A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

download A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

of 13

Transcript of A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    1/13

    ESCOLA SUPERIOR DE ADMINISTRAÇÃO, MARKETING E

    COMUNICAÇÃO – ESAMC  – SANTOS

    CURSO DE DIREITO

    A SUCESSÃO TRABALHISTA NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DIANTE DA NOVA

    LEI DE FALÊNCIA

    Bárbara Santos1 

    Flávio Faitanini2 Vivian Lopes3 

    Sinval Moraes4 

    RESUMO 

     A partir de uma pesquisa exploratória com delineamento bibliográfico e ex-post

    facto, esse trabalho visa apresentar a possibilidade ou não da sucessão trabalhista

    nos casos de recuperação judicial de empresas. A abordagem se dá por uma

    análise conceitual dos institutos da recuperação judicial, bem como da sucessãotrabalhista, para em seguida apresentar esta discussão em um caso concreto,

    envolvendo as empresas Varig e Gol, julgado pela nossa Suprema Corte.

    1  Bacharelanda em Direito na ESAMC  –  Escola Superior de Administração, Marketing e Comunicação  – Santos(SP). 2015. E-mail: [email protected]. Orientador: Sinval Moraes.2  Bacharelando em Direito na ESAMC  –  Escola Superior de Administração, Marketing e Comunicação  – 

    Santos(SP). 2015. E-mail: [email protected]. Orientador: Sinval Moraes.

    3  Bacharelanda em Direito na ESAMC –

      Escola Superior de Administração, Marketing e Comunicação –

     Santos(SP). 2015. E-mail: [email protected]. Orientador: Sinval Moraes.4  Orientador e Professor de Direito Empresarial na ESAMC  –  Escola Superior de Administração, Marketing e

    Comunicação – Santos (SP). 2015. E-mail: [email protected].

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    2/13

    Palavras-chave: Recuperação Judicial; Sucessão Trabalhista; Varig; Gol.

    1. INTRODUÇÃO

     A Lei n.º 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, que regula a recuperação judicial,

    a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, trouxe à tona

    grande discussão doutrinária sobre a possibilidade ou não de ocorrência da

    sucessão trabalhista na recuperação judicial.

    Em se tratando de falência, a lei, em seu artigo 141, II, é expressa ao dispor

    que na alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive da empresa ou de suas

    filiais, o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do

    arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as

    derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho.

    No tocante à recuperação judicial, o legislador não foi emblemático, limitando-

    se a dispor, no artigo 60, parágrafo único da referida lei, que o objeto da alienação

    estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações

    do devedor, inclusive as de natureza tributária.

    Inicialmente, cumpre destacar que a norma contida no artigo 60, parágrafo

    único da Lei n.º 11.101/2005, não veda de maneira expressa a sucessão trabalhista,

    reportando-se o legislador tão somente à vedação das obrigações de natureza

    tributária na recuperação judicial, diferentemente da norma prevista no artigo 141, II

    da mesma lei.

     Assim, ao longo desse estudo iremos discorrer sobre a recuperação judicial e

    a sucessão trabalhista para melhor entendimento de tais institutos.

    2. DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    3/13

      Conforme dispõe o artigo 47 da Lei n.º 11.101/2005, a recuperação judicial

    tem como finalidade possibilitar que a sociedade empresária ou o empresário

    individual possa superar crise econômico-financeira, buscando assim, proteger a

    função social e estimular a atividade econômica, bem como preservar os postos de

    trabalho e garantir os interesses dos credores.

    Neste sentido, Ulhoa ressalta que a recuperação judicial tem como principal

    intuito evitar que crise instalada na empresa ocasione a sua falência. O doutrinador

    ainda destaca que a análise de viabilidade da recuperação deve ser realizada pelo

    Judiciário, em virtude de alguns fatores como:

    “a) importância social, no sentido de que é necessário que seja importantepara a economia local, regional ou nacional que aquela empresa sereorganize e volte a funcionar com regularidade;

    b) mão de obra e tecnologia empregadas;

    c) volume do ativo e passivo: o volume do ativo e passivo da sociedade queexplora a empresa a recuperar é importante elemento da análise financeirade balanço, que se faz comparando pelo menos dois demonstrativos dessaespécie;

    d) idade da empresa: empresas muito jovens só devem ter acesso àrecuperação judicial se o potencial econômico e a importância social queapresentam forem realmente significativos;

    e) porte econômico: quanto menor o porte da empresa, menos importânciasocial terá, por ser mais fácil sua substituição.”5 

