A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um...

46
Carlos Jaca 1 Linhas Gerais sobre a História da Universidade Conimbricense. Das suas origens à Reforma Universitária Pombalina de 1772. Parte 6 A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a Coimbra Introdução Antes de mais, convém sublinhar que, quando D. João V faleceu em 1750, Portugal encontrava-se em grave situação económica apesar da imensa riqueza em ouro, diamantes e pedras preciosas que nos chegava do Brasil. Entre os problemas de vária ordem que exigiam solução urgente sobressaía o da modernização do nosso aparelho administrativo do qual muitos outros dependiam. O país continuava a governar-se apoiado em estruturas ultrapassadas, desde há muito, e que agora se mostravam quase totalmente caducas, para responderem às exigências de toda a actividade comercial e ultramarina, e que nos últimos dois séculos tinham garantido notável incremento. Nos últimos anos de vida de D. João V já era bem visível a necessidade premente de levar a cabo profundas alterações na máquina estatal, porém a prolongada doença do rei, durante os últimos dez anos do seu reinado terão agravado ainda mais a situação do país. O sucessor, seu filho, D. José, ao subir ao trono tomou, de imediato, a decisão de constituir um Gabinete ministerial com homens que lhe parecessem, capazes de dar a volta às estruturas da governação anterior, ineficiente por hábitos de rotina, que tomasse as providências capazes de implantar as novas estruturas administrativas que o tempo, desde há muito, exigia, mesmo que tais providências viessem a ferir muitos interesses solidamente implantados, como era o caso dos nobres e da Companhia de Jesus.

Transcript of A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um...

Page 1: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

1

Linhas Gerais sobre a História da Universidade Conimbricense.

Das suas origens à Reforma Universitária Pombalina de 1772.

Parte 6

A Reforma pombalina dos Estudos.

Visita do Marquês a Coimbra

Introdução

Antes de mais, convém sublinhar que, quando D. João V faleceu em

1750, Portugal encontrava-se em grave situação económica apesar da imensa

riqueza em ouro, diamantes e pedras preciosas que nos chegava do Brasil.

Entre os problemas de vária ordem que exigiam solução urgente

sobressaía o da modernização do nosso aparelho administrativo do qual muitos

outros dependiam. O país continuava a governar-se apoiado em estruturas

ultrapassadas, desde há muito, e que agora se mostravam quase totalmente

caducas, para responderem às exigências de toda a actividade comercial e

ultramarina, e que nos últimos dois séculos tinham garantido notável

incremento.

Nos últimos anos de vida de D. João V já era bem visível a necessidade

premente de levar a cabo profundas alterações na máquina estatal, porém a

prolongada doença do rei, durante os últimos dez anos do seu reinado terão

agravado ainda mais a situação do país.

O sucessor, seu filho, D. José, ao subir ao trono tomou, de imediato, a

decisão de constituir um Gabinete ministerial com homens que lhe

parecessem, capazes de dar a volta às estruturas da governação anterior,

ineficiente por hábitos de rotina, que tomasse as providências capazes de

implantar as novas estruturas administrativas que o tempo, desde há muito,

exigia, mesmo que tais providências viessem a ferir muitos interesses

solidamente implantados, como era o caso dos nobres e da Companhia de

Jesus.

Page 2: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

2

Assim, D. José, certamente também aconselhado, constituiu um

Gabinete formado por três Secretários de Estado: Negócios do Reino,

Negócios do Ultramar e Marinha, e Negócios Estrangeiros e da Guerra. Esta

última pasta foi sobraçada por um homem já amadurecido, com 51 anos,

apadrinhado por certas personalidades influentes, e recomendado como

personalidade austera, tenaz e decidida.

Tratava-se de Sebastião José de Carvalho e

Melo, futuro Conde de Oeiras e Marquês de

Pombal, e que tinha desempenhado,

anteriormente, funções diplomáticas em

Londres e Viena de Áustria.

Apesar de muitos juízos serenos,

objectivos e bem fundamentados, Carvalho e

Melo é ainda hoje uma figura muito discutida,

e tudo parece indicar que jamais deixará de o

ser, porquanto a sua vida presta-se a várias

perspectivas de análise, desde a puramente biográfica, tipológica e, sobretudo,

como governante do despotismo “iluminado” ou, ainda, ao debate sobre a sua

orientação política, económica, social, diplomática e cultural.

A estada diplomática de Sebastião José de Carvalho e Melo em Londres

e Viena de Áustria poderá ter sensibilizado o futuro Marquês de Pombal a

tomar em consideração as ideias reformadoras pregadas por homens

reconhecidamente prestigiados nos centros da elite cultural europeia – refiro-

me a Luís António Verney, Jacob de Castro Sarmento e António Nunes Ribeiro

Sanches. E a prova é que, com ligeiras modificações de técnica dispositiva,

são as preciosas directrizes dos referidos e ilustres “estrangeirados” que

orientam os elaboradores do “Compendio Histórico” e dos novos “Estatutos

Universitários”.

A reforma universitária pombalina de 1772, factor marcante na História

da Cultura Portuguesa, é talvez a obra de mais incontestável mérito do

Marquês de Pombal. Sob este aspecto, releve-se a honestidade e isenção

exemplares demonstradas pela denominada corrente antipombalista – homens

que, considerando Carvalho e Melo “persona non grata”, reconheceram o

Page 3: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

3

mérito ao obreiro da inovadora, embora já tardia, reforma que pretendeu

modernizar a mais antiga Universidade portuguesa.

Quer se queira quer não, o polémico estadista activou o movimento

cultural de carácter iluminista, dando lugar a um espírito científico em moldes

metodológicos diferentes e de acordo com o espírito racionalista da época.

Com efeito, no seu projecto de reforma do ensino, e particularmente no

projecto reformador universitário, «as coordenadas foram-lhe ditadas pelo

pensamento iluminista que soube assimilar nas suas estadas pelo estrangeiro,

mas fundamentalmente pelas influências de muitos portugueses que na Europa

e no País presenciavam, participavam e desejavam uma ruptura cultural com

um passado dogmático e estático…Ao apresentar nos Estatutos de 1772 a

reforma da Universidade, Pombal, por influência de vários “iluminados”,

introduz no ensino uma mudança que apesar de tudo tentou ser, e em parte foi,

a substituição da Universidade «medieval», obscura e dogmática, pela

Universidade racionalista, experimental e jusnaturalista». (1)

Certo que a reforma pela Universidade da vida mental portuguesa é

tardia em relação aos vinte e dois anos que Pombal já levava de governo, facto

que parece perfeitamente aceitável se se quiser levar em conta que outras

preocupações o assoberbavam.

Para além da pesada herança (leve em ouro brasileiro), legada pelo

reinado anterior, Carvalho e Melo tinha sido abalado pelo terramoto de 1755 e

consequentes cuidados de reedificação da cidade; eram os conflitos internos e

externos que careciam de rápida e eficaz solução; eram os assuntos de

natureza comercial, como a fundação das grandes Companhias monopolistas;

a reforma e criação de organismos do Estado; a intensa actividade diplomática

desenvolvida pelo antigo Conde de Oeiras acerca da Companhia de Jesus,

problema, note-se, com repercussões a nível internacional, acrescentando

ainda que o novo ministro tinha entre mãos uma complicada legislação que não

podia padecer demora.

Efectivamente, só depois de liberto de todas estas situações Pombal

poderia lançar as bases da grande reforma, começando pela organização, ou

reorganização, dos Estudos Menores. Urgia vencer muitas dificuldades.

Page 4: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

4

Expulsão dos jesuítas e reforma dos Estudos Menores.

Prioritária e melindrosa questão era anular a influência jesuítica,

incluindo mesmo a sua expulsão, golpe que iria alterar todo o sistema da

instrução pública.

Quando D. José subiu ao trono, a maior parte do ensino que hoje

chamaríamos secundário estava confiado à Companhia de Jesus. Havia,

ainda, alguns colégios dirigidos pela Congregação

do Oratório, sobretudo desde o reinado de D. João

V, e cuja pedagogia tendia deliberadamente a

rebater e superar a influência dominante da

Companhia. Refira-se, também, que em algumas

cidades ou terras de maior importância, onde não

havia jesuítas ou oratorianos, existiam algumas

escolas geralmente pequenas e quase

rudimentares, leccionando especialmente o Latim,

base de todo o ensino da época. Acrescente-se, ainda, a existência de alguns

professores, denominados particulares, «que ministravam o ensino individual

ou a poucos discípulos, especialmente filhos de grandes senhores, que não

frequentavam as escolas públicas, ou mesmo a outros rapazes, a quem

davam lições, em geral nas próprias casas. Mas todos estes alunos

constituíam uma pequena minoria, comparados com os que frequentavam as

aulas da Companhia de Jesus. Também havia algumas escolas dos institutos

religiosos, mas geralmente reservadas aos seus membros». (2)

Foi, de facto, pelo ensino secundário que Pombal iniciou as suas

reformas da instrução. E nada há de estranho nisso, porquanto a reforma dos

Estudos Menores era a base do Ensino Superior e o remate lógico da guerra

de extermínio contra os jesuítas.

A Companhia era poderosa e influente. E, se já não predominava tão

completamente no ensino como na política, conservava ainda uma situação

privilegiada em ambos os sectores quando Carvalho e Melo tomou as rédeas

do Poder. Parece, dizem, que os jesuítas tinham sabido sempre tão bem

coordenar as suas funções de ensino e de governo, que eles ensinavam para

Page 5: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

5

governar e governavam para poderem estender mais longe o seu ensino e,

portanto, a sua influência.

Porém, tudo se conjugava para Sebastião José, mediante os trunfos de

que dispunha, dar luta e levar de vencida os «filhos de Santo Inácio».

Empolava-se, ou considerava-se relevante, que os jesuítas se haviam

rebelado contra a soberania portuguesa no Sul do Brasil por via de uma

questão de delimitações contra as vizinhas colónias espanholas; o processo

como tinham interferido e explorado o terramoto, considerando tal calamidade

como um castigo de Deus por causa da dominação pombalina; a

responsabilidade que Pombal lhes atribuía na tentativa de regicídio. E mais: os

jesuítas haviam-se erguido contra as reformas pombalinas de carácter

económico a propósito da Companhia do Alto Douro, chegando o padre

Balester a afirmar do alto do púlpito que «quem tivesse relações com

semelhante Companhia não podia fazer parte da Companhia de Nosso Senhor

Jesus Cristo».

Essa luta contra a Ordem é testemunhada por violento requisitório onde

Carvalho e Melo, em colaboração com Seabra da Silva, no dizer de alguns

historiadores, revela uma espantosa sagacidade, espírito de sequência e

aptidão jurídica: sob o aspecto interno, Pombal trata o problema como se

tratasse de uma questão de ordem pública com a rapidez e a energia de que já

havia dado provas por ocasião do terramoto; sob o ponto de vista

internacional, a questão foi tratada directamente com Roma e com os

governos de Espanha e França, de tal maneira que, em 1759, pela Lei de 3 de

Setembro, foram os regulares da Companhia de Jesus “desnaturalizados,

proscritos e exterminados do Reino de Portugal, sendo os seus bens

confiscados para a Coroa».

Para chegar a tal desiderato, Carvalho lançou mão de todos os meios.

De alguma coisa havia de servir a prática e a astúcia diplomática adquiridas em

Viena de Áustria, para além de não desconhecer, certamente, que Luís António

Verney, em 1746, imprimira uma proposta radical de remodelação pedagógica

e de mentalidades, onde a Companhia de Jesus era a instituição mais visada e

indirectamente responsabilizada por toda a orientação ou estagnação do

ensino.

Considere-se, no entanto, que já antes da Lei de 3 de Setembro, a Junta

Page 6: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

6

de Inconfidência por alvará de 28 de Junho privara os jesuítas de exercerem o

ensino, sendo extintas as suas classes e lançadas as bases ou Instruções para

os novos Estudos de Gramática Latina, Grega, Hebraica e de Retórica; no

preâmbulo desse alvará, fazia-se uma rápida crítica da decadência em que se

achavam os estudos secundários sob a disciplina dos jesuítas.

Obviamente, não bastava expulsar os jesuítas das escolas. Era preciso

fundar um ensino médio, que não existia fora da Companhia, e criar receita

para pagar as despesas de um ensino que deixava de ser gratuito no que dizia

respeito aos mestres. É neste ponto que se iniciariam os esforços para a

reforma pedagógica que se impunha de um modo inadiável.

Assim, fechadas as escolas, era um rude golpe que Pombal vibrava na

Companhia, mas também era uma grave obrigação que contraía para com o

progresso científico do seu país e para com a civilização do seu tempo.

Sebastião de Carvalho viu bem a importância da questão, porquanto

não podia, nem devia, mandar fechar os colégios dos jesuítas sem que,

imediatamente, providenciasse para que outros fossem abertos, de modo a

não criar um vazio quase total no campo das actividades pedagógicas. Foi

esse, de facto, o objectivo do célebre Alvará de 28 de Junho de 1759.

