A Representação Feminina na Imprensa Brasileira

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 A Representação da mulher pela Imprensa Feminina Ao longo de muitos séculos, nós mulheres figurávamos de forma secundária nas representações levadas ao público. No tocante às publicações da imprensa, algumas vezes aparecíamos como "segundo luga r", "subalte rno", "complem enta r", "dep endente" em refe rênc ia às publ icaç ões destinadas ao público masculino (Ainda que a Imprensa feminina, desde as folhas artesanais até o produto da indústria, tivesse potencial o suficiente para alcançar e atingir uma significativa parte da sociedade). Analisando o mome nto no qual surgira m - em todo o globo - publ ica ções dirigidas especialmente a nós mulheres, percebemos que este fato muito provavelme nte está ligado à ampliação dos papéis sociais femininos (antes restritos ao lar ou à vida religiosa) e também - talvez majoritariamente - à evolução do sistema capitalista que  pontuava novas necessidades a serem satisfeitas e novas gamas da sociedade a serem ab ar cada s po r ele. Ma s ai nda as sim a impr ensa fe mi nina su rg e com o es ti gma secundário. Com o decorrer dos séculos XIX e XX verificamos certa evolução no que diz respeito à nossa representação realizada pela imprensa feminina. O objetivo deste texto acadêmico é explicit ar, com base nas orientações da obra "Mulher de Papel - a representação da mulher pela imprensa feminina brasileira" de Dulcília Schro eder Buit oni  , de que forma co mpr eendemos ta is tra nsf ormaçõ es - tentando cumprir a linearidade de tempo e focando o objeto de nossas observações aqui mesmo, no Brasil. Ainda que a partir do século XIX seja comprovado o aparecimento, no ocidente, de veículos impressos destinados especialmente ao público feminino, o conceito de Imprensa Feminina ainda permanece em processo de produção, porque se analisarmos

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A Representação da mulher pela Imprensa Feminina

Ao longo de muitos séculos, nós mulheres figurávamos de forma secundária nas

representações levadas ao público.

No tocante às publicações da imprensa, algumas vezes aparecíamos como "segundo

lugar", "subalterno", "complementar", "dependente" em referência às publicações

destinadas ao público masculino (Ainda que a Imprensa feminina, desde as folhas

artesanais até o produto da indústria, tivesse potencial o suficiente para alcançar e

atingir uma significativa parte da sociedade).

Analisando o momento no qual surgiram - em todo o globo - publicações

dirigidas especialmente a nós mulheres, percebemos que este fato muito provavelmente

está ligado à ampliação dos papéis sociais femininos (antes restritos ao lar ou à vida

religiosa) e também - talvez majoritariamente - à evolução do sistema capitalista que

 pontuava novas necessidades a serem satisfeitas e novas gamas da sociedade a serem

abarcadas por ele. Mas ainda assim a imprensa feminina surge com o estigma

secundário.

Com o decorrer dos séculos XIX e XX verificamos certa evolução no que diz

respeito à nossa representação realizada pela imprensa feminina.

O objetivo deste texto acadêmico é explicitar, com base nas orientações da obra

"Mulher de Papel - a representação da mulher pela imprensa feminina brasileira" de

Dulcília Schroeder Buitoni , de que forma compreendemos tais transformações -

tentando cumprir a linearidade de tempo e focando o objeto de nossas observações aqui

mesmo, no Brasil.

Ainda que a partir do século XIX seja comprovado o aparecimento, no ocidente,

de veículos impressos destinados especialmente ao público feminino, o conceito de

Imprensa Feminina ainda permanece em processo de produção, porque se analisarmos

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cautelosamente a representação das mulheres feitas por esses meios, poderemos afirmar 

que muito há por se fazer em termos de retratação da realidade do nosso sexo.

A respeito desta questão Evelyne Sullerot [1963. Pag. 5] – estudiosa dos processos de

formação da Imprensa Feminina na França – em seu livro “ La Presse Féminine”

afirma:

“ A história dessa imprensa é apaixonante porque nela lemos a história dos costumes:

não a “pequena história” feita de anedotas sobre os grandes deste mundo, mas um

reflexo significativo da vida cotidiana, da economia doméstica, das relações sociais,

das mentalidades, das morais e dos esnobismos apaixonados, no seu monótono frenesi

de novidade”

Sendo assim, podemos chegar a um entendimento que nos servirá de apoio em

toda esta pesquisa: É exatamente a novidade, o novo, a ilusão que a todo custo a

imprensa feminina busca. Necessário se faz esclarecer que este termo ‘novo’ não

representa o novo encontrado na notícia, é um novo que lhe confere toda uma ideologia,

esta fazendo parte de sua natureza. Ainda assim ele impera nos impressos dedicados à

mulher desde o surgimento dos mesmos e ao final deste trabalho o consideraremos de

forma mais consistente.

Ao longo do texto estudaremos, assim como a autora que nos norteia na presente

 pesquisa, a evolução do impresso feminino fragmentado em décadas.

 Nosso objeto de análise estará contido entre os anos corridos de 1900 até a

década de 90; também analisaremos a edição mais recente da revista Cláudia, além de

uma visão sistemática tomando a atualidade como foco e as visões dos conteúdos

relacionados a conceitos do sociólogo Edgar Morin com a finalidade de complementar,

exemplificar, confirmar e trazer para os dias atuais as observações realizadas durante

nossa pesquisa.

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Visualizaremos, a partir deste instante, cada uma das décadas consideradas

imprescindíveis ao estudo da representação da mulher na imprensa feminina brasileira.

E antes de começarmos este panorama, sentimos a obrigação de dizer que no século

XIX são encontrados dois pólos bastante distintos desta representação: Uma imprensa

tradicional – que não torna possível a liberdade de ação fora do lar e que enaltece

virtudes domésticas e qualidades estigmatizadas como “exclusivamente femininas” – e a

outra, uma imprensa progressista, que pregavam e defendiam os direitos das mulheres,

enfatizando, sobretudo, a educação.

∗ Década de 1900

 Neste período nota-se o crescimento e a popularidade de revistas ilustradas. A

imprensa no Brasil já estava sendo considerada empresa industrial e comercial.

Surgiam, além dos jornais vespertinos já existentes, várias outras tiragens gráficas que

 buscavam atender às demandas da capital do país que era, então, o Rio de Janeiro. A

 população da cidade crescia exponencialmente, fazendo com que a cidade “se espalhe”e surjam jornais de bairro, havia também publicações luxuosas, ricas, que eram

favorecidas pelo desenvolvimento das artes gráficas e apresentavam ilustrações e

fotografias muito bonitas (data deste século a utilização dos recursos fotográficos pela

imprensa no Brasil).

Tais imagens ocupavam espaço cada vez maior, e os textos não contavam mais

tão somente com xilogravuras e litografia. Esta prosperidade das revistas ilustradas

delimita uma época em que jornalismo e literatura se fundiam nas publicações. Em

seguida estas começaram um processo de afastamento da literatura, se transformando

em revistas mundanas, de variedades ou femininas.

Em geral as folhas femininas, com exceção do jornal “A Voz Feminina”, de

1901 –fundado por três moças de família tradicional de Diamantina- que lançava a

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campanha do pelo voto feminino, cuidavam de assuntos caricatos, poesias e até

 brincadeiras.

Existiam, entretanto, perspectivas mais sérias em relação à mulher, porém estas

se encontravam na imprensa em geral, não necessariamente na específica imprensa

feminina.

