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A PROPÓSITO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS: A ECONOMIA POPULAR E SOLIDÁRIA COMO UMA MANIFESTAÇÃO DE ECONOMIA POLÍTICA - LIMA, José Raimundo Oliveira Salvador BA: UCSal, 8 a 10 de Outubro de 2014, ISSN 2316-266X, n.3, v. 2, p. 852-867 852 A PROPÓSITO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS: A ECONOMIA POPULAR E SOLIDÁRIA COMO UMA MANIFESTAÇÃO DE ECONOMIA POLÍTICA LIMA, José Raimundo Oliveira Professor do Curso de Ciências Econômicas e Coordenador do Programa de Extensão e Pesquisa Incubadora de Iniciativas da Economia Popular e Solidária da Universidade Estadual de Feira de Santana/Bahia/Brasil. [email protected] RESUMO Este trabalho faz uma reflexão sobre o processo que denota tanto a intervenção estatal para garantir pleno emprego e bem estar social, quanto os atuais processos de orientação de políticas públicas para resolver demandas sociais pontuais e busca compreender o que existe de comum nas duas situações. Discute-se como eixo central o modo de intervenção do estado em escalas gerais e particulares, conforme evolui a demanda por essas políticas. Observam-se ações em setores populares o quanto mais instável ou vulnerável, como espaço propício à intervenção em decorrência da dificuldade de auto-organização e politização pela busca de igualdade de oportunidades. De outro modo, também, com ação de intervenção, procura-se garantir a manutenção do estado burguês. Para compreensão das duas formas de orientação estatal, buscou-se sustentação teórica nas discussões dos processos de incubação de Iniciativas de Economia Popular e Solidária, enquanto orientação política e educativa para outra economia. Palavras Chave: Políticas púbicas Orientação econômica Mercado. ABSTRACT This work is a reflection on the process that denotes both state intervention to ensure full employment and social welfare, as the current orientation processes of public policies to address specific social needs and seeks to understand what is common in both situations. Is discussed as the core mode of state intervention in general and particular scales, as it evolves, the demand for these policies. Note the preference shares into popular sectors as vulnerable as unstable or as conducive to its implementation due to the difficulty of self-organization and politicization by the pursuit of equal opportunities or otherwise to maintain the bourgeois state space. To understand the two forms of state guidance was sought theoretical support in discussions of the processes of incubation initiatives Popular and Solidarity Economy, as a political and educational guidance to other economy. Key words: Pubic Policies - Economic Guidance Market.

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ECONOMIA POLÍTICA - LIMA, José Raimundo Oliveira

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A PROPÓSITO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS: A ECONOMIA POPULAR

E SOLIDÁRIA COMO UMA MANIFESTAÇÃO DE ECONOMIA

POLÍTICA

LIMA, José Raimundo Oliveira

Professor do Curso de Ciências Econômicas e Coordenador do Programa de Extensão e Pesquisa

Incubadora de Iniciativas da Economia Popular e Solidária da Universidade Estadual de Feira de Santana/Bahia/Brasil.

[email protected]

RESUMO

Este trabalho faz uma reflexão sobre o processo que denota tanto a intervenção estatal para garantir

pleno emprego e bem estar social, quanto os atuais processos de orientação de políticas públicas para resolver demandas sociais pontuais e busca compreender o que existe de comum nas duas situações.

Discute-se como eixo central o modo de intervenção do estado em escalas gerais e particulares,

conforme evolui a demanda por essas políticas. Observam-se ações em setores populares o quanto mais instável ou vulnerável, como espaço propício à intervenção em decorrência da dificuldade de

auto-organização e politização pela busca de igualdade de oportunidades. De outro modo, também, com

ação de intervenção, procura-se garantir a manutenção do estado burguês. Para compreensão das duas formas de orientação estatal, buscou-se sustentação teórica nas discussões dos processos de incubação

de Iniciativas de Economia Popular e Solidária, enquanto orientação política e educativa para outra

economia.

Palavras – Chave: Políticas púbicas – Orientação econômica – Mercado.

ABSTRACT This work is a reflection on the process that denotes both state intervention to ensure full employment

and social welfare, as the current orientation processes of public policies to address specific social needs

and seeks to understand what is common in both situations. Is discussed as the core mode of state intervention in general and particular scales, as it evolves, the demand for these policies. Note the

preference shares into popular sectors as vulnerable as unstable or as conducive to its implementation

due to the difficulty of self-organization and politicization by the pursuit of equal opportunities or

otherwise to maintain the bourgeois state space. To understand the two forms of state guidance was sought theoretical support in discussions of the processes of incubation initiatives Popular and Solidarity

Economy, as a political and educational guidance to other economy.

