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    $ % ' ( 0 1) 2 4 3 5 0 8 9 1

    @ A C D F H C P Q S P T U V

    X Y ` a c e f g i c

    O Princpio da Induo um eficiente instrumento para a demonstrao de fatos

    referentes aos nmeros naturais. Por isso deve-se adquirir prtica em sua utilizao. Por outrolado, importante tambm conhecer seu significado e sua posio dentro do arcabouo da

    Matemtica. Entender o Princpio da Induo praticamente o mesmo que entender os

    nmeros naturais.

    Apresentamos abaixo uma breve exposio sobre os nmeros naturais, onde o

    Princpio da Induo se insere adequadamente e mostra sua fora terica antes de ser utilizado

    na lista de exerccios propostos ao final.

    p q s u v w x Y X

    se c

    uY

    va c

    uY

    s` f a

    sX

    u

    Os nmeros naturais constituem um modelo matemtico, uma escala padro, que nos

    permite a operao de contagem. A seqncia desses nmeros uma livre e antiga criao do

    esprito humano. Comparar conjuntos de objetos com essa escala abstrata ideal o processoque torna mais precisa a noo de quantidade; esse processo (a contagem) pressupe portanto

    o conhecimento da seqncia numrica. Sabemos que os nmeros naturais so 1, 2, 3, 4, 5,

    A totalidade desses nmeros constitui um conjunto, que indicaremos com o smbolo

    e que

    chamaremos de conjunto dos naturais. Portanto = {1, 2, 3, 4, 5,}.

    Evidentemente, o que acabamos de dizer s faz sentido quando j se sabe o que um

    nmero natural. Faamos de conta que esse conceito nos desconhecido e procuremos

    investigar o que h de essencial na seqncia 1, 2, 3, 4, 5 .

    Deve-se a Giussepe Peano (1858-1932) a constatao de que se pode elaborar toda a

    teoria dos nmeros naturais a partir de quatro fatos bsicos, conhecidos atualmente como os

    axiomas de Peano. Noutras palavras, o conjunto dos nmeros naturais possui quatro

    propriedades fundamentais, das quais resultam, como conseqncias lgicas, todas as

    afirmaes verdadeiras que se podem fazer sobre esses nmeros.Comearemos com o enunciado e a apreciao do significado dessas quatro proposies

    fundamentais a respeito dos nmeros naturais. q

    cu s

    X c s u

    ev v s

    Y c

    Um matemtico profissional, em sua linguagem direta e objetiva, diria que o conjunto

    dos nmeros naturais caracterizado pelas seguintes propriedades:

    A. Existe uma funo s : , que associa a cada n um elemento s(n) ,chamado o sucessor de n.

    B. A funo s :

    injetiva.

    C. Existe um nico elemento 1 no conjunto

    , tal que 1 s(n) para todo n

    .

    D. Se um subconjuntoX

    tal que 1

    e s(X) X(isto , nXs(n) X), entoX=

    .

    Observe que, como estamos chamando de

    o conjunto dos nmeros naturais, a

    notao n

    significa que n um nmero natural.

    As afirmaes A, B, C e D so os axiomas de Peano. A notao s(n) provisria. Depois dedefinirmos adio, escreveremos n + 1 em vez de s(n).

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    Como concesso fraqueza humana, nosso matemtico nos faria a gentileza de

    reformular os axiomas de Peano em linguagem corrente, livre de notao matemtica. E nos

    diria ento que as afirmaes acima significam exatamente o mesmo que estas outras:

    A'. Todo nmero natural possui um nico sucessor, que tambm um nmeronatural.

    B'. Nmeros naturais diferentes possuem sucessores diferentes. (Ou ainda: nmeros quetm o mesmo sucessor so iguais.)

    C'. Existe um nico nmero natural que no sucessor de nenhum outro. Este nmero representado pelo smbolo 1 e chamado de "nmero um".

    D'. Se um conjunto de nmeros naturais contm o nmero 1 e, alm disso, contm osucessor de cada um de seus elementos, ento esse conjunto coincide com

    , isto ,

    contm todos os nmeros naturais.

    A partir da, retomamos a palavra para dizer que o sucessor de 1 chama-se "dois", osucessor de dois chama-se "trs", etc. Nossa civilizao progrediu ao ponto em que temos um

    sistema de numerao, o qual nos permite representar, mediante o uso apropriado dos

    smbolos 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9, todos os nmeros naturais. Alm disso, nossa linguagem

    tambm fornece nomes para os primeiros termos da seqncia dos nmeros naturais.