Sendo assim, entendemos que a representação da mulher nos impressos

dedicados exclusivamente a ela eram demasiadamente literários e repletos de belas

gravuras. A primeira década do século XIX apresentava a figura feminina a partir de um

conjunto de Oásis.

Década de 1910

 Nesta década a imprensa paulista desenvolveu-se ainda mais. Surge na cidade de

São Paulo o veículo denominado “Revista Feminina”. Fundada por Virgilina de Souza

Salles e sua secretária Avelina de Souza Salles, esta era uma revista mensal que

alcançou a tiragem de 30 mil exemplares, sendo mantida por vários anos (de 1914 até

1935) com distribuição nacional.

 Não era um veículo meramente comercial, porque possuía uma postura editorial

que defendia o voto feminino em publicações na página de abertura, era bem

diagramado, bem acabado e possuía uma gama extensa de assuntos; além de dedicar-se

“(...) às senhoras, ocupando-se das artes, letras, modas, poesia, contos, informações,

conhecimentos úteis etc.”. Esta revista expunha textos que iam além do conteúdo

comum destinado ao público feminino da época, havia uma ideologia a ser defendida.

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 No momento histórico em que as folhas femininas levavam ao público moda e

literatura, tratando esporadicamente de assuntos como educação, higiene, pequenas

seções de culinária e dicas de beleza; a “Revista Feminina” demonstrava uma

formulação mais completa em relação aos demais veículos.

Entretanto não existia nesta época nenhuma “revista” dedicada inteiramente às

mulheres com número significativo de páginas; visto que todas as folhas, revistas e

  jornais femininos publicados até o momento não excediam 16 páginas e eram

apresentadas como complemento de outros impressos. Esta compreensão faz com que

enxerguemos a “Revista Feminina” como um impresso que explorava melhor a

 potencialidade do público ao qual se destinava, oferecendo maior variedade de seções

que preenchiam um espaço razoável. Ela compreendia melhor o “Universo Feminino”

de sua época e ocupava de maneira mais completa cada uma das divisões deste conceito

(culinária, psicologia, beleza, notas sociais, trabalhos manuais etc.). Em síntese era um

 produto melhor dimensionado e melhor enquadrado nas demandas de seu público, que

evoluía dentro do sistema capitalista.

É preciso trazer à tona, para melhor compreensão do leitor desta pesquisa, que

neste momento a campanha sufragista, no âmbito da luta política, vai se firmando e

algumas mulheres passaram a tomar atitudes concretas neste sentido.

Contamos com o exemplo da professora Leolinda Daltro que, não conseguindo

alistamento eleitoral, funda em 1910 o Partido Republicano Feminino e organiza em

1917 uma passeata a favor do voto feminino, no Rio de Janeiro. Em 1919, junto com

um número significativo de mulheres, vai ao Congresso assistir à votação de um projeto

que visava a concessão do direito de voto ao sexo feminino. Também pode ser citada a

Advogada Myrthes de Campos, primeira mulher a ser aceita na Ordem dos Advogados

(OAB), que requereu seu alistamento eleitoral em meados de 1905 e não obteve

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sucesso. As mulheres moviam-se, e a imprensa da época noticiava e comentava esses

eventos, que também se refletiram nas revistas femininas.

Uma das mulheres que conseguiu grande projeção nos impressos femininos foi a

Bióloga e Advogada Bertha Lutz que lutava em favor dos direitos da mulher, afirmava

que a emancipação estava contida na educação da mulher e também do homem. Dez

anos depois, já Presidente da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, lidera o

movimento pelos direitos femininos, especialmente o direito ao voto. Em um de seus

textos ela afirma que nesta década, ainda que o advento da Primeira Grande Guerra não

tenha sido experimentado fisicamente no Brasil, ao perderem seus filhos para a

Epidemia de 1918, as mães brasileiras se aproximavam - na dor e na tristeza – e se

tornavam “irmãs” das mães européias que perdiam seus filhos na Guerra.

∗ Década de 1920

A influência da arte européia, unida ao nativismo e à fermentação cultural

urbana, eclodiu na Semana de Arte Moderna. No tocante ao uso de imagens desenhadas,

a imprensa permanecia bem criativa e em algumas publicações essas tendências se

enfatizaram com o aparecimento do Modernismo. A efervescência deste se traduziu, em

termos editoriais, em várias revistas literárias que surgiram durante os anos 20, expondo

em textos fragmentos deste movimento que afetaria todos os campos artísticos.

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Embora o Modernismo tenha influenciado os desenhos publicados nas revistas

ilustradas o mesmo não se deu com os textos das mesmas. Este ainda evolui muito

devagar, se tivermos como base de comparação o texto literário modernista, mas ainda

existem evoluções se considerarmos o padrão de texto jornalístico. A imprensa em geral

começa a distanciar-se do opinativo e passa a fazer uso de reportagens. Então as

fotografias deixavam de ser meramente ilustrativas para complementarem alguma

informação contida no texto.

 No tocante à imprensa feminina, A paulista “Revista Feminina” seguia carreira

firme, junto às suas leitoras fiéis e apresentação gráfica moderna, assemelhando-se em

alguns pontos às revistas destinadas às mulheres publicadas nos Estados Unidos. Em

São Paulo surge também a “Vida Doméstica” em 1929.

Continuava também a revista “A Cigarra”, que foi lançada em Março de 1914,

  por Gelasio Pimenta. Em 1924 ela mantinha suas seções de moda, denominada

“Chronica das Elegancias” e inovava com seções como “Collaboração das leitoras”, esta

sendo o espelho da participação do público da revista; esporadicamente se via no início

da ‘Collaboração’ algum assunto mais sério, mas em geral esta se dedicava a uma

espécie de comunicação adolescente que girava em torno de  footings e namoros em

 praças.

De outro lado, a burguesia paulista e a carioca ascendem de maneira que criam

uma nova demanda impressa, tornando necessários produtos editoriais mais

sofisticados. É neste contexto que surge, em 1927, a revista “A Paulistana”, cuja

 primeira edição apresentava capa modernista, anúncios desenhados também com base

no modernismo, belas ilustrações, “palavras cruzadas”, coluna social, uma nota sobre a

exposição do pintor Antonio Gomide, com reprodução de algumas de suas obras, “O

Reino da Celluloide” – uma seção sobre cinema - “De Eva & de Adão” – seção de

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modas e variedades - entre outras que atendiam aos anseios cosmopolitas da elite do Rio

de Janeiro e de São Paulo.

A partir das análises de Revistas Femininas da época, compreendemos que a

maior parte delas tendia para o aspecto educativo e para a elevação espiritual da mulher,

sem que se envolvam com questões de cunho religioso. Havia somente o culto à beleza

e à perfeição, por isso seus artigos se concentravam em educação e psicologia. Eram as

linhas editoriais unidas em um ponto: o pensamento da busca pelo aperfeiçoamento das

mulheres e consequentemente de seus filhos.

Embora por um lado observamos que certas publicações tentam aproximar a

mulher do mundo material, tratando de assuntos como sua saúde, educação, de seus

direitos, do trabalho feminino, de sua conscientização, informação e contato com o

mundo proletário, o modelo proposto ainda é o de uma mulher etérea, cultivadora de

valores espirituais.

∗ Década de 1930

Em 1932 finalmente foi dado às mulheres do Brasil o direito ao voto, por decreto

- do então presidente – Getúlio Vargas. A Revolução Constitucionalista, o caminho

democrático e a Constituição de 1934, que incorporou à lei o voto feminino. Em

seguida houve o Estado Novo, que interrompeu a democracia alcançada nos anos

anteriores, e que fez nascer o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) que

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cerceava a cultura no Brasil. A crítica política abranda-se e a caricatura começa a

declinar.