Key – words: Pubic Policies - Economic Guidance – Market.

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CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O planejamento econômico e social, a partir das complexas formas de organização das

empresas públicas e privadas, tornou-se um instrumento de orientação da ação econômica dos

estados, seja nas economias planificadas como foi o caso da URSS (União das Republicas

Socialistas Soviéticas), a partir de 1917, seja nos estados capitalistas a partir da década de 1930,

em especial na Europa e mais recentemente no Brasil, sobre a alegação da necessidade de um

estado responsável pelo bem estar social, com referência no bastante propalado welfare state.

O processo de orientação econômica sempre se deu mediante uma condução estatal

através dos instrumentos diretos de orientação como leis, normas, decretos, súmulas, portarias,

bem como diversas outras formas regulamentadoras de gastos ou investimentos que direcionam

politicamente os gastos públicos seja na esfera social ou particular. Deu-se também por

instrumentos indiretos como as políticas fiscais, cambiais, monetárias e seus desdobramentos

como taxa de juros, deposito compulsório, controle dos níveis de preços entre outros. A

dinâmica entre instrumentos diversos são orquestrados pelo mercado, embora o estado

capitalista, burguês, também o faça diretamente em nome de toda sociedade, muitas vezes, em

referência aos trabalhadores sobre égide da geração de emprego e renda, articulando os dois

tipos de instrumentos mediante incentivo às empresas para instalação de novas fabricas,

terceirização dos serviços públicos para “dinamizar” o trabalho, redução ou isenção de

impostos industriais visando aumento da produção e da produtividade e assim por diante.

Essas intervenções ocorrem mediante a imperativa alegação da modernização

socioeconômica e da empregabilidade, que possibilitam entre tantas ações: terraplanagem para

instalação de empresas, ampliação da malha rodoviária e ferroviária, modernização dos portos,

edificações diversas, formação profissional em escolas públicas e técnicas, financiamento da

formação de trabalhadores em escolas privadas, entre outras medidas ou políticas orientadas

pelo uso dos recursos públicos que seguem processualmente sendo formatadas pelos

instrumentos diretos e indiretos, muito mais para atender a produtividade infraestrutural

privada e mercadológica do que às demandas sociais apregoadas.

Neste processo histórico de completo enlace propiciado pelo liberalismo econômico,

nas diversas formas de governo tem-se como normalidade o mercado como principal regulador

de competências, de qualidade de produtos e produtividade, de gestão eficaz e, inclusive, de

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estética da “qualidade de vida” social. Assim, a atuação do estado tem se dado de maneira que a

ação no fornecimento de serviços e no respeito aos direitos sociais dos trabalhadores ocorrem

por exclusão ou complementaridade, a partir das atividades que não despertam interesse

peremptório do mercado como algumas áreas de necessidades e demandas sociais

evidentemente complexas do ponto de vista da gestão lucrativa como segurança, saúde,

educação, algumas indústrias de fomento ou de insumos para produção em larga escala,

especialmente, para o caso do bom desempenho de empresas estrangeiras, de forma direta ou

indireta, mediante a busca ou “lida” com “atração de capital externo”.

Este processo, é certamente complexo, e por isso sugere reflexões sobre aquilo que é

público, o que é privado e também sobre o “público não-estatal” conforme Pereira (1999).

Entretanto, esta perspectiva é muito pouco ou quase nada discutida entre os diretamente

interessados (cidadãos comuns), pois a organicidade propiciada pelo capital metamorfoseia as

relações e camufla a criticidade do processo educativo e político necessário ao esclarecimento

social e popular.

Nesta esteira, por absoluto domínio do planejamento indicativo que consiste na

organização produtiva pelo setor privado formador de uma engrenagem de articulação para

negócios e atuação do mercado na maior amplitude de demanda possível, cujas diretrizes se

baseiam na especulação pela melhor proposta resultante de uma guerra fiscal devastadora da

natureza pública dos entes federais, estaduais e/ou municipais, quebra-se, desarticula-se a

política de estado em diversas áreas, através das privatizações, terceirizações, publicizações em

nome de um Estado “leve”, eficiente, gerencial e dinâmico, embora os princípios

dinamizadores sejam liberais como a flexibilização do trabalho, a competitividade extremada e

o laissez faire, que devastam as relações sociais em nome das técnicas, ou modernidade

tecnológica, “necessária” e sem culpas.

