A Poesia Barroca de Gregório de Matos

9
A POESIA BARROCA DE GREGÓRIO DE MATOS José Pereira da Silva (UERJ e ABF) Como não sou um literato nem tenho dedicado grande parte de minha vida aos estudos literários, partirei do excelente trabalho de Domício Proença Filho, Estilos de Época na Literatura, para desenvolver o tema que me coube neste Seminário. Pode-se afirmar que o estilo barroco se configurou nos moldes da Contra-Reforma e dos Concílios de Trento (século XVI), tentando “conciliar a novidade renascentista com a tradição religiosa que vinha da Idade Média” (PROENÇA FILHO, 1973: 139), poisforam principalmente esses dois acontecimentos – continua –, que marcaram os princípios ideológicos do homem daquele tempo, impondo-lhe “traços relevantes em pensamento, concepções sociais e políticas, arte e, naturalmente, religi ão.” (p. 140). Reformatado, o pensamento cristão medieval reaparece no Barroco: o equilíbrio do homem medieval se transforma em conflito permanente, representado em jogo de oposições e contrastes. “E de imediato se depreende que o Homem barroco se debate num conflito oriundo deste duelo entre espírito cristã o e espírito secular, que leva a contrições como esta atribuída a Gregório de Matos”, continua Domício, exemplificando com o soneto abaixo: Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado[1] Da vossa piedade me despido,[2]: Porque quanto mais tenho delinqüido, Vos tenho a perdoar mais empenhado. Se basta a vos irar tanto um pecado, A abrandar-vos sobeja um só gemido: Que a mesma culpa que vos há ofendido, Vos tem para o perdão lisonjeado. Se uma ovelha perdida e já cobrada[3] Glória tal e prazer tão repentino Vos deu, como afirmais na Sacra História: Eu sou, Senhor, ovelha desgarrada; Cobrai-me; e não queirais, Pastor Divino, Perder na vossa ovelha a vossa glória. (TOPA, 1999: II, 37) Na medida do possível, mostraremos poemas de Gregório de Matos que tragam algumas das seguintes características do Barroco relacionadas por Domício Proença Filho: 1 – O culto do contraste; 2 – Oposição do homem voltado para o céu ao homem voltadopara a terra; 3 – Preferência (dentro do espírito de contrastes) pelos aspectos cruéis, dolorosos, sangrentos e repugnantes; 4 – Pessimismo; 5 – Humanização do sobrenatural; 6 – Fusionismo; 7 Intensidade; 8 – Acumulação de elementos; 9 – Impulsopessoal; 10 – Niilismo temático; 11 Tendência para a descrição e 12 – Culto da solidão. [4] 1 – O CULTO DO CONTRASTE Segundo Ronaldes de Melo e Souza, em “As máscaras de Gregório de Mattos” (SOUZA, 2000: 15), através do fingimento, o poeta está sempre em contraste, inclusive consigo mesmo e com os princípios que defende:

description

Poesia

Transcript of A Poesia Barroca de Gregório de Matos

APOESIABARROCADE GREGRIO DEMATOSJosPereirada Silva(UERJ e ABF)Comonosouumliteratonemtenho dedicadograndepartedeminhavidaaosestudosliterrios, partirei doexcelentetrabalhode Domcio ProenaFilho,EstilosdepocanaLiteratura,paradesenvolverotemaquemecoube nesteSeminrio.Pode-seafirmarqueoestilobarrocose configurounosmoldesda Contra-Reforma e dosConcliosde Trento (sculoXVI), tentando conciliaranovidaderenascentistacomatradioreligiosaquevinhadaIdadeMdia (PROENAFILHO, 1973: 139),poisforamprincipalmenteessesdoisacontecimentos continua ,quemarcaram osprincpiosideolgicos dohomemdaqueletempo, impondo-lhe traosrelevantesempensamento,concepessociaisepolticas,artee,naturalmente,religio. (p. 140).Reformatado, opensamentocristomedievalreaparece noBarroco: oequilbriodohomemmedievalse transformaemconflitopermanente, representadoemjogodeoposiesecontrastes.E deimediatose depreendequeoHomembarrocosedebatenumconflitooriundodestedueloentreespritocristoeespritosecular,quelevaacontriescomoesta atribuda a Gregrio deMatos, continua Domcio, exemplificandocomosonetoabaixo:Pequei,Senhor,masnoporqueheipecado[1]Davossapiedademedespido,[2]:Porquequantomaistenho delinqido,Vostenho aperdoarmaisempenhado.Sebastaavosirartantoumpecado,A abrandar-vossobejaumsgemido:Queamesmaculpaquevosh ofendido,Vostemparaoperdolisonjeado.Se umaovelhaperdida ejcobrada[3]GlriataleprazertorepentinoVosdeu,comoafirmais naSacraHistria:Eusou,Senhor,ovelhadesgarrada;Cobrai-me; enoqueirais,PastorDivino,Perdernavossaovelhaavossaglria.(TOPA, 1999: II, 37)Namedidadopossvel, mostraremospoemasde Gregrio deMatosquetragam algumas dasseguintescaractersticasdoBarrocorelacionadasporDomcio ProenaFilho: 1 Ocultodocontraste; 2 Oposiodohomemvoltadoparaocuaohomemvoltadoparaaterra; 3 Preferncia(dentrodoespritodecontrastes)pelosaspectoscruis,dolorosos,sangrentoserepugnantes; 4 Pessimismo; 5 Humanizao dosobrenatural; 6 Fusionismo; 7 Intensidade; 8 Acumulaodeelementos; 9 Impulsopessoal; 10 Niilismotemtico; 11 Tendnciaparaadescrioe 12 Cultodasolido.[4]1 OCULTODOCONTRASTESegundoRonaldes de Melo e Souza,emAsmscarasde Gregrio de Mattos (SOUZA, 2000: 15),atravsdofingimento, opoetaestsempreemcontraste,inclusiveconsigomesmoecomosprincpiosquedefende:Gregrio de Mattos secomportacomopersona ficta[5],ostentando vriasmscaras, fingindo diversasvozes, representando,enfim, aproliferaoindefinidadeumserquenocessa deseroutro. A heterogeneidaderadicaldopoetasemanifestanas mltiplasvozes(religiosa,ertica,lrica,jocosa,satrica, encomistica),quepresidem gnesee aodesenvolvimentodesuaobraessencialmentedialgicae polifnica. Argumenta-sequeoconceitooperatriodobarroco,que adobra(le pli, Deleuze), constitui ofundamentohistrico-cultural daobragregoriana,quepoeticamente se desdobraemfugaincessanteemetamorfosecontnua.Assim,quasequeantecipando FernandoPessoanacriaodeheternimos[aterminologiatalveznoseja amaisadequada], afirmandoqueopoetase despersonalizaparapersonificaroutroseus, Ronaldes de Melo e Souza acrescenta, napginaseguinte:Adriano Espnola levanta ahiptesedequeolicenciadoRabello e ofreiLourenoRibeirosomscarasbiogrficas de Gregrio de Mattos.....................................................................................................Nestas duascriaesalonmicas[6], umaqueo exalta eoutraqueo verbera, orisode Gregrio de Mattos atinge a culminncia de uma bufoneria[7]transcendental.Perfeitofingidor, opoetafinge,nosomenteasuaobra,mastambmasuavidapessoal, depersonaconvicta. E fingetocompletamente,quechegaafingirduasmscarassimtricas e opostas: uma adjuvante eoutraoponente. Estamascaradabiogrfica representa dramaticamente a polaridadebarrocadosublimee dogrotesco.