A Palestina No Tempo de Jesus

download A Palestina No Tempo de Jesus

of 4

description

artigo do historiador Prof° José Tadeu Arantes para 'Arquivos - História Viva' n°4, acervo Ed. Duetto

Transcript of A Palestina No Tempo de Jesus

A Palestina no tempo de Jesus

No sculo I, - poca de Jesus, - a Palestina tinha uma superfcie de 34 mil Km2 e 650 mil habitantes. Fazia j muito tempo que havia perdido sua independncia poltica. Durante o domnio romano, no ano 37 aC, Herodes, um aventureiro sem escrpulos, foi proclamado rei da Judia pelo senado Imperial. Com extraordinria astcia, o apoio de mercenrios e a aprovao de Roma, ele se tornou um monarca poderoso, impondo sua realeza sobre um territrio que se estendia da Sria ao Egito. Seu cognome, - o Grande, - deveu-se principalmente ao fabuloso programa de obras urbansticas e arquitetnicas promovido por ele. A Histria nos mostra que Herodes, alm de um tirano cruel e astucioso, era tambm um gnio criativo e grande empreendedor.

'Herodes Atticus', Museu do Louvre

Aps a meno do nome Herodes, a pergunta que deveria imediatamente se seguir : qual deles?. A histria dessa malfadada famlia percorre todo o relato dos Evangelhos e chega ao livro de Atos. Segue a rvore genealgica resumida:

Herodes, o Grande: segundo a Bblia, assassinou as crianas de Belm, numa tentativa de encontrar e matar o Messias prometido, aquele que viria a se tornar o novo 'Rei dos Judeus' (Mateus 2,1-16).

Herodes Arquelau - Herodes Antipas - Herodes Filipe: todos estes eram filhos de Herodes o Grande. Arquelau assumiu o trono quando seu pai morreu. Foi a respeito deste que, segundo a Bblia, Jos foi avisado, em sonho, que o evitasse: assim, mudou-se com Maria e o pequeno Jesus para a Galilia, ao retornarem do Egito (Mateus 2, 19-23). Arquelau foi mais tarde banido pelos romanos e substitudo por supervisores nomeados (um dos quais foi Pilatos). Herodes Antipas e Herodes Filipe no receberam territrios menores (Lucas 3,1). Herodes Antipas era o tetrarca da Galilia, aquele que tomou parte no julgamento de Jesus.

Herodes Agripa I - Herodes Agripa II: Neto e bisneto de Herodes o Grande, respectivamente. Agripa I matou o Apstolo Tiago e aprisionou S. Pedro, nas primeiras perseguies Igreja. Ele foi "ferido com vermes" e morreu (Atos 12,1-23). Agripa II ouviu o Apstolo Paulo se defender e "quase foi persuadido" a se tornar um cristo (Atos 25,13 e 26,32).

Sabemos um pouco a respeito de como Herodes Antipas era antes de participar do julgamento de Jesus. Sua perversidade era conhecida, e o prprio Cristo advertiu quanto sua influncia: "Vede, guardai-vos do fermento dos fariseus e do fermento de Herodes" (Marcos 8,15). Joo Batista o condenou quanto ao modo com que se conduziu no caso de Herodias, que era esposa de Filipe, irmo de Antipas, mas este a seduziu e desposou (Marcos 6, 17-18). Em consequncia, foi Joo aprisionado. Herodias queria v-lo morto, mas Herodes "temia a Joo, sabendo que era homem justo e santo". Mais tarde, porm, devido a um juramento feito filha de Herodias, ordenou a decapitao do grande Profeta. (Mateus 14,8).

Assim como vrias outras cidades judaicas, Jerusalm, a cidade santa, havia sido reurbanizada ao estilo romano, cortada por grandes avenidas e embelezada com palcios, anfiteatros, hipdromos, piscinas e jardins. O preo desse ambiciosos empreendimentos foi uma opresso ilimitadas sobre o povo j sofrido. Por ocasio da morte de Herodes o Grande, no ano 4 aC, o reino foi dividido entre os filhos Arquelau, Filipe e Herodes Antipas, que, apesar de no possurem nem o poder e nem a genialidade do pai, seguiram sua carreira de crueldades.