Em relação à imprensa direcionada à mulher podemos observar que o jornalismo

feminino não encontrara ainda formas “mais jornalísticas” de tratar a realidade, isso

quer dizer que não faz muito uso de maneiras de investigação que ajudam a melhor 

caracterizar as reportagens e entrevistas publicadas. Esta imprensa estava limitada à

abordagem de assuntos tradicionais: moda, beleza, crianças etc. Além, como já citado,

de textos literários, contos, crônicas, poesias, provérbios, ou – no máximo – artigos

sobre problemas atuais ou outros assuntos. Ainda esses artigos eram escritos em

linguagem formal, pretensamente literária. Reportagens e entrevistas raramente eram

veiculadas, portanto a relação da imprensa feminina com o fato da atualidade era (e em

alguns momentos até hoje é) menos presente.

A realidade não surge narrada, descrita ou revivida nas páginas dos impressos

femininos. Em geral as matérias neles publicadas apenas dissertavam sobre um tema

atual qualquer e essa era uma das poucas formas de o “real” inserir-se na imprensa

dedicada às mulheres: como editorial ou um artigo.

∗ Década de 1940

 Nesta década, expande-se o jornalismo Norte Americano. As agências enviavammaterial jornalístico que era traduzido e dificilmente adaptado. As assinaturas dos textos

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eram de nomes estrangeiros bem como as fotografias. Esta era uma época em que

Hollywood pregava o otimismo, ainda que em tempos de guerra. Mesmo revistas como

“O Cruzeiro”(fundada em 29 de Março de 1930) que possuíam boa dose de sentimento

nacional, com reportagens escritas e fotografadas em nosso país e muitas ilustrações de

autores brasileiros, não escaparam à influencia que os Estados Unidos impuseram aos

meios de comunicação de massa, principalmente no que dizia respeito ao cinema.

 Nomes importantes como Fox, Columbia, Warner etc. emitiam fotos e textos a respeito

de artistas ou pequenas histórias por eles protagonizadas.

A Guerra aparece muito pouco nas páginas das revistas, em algumas surgia

apenas sob a forma de votos de paz. A Indústria cinematográfica de Hollywood

 predominava. Em “O Cruzeiro” um exemplo das poucas seções nacionais: “Garotas”,

com desenhos de Alceu e legendas (em verso) de Millôr, e a série “Queria ser...” que

reflete o desejo das moças brasileiras em tornarem-se estrelas internacionais como as

que lhes eram apresentadas nos cinemas da época.

Percebemos, portanto, que o padrão desta década era a atriz estrangeira. As

seções de moda e beleza são ilustradas com fotos de celebridades como Deanna Durbin,

Ana Pavlova, Eleonora Duse,Betty Grable. A atriz Eleanor Powell ditava normas de

etiqueta para debutantes que vão ao primeiro baile em uma das seções.

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Já na segunda metade da década de 40 surge um produto que apontaria uma

nova direção, diferente das existentes até o momento e que ganharia, mais tarde, uma

 boa parte do mercado: As Fotonovelas. No Brasil a pioneira foi Grande Hotel, lançada

em 1947, pela editora Vecchi, no Rio de Janeiro, que publicava histórias de amor em

quadrinhos. Ainda não era a fotonovela verdadeira, que possuía fotos (e foi publicada

 pela mesma editora em 1951), mas era o início do gênero.

Grande Hotel   já nasceu como veículo destinado exclusivamente às mulheres,

que trazia relatos “verdadeiros” de conflitos amorosos, o que o fez um dos maiores

sucessos editoriais de seu tempo, ultrapassando rapidamente um milhão de exemplares

semanais. Este veículo faz uma exploração tônica do romantismo, trazendo seções como

“Problemas do coração – problemas de amor expostos pelos próprios interessados”,

testes: “Estará você realmente amando?” e “Que Mulher é você?”, resumos de filmes

em “O Amor nos filmes” e frases amorosas. Eram pequenas doses de romantismo que

garantiam a compra da revista semanalmente.

∗ Década de 1950

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A década de 50 marca uma maior evolução na industrialização da imprensa

 brasileira, refletida mais intensamente nas revistas, porque elas estavam entrando em

fase de produção industrial, especificamente as femininas e as denominadas ilustradas.

As seções femininas dos jornais, que custavam a modernizar suas formas e seus

conteúdos, estavam sempre atrasadas em relação às revistas. A diagramação e ilustração

dos conteúdos dedicados às mulheres nos jornais eram pouco trabalhadas; a mulher,

como público, era bem pouco considerada, o que dava a impressão de que os jornais

 possuíam as folhas femininas somente para constar. O Estado de S. Paulo publicava as

Sextas-Feiras uma página para o público feminino, nesse formato, desde 1940. Na

década de 50, graças às exigências criadas pela urbanização crescente e pela

concorrência, a seção feminina foi transformada em suplemento, o “Suplemento

Feminino”, de 1953, de dezesseis páginas em tamanho tablóide. Sua diagramação não

apresentava nada de novo.

Ao passo que as revistas femininas desta década iam adquirindo formato mais

industrializado, obedecendo a metas empresariais. A primeira revista de fotonovela no

Brasil foi a “Encanto” de 1951 – da Artes Gráficas do Brasil. Embora a “Grande Hotel”

 já existisse desde 1947, suas histórias eram em formato de quadrinhos, ou seja, ela só

inaugura o verídico estilo ‘fotonovela’ em 1951.

As fotonovelas desertam para uma realidade urbana, que, entretanto, só é

trabalhada em sua superfície. Da mesma maneira que mostra a mulher trabalhadora,

mantém a ideia de que a felicidade suprema se realiza no lar, com marido e filhos. A

Mulher é chamada para trabalhar fora; mas é chamada com mais ênfase para ficar em

casa. Em síntese: Atrás de toda a apologia ao amor, resta um conformismo nutrido por 

diversas histórias erguidas exatamente no mesmo modelo.

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Surge então, em 1952, a revista “Capricho”, da Editora Abril. Precedendo o

lançamento da mesma ocorreu uma grande campanha publicitária, com anúncios no

rádio e em páginas inteiras de outros veículos impressos de grande tiragem, como “O

Cruzeiro. A partir de então surge no Brasil uma nova fase no mercado editorial.

“Capricho” foi a primeira revista que a Abril lançou dedicada ao público feminino. Em

novembro, a revista passou a ser mensal, por decisão do proprietário da Abril, Victor 

Civita, e esta periodicidade vale até hoje, apesar de eventuais períodos em que a revista

era publicada quinzenalmente.

Em paralelo ao nascimento de revistas femininas e revistas ilustradas mais

modernas, formava-se com o passar do tempo uma galeria de ídolos nacionais,

auxiliados pelo processo de difusão ocorrido devido a meios como rádio e televisão, que

começava uma progressiva inserção. Em meados dos anos 40 predominavam os artistas

de Hollywood e apenas alguns poucos artistas brasileiros eram focalizados pelos

‘media’. Um fator que poderia ser apontado como auxiliador na formação de estrelas

nacionais foi o colunismo social, gênero jornalístico que cresceu bastante neste

momento de crescimento econômico da era juscelinista, que atendia à ideologia otimista

da burguesia ascendente.

Geralmente todos os meios de comunicação existentes espelhavam tal espírito

 progressista superficial, e criavam o embrião do jornalismo de televisão, através da

sedimentação de algumas estrelas em fotonovelas cujas características eram bem mais

nacionais e fazia uso do prestígio dos novos ídolos.