A este propósito, deve levar-se em conta que o facto de Carvalho e

Melo ter retirado o ensino da tutela da Companhia de Jesus não impediu qua a

Igreja continuasse a dominar superiormente o ensino, porquanto as

autoridades pedagógicas, ao mais alto nível, eram, em grande parte

eclesiásticas, como o Director-Geral dos Estudos, a chefia e os deputados da

Real Mesa Censória, o novo Reitor da Universidade, D. Francisco de Lemos,

Bispo de Coimbra e membro da Junta de Providência Literária, bem como

outros membros dela, caso de Frei Manuel do Cenáculo. Muitos professores

de Latim da nova ordem eram sacerdotes, e as várias ordens religiosas como

a dos Oratorianos colaboraram com os seus mestres nas reformas do ensino.

Só que, muito provavelmente, alguns, indo contra as suas próprias ideias, ou

parte delas, viam-se obrigados a “ler” pela “cartilha” do omnipotente ministro,

caso contrário eram considerados “cartas” fora do “baralho” e, não raramente,

sofrendo penas bem gravosas. Significativo: inicialmente, o futuro Marquês de

Pombal privilegiou a Congregação do Oratório, cujos compêndios foram em

Page 7: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

7

grande parte aprovados para os novos estudos. Porém, mais tarde, em 1768,

1769, «também os oratorianos foram proibidos de ensinar, sob pretexto de

“inconfidência” (crime de lesa majestade) e de ensinarem doutrinas perniciosas

à mocidade e de adesão ao Bispo de Coimbra, D. Frei Miguel da Anunciação.

Tudo se resumia, de facto, a não aceitarem as doutrinas jansenistas, regalistas

e antipapais que o Marquês queria impor». (3)

A reforma pombalina dos Estudos Menores apontava para uma área

bem alargada, tinha uma amplitude nacional. Era seu objectivo nomear

professores de primeiras letras para todas as cidades e vilas, além de mestres

de Gramática Latina e de Grego, assim como de Retórica e de Filosofia, nos

principais centros urbanos.

A base da reforma consistia na secularização da instrução nacional

dirigida pelo governo do rei, na pessoa de um seu delegado imediato, o qual

teria a função de averiguar com exactidão o processo dos Estudos,

apresentando ao Monarca, no termo de cada ano, uma relação fiel do estado

dos referidos Estudos, a fim de erradicar os abusos que se fossem instalando,

ao mesmo tempo que lhe propunha as soluções tidas como mais indicadas

para a inovação e progresso das Escolas.

Para além da inspecção e escolha do corpo docente por meio de

concurso, competia-lhe também evitar controvérsias entre os professores,

provenientes da contrariedade de opinião, e manter uma perfeita paz e

uniformidade de doutrina, de modo que todos contribuam para o progresso da

sua profissão e aproveitamento dos seus direitos.

A instauração do ensino oficial, dirigido exclusivamente pelo Governo,

pretendia ainda impor «um tipo de pedagogia normativo, inflexível, que se

julgava superior ao dos jesuítas e conforme às correntes em vigor nas escolas

da Europa, esperando-se, por meio dele, obter a formação intelectual e moral

da juventude da Nação». (4)

O mesmo alvará que privava os jesuítas do exercício do magistério,

criava a Directoria – Geral dos Estudos e, por Carta Régia de 6 de Junho de

1759, era nomeado D. Tomás de Almeida director-geral, pelo período de três

anos, para pôr em execução as disposições da reforma ordenada pelo já citado

diploma de 28 de Junho.

É inegável o alcance progressista das referidas determinações, porém,

Page 8: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

8

só o eram em teoria, porquanto na prática toda a actividade nacional estava

exclusivamente na dependência do ministro de D. José. Conclusão: ao Director

dos Estudos competia apenas zelar e impedir que alguém minimamente se

desviasse das normas impostas pela autoridade do ministro.

Apesar de confrontado com algumas dificuldades o plano pombalino lá

se vai efectivando, e quando da sua regulamentação em 1772, pode dizer-se

que o que se fez em matéria de Estudos Menores, ainda que insuficiente, é

bem superior ao que se fazia sob o regime tradicional.

Num despacho de 3 de Novembro de 1759, do ministro português em

Viena, e que se guarda no Arquivo da Embaixada, acha-se o seguinte e

lisonjeiro testemunho da reputação que se espalhara de Pombal e das suas

reformas nos domínios da instrução pública: «The new method for the Latin

and Greek classes established in Portugal has been approved ofhere; and

the President of the Aulic Council has expressed his desire to see the same

method applied in the empire». (5)

Entretanto o primeiro-ministro não era indiferente, nem fazia ouvidos de

mercador, à voz experiente de Ribeiro Sanches, Verney, D. Frei Manuel do

Cenáculo e do próprio D. Francisco de Lemos, que haviam sugerido ou

propunham com insistência a necessidade de reformar os estudos

portugueses na Universidade de Coimbra, não se cansando de clamar para a

necessidade de dar ao país uma fisionomia diferente perante o atraso cientifico

e cultural em que se encontrava.

Com efeito, lançadas as bases e criadas as condições e as estruturas

para uma renovação dos Estudos Menores, impunha-se a reforma do Ensino

Superior.

A Reforma Pombalina da Universidade data de 1772, porém, o

poderoso ministro trazia-a em mente há muitos anos.

Refira-se que, já na altura da fundação do Colégio dos Nobres, o então

Conde de Oeiras, se preocupava com a reforma da Universidade.

Essa preocupação e intenção ressaltam numa passagem de carta

datada de 12 de Março de 1761, dirigida a Iacopo Facciolati, professor da

Universidade de Pádua, em que Carvalho e Melo pede que lhe envie, além de

uma História da Universidade de Pádua de que ele, Facciolati, foi autor, os

Estatutos dessa mesma Universidade, pois tem intenção, diz – reformar a de

Page 9: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

9

Coimbra. Declara também receber com muito agrado qualquer sugestão de

Facciolati a respeito da futura reforma».

A Junta de Providência Literária. O Compêndio Histórico.

Com a instituição da Junta de Providência Literária por Carta Régia de

23 de Dezembro de 1770, iniciava-se o processo que iria levar, a curto prazo,

os estudos universitários à reforma pombalina de 1772.

Sob a inspecção de Pombal e do Cardeal da Cunha, a Junta integrava

como conselheiros D. Frei Manuel do Cenáculo Vilas Boas, Bispo de Beja.

José Ricalde Pereira de Castro, José de Seabra da Silva, Francisco António

Marques Geraldes, Francisco de Lemos de Faria, Reitor da Universidade e

Bispo de Coimbra, Manuel Pereira da Silva e João Pereira Ramos de Azevedo

Coutinho.

Por determinação de D. José, competia à Junta de Providência Literária

examinar as causas da profunda e deplorável decadência da Universidade «e

o presente estado da sua ruína; para em tudo prover de sorte, que não só se

repare um tão deplorável estrago, mas também sejam as Escolas públicas

reedificadas sobre fundamentos tão sólidos, que as Artes, e Ciências possam

nelas resplandecer com as luzes mais claras em comum benefício». (6)

Depois de examinar com todo o rigor o «status quo» universitário, devia

a Junta ponderar sobre soluções a adoptar, cursos e métodos a estabelecer,

apresentando ao Rei um plano sistemático de reforma.

Passados que foram alguns meses da sua instituição, a Junta dava “à

luz” no Sítio de Nossa Senhora da Ajuda a 28 de Agosto de 1771, em “parto”

prematuro, o «Compêndio Histórico do estado da universidade de Coimbra no

tempo da invasão dos denominados Jesuítas e dos estragos feitos nas ciên-

cias e nos professores e – directores que a regiam pelas maquinações e

publicação dos novos Estatutos por eles fabricados».

É este o título oficial do célebre Compêndio Histórico, em que a Junta

de Providência Literária fundamenta por provas históricas a decadência da

Universidade de Coimbra desde o ano de 1555, e propõem os novos métodos

pedagógicos que deverão ser determinados pelos Estatutos.

Não cabe aqui a intenção de pretender fazer um balanço exaustivo à

reforma universitária pombalina, nem tão pouco ajuizar sobre o Compêndio

Page 10: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

10

Histórico mas... o título revela, só por si, um verdadeiro libelo antijesuítico (mas

não anticatólico) que não pode, nem deve ser escamoteado.

No entanto, parece inegável a idoneidade dos elementos que integravam

a Junta de Providência Literária; eram todos “filhos” da Universidade,

conhecendo, por conseguinte, os defeitos e virtudes de sua “mãe” e, «por mais

pombalistas que fossem, não deixavam de ser pessoas de ampla competência

e isenção». (7)

Esta mesma opinião já não é adoptada por catedráticos como Lopes de

Almeida e Mário Brandão, os quais consideram que a Junta não agiu com

sinceridade e independência de espírito, uma vez que os seus elementos

«obedeceram à voz inspiradora da campanha contra a Companhia, de que

Pombal dera o tom empolado e por vezes ridículo na Dedução Chronologica».

E mais: que «alguns executores da vontade tenaz do Marquês de Pombal con-

fessaram a violência e procuraram moderá-la, porém na comissão de reforma

parecia que trabalhavam de acordo, ao menos no que dizia respeito à sua

finalidade». (8)

De facto, à partida, é evidente o empenho da Junta de Providência

Literária em demonstrar e acumular provas contra a Companhia de Jesus,

responsabilizando-a pelo monopólio ou orientação do ensino e pela sua

influência nos estatutos vigentes.

Saliente-se, e com toda a legitimidade, a abalizada opinião do Prof.

Hernâni Cidade que, no Compêndio Histórico, para além de «um sectarismo

violento refervendo na linguagem e turbando o juízo crítico», consegue ver-se

que o livro não tem apenas carácter destrutivo. Assim, «ao lado da doutrina

que considera «venenosa», expõe a que inculca verdadeira e, ao lado do

método ou autor repelido, o método ou autor que é preciso seguir». (9)

De facto, é com toda uma copiosa documentação, clara e frequente

visão crítica e uma completa informação de todos os progressos da ciência do

tempo, que a Junta fundamenta o seu libelo contra o ensino imobilizado e

imobilizante atribuído à «invasão dos denominados jesuítas».

Page 11: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

11

Decadência das universidades no séc. XVIII.

Não era só a nossa Universidade que se encontrava na mais lastimável

decadência, o mesmo sucedia às Universidades de países mais civilizados

como a França e a Inglaterra. Quanto às espanholas «nem é bom falar, por tal

forma a decadência dos estudos e o obscurantismo dos professores

desafiavam as censuras dos críticos – como Saavedra Fajardo, na República

Literária – e a veia cómica dos autores de sainetes». (10) O mesmo acontecia

às Universidades Italianas, como afirma Ribeiro Sanches.

De facto, convém dizer que, no séc. XVIII, as Universidades europeias

clássicas estavam em nítido processo de decadência, acontecendo que, em

quase todas, o ensino superior processa-se ainda segundo o modelo e a

tradição medieval e sem qualquer abertura ao avanço da ciência. As

Universidades continuavam e continuaram sem grande renovação.

Efectivamente, fora das Universidades, a ciência seguia um processo de

renovação, abandonando os trilhos do metafisicismo e deixando cada vez

mais de ser verbal para se tornar progressivamente experimental; as ciências

biológicas passam da sua fase descrita para um estado analítico que virá,

mais tarde, condicionar as grandes sínteses de Darwin e Lamarck.

Tais avanços não tinham reflexos dentro das Universidades, porquanto,

estas continuavam fechadas ciosamente a essas inovações, verificando-se um

divórcio completo entre o estado da ciência – cada vez mais progressiva e

liberta de todos os preconceitos, e a situação do ensino rotineiro, obsoleto,

imobilizado no escolaticismo e tão submisso ao dogmatismo religioso como ao

autoritarismo docente.

Acerca do estado interno das Universidades francesas, sob o antigo

regime, atente-se na magistral descrição de Luiz Liard, na História do Ensino

Superior em França de 1789 a 1889: «raras têm bibliotecas; mais raras são

ainda as colecções científicas. A Universidade de Medicina de Montpellier não

tem gabinete de anatomia; não tem biblioteca; os seus estudantes estavam

reduzidos a alugar aos bedeis os livros necessários para o seu estudo. Custa

a crer que o exemplar do «Corpus Júris Civilis», comprado em 1789 pelo

professor de Bordéus, formava toda a livraria...» No seu documentadíssimo

estudo, Liard, conclui: «o antigo regime não teve uma verdadeira noção do

Page 12: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

12

ensino superior; nestas Universidades de dois andares, em nenhuma delas

existia um alto ensino das letras, das ciências, do direito e da medicina; a

Faculdade de Artes não dava mais do que uma instituição preparatória, e as

Faculdades superiores, sobretudo o Direito e a Medicina, obedeciam a vistas

estritamente pessoais».

