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1 A MORTE E O SEU MISTÉRIO CAMILLE FLAMMARION VOLUME III I PESQUISA GERAL SOBRE A REALIDADE DAS MANIFESTAÇÕES DE MORTOS As verdades matemáticas só podem ser julgadas por matemáticos. Eu desprezo o julgamento dos mateólogos ignorantes. COPERNICO (Dedicatória do seu livro ao Papa, 1543.) Cada qual só deveria julgar do que entendesse. O bom senso Nosso volume «A Volta da Morte», segundo dessa trilogia metapsíquica, deu aos seus leitores a certeza dos fantasmas de vivos, das aparições e manifestações de moribundos, produzindo-se a qualquer distância, transmissões telepáticas irrecusáveis, e terminou com esta interrogação: «Nos Obteremos as mesmas provas de autenticidade, a mesma certeza quanto à existência real dos mortos ?» «Eis um livro de boa fé» dizia Montaigne em seus inesquecíveis «Ensaios» : deve caber a mesma afirmação para esta obra. Chegamos à porta do templo fechado. Mas já esta porta pareceu entreabrir-se em nossas excursões à fronteira dos dois mundos. Este terceiro volume tem por fim estabelecer a sobrevivência por meio de fatos observados, e isto pelo mesmo método experimental, independentemente de qualquer crença religiosa. O raciocínio e a meditação podem auxiliar na pesquisa da verdade; mas não são suficientes, não o foram até hoje para descobri-la. A observação positiva é indispensável para nos convencer. As teorias de nada valem quando não se esteiam em realidades . Ora, é de notar que a questão por excelência capital, qual a de sabermos se somos efêmeros ou duradouros, se sobrevivemos à morte, ficou até hoje fora do quadro das ciências clássicas. O habitante da Terra é um ente

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A MORTE E O SEU MISTRIO

CAMILLE FLAMMARION

VOLUME III

I

PESQUISA GERAL SOBRE A REALIDADE DAS MANIFESTAES DE MORTOS

As verdades matemticas s podem ser julgadas por matemticos. Eu desprezo o julgamento dos matelogos ignorantes.

COPERNICO

(Dedicatria do seu livro ao Papa, 1543.) Cada qual s deveria julgar do que entendesse.

O bom senso

Nosso volume A Volta da Morte, segundo dessa trilogia metapsquica, deu aos seus leitores a certeza dos fantasmas de vivos, das aparies e manifestaes de moribundos, produzindo-se a qualquer distncia, transmisses telepticas irrecusveis, e terminou com esta interrogao: Nos Obteremos as mesmas provas de autenticidade, a mesma certeza quanto existncia real dos mortos ?

Eis um livro de boa f dizia Montaigne em seus inesquecveis Ensaios : deve caber a mesma afirmao para esta obra.

Chegamos porta do templo fechado. Mas j esta porta pareceu entreabrir-se em nossas excurses fronteira dos dois mundos. Este terceiro volume tem por fim estabelecer a sobrevivncia por meio de fatos observados, e isto pelo mesmo mtodo experimental, independentemente de qualquer crena religiosa.

O raciocnio e a meditao podem auxiliar na pesquisa da verdade; mas no so suficientes, no o foram at hoje para descobri-la. A observao positiva indispensvel para nos convencer. As teorias de nada valem quando no se esteiam em realidades .

Ora, de notar que a questo por excelncia capital, qual a de sabermos se somos efmeros ou duradouros, se sobrevivemos morte, ficou at hoje fora do quadro das cincias clssicas. O habitante da Terra um ente

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esquisito: vive num planeta sem saber onde est, sem ter a curiosidade de indag-lo de si mesmo e sem procurar conhecer a sua prpria natureza!

E' chegado o tempo de atacar a fortaleza da ignorncia secular, e isso sem dissimular dificuldade alguma, objeo alguma.

Antes de nos entregarmos a nossas pesquisas e para no nos expormos a perder nosso tempo - pois no h coisa mais absurda que o tempo perdido -, parece-me que meu primeiro dever, como sinal de respeito para com os inmeros leitores que me honram com a sua ateno, ser de abranger, sob a mesma rubrica de recapitulao, as comunicaes aos milhares que me foram dirigidas, aduzindo-lhes outras tantas feitas em outros pases e em todas as pocas, e ver se algumas se apresentam com tal evidncia que nos prometam a certeza desejada, libertem-nos do temor formulado aqui, autorizando-nos a tomar em considerao o assunto a examinar. Teremos ocasio de classificar mais tarde, em diversas categorias, os fenmenos observados. Faamos, pois, primeiro um ligeiro exame que ilumine espontaneamente nosso campo de estudos .

Das 4.800 cartas que recebi dos correspondentes com os quais estava - ou estive depois - em relaes e cuja sinceridade e valor moral pude apreciar, dessas s destaquei algumas centenas de observaes, dentre as que me pareceram inatacveis. Agi exatamente como agimos para com as compilaes cientficas, quando publicamos uma observao astronmica, meteorolgica, geolgica e mesmo com maior severidade. Nada de romances, nada de fantasias. Estrita observao. Os leitores que acusariam esta obra, ou a precedente, O Desconhecido,, de falta de mtodo, demonstrariam que tiveram a preguia de examinar seriamente o assunto ou que realmente esto desprovidos do esprito de anlise .

No tenhamos nenhum preconceito, nem religioso, nem anti-religioso. Nas crenas menos argumentadas, descobre-se muitas vezes um fundo de verdade mal interpretada. Observemos com independncia e formemos nosso juzo . H espritos obtusos . No os imitemos . - Eu, dizia um dia certo negador impenitente a um livre pesquisador, s acredito no que posso compreender. - E todos sabem que o senhor em nada acredita! - retorquiu o interlocutor.

Os princpios do mtodo cientfico nos ordenam de receber as narraes de fenmenos, fora do natural, com a mxima circunspeo, considerando-os a priori como suspeitos, precisamente porque so extraordinrios e inexplicveis. E difcil, primeira vista, de aquilatar qual o valor dos narradores, a respeito da sua prpria sinceridade e do seu equilbrio mental. Poderia citar mais de um pseudo-historiador fazendo pouco caso do respeito verdade. O nome do signatrio no sempre uma garantia. A narrao muito simples de uma observao feita por testemunha atenta e sbria, sem preterio literria, muitas vezes de melhor qualidade que a de um escritor profissional. Podemos at pensar que um romancista, habituado a inventar

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fices, seja muito capaz de apresentar fatos falsos como realidades e isso sem o mnimo remorso. Todas as narraes devem ser, a priori, consideradas como suspeitas, porm declar-las toda inadmissvel simplesmente estupidez. Existem fatos reais. Apesar da incerteza das testemunhas histricas, peo licena para repetir a afirmao que Lus XVI morreu na guilhotina, a 2l de Janeiro de 1793, em Paris, e que o cadver embalsamado de Napoleo jaz no sarcfago de mrmore doa Invlidos . Procedamos assim: 1 com prudncia; 2 com toda a liberdade de apreciao .

O mtodo que aqui adotamos para este estudo parece-nos o mais seguro, o mais inatacvel.

Verificamos, na segunda parte dessa obra, que a alma ao separar-se do corpo manifesta-se de maneiras diferentes, muitas vezes a grande distncia do lugar do falecimento. Mas essas manifestaes poderiam provir do ser humano ainda vivo, pois o momento preciso da morte extremamente difcil de se marcar, psicologicamente falando.

Vimos passar diante de nossos olhos fenmenos diversos que se produziram num estado psquico intermedirio entre a vida e a morte e que no parecem ser manifestaes de mortos. No quisemos dissimular as objees que se erguem diante do problema que deveremos resolver; enfrentamos as dificuldades, porque o estudo cientfico , antes de tudo, franco e leal. E com a mesma lealdade, a mesma sinceridade, a mesma independncia de esprito que devemos examinar os fatos de observaes que agora se nos vo apresentar.

Trata-se de estudar imparcialmente, de discutir, de interpretar grande nmero de fenmenos que se nos apresentam como manifestaes de mortos. Se os atos produzidos por certas faculdades da alma, desconhecidas ou pouco estudadas, tais como as transmisses psquicas distncia, vontade agindo sem intermedirio, a telepatia, a vista sem os olhos, a audio sem os ouvidos. a previso do futuro, revelam sob diferentes aspectos a existncia pessoal da alma, que deve ser considerada. de ora em diante, no como efeito, mas como cansa: esse assunto nos dar testemunhos formais e categricos da sobrevivncia. Esses fatos, por serem inexplicveis, nos obrigam a admitir que em ns existe um princpio espiritual diferente dos atributos fisiolgicos. fsicos, mecnicos, qumicos, do organismo animal, que ficam intactos quando o corpo se desagrega.

O valor, porm, das nossas concluses est intimamente ligado severidade do nosso mtodo. Devemos evitar atribuir aos mortos todos os fatos inexplicveis que nosso primeiro volume (Antes da Morte) levou-nos a suspeitar da existncia de faculdades humanas ainda no determinadas .

Vamos ter sob nossas vistas manifestaes, aparies, observadas depois da morte, muitas vezes cumprindo intenes expressas em vida. Nosso dever , sem a menor dvida, tentar primeiro explic-los como atos de viventes, como funes cerebrais; mas havemos de reconhecer que, apesar da melhor

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boa vontade, no isso fcil, e que, sem idia preconcebida, somos obrigados a admitir vontades de mortos .

Uma comunicao entre um ente morto e um ente vivo comunicao entre um esprito em certa fase da existncia, e um outro esprito em fase completamente diferente, efetuando-se por um meio diverso dos rgos fsicos, pois que do outro lado estes rgos no existem mais. Examinemos tudo com cuidado, sem nos encerrarmos num quadro sistemtico .

Neste exame continuaremos a obedecer ao princpio que at agora nos guiou : nada de frases, nada de dissertaes e de hipteses : FATOS .

Antes de tudo, declaremos que os fenmenos pstumos, que vamos examinar, no esto em desacordo com a lei biolgica da continuidade . Demonstram, pelo contrrio, que a vida continua alm-tmulo, e isto muito simplesmente, muito naturalmente . As aparies, no momento da morte, lanaram para ns uma ponte entre os dois mundos ; levam-nos diretamente, sem soluo de continuidade, s aparies depois da morte.

*

A Cincia deve estudar os fenmenos psquicos como estuda os fsicos, sem se deter com as inverossimilhanas. Teramos acaso podido admitir, antes da descoberta das ondas hertzianas, que seria possvel transmitir uma onda eltrica, sem fio, a uma distncia de milhares de quilmetros? Teramos rido se tivessem pretendido poder fotografar um objeto de metal contido numa caixinha de madeira espessa! No teramos chamado louco quele que nos tivesse dito que veramos um dia fotografias dos nossos ossos obtidas atravs da nossa carne e nosso vesturio? Tudo no estava ento e no est ainda por estudar?