    (Nmeros muito grandes no tm nomes especficos, ao contrrio dos menores como "mil

    novecentos e noventa e oito". Quem sabe, por exemplo, o nome do nmero de tomos douniverso?)

    Voltando a usar a notao s(n) para o sucessor do nmero natural n, teremos ento 2

    = s(1), 3 = s(2), 4 = s(3), 5 = s(4), etc. Assim, por exemplo, a igualdade 2 = s(1) significa

    apenas que estamos usando o smbolo 2 para representar o sucessor de 1. A seqncia dosnmeros naturais pode ser indicada assim:

    sssss 54321

    As flechas ligam cada nmero ao seu sucessor.

    Nenhuma flecha aponta para 1, pois este nmero no sucessor de nenhum outro. O

    diagrama acima diz muito sobre a estrutura do conjunto

    dos nmeros naturais.

    qc

    s X c

    se

    sX Y e f g i c

    Um dos axiomas de Peano, o ltimo, possui claramente uma natureza mais elaborada

    do que os demais. Ele conhecido como o axioma da induo. Faremos dele uma anlise

    detida, acompanhada de comentrios.

    O significado informal do axioma D que todo nmero natural pode ser obtido apartir de 1 por meio de repetidas aplicaes da operao de tomar o sucessor. Assim, por

    exemplo, 2 o sucessor de 1, 3 o sucessor do sucessor de 1, etc. Para se entender melhor o

    axioma da induo util examinar o exemplo, no qual

    = {1, 2, 3,} mas a funo s :

    modificada, pondo-se s(n) = n + 2. Ento, se comearmos com 1 e a este nmero

    aplicarmos repetidamente a operao de tomar o "sucessor" (nesta nova acepo) obteremoss(1) = 3, s(3) = 5, s(5) = 7, etc., e nunca chegaremos a qualquer nmero par. Portanto, o

    diagrama

    ssssss 642531

    exibe uma funo injetiva s : para a qual no verdade que todo nmero natural npode ser obtido, a partir de 1, mediante repetidas aplicaes da operao de passar de kpara

    s(k).

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    Dentro de um ponto de vista estritamente matemtico, podemos reformular o axioma

    da induo do seguinte modo: Um subconjuntoX chama-se indutivo quando s(X) X, ouseja, quando nX s(n) X, ou ainda, quando o sucessor de qualquer elemento de Xtambm pertence aX.

    Dito isto, o axioma da induo afirma que o nico subconjunto indutivo de

    que contm o

    nmero 1 o proprio

    .

    No exemplo acima, os nmeros mpares 1, 3, 5, formam um conjunto indutivo que

    contm o elemento 1 mas no igual a

    .O papel fundamental do axioma da induo na teoria dos nmeros naturais e, mais

    geralmente, em toda a Matemtica, resulta do fato de que ele pode ser visto como um mtodo

    de demonstrao, chamado o Mtodo de Induo Matemtica, ou Princpio da Induo

    Finita, ou Princpio da Induo, conforme explicaremos agora.

    Seja P uma propriedade que se refere a nmeros naturais. Um dado nmero natural

    pode gozar ou no da propriedade P.

    Por exemplo, seja P a propriedade de um nmero natural n ser sucessor de outro

    nmero natural. Ento 1 no goza da propriedade P, mas todos os demais nmeros gozam de

    P.

    O Princpio da Induo diz o seguinte:

    Princpio da Induo: Seja P uma propriedade referente a nmeros naturais. Se 1 goza de Pe se, alm disso, o fato de o nmero natural n gozar de P implica que seu sucessor s(n)

    tambm goza, ento todos os nmeros naturais gozam da propriedade P.

    Para ver que o Princpio da Induo verdadeiro (uma vez admitidos os axiomas de

    Peano) basta observar que, dada a propriedade P cumprindo as condies estipuladas no

    enunciado do Princpio, o conjunto X dos nmeros naturais que gozam da propriedade P

    contm o nmero 1 e indutivo. LogoX= , isto , todo nmero natural goza da propriedade

    P. As propriedades bsicas dos nmeros naturais so demonstradas por induo. Comecemos

    com um exemplo bem simples.

    Exemplo 1. Entre os axiomas de Peano no consta explicitamente a afirmao de que todo

    nmero diferente do seu sucessor, a qual provaremos agora. Seja P esta propriedade. Maisprecisamente, dado o nmero natural n, escrevamos P(n) para significar, abreviadamente, a

    afirmao ns(n). Ento P(1) verdadeira, pois 1 s(1), j que 1 no sucessor de nmeroalgum; em particular, 1 no sucessor de si prprio. Alm disso, se supusermos P(n)

    verdadeira, isto , se admitimos que

    ns(n), ento s(n) s(s(n)), pois a funo s : injetiva. Mas a afirmao s(n) s(s(n) significa que P(s(n)) verdadeira. Assim, a verdade de P(n) acarreta a verdade

    de P(s(n)). Pelo Princpio da Induo, todos os nmeros naturais gozam da propriedade P, ou

    seja, so diferentes de seus sucessores.

