construtivo terra empilhada 7
Figura 7 Edifcio em construo com o mtodo terra empilhada 7
Figura 8 Bloco prensado (BTC) 8
Figura 9 Extraco de blocos cortados 8
Figura 10 Prensa manual para a produo de blocos de adobe mecnico 9
Figura 11 Edifcio em construo com o mtodo da terra ensacada 10
Figura 12 Edifcio com paredes do primeiro piso em terra sobre engrado 11
Figura 13 Edifcio com cobertura em terra 11
Figura 14 Abrigo com paredes em terra sobre engrado e telhado em colmo 12
Figura 15 Zigurate 14
Figura 16 Mastaba 14
Figura 17 Arquitectura de terra no mundo 15
Figura 18 Distribuio geogrfica das principais tcnicas de construo em terra em
Portugal
19
Figura 19 Palheiro em taipa, na aldeia da Sapeira 20
Figura 20 Castelo de Paderne 20
Figura 21 Central de monitorizao da estao de tratamento de guas residuais de
vora
20
Figura 22 Diagrama triaxial de classificao do solo 23
Figura 23 Frascos de vidro utilizados para o teste por sedimentao 25
Figura 24 Bola em terra utilizada para a realizao do teste de reteno de gua 26
Figura 25 Cilindro em terra utilizado para a realizao do teste de resistncia
secagem
27
Figura 26 Peneiras utilizadas para a realizao do teste de anlise granulomtrica 28
Figura 27 Elementos constituintes de uma cofragem 29
Figura 28 Exemplos de piles ou maos tradicionais 30
Figura 29 Compactao da terra de forma manual 30
Figura 30 Compactao da terra de forma mecanizada 30
Figura 31 Esquema de juntas na diagonal 32
Figura 32 Edifcio em taipa com juntas verticais 32
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Figura 33 Edifcio em taipa sem juntas 32
Figura 34 Planta de uma habitao anti-ssmica, no Afeganisto 37
Figura 35 Exemplos de implantao de paredes, estabilizadas pela sua forma 38
Figura 36 Propores aconselhadas para o dimensionamento de paredes 39
Figura 37 Unio aconselhvel para as paredes 39
Figura 38 Telas de ao inox 44
Figura 39 Esquema de aplicao da tela em ao inox 45
Figura 40 Esquema de aplicao da estrutura em madeira 45
Figura 41 Mapa com os distritos de Portugal 48
Figura 42 Mapa da regio do Algarve 48
Figura 43 Mapa do ndice de precipitao anual na regio do Algarve 50
Figura 44 Carta de intensidades mximas 53
Figura 45 Epicentros dos sismos ocorridos em Portugal entre 1998 e 2003 53
Figura 46 Freguesias do concelho de Silves 55
Figura 47 Vista area com a localizao da aldeia da Sapeira e de So Marcos da Serra 57
Figura 48 Vista area da aldeia da Sapeira com a localizao da rea de interveno 58
Figura 49- Sobreposio da rea de interveno com a Carta de Ordenamento do PDM de
Silves. (sem escala)
59
Figura 50- Sobreposio da rea de interveno com a Carta de Condicionantes do PDM
de Silves. (sem escala)
61
Figura 51- Sobreposio da rea de interveno com a Carta de REN do PDM de Silves.
(sem escala)
61
Figura 52- Sobreposio da rea de interveno com a Planta de Sntese do POAAP da
albufeira de Odelouca. (sem escala)
62
Figura 53- Sobreposio da rea de interveno com a Planta de Condicionantes do
POAAP da albufeira de Odelouca. (sem escala)
63
Figura 54- Planta esquemtica de reas. (sem escala) 66
Figura 55- Esquema explicativo do conceito 69
Figura 56 - Esquema em planta das habitaes 70
Figura 57 - Estudos da estrutura de suporte da cobertura 71
Figura 58 - Esquema de funcionamento ideal das louas sanitrias 72
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Lista de Tabelas
Tabela 1 Informao relativa ao diagrama da Figura 1 5
Tabela 2 Sismos que mais afectaram o Algarve 52
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Lista de Acrnimos
ONG Organizao No Governamental
BTC Blocos de Terra Comprimidos
CEB Compressed Earth Blocks
CCDRA Comisso de Coordenamento e Desenvolvimento Regional do Algarve
ACIS Asociacion Colombiana de Ingenieria Sismica
REN Reserva Ecolgica Nacional
RAN Reserva Agrcola Nacional
POAAP Plano de Ordenamento das Albufeiras de guas Pblicas
PDM Plano Director Municipal
LNEC Laboratrio Nacional de Engenharia Civil
SNDA Sindicato Nacional Dos Arquitectos
DGOTDU
Direco-Geral do Ordenamento do Territrio e Desenvolvimento Urbano
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Captulo I
1. Problema
Desde que os homens constroem cidades, h cerca de dez mil anos, a terra crua tem
sido, atravs de tradies eruditas e populares, um dos principais materiais de construo
utilizados. Assim, mais de um tero da populao do nosso planeta vive hoje em habitaes
de terra. () margem das cidades, sobretudo as culturas rurais perpetuam mltiplas
tradies das arquitecturas de terra; a diversidade tal, que um inventrio seria fastidioso.
(Perdigo, 1993)
A terra crua, como tcnica construtiva, tem sido, desde h mais tempo, a mais
utilizada pelo homem para a construo. Actualmente, devido, principalmente,
preocupao com a sustentabilidade, quer econmica, quer ambiental, este mtodo
construtivo tm-se afirmado como uma alternativa frequente construo em beto armado.
Portugal um dos pases da Europa com maior tradio em construo em terra, o que
se deve ao seu grande potencial para a prtica deste mtodo construtivo. Este assume maior
expressividade a sul do pas, nomeadamente na regio do Alentejo e Algarve. Durante um
longo perodo de tempo verificou-se uma preferncia por este mtodo de construir devido ao
baixo custo proporcionado pela existncia de material no local da construo. Contudo,
devido falta de consciencializao e proliferao da construo em beto armado, esta
tcnica construtiva tem entrado em desuso, facto que se pretende alterar. Para tal,
necessrio repensar a aplicao deste material de forma a desmistificar a actual ligao deste
com a arquitectura tradicional, maioritariamente utilizado por uma classe econmica baixa,
informando e demostrando que este um material que permite pensar a arquitectura
utilizando uma linguagem contempornea. Alm disso possvel realizar uma construo no
poluente, com um material de baixo custo, perfeitamente reciclvel e que oferece uma
qualidade ao ambiente interior dos espaos que outros materiais dificilmente conseguem
atingir, dispensando em muitos casos a necessidade de utilizao de sistemas de climatizao
artificial, o que o torna um sistema extremamente sustentvel e ecolgico. Este um
processo essencial para credibilizar a construo em terra num futuro prximo.
2. Enquadramento
O desenvolvimento de temas relacionados com a arquitectura sustentvel tem surgido
nas ltimas dcadas como necessidade de resposta crise ambiental, em que nos
encontramos actualmente. Os nveis actuais de poluio tm vido a destruir a camada do
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
2
ozono, provocando enormes alteraes climatricas, o que revela a necessidade de reflexo
sobre este tema.
Nas ltimas dcadas estas reflexes foram fundamentais para a difuso de tcnicas
construtivas. Tanto as contemporneas como as tradicionais, apresentam baixo impacto
ambiental, deste modo, a taipa enquanto sistema construtivo tem-se vindo a afirmar em
relao a outros, uma vez que, para alm do baixo custo da sua matria-prima, esta no
apresenta necessidade de transporte, nem de maquinaria demasiado poluente para a sua
transformao, permitindo edificar com uma pegada ecolgica extremamente reduzida.
O ecoturismo manifesta-se num segmento de actividade turstica que visa conservar e
utilizar de forma sustentvel o patrimnio natural e cultural, atravs da consciencializao e
interpretao do ambiente, o que demonstra uma simbiose entre o mtodo construtivo acima
referido e as necessidades de construo deste tipo de equipamentos. Como tal, considera-se
pertinente explorar este sistema construtivo e a relao com este tipo de equipamentos,
tendo em conta que as especificidades da regio ao nvel do clima, fauna e flora local
potenciam o bom funcionamento de todo o conjunto.
O tipo de clima que se manifesta na regio do Algarve perfeitamente compatvel com
este tipo de construo, como o demonstra o grande nmero de edifcios outrora edificados.
Estes edifcios foram executados a baixo custo, recorrendo a mo-de-obra barata sendo,
muitas vezes, realizada em comunidade, num sistema de autoconstruo. Constituindo abrigo
face s variaes de temperatura registadas ao longo do ano, e tirando partido da fraca
precipitao da regio, eram edificadas habitaes, palheiros, abrigos para os animais, muros
e fortalezas. Deste modo verifica-se o grande poder de aplicabilidade do material e o
aproveitamento das suas vantagens.
Com o passar das dcadas esta regio rural e piscatria foi-se voltando cada vez mais
para a actividade turstica, sendo hoje a maior do pas. Este facto justifica a necessidade de
criao de novos equipamentos com ofertas invulgares e inovadoras, aumentando a
curiosidade e a oferta disponvel no mercado com vista evoluo deste segmento.