Descurar observaes sob o pretexto de que so raras e excepcionais erro e anticientfico. A descoberta dos raios X foi devida a um acidente; a do rgon foi devida a uma anomalia no modo de agir do azoto; foi o desacordo entre as posies observadas e calculadas de Urano que revelou a existncia de Netuno, etc.

Compreendemos ns as transmisses telepticas no momento da morte? No. So elas absolutamente certas? Sim. So ainda mais freqentes do que o deixei entrever. Enquanto estava redigindo estas pginas (Julho de 1921), recebi a seguinte carta de meu ilustre amigo Camilo Saint-Sans, arrebatado alguns meses depois (16 de Dezembro) afeio dos seus admiradores:

Tornando a ler pela nona vez teu ltimo volume, urna recordao desperta em minha memria e no deixo para amanh escrever-te a este respeito.

Era em Janeiro de 1871, no ltimo dia da guerra . Estava eu nos postos avanados, em Arcueil-Cachan, acabvamos de jantar um excelente cavalo com que tnhamos feito cru bom cozido e tnhamos apanhado tarxacos, cuja

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raiz, nesta estao do ano, est muito desenvolvida; em suma, um jantar que a todos ns satisfizera e estvamos todos to alegues quanto era possvel s-lo, dadas as circunstncias; subitamente ouvi cantar no meu crebro o lamento musical de que fiz, mais tarde, o preldio do meu Rquiem, e senti no meu ntimo que uma desgraa me acontecia. Angstia profunda me acabrunhou.

Neste momento mesmo morria Henrique Regnault, ao qual me prendiam laos da mais viva amizade. A nova da sua morte me causou tal pesar, que adoeci e tive que ficar trs dias de cama.

Experimentei pois a realidade da telepatia, antes da inveno desta palavra. Como tens razo de pensares que a cincia clssica no conhece o ente humano e que temos que aprender tudo!

De todo o corao

C. Saint-Saens

(Carta 4.565.) Eis mais uma observao psquica a reunir a todas as que meus leitores

apreciaram e qual o nome daquele que a experimentou d um valor especial. A comunicao teleptica duma alma para outra, durante a vida, no

duvidosa; no o to-pouco depois da morte . Dados nossos conhecimentos atuais sobre as radiaes, sobre as foras

fsicas e psquicas, sobre a constituio atmica da matria, creio que estamos agora nos casos de analisar nosso assunto com uma ateno mais proveitosa do que outrora, com a esperana fundada de obter resultados de alta importncia . Examinemos pois este grave assunto sob todos os seus aspectos, mantendo-nos isentos das idias preconcebidas que poderiam prejudicar a independncia do nosso julgamento.

Vou apresentar ateno imparcial dos nossos leitores uma primeira srie de observaes que me parecem absolutamente demonstrativas. Assim deve ser a introduo lgica deste terceiro volume para merecer seu ttulo: Depois da morte.

*

Procurai e achareis JESUS-CRISTO.

Uma das mais demonstrativas manifestaes de mortos que eu conheo,

a que foi relatada por um positivista sinceramente materialista, o Doutor Caltagirone, de Palermo, o qual a observou em pessoa; ouamos a verso que dela deu . O fato passou-se no h muito tempo, em Dezembro de 1910.

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Era eu, escreve ele, o amigo de Benjamim Sirchia; e at seu mdico. Sirchia, muito conhecido em Palermo, era um velho patriota, muito popular. Tinha qualidades morais e cvicas excelentes; era um incrdulo como eu, no sentido mais lato da palavra.

Um dia, no ms de Maio de 1910, comeamos a discutir sobre os fenmenos psquicos; respondi s suas perguntas assegurando-lhe que conclua por minha prpria experincia que alguns destes fenmenos eram reais, porm a sua interpretao era contestvel. Durante esta conversa, disse-me em tom de gracejo:

- Escute, doutor, se eu morrer primeiro, o que provvel, pois sou velho e o senhor ainda moo, forte e robusto, dou-lhe minha palavra que virei trazer-lhe a prova da minha sobrevivncia, se eu ainda existir.

Eu, rindo, e no mesmo tom de brincadeira, retorqui - Ento vira manifestar-se quebrando alguma coisa neste quarto, por

exemplo, este lustre, por cima da mesa... - (Estvamos ento na sala de jantar.) E para ser corts acrescentei: - Se eu morrer primeiro, tambm prometo ir a sua casa fazer alguma demonstrao do mesmo gnero!

Repito-o ainda, tudo isso foi falado antes como gracejo que seriamente. Ns nos separamos e ele partiu alguns dias depois para Licata, provncia de Girgnti, onde se ia estabelecer. Desde esse dia nunca mais tive noticias dele, direta ou indiretamente. A conversa tivera lugar em Maio de 1910. No ms de Dezembro seguinte (no dia l ou no dia 2), pelas 6 horas da tarde, estava eu sentado mesa com minha irm, nica pessoa que vive comigo, quando nos chamou a ateno o rudo de vrias pancadinhas dadas no abajur do lustre suspenso ao teto da sala de jantar e na campainha mvel de porcelana do fumivoro, colocada por cima do vidro tubular de cristal. A principio, atribumos essas pancadinhas a estalidos produzidos pelo calor da chama que tentei diminuir. Mas as pancadas se tornaram mais fortes e continuaram obedecendo a um certo ritmo. Trepei ento numa cadeira para examinar com mais cuidado o que havia, e verifique) que o fenmeno no podia ser atribudo ao calor da chama, que funcionava com presso muito normal.

Ao demais, no se tratava a de pequenos estalidos, como os que so produzidos por um calor extremo, porm eram pancadas curtas, de timbre especial, lembrando os estalidos feitos com as juntas dos dedos ou os que se produziria com uma varinha em objeto de porcelana. Tentei descobrir a causas dessas pancadas esquisitas. Nada. Enfim terminamos o jantar e o fenmeno cessou .

No dia seguinte, noite, o mesmo tilintar foi ouvido e assim aconteceu durante quatro ou cinco dias seguidos, o que aguou ainda mais a nossa curiosidade.

Mas, na ltima noite, uma pancada forte e seca partiu em dois pedaos a campainha mvel, permanecendo ela neste estado, pendurada no gancho do contrapeso metlico. Foi o que pude verificar quando fiquei em p em cima da

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mesa, pois queria ver de perto o efeito da ultima pancada. Lembro-me bem, e minha irm igualmente, que embora tivssemos apagado a luz central, em volta da qual se realizava o fenmeno, e tivssemos acendido um dos ramos do lustre, as pancadas continuaram com a mesma intensidade.

Devo igualmente declarar e afirmar, sob minha palavra de honra, que durante os cinco ou seis dias em que se repetiu este fato estranho, que eu no podia explicar, nunca pensei no meu amigo Benjamim Sirchia e nem me recordei da conversa do ms de Maio precedente, conversa que eu tinha esquecido totalmente.

No dia que se seguiu a ltima noite, durante a qual a campainha arrebentara, estava eu no meu gabinete: eram mais ou menos 8 horas da manh. Minha irm estava janela, vendo no sei qu, na rua; a criada tinha sado; sbito, ouviu-se um rudo estrondoso na sala de jantar, como se tivessem batido na mesa com uma clava.

Minha irm ouviu-o da janela e eu do meu gabinete: corremos ambos para ver o que tinha acontecido.

E extraordinrio, mas, por mais fantstico que seja este fato, garanto-lhe a veracidade: em cima da mesa, e como a tivesse ali sido colocada por mo humana achamos a metade da campainha mvel, tendo ficado a outra metade suspensa em seu lugar.

Evidentemente o estrondo to violento no estava em relao com o incidente. Foi o ltimo fenmeno que ps o remate a estes fatos esquisitos, repetindo-se eles durante cinco ou seis dias, sendo que este remate se deu em pleno dia e sem a ao do calor.

A queda da metade da campainha de porcelana no se podia realizar perpendicularmente a mesa, pois, tendo que passar pelo centro do abajur, teria esbarrado no tubo do aparelho e na camisa deste e ambos teriam quebrado com o choque, podendo assim passar a metade da campainha do fumivoro; ora, estes dois objetos estavam intactos.

Se ela tivesse cado obliquamente sobre o abajur de porcelana, a metade da campainha ter-se-ia queixado ou teria quebrado o dito abajur; se admitirmos que ela tenha escorregado sem nada quebrar, devia, neste caso, ter saltado para um ponto afastado do centro da mesa e no perpendicularmente ao eixo do aparelho.

Conseqncias: o barulho foi um aviso do fenmeno, e o pedao de campainha foi colocado de modo a demonstrar que o fato no era devido a um acidente, o qual, ao demais, estaria em oposio com as leis da queda dos corpos.

Devo ainda confessar que eu me tinha esquecido absolutamente de Sirchia e do pacto feito entre ns no ms de Maio precedente.

Dois dias depois, encontrando-me com o professor Rusci, este me disse: - Sabia que o pobre Benjamim Sirchia morreu? - Quando ?

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- perguntei com ansiedade . - Nos ltimos dias de Novembro; foi a 27 ou 28. Que coisa estranha! Nos

ltimos dias de Novembro, pensei eu ento. Os fenmenos que se passaram em minha rasa teriam alguma relao com sua morte ? (Lembrava-me da nossa ltima conversa, com todos os seus pormenores to caractersticos.) Comearam eles no dia 1 ou no dia 2 de Dezembro e prosseguiram durante cinco ou seis dias. A tentativa de quebrar alguma coisa do lustre da sala, de jantar, fora coisa combinada entre ns, no ms de Maio, e esta manifestao cessou com a execuo final do que tinha sido marcado... Coisa tambm muito estranha, quando foi assim executado o pacto, uma pancada formidvel o anunciou como para evidenci-lo quase! O transporte da campainha para um lugar onde era normalmente impossvel que casse por si, salvo o acaso, completa a estranham manifestao.

Eis a minha observao pessoal. Eu e minha irm conservamos como recordao deste fenmeno

inexplicado os dois pedaos da campainha e os colocamos com as coisas que para ns so mais preciosas e mais queridas.

DR. VICENZO CALTAGIRONE

Tal a narrao da testemunha. Parece-me lgico tirar dessa observao concluso que dela ressalta,

assim como procedemos numa experincia de qumica ou de fsica, e devemos afirmar que ela prova o seguinte : 1 - Este amigo ainda existia quatro, cinco, seis, sete, oito dias aps a sua morte; 2- ele tinha conservado sua conscincia, sua individualidade; 3 - recordava-se da sua promessa; 4 - pde realiz-la .

E certo que ignoramos sob que forma se pode existir depois desta vida, quais as faculdades das nossas monadas psquicas e como as podem agir materialmente, mecanicamente como neste exemplo to caracterstico.