 

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*Década de 1960

 Neste momento adentramos a história mais próxima, que figura na memória de

algumas brasileiras que viveram este contexto, não mais somente dependendo da análise

de livros. A mulher já havia sido introduzida na sociedade do consumo. As revistas

traziam cada vez mais anúncios, como querendo testar a capacidade compradora do

 público ao qual se destinavam e, sendo assim, o projeto editorial desses impressos

dirigidos às mulheres focavam, primeiramente, o consumo. Conselhos de beleza,

contos, psicologia e culinária não são selecionados por si mesmos; tudo que está

inserido em uma revista feminina está diretamente ligado ao produto ou serve para atrair 

a consumidora a comprar a revista e ser “bombardeada” com a publicidade nela contida.

Em suma: o conteúdo é instrumental e serve a interesses bem específicos das empresas.

 Neste momento, aparece em 1966, a grande e inigualável revista brasileira de

reportagem:  Realidade, da Editora Abril. Ela contava com jornalistas e fotógrafos

conceituados que produziam reportagens pesquisadas durante meses e nos lugares maisdiferentes do Brasil e do mundo. Então, o nº 10, de Janeiro de 1967, inteiramente sobre

a mulher brasileira, foi apreendido/censurado.

Segundo matéria publicada na revista  Edição Veja  Especial Mulher (da mesma

Editora Abril) de Junho de 2010 o contexto histórico no qual nasceu a revista

 Realidade, terceiro ano da ditadura militar no Brasil, era relativamente mais tranquilo – 

se comparados aos momentos vividos após o Ato Institucional número 5 (AI-5) de 1968

- embora houvesse sinais de fechamento de alguns dos meios de comunicação.

Em meros seis meses desde o seu lançamento a revista já alcançara a marca de

venda de 475 mil exemplares. Não havia tema que escapasse do crivo dos trabalhadores

da revista: Divórcio (chamado “desquite” naquele tempo), celibato na Igreja,juventude,

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homossexualidade, drogas, sexo e tantos outros assuntos tabu geralmente omitidos de

outros impressos.

Para a edição nº 10, correspondente a Janeiro do ano 1967 os editores

 pretendiam realizar o mais completo retrato da mulher brasileira, jamais publicado.

Foram seis meses de trabalho em cima das reportagens e foi encomendada uma pesquisa

ao INESE, instituto mais respeitado da época, que ouviu mais de 1200 mulheres para

apresentar um panorama bastante amplo do pensamento feminino. A chamada principal

da capa era “Edição Especial – A Mulher Brasileira, hoje”.

Poucas horas depois de ter chegado às bancas (No dia 30 de Dezembro de 1966)

e terem sido distribuídos mais de 400 mil exemplares, a  Realidade foi recolhida das

 bancas por viaturas da polícia, com o apoio da Delegacia de Costumes de São Paulo. No

despacho, o juiz Artur de Oliveira Costa afirmava que a publicação possuía “algumas

reportagens obscenas e profundamente ofensivas à dignidade e à honra da mulher,

  ferindo o pudor e, ao mesmo tempo, ofendendo a moral comum, com graves

inconvenientes e incalculáveis prejuízos para a moral e os bons costumes”.

 No dia seguinte ao embargo em São Paulo foi decretada a apreensão da revista

também no Rio de Janeiro. A revista recolhida virou peça de colecionador, sua

apreensão serviu para torná-la ainda mais querida entre aqueles que a liam.

A Edição Especial Mulher de 1967 foi como um cânone do modo de fazer 

 jornalístico que mescla jornalismo e literatura. Seus textos extremamente bem escritos

causaram posições como a de Cláudia Andujar, fotógrafa do parto que foi uma das

causas da apreensão da revista, por ser extremamente “chocante”, que afirmou haver 

uma palavra que serviria de sinônimo à Realidade: Liberdade.

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∗ Década de 1970

O auge do consumo nas revistas brasileiras acontece nesta década. Antes de

serem lançadas as revistas, ocorriam diversas pesquisas que serviam para determinar alguns assuntos, a linguagem a ser utilizada, o tamanho da publicação, a disposição dos

assuntos e as fotos da capa e outros fatores.

As revistas que já existiam passaram a se adaptar em termos de publicações e formatos

aos interesses e demandas do público. Ou seja, elas passaram a ser, a priori, um produto

industrial e a questão cultural é relegada ao segundo plano. As necessidades reais vêm

depois das necessidades artificialmente produzidas pelos meios de comunicação de

massa.

As revistas femininas de classe média, a exemplo da Cláudia (cuja edição mais

recente analisaremos posteriormente), são praticamente catálogos comerciais de

diversos produtos com uma ou outra matéria fielmente jornalística.

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 Notamos a existência de muitas páginas coloridas que demonstra o espírito desta

década, A parte majoritária dessas revistas constitui-se, além dos anúncios, de matérias

sobre moda, beleza, decorações – todas elas com indicações de nomes, endereços e até

 preços de alguns prestadores destes tipos de serviço e de muitos desses artigos.

Pretextando veicular “reportagens de serviço”, davam prioridade à fabricantes

que faziam anúncios em suas páginas. A revista vende a leitora para o anunciante e o

conteúdo anunciado vende a revista para a leitora (ou chama sua atenção).

Enquanto a edição das revistas vai se aperfeiçoando, os jornais, preocupados

muito mais com outras editorias do que com a especificamente feminina, vão ficando

em atraso se comparados com esta imprensa específica.

O “Suplemento Feminino”, enquanto produto para grande circulação, não estava bem

dimensionado, por não ser capaz de cumprir funções básicas como os outros veículos,

mesmo que sejam totalmente comerciais.

O fato é que o produto mais veiculado nas revistas gerais desta época era o sexo.

Este era o principal e mais vendido produto editorial nos anos 70.

A repressão política dos primeiros anos acabou por canalizar as insatisfações para

outros aspectos. Nas revistas femininas, assuntos sexuais foram conquistando pouco a

 pouco o seu espaço. Desde referências às insatisfações de mulheres casadas, começaram

a ser publicadas matérias sobre virgindade, orgasmo, masturbação, etc. Mais no final da

década as edições de revistas femininas publicavam, na íntegra, nomes dos órgãos

sexuais, o que era impensável dez anos antes. É preciso ressaltar que esse avanço não

foi uniforme em todas as revistas femininas. ‘Cláudia’ e ‘Capricho’ foram bastante

cautelosas e vagarosas para tratar de temas sexuais em suas páginas, a primeira por ser 

considerada mais comportada e a segunda por ser dedicada a um público mais jovem.

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A inovação no que diz respeito À destinação foi protagonizada pela revista

“Nova” que, ao contrário das revistas femininas da época que se destinavam à dona de

casa ou à jovem moça, passou a direcionar-se à mulher adulta, casada ou não, com

 poucas preocupações dentro do lar e muitas preocupações sexuais; Uma mulher mais

“liberada” que não pensa necessariamente em casamento.

Paralelamente à esses produtos industriais bem trabalhados surgiam impressos

modestos, tentativas artesanais de jornais e publicações que visavam promover a mulher 

como ser humano, buscando identificação com as classes populares, a exemplo do

tablóide de 1976 “Nós Mulheres”.

∗ Década de 1980

As fotonovelas deixam de fazer parte das publicações femininas, a segmentação

inicia um processo de crescimento e a beleza passa a ter ser foco direcionado para a

estética corporal. Os anos 80 apresentaram crise econômica e daí nasceram as revistas

de “serviços”, que sugeriam às leitoras seções de “Faça Você mesma”. As adolescentes

ganharam importância definitiva enquanto público e nicho mercadológico.