3. Objectivos
A presente dissertao tem como objectivo explorar as potencialidades da construo
em terra, das quais se pretende aprofundar os seus mtodos construtivos, tanto os mais
rudimentares como tambm os mais modernos e evoludos, de modo a compreender e abordar
correctamente as vantagens e desvantagens deste sistema construtivo. com base nesta
pesquisa que se vai conceber um mtodo de interveno modelo, no qual se ir valorizar os
pontos fortes e corrigir as fragilidades, de forma que, atravs destas melhorias seja possvel
uma reabilitao que se integre nos critrios de sustentabilidade. Estes princpios sero
aplicados na concepo de novos edifcios de habitao temporria para turismo, assim como,
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
3
na reabilitao de uma edificao de terra que se encontra abandonada, num estado bastante
deteriorado. A interveno passa pela sua construo e reabilitao, tendo em conta as
exigncias actuais sobretudo ao nvel do conforto e demais necessidades, sempre de modo a
tirar o mximo partido da utilizao deste material como um material ecolgico e no
poluente, permitindo uma construo ecolgica com um impacto no ambiente bastante
reduzido. Com isto pretende-se demonstrar a adequabilidade deste sistema construtivo s
especificidades da arquitectura contempornea e os seus benefcios no processo de
construo.
4. Metodologia
A primeira abordagem ao trabalho consiste numa recolha e anlise de informao
relativa construo em terra crua desde a sua origem ao seu uso ao longo dos tempos, na
qual se ir aprofundar a sua aplicao em Portugal, principalmente na regio do Algarve.
Posteriormente sero estudados os mtodos utilizados na construo com terra crua, de modo
a perceber e explorar as possibilidades construtivas deste material. Em funo do
reconhecimento/levantamento do local de estudo, e dada a grande expresso do sistema
construtivo em terra prensada (taipa) na rea a intervir (a qual se encontra presente em
todos os edifcios de terra existentes na aldeia), ser explorada a temtica da sua utilizao
na recuperao do edificado, bem como a vantagem da utilizao desta tcnica construtiva
em edifcios novos. Por ltimo, como reflexo de toda a investigao, ser apresentado um
caso prtico, o qual consiste na reabilitao e construo de edifcios de modo a criar as
condies necessrias para a realizao de turismo de carcter ecolgico. Para tal, ser
aplicado o sistema construtivo anteriormente referido associado s medidas ecolgicas deste
tipo de equipamento turstico.
5. Estrutura
Estruturalmente o programa do presente trabalho, encontra-se dividido em quatro
captulos essenciais e anexos.
O primeiro captulo Introduo tem como objectivo apresentar o tema da
dissertao, de modo a explicar a abordagem ao tema, quais os objectivos pretendidos, quais
as hipteses que se colocam, qual o mtodo utilizado e a forma como este ser estruturado.
O segundo captulo Estado da Arte pretende contextualizar o tema em estudo, que
se subdivide em cinco subcaptulos. No primeiro, intitulado TCNICAS CONSTRUTIVAS EM
TERRA CRUA faz-se uma breve introduo s diversas tcnicas construtivas realizadas em
terra crua. No segundo subcaptulo, A CONSTRUO EM TERRA AO LONGO DOS TEMPOS, faz-se
uma abordagem cronolgica da utilizao deste mtodo construtivo, bem como a sua
aplicao em diferentes pases, em especial em Portugal. No terceiro subcaptulo, TAIPA
COMO SISTEMA CONSTRUTIVO, faz-se uma explorao mais detalhada deste mtodo
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
4
construtivo, apresentando alguns pormenores tcnicos. No quarto subcaptulo, RESTAURO DE
EDIFCIOS EM TAIPA, pretende-se identificar as anomalias tipo mais frequentes neste tipo
de edifcios, para os quais so apresentadas solues de restauro e melhoramento. No quinto
subcaptulo, intitulado COMPORTAMENTO SISMICO DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TAIPA,
pretende-se expor os problemas deste sistema construtivo face a este tipo de aces para,
seguidamente, apresentar solues para os mesmos.
O terceiro captulo ENQUADRAMENTO DA REGIO A INTERVIR tem como objectivo,
como o prprio nome indica, sintetizar vrios tpicos referentes caracterizao da regio do
Algarve. Este captulo subdivide-se em trs subcaptulos. No primeiro, intitulado A REGIO DO
ALGARVE apresenta-se um breve enquadramento geogrfico e geolgico da Regio do Algarve,
mencionando-se ainda algumas caractersticas da construo nesta regio. No segundo
subcaptulo, CLIMA DA REGIO DO ALGARVE, faz-se um breve enquadramento do clima desta
regio. No terceiro subcaptulo, intitulado ENQUADRAMENTO SISMICO NA REGIO DO
ALGARVE, apresenta-se um enquadramento da perigosidade ssmica e da sismicidade desta
regio.
O quarto captulo INTERVENO- referente parte prtica e subdivide-se em dois
subcaptulos. No primeiro, intitulado UM PROJECTO DE REABILITAO, feito um
enquadramento do local da interveno, so verificadas as condicionantes impostas pelos
planos de ordenamento em vigor para a rea em questo e ainda realizada uma memria
descritiva onde so descritas e justificadas todas as opes efectuadas durante a realizao
do projecto. No segundo, intitulado ANLISE DAS FICHAS DE IDENTIFICAO, realizada uma
concluso dos resultados obtidos atravs do levantamento dos edifcios existentes na aldeia.
Em anexo esto organizadas todas as fichas de identificao das habitaes construdas
em taipa existentes na aldeia da Sapeira.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
5
Captulo II
6. Tcnicas construtivas em terra crua
Por tcnicas construtivas em terra, segundo Fernandes [s.d.] a entenda-se qualquer
tcnica utilizada na construo de infraestruturas, nas quais se utiliza a terra como matria-
prima sem recorrer sua cozedura. Ento, para se considerar uma tcnica construtiva
realizada com terra crua, a matria-prima no pode sofrer alterao das suas caractersticas
mineralgicas.
O grupo CRATerre1 criou, em 1986, um diagrama com o objectivo de sistematizar as
inmeras solues construtivas em terra existentes at data, o qual se pode observar na
Figura 1 (este diagrama foi interpretado e traduzido em vrias lnguas por diversos autores).
O referido diagrama apresenta uma diviso de dezoito tcnicas de construo em terra,
agrupadas em trs grupos, referentes ao tipo de estrutura, as quais segundo Fernandes [s.d.]a
e Gonalves & Gomes (2009) se classificam e definem por: A Sistemas Monolticos; B
Sistemas de Alvenaria; C Sistemas de Enchimento ou Revestimento.
1 ONG (organizao no governamental) internacional que se dedica investigao e formao na rea da construo em terra.
A
UTILIZAO DA
TERRA SOB A
FORMA
MONOLTICA
1. Terra Escavada
2. Terra Plstica
3. Terra Empilhada
4. Terra Moldada
5. Terra Prensada (Taipa)
B
UTILIZAO DA
TERRA SOB A
FORMA DE
ALVENARIA
6. Blocos Apiloados
7. Blocos Prensados
8. Blocos Cortados
9. Torres de Terra
10. Terra Extrudida
11. Adobe Mecnico
12. Adobe Manual
13. Adobe Moldado
C
UTILIZAO DA
TERRA COMO
ENCHIMENTO DE
UMA ESTRUTURA
DE SUPORTE
14. Terra de Recobrimento
15. Terra sobre Engrado
16. Terra Palha
17. Terra de Enchimento
18. Cobertura em Terra
Tabela 1 Informao relativa ao diagrama da Figura 1 Fonte: Houben & Guillaud (1989) citados em Fernandes
[s.d.]a
Figura 1 Diagrama de classificao das diferentes tcnicas construtivas em funo do seu tipo de
estrutura.
Fonte: Houben & Guillaud (1989) citados em
Fernandes [s.d.]a
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
6
O grupo A composto por cinco tcnicas construtivas pertencentes ao sistema
monoltico. Estas tcnicas permitem uma extrao e transformao do material no prprio
local da obra, evitando, assim, custos de transporte.
Descrio dos sistemas construtivos apresentados na tabela 1:
1. Terra escavada Esta tcnica, utilizada desde a pr-histria, consiste numa
construo por subtraco, em que o terreno, em estado seco ou solido, escavado dando
origem a novos espaos. Esta tcnica realizada tanto na vertical (Figura 2), como na
horizontal Figura 3).
2. Terra plstica Neste sistema construtivo a terra utilizada num estado quase
lquido (Figura 4), a qual aplicada entre cofragens para erguer paredes (Figura 5), sendo,
tambm, bastante utilizada na construo de pavimentos, recorrendo ao uso de moldes. Este
sistema, devido s caractersticas que lhe so prprias, apresenta algumas debilidades,
nomeadamente de retraco, provocadas pelo uso da matria-prima com um elevado teor de
gua.
Figura 5 Parede construda com o mtodo terra plstica.
Fonte: CRATerre [s.d.]
Figura 4 Exemplo de argamassa utilizada no sistema construtivo terra plstica.
Fonte: CRATerre [s.d.]
Figura 3 - Construo por subtraco na
horizontal. Fonte: Mikasmi (2009)
Figura 2 - Construo por subtraco na vertical.