Mas o fato a est. No h possibilidade de evasivas. Explic-lo impossvel, no estado em que esto os nossos

conhecimentos, porm esta impossibilidade de explicar o fato no lhe diminui o valor. Para o estudo do mundo psquico estamos no mesmo ponto em que estava Newton quando procurava explicar o sistema do mundo fsico e aqui podemos aplicar seu modo de raciocinar... As coisas se realizam, escrevia ele, como se os corpos se atrassem uns aos outros, em razo direta das massas e em razo inversa do quadrado das distncias. Quanto ao saber como se faz, ignoro. Digamos do mesmo modo: As coisas se realizam como se o morto agisse .

Criticar a lgica deste argumento parece-me inverossmil. A velha hiptese das coincidncias acidentais no mais aceitvel. As combinaes mais alambicadas nada concluem. E' preciso negar a observao ou confessar que inexplicvel.

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Repito com Newton: As coisas se realizaram como se o amigo do Doutor Caltagirone tivesse cumprido sua promessa. E este o verdadeiro mtodo cientfico, no a negao cega, persistente e sistemtica.

Ainda uma vez, digamos que no sabemos como uma alma pude bater em um lustre, quebrar a campainha de um fumivoro de porcelana e dar forte pancada na mesa (1). H centenas de observaes.

As que lemos nos dois primeiros tomos desta obra nos induzem a pr em jogo a fora eltrica; mas esta hiptese nada nos ensina, pois que ningum sabe o que a eletricidade. Alm de que h na Natureza foras desconhecidas; podem-nas representar papel preponderante nestes fenmenos. Estas que devemos descobrir e no nos inspirar no mtodo de certos sbios contemporneos, que pretendem que a Cincia s tem o direito de explicar os fatos observados por meio das foras conhecidas e no deve admitir o desconhecido.

Recebi to elevado nmero de narraes diferentes, de todos os pases do mundo, em todas as lnguas, de todas as classes sociais, assim como de todas as idades, desde 3 infncia mais ingnua e mais ignorante at a idade de competncia unida experincia esclarecida e severa anlise psicolgica, que fico absolutamente impossibilitado de descrer das manifestaes de mortos em certos casos e do mesmo modo no posso duvidar da sua sobrevivncia, pelo menos durante um certo tempo.

Cumprir uma promessa para provar a um amigo que a existncia perdura depois do ltimo suspiro , evidentemente, uma indicao bastante decisiva. Que mais podemos pedir?

Essas pancadas, esses movimentos mecnicos, esses fenmenos fsicos so manifestaes de uma fora procedente do esprito. Vimos um grande nmero de manifestaes de fora psquica no tomo II.

Este termo: fora psquica, que eu tinha posto em moda em 1865, com a publicao do meu opsculo primitivo As Foras Naturais Desconhecidas, foi discutido e mesmo algum tanto ridiculizado por certos escritores argui-clssicos, bem intencionados e extraprudentes. Um filsofo, alis justamente estimado, por certos trabalhos de histria astronmica, a Senhor Th. Henri Martin, decano da Faculdade de Letras de Renes, membro do Instituto, escrevia entre outras coisas : No me parece necessrio discutir seriamente as foras naturais desconhecidas a que o Senhor Flammarion chama psquicas e que seriam as promotoras dos movimentos inteligentes das mesas e dos outros prodgios atribudos aos mdiuns (2). O clebre professor de Renes no admite a existncia dessas foras desconhecidas. Aps longa dissertao sobre as experincias de Agenor de Gasparin, de Thury e outros observadores, das quais nada entendeu, e, falta de melhor, colocando-se ao lado do R. P. Matignon e dos partidrios da interveno do demnio, escreve ele: Vejo fortes probabilidades para que esses prodgios sejam atribudos em parte

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iluso e em parte fraude (3) . Ou por outra: coisa nenhuma. Eis o que disseram nossos predecessores clssicos nessa ordem de pesquisas.

O fato que acabam de ler caracterstico. Atribu-lo a faculdades humanas desconhecidas ou ento ao acaso parece-me coisa ultratemerria. Seguramente preferiramos ter visto a causa dessas pancadas propositais . Vemos os fantasmas? Sim, s vezes. Eis uma observao, precisa e positiva.

A carta abaixo transcrita foi-me dirigida de Lio, a 25 de Abril de 1921. Senhor e caro Mestre: Permita-me declarar-lhe, antes de tudo, que na minha mocidade (que est

longe) eu ria vontade quando, por acaso, falavam em minha presena das manifestaes do alm: tinha o cepticismo de - digamos a coisa como - da imbecilidade.

Passou a mocidade, veio idade madura, e se, entre as pessoas com quem estava, agitavam essas questes, j no ria mais, porm no era crente. Havia progresso. Ora, eis o que se deu comigo mesmo

Uma noite de outono, a temperatura j estava fria, estava eu ento sentado perto do fogo onde ardiam alguns tocos de lenha. Numa poltrona, diante de mim, minha mulher estava sentada de costas para a janela que dava para a varanda aberta, que servia de passagem aos quartos do primeiro andar da minha casa. Eu no estava sonhando, asseguro-lhe, pois acabava de percorrer um tratado Transformadores eltricos, obra que no se presta a devaneios. Estava, pois, longe de pensar em fenmenos extraterrestres, quando meu co, um lulu da Pomerania, deitado diante da lareira, ergueu-se e ps-se a latir, olhando para a janela e vindo depois se deitar, sempre rosnando, perto da minha poltrona .

Olhei rapidamente para a janela, e vi, por detrs do vidro, uma sombra de contornos vaporosos, indecisos, que parecia ter sido esbatida a esfuminho por Henner. Essa sombra dirigiu-se para a porta do meu quarto. No pude conter uma exclamao. Fracamente atravessada de lado a lado pela luz de um bico de gs bastante afastado, ela caminhava lentamente, com andar que denunciava. leve claudicao. Malgrado a minha vontade, exclamei: Oh! o pai!

Era ao mesmo tempo o aspecto corpreo, o andar do pai de minha mulher, falecido havia dois anos. Era ele mesmo. Levantei-me pressa, arremessando-me porta que abri bruscamente e... nada!

No podia ser uma alucinao; o livro que eu acabava de percorrer, e que ainda segurava, no dava propenso a isso, e minha mulher que se virara, ouvindo meu grito, tinha percebido, como eu, esta sombra cuja recordao lhe era to querida.

Quando entrei no meu quarto, meu co j se tinha refugiado debaixo da cama e continuava a rosnar.

Desde essa poca nada mais vi. Aceite, senhor e caro Mestre, a homenagem da minha admirao .

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BALLET-GALLIFET

12, ladeira do Greillon, em Lio.

(Carta 4 .462.) Todas as cartas que recebi no possuem o valor desta. O observador um

cientfico . Sua observao espontnea foi reforada pela da sua senhora, e o que no se deve desprezar, pela sensao do co. Tudo isso no banal.

Conforme meu hbito, deliberei fazer sobre o caso um inqurito independente . Entre as pessoas com quem estou relacionado em Lio, uma pareceu-me, pelos seus trabalhos e pela sua competncia, indicada para me auxiliar no inqurito : a Sra . Rougier, minha digna colega da Sociedade Astronmica de Frana e do Instituto Metapsquico. Escrevi-lhe - sem lhe dar pormenores do assunto - para que fosse, sob qualquer pretexto, visitar o autor da comunicao precedente, levar a conversa para esses assuntos e ouvir atentamente a narrativa pessoal que ele pudesse fazer a respeito da sua observao.

Da sua amvel resposta, copio o que segue Recebi hoje de manh, 2 de Maio, a carta com que me honrou. Comeo

esta resposta s 6 horas menos 5 minutos, e tenho o prazer de lhe dizer que voltamos agora, eu e meu marido, da casa do Senhor Ballet-Gallifet. Este senhor recebeu-nos cordialmente e no demorou em falar-nos da apario to surpreendente que ele e a Senhora Ballet-Gallifet viram, reconhecendo ambos o pai desta senhora. Eis a sua narrativa:

Estvamos em nossa casa, eu e minha mulher, s 9 horas da noite, quando, subitamente, nosso co latiu, percebendo algum que entrava. Era um homem que se adiantava vagarosamente. Fiquei tomado de espanto ao reconhecer meu sogro, pois no somente a personagem era ele mesmo, mas tambm coxeava como ele. Meu sogro era coxo. Se eu no tivesse notado logo esta particularidade que me fez reconhec-lo de longe, teria ido buscar uma arma, tomando-o por um malfeitor. Minha mulher foi igualmente testemunha da apario

Seus dois ltimos livros que levaram o Sr. B. G. a assinalar este fato antigo, de quinze anos! Este leitor uma inteligncia que se interessa vivamente por tudo que constitui o progresso, seja na Cincia, seja na Arte; ele nos pareceu digne de f, sob todos os pontos de vista. Devemos ir daqui algum tempo visitar a sua senhora, que no pde aparecer, porque meu marido no tinha tempo para demorar; porm, eu a avistei sem que me fosse possvel conversar com ela.

T. ROUGIER.

(Carta 4 .470 .)

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Posso anunciar-lhe que no dia 20 de Maio fui l de novo e a Senhora B.

G., que no pudera ver da primeira vez, confirmou-me todos os fatos narrados por seu marido, parecendo interessar-se muito pelo estudo para o qual exigis observaes seguras. Acrescento que o Sr. B. G. nos disse ainda: O fantasma deslizava, no andava.

T .ROUGIER..

(Carta 4 .514 .) Uma outra carta do Sr . Ballet-Gallifet deu-me e, data da morte do seu

sogro: 19 de Maro de 1904. Foi no correr do ano de 1906 que a observao foi feita. Esta ltima carta vinha acompanhada de uma planta (carta 4.484) que no me parece necessrio reproduzir.

Por estas comprovaes, no pode a apario ser posta em dvida pois, como notamos, est confirmada pela impresso do co. Supor que h, nesse caso, trplice alucinao seria como se negssemos a realidade de tudo o que vemos diante de nossos olhos a qualquer hora do dia .

Ofereo aos meus leitores esta observao, depois da precedente, por causa da sua disparidade . A objeo da coincidncia, que poderia ser aplicada primeira, no poderia ser aplicada a esta. E' outra ordem de testemunho. Que possvel imaginar-se aqui? Uma alucinao do narrador, da sua mulher e do co? Que dizer a isso? A variedade dessas manifestaes de mortos pleiteia em favor da sua realidade . Eis a uma terceira, completamente diferente.

Uma manifestao to difcil de negar quanto as duas precedentes a que est narrada na seguinte carta. Essa comunicao me foi mandada de Ruelle (Charente), no dia 9 de Junho de 1921. Transcrevo aqui o essencial:

Os fatos que o senhor expe e discente so hera mim de veracidade contestvel. Relatou (4) o senhor uma carta que eu lhe escrevi h mais de vinte anos, ao acabar de ler O Desconhecido. E o que h de mais autentico, e, entretanto, nem esta pancada nem este movimento da cortina, coincidindo com um falecimento, furam as coisas que me convenceram de que tudo no est terminado aps a morte; o que me convenceu foi o fato que lhe vou narrar.