A situação das Universidades inglesas no séc. XVIII continuava ainda o

espírito do dogmatismo medieval. Referindo-se a este regime pedagógico,

escreve Renan: «Não se pode dizer que em Inglaterra um tal regime

produzisse resultados de primeira ordem. Oxford e Cambridge tiveram nos

séculos XVII e XVIII homens eminentes, mas não foram o teatro de nenhum

grande movimento. Estas velhas instituições acabaram por se adormecerem

em uma rotina, em uma ignorância, em um grande esquecimento dos grandes

interesses do espírito, que se julgariam incuráveis se a Inglaterra não

possuísse nas suas liberdades, no acordar e na actividade dos indivíduos o

remédio para todos os males». (11)

O quadro universitário espanhol era representado por Saavedra

Fajardo, na “República Literária”, nos traços comuns em que se satirizava as

Universidades europeias: «Era mais a presunção do que a ciência; era mais o

que se duvidava do que o que se aprendia; o tempo, e não o saber, dava os

graus de bacharéis, licenciados e doutores, e às vezes unicamente o dinheiro,

concedendo em pergaminhos magníficos, com pendentes de fios, faculdade à

ignorância para poder explicar os livros e ensinar as ciências e achar-se em

um destes graus».

Não deixa de ser bem caracterizada esta esterilidade do ensino, que

cimentava o pedantismo doutoral, embaraçando o desenvolvimento das

ciências experimentais independentes das demonstrações silogísticas.

Apenas as Universidades alemãs, nomeadamente Jena e Gottingen,

parece terem escapado a esta fase de decadência e imobilismo o que se

poderá explicar pela liberdade de exposição e de crítica concedida aos

professores, e que eram, sem dúvida, reflexos da liberdade religiosa, não

esquecendo que a existência de professores livres – os «privat docenten» - em

muito contribuiu para o alto nível no ensino superior alemão.

Page 13: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

13

A Universidade portuguesa.

Se bem que houvessem sido diversas as reformas por que passou a

nossa Universidade através dos séculos XVI, XVII e nos três primeiros quartéis

do séc. XVIII, o que é certo é que com elas nada ganhou o ensino.

Como diz D. Francisco de Lemos na “Relação Geral do Estado da

Universidade de Coimbra”, «todas as reformas que a

este tempo se fizeram limitaram-se à interpretação,

declaração, revogação e extensão de alguns Estatutos

antigos, e poucas foram as providências que de novo

se acrescentaram a benefício das Letras». Os últimos

Estatutos (1654) estavam totalmente desajustados em

relação às actuais circunstâncias e ao progresso

verificado nos diversos ramos do saber.

Efectivamente, a Universidade era uma

instituição muito mais teocrática que pedagógica, e muito mais destinada à

defesa da intangibilidade dos dogmas que a cuidar dos progressos do ensino.

O espírito crítico e investigador e, por conseguinte, os métodos do

experimentalismo estavam excluídos por definição, sendo toda a vida

intelectual, no que toca ao mundo físico, reduzida a comentários: «Comentar

livros da Antiguidade, sensibilizar, recomentar, era um sonho de subtilezas

formais, um jogo verbal de ilusões aéreas». (12)

A crise em que a Universidade mergulhara havia bastante tempo não

podia deixar de pôr em confronto o poder civil e o poder eclesiástico, O choque

era inevitável, uma vez que o domínio do ensino estava entregue, na sua

quase totalidade, a instituições religiosas nomeadamente aos jesuítas, que se

inspiravam numa prática pedagógica tradicionalista e retrógrada.

Em jeito de parêntesis, refira-se que o Padre Francisco Rodrigues no

tomo III do vol. I da sua “História da Companhia de Jesus na Assistência de

Portugal”, afirma que «A Companhia de Jesus em Portugal encheu todo o

século XVII». De facto, a afirmação não deixa de ser correcta, porquanto, sem

dúvida, a Companhia conseguiu assumir papel de tal modo relevante na vida

nacional, ensino, política e missionação (aquém e além mar), que é lícita a

afirmação citada, de ter “enchido” o nosso século XVII.

Porém, não pode contestar-se que os padres da Companhia de Jesus,

Page 14: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

14

sistematicamente estacionários ou, se se quiser, nas coisas das ciências

tiveram larga parte na decadência dos estudos. Mas... não deve ser-lhes

imputada toda a culpa.

Não será, de certo modo, muito justo afirmar-se que «desde o ano de mil

quinhentos e noventa e oito até agora que governaram a dita Universidade, não

há cousa alguma, que se possa aproveitar para objecto da reforma. Muito pelo

contrário se contém neles (Sextos e Sétimos Estatutos) um doloso sistema de

ignorância artificial, e de impossibilidade para se aprenderem as mesmas

Ciências que se fingiu, quererem-se ensinar». E também parece algo

exagerado considerar o labor da Companhia como uma oficina perniciosa,

cujas máquinas ficaram desde então sinistramente laborando para obstruírem

todas as luzes naturais dos felizes engenhos portugueses». (13)

Não deixa de ser legítima a análise do Prof. J. Veríssimo Serrão, ao

afirmar que a responsabilidade dos inacianos no campo de ensino tinha os

limites próprios da sua actuação, não sendo tão profunda nem intensa, «pois

dela partilhavam todos os sectores da Universidade, afectando por igual os

ensinos não confiados à Companhia de Jesus, como a Jurisprudência e a

Medicina. Se não se desenvolvera o ensino da ciência experimental, isso não

se fizera por malícia, para impedir o aproveitamento dos alunos, mas apenas

porque a reforma da Universidade devia ter-se obrado no tempo próprio, ou

seja, no início do Séc. XVIII». (14)

Que os jesuítas tiveram as suas culpas na decadência dos estudos, é

um dado adquirido. Cabe-lhes entre outras coisas a mais completa

responsabilidade «pela obstinada relutância com que mantiveram nos Cursos

de Artes os Comentários do Colégio Conimbricense, excluindo do ensino as

recentes descobertas, que engrandeciam as ciências de observação e a

Filosofia Racional. Acoimá-los, porém, de prejudiciais no ensino das ciências

universitárias, que não ensinaram, atribuir-lhes influência nociva na coordena-

ção dos estatutos velhos, que são pouco mais do que a recopiação de leis,

praxes e costumes estabelecidos no decurso de um século, é injustiça

manifesta, que o juízo imparcial da História como tal reconhece». (15)

Obviamente que, os redactores do “Compêndio Histórico”, como

pessoas de absoluta dedicação a Pombal, lisonjear-lhe-iam, naturalmente, a

sua “jesuitofobia”, atribuindo toda a decadência das ciências e mesmo da

Page 15: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

15

Medicina à Companhia de Jesus, exagerando e prejudicando a seriedade do

seu exame, porquanto, bastava notar que noutras universidades, onde os

jesuítas nunca dominaram, a decadência pedagógica era igualmente profunda

e apresentava as mesmas características.

Na verdade, outros elementos terão concorrido para que, entre os

séculos XVII e XVIII, o ensino universitário estivesse totalmente desajustado

em relação às actuais circunstâncias e ao progresso verificado nos diversos

ramos do saber.

Creio não dever ser omitido o terror, a intolerância e a desumana

perseguição do Tribunal do Santo Ofício; o reinado de monarcas como D. João

III (desde que se deixou avassalar pelas sugestões do fanatismo), D.

Sebastião e o Cardeal-Rei; a perda da nacionalidade e o domínio filipino

durante seis décadas. E, ainda, os cuidados e esforços para sustentar a

independência recuperada em 1640, que absorviam toda a vitalidade da

Nação. Ora, tudo isto foi parte para que os estudos caíssem no lastimoso

abatimento a que chegaram.

Se se considerar serenamente – diz o Professor Hernâni Cidade –

parece não dever aceitar-se que os jesuítas houvessem «cavilosamente

arruinado» a ciência e, menos ainda, tentado tornar irreligiosa a Nação – eles

que foram expoentes máximos na obra de cristianização do Ultramar e que

«só pelo receio da heterodoxia punham entraves ao processo científico. Mas

temos o direito de afirmar que se não fora a reacção que os venceu,

continuaríamos, e não se sabe até quando, merecendo, pelo anacronismo da

nossa cultura, o rótulo de Índios da Europa». (16)

Para Teófilo Braga a causa de uma tão longa apatia não pode ser

atribuída exclusivamente a factores externos: «incorporação de Portugal na

monarquia espanhola, a absorção dos jesuítas quer pelas imposições

pedagógicas ou pelas usurpações económicas, nem ainda pela constante

intervenção reaccionária do governo absoluto; na essência do próprio

estabelecimento, o espírito conservantista pode manter uma severa disciplina

escolar e sustentar as ciências e os seus métodos na altura em que foram di-

vulgados, mas evitará sempre as inovações doutrinárias como atentatórias da

autoridade académica. Tal é a razão por que as universidades se atrasam e

Page 16: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

16

ficam alheias à corrente intelectual; deu-se isto com a de Paris, com a de

Salamanca, e em geral com as dos países meridionais». (17)

A cegueira e o ódio visceral de Carvalho e Melo em relação aos jesuítas

estariam na base das perseguições aos “inacianos”, porquanto, em qualquer

tempo, uma apreciação serena dos factos tornam “despropositadas e

carregadas de exagero” as invectivas antijesuíticas, atribuindo-lhes a total

responsabilidade no que dizia respeito ao estado em que se encontrava o

ensino.

E mais, tal campanha, parece, igualmente, ter pretendido esquecer ou

diminuir o labor da Companhia no Colégio das Artes e de Jesus, bem como

uma acção incomparável de heróis, mártires e santos, levada a cabo em

territórios desconhecidos, e nas mais difíceis condições, tais como o Brasil, a

África e o Oriente.

Hoje, julgo, já ninguém de boa fé, ou espírito isento, considerará a

Companhia de Jesus como a única causa, ou também a principal causa, da

decadência do ensino em Portugal quando Sebastião José de Carvalho e Melo

tomou conta do Poder absoluto.

Os “Estrangeirados”.

Não obstante alguns esforços de D. João V no sentido de iniciar a

batalha para nos fazer reentrar na Europa culta, o meio cultural pouco

melhorou, não se tendo conseguido emancipar do ambiente tradicional, ainda

que algumas ressonâncias das correntes de além-Pirenéus se fizessem sentir

vagamente em Portugal.

As críticas ao retardamento português eram provenientes de

observadores estrangeiros ou de portugueses residentes, há muito, noutros

países e que, por essa razão, estavam bem posicionados em termos de uma

perspectiva crítica da realidade nacional.

Alguns desses observadores eram diplomatas, outros cristãos-novos

expatriados por via da repressão inquisitorial.

As perseguições da Santa Inquisição espantavam de cá o melhor da

“intelligentzia” portuguesa, e esses emigrados foram, assim, constituindo,

Page 17: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

17

pouco a pouco, a plêiade que muito contribuiu para, como diz António Sérgio,

«iluminar, na 2ª metade do Séc. XVIII, a nossa noite intelectual».

Embora só através do “crivo” de uma bem organizada vigilância

chegassem a Portugal breves notícias do que se passava pela Europa, muitos

portugueses cultos eram receptivos e aspiravam a um novo estilo de vida:

eram os «estrangeirados».

A divulgação e influência das suas ideias circunscrevia-se a uma área

muito limitada, a uma elite, visto que o seu reformismo era geralmente exposto

em epistolários que, pelo menos há poucos anos, permaneciam ainda

parcialmente inéditos (D. Luís da Cunha, José da Cunha Brochado, etc.).

As sementes de reforma e renovação, já visíveis nos finais do reinado

de D. João V, mas sufocadas pelo tradicionalismo das escolas jesuítas e

bloqueadas pela «asa protectora» do Santo Ofício, viriam, porém, a sofrer o

impacto do iluminismo europeu e a influência mais directa e activa dos “es-

trangeirados”: «essas componentes, agindo em simultâneo, viriam a produzir

um notável efeito desbloqueador, mas só quando se deparassem novos

condicionalismos políticos, porque antes... Se

alguns apareciam a defender publicamente as

novas ideias – como Verney ou Ribeiro Sanches –

«quando desceram à arena da luta vinham quase

sempre com uma preocupação de imunidade,

garantida por um pseudónimo cauteloso ou

assegurada por uma distância de muitos

quilómetros. A grande massa do País manteve-se, porém, alheia a polémica –

em que nem sequer podia participar, pois era analfabeta. Nem poderia ter sido

de outro modo: nos países peninsulares, mais do que em qualquer outra nação

da Europa Ocidental, quase não houve limites para o domínio da Contra-

Reforma que, exercendo-se com uma acção "depuradora" nos veículos da

Cultura, e dominando totalmente ou quase a orgânica do ensino público, fizera

estagnar e até retroceder o movimento de progresso que se pressentira

prestes a surgir na primeira metade do Séc. XVI». (18)

De qualquer modo, pode dizer-se que toda a política governativa de

Carvalho e Melo na área do ensino veio, de forma determinante, a inserir-se

nas «Novas ideias» que esses intelectuais «estrangeirados» como Verney,

Page 18: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

18

Luís da Cunha, Ribeiro Sanches e outros tinham empreendido durante meio

século, não se cansando de propalar a urgente necessidade de transmitir ao

País uma fisionomia diferente, libertando-o da decadência científica e cultural

em que se encontrava.

Depois da reforma levada a cabo por D. João III, em 1537, iria verificar-

se, 250 anos depois, uma remodelação total na velha escola de Coimbra, já

que o espírito renascentista que inspirara a orgânica universitária do séc. XVI

não se tinha ajustado aos ideais que o progresso científico e filosófico criara.