Assim, esta dinâmica, portanto, produz em algum momento uma confusão proposital

entre aquilo que é público e o que é privado generalizando a noção de setor produtivo e

dinamizando uma inter-relação para a subsunção do que é público ou do que é um direito social

à dinâmica do capital mercadologizante.

Neste contexto, torna-se “natural” a precarização das áreas onde ainda dispõe da

mínima atuação do estado, passando, este, a agir por ações fragmentadas, descontinuas e

pontuais chamadas de políticas públicas (observa-se editais demorados e insuficientes nos

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repasses para atendimento a demandas populares), embora existam algumas possibilidades de

políticas de estado, quando este porta alguma estabilidade econômica, financeira, social e

política capaz de revestir-se de coerências internas, externas e políticas, conforme Miglioli

(1983).

Com efeito, de maneira geral, política pública tem sido sinônimo da fragmentação da

atuação temporária do estado ou muito mais de governo, antes de ser planejada e compreendida

pelo mercado como intervenção em setores ou áreas específicas. Pode ser sinônimo de

planejamento estatal orientado e garantido em planos, programas ou projetos viabilizados por

lei e implementado diretamente do estado à população, embora não raro do ponto de vista

capitalista, em alguns casos o seja a realização da produção.

No Brasil, atualmente, a mescla de políticas públicas intencionadamente ou

sabidamente desintegradas favorece a atuação da iniciativa privada em qualquer setor ou área, o

que demanda antes ser determinadas por um planejamento de atuação exclusiva do estado,

conforme mencionado, como ação de complementaridade e por tempo determinado em metas

definidas e com participação democrática a mais ampla possível.

Este estudo, portanto, discute alguns comportamentos políticos de estado previsível a

luz das teorias econômicas tradicionais, cujos argumentos, ideologicamente, justificam uma

dinâmica que permite mitigar ações para diversas variações ou falhas que o mercado possibilita,

antes chamada de intervenção ou atuação de responsabilidade exclusiva, para posteriores

políticas de “varejo”, fragmentadas de acordo com o interesse de cada seguimento

mercadológico, em alguns casos setores. Ressalte-se que este estado capitalista, em ambas as

situações, é eminentemente burguês e assim, conduzido claramente pelas leis de mercado ou

“mão visível” da classe dominante, conforme Sanfelice (2005).

A sustentação teórica desse estudo deu-se, a partir de um arrazoado teórico explicativo

num diálogo crítico com sustentação de ordem histórica, fundada nas contradições dos

processos e objetivos de orientação socioeconômicos, obedecendo a uma totalidade sistêmica

planejada sobre uma lógica de acumulação de capital hierarquicamente estabelecida por

competitividade e propulsão individualista de caráter neoliberal, segundo Silva (2001).

Discute-se, portanto, um processo econômico histórico gerador de justificativas teóricas

para a dominação classista que constrói concepções de políticas públicas em lugar da

participação do estado na vida da sociedade. Esse estado tem agido em complementaridade às

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ações de mercado ou do setor privado com efeitos liberais, efetivamente, por uma via de menor

custo para com os setores populares.

Assim, o eixo central das reflexões é o modo de intervenção do estado que tem se dado

em escalas macro agregadas ou particulares, ou seja, políticas públicas no “atacado” ou no

“varejo” conforme evolui o gosto desorganizado do “cliente consumidor” e desta forma,

preferem-se setores populares que quanto mais instáveis ou vulneráveis, tornam-se propícios à

sua implementação pela dificuldade de auto-organização e politização.

Os resultados deste estudo ou esta compreensão a respeito das políticas públicas deve-se

à execução de leituras no Grupo de Estudos e Pesquisas em Economia Popular e Solidária e

Desenvolvimento Local na linha política pública como uma das estratégias de mobilização da

economia dos setores populares para a disputa política de classe no capo de uma economia não

tradicional – a economia popular e solidária conforme Razeto (1999).

POLÍTICAS PÚBLICAS OU INTERVENÇÃO DESINTEGRADA

Em um dado momento histórico a forte presença do estado agindo de forma a garantir os

direitos sociais, cuja participação e nível de consciência política se revestiam de

posicionamento político de sociedade civil organizada, classista e marcada pela indústria como

engrenagem central diferenciadora entre o público e o privado, possibilitava ações integrais que

nutria toda sociedade com produtos e serviços nos mais altos níveis de inventividade,

criatividade ou avanços tecnológicos a bem do consumo da maioria, mesmo com ofertas

controladas por uma classe mediante monopólios e oligopólios em que a oferta cria sua própria

demanda.