    Nas demonstraes por induo, a hiptese de que a propriedade P vlida para o

    nmero natural n (da qual deve decorrer que P vale tambm para s(n)) chama-se hiptese de

    induo.O Princpio da Induo no utilizado somente como mtodo de demonstrao. Ele

    serve tambm para definir funes f:

    Yque tm como dominio o conjunto

    dos

    nmeros naturais.

    Para se definir uma funof:XYexige-se em geral que seja dada uma regra bemdeterminada, a qual mostre como se deve associar a cada elementoxXum nico elementoy =f(x) Y.

    Entretanto, no caso particular em que o domnio da funo o conjunto

    dos

    nmeros naturais, a fim de definir uma funo f:

    Yno necessrio dizer, de uma s

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    vez, qual a receita que d o valorf(n) para todo n

    . Basta que se tenha conhecimento dos

    seguintes dados:

    (1) O valorf(1);(2) Uma regra que permita calcularf(s(n)) quando se conhecef(n).

    Esses dois dados permitem que se conhea f(n) para todo nmero natural n. (Diz-se

    ento que a funoffoi definida por recorrncia.) Com efeito, se chamarmos deXo conjunto

    dos nmeros naturais n para os quais se pode determinarf(n), o dado (1) acima diz que 1 Xe o dado (2) assegura que n

    X

    s(n)

    X. Logo, pelo axioma da induo, tem-se

    X= .

    Obs. : Uma funof: Ycujo domnio o conjunto dos nmeros naturais chama-se umaseqncia ou sucesso de elementos de Y. A notao usada para uma tal seqncia (y1,

    y2,,yn,), onde se usayn em vez def(n) para indicar o valor da funo f no nmero n.

    O elementoyn .

    q se X g i c

    v f ` X

    X

    sg i c e

    vY

    va c

    uY

    s` f a

    sX

    u

    A adio e a multiplicao de nmeros naturais so exemplos de funes definidas

    por recorrncia.

    Para definir a adio, fixaremos um nmero natural arbitrrio ke definiremos a soma

    k+ n para todo n

    .Fixado k, a correspondncia n k + n ser uma funo f: , f(n) = k + n,

    chamada "somar k". Ela se define por recorrncia, a partir dos seguintes dados:

    (S1) k+ 1 = s(k)

    (S2) k + s(n) = s(k+ n).

    Portanto, k+ 1 , por definio, o sucessor de k. E, se conhecermos k+ n, saberemos o valor

    de k+ s(n): por definio, tem-se k+ s(n) = s(k + n). Isto nos permite conhecer k+ n para

    todo n

    (e todo k

    ).

    Usando as notaes definitivas n + 1 em vez de s(n) e (k+ n) + 1 em vez de s(k+ n),

    a igualdade (S2) se escreve assim:

    (S2') k+ (n + 1) = (k+ n) +1.

    Assim, as igualdades (S1) e (S2) ou, equivalentemente, (S1) e (S2') definem porrecorrncia a soma k+ n de dois nmeros naturais quaisquer ke n.

    A multiplicao de nmeros naturais se define de modo anlogo adio. Fixado

    arbitrariamente um nmero natural k, a multiplicao por kassocia a todo nmero mnatural n

    o produto nk, definido por induo da seguinte maneira:(P1) 1k= k.(P2) (n + 1) k= nk + k.O produto nkescreve-se tambm nke l-se "n vezes k". A definio acima diz portanto queuma vez k igual a k e n + 1 vezes k igual a n vezes k mais (uma vez) k . Assim, por

    definio, 2 k= k+ k, 3 k= k+ k+ k, etc.Usa-se induo para provar as propriedades bsicas da adio e da multiplicao de nmeros

    naturais. Entre elas, destacam-se as seguintes, vlidas para quaisquer k, n,p

    :

    Associatividade: k+ (n + p) = (k+ n) +p e k (np) = (kn)pComutatividade: k+ n = n + k e k n = nkLei do Corte: k+ n = k+pn =p e kn = kpn =pDistributividade: k(n + p) = kn + kp.