Fonte: Melo (2011)
-
A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
7
3. Terra empilhada - Este sistema construtivo consiste na sobreposio de bolas de
terra misturada com palha (Figura 6) e na posterior aplicao por camadas (figura 7),
produzindo paredes. No fim a parede aparada ou regularizada conferindo-lhe, deste modo,
uma superfcie menos rugosa. Esta tcnica encontra-se um pouco por todo o mundo, sendo
muito conhecida pela sua designao em ingls cob.
4. Terra moldada Neste sistema a terra utilizada em estado plstico, sendo moldada
a mo na prpria parede, a qual se vai erguendo por sobreposio de camadas. Uma das
caractersticas deste sistema construtivo a decorao presente nas suas paredes,
normalmente de planta circular.
5. Terra prensada (taipa) Esta tcnica tambm conhecida como taipa ou taipa de
pilo, utiliza em geral terras arenosas com agregados de tamanho mdio (equivalentes a uma
noz) e com baixo teor de gua. Tradicionalmente, a compactao realizada manualmente
com recurso a um pilo, mais recentemente, com equipamentos pneumticos. Nos dois casos
este processo realizado entre taipais. Esta tcnica encontra-se bastante presente na
Europa, no Mediterrneo, na China, ustria, Austrlia, nos continentes Americano e Africano,
predominando no Oriente. Em Portugal, esta foi a tcnica construtiva mais utilizada no sul
(Alentejo e Algarve) at, pelo menos, aos anos 50 do sculo XX. Actualmente tem-se
verificado um interesse por esta tcnica, que , actualmente, uma das mais importantes na
nova construo em terra crua.
O grupo B composto por oito tcnicas construtivas pertencentes ao sistema de
alvenarias. As alvenarias utilizadas nos sistemas de construo pertencentes a este grupo so
previamente realizadas, e s depois so utilizadas na construo.
Figura 6 Exemplo de argamassa utilizada no sistema construtivo terra
empilhada.
Fonte: Griswold (2009)
Figura 7 Edifcio em construo com o mtodo terra empilhada. Fonte: Griswold (2009)
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Descrio dos sistemas construtivos apresentados na tabela 1:
6. Blocos apiloados Esta tcnica consiste na concepo de pequenos blocos quadrados
ou rectangulares, utilizando terra num estado plstico ou seco, comprimida com auxlio de
um pequeno mao dentro de moldes de madeira, sendo estes, posteriormente, secos ao sol.
7. Blocos prensados Esta tcnica consiste em comprimir, ou apertar presso, terra
seca. Este processo pode ser realizado manualmente, recorrendo a moldes de madeira e a um
pilo ou, como tem sido mais comum nos ltimos anos, com o auxlio de mquinas, sendo
estes blocos designados por BTC ou CEB (Figura 8). A terra utilizada no fabrico destes blocos
muitas vezes estabilizada atravs da adio de uma percentagem de cal ou cimento. Este
(cimento) comeou a ser utilizado mais recentemente com a produo de BTC. Este tem vido
a ganhar alguma popularidade devido semelhana que apresenta com outras tcnicas mais
actuais de construo (blocos de beto ou tijolo cermico).
8. Blocos cortados Este sistema construtivo surge em zonas com um solo muito
especfico, com grande concentrao de xido de ferro e alumnio, pois nestes locais onde
se podem encontrar pedreiras de extraco destes blocos (Figura 9). Estes blocos so cortados
manualmente e directamente do solo com recurso a um utenslio tipo machado. A pedreira
mais conhecida onde se efectua este tipo de extraco localiza-se na ndia, sendo os seus
blocos conhecidos como blocos de Laterite. Este tipo de extraco fica limitado a zonas de
clima hmido e quente, onde este tipo de solo mais frequente. Devido s prprias
caractersticas da matria-prima, estes blocos tm tendncia a oxidar, aproximando-os de um
material ptreo (devido dureza adquirida ao longo do tempo).
Figura 8 Bloco prensado (BTC).
Fonte: Geiger (2001)
Figura 9 Extraco de blocos cortados.
Fonte: Schellman (2006)
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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9. Torres de terra Terra vegetal coerente que permite produzir blocos, os quais,
depois de secos, so utilizados na construo de paredes.
10. Terra extrudida Esta tcnica construtiva recorre a um sistema mais moderno e
mecnico para a produo de alvenarias. A matria-prima utilizada terra seca com alguma
plasticidade. Para alm da argila que a matria-prima j contm, comum adicionar cimento
ou cal, que funcionam como ligantes. Este tipo de produo permite criar alvenarias mais
estveis e homogneas em grandes quantidades. Esta tcnica exige sistemas de produo
mais complexos. Contudo, devido s suas semelhanas com o processo de fabrico de tijolos,
so j algumas as fbricas que coordenam e fabricam ambas as alvenarias. de salientar que
esta alvenaria de terra apenas utiliza os fornos para secar, no chegando a sofrer nenhuma
cozedura.
11. Adobe mecnico Este sistema construtivo, ao nvel da produo das alvenarias,
bastante semelhante ao anterior, diferindo apenas no tipo de terra utilizado na elaborao
das alvenarias. Neste caso utilizada terra plstica com algum teor lquido, a qual
comprimida por uma prensa (Figura 10) de modo a conferir unidade aos blocos, os quais
passam depois por um processo de secagem ao ar livre.
12. Adobe manual No sendo possvel afirmar, julga-se que esta tcnica de produo
de alvenarias foi a forma primitiva dos adobes quadrados e paralelepipdicos. Esta uma
tcnica ancestral, a qual consiste em moldar ou esculpir manualmente (sem recurso a
moldes) adobes concebidos em terra plstica, e posteriormente secos ao sol.
13. Adobe moldado A concepo deste tipo de alvenarias consiste em pressionar
manualmente, sem recurso a outros utenslios, a terra em estado plstico dentro de moldes
de madeira, que passado pouco tempo retirado, ficando o adobe a secar ao ar livre. A terra
utilizada para a construo deste tipo de adobes, encontra-se em estado plstico, bastante
vulgar em terrenos arenosos/argilosos, muitas vezes em terrenos de aluvio, em vales, junto
as linhas de gua.
Figura 10 Prensa manual para a produo de blocos de adobe mecnico.
Fonte: Rojas (2007)
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
10
Uma tcnica que no aparece representada no diagrama anteriormente referido a
terra ensacada, a qual, segundo Gonalves & Gomes (2012), parece enquadrar-se bastante
neste sistema de alvenarias. Esta tcnica construtiva consiste em encher com terra
(semelhante utilizada na produo dos restantes adobes) sacos longos (com aspecto de
tubo). Esta tcnica (Figura 11) evoluiu das tcnicas de construo de bunkers militares e de
diques temporrios, tendo sido apelidado de superadobe pelo seu criador, o arquitecto
iraniano Nader Khalili.
O grupo C composto por cinco tcnicas construtivas pertencentes ao sistema de
enchimento de uma estrutura de suporte. As tcnicas construtivas pertencentes a este
sistema utilizam a terra como um sistema secundrio. Neste sistema a terra utilizada, no
como material autoportante, mas sim como um material de preenchimento ou revestimento
de vazios presentes na estrutura realizada previamente.
Descrio dos sistemas construtivos apresentados na tabela 1:
14. Terra de recobrimento Esta tcnica tambm conhecida como taipa de fasquio ou
tabique. Esta consiste em revestir com terra estruturas em grade, normalmente em madeira.
A presente tcnica construtiva tem forte presena em Portugal, nomeadamente nas regies
da Beira Alta, Beira Baixa, Trs-os-Montes e Minho, onde, usualmente, o rs-do-cho em
alvenaria de pedra, sendo o tabique aplicado nos pisos superiores, tanto em paredes
interiores como exteriores.
Figura 11 Edifcio em construo com o mtodo da terra ensacada.
Fonte: Capello (2010)
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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15. Terra sobre engrado Esta tcnica (Figura 12) bastante semelhante anterior,
partilhando, at, o mesmo princpio construtivo. A nica diferena encontra-se na
possibilidade de incorporar na terra utilizada para o enchimento da estrutura, agregados
como torres de terra, palha ou outros, sendo por fim rebocados com uma argamassa de terra
mais fina. Devido pouca diferena entre estas duas tcnicas frequente ambas serem
apelidadas de tabique.
16. Terra palha Esta tcnica consiste numa juno de terra argilosa com palha, a
qual, aps a sua mistura forma uma pasta, que , ento, utilizada para construir pavimentos,
isolamentos de paredes e at as prprias paredes, usando, para estas, uma cofragem sobre
uma estrutura de madeira.
17. Terra de enchimento semelhana do seu nome, aqui a terra utilizada no
enchimento de outras estruturas. Esta utilizada como reforo de estruturas, como
isolamento, ou apenas como enchimento do vazio existente estre duas estruturas.
18. Cobertura em terra Neste caso a terra utilizada para revestimento de coberturas
(Figura 13), de modo a proteger as estruturas que a suportam. Actualmente existe uma
variante deste tipo de cobertura, a qual se designa por cobertura verde ou cobertura
ajardinada. Esta comea a ganhar importncia acrescida sobretudo nas cidades, devido, no
s s melhorias trmicas que esta comporta, mas tambm pelas necessidades de espaos
verdes e consequente melhoria da qualidade do ar.
Figura 12 Edifcio com paredes do primeiro piso em terra sobre engrado.