Esta perspectiva, entretanto, com o advento do estado mínimo passa a ser desenvolvida

de acordo com as necessidades mercadológicas, indicadas, inclusive, pela sociedade em

processo de organização, porque fora revertida sua dinâmica de organização, anteriormente,

orientada pelo trabalho industrial, para, posteriormente, orientado pelo grande setor de

serviços, principalmente, financeiros.

Nesta esteira, os diretos sociais representados pela educação, saúde, segurança,

transportes, comunicação, água e esgoto, telecomunicações entre outros passaram a ser

produtos ou serviços conduzidos no “varejo” pelos mercados setorizados para atender

indivíduos responsáveis pelas “suas” escolhas, mas, ao mesmo tempo inter-relacionados pela

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precarização do trabalho e financiados pelos próprios trabalhadores através do credito

repassado pelo estado numa nova dinâmica econômica. Esse processo engenhoso dificulta,

assim, a compreensão e reação política da maior classe (trabalhadora) e facilita a mercadologia

e diminui os riscos nos investimentos da menor classe, entretanto, mais poderosa.

Neste contexto, o processo de criação e articulação das políticas públicas tem variado

bastante e se intitulado, inclusive, de políticas de desenvolvimento, conduzindo-se de forma

globalizada, macroeconomicamente, de “cima para baixo”, hierarquizando continentes, países,

estados, regiões, localidades e pessoas, atribuindo-se a algumas nações escalas de

desenvolvimento gradativo, para justificar suas necessidades, como subdesenvolvidas,

emergentes ou em desenvolvimento como se fosse um processo de sucessiva evolução; ideia

que não passa de expectativa desenvolvimentista frustrante, conforme Furtado (1981).

Nesta lógica desenvolvimentista, qualquer dimensão organizativa estatal está passível

de políticas públicas interativas, interventiva ou corretiva, depende, apenas, da gradação de

necessidades, entretanto, nas localidades, as políticas públicas se confundem com a atuação do

setor privado, porque manifesta a clara intenção de empreender negócios sobre

impulsionamento público mediante incentivos fiscais de diversas ordens com base no

argumento da geração de emprego e renda, inclusive, induzindo de forma patrimonialista as

compras públicas ou execução de serviços públicos como segurança, transportes, limpeza

pública, entre outros de forma direta ou direcionada, muitas vezes bancando custos maiores que

se executado diretamente pelo ente público.

Boneti (2006: 62-63) esclarece que:

(...) toda política pública é originada de uma ideia e esta de um princípio, de

uma pressuposição ou de uma vontade. Portanto, a palavra não carrega consigo apenas o significado literal do termo, mas algo mais, o contexto dos

fatores determinantes que dão origem a uma ideia de política pública, como o

caso da conjugação de interesses, as inserções ideológicas, as concepções científicas, as correlações de forças sociais etc. (BONETI, 2006 p. 62-63)

Nesta esteira, compreende-se que políticas sociais de renda mínima não é

necessariamente uma política pública de distribuição de renda, como alguns governantes, a

partir da década de 1990, insistem em classificá-las, pelo contrário tem como objetivo fundante

incentivar a produção na mesma proporção do conjunto dos fatores de produção (capital e

trabalho) para realização do consumo e com isso dinamização do crescimento econômico,

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confundido, propositadamente, não raro, com desenvolvimento ou mobilidade de classe. Nesta

perspectiva, observa-se que cada R$ 1(um real) investido no programa de transferência de

renda Bolsa Família, por exemplo, gera um aumento de R$ 1,78 no Produto Interno Bruto (PIB)

do Brasil, segundo um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) divulgado

em 15/10/2013 em Brasília.

Ressalte-se que não há possibilidade, entretanto, de distribuição de renda mantendo-se o

processo de acumulação nas mesmas proporções ou até maiores, especialmente, em setores que

sempre acumulam capital como a indústria pesada, o agronegócio e o mercado financeiro e, por

fim, de bens de consumo imediato, em detrimento de alguns setores que quanto mais cresce as

necessidades inerentes, no máximo se mantêm a mesma proporção de investimentos,

insuficientes para os saltos qualitativos necessários ao desenvolvimento integral esperado das

políticas específicas:

No campo da educação, a política pública no Brasil mantém as características que também estão presentes na previdência, saúde e saneamento. Segue a

lógica da expansão desigual no tempo e no espaço; do atendimento deficitário

à população pobre; dos gastos excessivos, que se perdem na manutenção da burocracia e pouco contribuem para os fins propostos; do repasse dos recursos

a setores do empresariado, na perspectiva de sua concentração na esfera

privada; da ausência da redistribuição da riqueza na perspectiva social.