Sobretudo esta época foi extremamente importante no tocante à luta para

conquistar a democracia.

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Em 1981, o governador do Estado de São Paulo - Franco Montoro, criou o

 primeiro Conselho Estadual da Condição Feminina; a primeira Delegacia da Mulher 

começou a funcionar em São Paulo em Agosto de 1985.

A nova Constituição, promulgada em 1988, previa que “Mulheres e Homens são

iguais em direitos e obrigações” e “Os Direitos e deveres referentes à sociedade

conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”, o sistema já não era

mais patriarcal. Também foi aprovado o voto aos 16 anos de idade e começava a ser 

tratada a questão do meio ambiente.

Os anos 80 começaram a apresentar os resultados das lutas e reivindicações

femininas, iniciadas na década anterior. O mercado de Trabalho se abria cada vez mais

 para representantes do sexo feminino; as mulheres chegavam em número cada vez

maior às universidades e aumentava gradativamente a atuação da mulher na política.

 Nesta época, graças às dificuldades econômicas, surgem revistas cujo objetivo

era serem úteis à leitora, algumas dando “dicas” para que se conseguisse uma renda

complementar a partir de trabalhos artesanais. Outro tema que começava a ser tratado

com frequência era “Cuidados com a saúde e com a alimentação”; a difusão de

academias de ginástica dava conta de que o físico ganhava mais relevância.

 No tocante à interação com os leitores (ou a ideia de interação amistosa que as

revistas pretendiam transmitir) as revistas femininas recebiam inúmeras

correspondências enviadas pelo público ao qual se destinavam nas seções de cartas – 

onde algumas delas eram publicadas. Sugestões, consultas sobre temas como

relacionamentos, direito, saúde e outros estão presentes desde sempre na imprensa

feminina. Em tempos pré-internet o volume de cartas recebido pelas revistas indicava a

necessidade de interação das mulheres com a revista que elas compram e na qual

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confiam. Mais e mais a leitora ganha voz ativa nas publicações que se dirigem a ela,

dando início a um tempo de jornalismo colaborativo.

∗ Década de 1990

Grande parte das revistas brasileiras de grande circulação dedicou-se, nesta

década, ao consumo e culto às celebridades (neste momento podemos enxergar uma

intertextualidade com a obra de Edgar Morin acerca da Imagem Olimpiana, que será

analisada neste mesmo trabalho depois.), em especial as que figuravam na Televisão.Todo o direcionamento para o mercado que a imprensa feminina realizou desde os

 primeiros momentos de sua existência chega ao ápice no fim do século XX.

As revistas destinadas às mulheres são fundamentais para a concretização da

sociedade de consumo e, desta forma, o corpo assume o sentido de elemento

fundamental na elaboração da imagem das pessoas.

A produção de imagens cresceu significativamente: Televisões, vídeos, câmeras

de segurança, outdoors, indoors, circuitos internos, imagens nos computadores etc. A

 pressão exercida por essa enxurrada de imagens femininas é muito intensa.

Os anos 90 viram ascender os setores das classes denominadas C e D na

sociedade. Com o plano Real de 1994, a população voltou a ter maior poder aquisitivo,

 possibilitando o lançamento das chamadas revistas populares. Descobriu-se que muitas

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mulheres comprariam revistas semanais cujo preço era de R$1,50. Estas traziam

informações úteis ao cotidiano, celebridades e respondiam às necessidades de suas

leitoras.

A característica principal desta década é o auge da divinização das celebridades.

A Revista “Caras” é um exemplo significativo deste fato; a fórmula dessas publicações

que são destinadas à classe A e B, também atrai leitores da classe C, que enxergam

nestas pessoas “célebres” modelos a serem copiados.

Quase não há lugar para matérias críticas ou para assuntos tristes. Muito raro, vê-se o

depoimento de algum famoso acerca de superação de um momento mais amargo de sua

vida, que é apresentada ao público como algo próximo da perfeição vista em

divindades.

O tema “televisão” movimenta um mercado crescente, que se pronuncia com a

questão da representação da imagem feminina. Em outros termos: as mulheres da tela

da TV são as referencias principais para as mulheres brasileiras.

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Análise Sociológica acerca da Imprensa Feminina

Edgar Morin, sociólogo francês que desenvolveu trabalhos envolvendo a cultura

de massa, produziu uma tese de que os mass media criam no imaginário de seus

espectadores o que ele denomina imagem “Olimpiana”. Olimpianos, na mitologia grega,

eram os deuses que habitavam o monte Olimpo e, apesar de serem divinos,

apresentavam características humanas. Neles, as pessoas se inspiravam, procurando

viver à sua semelhança. Desta forma, tais entidades foram consideradas centrais na

sociedade, apresentando-se, portanto, como referência para a vida e conduta de todo o

 povo grego.

A tese dos Olimpianos de Morin afirma que os meios de comunicação de massa,

semelhante ao que ocorria com estes, transformam artistas em pessoas de destaque na

sociedade, a ponto de tornarem-se referências para comportamento, aparência e até no

modo de ser.

De acordo com esta perspectiva e tomando por base as capas de revistas

destinadas ao público feminino, torna-se possível inferirmos que as modelos e

celebridades que as estampam exibem corpos aparentemente perfeitos – entendemos por 

 perfeitos aqueles que são assim julgados e moldados pela mídia. Em sua maioria, estas

mulheres aparecem seminuas ou, ainda, com belíssimas roupas, além de cabelo e pele

invejáveis. Estas figuras podem ser consideradas olimpianas que, em detrimento de se

tratarem de seres humanos, acabaram por ser divinizadas, exaltadas, colocadas em

 pedestal e que, através do veículo impresso – não somente – são impostas à sociedade

como padrão de beleza a ser invejado e seguido.

Figuras como as que estampam as capas destas revistas correspondem a uma

afirmação de Morin: “(...) as estrelas em suas vidas de lazer, de jogo, de espetáculos, de

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amor, de luxo, e na sua busca incessante da felicidade simbolizam tipos ideais da cultura

de massa.”

As edições destinadas às mulheres geralmente dedicam espaço para sessões de

moda, onde são oferecidos padrões que moldam o perfil de como a leitora deve se vestir 

e se arrumar para ser considerada realmente bonita e atraente. Por mais que não se

avalie determinada peça como, de fato, bonita, certamente, a mulher procurará se vestir 

de forma semelhante pelo simples fato de que “saiu na revista”.

Tais dicas de moda e exposição de determinadas tendências, assim como

modelos de comportamento, apresentam-se como sendo uma perpétua busca do novo

(novo estilo, novo cabelo, novo visual); o que, segundo Morin, “corresponde a uma

dupla necessidade: a da reestimulação sedutora, a da afirmação individual (ser diferente

dos outros).” Estas matérias trazem consigo uma constante “reciclagem” do visual com

o intuito de combater e anular o já visto e, portanto, ultrapassado. Também propõem a

originalidade, o estilo próprio; porém tal “desejo de originalidade, desde que a moda se

espalhou [por meio dos veículos de comunicação de massa] se transforma em seu

contrário; o único, multiplicando-se, vira padrão.” (MORIN, 1977). Entramos desta

forma num ciclo vicioso de renovação e busca do diferenciado, sem, no entanto,

 perceber que, uma vez massificados, os aspectos estilísticos divulgados nunca levarão à

originalidade objetivada.