A submisso poltica e a extorso econmica, por meio de pesados impostos, geraram uma forte oposio ao domnio romano, que culminaria em revolta generalizada: em consequncia, no ano 70 dC a populao judaica foi dispersa, e Jerusalm, destruda pelas legies comandadas por Tito, futuro imperador de Roma. - Conforme predito pelos Profetas e pelo prprio Cristo.

Jesus viveu, portanto, em um contexto extremamente conturbado. As principais foras poltico-religiosas de seu tempo estavam reunidas nos seguintes partidos e seitas:

Saduceus - Representavam o poder, a nobreza e a riqueza. Grandes proprietrios de terras e membros da elite sacerdotal, controlavam o Sindrio, o conselho supremo de Israel. Em matria religiosa, negavam a imortalidade da alma e aceitavam apenas o texto escrito da Lei (Tor), e no as suas interpretaes orais, feitas pelos rabinos. Foram os principais responsveis pela condenao de Jesus.

Escribas - Sem ligao com uma atividade econmica ou partido especfico, gozavam, no entanto, de enorme autoridade, por terem entre seus membros os intrpretes abalizados das Escrituras. Detinham forte influncia no Sindrio, nas Sinagogas e nas escolas rabnicas.

Fariseus - Separavam-se do resto da comunidade judaica pelo cumprimento rigoroso das numerosas regras de pureza prescritas na Tor. Reuniam representantes de todas as classes sociais, principalmente as dos artesos e comerciantes. Foram criticados por Jesus por desprezarem a essncia e sentido da Lei, dando maior importncia e nfase s suas mincias formais e deixando de lado o real significado por trs de todas regras e prescries formais. A sua crena na imortalidade da alma e na ressurreio, porm, era um ponto em comum entre os membros deste grupo e os seguidores de Jesus.

Zelotes ou Zelotas - Dissidentes radicais da seita dos fariseus, expressavam os sentimentos dos pequenos camponeses e dos pobres em geral. Religiosos e ultranacionalistas radicais, resistiam aos dominadores pagos e contavam com a iminente chegada do Messias para desencadear uma guerra contra os romanos. Por isso, eram duramente perseguidos pelo invasor.

Essnios - Compostos por sacerdotes dissidentes e leigos exilados, viviam em comunidades ultra fechadas, como as que foram descobertas nas cavernas de Qumran. Consideravam-se os nicos puros de Israel e levavam uma vida em comunidade extremamente austera. Praticavam rituais como o batismo e dedicavam-se aos trabalhos na lavoura. Combatiam tanto aos romanos quanto ao poder do Templo de Jerusalm, e propunham uma guerra santa para instaurar o que chamavam de Reino dos Justos.

Representao artstica do magnfico Templo de Jerusalm, cujos triospodiam comportar um milho(!) de peregrinos (clique para ampliar).

Muito mais que um local de culto, o Templo de Jerusalm era o centro econmico, poltico e religioso de Israel. Lucrava com a arrecadao de impostos, tendo em seu cadastro cerca de 1 milho de contribuintes, dentro e fora da Palestina. Alm disso, auferia somas fabulosas com o sacrifcio de animais (bois, carneiros e pombos), criados por grandes proprietrios de terras ligados s famlias sacerdotais. Calcula-se que, na poca de Jesus, por ocasio da Pscoa, foram imolados, em suas dependncias, mais de 250 mil cordeiros(!).

Para pagar pelos animais a serem sacrificados, os fiis eram obrigados a trocar o dinheiro corrente, altamente inflacionado, pela tetradracma tria, uma moeda forte, cunhada na Fencia, que no sofreu nenhuma desvalorizao num perodo de 300 anos. Os cambistas cobravam gio de 8% pela operao e formavam uma mfia poderosa, mancomunada com a elite sacerdotal. Quando expulsou os vendedores de animais e cambistas do Templo, Jesus golpeou de frente essa poderosa rede econmica. Provavelmente tenha sido esse confronto, mais do que quaisquer outros, que tenha provocado a sua condenao.

Este post foi baseado num artigo do historiador Prof Jos Tadeu Arantes para 'Arquivos - Histria Viva' n4, acervo Ed. Duetto