Fonte: Santos (2011)
Figura 13 Edifcio com cobertura em terra.
Fonte: Landlab ([s.d.])
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Figura 14 Abrigo com paredes em terra sobre engrado e telhado em colmo.
Fonte: Moreira ([s.d.])
7. A construo em terra ao longo dos tempos
7.1. Origem da construo em terra
Desde os primrdios do Homem no planeta Terra, houve sempre a procura por locais
que lhe garantissem segurana e algum conforto para se abrigar. O Homem necessitava que
estes abrigos o protegessem, no s das intempries naturais, das grandes oscilaes de
temperatura, mas sobretudo, pretendia um lugar onde se pudesse defender dos ataques de
predadores selvagens. Inicialmente eram usados como habitao temporria, espaos naturais
criados pela prpria natureza - grutas, cavernas, lapas, clareiras entre outros. Foi ento que
o Homem, ao adquirir alguma experincia, conjugada com habilidades que foi desenvolvendo,
comeou a criar os seus prprios abrigos, manipulando os vrios materiais que se encontravam
sua disposio. Com recurso imitao dos abrigos naturais que tinha usufrudo at ento
e, em conjunto com a sua imaginao, surgem as primeiras construes primitivas. Com as
novas habilidades desenvolvidas comea a criar novos abrigos, como a cabana, que s foi
possvel edificar depois de adquirir a habilidade de construir com troncos, canios e colmo.
Com a habilidade de trabalhar a pedra ergueram-se paredes, construes que j na altura
eram bastante resistentes. Estes materiais no estavam disponveis em todo o territrio, mas
era necessrio construir com outros materiais que a estivessem disponveis. Foi ento que o
Homem recorreu s argilas, gravilhas e areias, materiais que quando misturados em doses
apropriadas, podem ser moldados (Figura14). Com uma sabedoria que foi sendo cada vez mais
aprofundada foi possvel criar abrigos resistentes e duradouros construdos em terra.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
13
Como refere Perdigo (1993), a terra, como material de construo, comeou a ser
utilizada h cerca de dez mil anos. Desde ento, foram realizadas vrias experincias e
muitos conhecimentos tm sido trocados, o que explica a existncia de vrias tcnicas de
construo em terra crua. Este tem sido um dos principais materiais de construo utilizados
ao longo dos tempos, chegando as estimativas a apontar que um tero da populao do
planeta vive, actualmente, em habitaes construdas em terra.
Este material abundantemente usado, desde a Antiguidade, tanto na Mesopotmia
como no Egipto dos Faras. Na Europa, na frica e no Mdio-Oriente as civilizaes romanas,
depois muulmanas e, na sia, as hindus, bem como as dos monges budistas ou dos
imperadores da China constroem em terra. Igualmente na Europa, na Idade Mdia, e
simultaneamente os ndios na Amrica, os Aztecas no Mxico ou os Mochica nos Andes. A
conquista espanhola das Amricas vem enxertar nestas tradies as tcnicas europeias e do
norte de frica das arquitecturas de terra. Em frica, a continuidade assegurada em
culturas to diversas como as dos Berberes ou dos Dogons, dos Achantis, dos bamilks ou dos
Haoussas, nos remos de Ife e de Daom ou nos imprios do Ghana e do Mali. (Perdigo, 1993)
Ainda assim ser difcil apontar com exactido o local e a data especfica em que
surgiram as primeiras construes com terra, pois semelhana da escrita e da fala, a
construo com terra surgiu de uma necessidade bsica do ser humano. Contudo, segundo
Correia & Merten [s.d.] pode-se afirmar que a construo em terra tem sido utilizada desde o
perodo pr-histrico. No Mdio Oriente foram encontradas construes com terra apiloada ou
moldada, datadas do perodo compreendido entre 9000 e 5000 a.C.
Como j foi referido, apesar de este ser um material comum na maioria dos locais do
planeta, para a regio da Mesopotmia e do antigo Egipto que nos remetem os registos mais
antigos. Tal facto deve-se sobretudo a duas caractersticas bastante peculiares destas
regies, as quais so indispensveis para se beneficiar ao mximo da construo com esta
matria-prima. A primeira caracterstica indispensvel a presena de gua, quer atravs de
rios, fontes, entre outros, os quais so propcios a um processo geolgico de sedimentao
deste material para a formao de argila. Outra caracterstica a presena natural de um
clima seco, no qual o conforto trmico do ambiente interior dos edifcios mais valorizado.
Foi em terra crua que as mais diversas civilizaes da antiguidade edificaram cidades
inteiras de que restam, em todo o mundo, vestgios arqueolgicos eloquentes: de Jerico,
construda h uma centena de sculos e sem duvida a primeira cidade da histria, a atal
Hoyuk, na Turquia. De Harappa e Mohendjo-Daro, no Paquisto, at AkhetAton, no Egipto, De
Chan Chies no Peru clebre Babilnia, no Iraque. De Madinat-Al-Zahra s portas de
Crdoba, em Espanha, at Khirokifia, em Creta. Sobre as bases antigas, floresceram por vezes
cidades modernas, onde a construo em terra ficar presente, tal como Lugdunum, capital da
Glia romana (Perdigo, 1993)
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
14
Foram inmeras as antigas civilizaes que inicialmente utilizaram a terra como
elemento construtivo gerador de espaos e abrigo. Inicialmente os sumrios, assrios e
babilnios construram os zigurates2 (Figura 15), assim como os egpcios edificaram mastabas3
(Figura 16) com esta matria-prima, utilizando maioritariamente blocos de adobe.
Desde ento, a terra, enquanto material de construo, revelou-se um material com
capacidade para ser aplicado de diversas formas, o que potenciou o desenvolvimento de
diferentes tcnicas construtivas, as quais foram adaptadas s exigncias e caractersticas de
cada lugar. Esta capacidade de adaptao, aliada ao baixo custo do material, foram dois
factores fundamentais para a disseminao deste tipo de construo, sendo o adobe e a taipa
os sistemas construtivos que assumem uma maior presena em todo o mundo.
2 Templo de grandes dimenses em forma de pirmide, constitudo por diversos andares de formato piramidal sobrepostos, sendo o andar superior sempre de rea menor que a base. A sua composio varia normalmente entre os dois e sete patamares. 3 Tmulo egpcio, de forma trapezoidal.
Figura 15 Zigurate.
Fonte: Rocha (2004)
Figura 16 Mastaba. Fonte: Bodsworth (2007)
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
15
7.2. A utilizao do sistema construtivo em taipa pelo mundo
Atravs da observao da figura 17 verifica-se uma inexistncia de construes em terra
na zona norte e no extremo sul do globo. A sua presena acentua-se ao longo do eixo do
equador expandindo-se na vertical. O continente Africano o que se destaca, apresentando
uma rea mais consolidada no que respeita a este tipo de construo, seguindo-se a sia na
qual se reala a zona sul. Por ltimo, ainda de salientar a zona centro da Amrica que
apresenta igualmente uma grande quantidade de edificaes em terra.
7.2.1. sia
Como se pode observar na figura anterior, o continente Asitico apresenta uma grande
concentrao de construo em terra junto ao litoral Sul e Este e ainda na zona centro.
A China o pas da sia onde a arquitectura de terra, em especial a taipa, foi mais
utilizada. A construo em taipa proliferou por todo o territrio chins especialmente aps os
anos 221-581 d.C., perodo dos Trs Reinos (Fernandes, [s.d.]), sendo as muralhas da Monglia
e China uma das mais emblemticas construes. Estas foram, primeiramente, construdas em
taipa e s posteriormente revestidas com pedra, o que actualmente lhes confere uma
aparncia de muralha em pedra. Outras construes, como as torres na regio de Dunhuarg,
as quintas fortificadas de planta circular na regio de Hakka e o mosteiro Lhakhang, no Buto,
com mais de 300 anos, so exemplos de como esta tcnica, desde que conservada, pode ser
actual e perfeitamente habitvel.
Segundo Fernandes [s.d.]b a ndia, aps o sculo XVI, foi alvo de uma forte influncia
portuguesa no que diz respeito a construes realizadas em taipa. So vrios os exemplos de
Mosteiros Budistas edificados na ndia, Boto e Nepal, nos quais foi utilizado este sistema
construtivo. Na Arbia, por exemplo, a taipa apenas era utilizada em algumas fortificaes,
sendo a terra moldada ou a terra empilhada, a tcnica mais recorrente.
Figura 17 Arquitectura de terra no mundo.
Fonte: CRAterre [s.d.]
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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7.2.2. Oceania
Na Nova Zelndia, segundo Carvalho et al. [s.d.], as construes em terra foram uma
influncia trazida pelos colonizadores ingleses, os quais difundiram especialmente as tcnicas
de construo em adobe e tabique. semelhana do que aconteceu noutros pases, aqui,
este tipo de construo tambm foi sendo abandonada, comeando agora a dar os primeiros
passos na recuperao destes sistemas construtivos.
Na Austrlia a taipa no era um mtodo construtivo muito divulgado, uma vez que no
existia grande tradio deste tipo de construo, o que justifica a pouca presena do mesmo
no local. Contudo, segundo Fernandes, [s.d] no sculo XIX esta tcnica tornou-se bastante
popular devido a algumas publicaes e construes realizadas. Embora sejam praticados
outros mtodos construtivos, como o adobe, blocos cortados, entre outros, foi sem dvida a
taipa a que mais se imps na arquitectura contempornea. A Austrlia foi um dos pases que
mais investiu na regulamentao e investigao deste sistema construtivo.