(MEKSENAS 2002 p.116).

Neste contexto segundo Schaff (2007), fazendo-se uma reflexão de acontecimentos

sócio-políticos promissores do ponto de vista do progresso sociotecnológico, compreende-se

três revoluções técnico-científicas: a primeira revolução industrial que substituiu a força física

do homem pela energia das máquinas (vapor e eletricidade); a segunda revolução amplia as

capacidades intelectuais do homem, inclusive substituídas por autômatos, que elimina com

êxito crescente o trabalho humano na produção e nos serviços, a exemplo da engenharia

genética; e, a terceira a revolução energética, com a criação de novas fontes de energia.

Sintetiza-se, portanto, as três revoluções técnico-científica na tríade revolucionária –

microeletrônica, microbiologia e energia nuclear. Estas revoluções, entretanto, contribuem para

desarrumar a organização do fator trabalho, o que torna os trabalhadores vulneráveis a

problemas indicadores de implementação de políticas pontuais para tentar equilibrar

novamente a organização do trabalho.

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Neste contexto Schaff (2007), aponta que a sociedade futura não será nem

capitalista e nem socialista, denominando-a de sistema de economia coletivista, economia

capitalista privada e economia social capitalista. Ao tratar das mudanças sociais nesta

sociedade, afirma que a eliminação do trabalho não significa o desparecimento da atividade

humana, que pode adquirir formas das mais diferentes ocupações.

Compreende-se, portanto, que o desaparecimento do trabalho não é possível, apenas,

ocorreram possibilidades de mudanças na forma de ocupação humana ou, metamorfoseou-se

em diversas outras formas socioprodutivas.

Contraditoriamente, mesmo se consideramos os avanços tecnológicos e todas as

revoluções e evoluções nas técnicas de trabalho, percebe-se que o ritmo ou a jornada de

trabalho não tem reduzido, pelo contrario, em alguns casos, tem-se intensificado sem

acréscimos quantitativos de rendimentos para o trabalhador envolvido neste processo de

reestruturação produtiva:

Os processos recentes de reestruturação produtiva, que envolvem inovações

técnico-organizacionais, apesar de todas as falácias, só em poucas situações ampliam esses graus de liberdade e tornam o trabalho mais autônomo e

criativo. Na maioria das vezes, tendem a diminuí-los, em razão da existência

de esquemas de controle de tempo e métodos muito mais rígidos, introduzidos mediante procedimentos informatizados, em substituição aos velhos

esquemas de supervisão, mais facilmente burláveis. Pesquisas recentes que

têm por objeto o estudo dos processos de trabalho nos setores mais dinâmicos da economia capitalista mostram sinais de intensificação do ritmo de trabalho,

e não de incorporação de conteúdos mais elaborados e de maior autonomia.

(MANFREDI, 2002, p. 46).

O processo de alienação do trabalhador se intensifica e a necessidade do trabalho ou

atividade humana como alguns tentam nominá-lo em seu significado mais próximo é cada vez

mais clara e presente no processo econômico integral. O conceito de trabalho como principio

educativo que concebe o trabalho enquanto práxis humana, ou seja, como o conjunto de ações

materiais e não materiais que são desenvolvidas pelo homem, enquanto indivíduo e coletivo, ao

longo da história, para construir as condições de existência, através do qual, estão postas as

bases para compreendê-lo para além da práxis produtiva tal como tem sido dominante sob a

égide do capital, elegeu a forma assalariada como sua expressão mais moderna, segundo

Kuenzer (2011).

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Neste contexto, as políticas públicas favorecem a empregabilidade precarizadas,

normalmente, terceirizada, mas, a benefício da “contrataualização” do trabalhador, modelo

empregatício do passado para algumas economias, mas, com justificativa de futuro em

equivalente dominação para outras.

Com efeito, a sociedade humana, ao longo da sua história sempre foi, não raro,

permeada por lutas e contradições entre comunidades diferentes, pela dominação de um grupo

sobre outro. Nessa relação de dominação, os grupos dominantes utilizavam a força de trabalho

dos grupos dominados, os quais eram subjugados a essa condição e qualquer instrumento

(medida) político de intervenção estatal dominante, visava, apenas, justificar situações pontuais

para tentar garantir um equilíbrio fictício entre grupos.