“A mulher modelo desenvolvida pela cultura de massa tem aparência de boneca

do amor”. Cria-se um modelo feminino constantemente pintado, impecável, o que,

segundo Morin, segue um ritual permanente que é um convite ao amor.

Um comentário relevante do sociólogo francês é o que compara a mulher 

ocidental com a mulher soviética, que não vive em uma sociedade de consumo e que,

 portanto, não vive esta busca incessante pela beleza. De acordo com o autor, “essa

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mulher normal das grandes cidades ocidentais aparece como meretriz aos olhos das

mulheres de Moscou ou de Gorki.”.

Ainda segundo Edgar Morin: “um rosto de mulher reina sobre as capas das

revistas, sejam elas femininas ou não (...). Se o rosto da mulher e não do homem impera

na revista feminina é porque o essencial é o modelo identificador da mulher sedutora, e

não o objeto a seduzir. Se na grande imprensa periódica a mulher eclipsa igualmente o

homem, é porque ela ainda é sujeito identificador para as leitoras, enquanto ela aparece

como objeto de desejo para os leitores. Essa coincidência da mulher-sujeito e da

mulher-objetivo assegura a hegemonia do rosto feminino.”

 A Atualidade como Cenário

Pretendemos neste item elaborar uma síntese da forma com que a figura

feminina está sendo retratada no período atual. Esboçaremos sobre todos os aspectos

que consideramos relevantes, os quais visualizamos constantemente nas edições em

questão, além de suas possíveis intenções, implícitas a olhos relativamente ingênuos.

Considerando pesquisas realizadas por Tânia Navarro Swain e Michelle

Bronstein, é possível afirmarmos que ambas concordam entre si no que diz respeito à

  presença de aspectos masculinos nas revistas femininas. Não estamos tratando

 propriamente da figura do homem nas publicações, mas da abordagem de assuntos quevisam instruir a leitora a “agradar” e alcançar o público masculino.

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Segundo Swain, “as revistas são construídas em função de um personagem cuja

 presença é incontornável e em torno da qual giram as mulheres incansavelmente: o

homem”. Isto é perceptível em matérias que estão no grupo classificado “Amor e Sexo”.

Ocorrem, geralmente, intituladas, por exemplo, como “Ele gosta mesmo de você?”,

“Como os homens realmente veem você?”. Podemos a partir disto destacar a ocorrência

de testes que objetivam, como citado anteriormente, a análise da vida da mulher 

relacionada à figura masculina, além de questionários que buscam o autoconhecimento

da leitora e seu desempenho na vida pessoal e profissional.

"Com a promessa de educar as mulheres para a conquista amorosa e sexual, as

revistas dão inteligibilidade à aquilo que é desejável neste período histórico e indicam

os caminhos serem seguidos para alcançar os objetivos propostos por elas mesmas." 

Gabriela Boemler Hollenbach

 Notamos que ao conter matérias voltadas para a sexualidade, as edições revelam

a emancipação da mulher. Contudo, ao mesmo instante em que a mulher moderna se

encontra neste nível de independência, ela também mantém certos valores tradicionais

que, desde sempre, são esperados de sua parte: a sedução a fim de agradar ao homem; o

que confirma a opinião de Tânia Swain.

Outro aspecto importante verificado nos dias de hoje trata-se da presença de

orientações para confecção de produtos artesanais e culinários. São divulgados manuais

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de “como ganhar o seu próprio dinheiro” instruindo a trabalhos que exigem habilidade,

o que é pressuposto ser um dom feminino. A partir disto, podemos inferir que, apesar 

das publicações incentivarem o desenvolvimento de uma renda própria, ela não

incentiva a ruptura com o modelo doméstico e sim a conciliação com o mesmo.

Assuntos como decoração também se fazem presentes nas revistas, o que nos

 permite alcançar a ideia de que a mulher deve, sobretudo, se voltar para o ambiente

familiar, sabendo torná-lo mais agradável e bonito para uma melhor convivência com a

família. A mulher, neste aspecto, deve demonstrar um caráter mais inovador e moderno,

deixando transparecer certa autonomia e maior personalidade ao decidir, por exemplo,

ousar na constituição decorativa de sua casa.

"A decoração de uma casa pode torná-la tranquila e agradável para quem mora nela

ou pode se transformar no último lugar para o qual seus moradores desejam ir." 

Acompanhada deste poder de autonomia, a figura feminina tende a ser tratada de

modo gradativamente independente sem, no entanto, alcançar o ápice desta proposta.

Ela ocorre como detentora do poder de opinião e com parcela de participação na renda

da casa, uma vez que as revistas retratam a mulher como aquela que, além de cuidar do

lar também trabalha fora e consegue, ainda assim, manter sua classe e beleza. O período

atual tende a enfatizar este modo independente, bem mais explícito se comparado aos

 períodos anteriores expostos em nossa pesquisa. A figura feminina já não se faz tão

dependente do companheiro, daí a sensação de maior liberdade.

As publicações da atualidade geralmente dispõem, ainda, uma sessão de “carta

da leitora”, destacando o espaço e a participação do público alvo, seja para sugerir,

elogiar ou, até mesmo criticar. Poderíamos, a partir desta observação, constar o

 pensamento errôneo de Theodor Adorno ao afirmar que o público aceitaria de forma

acrítica os produtos culturais da chamada Indústria Cultural. Os veículos impressos

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 possibilitam a retroalimentação ou  feedback  através deste espaço, o que destaca o

equívoco cometido pelo autor.

Um ponto muito explorado nas revistas consiste no estímulo, cada vez maior, ao

uso de próteses, as quais deteriam o poder de moldar o corpo da forma desejada. Este

 padrão de desejo é, portanto, imposto pela própria mídia em que rege a ideia de que o

corpo só será suficientemente bonito se for invadido por uma prótese que o transforme.

As publicações encarnam verdadeiras portas de publicidade incentivando o consumo de

 produtos ao mesmo tempo em que oferece o ideal de beleza desejado desde sempre. As

revistas passam a invadir o espaço de instituições como família, igreja e escola, ditando

também regras a serem seguidas.

Como caráter diversional, podemos destacar nas publicações a presença dos

contos de amor. As mulheres buscam nestes textos se identificar com tais situações e,

 possivelmente, associá-las ao seu cotidiano e convívio com o parceiro. Buscam neles,

de repente, alguma solução para um problema que estejam enfrentando no

relacionamento.

Com relação ao material jornalístico disponível nestas publicações, podemos

salientar a predominância do jornalismo interpretativo. Geralmente as revistas não se

atêm em conteúdo informativo, até porque suas edições ocorrem quinzenal ou

mensalmente, o que dificulta muito o acompanhamento dos fatos da atualidade. Já o

 jornalismo interpretativo constitui um modelo que oferece mais atenção, tanto ao fato,

quanto ao leitor, neste caso, à leitora porque busca meios para que esta compreenda, a

seu tempo, as causas e as origens dos fenômenos, além de suas conseqüências no

futuro.

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Para Beltrão, (1976) interpretar, no sentido jornalístico, significa buscar a

essência do fato para entender seu sentido através da identificação de causas e motivos,

de análises, comparações e previsões.

Esta modalidade de informação também pode ser entendida como detentora da

função de deixar a mulher inserida no que ocorre no mundo, porém, de uma forma mais

aprofundada, o que nos auxilia visualizar uma mulher provida de mais conteúdo. É

como se isto fizesse parte da construção do “mundo delas”, compreendido à maneira

mais delicada e inteligente da mulher, visivelmente mais perfeccionista e detalhista, se

comparado à maneira masculina.