Como diz o Prof. Borges de Macedo, os portugueses não eram

totalmente ignorantes nas ciências exactas, «mas o que se sabia estava

sobretudo circunscrito a curiosidades individuais ou a necessidades imediatas.

Não havia a esse respeito qualquer instituição, seja de ensino seja de registo

ou debate (uma Academia por exemplo), onde se realizasse e pudesse

empreender uma actividade sistemática. Sabia-se ser urgente a reforma da

Universidade de Coimbra para que esta pudesse dispor dos meios de cultivar

as ciências exactas e da Natureza e abordar as novas questões da Filosofia. O

Marquês de Pombal estimulou uma reforma universitária, e fê-la no sentido de

transformar os estudos segundo as correntes de pensamento jurídico e os

novos métodos ligados ao Direito Natural e ao Direito Público e das Gentes. A

mudança era profunda quanto aos princípios orientadores e teve influência

decisiva na mentalidade dos quadros de que o País passou a dispor». (19)

O espírito da reforma universitária era já uma realidade, sentindo-se que

se tomava urgente reformular totalmente todo o processo de ensino, pondo em

prática novos métodos, adoptar livros actualizados e imbuídos de uma

mentalidade renovadora

Reforma universitária

A traços largos, já que no caso presente apenas se trata de colocar as

quatro Faculdades tradicionais ao nível das suas congéneres europeias em

todos os aspectos, vejamos o que foi essa profunda e eficaz reforma.

Acrescente-se, também que as ciências humanas e experimentais foram

devidamente tidas em conta, baseando-se os Estatutos em autores célebres,

como Pufendorf, Boerhaave e outros.

Page 19: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

19

Mantinha-se a Faculdade de Teologia, como convinha num país

eminentemente católico, e cujo programa, definindo um novo espírito, fora

elaborado por D. Frei Manuel do Cenáculo e pelo Padre Pereira de Figueiredo.

Anteriormente às reformas pombalinas, e segundo D. Francisco de

Lemos, o estado do ensino da Teologia era o seguinte: «Basta dizer-se que do

século passado para cá até ao princípio do reinado do Senhor Rei D. José... a

Teologia que se ensinou nas Escolas Conimbricenses foi a Teologia

Escolástica: Teologia que, tendo sido aliada no século XII com a venenosa

filosofia de Aristóteles, alterada pelas Explicações e Comentários dos Árabes,

se foi pouco a pouco corrompendo até formar um Corpo de Questões, que

nunca se tinham ouvido na Igreja, e totalmente inúteis para os fins do

Ministério Sagrado». (20)

Os métodos aplicados eram obsoletos, sem qualquer inovação e cria-

tividade, sobrepondo-se a autoridade dos autores e dos mestres ao papel da

crítica e da análise objectiva do texto. A remodelação dos estudos teológicos

apontava agora para um ensino de carácter menos especulativo e escolástico

e mais baseado nos conhecimentos da História Sagrada e Eclesiástica, na

crítica e na interpretação dos textos gregos e latinos, procurando fazer-se a

análise exegética do texto bíblico «visto directamente» à luz conjugada da

História e da Filologia. Só assim, dizia, D. Francisco de Lemos, Bispo de

Coimbra e Reitor da Universidade, se poderiam formar bons teólogos.

As Faculdades Jurídicas constituíam dois cursos: de Direito Civil e de

Direito Canónico. O ensino de Direito Canónico limitava-se à estéril lição das

Decretais, do Decreto e das Clementinas. Não se ensinava a História Sagrada,

a História Eclesiástica, o Direito Público Eclesiástico, o Natural e o das Gentes.

Conservava-se a Faculdade de Cânones com o fim de regular e estudar

fundamentalmente as normas jurídicas, apresentadas ou aprovadas pelas

autoridades eclesiásticas, delimitando e definindo a competência da Igreja.

Quanto à Faculdade de Leis, passavam-se cinco anos na «ruminação

estupefaciente» do “Digesto”, das” Institutas” e do” Código”.

Sobre o que se passava a nível da jurisprudência conimbricense vale a

pena transcrever parte de um elucidativo relato de D. Francisco de Lemos:

«Todo o exercício literário se reduzia aos Actos, para os quais não era

Page 20: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

20

necessário ter estudado, mas sim que corressem os anos do Curso e

chegasse a medida do tempo nele marcado, porque os Pontos e os

Argumentos eram já sabidos e muito vulgares; e além disso o estudante na

mesma ocasião dos Actos era instruído na matéria deles por um Doutor, o qual

acabava de consumar a obra da negligência, inspirando-lhe em casa e na

mesma Sala dos Actos, o que ele havia de responder e dizer».

A grande inovação introduzida consistiu numa maior atenção às fontes

jurídicas verdadeiramente portuguesas, onde, além das várias Ordenações,

havia também as leis extravagantes dos últimos reis de Aviz, os comentários

às Ordenações, outros diplomas avulsos, processos julgados, etc.

O Direito Civil, conforme diziam os estatutos (Tit. Cap. 3), seria «ou o

Romano ou o Pátrio, contido nas leis do reino. Dos dois direitos, este é o

superior quanto a poder de autoridade; vale como lei; obriga, à falta de

disposição específica e em todos os casos onde encontre lance. Quanto ao

Romano, esse, é tão só, subsidiário; tem apenas validade como suplemento

do Direito Pátrio; somente alcança força legislativa e autoridade aí onde as leis

nacionais não cheguem e não chegue outrossim aquele natural jus fundado

sobre a boa razão que lhe serve de única base». (21)

As Faculdades de Cânones e Leis acabaram por se fundir conforme

decreto de Passos Manuel, datado de 1836.

Notável é a reforma da Faculdade de Medicina, devida em grande parte

à colaboração do médico Sacchetti Barbosa e à influência de Ribeiro Sanches.

O ensino aqui era puramente livresco, seguia-se

Galeno e outros autores que por essa Europa fora já

não contavam, e os mestres preocupavam-se mais

na utilidade particular de curar do que na pública de

ensinar. Ordenavam os Estatutos que se ensinasse

a anatomia e se fizessem demonstrações, e se

aprendesse a prática da Medicina no hospital, porém

«todas estas disposições se iludiam de um modo perfunctório (supérfluo) e

inútil».

No «Reino Cadaveroso», ou no «Reino da Estupidez» como já alguém

chamou ao Portugal setecentista, a anatomia e toda a espécie de ensino

prático aparecem, embora de forma caricatural, do modo seguinte:

Page 21: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

21

«Há coisa mais cruel, mais desumana,

Mais contrária à razão, que ver os médicos

Um cadáver humano espatifando,

Um corpo que habitou o Espírito Santo?

Nunca tal praticaste, ó bom Lopes,

Quando pelo Natal em um carneiro

O bofe, o coração, as tripas todas

A teus hábeis discípulos mostravas!...». (22)

Diz Hernâni Cidade que não era, de facto, um carneiro pelo Natal, mas

nove carneiros por ano as vítimas sacrificadas à anatomia.

Efectivamente, a anatomia humana era ensinada através da dissecação

de carneiros, o que representava um retrocesso em relação aos Estatutos de

1559, pois estes já previam a anatomia sobre cadáveres fornecidos pelo

hospital. A dissecação de cadáveres humanos havia sido abolida por via de

preconceitos religiosos.

Desconhecia-se, ou pouco menos, a Medicina no Norte Europeu, sob o

impulso de Boerhave, Haller, etc., por parte do ensino universitário, pois fora

dele, médicos como Gomes Lourenço, Sacchetti Barbosa, em convivência

espiritual com os mestres estrangeiros de Anatomia e Cirurgia do Hospital de

Todos-os-Santos, com Castro Sarmento e Ribeiro Sanches mostram-se

suficientemente informados.

Considera o Prof. João Pedro Miller Guerra que «as providências

reformadoras, modernizando o curso universitário e colocando-o a par do que

se professava nos centros europeus adiantados, efectuaram a modificação

mais profunda e ampla da história da Medicina. Apesar de controvérsias que

gerou e das limitações que sofreu na aplicação, a reforma pombalina revigorou

os estudos médicos, dando-lhes um impulso tão enérgico e certeiro que

perdurou até à República, embora com retoques e acrescentamentos, mas

também com modificações nocivas». (23)

Todavia, a maior inovação da reforma universitária consistiu na

fundação das faculdades de Matemática e Filosofia, colaborando na

organização da primeira os italianos Franzini e Vandelli, e na segunda o seu

companheiro Ciera e o ex-jesuíta José Monteiro da Rocha.

Page 22: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

22

Pretende Garção Stockler que de todas as instituições de El-Rei D. José

a Faculdade de Matemática «é talvez a que mais honra faz à sua memória, e é

sem dúvida uma daquelas pelas quais a nação portuguesa lhe deve tributar

eternamente os mais vivos sinais de sincero reconhecimento». (24)

Até aos meados do Séc. XVIII eram rudimentares os conhecimentos de

ciências matemáticas na Universidade, depois de passarem os tempos áureos

de Pedro Nunes.

Pombal, reconhecendo que na Universidade havia Matemática a menos e no

Colégio dos Nobres Matemática a mais, transferiu de Lisboa para Coimbra

vários professores, montando nesta cidade um Observatório Astronómico e

estabelecendo o ensino da Astronomia, da Mecânica e da Arquitectura.

Os abalizados matemáticos portugueses José Monteiro da Rocha e

José Anastácio da Cunha foram escolhidos para constituírem a faculdade

recentemente instituída, bem como o piemontês Michele António Ciera e o ve-

neziano Michele Franzini.

Conforme se lê nos Estatutos a Faculdade de Matemática foi

incorporada na Universidade como qualquer das outras faculdades que até

então se distinguiam com o nome de maiores, nascendo, deste modo, dentro

da orgânica universitária, uma nova Faculdade Maior com o seu próprio corpo

de lentes, substitutos, opositores, ascensão ao grau de doutores, insígnias de

categoria doutoral (borla e capelo de cor azul) e todos os demais privilégios e

honras até então exclusivos daquelas quatro faculdades» (Teologia, Cânones,

Leis e Medicina.

Finalmente era abolida, como «sistema incorrigível», a Faculdade de

Artes, a qual estava tão longe de cumprir com o seu objectivo seu que se

volvera em fonte e manancial venenoso de um palavreado obscuro e sofístico,

contaminando todos os ramos da instrução pública.

Com a reforma de 1772, criava-se a Faculdade de Filosofia, destinada a

substituir o antigo Curso das Artes até então ministrado no respectivo Colégio,

mas enquadrado entre os Estudos Menores, pretendendo-se uma Filosofia que

descesse da altura dos Universais e procurasse estudar o homem moral e o

mundo moral com que está relacionado, o homem físico no mundo físico de

que faz parte.

A propósito do referido curso “artístico” diga-se que, durante a estadia

Page 23: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

23

do Marquês em Coimbra, o Colégio das Artes foi incorporado na Universidade,

o que correspondia a um desejo formulado numa das sessões da Junta de

Providência Literária, por via das escolas menores poderem fornecer

estudantes à Universidade. Assim, a “Alma Mater”voltava a satisfação de ter

novamente integrada no corpo académico uma instituição pela qual lutara

desde que lhe fora retirada pela Companhia de Jesus.

Porém não bastava promulgar a Reforma. A nova organização

universitária exigia cuidados especiais. Tratava-se primeiro que tudo de reunir

um grupo de homens, cada um deles com uma cultura profunda e sólida sobre

os assuntos que lhe respeitava. Considere-se que era tarefa extremamente

difícil e delicada elaborar uma longa lista de todos os professores que

deveriam ser afastados da Universidade por meio de jubilação e daqueles que

pelos merecimentos e aptidões eram garantia segura para a eficácia da

Reforma. É que a Reforma não viria verdadeiramente a sê-lo se, além das

intenções e dos métodos novos, o pessoal recrutado não se integrasse,

abertamente, no seu espírito

Assim, por despachos de 3, 11, 12 e 28 de Setembro de 1772 eram

jubilados os antigos lentes da Universidade que nenhuma garantia ofereciam

de poder compreender e executar os novos Estatutos completamente, isto é,

tanto no seu espírito como na sua letra.

Este processo de escolha não deu origem a queixas, visto que pelo

regime governativo seriam julgadas como crimes de lesa-majestade, além de

que também não eram roubados os direitos de cada um, porquanto os antigos

lentes «foram jubilados, outros investidos em conesias magistrais ou doutorais

nas sés do Reino, outros, enfim, providos como lentes efectivos e substitutos.

Houve, na verdade, uma renovação do corpo professoral, com o ingresso de

figuras que pela investigação e pela docência viriam a honrar a Universidade

de Coimbra». (25)

O Marquês de Pombal em Coimbra. Entrega e publicação dos Estatutos.

Justamente passado que foi um ano da apresentação do “Compêndio

Histórico”, D. José, por Carta de Roboração datada de 28 de Agosto de 1772,

promulgava a carta orgânica da Universidade, os Novos Estatutos. Igualmente,

Page 24: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

24

em resolução régia de 25 de Setembro, mandava suspender a antiga

legislação académica, e que não se procedesse à «abertura, juramento e

matrículas…até nova ordem de Sua Majestade.».