    De acordo com Ricardo Negrão, o devedor em crise econômico-financeira

    que pretende utilizar-se de um dos instrumentos de recuperação em juízo deverá

    observar os pressupostos contidos no artigo 48 do dispositivo legal supracitado,

    conforme:

    “(a) o exercício  regular de atividade empresarial há mais de dois anos; (b)não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença

    transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes; (c) não ter, hámenos de cinco anos, obtido concessão de recuperação judicial; (d) não ter,há menos de oito anos, obtido concessão de recuperação judicial com baseno plano especial de que trata a Seção V do Capítulo III; (e) não ter sidocondenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoacondenada por qualquer dos crimes previstos na LF. À exceção dosalinhados sob c e d, que não se aplicam à recuperação extrajudicial, todosos demais são comuns às três modalidades de recuperação em juízo.”6 

    5COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial: Volume III. São Paulo. Saraiva, 2010.6NEGRÃO, Ricardo. Aspectos objetivos da lei de recuperação de empresas e de falência: Lei 11.101, de 9 de

    fevereiro de 2005. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    4/13

      O artigo 50 do referido diploma legal, trouxe um rol exemplificativo de

    medidas que possibilitam a recuperação judicial da empresa em crise, como

    disposto abaixo:

    “ Art. 50. Constituem meios de recuperação judicial, observada a legislaçãopertinente a cada caso, dentre outros:

    I  –  concessão de prazos e condições especiais para pagamento dasobrigações vencidas ou vincendas;

    II  –  cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade,constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações,respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente;

    III – alteração do controle societário;

    IV  –  substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou

    modificação de seus órgãos administrativos;V  –  concessão aos credores de direito de eleição em separado de

    administradores e de poder de veto em relação às matérias que o planoespecificar;

    VI – aumento de capital social;

    VII  –  trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive àsociedade constituída pelos próprios empregados;

    VIII – redução salarial, compensação de horários e redução da jornada,mediante acordo ou convenção coletiva;

    IX  – dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ousem constituição de garantia própria ou de terceiro;

    X – constituição de sociedade de credores;

    XI – venda parcial dos bens;

    XII  –  equalização de encargos financeiros relativos a débitos dequalquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedidode recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de créditorural, sem prejuízo do disposto em legislação específica;

    XIII – usufruto da empresa;

    XIV – administração compartilhada;

    XV – emissão de valores mobiliários;

    XVI – constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar,em pagamento dos créditos, os ativos do devedor.”7 

    Negrão analisa os meios de recuperação judicial através da Teoria da

    Empresa, adotada pelo Código Civil de 2002, classificando-os em seis categorias

    distintas:8 

    7 BRASIL. Lei n.º 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência doempresário e da sociedade empresária. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-

    2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 07 nov. 2015.

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    5/13

    “a) dilatório ou misto: decorre da concessão de prazo e condições especiaispara das obrigações vencidas ou vincendas, conforme dispõe o art. 50, I daLF, o doutrinador ressalta também, que se os créditos vencidos, foremderivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes detrabalho, a dilatação do prazo para pagamento não poderá exceder a um

    ano, (LF, art. 54). E que se o crédito for de natureza exclusivamente salarial,no valor de até cinco salários mínimos, vencidos nos três meses anterioresao pedido de recuperação judicial, o plano deve prever o pagamento em atétrinta dias (LF, art. 54, parágrafo único).

    b) meramente remissório: é a equalização de encargos financeiros relativosa débitos de qualquer natureza, nos termos do art. 50, XX da LF.

    c) com preponderante influência sobre o perfil subjetivo da empresa:decorre da cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade,constituição de subsidiária integral (art. 50, II). Alteração do contratosocietário (art. 50, III). A constituição de sociedade de credores (art. 50, X).Negrão afirma que essas alterações provocam considerável mudança naempresa, vez que refletem, diretamente sobre o sujeito da atividadeeconômica, tendo em vista a alteração da forma, estrutura ou capital dasociedade empresária;

    d) com preponderante influência sobre o perfil objetivo da empresa: tambémdenominado de aspecto patrimonial, decorre quando há a cessão de cotasou ações; o aumento do capital social, o trespasse ou arrendamento deestabelecimento empresarial; a dação em pagamento ou novação dedívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia; a venda parcial debens; a emissão de valores mobiliários e a constituição de sociedade paraadjudicar os ativos do devedor.