Neste contexto, por acreditar que os sujeitos sociais em grupo dizem mais da sua

história do que os indivíduos separadamente, resta entender que, contraditoriamente, todos

esses temas, questões, problemas, políticas, relacionam-se e que nossa opção de analise política

tem posicionamento classista, por termos privilegiado a dialética de bases materialista e

histórica, pois, constitui-se em analise ontologia, com epistemologia que nos conduz a

compreender e explicar as relações substantivas que os homens estabelecem com a natureza e

consigo mesmos, através de toda a história. Neste caso, utiliza-se da polissemia própria das

palavras “política” e “público” para uma “confusão” proposital no que se refere à dominação

pelo trabalho e dos rendimentos destes via políticas públicas.

Nesta esteira, compreende-se a dialética materialista histórica como uma postura, um

método e uma práxis, conforme argumenta Sanfelice (2008), que facilita o entendimento sobre

a articulação entre instrumentos diretos e indiretos de orientação econômica e social capazes de

confundir, intercalar-se e articular-se sobre o comando do estado capitalista de forma alienante

que nos leva às vezes a subjetivação de que o estado também somos nós enquanto sociedade

civil e que estas tais políticas públicas somos nós que criamos segundo nossas necessidades.

Com efeito, não percebemos, portanto, que estamos perdendo cada vez mais e que

estamos tendo um atendimento no “varejo” do que antes era no “atacado” e que aquilo que era

público ora se apresenta como privado e o privado como público, direitos confunde-se com

serviços fazendo desaparecer a relevante noção de setor, outrora muito útil à compreensão do

trabalhador sobre a complexa sociedade em que vive, por isso é complexo entender dentro das

políticas públicas a que e a quem se destina, bem como sua totalidade/integralidade.

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A ECONOMIA POPULAR E SOLIDÁRIA COMO UMA MANIFESTAÇÃO DE

AECONOMIA POLÍTICA

O movimento da economia popular e solidária diferencia-se em bases nacionais e locais

pelas próprias dinâmicas inerentes a cada dimensão, em especial, observadas nas relações do

amplo campo de trânsito desta economia, conforme se observa na Figura 1.

Segundo relato da Secretaria Executiva do Fórum Brasileiro de Economia Solidária

(FBES) esta economia pauta-se por uma trajetória de movimento que circunda em torno do

espaço e da agenda do Fórum Social Mundial (FSM), destacando-se fortes elementos

constitutivos da recente trajetória da economia solidária no Brasil, a exemplo da constituição do

Grupo de Trabalho Brasileiro da Economia Solidária criado em 2001 para articular e mediar a

participação nacional e das redes internacionais da Economia Solidária no I FSM. (FÓRUM,

2012).

O GT Brasileiro foi constituído de organizações e redes de uma diversidade de práticas

e segmentos da Economia Popular e Solidária: campo, cidade, práticas diminutas, práticas

complexas, igreja, bases populares, bases sindicais, universidades, movimentos sociais

populares, práticas governamentais, práticas de apoio ao crédito, práticas de redes de

informação, vínculos às bases nacionais, bem como às redes internacionais.

Nesta esteira, encontram-se 12 (doze) entidades e redes nacionais de fomento que em

momentos e níveis diferentes participaram do GT Brasileiro como Rede Brasileira de

Socioeconomia Solidária (RBSES); Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS);

Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional (FASE); Associação Nacional

dos Trabalhadores de Empresas em Autogestão (ANTEAG); Instituto Brasileiro de Análises

Socioeconômicas (IBASE); Caritas Brasileira; Movimento dos Trabalhadores Sem Terra

(MST/CONCRAB); Rede Universitária de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas

Populares (ITCP); Agência de Desenvolvimento Solidário (ADS/CUT); Rede

UNITRABALHO; Rede Brasileira de Gestores de Políticas Públicas da Economia Solidária e a

Associação Brasileira de Instituições de Microcrédito (ABICRED).

Com efeito, neste processo ao final de 2002, o GT Brasileiro deparou-se com a vitória

do Presidente Luís Inácio Lula da Silva. Naquele momento decidiu-se por encaminhar uma

carta ao Governo Lula propondo a criação de uma política de apoio à economia solidária, cuja

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A PROPÓSITO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS: A ECONOMIA POPULAR E SOLIDÁRIA COMO UMA MANIFESTAÇÃO DE

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carta foi reforçada e ampliada na I Plenária Nacional que iniciou o debate sobre uma

Plataforma, uma Carta de Princípios e a criação de um Fórum Nacional da Economia Solidária.