7.2.3. Amrica
Na Amrica a construo em terra concentra-se principalmente na zona centro,
expandindo-se na vertical (eixo Norte-Sul), tornando-se evidente a sua existncia em toda a
zona litoral da amrica do sul.
Na Amrica do Norte so conhecidas construes piramidais de terra que remetem ao
perodo pr-histrico, das quais se destaca a Monks Mound no estado de Illinois. Ainda assim a
construo em taipa apenas comea a ser usada por volta do sculo XVIII com a chegada dos
colonizadores. Segundo Fernandes, [s.d] este sistema construtivo muito usado em Espanha
foi, em conjunto com o adobe, j utilizado na Califrnia, o sistema construtivo utilizado para
edificar novas habitaes e igrejas. No sculo XIX, a chegada de imigrantes chineses revelou-
se um forte contributo para a presena de edificaes em taipa.
Na Amrica do Sul este sistema construtivo foi, e ainda , segundo Silveira [s.d.]
bastante utilizado, sobretudo nas regies montanhosas, como a cordilheira dos Andes.
Contudo, no Brasil onde se encontra o maior patrimnio construdo em taipa de toda a
Amrica. Este facto deve-se influncia das colnias portuguesas no sc. XVIII e ao seu
contacto com os ndios residentes, em construes de tabique com telhado de palha,
construdas com materiais naturais que se encontravam ao seu dispor. Os colonizadores
introduziram a telha cermica, a taipa, a sofisticao das carpintarias e revestimentos,
construindo edifcios mais resistentes e adaptados ao clima tropical, o que influenciou a
construo no Brasil e no Uruguai. A taipa, como material de construo, passou ento a ser
aplicada tanto em edifcios de habitao como em igrejas, fortificaes e at edifcios
pblicos. Entretanto, esta tcnica, que foi caindo no esquecimento ao longo dos anos, tem
vindo a ser recuperada e a sua utilizao encontra-se agora em crescimento gradual, o que se
deve ao facto da consciencializao da necessidade de construes menos poluentes e da
dissipao do estigma deste tipo de construo.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
17
7.2.4. frica
Em alguns pases de frica, a construo em terra, nomeadamente com adobe um
sistema construtivo bastante utilizado, como por exemplo no Egipto, Marrocos, Qunia, Mali e
Gana onde, ainda hoje, so edificados novos edifcios atravs desta tcnica. Por outro lado,
noutros pases esta j uma tcnica completamente abandonada.
Segundo Fernandes [s.d.]b, em pases como a Arglia e o Egipto a presena e utilizao
de taipa bastante ocasional, sendo considerada uma tcnica secundria e de construo
precria. J em Marrocos, este um sistema construtivo ainda bastante utilizado, o qual est
mais presente no interior do pas, tanto em edifcios de arquitectura vernacular como de
arquitectura contempornea. Este sistema construtivo muitas vezes aplicado
simultaneamente com o adobe.
7.2.5. Europa
Segundo Carvalho et al. [s.d.], existem por todo o continente europeu vrios vestgios
arqueolgicos que comprovam a existncia da construo em terra desde o perodo do
Neoltico, vestgios estes que se encontram principalmente na Pennsula Ibrica.
Segundo Fernandes [s.d.]b, os pases europeus que tm tradio em construes em
terra, nomeadamente no sistema construtivo de terra prensada, so:
A Espanha um dos pases europeus com mais tradio de construo em taipa.
Edifcios construdos com esta tcnica encontram-se ao longo da costa mediterrnica e em
algumas regies do interior, como Estremadura, Castela, Arago, Mrcia entre outras. Este
sistema construtivo foi utilizado para erguer fortificaes, edifcios pblicos, religiosos,
habitaes e construes rurais. Era usual adicionar ligantes como gesso e cal para estabilizar
a taipa e conferir uma melhor resistncia mecnica da alvenaria. Estes ligantes permitiam
assim uma melhor aderncia a rebocos e s alvenarias de tijolo com os quais as paredes eram
revestidas.
Frana, semelhana de Espanha, outro dos pases com tradio em construo, no
s em taipa, mas tambm com outros sistemas construtivos em terra. Tradio que foi
recuperada e ganhou novo flego a partir do sculo XVIII, com a publicao do livro de
Franois Cointeraus Cahaiers dcole dArchitecture Rurale. Esta publicao foi fulcral para
o desenvolvimento deste mtodo construtivo, no s em Frana mas tambm noutros pases.
Com a edio deste manual deu-se uma revoluo construtiva, a qual proporcionou a
este mtodo de construir uma aplicao sistematizada e organizada em edifcios com diversas
funes, separando este sistema construtivo do estigma associado de construes efmeras e
de baixo extracto social. Este factor, em conjunto com outras aces desenvolvidas em
Frana em prol da arquitectura em terra, como por exemplo a fundao do CRATerre, em
1979, foram aspectos fundamentais para recuperar e redescobrir esta tcnica construtiva.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
18
Na Alemanha a construo em taipa surge durante o sculo XVIII. Esta tcnica foi
bastante utilizada em 1945 (impulsionada pelos manuais franceses) para dar resposta
necessidade de resolver o problema habitacional de inmeros refugiados da segunda guerra
mundial, sendo um material de eleio, visto apresentar baixo custo da matria-prima e
devido s vantagens que demonstrava em relao ao risco de incndio. Este pas destaca-se
pela organizao de legislao, regulamentos e normas referentes a este tipo de construo e
outros materiais alternativos, os quais foram desenvolvidos a partir da dcada de oitenta do
sculo XX, tornando-se, talvez, um dos pases europeus mais desenvolvidos em relao
industrializao dos materiais e regulamentao da arquitectura de terra.
Em Itlia a construo em terra dominada pelo adobe, embora existam em algumas
regies, construes rurais em taipa. Contudo, so sempre edifcios associados aos extractos
mais baixos da sociedade, no sendo conhecidos casos de habitaes burguesas e urbanas
construdas em taipa.
Muitos dos pases Europeus s conheceram a construo em taipa aps a traduo e
importao dos manuais oitocentistas de Franois Cointeraux. Esses parecem ter sido os casos
do Reino Unido, da Alemanha, da Polnia, Dinamarca, Sucia, e Hungria. (Fernandes, [s.d.])
7.3. A Histria da construo em terra em Portugal
Actualmente, em Portugal, possvel encontrar vestgios de inmeras construes em
taipa, compreendidas desde o perodo do Neoltico at a actualidade.
Do perodo do Neoltico foi identificado um conjunto habitacional no distrito de Faro,
perto de Alte, mais concretamente na Quinta do Freixo, sita em Paniachos, a qual apresenta
vestgios de estruturas arredondadas compostas por pedras sobrepostas, fundaes e
argamassa de terra. (Veiga, 1887 citado em Correia, 2007)
Segundo Correia (2007) os Muulmanos, aps a invaso da Pennsula Ibrica, em 711,
foram os principais propagadores deste tipo de construo. Este povo implantou em Portugal
uma tipologia de habitao especfica, que consistia na construo de um soco em alvenaria
de pedra, o qual serviria de base s paredes de taipa, estas com uma espessura de 50 cm,
aproximadamente. Outro elemento marcante herdado desse povo foram as torres albarrs, as
quais so muito comuns nas fortalezas algarvias, como por exemplo o Castelo de Silves,
Castelo de Paderne, Castelo de Faro, Castelo Velho de Alcoutim, entre outros.
Existem tambm, ainda hoje, edifcios rurais que so o testemunho da utilizao dessa
tcnica, no perodo aps a reconquista de 1249. de salientar a sua utilizao em meios
urbanos como Lisboa, em que os seus edifcios eram construdos com um sistema muito
semelhante taipa de fasquio ou taipa de rodzio, tendo aps o terramoto de 1755, dado
origem ao muro anti-ssmico Pombalino.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Portugal, no perodo dos descobrimentos foi um difusor marcante desta tcnica, uma
vez que na troca de conhecimentos com outras civilizaes, muitas vezes ensinou e construiu
edifcios, utilizando o sistema construtivo em taipa, transportando este conhecimento da
Europa para outros continentes como, frica, sia e Amrica.
7.4. A utilizao do sistema construtivo em taipa em Portugal
Em todo o Pas, observa-se uma grande variedade de tcnicas tradicionais de
construo, nomeadamente devido aos materiais disponveis em cada regio. Em geral,
identificam-se trs tcnicas de construo em terra em Portugal: a taipa, o adobe e o
tabique. Mais recentemente foi introduzida uma quarta tcnica construtiva no tradicional: o
B.T.C., bloco de terra comprimida. (Correia, 2007)
A construo em taipa em Portugal (Figura 18) foi at, aproximadamente, aos anos 50,
a tcnica construtiva mais utilizada, especialmente no sul do pas, em regies como o
Alentejo, Ribatejo e Algarve. Era tambm bastante comum a edificao em adobe, tcnica
utilizada at s dcadas de 60 e 70, a qual era mais frequente em zonas de aluvio que
possuam terra mais argilosa. (Correia & Merten, [s.d.]) Esta ltima era muitas vezes um
complemento construo em taipa, sendo utilizada para erguer as paredes interiores das
habitaes. O adobe dominava, at ento, a construo no centro litoral, onde ainda
possvel observar uma grande variedade de tipologias de adobe.
