A PNAD contínua como nova métrica de desemprego...a PNADC possui nível de desemprego mais alto e...

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1 Destaque Depec - Bradesco Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos Ano XII - Número 118 - 11 de setembro de 2015 Fonte: IBGE, Seade Elaboração e projeção: BRADESCO Igor Velecico A PNAD contínua como nova métrica de desemprego Taxas de desemprego: PNAD contínua e PME Ao longo dos próximos meses, a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) deverá ser encerrada e a PNAD contínua (PNADC) se tornará o único indicador de desemprego divulgado mensalmente pelo IBGE. Neste Destaque procuramos levantar alguns pontos que consideramos importantes a respeito desse novo termômetro. Ponto 1: a metodologia da PNADC é, na verdade, mais próxima da PME do que da PNAD anual (apesar do nome parecido). No entanto, a PNADC possui nível de desemprego mais alto e conta uma história ligeiramente diferente (em relação à PME) do mercado de trabalho no período recente (2014-2015). Em sua amostra até agora (março de 2012 a junho de 2015), a taxa de desemprego média da PNADC foi de 7,1%, enquanto a da PME foi de 5,4%, uma diferença de 1,7 pontos. Diferença de termômetro, não de temperatura. Ponto 2: os analistas continuarão calculando por conta própria o desemprego com ajuste sazonal. O IBGE não divulgava a taxa de desemprego com ajuste sazonal para a PME e provavelmente não o fará para a PNADC. Por conta disso, os analistas de mercado seguirão divulgando suas próprias taxas de desemprego com ajuste sazonal, como já o faziam para a PME. Em nosso caso, calculamos o fator sazonal diretamente sobre a série da taxa de desemprego. Outro ponto importante é a retropolação da PNADC, a fim de obter uma série histórica. Preferimos utilizar os dados dessazonalizados da PME e do Seade (que captura apenas o desemprego da Região Metropolitana de São Paulo e é mais longa do que a PME, iniciada em 2002). A retropolação é utilizada, por exemplo, para estimar a NAIRU 1 , a taxa de desemprego que não acelera a inflação, importante componente dos modelos de inflação. Os resultados estão ilustrados a seguir: 1 Uma referência interessante é o artigo de Ball & Mankiw, disponível em: http://scholar.harvard.edu/files/mankiw/files/jep.ballmankiw.pdf . NAIRU é a abreviação para "non-accelerating inflation rate of unemployment. Ponto 3: alguns comentários a respeito do gráfico anterior. Em primeiro lugar, nossas estimativas “em tempo real” da NAIRU para a PME e para a PNADC são, respectivamente, de 6,3% e de 8,1%. Os últimos dados de desemprego (em termos dessazonalizados) são de 7,1% para a PME (referente a julho) e de 8,1% para a PNADC (referente a junho). O próximo dado da PNADC deve trazer nova alta relevante do desemprego, jogando as duas taxas para acima do neutro, colaborando, portanto, para a desaceleração da inflação.

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osAno XII - Número 118 - 11 de setembro de 2015

Fonte: IBGE, SeadeElaboração e projeção: BRADESCO

Igor Velecico

A PNAD contínua como nova métrica de desemprego

Taxas de desemprego: PNAD contínua e PME

Ao longo dos próximos meses, a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) deverá ser encerrada e a PNAD contínua (PNADC) se tornará o único indicador de desemprego divulgado mensalmente pelo IBGE. Neste Destaque procuramos levantar alguns pontos que consideramos importantes a respeito desse novo termômetro.

Ponto 1: a metodologia da PNADC é, na verdade, mais próxima da PME do que da PNAD anual (apesar do nome parecido). No entanto, a PNADC possui nível de desemprego mais alto e conta uma história ligeiramente diferente (em relação à PME) do mercado de trabalho no período recente (2014-2015). Em sua amostra até agora (março de 2012 a junho de 2015), a taxa de desemprego média da PNADC foi de 7,1%, enquanto a da PME foi de 5,4%, uma diferença de 1,7 pontos. Diferença de termômetro, não de temperatura.