[8]Noapresentaremosexemplodaobrade Gregrio deMatosnestepontoporqueoprimeirosonetotranscrito suficienteparailustraros referidoscontrastes.2 OPOSIODOHOMEMVOLTADOPARAOCUAOHOMEMVOLTADOPARAATERRATratando deseucomportamentoreligioso,bemexplcitonaspeasdeacusaoe dedefesaencontradas noprocessoinquisitorialquesofrera, pode-seconcluirqueProvavelmente acausadessasvisesantagnicas reside naprpriafiguradoescritor, naambigidade,emtermosdecomportamentoecrenasreligiosas,entreapessoaempricae apersonapotica. Se aprimeiracapazdefalarmuitascoisasescandalosas,comoqueroacusador,oudeserumloucojocoso,comoo consideraseudefensor, asegundasemostracapazdefingirumadevooextrema, deumlegtimoeinteirocristovelho.Opontodeunioentreessesextremosseencontranotemperamentoburlesco,farsante,oramanifesto,oralatente, notratamentoliterriodadoaostemasreligiosos,comoexpressomesmadocomportamentoambguodapessoaempricajocosae dapersonapoticadevotadoautor.Da oconflitopermanentedopoetacindindoentreaconscinciadopecadoe anecessidadeda salvao,entreodesejodatransgressoe a solicitao doperdo,entrecertezasdivinas edvidasterrenas,...Eisumsonetoquebemretrataesteaspectodaobragregoriana:Ofendi-vos,meuDeus, bemverdade,verdade,Senhor,quehei delinqido,Delinqidovostenho e ofendido,Ofendidovostemminhamaldade.Maldadequeencaminha vaidade,Vaidadequetodomeh vencido.Vencido quero ver-me e arrependido,Arrependido atantaenormidade.Arrependido estou decorao,Decoraovosbusco, dai-me osbraos,Abraosquemerendemvossaluz.Luzqueclaromemostraa salvao,A salvao pertendoemtaisabraos,Misericrdia,amor, Jesus, Jesus.(TOPA, 1999: II, 39)3 PREFERNCIA(DENTRODOESPRITODECONTRASTES)PELOSASPECTOSCRUIS,DOLOROSOS,SANGRENTOSEREPUGNANTESMesmoumpoemasacroadquiretonalidadesatricaaoserintroduzidopeladidasclia[9]AobraodomeninoJesus daSquandodesapareceu docorpo. Otextotipicamentegregorianotem deserlidocomointertexto e metatexto. (SOUZA, 2000: 17)Eisosonetoqueescreveu ACristoSenhorNossocrucificado, estando oPoetanaltimahoradasuavida:MeuDeus,queestaispendenteemummadeiro,EmcujaLeiprotestodeviver,EmcujaSantaLeihei demorrer,Animoso,constante,firmeeinteiro.Nestelance,porseroderradeiro,Poisvejo aminhavidaanoitecer,,meuJesus, ahorade severAbranduradeumPai,mansocordeiro.Muigrandevossoamoremeudelito;Pormpodeterfimtodoopecar,Enoovossoamor,queinfinito.Essarazomeobriga aconfiarQuepormaisquepequei nesteconflito,Esperoemvossoamordemesalvar.(TOPA, 1999: II, 41)4 PESSIMISMOEssepessimismonasce doconflitoentreoeue omundo, levando opoetaao bifrontismo dohomem,santoepecador,conformeensinaDomcio ProenaFilho,op. cit.,p. 141.Eisoqueescreve opoetaaosMissionrios,emocasioquecorriam aViaSacra,quandooarcebispoda Bahia dava exorbitantesdireesMisso,juntamentecomoexercciodaViaSacra:Viade prefeio aSacraVia,ViadoCu,caminhodaverdade;MasiraoCucomtalpublicidadeMaisquevirtudeobotohipocrisia.Odio dalmainfamecompanhia,Apazdeixou-aDeusCristandade;Masarrastarporforaumavontade,Emvezdecaridadetirania.Odarpregesnoplpitoindecncia:[]Qu defulano?[] e []Venhaaquisicrano![],Porquepecadoepecadorse veja;prpriodeumporteirodaudincia;E se nistomaldigooumalmeengano,Eumesumeto SantaMadreIgreja.