    Omitiremos as demonstraes destes fatos. O leitor pode consider-las como

    exerccios sobre o mtodo da induo.

    qc a e

    v

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    A adio de nmeros naturais permite introduzir uma relao de ordem em

    . Dados

    os nmeros naturais m, n diremos que m menor do que n, e escreveremos m < n, para

    significar que existe p tal que n = m + p. Neste caso, diz-se tambm que n maior doque m e escreve-se n > m para exprimir que se tem m < n. A notao mn significa que m 1. Assim, 1 o menor dos nmeros naturais.

    Provaremos a seguir as propriedades bsicas da relao de ordem

    m < n que definimos. A primeira delas a transitividade.

    Teorema 1. (Transitividade.) Se m < n e n < p, ento m < p.Demonstrao: Se m < n, n < p ento n = m + k, p = n + r, logo p = (m + k) + r = m + (k +r), portanto m < p.

    Outra importante propriedade de relao de ordem que, dados dois nmeros naturais

    diferentes m, n, ou se tem m < n ou ento n < m. Esta propriedade pode ser reformulada de

    outra maneira, como segue.

    Diremos que os nmeros naturais m, n so comparveis quando se tem m = n, m < n

    ou n < m. Podemos ento enunciar o seguinte teorema.

    Teorema 2. (Comparabilidade.) Todo nmero naturaln comparvel com qualquer nmeronatural m.

    Demonstrao: Isto se prova por induo. O nmero 1 comparvel com qualquer outro

    nmero natural pois j sabemos que 1 < m para todo m 1.Suponhamos agora que o nmero n seja comparvel com todos os nmeros naturais.

    Mostremos, a partir da, que n + 1 tambm tem essa propriedade. Com efeito, seja m tomado arbitrariamente. Sabemos que se tem

    m < n, m = n ou n < m. Examinemos cada uma dessas possibilidades:

    Se for m < n ento m < n + 1por transitividade, pois sabemos que n < n + 1.

    Se for m = n, ento m < n + 1.

    Se for n < m ento m = n + p. Neste caso, h duas possibilidades. Ou se temp = 1, donde m =

    n + 1, ou entop > 1, logop = 1 +p', e dam = (n + 1) +p'e conclumos que n + 1 < m. Emqualquer hiptese, vemos que n + 1 comparvel com qualquer nmero natural m. Por

    induo, fica provada a comparabilidade de quaisquer nmeros naturais m, n.

    A comparabilidade dos nmeros naturais complementada pela proposio abaixo.

    Teorema 3. (Tricotomia.) Dadosm, n , qualquer das afirmaesm < n,m = n, n < m exclui as outras duas.

    Demonstrao: Se tivssemos m < n e m = n, ento seria m = m +p, donde m + 1 = m + p+ 1 e, cortando m, concluiramos que 1 = p + 1, um absurdo, pois 1 no sucessor de p.

    Portanto m < n (e analogamente, n < m) incompatvel com m = n.

    Do mesmo modo, se tivssemos m < n e n < m, ento teramos n = m + p e m = n + k, do

    que resultaria n = n + k + p, logo n + 1 = n + k + p + 1 e, cortando n, concluiramos que 1 = k

    + p + 1, um absurdo.O teorema seguinte mostra que n e n + 1 so nmeros consecutivos.

    Teorema 4. No existem nmeros naturais entren e n + 1.Demonstrao: Se fosse possvel ter n 1.A conexo entre a relao de ordem e as operaes de adio e multiplicao dada pelo

    seguinte teorema:

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    Teorema 5. (Monotonicidade.) Sem < n, entom +p < n + p e mp < np.

    Demonstrao: Usando a definio de mp.A recproca da monotonicidade a Lei do Corte para desigualdades: m +p < n + p m < n emp < npm < n. O leitor poder prov-la por absurdo, usando a tricotomia e a prpriamonotonicidade.

    q c

    sc a e

    vY

    sg i c

    Dado o subconjunto A , diz-se que o nmero natural a o menor(ou primeiro)elemento de a quando aA e, alm disso, ax, para todos os elementosxA.

    Por exemplo, 1 o menor elemento de

    .

    De agora em diante, dado n

    , indicaremos comIno conjunto dos nmeros naturais

    p tais que 1 p n. Assim,I1 = {1},I2 = {1, 2},I3 = {1, 2, 3} etc.As propriedades da relao de ordem m < n, demonstradas na seo anterior para os

    nmeros naturais (exceto o Teorema 4 que vale apenas para nmeros inteiros), so igualmente

    vlidas para os nmeros inteiros, racionais e, mais geralmente, para nmeros reais quaisquer.