 Não diferente das edições comentadas até o momento, as revistas dedicadas ao

 público adolescente trata de assuntos como moda, beleza, sexo e conquista de homens,

 porém de um modo inerente ao processo vivido na adolescência. A exemplo, podemos

tratar do que diz respeito aos relacionamentos; em vez de falarem sobre como agradar 

um homem sexualmente, estas revistas instruem as meninas a como beijar 

satisfatoriamente além de oferecer dicas para alcançar um relacionamento "com aquele

carinha" e não "pagar um mico" nas baladas quando se aproximar do "gato". Este tipo

de linguagem é utilizado, uma vez que se pretende alcançar o entendimento das

adolescentes e jovens que buscam suas respostas para este confuso período de suas

vidas. Estas ocorrem sedentas de um apoio, ou alguém que as entenda e dê conselhos;

assumindo este papel de cupido, a revista adolescente vem ampará-las de tais

inquietações.

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Em geral, estas edições destinam-se a garotas de dez a dezenove anos, idade em

que os padrões comportamentais ainda não se encontram bem definidos. A partir disto,

estes “folheteens” se apresentam como verdadeiros manuais de comportamento para que

as garotas se insiram nos grupos sociais. Este tipo de discurso se faz mais eficiente dada

a pretensão de pessoas desta faixa etária de serem aceitas socialmente.

A imprensa feminina, desta forma, pode ser considerada como o ponto máximo

dos valores estabelecidos pela cultura de massa: afirmação da individualidade privada, o

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 bem-estar, o amor e a felicidade, uma vez que ela leva as mulheres a uma obsessão

consumidora de roupas e acessórios a fim de nivelarem-se às referências explícitas e

oferecidas pela própria imprensa. Padrões de vida e modos de se comportar diante das

várias situações do cotidiano são oferecidos a fim de nortear a figura feminina na

sociedade; de acordo com esta perspectiva e finalidade da imprensa, portanto mídia, o

conteúdo tende a ser totalmente inerente aos processos, vivências e problemas pelos

quais a mulher passa, se aproximando dela, cumprindo papel de representante e apoio.

 Análise da Revista Cláudia – Ano 49 nº. 7 

Para melhor enxergarmos as observações que fizemos acerca da representação feminina nos impressos

que foram surgindo ao longo do século XX no Brasil, decidimos analisar o exemplar mais recente,

 publicado em Julho de 2010, da Revista Cláudia.

Tal revista, como já vimos anteriormente, está disponível nas bancas de todo o país desde o ano 1961 – 

década marcada por profundas mudanças no tocante aos veículos direcionados às mulheres – e destina-se

mais especificamente ao público feminino adulto de classe média alta. Tal fato pode ser percebido através

dos anúncios de artigos de beleza, decoração e culinária de luxo e da veiculação de imagens e reportagens

que apresentam mulheres socialmente “bem posicionadas” e de sucesso profissional comprovado. Outro

fator decisivo para esta observação acerca da destinação da Cláudia é o seu preço, atualmente do valor de

Dez Reais. Partimos da suposição que mulheres cujas posses são limitadas não tenderão, em sua maioria,

a dispor frequentemente desta quantia em prol das leituras proporcionadas por aquela revista.

 Na capa do mês analisado nos deparamos com a figura muito bem vestida e maquiada de Malu Mader,

nos remetendo à analise de Edgar Morin sobre Imagem Olimpiana. A atriz se apresenta bela e sorridente

(sua imagem obviamente retocada pelo programa Photoshop, afim de ocultar os sinais evidentes de seus

43 anos de idade) como uma espécie de divindade e, na matéria que contém sua entrevista, de título “Fala

Maria de Lourdes” (tratando a celebridade como se fosse qualquer outra mulher, ou leitora), ela vem falar 

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do enfrentamento e superação que teve - em suas palavras “Enfrentei tudo com o amor da minha

família”- de uma cirurgia na cabeça em 2005. Malu também fala de seu casamento, tido como perfeito,

com o guitarrista da Banda Titãs – Tony Belloto; e de sua volta ao cenário televisivo na nova novela

global das 19 horas. Todas as páginas a ela dedicadas nos remetem à tudo aquilo que vimos sobre as

celebridades da televisão brasileira começarem a ser os novos padrões de imagem e comportamento a

 partir da década de 70, nos demonstrando modelos a serem seguidos.

Voltando às manchetes da capa, vimos uma menção ao conceito de “novo” da imprensa feminina:

“Cabelo novo”. Este ‘novo’ não é a novidade da notícia, mas a volatilidade com que lidam as mulheres no

que diz respeito a toda a formação de sua imagem e, por vezes, de seu comportamento. Esta manchete nos

apresenta “Cortes que diminuem dois manequins, rejuvenescem cinco anos, atualizam a sua imagem.

Colorações da moda que valem por uma transformação de beleza.” E demonstra claramente a

valorização e o culto exacerbado à figura física da mulher, a importância dada à aparência externa como

se ela fosse realmente capaz de alterar sentimentos subjetivos e situações cotidianas.

A Capa também traz uma chamada para reportagem sobre o assunto saúde, que passou a ser destaque

neste tipo de publicação desde a década de 80.

Além disso, conta com uma matéria que sugere um questionamento feito na capa: “O Sexo foi para o fim

da fila”. É o assunto que foi produto editorial mais vendido na década de 70 aparecendo agora sob outra

  perspectiva: As mulheres atualmente preocupam-se com tantas outras questões: estudo (seja a

Universidade, a Pós Graduação, o Mestrado), trabalho, saúde, viagens, lazer e filhos – não

necessariamente nesta ordem. Isto faz com que o apetite sexual acabe se tornando uma questão secundárianas mentes femininas, hoje. A Revista constrói um panorama etário que apresenta a evolução paralela do

desejo de homens e mulheres ao longo da vida; informando também que há algumas décadas as mulheres

tinham duas vezes mais relações sexuais por semana do que tem hoje. A Crítica que temos a fazer 

especificamente para esta matéria é que o sexo foi nela tratado, ainda que de maneira bastante “diluída”,

como uma preocupação que a mulher deve manter sempre entre suas prioridades, e chega ao ponto de

afirmar, com o depoimento de dois ginecologistas (homens) que esta seleção de outros aspectos do

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cotidiano que ocupam nossos pensamentos é bastante negativa, porque ocupa o espaço do prazer. A

“redenção” destas páginas foi a frase de uma leitora, que afirma que agora a mulher é capaz de encontrar 

 prazer em diversas áreas, que não somente as da libido sexual.

A Cláudia de Julho trouxe também “Os 7 pilares da autoestima”, nos revivendo na memória que as

 publicações femininas sempre tentam imputar regras e padrões de pensamentos, comportamentos,

imagem etc. Utilizando-se de linguagem informal que lhes confere uma relação extremamente íntima -

de quase amiga - com suas leitoras, as revistas inserem em suas mentes muitas idéias cristalizadas que

representam padrões genéricos quase sempre inalcançáveis, como se a felicidade das mulheres

dependesse exclusivamente deste ou daquele “pilar”.

Por fim nos deparamos com o fator místico que circunda o chamado “Universo Feminino”. Cláudia traz

um “Guia da Lua” com 365 dias de previsões, visando nortear as atitudes das leitoras de acordo com o

signo regente de cada Lua vigente nestes dias todos.