Vou dizer-lhe em que se baseia a minha convico; no de ontem, pois recordao de infncia; porm, ficou gravado na minha, memria e vejo em pensamento o lugar onde se passou o fato, tal qual se tivesse dado ontem. E ainda no Isere, em Saint-Gervais, onde havia outrora uma fundio de canhes para a Marinha. Morvamos numa casa, dada como moradia pelo Estado. Meu pai era um adepto fervoroso do Espiritismo; eu, muito moo, no lhe dava nenhuma ateno, tanto mais quanto meu pai se entregava sozinho a este estudo.

Em Rochefort-sur-Mer, tinha ele um amigo, chamado Cognet, cuja morte lhe foi anunciada Por uma carta.

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Uma noite, depois de ter recebido esta carta (no me recordo se foi no mesmo dia em que recebeu a carta, ou se foi depois), estvamos deitados. As duas camas estavam colocadas numa alcova cujas portas se encontravam abertas, mas, quando eu estava deitado, dava as costas para os dois batentes da porta e eu no podia ver nada no quarto precedente alcova. No dormia; ouvia meu pai falando um tanto baixo na sua cama, mas no compreendia as palavras que ele pronunciava. Sbito, vi uma luz que me fez soltar um grito de medo. Meu pai levantou-se e pos me perto dele na mesma cama. A luz persistia; era uma espcie de nuvem fosforescente, sem contornos precisos.

Disto, eu me lembro muito bem, porque o vi da cama de meu pai. Repare que a luz me havia impressionado, embora estivesse de costas e no houvesse espelho nenhum em que pudesse ser refletida. Meu pai pronunciou estas palavras em voz alta: Se fores Cognet, bate trs pancadas na cmoda. Este traste, com tampo de mrmore e que ainda tenho em meu poder, estava no quarto que precedia a alcova. Trs pancadas fortes e espaadas foram dadas ento no mrmore da cmoda. Depois, pouco a pouco, a luz diminuiu, desfez-se e no vi mais nada. No me lembro se meu pai fez outras perguntas; muito provvel que sim, mas no me recordo.

Pois bem, este simples fato, em que pensei durante toda a minha vida e no qual refleti mais tarde, quando pude raciocinar, foi o que me deu a convico, a certeza de que tudo no fica terminado com a morte. Muitas vezes diziam diante de mim

- Depois da morte, no h mais nada. - Sim - replicava eu - h alguma coisa. - Como sabe ? - Vi. Vi, sem ter vontade de ver; ouvi, tremendo de medo.

TEXIER Fundio de Ruelle (Charente) .

(Carta 4 .528 .) Embora essa observao s tenha tido duas testemunhas um pouco vagas,

parece-me dever ser registrada com toda a segurana. A recordao do fato foi conservada com preciso . Meus leitores conhecem outras iguais, por exemplo, a luz, iluminando o quarto, coincidindo com uma morte (tomo II), as manchas luminosas, fosforescentes, correspondendo ao estado comatoso que precedia o falecimento de um pai (idem), a aurola luminosa cercando um morto (idem), a apario envolta numa luz muito viva (idem), a iluminao dum quarto (idem) .

Essas luzes misteriosas foram bastantes vezes notadas, sempre espontaneamente. Devemos ver nisso, como nas circunstncias anlogas, a manifestao do defunto, que, por conseguinte, ainda existia, como no caso do

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lustre em que bateu Benjamim Sirchia, morto havia oito dias, e como no caso da apario do pai da Senhora Ballet-Gallifet .

Um homem, que conservou em toda a vida a lembrana viva de um acontecimento inesquecvel, testemunha que no se pode desprezar.

H grande variedade de observaes como essas. Eis uma quarta. E' um outro gnero, mas so manifestaes que confirmam nossos dois primeiros exemplos.

Ser possvel no tomar em considerao a carta seguinte, que me foi dirigida de Nantes a 31 de Maro de 1921., e supor que seu autor fez uma inveno fantasista ou teve uma alucinao?

Caro Mestre: Tenho quarenta e dois anos, amo demasiado a Cincia, interesso-me por

todos esses problemas que estudais to imparcialmente e to cientificamente, e tenho, enfim, o que seria suficiente, tanta estima e considerao pelo sbio que sois que no seria possvel viesse eu inventar ou exagerar alguma coisa .

Tinha dezenove anos e habitava Nantes, onde estou atualmente. Freqentava um caf, onde, tendo intimidade com o dano, passava quase todas as noites.

Nesse caf uma senhora fazia a parte mais pesada da limpeza; esta mulher no era casada e vivia maritalmente com um operrio, um marselhs, cujo nome de batismo era Mrio. Ela era bret e seu nome de famlia era Keryado; porm ns a chamvamos me Mrius. Bebia um pouco. Esses pormenores tem importncia. Em suma, era uma boa mulher, de muito bom corao e que me havia prestado alguns obsquios.

Todas as semanas, eu saa de Nantes aos sbados, noite, e ia passar o domingo na roa, num stio em pleno mato. Um sbado, parto como de costume, despeo-me do patro, dos amigos e digo at breve me Mrius, que estava em excelente estado de sade . Desde tarde da noite de sbado, estava eu no campo, como de costume, mas devo dizer que desta vez devia passar no sitio a semana inteira. A casa s tinha dois aposentos: quarto e cozinha. Na quinta-feira, uma hora da tarde, estava conversando no quarto com a filha da dona da casa. Na cozinha no havia ningum, portas e janelas fechadas. Conversvamos, quando ouvimos (ambos) um barulho na cozinha como se as tenazes do fogo tivessem cado na pedra. Por precauo, e supondo que o gato estivesse a mexer nos potes de leite, fui ver. Nada, tudo estava fechado. Apenas de volta ao quarto, recomeou o barulho. L vou de novo. Nada. Como j me tivesse ocupado de Espiritismo, disse, rindo, moa:

- E talvez um Esprito. - no dando entretanto muita importncia s minhas palavras .

Tive ento a idia de recorrer a uma mesinha de que j nos tnhamos servido para sesses, e ambos, com as mos colocadas em cima, esperamos. Quase logo, obtemos uma comunicao por tiptologia e conforme a conveno relativa ao alfabeto.

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- E um Esprito? - Sim . - Viveu na Terra? - Sim. - Conheceu-me? - Sim. - Qual era seu nome ? - Keryado . Ouvindo este nome esquisito, e no me recordando do nome de famlia da

empregada do caf, ia deixar a mesa, supondo o caso desprovido de interesse, quando a moa me disse:

- E o nome de famlia da empregada do caf. - E verdade - respondi, e encetei ento uma srie de perguntas. Eu no queria acreditar que ela estivesse morta, pois a tinha deixado de

perfeita sade, havia somente cinco dias. Peo-lhe explicaes e ela me dizem que, sentindo-se indisposta na tera-feira, s 8 horas da noite. a levaram a casa e que ali tinha morrido, s onze horas, de uma congesto. Eu disse que ela bebia. (A moa a conhecia, mas havia um ms que estava na roa, e dela no tinha notcia alguma.) Isto se passava na quinta-feira. No sbado, de volta a Nantes, logo que sa do trem, fui ao caf e ali, muito admirado, confirmaram a morte da mulher com todos os pormenores que ela me havia contado.

Tal a aventura que comigo se deu. Desde ento, contei-a mais de vinte vezes, quando conversavam neste assunto. No se pode invocar a auto-sugesto: eu tinha deixado essa mulher em perfeita sade, no tinha razo nenhuma para pensar nela e a pessoa que comigo estava, na mesinha, no a tinha visto, havia um ms, no lhe escrevendo de modo algum .

NEBERRY (Em Nantes)

O inqurito habitual que fiz, aps esta comunicao, no d ensejo a

nenhuma dvida do caso. E verdade que, quase sempre, os exerccios de Espiritismo no tm valor intrnseco, e reflete ingenuamente a mentalidade dos experimentadores; mas, neste caso, o ato foi espontneo, inesperado e singularmente preciso.

O mesmo correspondente, que se tornou um espiritualista inabalvelmente convencido - como todo observador est convencido de que viu, do mesmo modo que um pedreiro que construiu uma parede est certo de que foi feita de pedra e assim como um lavrador tem certeza de terem seus campos produzidos trigo-, relatou-me outro fato no menos notvel. Trata-se da manifestao de um suicida alguns dias depois da sua morte. Eis o fato:

Meus avs dirigiam em Bordus um hotel-restaurante, cuja clientela se compunha sobretudo de marinheiros. Um capito de longo curso nele

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habitava, quando voltava de suas viagens e passava alguns dias em Bordus, antes de reunir-se famlia, em Rochefort.

Um dia em que se havia hospedado no hotel, teve a carteira furtada por uma mulher de m vida, que conhecera na cidade. Desesperado, magoado, sem coragem para voltar ao seio de sua famlia, aps essa aventura, enforcou-se no fecho da janela do seu quarto. De manh, inquieta por no o ver sair, a criada sobe e o encontra enforcado! Cumprem as formalidades do caso, e previnem a famlia. Alguns dias depois, minha tia (foi quem me narrou o fato, incapaz de mentir e mora atualmente em Nantes) e a criada estavam ocupadas em arrumar o quarto do capito, conversando a seu respeito, quando, subitamente, a mesinha da cabeceira sacudida com violncia, e as cortinas da cama se movem. A criada, assustada, corre para a escada, e minha tia, amedrontada, foge e se esconde.

Algum tempo depois, este mesmo quarto era ocupado por um simples marinheiro a quem tinham ocultado a histria (nos hotis, escondem esses casos) .

Ao voltar, noite, o marinheiro acendeu a vela e esta se apagou. Acendeu-a de novo, torna a apagar. Julgando ser o fato devido correnteza de ar (foi ele mesmo quem o contou no dia seguinte), vai a janela, que estava bem fechada. Acende novamente. vela de novo se apaga! Apodera-se dele o medo; hesita no que deve fazer: descer e avisar do que se passa, mas j tarde, todos esto deitados, vo caoar dele, acreditar que bebeu. Acende ainda uma vez e a vela, ento, no se apaga. Deita-se e imediatamente comeam as cortinas a se moverem. Preso de compreensvel emoo, no dorme, e, de manh cedo, desce e conta tudo o que se passou. Dizem-lhe ento que, nesse quarto, suicidou-se um capito de longo curso.

Que concluir? Na minha opinio, o esprito, a alma do capito, em uma palavra, se manifestava. Que queria ele? Alguma coisa, sem dvida, difcil de adivinhar. Que sabemos? No foi j notado que as pessoas que se suicidaram tm tendncia para voltarem ao lugar do suicdio?

G. NEBERRY

Ao meu pedido de inqurito o autor da narrativa respondeu o seguinte: Nantes, 14 de Abril de 1921.