Desta forma, as negociações junto ao governo Lula avançaram positivamente. A II

Plenária Nacional aconteceu no FSM-2003 e as decisões de mobilizações pelo país

potencializaram o compromisso do Governo Federal em criar a Secretaria Nacional da

Economia Solidária sob a direção do professor Paul Singer. Esta II Plenária Nacional, realizada

durante o FSM, decidiu mobilizar as bases estaduais – até então com poucos Fóruns e

articulações estaduais – para o debate sobre a identidade (Carta de Princípios), a Plataforma de

Lutas, o caráter e a composição do Fórum Nacional de Economia Solidária a ser criado, o que

mobilizou 18 (dezoito) estados a realizarem suas plenárias preparatórias.

Neste processo, a III plenária nacional cria o FBES na intenção de duas tarefas

fundamentais: a mediação e a mobilização com mais de 800 representantes, delegados das 18

plenárias estaduais, com a incumbência de articular e mobilizar as bases da economia solidária

pelo país em torno de uma Carta de Princípios e uma Plataforma de Lutas, ali aprovadas, e de

fazer a interlocução junto ao governo, em especial, junto à recém-criada SENAES (Secretaria

Nacional da Economia Solidária).

A Secretaria Nacional da Economia Solidária assumiu a Plataforma de Lutas como parte

de seu Plano de Governo. A III Plenária definiu também a composição e o funcionamento do

FBES. Na sequência, o I Encontro Nacional dos Empreendimentos da Economia Solidária

(agosto/ 2004) reuniu 2.500 (dois mil e quinhentos) representantes de todos os estados

brasileiros, onde foram criados Fóruns ou comissões pró-fóruns estaduais. Em alguns Estados,

a ampliação do Fórum consiste em estruturar fóruns sub-regionais e municipais. É assegurada,

considerada como avanço, a participação majoritária dos empreendimentos.

Por conseguinte, a economia solidária aparece no centro do FSM-2005, desafiada a gerir

o abastecimento, a comercialização, a moeda social, as rodadas de negócios, a campanha pelo

consumo consciente contra os produtos transgênicos, nocivos das transnacionais e a realizar os

debates articulados entre as redes nacionais e internacionais. Por isso, diz-se que não só outro

mundo é possível, mas que outra economia já acontece, conforme assinala Singer (2002).

Com efeito, neste processo foi se delineando, segundo França Filho (2010), o campo de

atuação da economia solidária no Brasil, na medida em que sua estrutura política de movimento

foi se configurando e se articulando numa malha, conforme Figura 1. É relevante ressaltar que a

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dinâmica da Economía Popular e Solidaria, no seu conjunto das atividades agregadas do

dia-a-dia, é bem maior do que o que se enxerga nesses momentos de mobilização contextuais;

entretanto, não resta dúvidas de que a história contada nos relatos formais do FSM e dos agentes

e iniciativas envolvidas é algo, de fato, animador e capaz de potencializar-se como uma

economia política dos setores populares.

Figura 1 – Representação do campo de atuação da Economia Solidária no Brasil

Fonte: SENAES (2011).

A Figura 1 mostra que, centralizados em torno da economia solidária, diversos agentes

atuam formando o movimento nacional em defesa de outra lógica de desenvolvimento em que

interagem, de forma integrada, ações governamentais e não governamentais conduzindo a vida

de 1.687.035 (um milhão, seiscentos e oitenta e sete mil e trinta e cinco) trabalhadores, sendo

63% homens e 37% mulheres, segundo o SIES/2007, espalhados pelas diversas regiões do

Brasil em um processo educativo, autogestionário, cooperativo e solidário, com protagonismo

oposto ao processo empresarial alienante imposto pela economia tradicional.

Incubadoras universitárias, neste movimento entidades de apoio e fomento, portanto, é

capaz através da pesquisa, extensão, incubação e diálogo com as comunidades locais esclarecer

e ou potencializar as melhores práticas, princípios e experiências, bem como contribuir para a

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desarticulação das armadilhas (formas dissimuladas de diálogos, por exemplo) da vala comum

do modo de produção capitalista.

Diante de toda esta trajetória intensa, porém, recente, como compreender que a

Economia Popular e Solidária assume ou pode vir a assumir as dimensões educativas dos

processos de trabalho, contrapondo-se a alienação imposta pelo processo econômico tradicional

a partir do comando dos trabalhadores? Responder a esta indagação não é uma tarefa simples,

entretanto, o mapa acima (figura) – advindo de reflexões a partir dos relatórios do FBES – dar

de alguma forma o tom sobre a maneira e a diversidade de áreas comprometidas com a

construção desta economia. Além disso, os estudos demonstram as incubadoras universitárias

postando-se nesta frente.