    Existe, porm, uma propriedade de suma importncia que vlida para a ordem entre os

    nmeros naturais, mas sem equivalente para nmeros inteiros, racionais ou reais.

    Teorema 6. (Princpio da Boa Ordenao.) Todo subconjunto no-vazioA

    possui um

    menor elemento.

    Demonstrao: Sem perda de generalidade, podemos admitir que 1 A, pois caso contrrio1 seria evidentemente o menor elemento de A. O menor elemento de A, cuja existnciaqueremos provar, dever ser da forma n + 1. Devemos pois encontrar um nmero natural n tal

    que n +1 A e, alm disso, todos os elementos deA so maiores do que n, logo maiores doque 1, 2, , n. Noutras palavras, procuramos um nmero natural n tal queIn A e n + 1A. Com esse objetivo, consideramos o conjunto

    X= {n

    ;In A}.

    Portanto,X o conjunto dos nmeros naturais n tais que todos os elementos deA so maioresdo que n. Como estamos supondo que 1 A, sabemos que 1 X. Por outro lado, comoA no vazio, nem todos os nmeros naturais pertencem a X, ou seja, temosX

    . Pelo axioma D,

    vemos que o conjunto Xno indutivo, isto , deve existir algum nXtal que n + 1 XIsto significa que todos os elementos de A so maiores do que n mas nem todos so maiores

    do que n + 1. Como no h nmeros naturais entre n e n + 1, conclumos que n + 1 pertence a

    A e o menor elemento deA.

    O Princpio da Boa Ordenao pode muitas vezes ser usado em demonstraes,

    substituindo o Princpio da Induo. Vejamos um exemplo.

    Dissemos anteriormente que um subconjuntoX chama-se indutivo quando nX n + 1 X, ou seja, quando X contm o sucessor de cada um dos seus elementos. OPrincpio da Induo afirma que se um conjunto indutivo X contm o nmero 1 ento X

    contm todos os nmeros naturais.

    Vamos usar o Princpio da Boa Ordenao para provar que se um conjunto indutivoX

    contm o nmero a, entoXcontm todos os nmeros naturais maiores do que a.

    A prova desta afirmao se faz por absurdo, como ocorre em geral quando se usa aboa ordenao. Suponhamos ento que existam nmeros naturais, maiores do que a, no

    pertencentes ao conjunto indutivo X. Seja b o menor desses nmeros. Como b > a, podemos

    escrever b = c + 1, onde, pela definio de b, tem-se necessariamente cX. Mas, como Xindutivo, isto obriga que b = c + 1 X, uma contradio.

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    A proposio qua acabamos de demonstrar pode ser enunciada da seguinte forma:

    Teorema 7: (Princpio da Induo Generalizado.) Seja P uma propriedade referente anmeros naturais, cumprindo as seguintes condies:

    (1) O nmero natural a goza da propriedade P;(2) Se um nmero natural n goza da propriedade P ento seu sucessor n + 1 tambm goza de

    P.

    Ento todos os nmeros naturais maiores do que ou iguais a a gozam da propriedade P.

    Exemplo 2. Vejamos uma situao simples onde se emprega o Princpio da Induo

    Generalizado. Trata-se de provar que 2n + 1 < 2n, para todo n 3. Esta afirmao, (que falsa

    para n = 1 ou n = 2), vale quando n = 3. Supondo-a vlida para um certo n 3, mostremos queda decorre sua validez para n + 1. Com efeito, 2(n + 1) + 1 = (2n + 1) + 2 < 2

    n+ 2 < 2

    n+ 2

    n=

    2n+ 1

    . (Na primeira desigualdade, usamos a hiptese de induo.)

    Exemplo 3. Usando a desigualdade 2n + 1 < 2n, qua acabamos de provar para n 3, podemosdemonstrar que n

    2< 2

    npara todo n 5, empregando novamente o Princpio da Induo

    Generalizado. Com efeito, vale 52

    < 25

    pois 25 < 32. Supondo vlida a desigualdade n2

    < 2n

    para um certo valor de n

    5, da segue-se que (n + 1)2 = n2 + 2n + 1 < 2n + 2n + 1 (pela hiptese de induo) < 2n + 2n

    (pelo exemplo anterior) = 2n + 1. Portanto P(n) P(n + 1). Pelo Princpio de InduoGeneralizado, segue-se que P(n) vale para todo

    n 5. Evidentemente, a desigualdade n2 < 2n falsa para n = 1, 2, 3, 4.O teorema abaixo contm outra aplicao do Princpio da Boa Ordenao.