Estive com minha tia que foi testemunha dos fatos ocorridos depois do

suicdio do capito de louro curso. Foi trs ou quatro dias aps a morte do capito, ao fazer a cama do

quarto, no qual ele se suicidara, que ela e a criada do hotel viram a mesinha de cabeceira mover-se sozinha, produzindo barulho bastante violento.

Permita-me um reparo: enquanto fazia a cama, a criada falava no capito, e foi neste momento que o fenmeno se realizou.

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E foi cinco ou seis dias mais tarde que o marinheiro, hspede daquele quarto, ficou aterrorizado por ver a vela apagar-se trs vezes a fio e por ver as cortinados se moverem sozinhos, depois de ele se ter deixado. Um pormenor que no lhe contei e que minha tia me narrou : o marinheiro lhe disse haver notado, num canto do quarto, uma forma, uma sombra inexplicvel.

Estou convencido, querido Mestre, de que se todas as pessoas, testemunhas pessoais dos fatos que procurais elucidar, lhe escrevessem, a reunio de suas narrativas encheria bibliotecas .

G. NEBERRY

(Carta 4.435.) Esta quarta contribuio s nossas comprovaes de fatos observados,

post mortem, mostra-nos a sua variedade. Ela bastante complexa. Pelas informaes que pude obter, no se deve recus-la. Eis outra, mais esquisita ainda, bastante inesperada, e que, entretanto, no podemos tambm afastar.

Desafio o mais cptico dos meus contraditores que explique a observao seguinte, sem admitir a ao do morto. A apario de que vamos falar realizaram-se espontaneamente, dois dias aps a morte

Um amigo de Gurney, o fundador com Myers e Podmore da Sociedade Inglesa de Pesquisas Psquicas (5), um certo Sr. D. (que suplicou a Gurney no lhe revelar o nome), era proprietrio de duas usinas, uma em Glasgow e outra em Londres .

Tinha ele como empregado um rapazinho, fraco e delicado, chamado Roberto Mackenzie, o qual, mal aconselhado, o deixou ao cabo de trs anos. Ora, aconteceu isto alguns anos depois de se ter despedido:

Um dia, o Sr . D . , passando por uma rua, notou um rapaz que devorava avidamente um pedao de po seco. Parecia um esfomeado, preste a morrer de fome. Era Roberto Mackenzie. O proprietrio parou, ouviu o que lhe contou seu ex-empregado, que se arrependia muitssimo de ter sado de um emprego que lhe garantia o po de cada dia. O Sr. D. consentiu em readmiti-lo e ele lhe exprimiu seu reconhecimento com a mais profunda emoo. Desde essa poca, sem jamais fazer alarde dos seus sentimentos, parecera s viver para seu patro. Logo que o avistava, fitava nele seus grandes olhos pensativos, acompanhando-lhe todos os movimentos. Seus protetores era a estrela polar da sua vida.

O patro foi habitar Londres e l esqueceu pouco a pouco seus operrios escoceses . Certa noite, uma sexta-feira, davam eles seu baile anual; Roberto Mackenzie, que se unia pouco aos outros, pediu licena para servir os refrescos. Tudo se passou bem e a festa continuou no sbado.

Na tera-feira seguinte, pouco antes das oito horas, em sua casa de Campden-Hill, o Sr. D. viu uma manifestao que resume deste modo:

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Sonhei que estava sentado diante de uma escrivaninha, conversando em negcios com um senhor desconhecido . Roberto Mackenzie adiantou-se para mim . Aborrecido, perguntei-lhe com alguma aspereza se ele no via que eu estava ocupado. Retirou-se, parecendo-me contrariado, depois se aproximou de novo como se desejasse vivamente uma conversa imediata. Censurei-lhe com mais aspereza que da primeira vez pela sua falta de delicadeza. Neste comenos, a pessoa com quem eu conversava despediu-se e Mackenzie adiantou-se novamente .

- Que quer dizer isto Roberto? - disse eu um tanto irritado. - No viste que eu estava ocupado?

- Sim senhor - respondeu ele -; mas preciso que eu lhe fale j . - A que propsito? Que urgncia esta? - Desejo dizer-lhe, senhor, que me acusam de uma coisa que no fiz;

preciso que saiba e me perdoe disso que me censuram, pois sou inocente. - Depois acrescentou: - Eu no fiz o que dizem que eu fiz.

- Que foi? - repliquei ainda. Ele repetiu as mesmas palavras. Perguntei-lhe ento, muito naturalmente - Mas como posso perdoar-te se no me dizes de que s acusado? Nunca esquecerei o modo enftico da sua resposta, feita em dialeto

escocs: - O senhor breve o saber. Minha pergunta foi feita pelo menos duas vezes; estou certo de que a

resposta foi repetida trs vezes e do modo mais expressivo. Nesse momento acordei, guardando certo desassossego por causa deste sonho esquisito. Estava a perguntar-me se ele tinha algum sentido, quando minha mulher precipitou-se no meu quarto, muito comovida, tendo na mo uma carta aberta, exclamando:

- Oh! James, que coisa terrvel no baile dos operrios: Roberto Mackenzie suicidou-se.

Compreendendo ento o sentido da viso, respondi tranqilo e firmemente:

- No, ele no se suicidou. - Como pode sab-lo? - Acaba de me dizer. Quando ele me apareceu - para no interromper a narrao, no

mencionei a princpio esta particularidade -, eu ficara impressionado com a singularidade do seu aspecto. Seu rosto era de um azul lvido e na testa percebiam-se manchas semelhante a gotas de suor. Eu no sabia o que significava isto. Mas eis o que se passara. Quando voltou a casa na noite de sbado, Mackenzie tomou uma garrafa com gua-forte, julgando ser sua garrafa de usque; serviu-se dum copinho, que bebeu de um trago. Morreu no domingo, aps atrozes sofrimentos. Tinham acreditado que ele se suicidara. E eis porque viera afirmar-me que era inocente da acusao que lhe faziam. Ora, coisa notvel, e de que eu no tinha a mnima idia: procurando os sintomas

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tio envenenamento pela gua-forte, vi que eram mais ou menos os que eu tinha notado no rosto de Roberto.

Breve reconheceu que se tinham enganado, atribuindo-lhe a morte a um suicdio. Fui prevenido disso no dia seguinte, por uma carta do meu representante na Esccia.

Esta apario, na minha opinio, foi devida ao reconhecimento excessivo de Mackenzie que eu havia arrancado duma misria deplorvel e ao muito desejo que tinha de ser por mim estimado .

Tal a relao do manufatureiro de Glasgow. Este operrio, vindo revelar-lhe a verdade, aps o seu pretenso suicdio, prova evidentemente a sobrevivncia. E' de notar que na Inglaterra o suicdio considerado crime .

O inqurito, feito pela Psychical Society, no deixa pairar qualquer dvida quanto exatido da narrativa que acabo de reproduzir. Foi mesmo um morto que agiu nessa ocasio. No pode ser uma sugesto atrasada nem um acaso, seja l o que for.

Temos pois quatro testemunhos pessoais de sobrevivncia, completamente diferentes uns dos outros. Neg-los exigir quatro hipteses diversas.

Todos os que examinam, leais e completamente, esses testemunhos sentem em sua conscincia que nenhum de ns tem o direito de se julgar com autoridade bastante para recus-los e considerar seus narradores como outros tantos impostores, loucos ou alucinados. E' preciso confessar francamente que h nesses fatos uma ordem de coisas ainda desconhecidas das pesquisas cientficas

Leiamos tambm a relao seguinte. Foi-me dirigida de Paris, no dia 14 de Junho de 1921, pedindo-me que lhe ocultasse os nomes.

Minha jovem amiga, Margarida. .., que tem agora vinte e dois anos, teve a desgraa de perder, no mesmo ano, em 1918 seu pai, sua me e sua irm Joana, de dezesseis anos de idade. Esta, que sempre gozara de perfeita sade, comeou a enfraquecer-se Tono depois da morte da me. Ficou atacada do peito, e, depois de definhar durante cinco ou seis meses, sucumbiu por sua vez.

Margarida e Joana, que se queriam muito e nunca se separavam, dormiam no mesmo quarto. Desde que ficaram rfs, a av viera habitar com elas. Dois meses mais ou menos depois da morte da me, Margarida despertou uma manh, pelas cinco horas, ouvindo leve rudo no quarto. Abre os olhos e v uma sombra, vestida de preto, que desliza at aos ps de sua cama, aproxima-se do leito da irm, inclina-se sobre Joana adormecida e beija-a na testa. Margarida senta-se, olha mais atentamente, e diz: Mas mame! No mesmo instante, ergue-se sombra e desaparece como viera.

A moa, muito impressionada, levanta-se sem fazer barulho, para no despertar a irm j enferma naquela poca, e corre para o quarto da av, que dormia profundamente. Desperta-a e lhe pergunta:

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- Vov, foi voc que veio beijar Joana na cama? - e conta-lhe o que acabava de ver.

- Eu, no, minha querida - responde-lhe a av - no me movi daqui, sonhaste; vai deitar-te e dorme ainda umas boas duas horas.

Margarida volta para o quarto, tentando persuadir-se de que havia sonhado. Mas quando se tornava a deitar, a irm desperta e lhe diz:

- Oh! que pena me teres acordado, eu estava feliz! . . . Enquanto estava dormindo, mame veio beijar-me; estava vestida de preto, como sempre, depois da morte de papai; roou os ps de tua cama, depois chegou perto de mim, inclinou-se, senti seu beijo na minha testa.

Margarida conta-lhe ento a viso que tivera... Como explicar a viso, a no ser pela presena real, no quarto de suas

filhas, dessa me morta, havia dois meses, que voltava para marcar com um beijo, na testa, a filha que em breve a ela se reuniria? . . . Presena fisiolgica? espiritual? astral?... No sei, porm, presena indubitvel, perceptvel aos olhos da que estava acordada e sensibilidade da que estava dormindo.

Margarida ainda tinha os olhos cheios de lagrimas, ao contar-me os pormenores da cena. E' moa sadia, robusta, muito ativa, de temperamento reto e espontneo, com alta cultura intelectual e de modo nenhum predisposta s imaginaes mrbidas.

SRA. CORNEILLE

(Cartas 4.542 e 4.575.) Minha correspondncia com esta narradora demonstrou-me quo bem

fundada a narrao. Imaginar sempre alucinaes, para explicar esses fenmenos, no

corresponde mais s nossas observaes atuais . H, aqui, dois testemunhos bem independentes, distintos, pois que uma das irms estava acordada e a outra dormia. Assim como o jovem Mackenzie manifestou-se incontestavelmente, a apario da me das duas moas apresenta-se como devendo ser aceita com a mesma sinceridade . Lembremo-nos de que o espao e o tempo no so o que nos parecem. A me das moas pode ter-se manifestado sem ter estado ali realmente .

*

A hiptese alucinatria tambm no aceitvel neste outro exemplo: um menino de doze anos que viu seu pai, que j tinha morrido, e faleceu por sua vez.