Neste contexto, Tiriba (2000) destaca, entre outros argumentos e eixos de discussões,

situações que denotam esta possibilidade de protagonismo: na primeira, indica que, como

elemento de produção da vida social, o processo de trabalho é, em si, educativo. Ressalta que,

ao longo da história, como estratégia de sobrevivência e/ou de produção de uma nova

sociedade, uma parcela da classe trabalhadora tem vivido experiências associativas que se

constituem como “escolas” de produção de uma cultura do trabalho e que, de alguma maneira,

contrariam a lógica excludente do modo de produção capitalista; na segunda situação, assinala

os atuais movimentos de trabalhadores associados – considerando que a crise do paradigma

keynesiano, que pressupõe a ação protetora do Estado a todos os cidadãos, levou às últimas

consequências a marginalização e a exclusão da população do direito ao trabalho, saúde,

educação e previdência social; na terceira, à luz do materialismo histórico, revisitando as

categorias “produção associada”, “autogestão” e “cultura do trabalho”, fazendo referência a

diferentes contextos históricos em que os trabalhadores tomaram para si os meios de produção.

Destaca-se, nesse sentido, o movimento por uma Economia Popular e Solidária que,

segundo Tiriba (2008), desde o final da década de 1980, com a crise estrutural do emprego, se

constrói, em âmbito latino-americano, a possibilidade que se constitui na busca de fundamentos

de uma “pedagogia da produção associada”.

Com efeito, uma educação emancipatória e, nesta perspectiva, preocupada com a

formação integral do homem e a superação da sociedade baseada na exploração do homem pelo

homem, está presente já há muitos séculos na história da humanidade, segundo Freire (1987).

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Neste sentido, diversos educadores, pedagogos, filósofos e intelectuais se dedicaram a

essa busca, e ainda hoje nos inspiram a continuar na busca do empoderamento do homem na

perspectiva do associativismo, cooperativismo e da solidariedade, conforme Luckesi (2005).

Dessa maneira, mesmo diante de boas perspectivas de organização dos trabalhadores

sobre a égide desta economia, o processo de organização não tem sido retilíneo, sincrônico,

nem fácil de ser orientado, tendo em vista um legue de dificuldades enfrentadas pelas

iniciativas de Economia Popular e Solidária, até mesmo se amparadas por politicas públicas,

porque nem todas atendem aos preceitos de uma economia politica dos setores populares.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A propósito das políticas públicas, percebe-se que existe uma intenção de confundir

presença e ausência de estado pelos seus extremos, embora um tenha sido empreendedor e de

bem estar e o outro mínimo, entretanto, no que se refere à forma de exploração e controle dos

instrumentos de orientação de que se utilizam são os mesmos, ainda que agudizem o mal estar

de formas diferenciadas.

Portanto, o objetivo de compreender o processo socio-histórico gerador das

compreensões sobre as políticas públicas como possibilidade “inovadora” da responsabilidade

do estado, faz-se, necessário entende-las como uma panaceia que cobre os “furos” de ausência

de um estado e de um mercado que outrora fornecia um equilíbrio social, mediante o

auto-ajustes das forças de oferta de demanda por bens e serviços privados, públicos, alguns

antes denominados de direitos, mas, que justificava o processo produtivo capitalista por algum

tempo e em alguns lugares como modelo inerente aos competentes, instruídos, avançados e

eficientes agentes referenciados na melhor industrialização.

Com efeito, percebe-se que a escala crescente de necessidade de acumulação do capital

de forma globalizante, contraditoriamente, desnudou os desníveis entre continentes, países,

regiões, estados, localidades e indivíduos, permitindo, o entendimento político de que uma

dessas unidades econômicas, paradoxalmente as mais fracas ou menos desenvolvidas

financiavam as mais fortes ou desenvolvidas, facilitando o entendimento sobre o fluxo

hierarquizado de acumulação do capital e das riquezas produzidas.

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Nesta perspectiva, a justificativa para cobrir os rápidos, ditos, cíclicos desequilíbrios do

mundo capitalista tem tentado dar uma “nova velha” resposta que são as políticas públicas no

lugar da intervenção do estado, mas, tem indicado a necessidade de outro estado que seja

conduzido pela maioria dos sujeitos e não das unidades econômicas de produção e consumo.

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