A esta data já Carvalho e Melo se encontrava em Coimbra havia três

dias. Efectivamente, no mesmo dia em que são

promulgados os Estatutos, uma carta régia dirigida

ao Marquês determinava a sua presença em

Coimbra, não para cortar a fita inaugural dos

«Estudos novamente fundados», mas sim como

plenipotenciário e lugar-tenente de D. José para

restituir e estabelecer as Artes e as Ciências contra

as ruínas em que se acham sepultadas, fazendo

publicar os Novos Estatutos». (26) De facto só

motivos fortemente ponderosos justificariam que o

ministro se ausentasse do seu Gabinete de Lisboa,

durante cerca de mês e meio.

Salientava El-Rei que na aplicação dos Estatutos e noutros aspectos

concernentes ao regulamento e boa ordem da Universidade, «poderiam ocorrer

alguns incidentes que não deveriam esperar pelas decisões dos recursos

dirigidos á Minha Real Pessoa, sem demoras prejudiciais ao pronto

Estabelecimento que requer a urgência de uma tão útil e necessária

Fundação». (27)

Assim, confiando no zelo e fidelidade com que o Marquês sempre se

empregara no real serviço, e pelo seu muito interesse já dedicado à Uni-

versidade dirigindo e animando os trabalhos da Junta de Providência Literária

com «infatigável disvello», o rei tinha por certo que, nos casos ocorrentes,

Pombal agiria em conformidade com a sua experimentada prudência.

Para ultrapassar todos os impedimentos e incidentes que,

eventualmente, surgissem contra a rápida e fiel execução dos Estatutos,

Carvalho e Melo seria investido não só com os poderes que foram concedidos

a seu «quinto avô Balthazar de Faria, Primeiro Reformador Vizitador da

Universidade, pelo Alvará da Comissão expedida em onze de Outubro de mil

quinhentos sincoenta e sinco» (28), mas também com todos aqueles que

considerasse necessários, segundo a natureza dos casos; «obrando em tudo

Page 25: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

25

como Meu Lugar Thenente – prossegue a Carta Régia que tenho estado a

seguir – com Jurisdição privativa, exclusiva, e illimitada para todos os

sobreditos effeitos». (Embora o ouro do Brasil começasse a escassear, D. José

parecia saber a quem passava o cheque em branco).

Acrescentava, ainda, a Carta Régia, que o Reitor, Lentes, Deputados,

Conselheiros e outras pessoas da Universidade, cumprissem toda a orientação

determinada pelo «honrado Marquez de Pombal do Seu Conselho de Estado e

Seu Lugar Thenente na Fundação da Universidade de Coimbra».

A fim de dar cumprimento ao estabelecido por El-Rei, Carvalho e Melo

saíra de Lisboa a 15 de Setembro chegando a Coimbra ao fim da tarde do dia

22, e ficando alojado no Paço Episcopal onde se manteve até 24 de Outubro.

Recebido com honras majestáticas e a pompa inerente à dignidade do

cargo, as suas visitas à Universidade revestiam sempre grande aparato e

solenidade, «andando debaixo do pálio, assentando-se sob um dossel e

dando dali beija-mão, segundo as formas fetichistas da autoridade». (29)

Cerimónia de grande pompa terá ocorrido no dia 29 de Setembro,

quando o Marquês se dirigiu à Sala dos Capelos e fez ao Reitor a aparatosa

entrega dos Novos Estatutos, que extraiu solenemente de uma bolsa de

veludo, para ficarem em execução a partir daquele momento.

Depois de ter lido o Real Decreto confirmativo da nova carta orgânica da

Universidade, e que se acha incluso no princípio do 1º tomo dos Estatutos,

disse o Secretário que o Sr. Marquês era servido e mandava que o novo

Estatuto estivesse patente na Sala do Prelado, e que no dia seguinte se

recolhesse ao Cartório, e que o Reitor da Universidade distribuiria os

exemplares impressos depois de serem por ele assinados.

Como considera Hernâni Cidade, os Estatutos são a consequência da

cultura moderna mas pertinaz da Junta de Providência Literária e do espírito

esclarecido mas absolutista do Marquês de Pombal, traduzindo um rompimento

com o aristotelismo.

A antipatia contra o «abominável filósofo» era tanto do espírito da Escola

que Seabra da Silva, procurando reduzir, ou até anular, a influência de Frei

Manuel do Cenáculo junto de Pombal, na elaboração dos Estatutos, em que

Page 26: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

26

por vezes divergiam, insinuava-lhe que o Bispo «ainda acudia alguma coisa

pelos escolásticos».

Os novos Estatutos orientavam-se pelas ideias afectas ao iluminismo:

crítica ao aristotelismo formalista e verbalista,

recusando receptividade aos argumentos da

autoridade e privilegiando o método experimental

e o direito à prática da livre crítica no domínio da

ciência.

Com efeito, os Estatutos, num

reduzidíssimo espaço de tempo, «humanizaram a

medicina, aportuguesaram a jurisprudência,

lançaram as pontes para as profissões

construtivas (engenharia e arquitectura), abriram

o céu ao observatório astronómico, festejaram a

natureza no jardim botânico, separaram do

primado pontifício a soberania real, impuseram a história do direito pátrio, com

isso mudando o esquema ideológico dos cursos, que perdiam a linguagem

anacrónica, no latim eclesiástico, para captar as forças ambientais (e

europeias) do objectivismo pleiteado pelos enciclopedistas e levado, nas asas

da literatura, por Voltaire e Rousseau a todas as áreas da cultura livre». (30)

Convém, no entanto, sublinhar um notável sentido de prudência implícito nos

próprios Estatutos: preceituam que nenhum autor português ou estrangeiro

deverá ser adoptado “in perpetuum”, antes a título provisório, «até que surja

outro que se considere mais acomodado e melhor».

Apesar das naturais imperfeições, os Novos Estatutos foram acolhidos

na Europa com agrado geral, facto que o Marquês não se esqueceu de

participar ao Reitor, em carta de 7 de Novembro de 1772: «Os Estatutos da

nossa Universidade fazem um tão grande objecto na expectação das nações

estrangeiras, e hão-de fazer outro tão pungente estímulo da raiva jesuítica,

que, por um e outro princípio, os livreiros do Norte se hão-de dar todo o

movimento em os fazer traduzir para ganhar dinheiro; e os que eles apeiam

dos seus cavalos de batalha para ver se podem estropiar e difamar a mesma

legislação, introduzindo nela maliciosos erros e dissonantes imposturas. Por

Page 27: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

27

ambos os referidos motivos, se faz indispensável que a nossa tradução seja a

primeira que veja a luz do mundo. E para este fim não há meio próprio que não

seja o de se dividirem os Estatutos pelos diferentes tradutores que vão

indicados na distribuição que ajuntei a esta carta...» (31)

Os autores da “Gazeta Eclesiástica”, de França, bem como outros mais,

referem o elevado mérito dos Estatutos, louvando-os pela ordem do método e

solidez da doutrina. O Prof. Serra de Mirabeau considera tratar-se do mais

notável código de legislação que até então se conheceu em todas as nações

civilizadas; cem anos após a Reforma, Francisco de Castro Freire, um dos

mais eminentes professores de Coimbra, diria: «Estes Estatutos admiráveis,

que têm merecido a atenção e o respeito dos sábios das nações mais cultas,

colocaram a Universidade ao nível das melhores do seu tempo; e na sua

organização revelam a cada passo os seus ilustrados redactores não só uma

vasta e sólida instrução nas ciências cujo ensino regularam, mas, sobretudo,

um conhecimento profundo da natureza humana e dos métodos mais profícuos

para dirigir a mocidade nas árduas mas gloriosas sendas da sabedoria

humana». (32)

Durante o mês que permaneceu em Coimbra, ocupando-se amiudadas

vezes com o Reitor numa activa e eficiente implantação da Reforma e

promulgando as disposições indispensáveis à abertura das faculdades,

Pombal ia dando o melhor cumprimento às instruções estabelecidas por D.

José.

Antes de regressar a Lisboa, o mandatário real despediu-se de toda a

Universidade na sala nobre e, com o cerimonial costumado, pronunciou

algumas palavras de despedida. Estimulando a instituição académica a dar

continuidade com entusiasmo e dedicação aos trabalhos de que tinha lançado

as bases, acrescentou: «No meu particular tenho por certo que os sucessos

hão-de corresponder em tudo à expectação régia, e esta plausível certeza é a

que só me pode suavizar de algum modo o justo sentimento com que a

urgência das minhas obrigações na Corte faz indispensável que eu me

despeça desta preclara Academia, augurando-lhe felicidades iguais aos

consumados adiantamentos literários com que tenho previsto que há-de

ressuscitar em toda a sua anterior integridade o esplendor da Igreja Lusitana; a

Page 28: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

28

glória da Coroa de El-Rei Meu Senhor, e a fama dos mais assinalados varões,

que nas suas memórias honrarão os fastos portugueses. Com estes

faustíssimos fins deu o dito Senhor à Universidade o digno Prelado, que até ao

presente governo como Reitor com tão feliz sucesso, e que do dia da minha

partida em diante a há-de dirigir como Reformador; confiando justamente das

suas bem cultivadas Letras, e das suas exemplares virtudes, que não só

conservará com a sua perspicaz atenção a exacta observância dos Estatutos,

de cuja execução fica encarregado, mas também que ao mesmo tempo a há-

de iluminar com as suas direcções, e a há-de animar com as suas frutuosas

aplicações a tudo o que for do maior adiantamento, e da maior honra de todas

as Faculdades Académicas». (33)

A cerimónia finalizou com a intervenção do Reitor agradecendo ao

ministro a reestruturação universitária; dirigindo-se ao corpo académico inci-

tava-o na aplicação e cumprimento das suas obrigações, e que tivesse bem

presente o facto de trabalhar «á vista do mesmo herói, que o amor das letras e

da pátria trouxe a este lugar para vos honrar com a sua presença, para vos

instruir e guiar com a sua sabedoria, e para vos encher de favores e

benefícios». (34)

Ao regressar a Lisboa, em 24 de Outubro de 1772, o Marquês apenas

havia deixado em Coimbra os alicerces da nova Universidade, o que só por

isso não pode deixar de ser considerado relevante. Porém, como justamente

observa o Prof. Joaquim Ferreira Gomes, a abertura dos cursos na Faculdade

de Medicina e nas duas criadas de novo (Matemática e Filosofia Natural) terá

sido prematura.

De facto, constituindo o «espírito experimental» a tónica da Reforma

Pombalina, é óbvio que a engrenagem emperrasse por falta de organismos e

instituições anexas de apoio.

Pombal e o Reitor Francisco de Lemos

sabiam que era assim e, por conseguinte, as suas

atenções vão privilegiar a construção e

apetrechamento dos estabelecimentos científicos

previstos nos Estatutos destinados à estranha

novidade que os trabalhos práticos constituíam: Jardim Botânico, Museu de

Page 29: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

29

História Natural, Gabinete de Física Experimental, Laboratório Químico,

Observatório Astronómico, Dispensário

Farmacêutico e, quanto ao Hospital, a

escolarização do existente, que ficou sob a

direcção universitária.

E para que nenhum instrumento de

cultura escasseasse, foi sugerida a criação

da Imprensa Universitária destinada a estimular e facilitar a produção científica,

bem como o intercâmbio com universidades estrangeiras.

Era, e por fim, mais uma realização que ficou a dever-se à notável

Reforma Pombalina, reforma esta que correspondeu verdadeiramente à

fundação de uma Nova Universidade, e que nos pôs em mais aberta e eficiente

comunicação espiritual com a Europa, constituindo um dos mais gloriosos

acontecimentos da história da pedagogia portuguesa.

Diário da visita do Marquês de Pombal a Coimbra.

«Do que se passou em a Cidade de Coimbra desde o dia 22 de

Setembro, em que o Ill.mo e Ex.mo Marquez de Pombal entrou, ate ao dia 24 de

Outubro, em que sahio da dita Cidade. (35)

Setembro, 22 (terça-feira). Após o

almoço partiu de Condeixa o Marquês de

Pombal acompanhado, além da sua

numerosa comitiva saída de Lisboa a 15 de

Setembro, do Reitor da Universidade, reitores

dos Colégios de S. Pedro, S. Paulo e

Militares, dos inquisidores Sebastião Pita de

Castro e António de Vasconcelos, do Deão,

mestre-escola, por parte do Cabido, do Juiz

de Fora, do vereador Xavier Zuzarte por parte

da Câmara, ministros e mais nobreza

presente na cidade e, ainda, um piquete de cavalaria de Almeida. A Sra.

Marquesa tinha vindo à frente em companhia de seu genro, o Conde de São

Payo.