(TOPA, 1999: II, 361)5 HUMANIZAO DOSOBRENATURALOfatomesmode terem sido colocadosemprimeirolugarospoemassacros, nocdiceorganizadopelolicenciadoRabello, d-lheumpragmatismoimediato,parasalvaraobra, apresentandoseuautorcomoumpoetareligioso,isto,comamscarasacral. (Cf. ESPNOLA, 2000: 112)Umexemplodestametamorfose,entremuitosencontrveis naartepoticade Gregrio deMatos, podeserosonetoabaixo,poisNosermoquepregou naMadredeDeusDomJooFrancodeOliveira, pondera oPoetaafragilidadehumana:Naoraoquedesaterra...........................aterra,QuerDeusqueaquemest ocuidado.......dadoPreguequeavida emprestado...............estado,Mistriosmilquedesenterra....................enterra.Quemnocuida desiqueterra..............erra,QueoaltoReiporafamado.....................amadoEquemlheassiste ao desvelado...............ladoDamorteaoarnodesaferra.................. aferra.Quemdomundoamortalloucura............cura,vontadedeDeussagrada......................agradaFirmar-lhe avidaematadura...................dura.vozzelosaquedobrada.........................brada,Jseiqueaflordaformosura...................usuraSer nofimdestajornada........................nada.(TOPA, 1999: II, 62)6 FUSIONISMOAssimcomonosonetoqueapresentaremos noitem8,ondehfusodoracionalcomoirracional, dosacrocomosatricoetc., podemosverafusodohumanocomodivino, doterrenocomocelestialetc. noprimeirodospoemassacrosapresentado nocdicedolicenciado,ondeopoetarecorre aoEclesiastes, deondeextrai oversculo3:20paraconstruirseuprimeiroverso, persuadindo retoricamente oleitor, conativa eapelativamente. Vejamos:Questerra,homem, eemterrahs de tornar-te,TelembrahojeDeusporsuaIgreja;Deptefazespelhoemquese vejaAvilmatriadequequis formar-te.Lembra-teDeusquespparahumilhar-te,EcomooteubaixelsemprefraquejaNosmaresdavaidadeondepeleja,Tepe vistaaterraondesalvar-te.Alerta,alerta,poisqueoventoberra,E seassopraavaidadee incha opano,Naproaaterratens, amaina eferra.Todoolenhomortal, baixelhumano,Sebuscaa salvao, tomehojeterra,Queaterradehojeportosoberano.(TOPA, 1999: II, 64)7 INTENSIDADEEssaintensidade traduzida,segundoAfrnio CoutinhoemsuaIntroduoLiteraturaBrasileira(COUTINHO, 1972: 107),...numsentimentodegrandiosidadeeesplendor, demagnificnciaepompa, demajestadeegrandezaherica,expressosnatendnciasuperlativae hiperblica, noexagerodoepteto.Masessatendnciaencontraseureversonopendorparaarennciae a nobreza dealma,responsvelpeloequilbrioinstvelde muitaspersonagensbarrocas,quevivementreavirtudee afraqueza,entreapurezae opecado,entreo rigorismomoraloualutarduae aquedae oarrependimento.Noh mediocridade nasuaalma,porqueDeusestpresente, noseucoraoeesprito,mesmoquandoenleadaspelopecado.Aproveitoparaexemplificarcomumpardesonetoscriadosnosmesmosversosconsoantes,comoqueopoeta,semnomearosinterlocutores,mostraumdilogo, umateatralidadeemsualrica:Quemperde obemqueteve possudo,Amortenodilate aosentimento,Queestador, estamgoa,estetormento,Nopodetertormentoparecido.Quemperde obemlogrado, tem perdidoOdiscurso, arazo, oentendimento;PorquecabernopodeempensamentoAesperanadeserrestitudo.Quandofosse aesperanaalentovida,t nasfaltasdobemseriaenganoOpresumirmelhorasdestasorte.Porqueondefaltaobem, homicidaAmemria,queatalhaoprpriodano,Orefgio,quepriva amesmamorte.(TOPA, 1999: II, 83)ObemquenochegouserpossudoPerdidocausatantosentimentoQuefaltando-lhe acausadotormento,Fazsermaiortormentoo padecido.Sentirobemlogrado ejperdidoMgoaser doprprioentendimento;PormobemqueperdeumpensamentoNoodeixaoutrobemrestitudo.Se ologrosatisfaz amesmavidaEdepoisde logrado ficaenganoAfaltaqueobemfazemqualquersorte:InfalvelserserhomicidaObemquesemsermalmotivaodano,Omalquesemserbemapressa amorte.(TOPA, 1999: II, 85)