    e) com preponderante influência sobre o perfil funcional ou negocial daempresa: ocorre com a substituição total ou parcial dos administradores do

    devedor ou modificação de seus órgãos administrativos (art. 50, V), com aconcessão aos credores de direito de eleição em separado deadministradores e de poder de veto em relação às matérias que o planoespecificar (art. 50, V), com usufruto da empresa (art. 50, XIII) ou com aadministração compartilhada (art. 50, XIV).

    f) com preponderante influência sobre o perfil corporativo ou institucional daempresa: Negrão observa que a as medidas previstas no art. art. 50, VIII,atingem diretamente as relações entre empresário, colaboradores,dirigentes, funcionários e operários, através da possibilidade de reduçãosalarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordoou convenção coletiva.” 

    Não obstante, Ulhoa observa que os termos do artigo 50, são instrumentosfinanceiros, administrativos e jurídicos que possibilitam aos administradores da

    sociedade empresária, interessada em pleitear o benefício da recuperação em juízo,

    analisar com o advogado e demais profissionais, quais, entre os meios indicados,

    possam mostrar-se eficazes para que empresa consiga superar a crise e reerga a

    atividade econômica, evitando, assim, a sua falência.9 

    8 NEGRÃO, Ricardo. Aspectos objetivos da lei de recuperação de empresas e de falência: Lei 11.101, de 9 defevereiro de 2005. 4 ed. - São Paulo: Saraiva: 2010.9 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: direito de empresa. 23 ed. - São Paulo. Saraiva: 2011.

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    6/13

      Atendidas as disposições dos artigos 51 e 52 da LF, no que se referem ao

    pedido e deferimento da recuperação judicial, e após a publicação da relação de

    credores sem manifestação contrária, em 30 (trinta) dias (art. 55 da LF), bem como

    cumpridas outras exigências que a lei determina, conforme dita o art. 58, o juiz

    concederá a recuperação judicial do devedor, cujo plano não tenha sofrido objeção

    de credor ou quando observado o disposto no § 1° do mencionado artigo. A lei

    disciplina, ainda, no art. 60, os casos em que a recuperação judicial aprovada,

    envolve a alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor.

    Cumpre observar que houve evidente omissão legislativa no artigo 60,

    parágrafo único, no tocante à vedação da sucessão trabalhista na recuperação

     judicial, uma vez que, esta não foi disposta de forma explícita, surgindo assim,

    discussões doutrinárias e jurisprudenciais quanto à possibilidade ou não de sua

    ocorrência no processo de recuperação judicial.

    3. DA SUCESSÃO TRABALHISTA

     A sucessão trabalhista, também conhecida por sucessão de empregadores ou

    alteração subjetiva do contrato, por sua vez, é regulada pelos artigos 10 e 448, da

    Consolidação das Leis do Trabalho, na forma abaixo expressa:

    "Art. 10. Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará osdireitos adquiridos por seus empregados.

    (...)

     Art. 448. A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresanão afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados."

    Nas palavras de Maurício Godinho Delgado, a sucessão trabalhista consiste

    no "instituto juslaborativo em virtude do qual se opera, no contexto da transferência

    de titularidade de empresa ou estabelecimento, uma completa transmissão de

    créditos e assunção de dívidas trabalhistas entre alienante e adquirente

    envolvidos.”10 

    10 DELGADO, Maurício Godinho. Sucessão trabalhista: a renovação interpretativa da velha lei em vista de novosfatos. Disponível em: . Acesso em: 10

    nov. 2015.

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    7/13

      Para que exista a sucessão trabalhista, dois são os requisitos essenciais: que

    uma unidade econômico-jurídica seja transferida de um para outro titular; que haja

    continuidade da prestação de serviços pelo obreiro.

    O primeiro requisito diz respeito, a princípio, à transferência do controle da

    sociedade ou do conjunto desta, que é transferida como um todo ou a transferência

    de um ou alguns de seus estabelecimentos específicos, tais como filiais, agências

    etc. Nesse sentido, se faz necessária a transferência de uma fração empresarial

    significativa que traduza seu aspecto de unidade econômico-jurídica.