Ponto 2: os analistas continuarão calculando por conta própria o desemprego com ajuste sazonal. O IBGE não divulgava a taxa de desemprego com ajuste sazonal para a PME e provavelmente não o fará para a PNADC. Por conta disso, os analistas de mercado seguirão divulgando suas próprias taxas de desemprego com ajuste sazonal, como já o faziam para a PME. Em nosso caso, calculamos o fator sazonal diretamente sobre a série da taxa de desemprego.

Outro ponto importante é a retropolação da PNADC, a fim de obter uma série histórica. Preferimos utilizar os dados dessazonalizados da PME e do Seade (que captura apenas o desemprego da Região Metropolitana de São Paulo e é mais longa do que a PME, iniciada em 2002). A retropolação é utilizada, por exemplo, para estimar a NAIRU1, a taxa de desemprego que não acelera a inflação, importante componente dos modelos de inflação. Os resultados estão ilustrados a seguir:

1 Uma referência interessante é o artigo de Ball & Mankiw, disponível em: http://scholar.harvard.edu/files/mankiw/files/jep.ballmankiw.pdf . NAIRU é a abreviação para "non-accelerating inflation rate of unemployment.

Ponto 3: alguns comentários a respeito do gráfico anterior.

Em primeiro lugar, nossas estimativas “em tempo real” da NAIRU para a PME e para a PNADC são, respectivamente, de 6,3% e de 8,1%. Os últimos dados de desemprego (em termos

dessazonalizados) são de 7,1% para a PME (referente a julho) e de 8,1% para a PNADC (referente a junho). O próximo dado da PNADC deve trazer nova alta relevante do desemprego, jogando as duas taxas para acima do neutro, colaborando, portanto, para a desaceleração da inflação.

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Fonte: IBGEElaboração: BRADESCO

Variação interanual da PEA: PME e PNADC

Variação interanual da população ocupada:

PME e PNADC

Em segundo lugar, as projeções para os próximos 18 meses são de continuidade da elevação do desemprego, reflexo da queda esperada do PIB (de 2,7% em 2015 e de 1,0% em 2016). De fato, nossa projeção para o desemprego “ponta” ao final de 2016 é de 10% para a PME (número que não saberemos já que a pesquisa será encerrada em dezembro de 2015) e de 11,7% para a PNADC.

Em terceiro lugar, é natural que aumentos expressivos do desemprego elevem, em alguma medida, a NAIRU. Pode-se argumentar tanto pelo lado microeconômico, via destruição rápida e intensa de empregos em setores cuja capacidade de recolocação é baixa, como pelo lado macroeconômico: porque a inflação tem demorado mais para cair. Trabalhamos com um

aumento da NAIRU levemente superior a um ponto para ambas as pesquisas. Apesar desse aumento da NAIRU, o hiato do mercado de trabalho continuaria a mostrar afrouxamento.

Em quarto lugar, é interessante notar que a PME sem filtro (linha verde) e a PNADC dão a impressão de terem apresentado em 2014-2015 movimentos da taxa de desemprego muito parecidos. No entanto essa conclusão está errada: na PME, a queda do desemprego se deu porque a PEA (população economicamente ativa) caiu mais de 1% (o sugerido pela demografia é um aumento anual de 1%), enquanto na PNADC a queda do desemprego se deu porque a ocupação não mostrou desaceleração tão intensa.

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Ocupação PME vs PNADc

PME

PNAD contínua

Fonte: IBGEElaboração: BRADESCO

Os dois gráficos acima deixam bem claro que o comportamento “parecido” do desemprego da PME e da PNADC decorre de movimentos completamente divergentes entre PEA e ocupação. A pergunta óbvia decorrente dessa constatação é: em qual pesquisa se apoiar? A resposta está no ponto a seguir.