Assim como o norte do pas, tambm o centro interior era dominado pela construo
em alvenaria de pedra. Contudo, era ainda possvel encontrar edifcios construdos em taipa.
O uso da taipa nestes locais do pas era usado mais frequentemente como complemento da
construo em alvenaria de pedra, nas quais era utilizada a terra de recobrimento ou terra
sobre engrado.
Figura 18 Distribuio geogrfica das principais tcnicas de construo em terra em Portugal.
Fonte: Adaptado de Fernandes et al. (2005)
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Figura 21 Central de monitorizao da estao de tratamento de guas residuais de vora. Fonte: guas do centro Alentejo (2011)
No final dos anos 80 a construo em terra em Portugal comeou a reaparecer
lentamente, em especial no meio rural. Surgiu, ento, uma consciencializao do valor do
patrimnio construdo em terra, para o qual foram decisivas algumas iniciativas que tiveram
lugar nessa altura, como a VII Conferncia Internacional sobre o Estudo e Conservao da
Arquitectura de Terra que decorreu em Silves, a qual sensibilizou o municpio para esta
temtica, chegando mesmo, mais tarde, a realizar um inventrio do patrimnio edificado em
terra, intitulado Itinerrios da Terra Inventariar o Patrimnio de Arquitectura em Terra.
Contributo para um Inventrio no Concelho de Silves. (Alegria & Fragueiro, 2002)
Esta consciencializao, ainda assim, s foi alvo de destaque devido a um restrito
nmero de profissionais e investigadores que procuraram preservar as tcnicas tradicionais de
construo em terra atravs do restauro/preservao, estudo e catalogao do patrimnio
existente, investigao cientfica e difuso do conhecimento cientfico da arquitectura em
terra.
Portugal, embora possua dos mais antigos testemunhos de construo em terra (Figuras
19 e 20), apresentando no s edifcios de habitao mas tambm edifcios destinados a
servios, como fortificaes militares, entre outros, enfrenta ainda um longo caminho no que
respeita salvaguarda e proteco da arquitectura de terra, tanto em relao ao patrimnio
construdo, como na ressalva do prprio saber de construir (Figura 21).
Figura 19 Palheiro em taipa, na aldeia da Sapeira.
Figura 20 Castelo de Paderne.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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8. Taipa enquanto sistema construtivo
8.1. Vantagens e desvantagens do mtodo construtivo
A matria-prima utilizada neste sistema construtivo no considerada normalizada,
pois as prprias caractersticas do material dependem do local e da profundidade de
extraco. Ainda assim, possvel verificar diversas vantagens e desvantagens de construir
em terra, em detrimento de outros materiais, os quais so, actualmente, mais utilizados
(beto, alvenaria de tijolo, entre outros).
Esta tcnica apresenta como principais vantagens, as seguintes:
- Confere uma boa qualidade do ar interior, devido capacidade de regular e equilibrar
o mesmo atravs da absoro e libertao rpida da humidade;
- Paredes salubres nas quais, dificilmente, se desenvolvem parasitas;
- As paredes garantem uma boa inrcia trmica, pois armazenam o calor perante a
exposio solar e perdem-no lentamente quando a temperatura externa se encontra mais
baixa. Este facto permite um melhor aproveitamento da radiao solar, reduzindo as
necessidades energticas, de aquecimento e arrefecimento, do edifcio;
- Este tipo de construo praticamente no contamina o planeta, pois permite
economizar muita energia. Apenas utilizado 1 a 2% da energia utilizada numa construo
idntica construda em beto armado ou tijolos cozidos;
- um processo totalmente reciclvel, pois este tipo de construo pode ser demolido
e reaproveitado mltiplas vezes, procedendo demolio e fragmentao das paredes e
repetindo o processo de preparao da argamassa de construo. Caso a matria-prima usada
na construo no tenha sido estabilizada com aditivos, esta pode ser devolvida natureza
sem necessidade de tratamento prvio;
- Material incombustvel, conferindo ao edifcio uma boa resistncia ao fogo;
- econmico, visto a matria-prima no ter qualquer custo, pois pode ser encontrada
na maioria dos casos, prximo ou mesmo no local da obra;
- Processo construtivo simples;
- Autoportante, pelo que dispensa o uso de estrutura em edifcios com apenas um piso;
- Boa aparncia, mesmo quando deixada vista.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
22
As principais desvantagens apresentadas so as seguintes:
- Matria-prima pouco homognea, pelo que a sua composio depende das
caractersticas geolgicas e climticas da regio. Este facto torna imprescindvel a realizao
de vrios ensaios ao solo de modo a avaliar as suas caractersticas, para, se necessrio, se
proceder sua correco com aditivos;
- Este material muito permevel, sendo aconselhvel uma boa proteco das paredes
face aos elementos atmosfricos (gua, humidade, neve, geada). A sua resistncia gua
bastante reduzida sendo, por isso, muitas vezes, adicionados estabilizantes como cal,
cimento, betumes. A proteco dos elementos construtivos fundamental, seja com recurso
a pormenores construtivos ou camadas impermeabilizantes;
- A grande retraco a que este sistema construtivo est sujeito pode provocar
deformaes significativas durante a secagem, gerando fissuras, as quais diminuem a
resistncia do material;
- Exige bastante mo-de-obra, o qual se pode tornar um inconveniente econmico,
principalmente em pases economicamente mais desenvolvidos;
- Necessidade de manuteno mais frequente em relao s construes realizadas com
materiais mais recentes.
8.2. Escolha da matria-prima adequada
A terra arenosa a mais adequada para a edificao com este sistema construtivo, a
qual deve conter um certo grau de gordura proveniente da argila, devendo apresentar uma
proporo aproximada de 30% de argila e 70% de areia (Prompt, [s.d.]). Esta relao
extremamente importante, pois caso se trate de uma matria muito argilosa, durante o
processo de secagem, ter tendncia para originar fendas por retraco. Por outro lado, se
esta for pouco argilosa no apresenta caractersticas aglutinantes necessrias para manter a
forma desejada.
As argilas so as partculas de menor dimenso dos solos que funcionam como manes
microscpicos, os quais garantem a coeso e impermeabilidade da parede, atravs das quais o
material atinge fora estrutural. Assim, o nvel de humidade deve ser o ideal, de modo a
existir gua suficiente para possibilitar a agregao das partculas (areias e outros elementos
envoltos por argila), mas no em excesso.
A constituio granulomtrica da terra outro factor importante, devendo esta
apresentar uma boa distribuio granulomtrica dos elementos, sendo admissvel a existncia
de cascalho, areia e siltes desde que a sua dimenso no ultrapasse os 20 /25 mm.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
23
Devido grande variedade de solos existentes (Figura 22), os quais apresentam
composies bastante distintas, torna-se, por vezes, necessrio misturar estabilizantes ou
terras de vrios locais e/ou profundidades, de modo a obter um material mais equilibrado
para construo. Como foi referido anteriormente, as argilas tm um papel fundamental na
construo em terra, pelo que a sua relao e dosagem com os restantes constituintes e
agregados a chave para obter um solo adequado para a construo.
Figura 22 Diagrama triaxial de classificao do solo.
Fonte: Ravick (2010)
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
24
8.3. Ensaios ao solo
Como foi referido anteriormente, a escolha da matria-prima adequada fundamental,
uma vez que tratando-se de um material extrado de subsolos que, muitas vezes, se
encontram na proximidade do local de construo, existe uma ampla variedade no tipo de
solos existentes que podem ser utilizados.
Torna-se, assim, conveniente averiguar qual o tipo e a qualidade apresentados pelo
solo nossa disposio, de modo a determinar qual a sua percentagem de argila e o tipo de
granulometria. Para tal, fundamental realizar testes e ensaios de controlo de qualidade e
adequao do solo, os quais podem ser feitos tanto em laboratrio, como em obra e sem
recurso a instrumentos complexos. Segue-se uma apresentao e descrio de alguns dos
testes possveis de realizar. (Eusbio, 2000 & CRATerre citado em Marques, 2002)
Testes possveis de realizar em obra:
- Observao da cor: este procedimento o primeiro indicador das caractersticas do
solo, uma vez que a cor deste influenciada pela sua constituio qumica. Deste modo, a cor
escura denuncia a presena de materiais orgnicos. Por sua vez, uma cor avermelhada indica
a colorao causada por xidos de ferro hidratado, enquanto o amarelo denuncia a presena
de xidos de ferro mais ou menos hidratados. Uma cor parda associada presena de xidos
de ferro hidratados ou xidos de ferro associados a matria orgnica. Por ltimo, solos plidos
indicam a presena de areias quartozas ou feldspticas.
- Teste do cheiro: como j foi referido, na construo com este sistema construtivo,
no devem ser usados solos que contenham matria orgnica. Assim, este teste assume-se
como o segundo indicador imediato, o qual atravs do odor libertado pelo solo, aps a sua
extraco, permite verificar a existncia de matria orgnica com base no seu cheiro
caracterstico. Este tipo de solo, quando aquecido ou humedecido, intensifica o seu odor.