    O segundo requisito é a continuidade da prestação laborativa pelo obreiro ao

    novo titular. Ensina Godinho que restará caracterizada a sucessão ainda que atransferência interempresarial não tenha afetado, significativamente, o contrato

    empregatício, mas desde que se verifique a continuidade da prestação laborativa

    para o novo titular.

    4. DA SUCESSÃO TRABALHISTA NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL E SUAS

    VÁRIAS INTERPRETAÇÕES

    Entendida como polêmica a questão trazida pela Nova Lei de Falências e

    Recuperação Judicial quanto à vedação trabalhista contida de forma expressa no

    artigo 141, II e sua omissão no artigo 60 da referida lei, a teor:

    "Art. 60. Se o plano de recuperação judicial aprovado envolver a alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juizordenará a sua realização, observado o disposto no artigo 142 desta lei.

    Parágrafo único. O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e nãohaverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive asde natureza tributária, observado o disposto no art. 141 desta Lei.

    (...)

     Art. 141. Na alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive daempresa ou de suas filiais, promovida sob qualquer das modalidades quetrata esse artigo:

    I  – Todos os credores, observada a ordem de preferência do art. 83 destaLei, sub-rogam-se no produto da realização do ativo.

    II  –  O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá

    sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as denatureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentesde acidentes de trabalho."

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    8/13

      Em diapasão, Manoel Justino Bezerra Filho explica que, "este dispositivo, de

    forma específica, isenta o adquirente dos bens das chamadas sucessões

    trabalhistas ou tributárias. Mesmo que haja dívidas de natureza tributária ou

    trabalhista, ainda assim não incidirão sobre o objeto da alienação."11 

     Assim, a doutrina se divide no sentido de que, de um lado, trata-se de uma

    afronta ao que dispõe os artigos 10 e 448 da CLT, e de outro, uma inovação em

    sede de sucessão trabalhista.

    De pronto reconhecemos que a inexistência da sucessão trabalhista no direito

    falimentar visa facilitar a alienação do estabelecimento para possíveis credores, uma

    vez que os encargos trabalhistas e tributários não serão sucedidos pelo arrematante.

    Se assim não fosse, não haveria interessados em adquirir os bens da

    sociedade em recuperação, pois a expectativa de suceder os débitos gera medo em

    acabar na mesma situação pela sucedida, qual seja, a insolvência. Compartilha

    deste entendimento Gladston Mamede:

    "Facilmente se percebe que, no contexto de uma empresa que está emcrise econômico-financeira, essa transferência seria no mínimo improvável,na medida em que possíveis interessados na aquisição da filial ou de

    unidade produtiva isolada temeriam o peso dos débitos do empresário ousociedade empresária recuperanda anteriores à transferência."12 

     A alienação busca garantir a própria continuidade ou recuperação do

    empreendimento, o que nos leva a um princípio conhecido na seara trabalhista: a

    proteção do hipossuficiente através da continuidade da empresa, caracterizada pela

    continuidade da empresa, de modo intrinsecamente ligada ao princípio da

    continuidade da relação de emprego.

     Ademais, a própria legislação falimentar visa conservar aquelas empresasconsideradas como economicamente viáveis, já que estas prestam grande auxílio à

    economia ao distribuir bens e serviços, gerando empregos.

    Feita tais considerações, há o entendimento de que os artigos referenciados

    impedem somente que o arrematante assuma com as obrigações do antigo

    empregador, não proibindo, entretanto, que os antigos empregados sejam

    contratados pelo adquirente, de modo a garantir a continuidade do emprego.

    11 BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova Lei de Recuperação e Falências Comentada. São Paulo: RT, 3ª edição,2005.12 MAMEDE, Gladston. Falência e Recuperação de Empresas. São Paulo. Ed. Atlas, 2006.

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    9/13

      Há ainda de se comentar o entendimento veiculado na doutrina e

     jurisprudência no sentido de que, o artigo 60, em seu parágrafo único, não exclui a

    sucessão trabalhista, pois a única vedação expressa está no artigo 141, II e trata

    das hipóteses de falência e não de recuperação. Nesse sentido, não podemos falar

    em uma interpretação extensiva do preceito com a finalidade de justificar a vedação

    à sucessão trabalhista, pois em hermenêutica, não se pode atribuir uma

    interpretação extensiva a norma jurídica de caráter restritivo.