Essatcnica utilizada noutrosdilogosemqueaspersonagenssonomeadas,como ocasodostrssonetosamorososdoPoeta,compostosnosmesmosconsoantese respondidos domesmomodoporFloralva,conformese podeleremTOPA(1999: II, 298-303).8 ACUMULAODEELEMENTOSSobastantenumerososospoemasemqueGregrio se utiliza estilisticamente desterecursodaacumulaodeelementos,quese faz de diversasmaneiras.Aproveitaremos aoportunidadeparaexemplificaraacumulaodeelementos(aqui,comonoexemplodoitem2)commaisumsonetoreligiosoquesetornaumastira,dadaocontextodesuaproduopeladidasclia (cf.item3).Otodosemapartenotodo,Apartesemotodonoparte,Masse aparteo faztodo, sendoparte,Nose digaqueparte, sendotodo.EmtodooSacramentoestDeustodoEtodoassisteinteiroemqualquerparte,Efeitoempartestodoemtodaaparte,Emqualquerpartesempreficatodo.Obraode Jesusnosejaparte,PoisquefeitoJesusempartestodo,Assistecadaparteemsuaparte.Nose sabendopartedestetodo,Umbraoquelheacharam, sendoparte,Nosdisse aspartestodas destetodo.(TOPA, 1999: II, 47-8)9 IMPULSOPESSOALNospoemasamorososenoserticos,naturalmente, oimpulsovem tonaacadapasso, oquemaisquenatural,apesarde seremfartososmodelosdetodoseles.Poristo, exemplificareicomumpoemasatricoeautobiogrfico(AMADO, 1992: I, 31):Epoiscronista sou.Se souberasfalartambmfalaras,tambmsatirizaras, se souberas,e seforaspoeta, poetaras.Cansadodevospregarcultssimasprofecias,quero das culteraniashojeohbitoenforcar;dequeservearrebentar,porquemdemimnotemmgoa?Verdadesdireicomogua,porquetodosentendaisosladinos, e osboaisaMusapraguejadora.Entendeis-meagora?Permiti,minhaformosa,queestaprosaenvoltaemversodeumPoetatoperversose consagre avossop,poisrendido fossafsoujPoetaconverso.Masamoporamar,queliberdade.10 NIILISMOTEMTICOUminteressanteexemplodessacarnciademotivoparaaproduopoticaouliterria osonetoescritoaoCondeda Ericeira, D. Lus de Meneses, pedindolouvoresaopoeta,quenolheachouprstimoalgum:Umsonetocomeoemvossogabo,Contemos estaregraporprimeira;Jlvoduas e esta aterceira,Jestequartetinho est nocabo.Naquintatroceagoraaporcaorabo,Asextavtambmdestamaneira;Nastimaentrojcomgrcanseira,E saio dosquartetosmuitobrabo.Agoranostercetosquedirei?Direiquevs,Senhor, amimmehonrais,Gabando-vos avs, eeuficoumrei.Nestavidaumsonetojditei,Se destaagoraescapo,nuncamais;Louvado sejaDeus,queo acabei.(TOPA, 1999: II, 35811 TENDNCIAPARAADESCRIOAs didasclias, caracterizandoumdiscursomascarado dopoeta, fazem umaligaodiretaentreaobraliterriae asuabiografia, assinadapelolicenciado. E comoqueolicenciadopodiasabertudoacercadopoetae dascircunstnciasquemotivaram aelaboraodeseuspoemas? perguntaRonaldes (SOUZA, 2000: 16-17), propondoimediatamente: Arespostaa estaperguntaqueobigrafoconseguesabertudoacercadopoetaeseuofcio,porqueolicenciadoRabello e Gregrio de Mattossoumamesmapessoa,quese representa dramaticamente desdobrada nobigrafoe no biografado.Ouseja, aquelas legendasquetm tantasvariantes,conformese podevernatesede FranciscoTopa(1999), constituem oelementodescritivoporexcelncianacomdiaemquese constitui aobrapoticade Gregrio deMatos, considerada destepontodevista,levadoatainverossimilhana (PROENAFILHO, 1973: 142).12 CULTODASOLIDOSegundoDomcio (p. 142), opoeta,maisqueoutros, umraro,quecriaoseumundoparticulare nele se isola.Gregrio