Logo que o Marquês chegou a S.ta Clara a ordenança e um terço de

Page 30: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

30

auxiliares deram três descargas, repicando os sinos da cidade onde «entrou

pelas 5 horas da tarde, e fazendo o seu caminho pela calsada, (rua Ferreira

Borges) ruas das Fangas (rua Fernandes Tomás) e de S. Cristóvão, Largo da

Sé e Rua das Covas, as quaes estavão todas armadas e arcadas, se foi apear

no Paço do Bispo aonde no fundo das escadas o esperavão os Lentes e mais

Oppositores da Universidade, e o acompanharão athe à primeira Sála... e

defronte do Paço estava postado hum corpo de 250 soldados de Infantaria de

Almeida; e à noite haverão luminárias, o que se repetio nas duas noites se-

guintes».

23 (quarta-feira). Houve grande afluência ao Paço. Falou o Sr. Marquês aos

Lentes de Leis, Cânones e Teologia, à Inquisição, Cabido, reitores e colegiais

de S. Pedro, S. Paulo, Militares e outras pessoas. De tarde, ordenou que se

tomassem as Becas no dia seguinte.

24 (quinta-feira). Pela manhã tomaram as Becas os nomeados dos Colégios de

S. Pedro, S. Paulo e Militares os quais foram, de seguida, agradecer ao

Marquês o provimento. Pelas oito horas da noite chegou do Porto João

d'Almada e Mello e sua mulher, D. Ana de Lencastre, que visitaram o Marquês

e se foram depois hospedar na casa do Cónego

Fr. António José Roiz, secretário que foi de Francisco de Almada, em Roma.

25 (sexta-feira). De manhã falou o Marquês a várias pessoas e, de tarde, aos

Lentes de Medicina.

26 (sábado). Pelas duas horas da tarde tocou o sino grande da Universidade,

«ajuntou-se» o Corpo Académico e organizou-se um cortejo da maneira

seguinte:

À frente, os archeiros da Universidade com suas fardas e alabardas novas,

seguindo-se urna multidão de estudantes; «logo depois, tocando urna

excelente marcha 2 oboés, 2 trompas e I fagote; seguindo-se os contínuos e

alguns outros Officiais da Universidade e, junto a elles, as Faculdades: em 1º

lugar a de Filosofia, em 2º Medicina, depois a de Leis, Cânones e Theologia, e

os Doutores com as suas respectivas insígnias, em duas allas, nas suas res-

Page 31: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

31

pectivas antiguidades; fechava este lustroso acompanhamento o Reitor da

Universidade, precedido dos Bedéis, Secretário e Conservador. A Cavallaria

d'Almeyda estava postada no Largo da Universidade, e a Infantaria tinha feito

duas allas desde a escada da Salla athe à porta férrea. Por meio destas se

encaminhou o Préstito, passando pelas ruas Larga e de S. João que estavam

arcadas, cobertas de espadana e com as janellas armadas; no Largo de S.

João se afastarão os Estudantes para os lados e, por meio delles, continuarão

as Faculdades as suas marchas athe ao pé da escada do Paço; e voltando à

alIa direita pelo lado direito e a esquerda pelo esquerdo continuaram as suas

marchas, athe que chegou o Reitor à escada, o qual subindo acompanhado

dos Bedéis, Secretário e Conservador e de alguns Doutores Theologos

entrando na 1ª Salla, apareceu o Sr. Marquez vestido de Corte e descendo as

escadas com o Reitor á direita e Fr. Pedro Thomaz Sanches, Lente de Prima

jubilado, á esquerda, no fundo dellas se cobrio, o que também imediatamente

fizeram as Faculdades...

Depois da Infantaria seguia-se a Guarda do Sr. Marquez e nesta ordem se

encaminhou o Préstito á Universidade. Á porta se separaram os Estudantes

para os lados, de forma que na Salla somente entraram os Doutores e o Sr.

Marquez...»

A Sala dos Capelos estava magnificamente decorada, forrada de damasco

carmesim, com sanefas de veludo, tudo

guarnecido de galões e franjas de ouro.

Numa cadeira de braços, debaixo de um soberbo

docel de veludo, sentou-se o Marquês; o Reitor no

Doutoral, depois o Conde de São Payo e os

Doutores nos respectivos lugares e, por fim,

entraram os estudantes que tinham ficado fora da

Sala.

Após o Secretário ter lido a Carta Régia de 28 de

Agosto o Reitor recitou uma Oração, na qual, em

nome da Universidade, agradecia a sua Majestade os benefícios que «por mão

do Sr. Marquez» lhe havia concedido.

Concluída a Oração o cortejo dirigiu-se à Capela da Universidade, à porta da

qual o «Visitador» foi recebido «debaixo do Pallio», cantando-se em acção de

Page 32: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

32

graças o «Laudate Dominum» e o «Te Deum».

A Marquesa assistiu da tribuna às cerimónias.

27 (domingo). Publicou-se o despacho nº 3, indo os despachados agradecer,

de imediato, os seus provimentos.

Visitou o Reitor da Universidade e foi a Sta Clara, à Quinta da Várzea e à Fonte

de Água das Mayas, após o que se recolheu ao Paço onde houve grande

afluência.

28 (segunda-feira). Publicou-se o decreto que jubilava todos os lentes de

Medicina, tendo o mesmo já acontecido com os de Teologia, Cânones e Leis.

De tarde, foi à Capela da Universidade assistir às vésperas de S. Miguel, onde

esteve presente toda a Universidade e nobreza. Acompanhado da Marquesa

foi ao Seminário, esteve no Convento de Celas e no de S. José dos Marianos.

29 (terça-feira). Pela manhã assistiu o Sr. Marquês à Festa de S Miguel, tendo

pregado D. António Callado, Lente de História Eclesiástica. De tarde, em

solene cortejo, foi à Sala dos Capelos onde, depois que o Marquês,

autoridades académicas e outras personalidades ocuparam os respectivos

lugares, o Secretário da Universidade abriu uma bolsa de veludo carmesim e

«della tirou o novo Estatuto escrito de letra de mão e encadernado em veludo,

com chapa de prata; Leo-se o Decreto que se acha inserto no princípio do 1º

tomo dos Estudos da Universidade; e acabado de ler disse ao Secretário que o

Sr. Marquez era servido, e mandava que o novo Estatuto estivesse patente na

Sala do Prelado e que no dia seguinte se recolhesse ao

Cartório, e que o Reitor da Universidade distribuiria os

exemplares impressos depois de serem por ele

asignados».

Em acção de graças assistiu, na Capela da

Universidade, ao «Te Deum Laudamus» e, depois,

recolheu-se em préstito ao Paço. À noite, o Reitor

distribuiu os exemplares do novo Estatuto por todos os

Lentes e colegiais dos 3 Colégios, e houve repiques e

luminárias.

Page 33: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

33

30 (quarta-feira). Os novos Lentes prestaram juramento no Paço em pre-

sença do Marquês e, já na Sala dos Capelos, tomaram posse das suas Ca-

deiras agradecendo «cada hum em breve período de Mercê, que S. Mag.e lhe

fazia, por mão do Sr. Marquez». Da tribuna, assistiram a Marquesa e o Reitor.

Outubro, 1 (quinta-feira). Após ter assistido à missa em honra do Espírito

Santo na Capela da Universidade, os novos Lentes prestaram na presença do

Marquês o costumado juramento.

2 (sexta-feira). Fez anos a Sra. Marquesa, havendo grande afluência ao Pa-

ço. De tarde, esteve presente à Oração recitada por Carlos Maria Matos, Lente

de Teologia, na abertura da sua Faculdade.

3 (sábado). Foi em carruagem à Universidade, visitando a Biblioteca e

«assistindo às medidas que os Engenheiros nessa tarde tomarão do Pateo».

4 (domingo). Acompanhado da Marquesa assistiu, em tribuna, à festa que

em acção de graças fizeram os brasileiros na Igreja de S. João, tendo pregado

D. Thomaz da Encarnação e Frei Alexandre de Souza, Promotor do Bispado.

Foi a S. Francisco da Ponte e a Sto António dos Olivais.

5 (segunda-feira). Foi à Sala dos Capelos onde Manuel José Alves, Lente de

Cânones, proferiu a Oração na abertura da Faculdade.

6 (terça-feira). Publicaram-se os despachos de Medicina e assistiu à Oração

pronunciada por Thomaz Pedro da Rocha, Lente da 1ª Cadeira de Leis, na

abertura da respectiva Faculdade.

7 (quarta-feira). Visitou o Colégio das Artes e o Castelo; foi à Cerca de Sta

Cruz «donde passou à Regaça em companhia do Dr. Vandelli, a ver que sitio

seja mais próprio para o Jardim Botânico».

8 (quinta-feira). Na Sé, foi recebido pelo Cabido debaixo do Pálio; depois de

Page 34: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

34

ter feito oração visitou o Claustro, Casa do Cabido, Cartório e Sacristia.

9 (sexta-feira). Em cortejo, veio o Sr. Marquês à Universidade precedido dos

Lentes nomeados de Medicina, José Francisco Leal, Simão Good e António

José Pereira, com capelos amarelos; logo adiante, Miguel Franzini, Padre José

Monteiro da Rocha e Miguel António Ciera, Lentes de Matemática, com capelos

azuis forrados de branco e uma esfera no lado; depois, António Soares e

Domingos Vandelli, Lentes de Filosofia, com capelos azuis; as borlas levadas

«em 3 salvas, por 3 Estudantes com luvas».

Na Sala dos Capelos os três Lentes de Medicina ajoelharam-se e leram o

juramento. Então, foram doutorados pelo Marquês que lhes pôs as borlas na

cabeça; depois dos abraços da praxe foram sentar-se no Doutoral da

respectiva Faculdade. Os de Matemática tiveram o mesmo cerimonial sen-

tando-se abaixo dos Teólogos, e os Filósofos no Doutoral dos Mestres em

Artes. Após o juramento dos Lentes tomaram posse das Cadeiras, «a que se

seguirão os costumados acompanhamentos».

Nesta mesma manhã, avisara os reitores dos 3 Colégios para que elegessem

um Colegial que não fosse Lente, ou substituto, para Deputado da Mesa da

Fazenda da Universidade.

O reitor do Colégio de S. Pedro elegeu José Barroso Pereira, o de S. Paulo

Aragão Trigoso, e o dos Militares Ricardo Raimundo Nogueira. À tarde esteve

presente na abertura da Faculdade de Medicina, tendo proferido a Oração o

Lente António José Pereira.

10 (sábado). Foi o Marquês recebido pelo Reitor à porta da Capela da

Universidade, assistindo «debaixo do Docel às vésperas da Festa determinada

no Decreto nº 7».

11 (domingo). Na Capela da Universidade assistiu à missa cantada em que

pregou Frei Joaquim de Santa Ana, Lente substituído das 3 Cadeiras

Dogmáticas; no fim da missa cantou-se o «Te Deum», tendo a Sra. Marquesa

assistido no Coro. De tarde, foi à Quinta de S. Martinho.

12 (segunda-feira). Houve cerimónia idêntica à do dia 9.

Page 35: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

35

Incorporaram-se na Faculdade de Leis o Doutor José Joaquim Vieira Go-

dinho, Lente de Direito Pátrio, e em Medicina os Doutores Vandelli e Miguel

Franzini; seguidamente, o Marquês doutorou em Medicina, Luís Chici. De

tarde, deslocou-se em sege à Universidade assistindo à Oração do Doutor

José Monteiro da Rocha, Lente de Matemática, na abertura da sua Faculdade.

13 (terça-feira). Assistiu à Oração proferida pelo Doutor António Soares,

Lente de Filosofia.

Recolhido ao Paço, prestaram juramento na sua presença os 3 deputados da

Mesa da Fazenda, o tesoureiro e o escrivão, ficando estes dois últimos com

direito a voto na referida Mesa, «para o que se lavraram nos Livros os termos

costumados».

14 (quarta-feira). Por ordem do Sr. Marquês foi o Secretário buscar os Esta-

tutos velhos da Universidade a todos os Conventos e Colégios da cidade,

tendo recolhido muitos exemplares.

Foi à Quinta de Vila Franca e, à noite, foi afixado o Edital nº 8.

15 (Quinta-feira). Na presença do Reitor tomaram as Becas os porcionistas

do Colégio de S. Paulo. – Edital nº 9. À tarde, acompanhado da Marquesa foi

ao Loreto.

16 (sexta-feira). Marquês e Marquesa foram a S. Jorge, indo depois à Várzea

visitar o Embaixador e a Sra. Embaixatriz.

17 (sábado). Reuniram-se os Doutores a cavalo com as suas insígnias e, no

Largo de S.ta Cruz, formou-se o cortejo do Doutoramento: Archeiros a pé,

músicos a cavalo, seguindo-se as Faculdades de Filosofia, Matemática, Medici-

na, Leis, Cânones e, por fim, Teologia; os Doutores em duas alas nas res-

pectivas antiguidades. O pajem, a cavalo, com a borla numa salva e, junto aos

bedéis, o Doutorando José Pereira Monteiro, em «hum cavalo ricamente

ajaezado»; ladeavam o Doutorando o Reitor e o Lente da 1ª Cadeira Analítica

de Cânones, sendo o acompanhamento finalizado pelo Conservador.