     A sucessão trabalhista, como explicado anteriormente, pode ser caracterizada

    ainda que se refira à fração do respectivo empreendimento, compreendida na

    alienação de filiais ou unidades produtivas isoladas, tal como expresso no dispositivo

    objeto de estudo, uma vez que a atividade econômica a ser operada será a mesma

    de antes, ocorrendo tão somente a mudança da titularidade desta unidade, e por

    força dos artigos 10 e 448 da CLT, não poderá afetar os direitos adquiridos e os

    contratos de trabalhos dos empregados vinculados a esta fração empresarial.

     A partir de uma análise à luz da principiologia, o princípio do in dubio pro

    operario autoriza que seja aplicada a interpretação mais favorável ao empregado, de

    modo, a que mais atenda aos seus anseios, no caso em questão, a garantia de

    manutenção e satisfação dos direitos e créditos trabalhistas pendentes.

    Nesse sentido ainda podemos elencar os princípios constitucionais da

    dignidade da pessoa humana, da valorização social do trabalho, da justiça social, da

    solidariedade, da função social da propriedade, dentre tantos outros que nos

    remetem à preservação de direitos sociais fundamentais do trabalhador.

    5. CASO VARIG X GOL

    Em 2005, o grupo econômico da Varig ingressou com um pedido de

    recuperação judicial, o qual foi aprovado. Alguns meses depois, durante o processo

    de recuperação judicial, a Varig Logística S/A, empresa do grupo Varig, teve seu

    controle acionário transferido para a empresa Volo do Brasil S/A.

     Após a transferência do controle acionário e aquisição de todos os ativos,

    aeronaves, clientes através de sistemas de milhagens e etc, a Varig Logística S/A, a

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    10/13

    Volo do Brasil S/A, a VRG Linhas Aéreas S/A, passaram a formar um grupo

    econômico denominado Nova Varig, que sucedeu a Varig S/A. Posteriormente, esse

    grupo econômico fora incorporado pela empresa área Gol.

    Em 28 de março 2007 a empresa Gol anunciou publicamente a compra da

    nova Varig S/A - Viação Aérea Rio Grandense, pelo valor de US$ 320 milhões, ou

    R$ 660 milhões, o que desencadeou diversas demandas de ex-empregados da

    Varig, postulando, além do pagamento de verbas contratuais devidas, o

    reconhecimento da sucessão da Varig pela Gol.

    Em resumo, explica o Dr. Leonardo P. Meirelles Quintella:

    "Tudo o que era praticado pela Varig S/A  – Viação Aérea Rio Grandensepassou a ser desempenhado pelas empresas Varig Logística S.A., Volo doBrasil S.A. e VRG Linhas Aéreas S.A  –  suas sucessoras  –  e hoje érealizado pelo ‘Grupo GOL’, composto por Gol Linhas Aéreas InteligentesS.A., Gol Transportes Aéreos S.A. e GTI S.A. o qual adquiriu toda aatividade econômica da “Varig”."13 

    6. ENTENDIMENTO DO STF ACERCA DA SUCESSÃO TRABALHISTA NA

    RECUPERAÇÃO JUDICIAL

    De antemão, porém em sentido contrário ao Supremo Tribunal Federal, se faz

    interessante mencionar decisão anterior proferida pela 15ª Turma do TRT-SP, tendo

    como relatora desembargadora Silvana Abramo Margherito Ariano, que se

    manifestou pelo reconhecimento da sucessão trabalhista, uma vez que, em seu

    entendimento, a Lei nº 11.101/2005 não altera as disposições contidas na lei

    específica trabalhista, que visa proteção do trabalhador e de seus direitos

    trabalhistas.

    O Tribunal Superior do Trabalho por sua vez, em decisão da 7ª Turma, em

    consonância com a Suprema Corte, absolveu as empresas VRG Linhas Aéreas S.A

    e a Gol S.A da responsabilidade solidária por débitos trabalhistas da Varig. Nesse

    sentido, o TST tem decidido pela ausência de responsabilidade no caso de

    aquisição por leilão em processo de recuperação judicial, mesmo diante do

    reconhecimento de grupo econômico preexistente.

    13  QUINTELLA, Leonardo P. Meirelles. Sucessão trabalhista: o caso Varig. Disponível em:

    . Acesso em: 10 nov. 2015.