criouumparopositivodemscaras,tpicodasartesliterriaedramticadeseutempo,pararevelarsuacriadorafacetabiogrfica:a detomencomistico, assinadapelolicenciado, e a detomsatrico, encetadapelofreiLourenoRibeiro. (ESPNOLA, 2000: 30).poristoque,depoisdeanalisarprofundamenteocontedocrtico-literrio daobracitada de Adriano Espnola,comseusbemfundamentadosargumentos, Ronaldes pdeconcluir,comseguranaemrelaoa Gregrio deMatoseGuerra:Os fingimentos desuanovssimacomdiatropicalo credenciamcomoumdosmaiorespoetasbarrocosdaliteraturamundial.Almdoludismopolmico dotexto, do intertexto e do metatexto, opoetarevela oqueh demaisprofundonaculturabarroca, eque ainterminveldemandade umaidentidadeperpetuamente mobilizada noritmodetransedaalteridadee do emascaramento.ComoPessoa, epormaisquese desdobreemvrioseus, Gregrio de Mattos permanecesempreoannimodesimesmo. Aorasuraroeuprprioparafingirosoutroseus, opoetaconvertetodooseutextonumverdadeiropalimpsesto...................................................................................................Oenigmade Gregrio de Mattosnosimplesmentefilolgico,masradicalmenteontolgico. (SOUZA, 2000: 17)13 CONCLUSOguisadeconcluso,tragobailanovamenteoprimeirodosatuaisscioshonorriosdaAcademiaBrasileiradeFilologia(SPINA, 1995: 79-80):Incontestavelmente Gregrio deMatospossuaabsolutodomniodatcnicaversificatria: manejavatodososgnerospoticos ecomoriginalmaestria. Parodiava ossonetosclssicos, prevalecia-se dosparalelismos, dasantteses, dos calemburgos[10]depoesiasalheiasquetantafamaalcanaram,paraelaborarosseus.[11]Istotambmnodesmerece otalentode Gregrio,porquantoessasadaptaespoticas,justamentecompoesiasquegranjearamlargapopularidade,noconstituem umaartimanhaqueimpliquedesonestidade,masumafacetaporondefulge oespritobrincalhoesatricodopoetabaiano.Expurgada asuaobradessejoiomuitasvezesmalinterpretado,aindaficaummajestosomonumentoliterrio. Negar-lhe aoriginalidadequesempremereceu negaraverdadehistricadomeioemqueviveu. Gregrio,pis, uma emerso dessacorruptaeprovocantesociedadecolonial, emenosumfmulo[12]eprojeo de Quevedo,porqueumtemperamentonos imita, esobretudosatrico,quese caracterizapelaausnciaquaseabsolutadeformalismo, eporconseguinteporumalgocunhodepersonalidade.14 REFERNCIASBIBLIOGRFICASAMADO, James (ed.).Gregrio deMatos:obrapotica. 3 ed.Preparaoenotasde Emanuel Arajo.RiodeJaneiro: Record, 1992, 2 vol.COUTINHO, Afrnio.Introduoliteraturano Brasil.7 ed.RiodeJaneiro: Distribuidora deLivrosEscolares, [1972].ESPNOLA, Adriano.Asartesdeenganar:umestudodasmscaraspoticase biogrficas de Gregorio de Mattos. [RiodeJaneiro]: Topbooks, [2000].PROENAFILHO, Domcio.Estilosdepocanaliteratura(atravsdetextoscomentados). 4 ed. rev. e ampl. [RiodeJaneiro;SoPaulo]:Liceu, 1973.SOUZA, Ronaldes de Melo e. Asmscarasde Gregrio de Mattos.In:ESPNOLA, Adriano.Asartesdeenganar:umestudodasmscaraspoticase biogrficas de Gregorio de Mattos. [RiodeJaneiro]: Topbooks, [2000], p. 15-17.SPINA, Segismundo.Apoesiade Gregrio deMatos.SoPaulo: Edusp, 1995.. Gregrio deMatos.In:COUTINHO, Afrnio; COUTINHO, Eduardo de Faria. (Dir.).Aliteraturano Brasil.Vol. II,ParteII:EstilosdepocaErabarroca/Eraneoclssica.3 ed. rev. e ampl.RiodeJaneiro: Jos Olympio; Niteri: Eduff, 1986, p. 114-125.TOPA, Francisco.Ediocrticadaobrapoticade Gregrio deMatos.Porto:EdiodoAutor, 1999, 2 vol. [Doistomosemcadavolume].