Ainda que tenha evoluído e muito em seus 49 anos de existência, Cláudia (e a enorme maioria das

  publicações dedicadas à representar a mulher) claramente mantém padrões esquadrinhados de

 predefinição feminina, visões bastante consolidadas não de “como é”, mas de “como aparenta e deseja

ser” a mulher brasileira atualmente.

Assim como Dulcília Buitoni, buscamos ainda a nossa representação no papel, porque os impressos que

nos dedicam apesar de estarem lançados há muito tempo não nos alcançaram em nossa plenitude e

essência.

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“Mulher de papel” ao final do percurso

  Nossa pesquisa pretendeu discorrer desde os primórdios, no qual a figura

feminina iniciava sua representação na imprensa, passando por uma análise do

momento em que nos encontramos, também prosseguindo o âmbito desta finalidade,

sendo ilustrada de maneira dinâmica pela análise da edição mais recente da revista

Cláudia, da Editora Abril. Baseamos-nos, ainda mais adiante, em proposições

desenvolvidas pelo sociólogo Edgar Morin relacionado-as com as meios pelos quais e

com os quais a mulher está sendo retratada pela mídia impressa.

Pudemos notar que os trajetos das mudanças de visão que figura feminina

  percorreu por parte da imprensa são consideráveis até certo ponto pois, apesar do

conteúdo das edições ser alterado, modificado e aprimorado ao longo do tempo, de

acordo com cada cenário histórico, também explicitado nesta pesquisa, a mulher ainda

não se faz totalmente representada de forma independente. Claramente, esta questão de

independência evolui consideravelmente, porém, não de forma a alcançar total

 plenitude, como podemos notar na análise que toma por pano-de-fundo a atualidade em

que, ao mesmo tempo em que a mulher é estimulada a desenvolver sua própria renda, os

laços com o ambiente doméstico não é plenamente dissolvido. A figura masculina ainda

se faz muito presente nas publicações como se fosse um objetivo constante da vida

feminina.

De textos essencialmente literários, as revistas e folhas dirigidas às mulheres

 passaram a conteúdos de cunho mais interpretativo, mas que tratam, ao mesmo tempo,

de assuntos da atualidade. Notamos neste ponto a inserção da mulher no mundo dos

fatos, donde se visualiza uma figura mais informada e atualizada, com poder de debate

de ideias, já que há uma fonte de onde se pode ter acesso às bases de tais

acontecimentos com uma linguagem detalhista, característica predominantemente

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feminina. Esta presença de textos envolvendo a atualidade trata-se de uma conquista

recente; no princípio da linha que segue nossa pesquisa, é possível inferir que não havia

qualquer preocupação em se moldar uma mulher com mais conteúdo, vigorava a ideia

da manutenção de uma entidade mais romântica, sensível e intrínseca ao ambiente

familiar. Confirmando esta ideia, vale relembrar que mesmo até 1950, os jornais

mantinham folhas femininas apenas para constar que não estavam negando tal sessão.

De páginas predominantemente criativas que visavam entretenimento até a

implantação do germe da sociedade de consumo; a partir de 1960, podemos notar que as

edições estavam invadidas pela publicidade que incentiva a mulher a se sentir mais bela

e mais bonita. O capitalismo assume posição de destaque oferecendo a felicidade

feminina (corpos perfeitos, roupas, pele, cabelo) em troca de seus produtos. Esta

 perspectiva se faz tal como enxergamos no momento presente; uma acelerada busca do

 perfeito que custa a constante manutenção do modelo econômico capitalista.

Assim como se observou a exaltação de atrizes estrangeiras na década de 40, vemos este

fato se corresponder com a busca cada vez maior de atingir os padrões de beleza

impostos pela mídia das modelos e atrizes atuais, o que Morin compararia com a já

citada “imagem Olimpiana”. A mídia é basicamente composta destas entidades que

acabam por ser exaltadas em razão de sua visibilidade dentro da sociedade. As capas

que estas entidades estampam geralmente pretendem chamar a atenção. Como diria

Morin, na imprensa não-feminina a mulher é considerada mulher-objeto, já na capa

feminina é considerada mulher-sujeito. Na primeira, a mulher funciona como meio de

seduzir o público que irá consumir, pois aparece como objeto de desejo masculino. Já

na segunda, a mulher funciona como sujeito identificador para as leitoras, e como objeto

de desejo para os homens.

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É interessante notar também que, nas revistas dedicadas ao público feminino,

existe a substituição do feminismo pela feminilidade. Ao invés de defender valores

 puramente dedicados à mulher, elas a retratam de um modo geral, de uma forma

doméstica, ainda parcialmente submissa ao homem, o que nos confirma a ideia inicial

de que ainda não houve o total desprendimento da mulher com relação ao ambiente

familiar.

Basicamente as mesmas bases são seguidas pela imprensa dedicada às jovens e

adolescentes. Esta instituição passa a dividir espaço com outras tantas, tais como

família, escola e igreja pra ditar normas comportamentais. Podemos observar que estes

veículos aproveitam-se da relativa ingenuidade das garotas que ainda não definiram

com clareza sua personalidade e ideias a serem seguidas para ditar e instruir da forma

com a qual o veículo julga melhor.

Podemos concluir, ao final deste estudo que houve, de fato, uma evolução no

modo pelo qual a figura feminina é retratada pela imprensa, contudo, muitos conceitos

 precisam ser revistos e padrões reavaliados, uma vez que entendemos como ideal a

mulher refletida como entidade mais forte e independente. A sociedade de consumo é

algo que perdurará, já que vivemos em mundo capitalista e globalizado; o que se deve é

dosar a forma com a qual isto penetra em nosso cotidiano, a fim de não nos

escravizarmos pelos padrões e produtos que nos são impostos constantemente. A

mulher é figura forte. Tanto que se faz objeto de estudo a todo o momento bem como

estamos observando. A tendência é que esta força aumente cada vez mais pois a

evolução, assim como apresentamos ao longo do século, tende a ser gradativa e

acreditamos que ela não parará neste momento, ao contrário, ela continuará seu percurso

até que poderemos constatar que a hegemonia da independência e libertação de valores

tradicionais alcançará seu topo mais alto.

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REFERÊNCIAS:

MORIN, Edgar. Cultura de Massas no século XX: o espírito do tempo. Rio de Janeiro, 4ª ed.,1977.

ADORNO, Theodor W. Teoria da Cultura de Massa. Rio de Janeiro, 4ª ed., 1990.BRONSTEIN, Michelle. Disponível em:<http://www.aguaforte.com/osurbanitas5/Bronstein2007.html> acesso em 22 Jun. 2010.

SWAIN, Tania Navarro. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-88392001000300010&lng=pt&nrm=iso > acesso em 22 Jun.2010.

HOLLENBACH, Gabriela Boemler. Sexualidade em Revista: As posições de sujeitoem Nova e TPM. Disponível em:< http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/5526/000516351.pdf?sequence=1 >acesso em 25 Jun. 2010.

BUITONI, Dulcília Helena Schoroeder. Mulher de Papel – a representação da mulher  pela imprensa feminina brasileira. 2ª Edição revista. Editora Summus,2009;

VEJA, Revista. Edição Especial Mulher. Ano 43, nº. 2166. Editora Abril, Junho 2010.

CLÁUDIA, Revista. Ano 49, nº. 7. Editora Abril, Julho 2010

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A REPRESENTAÇÃO DA MULHER PELAIMPRENSA FEMININA

Universidade Federal de Juiz de Fora

Patrícia LaniniVanessa Queiroz

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Trabalho entregue à disciplina ComunicaçãoE Expressão Escrita II

Professora Marise MendesFaculdade de Comunicação Social

Turno Noturno