    Teorema 8. Toda funo montona no-crescentef: constante a partir de umcerto ponto. (Isto , existen0 tal quef(n) =f(n0),para todonn0.)Demonstrao: Seja n0 o menor elemento do conjuntoX = {f(1),f(2), ,f(n),}. Ento n >

    n0f(n) f(n0) (porque a funo f no-crescente) o que acarreta que f(n) = f(n0) (porquef(n0) o menor elemento deX).

    Corolrio: Toda seqncia decrescenten1 > n2 > de nmeros naturais finita. Com efeito,do contrrio, pondo f(k) = nk, obteramos uma funo estritamente decrescentef: .

    q u v j

    f Y e c

    a X Y k

    X c es

    X Y e f g i c

    Em algumas situaes, ao tentarmos fazer uma demonstrao por induo, na

    passagem de n para n + 1, sentimos necessidade de admitir que a proposio valha no apenas

    para n e sim para todos os nmeros naturais menores do que ou iguais a n. A justificativa de

    um raciocnio desse tipo se encontra no

    Teorema 9: (Segundo Princpio da Induo.) SejaX um conjunto com a seguintepropriedade:

    (I) Dado n l , se todos os nmeros naturais menores do que n pertencem a X, ento n

    X.

    O segundo Princpio da Induo afirma que um conjunto Xm

    com a propriedade

    (I) coincide comm

    .

    Demonstrao: Com efeito, supondo, por absurdo, queXm

    , isto , quem

    X, sejan o menor elemento do conjunto m X, ou seja, o menor nmero natural que no pertence a

    X. Isto quer dizer que todos os nmeros naturais menores do que n pertencem aX. Mas ento,

    pela propriedade (I), n pertence aX, uma contradio. Segue-se quem

    X= eX=m

    .

    Obs. : Se um conjunto Xm

    goza da propriedade (I), para que um nmero natural n no

    pertencesse aXseria necessrio que existisse algum nmero natural r< n tal que rX. Em

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    particular, se n = 1, como no existe nmero natural menor do que 1, a hiptese 1 Xnopode ser cumprida. Noutras palavras, (I) j contm implicitamente a afirmao de que 1 X.Assim, ao utilizar o Segundo Princpio da Induo, no preciso estipular que Xcontm onmero 1.

    Toda propriedade P que se refira a nmeros naturais define um subconjuntoX n , a saber, oconjunto dos nmeros naturais que gozam da propriedade P. (E reciprocamente, todo

    conjuntoXn

    define uma propriedade referente a nmeros naturais, a saber, a propriedadede pertencer aX.) Deste modo, "propriedade" e "conjunto" so noes equivalentes. Por isso,

    natural que o Segundo Princpio da Induo possua a formulao seguinte, onde ele aparece

    como o

    Teorema 10: (Segundo mtodo de demonstrao por induo.) Seja P uma propriedade

    referente a nmeros naturais. Dado nn

    , se a validade de Ppara todo nmero natural

    menor do que n implicar que P verdadeira para n, ento P verdadeira para todos os

    nmeros naturais.

    Demonstrao: Com efeito, nas condies do enunciado, o conjuntoXdos nmeros naturaisque gozam da propriedade P satisfaz a condio (I) do Segundo Princpio da Induo, logoX

    =n

    e P vale para todos os nmeros naturais.

    Aplicaremos agora o Segundo Princpio da Induo para demonstrar um fato

    geomtrico. No exemplo a seguir, usamos os nmeros naturais como instrumento decontagem, isto , como nmeros cardinais, pois empregamos expresses do tipo um polgono

    de n lados". (Vide seo 6.)Sabe-se que, traando diagonais internas que no se cortam, pode-se decompor

    qualquer polgono em tringulos justapostos. Isto evidente quando o polgono convexo:

    basta fixar um vrtice e traar as diagonais a partir dele. Se o polgono no convexo, a prova

    requer mais cuidados. (Vide "Meu Professor de Matemtica", pag. 109.)

    O leitor pode experimentar com um polgono no-convexo e verificar qua h muitas

    maneiras diferentes de decomp-lo em tringulos justapostos mediante diagonais internas.

    Mas vale o resultado seguinte, no qual usaremos o Segundo Princpio da Induo.

    Exemplo 4. Qualquer que seja a maneira de decompor um polgono P, de n lados, em

    tringulos justapostos por meio de diagonais internas que no se intersectam, o nmero dediagonais utilizadas sempre n 3.

    Com efeito, dado n, suponhamos que a proposio acima seja verdadeira para todo

    polgono com menos de n lados. Seja ento dada uma decomposio do polgono P, de nlados, em tringulos justapostos, mediante diagonais internas. Fixemos uma dessas diagonais.