Chegados ao Largo da Universidade os Doutores e o Reitor foram buscar o

Page 36: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

36

Sr. Marquês que assistiu à missa na Capela. Finda a missa dirigiu-se,

precedido de luzido acompanhamento, para a Sala dos Capelos sentando-se

os Doutores nos respectivos lugares e o Conde de São Payo à direita do

Doutorando, por ser seu padrinho neste acto. Pronunciou o Doutorando uma

brevíssima Oração pedindo o grau. Discursaram em seu louvor os Doutores

canonistas Miguel Martins de Araújo e Miguel Pais de Aragão Trigoso, Colegial

de S. Paulo.

Terminado isto, subiu o Doutorando ao pé da cadeira do Marquês e leu o

juramento; depois, «chegou ao pé do Lente da 1ª Cadeira Analytica de

Cânones, o qual em huma Oração lhe deu o grau de Doutor, ornando-o com as

insígnias». Seguiram-se os abraços da praxe e «o novo Doutor foi neste dia

jantar ao Paço com o Sr. Marquês, por o haver convidado».

De tarde, foi o Marquês à Quinta da Geria e afixou-se o Edital nº 10.

18 (domingo). Tomou a Beca de Porcionista no Colégio de S. Pedro D.

Fernando de Portugal, filho do Marquês de Valença, a que assistiu o Reitor da

Universidade. De tarde, a Sr.ª Marquesa assistiu numa tribuna acompanhada

da Sr.a Embaixatriz e da mulher de João d'Almada, à última parte do Triduo que

os «filhos de Lx.» fizeram a N.a S.a da Esperança em acção de graças pela no-

va fundação da Universidade.

De manhã, houve Pontifical e pregou ao Evangelho o Doutor Frei Diogo Jardim,

monge de S. Jerónimo; de tarde veio o Bispo assistir ao Sermão que pregou o

Doutor Frei José Bernardo Pimentel, da Ordem de S. Domingos.

Seguiu-se urna procissão que veio «Igreja de S.ta Clara do Convento das

Religiosas de S. Franc.co trazendo o Bispo o Sacramento. O pálio foi levado

pelos Porcionistas e Colegiais lisboetas, recolhendo-se depois a procissão à

mesma Igreja onde o Sr. Marquês mandou pedir o Sermão do Evangelho, que

foi pregado por Frei Diogo Jardim.

19 (segunda-feira). Foi ao Colégio de S. Pedro visitar o seu filho que «se

achava molestado», indo depois a S. Paulo «dar os pêsames ao Porcionista

Luiz Gonçalves da Câmara, f.o do Almotacé Mor do Reyno, por lhe haver

falecido repentinam.te sua Mãe, a Sr.a D. Leonor Josefa d’Almeida».

Page 37: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

37

20 (terça-feira). De tarde foi o Sr. Marquês a casa do Reitor, «de onde se

recolheu ao Paço».

21 (quarta-feira). Em solene procissão que incorporava as Irmandades do

Santíssimo, Clero, Comunidades, Câmara e todo o Cabido paramentado,

procedeu-se à transladação do Santíssimo Sacramento para a nova Sé. O

Reitor da Universidade levava o Santíssimo debaixo do Pálio, pegando nas

varas os Condes da Ponte e São Payo, João de Almada e seu filho, o Morgado

de Oliveira e o Porteiro-Mór. Acompanhava a procissão «toda a Nobreza,

misturada com o corpo da Universidade q. p.a isto tinha sido avizado pelo R.or»

e, ainda, parte da Infantaria.

22 (quinta-feira). O Sr. Marquês assistiu, em tribuna, à missa cantada e

celebrada pelo Reitor da Universidade (governador do Bispado), tendo pregado

Frei Joaquim de Santa Ana.

De tarde, na Sala dos Capelos «recitou a fala n.o 13», a que se seguiu a leitura

do Decreto n.o 14 feita pelo Secretário. Encerrou a cerimónia o Reitor que, em

eloquente Oração, «agradeceo em nome da Universidade os benefícios q. esta

delle tinha recebido e lhe protestou a justa saudade q. a todos causava a sua

auzencia».

23 (sexta-feira). Em presença do Marquês, prestou juramento, na Capela

particular do Paço, o «Reitor Reformador», de que foram testemunhas os

Condes da Ponte e São Payo.

24 (sábado). Manhã cedo, recebeu na sua sala a Inquisição, Cabido, Uni-

versidade, Câmara e toda a nobreza.

Cerca das nove horas iniciava a sua jornada acompanhado da Sra. Marquesa e

do corpo acima referido, sendo recebido à passagem pelo Largo de S.ta Clara

com uma salva de 3 descargas.

Pouco depois da Ermida da Esperança mandou agradecer «o obséquio q. lhe

fazião e q. se retirassem, o q. com effeito todos fizerão» exceptuando o Reitor

que foi até Condeixa.

Pelas onze horas partiu João d'Almada e a Sra. D. Ana Joaquina, sendo

Page 38: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

38

acompanhados «athe fora da Cid.e pela Nobreza q. aqui se achava».

Oposição à reestruturação universitária.

Cinco anos após a entrega e publicação dos Estatutos considerava-se já

enorme a diferença entre o tempo anterior à Reforma e aquele que lhe seguiu,

não hesitando o Reitor, D. Francisco de Lemos, o grande obreiro da mudança,

em afirmar, e com toda a justiça, ter sido uma alteração radical. Os próprios

centros culturais europeus assim o elogiaram e confirmaram

De facto, a reforma pombalina da Universidade é uma obra de grande

mérito na sua estruturação e os Estatutos que a enformam colocam Portugal

numa posição relevante na Europa do seu tempo.

O labor dos seus organizadores nada teve de fácil, porquanto, havia

necessidade de se afastarem dos esquemas programáticos e metodológicos

tradicionais, o que correspondia a um esforço intelectual que é justo enaltecer.

Acrescente-se que a reforma foi, desde início, elaborada sem bases anteriores,

pois nesta matéria ”não há coisa alguma” [no passado] “que se possa

aproveitar para objecto de reforma”, consoante se lê no documento já citado de

28 de Agosto de 1771.

Trata-se, inegavelmente, de um esforço levado a cabo a fim de

«transformar radicalmente as estruturas antiquadas, ineficazes, anacrónicas,

do nosso ensino universitário “totalmente incapaz de responderem às

solicitações de um época em que as técnicas começavam a intervir

deliberadamente no contexto social e a investigação científica a organizar-se

como tarefa indispensável». (36)

Porém, julgo não causar qualquer espécie de surpresa, pelo menos a

quem estiver por dentro do processo, o facto de logo que as circunstâncias

favoráveis o permitissem, a oposição obstacularizaria e impediria no que fosse

possível a implantação da reforma pombalina dos estudos. Assim foi, como era

de esperar.

O momento chave, e esperado, foi o falecimento de D. José em 24 de

Fevereiro de 1777 e a consequente morte política do ministro Carvalho e Melo.

No entanto, cerca de cinco anos antes, mas quando um novo espírito já se

instalara em Coimbra, colocando frente a frente duas mentalidades

antagónicas, Teófilo Braga informa-nos que «Quando o Marquês de Pombal

Page 39: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

39

reformou a Universidade de Coimbra em 1772, com a cooperação activa,

inflexível e inteligente do reitor Francisco de Lemos, levantou-se entretanto,

uma surda oposição entre sectários do escolasticismo medieval, que com todo

o zelo religioso se mostrava hostil às “doutrinas novas, peregrinas e perigosas”,

que se ensinavam na Universidade», criticando métodos pedagógicos,

compêndios adoptados, teses defendidas, etc.

Porém, foi de facto a morte de D. José que constituiu um rude golpe em

todo o processo da reforma, uma vez que com a queda do poderoso ministro

passou a faltar o apoio indispensável à reestruturação universitária, ao mesmo

tempo que surgia uma forte reacção contra a sua acção governativa,

denegrindo e tentando derrubar uma das mais brilhantes obras do estadista.

Efectivamente, a oposição erguia-se contra a reforma pombalina dos

estudos: ódios e invejas que estavam latentes vieram ao de cima: muitos

acusavam os estudantes dos novos estudos de pensarem livremente em

pontos de religião, contribuindo em larga medida «para espalhar este rumor

falso, as declamações vagas que têm feito nos púlpitos alguns pregadores

incautos e pouco advertidos».

Aqui, o Reitor D. Francisco de Lemos, saiu a “terreiro”, ironizando que,

remetidos a um silêncio calculado, não isento de alguma covardia, só agora

apareçam a «opor-se à torrente de todas as novidades que, segundo dizem, se

espalham e ensinam na Universidade», não deixando de atacar com

veemência os detractores da Reforma, os quais tinham por hereges todos

aqueles que tentaram renovar a face cultural do país e da Escola transformada.

D. Francisco de Lemos defendia a liberdade de docência contra o autoritarismo

de magistério, acrescentando não haver motivos para receios, uma vez que as

doutrinas não são “novas, peregrinas e perigosas”.

A “Relação Geral do Estado da Universidade”. D. Francisco de Lemos

justifica a necessidade e o espírito da Reforma.

Como tivessem aumentado e endurecido as críticas acerca da

renovação dos estudos, havendo muitos que ansiavam voltar ao passado,

considerando condenáveis as novas doutrinas que agora se ensinavam na

Universidade baseadas em obras adoptadas no estrangeiro da autoria de

mestres consagrados, D. Francisco de Lemos decidiu-se a escrever a “Relação

Page 40: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

40

Geral do Estado da Universidade”, com o objectivo de defender o plano

executado e em desenvolvimento.

A “Relação Geral”, que é uma apologia notável da renovação dos

estudos universitários, resumia a acção de D.

Francisco de Lemos durante os cinco anos do seu

primeiro mandato como Reitor (1772-1777), sendo

o seu texto «minucioso, cuidado nos pormenores

e, portanto, expressivo».

O manuscrito foi encontrado há pouco mais

de um século e publicado por Teófilo Braga em

1894, sendo por sua iniciativa o original oferecido

ao Arquivo da Universidade de Coimbra, onde se

encontra. Este historiador e literato do nosso

século XIX, mas que foi um percursor, caracteriza

do modo seguinte a obra de D. Francisco de

Lemos: «Na “Relação”, em uma prosa seca com subdivisões segundo o estilo

escolástico, com uma ênfase autoritária no género dos derramados períodos

das leis pombalinas, D. Francisco de Lemos mostra-se muito superior aos

autores do “Compêndio Histórico” ao caracterizar o estado decadente e os

vícios pedagógicos da Universidade; narra o que se fez, o que não se pode

fazer, e o que não surtiu efeito depois da reforma. Por vezes as suas críticas

negativistas encontram-se com os pontos de vista do bispo Cenáculo e do

afamado Doutor António Nunes Ribeiro Sanches, que cooperaram nas

reformas pedagógicas do grande ministro». (37)

D. Francisco de Lemos defende a todo o transe e utilizando toda a

argumentação possível a necessidade da reforma em curso, tanto mais que lá

por fora, já se tinham verificado importantes reformas universitárias de acordo

com o espírito da época, caracterizada por profundo empenhamento no

experimentalismo e na renovação das ciências humanas.

No juízo que faz acerca da Reforma da Universidade, e embora

reconhecendo os progressos conseguidos, não deixa de apontar críticas a

certos atrasos ainda existentes e de indicar as vias que ajudassem a

ultrapassar os obstáculos.

Em particular, o que mais o preocupava era o facto de a frequência dos

Page 41: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

41

alunos, nas diversas Faculdades, não tivesse correspondido às expectativas

dos responsáveis da Reforma, muito provavelmente devido às exigências

determinadas pelos Estatutos terem criado, como era de calcular, problemas e

dúvidas a muitos que estavam habituados a um ensino rotineiro e de pouca

exigência.

Obviamente, que o ilustre Reitor-Reformador não deixou de justificar o

que os Estatutos estipulavam e, ao mesmo tempo indicar os meios para

resolver a situação. Em sua opinião seria necessário criar uma nova

mentalidade em todo o país, que levasse as pessoas a compreender que sem

um ensino universitário modelar não se podiam modificar as estruturas da

Nação.

Assim, considera que «para exercer certos cargos e profissões se devia

exigir formação nesta ou naquela Faculdade consoante os casos» tendo como

objectivo dotar o país de pessoas bem instruídas e com sólidos conhecimentos

no ramo de saber respectivo. Por outro lado, criarem-se “partidos” e prémios

para os estudantes a fim de diminuir as suas dificuldades económica.

Sublinhe-se que na sua “Relação Geral”, D. Francisco de Lemos, ao

tratar de cada uma das Faculdades, põe sempre a descoberto os “vícios” de

que padecia o ensino, bem como as suas carências, indicando os meios para

os erradicar ou resolver, referindo-se, nomeadamente, aos anos dos cursos, às

cadeiras, professores e livros adoptados, ao aproveitamento dos alunos, às

dificuldades encontradas e aos caminhos a seguir para aumentar o número de

alunos e à forma como poderia rentabilizar o saber transmitido durante os anos

de frequência na Universidade. De facto, não deixam de ser minuciosas, e

oportunas as notas e comentários com que o grande pilar da Reforma tenta

esclarecer e convencer que a remodelação operada tinha sido a mais

adequada e conveniente.