Ponto 4: para a PEA, preferimos utilizar a dinâmica da PNADC à da PME. O gráfico a seguir mostra o

histórico da taxa de participação (PEA sobre PIA, população em idade ativa) da PME, uma série razoavelmente estável desde meados de 2003, conjuntamente com a série da PNADC. Enquanto o declínio da taxa de participação da PNADC entre 2012 e 2014 é desprezível (até meio ponto percentual), a PME apresenta comportamento atípico, com queda de dois pontos na participação e impacto de primeira ordem na taxa de desemprego.

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Taxa de participação: PME e PNADC

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Taxa de participação PME vs PNADc

PMEPNAD contínua

Fonte: IBGEElaboração: BRADESCO

Ponto 5: para a ocupação, continuamos a optar por seguir os dados de geração líquida de emprego formal do Caged como fiel da balança. O motivo é óbvio: no Caged se observa praticamente todo o universo amostral, e nas pesquisas (PME, PNADC) apenas uma

amostra. O gráfico a seguir ilustra o comportamento no tempo da variação interanual do estoque de emprego formal pelas diversas pesquisas. Note-se que, na ponta, todas apontam para a mesma direção, ainda que na PNADC o movimento seja ligeiramente mais suave2.

2 O movimento na PNADC é mais suave pois a queda de 2,6% se dá em cima de uma base mais elevada, i.e., em cima da alta interanual de 5,4% vista em junho de 2014.

Variação interanual da ocupação: PME, Caged e PNADC

Fonte: IBGE, MTEElaboração: BRADESCO

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Pnad Contínua (E)PME (E)Caged (D)

Por fim, entendemos que os dados da PNAD contínua melhoram a compreensão sobre o mercado de trabalho brasileiro: (i) como novo “termômetro” do desemprego, a PNADC possui nível da taxa de desemprego cerca de 1,7 ponto percentual acima do da PME; (ii) o movimento abrupto de queda da PEA e da taxa de participação não foi corroborado pela PNADC, que mostrou uma estabilidade desses indicadores – o que faz sentido em nossa visão; (iii) a qualidade dos dados

de ocupação é boa, se aproximando razoavelmente dos dados do Caged; (iv) o termômetro de desemprego se tornou de fato nacional, com tamanho amostral bem superior ao anterior(cerca de 3.500 municípios ante as 6 regiões metropolitanas da PME). E por último, (v) a piora esperada para o desemprego da PNADC nos próximos 18 meses é substancial: esperamos que a taxa (dessazonalizada) de 8,1% em junho de 2015 atinja cerca de 11,7% em dezembro de 2016.

Série histórica da taxa de desemprego da PNAD contínua – retropolação com dados da PME e Seade, e projeção para 2015-2016 (ponta)11,6

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PNADC (retropolada e projeção)PNADC (dessazonalizada)PNADC (NAIRU)

Fonte: IBGEElaboração e projeção: BRADESCO

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Taxa de desemprego (média anual) – PNAD contínua e PME 13,0

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Desemprego - PNAD contínua

PNAD contínua

PME

Octavio de Barros - Diretor de Pesquisas e Estudos EconômicosMarcelo Cirne de Toledo - Superintendente executivoEconomia Internacional: Fabiana D’Atri / Felipe Wajskop França / Thomas Henrique Schreurs PiresEconomia Doméstica: Igor Velecico / Andréa Bastos Damico / Ellen Regina Steter / Myriã Tatiany Neves Bast / Ariana Stephanie ZerbinattiAnálise Setorial: Regina Helena Couto Silva / Priscila Pacheco Trigo / Leandro de Oliveira Almeida Pesquisa Proprietária: Fernando Freitas / Leandro Câmara Negrão / Ana Maria Bonomi BarufiEstagiários: Davi Sacomani Beganskas / Henrique Neves Plens / Mizael Silva Alves / Gabriel Marcondes dos Santos / Wesley Paixão Bachiega / Carlos Henrique Gomes de Brito

Equipe Técnica

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Fonte: IBGE Elaboração e Projeção(*): BRADESCO