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    11/13

      Diante do STF, o caso da Varig x Gol foi citado por diversas vezes durante o

     julgamento da ação direta de inconstitucionalidade, ADIN 3.934-2, que decidiu

    acerca da constitucionalidade dos arts. 60, parágrafo único e 141, II da Nova Lei de

    Falência, definiu que não há sucessão de débitos trabalhistas nos casos de compras

    de ativos isolados de empresas em recuperação judicial, o que encerra a discussão

    quanto à inexistência de sucessão trabalhista quando o processo de recuperação

     judicial envolver alienação de filiais ou de unidades produtivas isoladas, nos termos

    do caput do art. 60 do referido diploma.

    Em análise ao julgado da ADIN 3.934-2, vale ressaltar o entendimento do

    ministro relator, Ricardo Lewandowski, ao afirmar que a lei é coerente com a

    necessidade de preservação da empresa, e em consonância, o ministro Cezar

    Peluso salienta que a função da lei é justamente essa, pois se fosse lucrativo

    adquirir empresas em colapso, ela seria inútil.

    7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

    Em vista de toda anterior discussão acerca da aplicabilidade ou não da

    sucessão trabalhista no processo de recuperação judicial, a decisão proferida pelo

    Supremo Tribunal Federal foi recebida com entusiasmo por advogados atuantes na

    área de recuperação de empresas e assim caiu por terra todas as dúvidas e

    questionamentos acerca do tema.

    Com pesar das normas trabalhistas, a Nova Lei de Falências foi instituída

    com o fito de facilitar a permanência de empresas tidas como viáveis no mercado, e

    ao impor a obrigatoriedade do ônus decorrente, seja na seara tributária ou

    trabalhista, o legislador não estaria atingindo os fins colimados do diploma legal.

     Ao longo desse estudo foram mencionados princípios, inclusive de ordem

    constitucional, acerca da defesa do obreiro, mas diante da manifestação da nossa

    Suprema Corte não há que se questionar a constitucionalidade do artigo 60, caput e

    parágrafo único da Lei n.º 11.101/2005.

    REFERÊNCIAS

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    12/13

     

    BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Nova Lei de Recuperação e FalênciasComentada. São Paulo: RT, 3ª edição, 2005.

    BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:. Acesso em: 10nov. 2015.

    BRASIL. Lei n.º 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. Regula a recuperação judicial, aextrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em:. Acessoem: 07 nov. 2015.

    COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial: Volume III. São Paulo.Saraiva, 2010.

    DA SILVA, Francisco Dias. Sucessão trabalhista: caso Varig/Gol. Disponível em:. Acesso em: 10 nov. 2015.

    DE CARVALHO, Luiza e BAETA, Zínia. STF veta sucessão trabalhista. Disponívelem: . Acesso em: 10 nov. 2015.

    DELGADO, Maurício Godinho. Sucessão trabalhista: a renovação interpretativa davelha lei em vista de fatos novos. Disponível em: . Acesso em: 10 nov. 2015.

    DE SOUZA, Marcelo Papaléo. Repensando a sucessão trabalhista na recuperação judicial e falência. Disponível em:. Acesso em: 10 nov. 2015.

    FIGUEIREDO, Emilly Andrade. Sucessão de débitos da recuperação judicial e nafalência. Disponível em:. Acesso em: 10 nov. 2015.

  • 8/18/2019 A Sucessão Trabalhista Na Recuperação Judicial Diante Da Nova Lei de Falência

    13/13

    FONTANELE, Augusto. Gol e VRG são absolvidas de responsabilidade trabalhistada Varig. Disponível em: . Acesso em: 10 nov. 2015.

    GOL compra Varig por US$ 320 milhões. G1, São Paulo, 28 mar. 2007. Disponívelem: . Acesso em: 10 nov. 2015.

    LASMAR, Gabriela Mascarenhas. A sucessão trabalhista na recuperação judicial.Disponível em:. Acesso em: 10 nov. 2015.

    MAMEDE, Gladston. Falência e Recuperação de Empresas. São Paulo. Ed. Atlas,2006.

    NEGRÃO, Ricardo. Aspectos objetivos da lei de recuperação de empresas e defalência: Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

    QUINTELLA, Leonardo P. Meirelles. Sucessão trabalhista: o caso Varig. Disponívelem: . Acesso em: 10 nov. 2015.

    SUCESSÃO trabalhista e recuperação judicial. Disponível em:. Acessoem: 10 nov. 2015.