- Teste ao tacto: este procedimento consiste em esfregar uma amostra de solo (aps a
remoo as partculas de maiores dimenses) entre os dedos, o que permite identificar trs
tipos de solo: Solo arenoso, o qual se apresenta spero e sem coeso quando humedecido;
Solo Siltoso, semelhana do anterior, spero ainda que apresente uma certa coeso quando
humedecido; Solo argiloso demonstra-se plstico e pegajoso quando hmido, tornando-se
resistente ao esmagamento quando seco.
- Teste do brilho: aps realizar uma bola com solo ligeiramente humedecido, esta
cortada ao meio usando uma faca. Se o interior apresentar uma superfcie opaca indica a
presena de silte, se, pelo contrrio, apresentar uma superfcie brilhante, esta apresenta
uma predominncia de argila.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
25
- Teste da aderncia: este procedimento poder ser considerado um complemento do
teste anterior, uma vez que os dois primeiros passos so iguais. Neste, apenas necessrio
verificar qual a resistncia que a bola de terra oferece penetrao da faca, pois os solos
argilosos tendem a resistir penetrao e aderem faca, ao contrrio dos solos pouco
argilosos, em que a faca penetra facilmente na mesma.
- Teste lavagem: aps o contacto com o solo, a lavagem das mos e utenslios do-nos
informao sobre a composio do mesmo, atravs da facilidade com que este se liberta.
Enquanto os solos compostos por areia e silte so fceis de retirar apenas com gua, solos
com grande teor de argila obrigam a ser esfregados.
- Teste de sedimentao: Para este teste devemos colocar a terra a utilizar num frasco
de vidro redondo com fundo plano e encher at da sua altura com terra e os restantes
com gua (Figura 23). Tapa-se o frasco e deixa-se repousar durante uma hora para permitir
uma impregnao de todas as partculas. Em seguida agita-se fortemente e deixa-se repousar
durante mais uma hora, voltando a repetir este processo mais uma vez. A partir desta altura,
possvel comear a observar os resultados. As partculas slidas comeam a assentar,
podendo medir-se com alguma preciso as diferentes texturas na amostra. Os saibros
depositar-se-o no fundo, seguidos da camada de silte e da de argila e, superfcie da gua,
surgem as partculas orgnicas. Ao fim de oito horas, pode ento medir-se a altura das
diferentes camadas e avaliar, em termos percentuais, a constituio da terra. Deve ter-se em
considerao, no entanto, que as partculas argilosas aumentam de volume com a presena da
gua.
Figura 23 Frascos de vidro utilizados para o teste por sedimentao.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
26
- Teste visual pela peneirao: Este mtodo consiste em passar por dois peneiros o solo
que se deseja analisar, fazendo uma separao das partculas, atravs da passagem,
primeiramente, pelo peneiro n. 200 (0,074 mm) e, em seguida, pelo n. 10 (2 mm).
Passagem atravs do peneiro n. 200: Se o material retido (areia e seixo) for menor que
o passado (silte mais argila), o solo ser argiloso. Caso contrrio, o solo ser arenoso ou
pedregoso.
Passagem do material, anteriormente retido, no peneiro n.10: O solo ser pedregoso,
quando o montculo de seixos for maior que o de areia. Caso contrrio, o solo ser arenoso.
Ainda que se trate de solo arenoso ou pedregoso, este pode ser utilizado, desde que,
aps a realizao e secagem ao sol de uma bola de terra utilizando o material original, este
mantenha a sua forma sem partir, utilizando, posteriormente, o montculo de silte e areia
para os testes seguintes.
- Teste de reteno de gua: Aps a passagem do material pelo peneiro de 1mm faz-se
uma bola com um tamanho aproximado de um ovo, qual se adiciona a gua necessria para
manter a bola unida sem se colar s mos. Posteriormente pressiona-se suavemente a bola na
palma da mo encurvada e golpeia-se fortemente com a outra mo.
Se, aps 5 a 10 golpes a gua aparecer superfcie, trata-se de uma reaco rpida.
Sempre que pressionada, a gua desaparece e a bola fica esmigalhada, o que indica a
presena de areia fina ou de silte grosso. Se o mesmo s acontecer aps 20 ou 30 golpes,
trata-se de uma reaco lenta. Sempre que, sob presso, a bola se moldar s mos, trata-se
de um solo composto por silte ligeiramente plstico ou por argila. Caso no exista qualquer
reaco, ou esta seja muito lenta, pressupe a existncia de um alto teor de argila.
Figura 24 - Bola em terra utilizada para a realizao do teste de reteno de gua.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
27
- Teste de resistncia secagem: Utilizando o mesmo material usado para o teste
anterior, faz-se um cilindro, com cerca de 0,1 cm de altura e 5 cm de dimetro (Figura 25).
Aps a sua secagem ao sol aperta-se o cilindro entre o polegar e o indicador, de modo a
observar a sua dureza.
Se este no se reduzir a fragmentos trata-se de uma argila praticamente pura. Caso
seja necessrio bastante esforo para que este se fragmente trata-se de uma argila arenosa
ou siltosa. Se esta for facilmente destruda trata-se de areia ou silte com pouco contedo de
argila.
- Teste do rolinho: A partir de uma bola, com o tamanho aproximado de uma azeitona,
realizada com o mesmo material utilizado no teste de reteno de gua, tenta-se formar um
rolinho. Caso este parta antes de atingir cerca de 0,3 cm de espessura necessrio
acrescentar gua, pois encontra-se muito seco. Este processo repetido at encontrar o nvel
ideal de gua acrescentado. Posteriormente faz-se uma bola, a qual ser apertada entre o
dedo polegar e o indicador.
Caso apenas se consiga esmagar a bola com dificuldade, no fissurando, esta ter um
alto contedo de argila. Se a bola fissurar ou se desfizer, esta ter um baixo contedo de
argila. Caso esta se parta, mesmo antes de formar uma bola, dever conter um elevado
contedo de silte ou areia. Caso a bola seja esponjosa e suave, dever tratar-se de um solo
orgnico.
Testes realizados em laboratrio:
Actualmente, atravs do conhecimento desenvolvido sobre a mecnica dos solos,
possvel realizar ensaios mais precisos em laboratrio com o objectivo de perceber,
concretamente, as caractersticas e qual o solo mais adequado para este tipo de construo.
Deste modo, tambm possvel perceber qual a debilidade do solo para, se possvel,
proceder a uma correco do mesmo, atravs da adio ou subtraco de elementos.
Figura 25 Cilindro em terra utilizado para a realizao do teste de resistncia secagem.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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- Anlise granulomtrica: Atravs de um processo de peneirao e sedimentao (Figura
26) possvel obter a curva granulomtrica do solo, a qual se deve apresentar homognea,
com inertes de tamanho no superior a 2,5 cm e uma percentagem de argila entre 15 e 30 %.
Esta anlise permite, tambm, classificar a percentagem de areia e silte que compe o solo.
- Limite de consistncia: A argila sofre processos de expanso e contraco perante
diferentes nveis de humidade, o que influncia a sua consistncia e comportamento. Atravs
deste ensaio possvel descobrir o ndice de plasticidade, o qual resulta da diferena entre o
limite de liquidez e o limite de plasticidade. Este ndice representa a capacidade de absoro
de gua de um solo, atravs do qual, possvel avaliar a sua consistncia.
Em laboratrio possvel analisar a actividade da argila atravs da sua expansibilidade
e deformabilidade, assim como a sua retraco relativa (indicador da amplitude de variao
do seu volume). Atravs do teste de compactao possvel determinar qual quantidade de
gua ideal a acrescentar ao solo, de modo a proporcionar uma compactao exemplar.
Figura 26 Peneiras utilizadas para a realizao do teste de anlise granulomtrica. Fonte: Suguino (2012)
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Figura 27 Elementos constituintes de uma cofragem. Fonte: Doat et al. (1979)
8.4. Processo construtivo
8.4.1. Utenslios usados na construo
Cofragem:
A compactao do solo durante a construo das paredes realizada entre taipais.
Cada taipal era, tradicionalmente, construdo em madeira com trs a quatro tabuas
sobrepostas no sentido horizontal e unidas por duas a trs tbuas pregadas verticalmente.
Actualmente mais frequente a utilizao de madeira prpria para cofragem, sendo tambm
usual a utilizao de taipais de ferro. As dimenses destes variam, ainda que as mais
utilizadas estejam compreendias entre os 80 e os 92 cm de altura e 170 a 325 cm de
comprimento, sendo o seu afastamento a espessura das paredes, a qual varia, por norma,
entre os 45 e os 70 cm.
A cofragem composta por dois taipais laterais e pelas comportas (opcionais, pois o
seu uso depende do tipo de unio entre blocos), formando uma espcie de caixa sem topo
nem fundo. Na montagem da cofragem os painis assentam sobre as agulhas que, em
conjunto com os costeiros e as cangas (muitas vezes substituda por uma corda entrelaada, a
qual adquire a mesma funcionalidade), criam uma moldura que faz o travamento dos painis,
ver (Figura 27). A cofragem desmontada aps o seu enchimento, ficando o bloco construdo
a secar ao sol, enquanto ao seu lado se repete o processo. Actualmente, o processo de
montagem e desmontagem da cofragem bastante mais clere devido a sistemas deslizantes
e at pela possibilidade de cofragens de maiores dimenses.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Figura 29 Compactao da terra de forma manual.