    Ela decompe P como reunio de dois polgonos justapostos P1, de n1 lados, e P2, de n2 lados,

    onde n1 < n e n2 < n, logo a proposio vale para os polgonos P1 e P2. Evidentemente, n1 + n2= n + 2.

    P1P2

    As d diagonais que efetuam a decomposio de P se agrupam assim: n1 3 delas

    decompem P1, n2 3 decompem P2 e uma foi usada para separar P1 de P2. Portanto d= n1

    3 + n2 3 + 1 = n1 + n2 5. Como n1 + n2 = n + 2, resulta que d= n 3. Isto completa a

    demonstrao.

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    Observaes:

    1. Para habituar-se com o mtodo de demonstrao por induo preciso pratic-lomuitas vezes, a fim de perder aquela vaga sensao de desonestidade que o

    principiante tem quando admite que o fato a ser provado verdadeiro para n, antes de

    demonstr-lo para n + 1.

    2. Pratique tambm (com moderao) o exerccio de descobrir o erro em paradoxos queresultam do uso inadequado do mtodo de induo. Vejamos dois desses sofismas:

    Exemplo 5. Todo nmero natural pequeno.Ora, 1 certamente pequeno. E se n pequeno, n + 1 no vai subitamente tornar-se

    grande, logo tambm pequeno. (O erro aqui consiste em que a noo "nmero pequeno" no

    bem definida.)

    Exemplo 6. Toda funof:XY, cujo domnio um conjunto finito X, constante.Isto obviamente verdadeiro se X tem apenas 1 elemento. Supondo a afirmao

    verdadeira para todos os conjuntos com n elementos, sejaf: XYdefinida numconjuntoXcom n + 1 elementos. Considere um elemento aX. Como X' = X {a} tem nelementos,fassume o mesmo valor cYem todos os elementos de X'. Agora troque a porum outro elemento bX'. Obtm-se X''= X {b} um conjunto com n elementos (entre osquais a). Novamente pela hiptese de induo,f constante e igual a c emX''. Logof(a) = c e

    daf: XY constante. (Aqui o erro reside no uso inadequado da hiptese de induo. Oraciocnio empregado supe implicitamente queXtem pelo menos 3 elementos. Na realidade,

    no vale a implicao P(1) P(2).)

    O perigo de fazer generalizaes apressadas relativamente a asseres sobre nmerosnaturais fica evidenciado com o seguinte exemplo:

    Exemplo 7. Considere o polinmiop(n) = n2

    n + 41 e a afirmao "o valor dep(n) sempre

    um primo para n = 0, 1, 2, 3, ". Embora isso seja verdadeiro para n = 0, 1, 2, , 40, temosp(41) = 41

    2 41 + 41 = 41

    2no primo, logo a afirmao no verdadeira.

    Semelhantemente, a expresso q(n) = n2

    79n + 1601 fornece primos para n = 1, 2,

    , 79, mas q(80) = 802

    79 80 + 1601 = 1681 no primo, pois divisvel por 41. A moralda histria : S aceite que uma afirmao sobre os nmeros naturais realmente verdadeira

    para todos os naturais se isso houver de fato sido demonstrado!

    o q Y v a c u s a e X Y s X u

    Vamos agora mostrar como se usam os nmeros naturais para contar os elementos de

    um conjunto finito. O Princpio da Induo ser essencial. Lembremos que, dado n

    ,

    escrevemosIn = {p ;pn}, portantoIn = {1, 2, , n}.

    Uma contagem dos elementos de um conjunto no-vazioX uma bijeo

    f:InX. Podemos prx1 =f(1),x2 =f(2),,xn=f(n) e escreverX= {x1,x2,xn}. Diz-se ento queXpossui n elementos. O conjuntoXchama-se um conjunto

    finito quando existe n

    tal queXpossui n elementos.

    Um exemplo bvio de conjunto finito In. Evidentemente, a funo identidadef:InIn uma contagem dos elementos deIn.

    Um exemplo de conjunto infinito o proprio conjunto

    dos nmeros naturais, pois

    nenhuma funof:In pode ser sobrejetiva, no importa qual n se tome. De fato, dada f,

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    tomamos k=f(1) +f(2) ++f(n) e vemos que k>f(x) para todoxIn, logo kf(In), efno sobrejetiva.