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Tomrny Brown, um pobre menino de 12 anos, oriundo de famlia numerosa e miservel, estava estendido, debilitado, numa cama de hospital. Seu pai havia falecido dois anos antes, num leito vizinho ao dele (6) .

Certa noite, ele disse a sua me - Mame, olha papai. - NO, meu filhinho - respondeu a me -, no h ningum . - H sim! Ento no o v perto da cama? Fala-lhe, anda... Ela nada via, nem to-pouco a enfermeira. de guarda. - Que est fazendo

teu papai ? - acabou por perguntar a me . - Esta te olhar. - E, um instante depois: - Est olhando para mim e faz-me

sinal para que eu o acompanhe, quer levar-me com ele. Conversando com as pessoas vizinhas, a me fez notar que o pai do

pequeno tinha morrido, havia dois anos. O menino ouviu e replicou: -No, no, ele no morreu, pois que est aqui e acena-me com a mo.

Olha: est me chamando, esta me chamando . Assim falava, quando perdeu os sentidos . Morreu alguns dias depois .

SRA. CHAMBERS Enfermeira Voluntria

A observao ingnua de uma criana vale a de um homem . Grande nmero de fatos anlogos passaro sob nossas vistas nas pginas

seguintes. As almas dos mortos existem, vem, ouvem e se manifestam . Os prximos captulos vo prov-lo com superabundncia.

Esses testemunhos libertar-nos-o de uma causa freqente de tristeza. Observ-los de ordem cientfica atual ; explic-los ainda no o . Se no tivesse sido inventada a fotografia, no saberamos que a luz pode imprimir, numa placa, imagens que ficam latentes, invisveis, at que um produto qumico, derramado sobre essas placas, as faa aparecer. A atuao dos defuntos sobre nosso crebro s pode dar origem a imagens, a fantasmas, em certas condies fsicas e psquicas. Apesar da relativa raridade, as manifestaes dos mortos, entretanto, so de fato numerosas e variadas. Existem de todos os gneros . Eis um oitavo exemplo .

Uma apario singularmente curiosa a que se acha descrita na obra Human Personality, de Myers (t. II, pg. 27) (7) e que foi narrada em primeiro lugar aos professores Royce e Hodgson.

O narrador conta que sua irm, moa de dezoito anos, morrera subitamente de tolera, em So Lus, em 1867, e que, viajando ele pelos Estados Unidos, em 1876, isto , nove anos depois, certo dia, cerca de meio-dia, quando estava ocupado a escrever ordens, e a fumar um excelente charuto, pareceu-lhe ver algum sentado sua esquerda, tendo um brao apoiado na mesa. Vira-se para este lado e v sua irm, experimentando instantaneamente uma sensao de felicidade, pois a amava muito e a tinha

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chorado muitssimo. Mas a viso se desfez logo. Perguntou-se a si mesmo se tinha sonhado; mas o charuto que tinha na boca, a caneta na mo, a tinta ainda fresca no papel, tudo lhe provou que estava incontestavelmente acordado.

Ela parecera-lhe viva, fitando nele os olhos, com muita calma. Essa viso o havia impressionado tanto, que imediatamente tomou o trem

para ir contar o caso a sua famlia. Seu pai caoou dele, chamando-o visionrio e s o ouviram com incredulidade e cepticismo. Mas, descrevendo a viso tal como lhe ,tinha aparecido, ele mencionou a existncia, no lado direito do rosto dela, dum arranho que lhe pareceu fresco e recente.

Este pormenor impressionou tanto a sua me, que esta caiu sem sentidos. Quando voltou a si, declarou que o arranho fora feito por ela em sua filha, ao vesti-la pela ltima vez, tendo em seguida dissimulado o arranho com p de arroz, de modo que pessoa alguma podia saber do pormenor. A viso de seu filho era, pois, uma prova incontestvel da autenticidade da apario, e nesta viu, ao mesmo tempo, um aviso de sua morte prxima, que se verificou, com efeito, duas semanas mais tarde.

O narrador acrescenta que a impresso nele produzida pela sbita apario de sua irm, to perfeitamente viva aparentemente, foi mais poderosa por si s, do que todos os outros acontecimentos de sua vida. O sol claro que iluminava seu quarto, sua satisfao pela vida, pois seus negcios eram prsperos, seu charuto na mo, o estado de atividade do seu esprito, tudo lhe provou que a hiptese de alucinao era inadmissvel.

Tenho tambm esta convico . Tudo concorda para firm-la, apesar das objees possveis. O Senhor Podmore, por exemplo, que no admite a realidade das aparies e imagina poder explic-las com transmisses de pensamentos, prope acreditarmos que, no momento dessa manifestao, a me da falecida teria justamente pensado na filha e no arranho e que sua idia ter-se-ia transmitido ao longe, ao filho. H realmente demasiadas acondicionais para que seja aceitvel esta hiptese.

Porque teria ela pensado justamente nisso, nessa hora, ao cabo de nove anos?

E porque teria ido esta idia ter com seu filho que estava em viagem de negcios? Imaginam tambm a possibilidade duma iluso sbita da vista do irmo da morta; mas, 1 : no pensava nela, e 2 : ignorava esse arranho. No ser mais simples admitir a apario?

Acabamos de dizer que as manifestaes de mortos so to variadas como numerosas e que as h de todas as espcies.

Eis aqui uma, particularmente notvel. , em geral, difcil destacar os testemunhos de sobrevivncia dos

elementos psicolgicos da mentalidade dos vivos, e difcil ter a certeza de que o morto o seu autor incontestvel. O exemplo que vamos examinar parece-me pertencer a este caso. Foi oferecido pelos afamados trabalhos da Sociedade de Estudos Psquicos de Nancy .

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O Sr . P . Bossan, contador no Telgrafo de Grenoble, escrevia-me a 28 de Julho de 1920:

Nas pginas que vai ler, afirmo-lhe que tudo escrupulosamente verdico . Sou o marido sobrevivente de Augustine Chabert, e autorizo-o a fazer destes documentos o uso que quiser, e isto em favor dos servios que presta Humanidade.

Dou-lhe todos os nomes de famlia que, no Boletim de Nancy, foram publicados abreviadamente.

Eis em primeiro lugar uma certido da ata da primeira sesso (de Espiritismo), realizada no dia 29 de Janeiro de 1913. So as testemunhas de Nancy que falam; o secretrio resumiu deste modo os seus depoimentos

Alguns movimentos da mesa e em seguida o nome de Albert Revol ditado. Perguntamos a esta entidade se pode dar-nos provas da sua identidade. Pela tiptologia respondem que Albert Revol morreu h dois anos, com cinquenta e quatro anos; que habitava Pontcharra (Isere), na Grande-Rue e era alfaiate; era casado, tinha trs filhos, tendo um deles, chamado Eugnio, com 20 anos de idade, o mesmo ofcio do pai.

Estes pormenores, acrescentam o secretrio das sesses, muito nos interessavam, tanto mais que nenhum de ns conhecia o Delfinado. Dentre os assistentes, um s havia atravessado, em estrada de ferro, o Departamento do Isere, porm, em poca muito anterior; no conhecia, assim como os outros circunstantes presentes, nem a existncia de Pontcharra e muito menos a da famlia Revol.

- Morri subitamente - continuou o misterioso desconhecido - e ainda estou perturbado!

Insistimos. Ele acrescenta: - Tenho duas filhas, Helena e Henriqueta. No estou enterrado ali . Meus

restos mortais jazem em Grignon . Era minha terra. Ns s conhecamos um Grignon, em Seine-et-Oise. Fizemos ento notar

a Revol que este lugar fica muito longe de Pontcharra. - No, pertinho; ainda tenho minha me. Mora perto de ns, em

Grignon. Pareceu-nos isso inverossmil. Se a me do Esprito Revol morava perto

do filho, no podia ser em Grignon. Perguntamos a Revol a quem poderamos dirigir-nos para verificar as afirmaes. Respondeu-nos:

- Escreveram Senhora Goudon - e em seguida: - no, tenho medo de histrias; escrevam antes ao cura, ele me conhece; no lhe devem dizer porqu, nem falar de Espritos. Falem da famlia.

Escrevi ao secretrio da casa da Cmara de Pontcharra para lhe pedir a certido de bito deste Revol, solicitando-lhe para me informar de que molstia tinha morrido, qual a sua profisso, se tinha deixado filhos, quais os seus nomes e idades. Recebi a certido de bito seguinte:

Casa da Cmara de Pontcharra.

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Repartio do Estado Civil. - Certido de bito. Nos registros dos atos do registro civil da Vila de Pontharra, Comarca de

Goncelin, Departamento de Isere, consta que Revol (Francisco Antonio Albino), filho dos falecidos

Francisco e Gaillard (Adlia), vivo em primeiras npcias de Billaz (Elisa Josefina), marido em segundas npcias de Goudon (Filomena Leontina) , faleceu nesta vila, a seis de Maro de mil novecentos e onze, sendo registrado no mesmo dia na Casa da Cmara da dita vila, no 75.

Pontcharra, 4 de Fevereiro de 1913.

O Chefe da Repartio do Estado Civil. FAUTIER.

Assim, Revol havia mesmo existido e tinha morrido havia dois anos.

Casara-se com a Senhora Goudon. Fica deste modo confirmada a existncia da Senhora Goudon, cujo nome Para dado para que se obtivessem informaes.

A certido vinha acompanhada da carta, com a declarao seguinte: DEPARTAMENTO DO ISERE Distrito de Grenoble

Pontcharrra 4 de Fevereiro de 1913.

Cmara Municipal de Pontcharra . No encontrei o nome de Revol (Albert), mas somente o de Revol

(Francisco-Antnio-Albino), que faleceu subitamente em Pontcharra, a 6 de Maro de 1911.

Este Revol era negociante-alfaiate, e deixa trs filhos de um primeiro matrimnio. So eles:

1 Revol (Eugnio-Isidoro) ; 2 Revol (Maria-Helena-Lcia-Branca) 3 Revol (Henriqueta-Maria-Filomena) . O Senhor Revol, como disse, faleceu subitamente de uma embolia no

corao, creio eu, sem ter estado de cama. Assinado : FAUTIER .

Deduz-se dessa carta que Revol fora mesmo negociante-alfaiate, tinha

trs filhos, cujos sobrenomes e sexos foram dados com exatido. H uma diferena no prenome (nome de batismo) de Revol: Albino em lugar de Alberto. Farei observar que este prenome fora ditado por meio da mesinha e

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todos que se servem deste meio sabem que existe o mau hbito de querer terminar a palavra, antes que o ditado esteja terminado, para ganhar tempo .

Escrevi de novo ao secretrio da Cmara de Pontcharra para que ele me dissesse com que idade falecera Revol e em que rua habitava; tambm queria elucidar um ponto que nos intrigava muito : o lugar da sepultura de Revol; porque, apesar das minhas pesquisas, no me fora possvel descobrir outra vila, a no ser a de Seine-et-Oise, com o nome de Grignon (8) . Recebi a seguinte resposta:

Pontcharra, 19 de Fevereiro de 1913.