Fonte: Caetano & Vasco (2011)
Figura 30 Compactao da terra de forma mecanizada.
Fonte: Caetano & Vasco (2011)
Ferramentas utilizadas na compactao:
Este sistema construtivo, como j foi referido, baseia-se na compactao de terra entre
taipais. Tradicionalmente o apisoamento era realizado com recurso a ferramentas como o
mao ou o pilo (Figura 28 e 29). Estes so constitudos por um cabo de madeira ou mesmo
em metal com cerca de 4 cm de dimetro e entre 150 cm a 180 cm de comprimento, o qual
cravado na extremidade de um bloco de madeira, este para pisar a terra. Esta ferramenta
apresenta diversos tipos de acabamento, de modo a adequar-se s necessidades de
compactao das vrias zonas do bloco em taipa.
Actualmente, estes utenslios de compactao tradicional, tm sido complementados,
ou mesmo substitudos, por ferramentas pneumticas (Figura 30), as quais permitem uma
reduo do tempo e esforo empregue nesta actividade.
O processo de compactao extremamente importante para as paredes construdas
em taipa, pois a intensidade da fora empregue na compresso do solo aliado sua
qualidade, que conferem capacidade de resistncia parede.
Figura 28 Exemplos de piles ou maos tradicionais.
Fonte: Adaptado de Doat et al. (1979)
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
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Outros utenslios:
Outros utenslios como baldes, cestos e carros de mo so utilizados para efectuar o
transporte do solo, desde o local de extraco at zona de preparao e, posteriormente,
para o interior das cofragens. Motocultivador, enxada, p e picareta, so ferramentas
utilizadas para a extraco e preparao da terra. Outras ferramentas como fio-de-prumo, fio
de pedreiro, colher de pedreiro, esquadro, serrote e martelo so tambm usados neste tipo
de construo.
8.4.2. Preparao do solo
A extraco do solo deve ser realizada numa altura em que este no se encontre
demasiado hmido, pelo que aconselhado que a sua extraco no seja realizada durante a
poca de chuva. O primeiro cuidado a ter com o local da extraco a remoo da primeira
camada de terra (cerca de 50 cm), pois esta, por norma, apresenta grandes quantidades de
elementos orgnicos que no so benficos para este tipo de construo.
Aps a recolha do solo conveniente que este seja peneirado de forma a remover
impurezas, como elementos orgnicos e pedras de dimenses no desejadas. Seguidamente
so realizados os testes ao solo e, se necessrio, so realizadas as devidas
correces/estabilizaes (ver captulo 9.1.). Por fim, adicionada a gua necessria para
que esta possa ser devidamente trabalhada, sendo, posteriormente, transportada para o
interior dos taipais e devidamente pisada.
8.4.3. Construo de paredes
Como j foi referido, uma das grandes desvantagens da construo de paredes em taipa
a permeabilidade do material que, quando em contacto prolongado com gua, comea a
perder capacidade de resistncia, acabando por se desintegrar. Ento, torna-se conveniente
que as paredes do edifcio se encontrem protegidas, tanto no topo por um beirado saliente,
quer na base pela sua elevao em relao ao solo.
Tendo em conta esta debilidade as paredes em taipa devem elevar-se no mnimo 30 cm
cho (altura que varia em funo do tipo de clima, seco ou chuvoso) atingindo at 150cm,
sendo a opo mais utilizada a elevao das fundaes at referida altura.
Tradicionalmente as fundaes eram contnuas e realizadas em alvenaria de pedra ou de
tijolo, sendo a sua espessura igual (mais comum) ou superior da parede. Actualmente tem-
se verificado a sua construo em beto armado, uma vez que se trata de um processo mais
clere, mais resistente perante aces ssmicas e, muitas vezes, utilizado na restante
estrutura. Devido s caractersticas de capilaridade ascendente que estas paredes apresentam
conveniente criar uma barreira capilar ou corte hdrico entre as fundaes e a parede em
taipa, de modo a evitar o contacto com humidades ascendentes.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
32
Como referido anteriormente, de evitar a presena de matria orgnica no material
de construo da parede pois este pode causar fissuras e um mau comportamento estrutural,
pelo que, por vezes, a adio equilibrada de fibras e cascalho (desde que com dimenses
reduzidas) se torna vantajosa, uma vez que aumenta a sua resistncia mecnica. Aps a
conveniente preparao do solo vai-se colocando entre os taipais camadas de terra com cerca
de 10 a 20 cm de espessura que , de seguida, devidamente compactada (at emitir um som
quase metlico e formar uma nata a superfcie), repetindo-se o processo as vezes necessrias
para encher a cofragem. Quando este processo estiver concludo desmonta-se a cofragem e
repete-se o mesmo processo.
As juntas dos blocos de taipa podem ser rectas na vertical ou a 45 (Figuras 31 e 32),
sendo muitas vezes aplicadas umas argamassa de unio da terra, areia e cal ou ainda com
tijolos cozidos. Sendo que, actualmente, devido possibilidade de realizar cofragens ao longo
de todas as paredes, estas juntas podem ser apenas horizontais entre a unio de cada bloco,
ou nem existirem (Figura 33).
Na construo com este sistema construtivo as instalaes elctricas e canalizaes
so efectuadas com recurso aos mesmos materiais utilizados nas construes mais usuais,
existindo a hiptese que estes fiquem aparentes ou embutidos nas paredes, sendo que, neste
ltimo, os rasgos da parede devem ser realizados depois de descofrar a parede e antes que
esta complete dez dias, pois este tipo de paredes, ao contrrio de outras que se vo
degradando, esta vai melhorando a sua resistncia com o passar do tempo.
8.4.4. Revestimento das paredes
As paredes construdas em taipa no apresentam necessidade de revestimento, pelo
que podem conter um acabamento aparente. Ainda assim, devido fragilidade que este
mtodo construtivo apresenta quando em contacto directo e intenso com gua aconselhvel
que, nestes casos, a parede se encontre protegida por beirados e elevada do solo, o qual deve
apresentar um bom escoamento das guas. Outra possibilidade para este tipo de acabamento
a estabilizao fsico-qumica atravs da adio de elementos ligantes e hidrfugos (ex.:
Figura 31 Esquema de juntas na diagonal.
Fonte: Doat et al. (1979)
Figura 32 Edifcio em taipa com juntas verticais.
Fonte: Caetano & Vasco (2011)
Figura 33 Edifcio em taipa sem juntas.
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A SUSTENTABILIDADE DO SISTEMA CONSTRUTIVO EM TERRA: UM PROJECTO DE REABILITAO
33
cal, cimento), os quais permitem obter uma melhoria ao nvel da impermeabilidade da
parede, o que a torna mais resistente s intempries. Este tipo de soluo j usada h
vrios anos, sendo conhecida por taipa militar, em que a cal misturada com a terra
conferindo maior resistncia edificao. Em Portugal existem vrios exemplos desta
aplicao, principalmente em edifcios militares (ex. Castelo de Paderne, Castelo de Salir,
entre outros).
Em edifcios nos quais se opte pelo revestimento da parede, o tradicional reboco em
argamassa de cimento, este no aconselhvel, pois as suas caractersticas no so
compatveis com as das paredes em taipa, as quais apresentam uma base fraca no
suportando grandes retraces, o que origina a separao desse revestimento atravs de
empolas.
O reboco mais aconselhvel base de terra e cal, sendo aplicado em trs camadas: a
primeira constituda por cal hidrulica e areia, na proporo 1:3, respectivamente; a
segunda composta por areia mais fina; e a terceira com mais quantidade de cal. Neste caso
frequente a pintura anual base de cal, de modo a melhorar a impermeabilidade da
parede.
Hoje em dia possvel a aplicao de tintas de silicato, as quais, semelhana da cal,
permitem uma aplicao directa nas paredes em taipa, com a vantagem de apresentar uma
maior durabilidade da tonalidade da cor.
8.5. A estrutura dos edifcios em taipa
Grande parte dos edifcios em taipa excluem a necessidade de uma estrutura auxiliar
num outro material, uma vez que a prpria parede em taipa autoportante, ou seja tem a
capacidade de se suportar, aguentando ainda o peso da cobertura. Este tipo de construes
apresentam, em regra, apenas um nico piso, ainda que seja possvel a realizao de dois ou
mais pisos sem uma estrutura auxiliar. Tal no se mostra aconselhvel, uma vez que a
espessura necessria das paredes aumenta consideravelmente, o que se torna incomportvel
ao nvel de rea, material e mo-de-obra.
Em edifcios de apenas dois pisos frequente que as paredes do primeiro piso sejam de
menores dimenses que as do piso trreo. Esta medida assume grande importncia, uma vez
que reduz o seu peso e permite uma fcil e conveniente ligao entre as paredes e a laje do
piso justaposto, ainda que em alguns destes casos, ou nos edifcios que comportam um maior
nmero de pisos, se torne essencial a introduo de uma estrutura auxiliar.
Nos casos em que se opte pela introduo de uma estrutura complementar, esta pode
ser em diversos materiais, como a madeira (tipo de estrutura bastante usada em construes
tradicionais), o ferro ou o beto. Estas podem ser aplicadas, tanto no interior como no
exterior das paredes.
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A SUSTENTABILID