    A fim de que no haja ambigidade quando se falar do nmero de elementos de um

    conjunto finito X, necessrio provar que todas as contagens de X fornecem o mesmoresultado. Noutras palavras, dado o conjunto X, os nmeros naturais m, n e as bijeesf:ImX, g :InX, devemos mostrar que se tem m = n. Comeamos observando que sefe g sobijees, ento = g1f:ImIn tambm uma bijeo. Basta portanto provar o seguinte:

    Teorema 11.Dados m, n

    , se :ImIn uma bijeo, entom = n.Demonstrao. Com efeito, chamemos de Xo conjunto dos nmeros naturais n que tm a

    seguinte propriedade: s existe uma bijeo :ImInquando m = n. Evidentemente, 1 X.Suponhamos agora que nX. Dada uma bijeo : Im+1In+1, duas coisas podemacontecer. Primeira: (m + 1) = n + 1. Neste caso, a restrio |Im : ImIn uma bijeo,logo m = n, donde m + 1 = n + 1. Segunda: (m + 1) = b, com b < n + 1. Neste caso,consideramos

    a = 1(n + 1) e definimos uma nova bijeo :Im + 1 In + 1, pondo (m + 1) = n + 1, (a)= b e (x) = (x) para os demais elementos xIm + 1. Ento recamos no caso anterior enovamente conclumos que m + 1 = n + 1. Isto mostra que nXn + 1 X, logoX= e a

    unicidade do nmero cardinal de um conjunto finito fica demonstrada.

    Agora os nmeros naturais no so apenas elementos do conjunto-padro

    , mas

    servem tambm para responder perguntas do tipo "quantos elementos tem o conjunto X?,"ou

    seja, podem ser usados tambm como nmeros cardinais.

    A adio de nmeros naturais se relaciona com a cardinalidade dos conjuntos por

    meio da seguinte proposio.

    Teorema 12: Sejam X, Y conjuntos finitos disjuntos. Se X tem m elementos e Y tem n

    elementos, ento XY tem m + n elementos.Demonstrao: Com efeito, sef:ImXe g :InYso bijees, definimos uma bijeoh :Im+nXY por h (x) =f(x) se 1 xm eh(x) = g(x) + m se m + 1 xm + n, o que conclui a demonstrao.Prova-se, por induo, que todo subconjunto de um conjunto finito X tambm finito e seu

    nmero de elementos menor do que ou igual ao deX(Veja E.L.Lima, "Anlise Real", vol 1,

    pag. 5.)

    E conveniente incluir, por definio, o conjunto vazio entre os conjuntos finitos e

    dizer que o seu nmero de elementos zero. Embora zero no seja um nmero natural, ele

    passa a ser o nmero cardinal do conjunto vazio.

    Seguem-se algumas proposies que devem ser demonstradas por induo ou boaordenao. Os dez ltimos exerccios foram sugeridos pelo Professor A. C. Morgado.

    Exerccios:

    1. Construa um esquema de setas comeando com os nmeros mpares, seguidos dosnmeros pares divisveis por 4 em ordem decrescente e, por fim, os pares no divisveis

    por 4 em ordem crescente. Noutras palavras, tomeX= e defina s :XXpondo s(n) =n + 2 se n no divisvel por 4, s(n) = n 2 se n for mltiplo de 4. Mostre que s :XXcumpre os axiomas A, B, C mas no D.

    2. Defina, por recorrncia, uma funof:

    estipulando quef(1) = 3 ef(n + 1) = 5.f

    (n) + 1. D uma formula explcita paraf(n).

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    3. D uma frmula explcita paraf:

    sabendo quef(1) = 1,f(2) = 5 ef(n + 2) = 3f

    (n + 1) 2f(n).

    4. SejaX um conjunto indutivo no-vazio. Mostre que existe a tal queX= {n ;na}.

    5. Prove, por induo, que .6

    )12)(1(...21

    222 ++=+++nnn

    n

    6. Num polgono com n 6 lados, o nmero de diagonais maior do que n.7. Prove, por induo que [(n + 1)/n]n < n, para todo n 3. (Sugesto: Observe que (n +

    2)/(n + 1) < ( n + 1)/n e eleve ambos os membros desta desigualdade potncia n + 1.)

    Conclua da que a seqncia ,...5,4,3,2,1 543 decrescente a partir do terceiro termo.

    8. Prove, por induo a desigualdade de Bernoulli: (1 + a)n > 1 + na quando 1 + a > 0.9. Para todo n , ponha

    n

    nnn

    nx

    +

    +=

    )2(

    )1(2

    e prove, por induo que se tem

    .1

    2

    ++

    3n2 + 3n + 1 para n 3.22.Considere n retas em um plano. Mostre que o "mapa" determinado por elas pode ser

    colorido com apenas duas cores sem que duas regies vizinhas tenham a mesma cor.