Senhor: Respondo sua carta de 16 do corrente, fazendo-lhe ciente de que o

Senhor Revol faleceu na idade de cinquenta e quatro anos. Quando vivo, habitava nossa cidade, na Grande-Rue, e foi enterrado no cemitrio da parquia de Grignon, vila de Pontcharra.

A este respeito, devo inform-lo de que nossa vila est dividida em duas parquias, tendo cada uma o seu cemitrio.

Assinado : FAUTIER .

O mistrio de Grignon estava elucidado. Revol dizia a verdade ao

declarar-nos que havia sido enterrado em Grignon, nome de uma das parquias de Pontcharra. Esta carta confirma tambm a idade que ele nos tinha dado, assim como a sua morada na Grande-Rue.

Meu inqurito permitiu estabelecer a realidade de todas as informaes fornecidas pelo esprito Revol com o fim de provar sua identidade.

Tal a relao do dedicado secretrio da Sociedade de Nancy. Em uma outra sesso, no dia 5 de Maro seguinte, a comunicao, aqui transcrita agora, foi dada por um mdium psicgrafo e no por pancadas:

Sou um amigo de Revol. Vivi h dois sculos. Liguei-me com ele no Alm, pois sou da mesma terra. Chamo-me Chabert .

- Tem descendentes? - Sim, habitam Grenoble. So meus sobrinho-netos. Acompanhei de perto

minha sobrinha-neta. Eu a protegia. Ela morreu, mas posso indicar-lhe sua sepultura.

- Como se chamava? - Chamava-se Maria Agostinha Chabert . - Era casada? Seu marido ainda vive? Se sim, como se chama? Qual sua

profisso? - Paulo Bossan. E empregado dos Correios, em Grenoble . - Desde quando faleceu sua sobrinha?

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- H cerca de trs anos. No tenho ainda noo certa do tempo. Ela morava na Escola do Novo Jardim, uma escola maternal.

- Que idade tinha quando faleceu? - Quarenta e trs anos, penso eu. - De que morreu? - Sofreu muito tempo; vejo principalmente o seu ventre doente. - Tinha ela irmos e irms? - Sim, mas no os vejo; vou sobretudo . sua sepultura. - Como esta

sepultura? - Uma pedra muito simples, colocada em p. Tem esta inscrio: Maria-

Agostinha Chabert, casada com Bossan, falecida com 43 anos . - Foi enterrada em Grenoble? - No, em Chatte. Este nome, designando uma povoao, parece-nos esquisito. Insistimos - No est enganado? Ser possvel que alguma localidade tenha o nome

de Chatte? - Sim, l que est a sepultura dela. Pedimos ao esprito para que faa um esforo e nos fale dos irmos e das

irms de Agostinha Chabert. Diz que sente dificuldade nisso. Enfim, acrescenta:

- H Elias, ele est em Lans . H tambm Isabel, ela no casada; professora numa localidade.

- Qual ? - No posso dizer; um nome composto. H o Senhor Naud, um

parente. H Eugnia-Henrique Chabert; h tambm um cnego; so pessoas qualificadas. E preciso que todos pensem em Agostinha para apressar sua libertao. Digam ao guarda do cemitrio que ponha flores no seu tmulo, pois gostava muito delas.

De novo fazemos perguntas suplementares a respeito de identidade, mas o esprito Chabert nos diz:

- Vocs no precisam de tudo isto para pr flores na sua sepultura. E ele nos deixa . Depois desta comunicao inesperada, consultaram um dicionrio, para

saber se existia a povoao de Chatte e se havia algum Lans no Isere. Tudo foi confirmado. A Cmara Municipal de Grenoble enviou a seguinte transcrio da certido de bito da Senhora Bossan. Ei-la:

Nos registros das atas do Registro Civil da cidade de Grenoble, consta que Maria-Agostinha Chabert, casada com Jos-Eugnio-Paulo Bossan, faleceu em Grenoble no dia 7 de Julho de 1911.

Grenoble, 26 de Maro de 1913 .

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Tinham, pois, com este documento a confirmao de que Agostinha Bossan havia realmente existido; que fora casada com o Sr. Paulo Bossan e que falecera no lugar indicado. Nem a idade, nem o lugar da sepultura esto indicados .

O judicioso e consciencioso secretrio da Sociedade de Nancy pensou que obteria facilmente o complemento das informaes, dirigindo-se a Cmara de Chatte. Escreveu, pois, ao secretrio da Cmara, pedindo-lhe o obsquio de enviar a certido de nascimento de Agostinha Bossan; de mandar pormenores a respeito de sua famlia, de sua sepultura, etc . Eis o que foi extrado da resposta recebida:

Chatte, 15 de Abril de 1913.

Sr. Toms, Secretrio da Sociedade de Estudos Psquicos de Nancy. Junto lhe remeto a certido de casamento da Senhora Bossan, a qual pode

substituir a certido de nascimento, visto conter todas as informaes. Sepultura da Senhora Bossan: A pedra tumular est aprumada

verticalmente sobre um carneiro. Est voltada para o Sul, colocada na rua central do cemitrio. A inscrio a seguinte: Senhora Paulo Bossan, nata Chabert, diretora da Escola Maternal do Jardim-de-Ville, em Grenoble, 1867-1911.

A Senhora Bossan faleceu em Grenoble, em Julho de 1911, e foi sepultada em Chatte, na mesma poca.

Nasceu em Lans, povoao do Canto de Villard-de-Lans (Isere) . Tinha realmente dois irmos: um Elias, que ainda proprietrio em Lans e o outro Amadeu, que era inspetor de estradas, em Voiron.

Tinha ela trs irms: uma chamada Isabel, a principio professora leiga, depois religiosa no convento das Ursulinas, em Tullius (Isere), atualmente professora leiga em La Buisse, perto de Voiron (Isere) .

Outra chamada Sofia, casada com Naud, proprietria em Beaulieu (Isere) . Enfim, uma terceira, Eugnia, casada com Henrique Chabert, seu primo irmo.

O Secretrio da Cmara: DREVONT

CERTIDAO DE CASAMENTO

No dia 19 de Agosto de 1891, casaram-se em nossa povoao o Sr.

Joseph-Eugne-Paul Bossan, nascido na povoao de Chatte, a 23 de Setembro de 1865, filho de ..., etc... e a Srta. Marie-Augustine Chabert, nascida na Vila de Lans a 10 de Dezembro de 1867, filha de . . . , etc . . .

Saint-Marcellin, 15 de Abril de 1913.

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O Presidente da Cmara: NACRAIRE.

Estas informaes confirmavam a quase totalidade das indicaes fornecidas pelo esprito Chabert. Sua sobrinha, Augustine Chabert, era mesmo casada com o Sr. Paulo Bossan, empregado no Correio. Falecera como diretora da Escola Maternal do Jardim de Ville de Grenoble, e fora enterrada em Chatte. A pedra tumular, que est de p, tem uns dizeres diferentes nos termos que tinham sido dados pelo esprito Chabert; o que no de estranhar, pois este esprito nos havia prevenido de que no podia precisar.

Pela inscrio tumular e pela certido de casamento, Augustine Chabert faleceu com quarenta e quatro anos, ou, mais exatamente, com quarenta e trs anos e seis meses, tendo nascido a 10 de Dezembro de 1867 e morrido a 7 de Julho de 1911. O esprito Chabert nos havia dito quarenta e trs anos.

V-se tambm que Augustine tinha mesmo um irmo chamado Helie, morador em Lans; uma irm, por nome Isabel, solteira, professora em La Buisse, nome composto que Chabert no pudera dar; outra, casada com um Senhor Naud, parente, com efeito, pois que casado com uma irm de Augustine. Na sua nomenclatura, o esprito Chabert havia acrescentado : H tambm Eugne-Henri Chabert. Tem-se a explicao desta indicao na carta do secretrio da Cmara, indicando que a terceira irm, Eugnia, casada com Henrf Chabert .

Todos os pormenores dados pelo esprito Chabert achavam-se pois confirmados.

Faltava unicamente saber qual a molstia de que falecera Augustine e se tinha algum parente cnego.

Essas informaes foram dadas e inteiramente exatas. A conseqncia dessas revelaes fez que a Sociedade Psquica de Nancy

travasse relaes com o Sr. Paulo Bossan . Como j foi visto, o marido de Augustine Chabert escreveu-me tambm,

pedindo-me ateno toda especial para estes fatos to curiosos. Recomendando o mtodo positivo de procurar sempre o que poderia ser atribudo mentalidade dos vivos, fiz notar que o presidente da Sociedade Psquica de Nancy, o Coronel Collet, era delfins e conhecia o lugar. Responderam-me que ele no assistira s duas sesses, que se haviam efetuado em casa de um habitante de Nancy, num grupo particular. Entretanto, fiz questo de ficar mais rigorosamente informado e pedi novas informaes em Grenoble, ao Senhor Bossan, cuja resposta a seguinte, do dia 12 de Agosto de 1920.

O Senhor Coronel Collet no conhecia de modo nenhum nem minha famlia., nem a de minha senhora.

Nas visitas anuais muito curtas que ele fazia Senhora Vacher (Grenoble), nunca encontrou minha pobre desaparecida em casa dessa senhora.

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Esta afirmao seria, em caso necessrio, corroborada pelo Sr. Lus Vacher, filho da Senhora Vacher (a qual faleceu h uns quinze dias) . Moradia: 32, Avenida Flix Viallet, em Grenoble, e tambm pela Senhora Collet, que sobreviveu a seu marido e que mora no nmero 8 da rua 5ergent Bobllot, em Nancy.

E fcil compreender que todas essas informaes completaram a minha certeza.

Uma carta do dia 28 de Julho de 1920 terminava deste modo: A 20 de Junho de 1898, s 10 h .50 m tive a honra de cumprimentar o

autor de Estela no postigo do telgrafo em Grenoble, e de apertar-lhe a mo.

Meu correspondente no me , pois, um estranho. Nessa data j antiga, de 1898, os acontecimentos que acabam de ser

relatados dormiam ainda no desconhecido do futuro. Mas que o tempo? E este Chabert, morto havia duzentos anos, pai do tio-av da Senhora

Bossan, que trava relaes no outro mundo com seu patrcio do sculo XIX Revol! . . . e que vem contar a experimentadores de Nancy que sua sobrinha-neta est enterrada no Delfinado . . . numa aldeia desconhecida dos assistentes, como acontecera com a primeira, aquela Grignon, do Isere !

Uma transmisso teleptica de vivos poder explicar tudo isto? O Senhor Bossan conclui desta longa discusso o seguinte 1 Que duas entidades: Revol e Chabert se conheceram no Alm; 2 Que a entidade Chabert se interessava pela filha da sua sobrinha-neta,

quando ela vivia (minha pobre mulher, hoje morta) e que ele ainda agora a protege;

3 Que esta entidade fez uma descrio verdadeira do lugar da sepultura e uma citao exata do marido, dos filhos, irmos, irms, e tio de minha querida mulher.