Vejamos, agora, o que nos diz D. Francisco de Lemos, através da sua

“Relação Geral”, acerca dos costumes e doutrina dos estudantes. Diga-se,

desde já, que se trata de uma notável visão dos factos, trabalho da maior

importância, demonstrando que a Universidade muito beneficiou com a

Reforma de 1772.

Começa por dizer que as Universidades são Escolas não só de Letras

Page 42: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

42

mas também de Virtudes, «por isso não deve haver nelas menor cuidado em

ilustrar o espírito dos estudantes com a luz das ciências, do que em formar os

seus corações com a prática das Virtudes. Faltar a qualquer destes objectos

seria a ruína da educação nacional, a qual deve merecer a principal atenção e

vigilância dos reis, visto ser o princípio e origem da felicidade pública da

monarquia». (38)

De seguida, lamenta, com algum pesar, que o magistério da Virtude nem

sempre esteve presente nas Universidades, como era conveniente,

apresentando um quadro nada abonatório da história dos costumes dos

escolares: parcialidades, fracções, ódios, emulações, intrigas, querelas, feridas,

homicídios, adultérios, estupros e outros, «muitos vícios se cometiam e

contraíam no tempo dos Cursos Literários».

Este “statu quo”, segundo D. Francisco de Lemos, era a resultante da

Constituição das Universidades e dos próprios Mestres: era difícil manter a

disciplina em tão grande número de estudantes, divididos entre si pela

diversidade das nações, das línguas, das inclinações e dos costumes; também

os próprios Mestres estavam divididos entre si pela diversidade das suas

opiniões e pela oposição que faziam aqueles que tinham maior reputação e

mais ouvintes, sendo que estas mesmas divisões e emulações passavam aos

discípulos, e então eram causa de mil desordens; os mesmos Mestres não se

aplicavam senão em fazer lições e ditados, sem se preocupar em formar os

costumes da mocidade e em inspirar-lhe sentimentos de religião e probidade.

Tais hábitos constituíram um dos mais perniciosos efeitos do magistério

escolástico, isto é, não se preocupavam com os ensinamentos sólidos e úteis,

ficando-se em questões vãs e supérfluas que não serviam para formar o

espírito e o coração da mocidade, dando azo a que «a mesma mocidade longe

de aproveitar nas Universidades contraía vícios enormes e a faziam inútil para

os empregos e Ministérios públicos.

Entendendo ter dito o suficiente sobre o assunto, resumia as suas

considerações do seguinte modo: uma vez que o ensino público se tinha

reduzido a uma mera formalidade e que os estudantes não frequentavam as

aulas, nem a isso eram obrigados; dado que a vida académica se passava no

ócio e o Ministério da palavra estava em profundo silêncio e não havia

disciplina para inspirar e fortificar nos ânimos a probidade interna, atendendo a

Page 43: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

43

tudo isso, como se podia esperar que os estudantes saíssem da Universidade

cheios de sentimentos de Religião, de Justiça, de Ordem e de zelo pelo bem

público? E acrescenta: todos estes grandes defeitos foram reconhecidos e se

procuraram emendar na “Nova Reformação”.

A este propósito, e entre outras fontes que poderia citar, refere os

autores da “Gazeta Eclesiástica” de França que enaltecem o elevado mérito

dos Estatutos: «Vêem-se ao mesmo tempo nestes Estatutos homens cheios de

probidade, de Religião, e de Amor pelo Bem Público. Se eles trabalham a

formar sábios em todos os géneros, e a favorecer os progressos das Ciências

Divinas e Humanas, pelos meios os mais capazes, de conseguirem, tudo é

dirigido ao bem geral da Sociedade, e ao fim que se deve propor em todas as

Ciências, que é de conduzir os homens à virtude, a única e verdadeira

felicidade. Nenhuma coisa é mais própria do que estes Estatutos para

convencer a toda a pessoa racionável, que a Religião bem longe de ser inimiga

do que as Ciências têm de verdadeiro e de sólido, é só capaz de fazer

conhecer o preço delas, e de tirar delas vantagens…». (39)

D. Francisco de Lemos não deixa de insistir que a virtude está

solidamente ligada às ciências e, se estas florescem, em procura da verdade,

então, neste caso, também a virtude cresce e os costumes são outros,

sublinhando que os professores têm aqui um papel importante: enquanto os

escolásticos se envolviam em disputas e especulações, os de agora

preocupam-se com a verdade e o ensino da religião, da virtude e da probidade,

sendo o exemplo fundamental para que a mocidade se oriente pelo caminho da

virtude.

Assim, também, a antiga fórmula de juramento foi substituída por outra,

em que os estudantes, quando se matriculavam de novo, juravam observar os

Estatutos, obedecer aos seus superiores, ter reverência aos Mestres, tratarem-

se uns aos outros com toda a caridade e civilidade e viverem com bom

comportamento.

O certo é que na Universidade passou a haver mais aplicação, mais

tranquilidade e mais ordem, o que não será de todo estranho, uma vez que a

disciplina escolar e o respeito constituíam um objectivo importante nos

princípios do Reitor-Reformador.

Page 44: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

44

Em jeito de conclusão, pode dizer-se que a “Relação Geral do Estado da

Universidade” corresponde a uma tentativa notável de justificar as medidas

adoptadas pela Reforma de 1772. Contudo, não podia deixar de apresentar

algumas lacunas, dadas as circunstâncias em que tudo ocorreu,

nomeadamente o difícil período que a Universidade viveu a seguir à morte de

D. José e ao afastamento do Marquês, durante o qual surgiram fortes reacções

provenientes de vários quadrantes.

Porém, apesar de todas as dificuldades surgidas e dos enormes

obstáculos a superar, a Reforma prosseguiu o seu trajecto cujo êxito se deve

fundamentalmente ao Reitor. Efectivamente, a presença de D. Francisco de

Lemos à frente dos destinos da Universidade desde 1770 até 1821, apenas

com breves interrupções, apoiado por personalidades de grande envergadura,

como José Monteiro da Rocha e outros, foi, indiscutivelmente, o poderoso

suporte, o homem “providencial” na afirmação e triunfo da Reforma.

Nota final: As comemorações do 1º centenário da Reforma Pombalina, 1872,

demonstraram plenamente que os trabalhos iniciados um século antes

continuaram a merecer a aprovação do corpo universitário.

Entre a série de acontecimentos levados a cabo, saliente-se a

publicação de vária obras que fazem a história das Faculdades, com excepção

das Jurídicas.

Para além das comemorações do 2º centenário da Reforma, 1972, em

que foram editadas várias publicações, e levados a cabo outros eventos, deve

salientar-se, quando do 2º centenário da morte do Marquês de Pombal, 1982, a

promoção, a nível nacional, de iniciativas que decorreram entre Dezembro de

1981 e Dezembro de 1982. A Comissão Organizadora das Comemorações

tinha como principal objectivo, levar até aos mais vastos sectores da população

um conhecimento alargado da época pombalina e do seu significado na

História de Portugal.

As comemorações foram encerradas com o Colóquio Internacional, “Pombal

Revisitado”, realizado em 2 e 3 de Dezembro de 1982, onde participaram e

deram colaboração efectiva especialistas e estudiosos portugueses e

estrangeiros, espanhóis, franceses ,italianos, norte-americanos e brasileiros.

Page 45: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

45

Notas Bibliográficas

(1) Isabel Nobre Vargues – «A Ode a Filomeno e a Reforma da Universidade de 1772». Revista de História das

Ideias, Tomo II, 1982 – 1983, pág. 255.

(2) António Leite – «Pombal e o Ensino Secundário», in «Brotéria», Vol. 114, nº 5-6, Maio – Junho – 1982, pág.

590.

(3) Idem, pág. 599.

(4) António Alberto Banha de Andrade – «A Reforma Pombalina dos Estudos Secundários» (1759 – 1771), 1º

vol., pág. 82. Coimbra, 1981.

(5) John Smith (secretário privado do marechal Saldanha) – «Memoirs of the Marquis of Pombal». Vol. I, págs.

308 – 309: «O novo método para as classes de Latim e Grego foi aqui aprovado; e o Presidente do Conselho

Palatino expressou o desejo que tinha de ver o mesmo método aplicado no Império». London, 1843.

(6) Carta Régia de 23 de Dezembro de 1770, que cria a Junta de Providencia Literária, cit. Por Mário Alberto

Nunes da Costa em “Documentos para a História da Universidade de Coimbra» (1750 – 1772), Vol II, págs. 236 –

237. Coimbra, 1961.

(7) Joaquim Veríssimo Serrão – «História de Portugal», Vol. VI, pág. 266.

(8) Mário Brandão e M. Lopes de Almeida – «A Universidade de Coimbra» – Esboço da sua história. Por ordem

da Universidade, 1937, Parte II. Pág. 72.

(9) Hernâni Cidade - «Lições de Cultura e Literatura Portuguesas», 2º vol., págs. 190 – 191. Coimbra, 1959.

(10) António Ferrão – «A Reforma Pombalina da Universidade de Coimbra», págs., 5 – 6. Imprensa da

Universidade. Coimbra, 1926.

(11) «Questiones Contemporaines», pág. 81, cit. Por Teófilo Braga in «História da Universidade de Coimbra»,

pág. 141.

(12) António Sérgio – Obras Completas, «Ensaios», Tomo II, págs. 29 – 30.

(13) Mário Alberto Nunes da Costa – «Documentos para a História da Universidade de Coimbra» (1750 – 1752).

Vol. II, pág. 255.

(14) Op. cit. em (7), pág. 194.

(15) Bernardino António Serra de Mirabeau – «Memória Histórica e Comemorativa da Faculdade de Medicina».

Coimbra, Imprensa da Universidade, 1872.

(16) Op. cit. em (9), pág. 194.

(17) Teófilo Braga – «D. Francisco de Lemos e a Reforma da Universidade de Coimbra», pág. VIII. Lisboa, 1894.

(18) – Luís de Albuquerque – «O Reino da Estupidez e a Reforma Pombalina». Textos Vértice, pág. 21. Atlântida,

Coimbra, 1975.

(19) Jorge Borges de Macedo «O Marquês de Pombal», pág. 29. Biblioteca Nacional – Série Pombalina. Lisboa,

1982.

(20) D. Francisco de Lemos – «Relação geral do Estado da Universidade» (1777), pág. 12. Coimbra, 1980

(21) Henrique Schaefer – «História de Portugal». Vol. V, pág. 193. Porto, 1899.

(22) Op. cit. em (9), pág. 203.

(23) Miller Guerra – «A Reforma Pombalina dos Estudos Médicos», in «Pombal Revisitado», Vol. I, pág. 191.

(24) «Ensaio Histórico sobre a Origem e Programa das Matemáticas em Portugal», pág. 67, cit. por Henrique

Schaefer in «História de Portugal», pág. 199.

(25) Joaquim Veríssimo Serrão – «O Marquês de Pombal, o Homem, o Diplomata e o Estadista», pág. 152.

Lisboa, 1982.

(26) «Pasta de Manuscritos nº 895 46

» –

Carta Régia dirigida ao Marquês de Pombal sobre os Estatutos da

Universidade de Coimbra, 28 de Agosto de 1772; 3 fls.. Arquivo Distrital de Braga.

(27) Idem.

(28) Idem.

(29) Teófilo Braga - «História da Universidade de Coimbra», Tomo II, pág.427. Lisboa, por ordem e na tipografia

da Academia Real das Ciências, 1898.

(30) Pedro Calmon – «A Reforma da Universidade e os Dois Brasileiros que a planejaram». «Revista de História

das Ideias», Vol. IV, Tomo II, págs. 95-96.

(31) Joaquim Ferreira Gomes – «Dez Estudos Pedagógicos», págs. 229-230. Coimbra, 1977.

Page 46: A Reforma pombalina dos Estudos. Visita do Marquês a ... PARTE VI Reforma pombalina.pdf · um passado dogmático e estático ... como um castigo de Deus por causa da dominação

Carlos Jaca

46

(32) Francisco de Castro Freire – «Memória Histórica da Faculdade de Matemática», pág. 17. Coimbra, 1872.

(33) José Silvestre Ribeiro – «História dos Estabelecimentos Científicos, Literários e Artísticos de Portugal nos

Sucessivos Reinados da Monarquia». Tomo I, pág.379.

Lisboa, Tipografia da Academia Real das Ciências, 1872.

(34) Op cit. em (8), pág. 97.

(35) «Pasta de Manuscritos nº 895 42»

– Visita do Marquês de Pombal à cidade de Coimbra, e respectivo Diário

desde 22 de Setembro até 24 de Outubro, dia em que saiu da Cidade. Sé. XVIII, 14 fls. inumeradas. Arquivo

Distrital de Braga.

(36) Carvalho, Rómulo de – “História do Ensino em Portugal”, pág. 466. Fundação Calouste Gulbenkian, 1986.

(37) Rodrigues, Manuel Augusto – “ A Universidade de Coimbra”. Figuras e factos da sua história. Vol. I, pág. 553.

Campo das Letras, 2007.

(38) Op. cit. em (20), pág. 198.

(39) Idem, pág. 201-202.