A preciso total to surpreendente que, seguindo o conselho de amigos -- tambm leitores seus -, creio dever levar ao seu conhecimento esta perturbadora e extraordinria comunicao do Alm, pois estou persuadido de que ela prender sua ateno.

(PAULO BOSSAN em Grenoble ) .

Como poderamos recusar de tomar em considerao, com cuidado todo

especial, as concluses do meu estimado correspondente? E muito natural que procuremos explicar os fenmenos, como faculdades

humanas, conhecidas ou desconhecidas, e , notadamente, o que um autor contemporneo, empenhado em obter a soluo dos problemas psquicos, o Sr. Paulo Jagot, teve recentemente em vista numa obra de anlise cientfica (9) . Sua concluso mesmo formal a este respeito, pois se pode ler pgina 221:

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Nestes fatos nada vejo, absolutamente, que no seja explicvel pela ao das prprias foras psquicas do mdium ; e a este respeito cita exemplos notveis de viso do passado, de clculos instantneos, de leituras de pensamento. Confesso, todavia, que no compreendo de modo algum como mdium de Nancy teria podido adivinhar a existncia destes mortos, salvo fazendo uma hiptese inesperada, superior por sua temeridade admisso da interpretao esprita. Ao demais, parece-me que as teorias exclusivas s muito raramente so aplicveis a esses estudos transcendentais.

Pelo contrrio, as observaes semelhantes a que acabamos de relatar com todos os seus pormenores, do mesmo modo que os oito exemplos dados a ler ao leitor, para esta investigao resumida como inauguradora deste volume, levam-nos a admitir a sobrevivncia e a pensar, ao mesmo tempo, que a vida de alm-tmulo a continuao desta. Pode-se, verdade, imaginar a existncia de espritos estranhos que sabem tudo isso; porm, seria uma hiptese muito mais complicada.

Pensando no estado da alma depois da morte, acontece-nos muitas vezes lamentar, seja qual for este estado, de ter como sorte a supresso dos rgos que nos permitem gozar a vida: estes olhos, com que contemplamos as cenas admirveis da Natureza, pr do Sol esplndido, sublimes noites estreladas, bosques, montanhas, vales, regatos, rios, mar; este olfato que nos permite sentir os perfumes das plantas nas brandas noites de vero, erva ceifada, trigo cortado; estes ouvidos encantados pelo gorjeio dos pssaros, pelos mil rudos da Natureza viva . Sabemos que no possuiremos mais nem retina, nem nervo auditivo, nem nervo olfativo. Tememos a supresso desses rgos de sensaes, perguntando-nos a ns mesmos o que pode sentir um ser imaterial.

Quando por um belo dia de vero voltamos do cemitrio, aonde vimos descer sepultura o caixo de um amigo muito querido, e quando, ao voltarmos vida habitual, contemplando uma paisagem iluminada pela alegre claridade do belo Sol, pensamos que este amigo est debaixo da terra, no tmulo, que seus olhos esto cerrados para sempre e que no vero mais esta branda e terna luz! Estas paisagens, estas rvores, estes prados, estes campos, estas aldeias, esto banhados por raios luminosos que no existem mais para ele. H alguns dias ainda encantavam seus olhos. Hoje, est tudo acabado!

Pois bem! esta impresso no exata . A alma v, ouve, pensa, fica em comunicao com este mundo terrestre . As observaes psquicas mostraram-nos, nos tomos I e II desta obra, que a vista sem os olhos, pelo esprito, existe mesmo durante a vida terrestre material, agindo a vontade sem a palavra e que as transmisses telepticas do pensamento so exatas. As que acabamos de apresentar, desde o incio do tomo III, nos mostram, ainda, que as almas dos defuntos vem e ouvem sem os rgos corpreos da vista e do ouvido.

Quantas vezes li esta frase coberta de sinais de lgrimas, em cartas de mulheres desesperadas: No posso viver sem ele. Nossas duas almas eram uma s. Meu crebro se despedaa. Oh! esta ausncia! Sou religiosa, creio,

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espero! Mas ignoro! Se pelo menos eu soubesse que ele me v e v seus filhos!

Eu respondi: O ente humano sobrevive morte e as almas que se amam no esto separadas . Os invisveis no esto ausentes .

Quanto explicao, s condies para a manifestao, no as conheo. E extremamente difcil ser franco e honrado em nosso estranho planeta.

Tambm, desde a primeira pgina do primeiro volume desta obra, declaro que meu nico fim reunir fatos de observao e s fazer concluses com fatos positivos; que preciso estabelecer uma nova cincia, a cincia psquica, sobre as mesmas bases experimentais que as cincias chamadas exatas. Ora, vrios crticos me censuram de no concluir bastante depressa, de ficar indeciso na interpretao de certos fatos, e, em vez de compreenderem quanto este mtodo necessrio, confundem entre si os fenmenos mais disparatados, as produes de substncia com as transmisses de pensamentos, os vivos com os mortos, e declaram que no se deve admitir o que no se pode explicar.

Mesmo para alguns desses crticos, todos estes fatos nada provam, nada absolutamente. Margaritas ante porcos! Porque que cegos se ocupam de problemas de ptica quando to fcil no fazer nada? Se, por exemplo, eu declarar que impossvel atualmente a qualquer sbio adivinha, como uma morta, ou mesmo um vivo morrendo a mil quilmetros d distncia, pode bater vossa janela ou vossa mesa, no vejo porque esta ausncia de explicaes autorizaria a afirmao de que isso no passa de iluso . Por mais que amontoemos os fatos escrupulosamente observados, este trabalho de nada serve. Todos esto de acordo para repetir esta tolice : No possvel ; no pois verdade .

Repare que laboraramos em erro supondo nunca haver nem alucinaes, nem coincidncias imprevistas e, quanto a mim, tenho sempre em mente estas objees normais. O mtodo cientfico consiste em tudo considerar, tudo pesar. No deixa de ser verdade que as manifestaes dos mortos permanecem incontestveis.

Os exemplos que acabo de apresentar ao jri dos meus leitores no podem, parece-me, deixar dvida nenhuma, em todo esprito independente, livremente empenhado em conhecer a verdade pelo fato de observaes positivas de que em certas circunstncias os mortos se manifestaram e desse modo provaram que no morreram realmente. H muito tempo que os pensadores sabem isso. Mas podemos repetir, um sculo e meio depois dele, o, que escrevia o filsofo Emmanuel Kant, repetindo mais ou menos o que Ccero j havia dito h cerca de dois mil anos antes dele:

A Filosofia, que no receia comprometer-se, examinando toda a sorte de questes fineis, fica muitas vezes perplexa quando topa em certos fatos de que no poderia duvidar impunemente e que no podaria crer sem se tornar ridcula. E' o que acontece com as histrias de almas do outro mundo. Com

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efeito, no h censura que a Filosofia sinta mais do que o da credulidade e apago as supersties vulgares. Os que se do facilmente o nome e o realce de sbios zombam de tudo aquilo que, inexplicvel tanto para o sbio como para o ignorante, coloca-os ambos no mesmo plano. E por isso que as histrias de fantasmas so sempre ouvidas na intimidade e denegadas em pblico. Pode-se ter certeza de que jamais uma academia de cincias escolher tal assunto para um concurso; no por estar cada um dos membros dessa academia persuadido da futilidade e da mentira dessas narrativas, mas porque a lei da prudncia pe sbios limites ao exame dessas questes. As histrias de fantasmas sempre encontraro crentes secretos e sero sempre alvo, em pblico, duma incredulidade de bom tom.

Quanto a mim, a ignorncia em que estou da maneira por que o esprito humano entra neste mundo e dela sai, impede-me da regar a verdade das diversas narraes que por a so contadas.

Podemos todos hoje pensar como pensava o autor da Crtica da Razo Pura, e no rejeitar, por um desdm injustificado, as histrias de fantasmas de que acabo de dar um espcime . Notemos que a Academia de Cincias, em Frana mesmo, no elimina mais estes assuntos de estudos, dando mesmo um prmio anual (o prmio Emden) para as obras que se ocupam desses grandes problemas. As histrias de fantasmas, que acabam de servir de assunto a este captulo, no so mais desprezadas . Puderam, entretanto, espantar mais de um leitor. Muitas outras vamos ler! Apresenta-las-ei na classificao mais lgica e de mais vantagem para nosso estudo. Parece-me interessante assinalar em primeiro lugar, e muito especialmente, os mortos que se manifestaram depois de terem feito promessas e juramentos .

II

MORTOS QUE APARECERAM EM SEGUIDA A JURAMENTOS RECIPROCOS, A PROMESSAS, A AJUSTES, A DECLARAES

ANTERIORES

Sem medo vejo o tmulo das sombras eternas; Porque sei que o corpo ali tem uma priso.

Mas que a alma, ali, asas encontra! VITOR HUGO

J vimos manifestaes dessa ordem no tomo II notadamente na relao

to precisa da Srta. Ximenez de Bustamante, e a ns mesmo perguntamos se a moa, vindo to subitamente anunciar a prpria morte sua amiga, j teria falecido, ou se estaria ainda deste lado da barreira. Vimos igualmente, nesse mesmo tomo, em S. Petersburgo, perante a Condessa Kapnist a apario de um amigo que tinha feito este juramento e que apareceu antes mesmo de ter

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morrido . Dedicaremos aqui um captulo especial s manifestaes aps promessas, afirmando, assim, a sobrevivncia da alma e da memria. O captulo que acabam de ler inaugura essas realizaes pstumas com o exemplo do amigo do Doutor Caltagirone, de Palermo, batendo, conforme sua promessa, no lustre da sala de jantar. Estes testemunhos so numerosos e s temos que escolher para os examinar.

Uma das mais notveis aparies da coleo que coordenei h muito tempo a do amigo de Lorde Brougham, relatada por esta eminente personagem, pessoalmente .

Os homens da minha gerao viram este belo ancio, em Paris, ou em Canes, onde Faleceu em 1868. Lorde Brougham escreveu sua autobiografia e dela publicou o extrato abaixo no dia 16 de Outubro de 1862.

Nunca foi emitida uma dvida sobre a exatido desta recordao (10) que se refere ao ms de Dezembro de 1799: o futuro poltico e clebre historiador ingls s tinha, por conseguinte, vinte e um anos naquela ocasio e viajava na Sucia.

Fazia frio, escreve ele. Ao chegar em Gotemburgo, numa hospedaria de boa aparncia, pedi um banho quente e aconteceu-me a uma aventura to curiosa que quero narrar desde o princpio.

Tive como amigo de colgio, na High School, um colega por nome G . , que eu apreciava e estimava especialmente. Muitas vezes conversvamos juntos sobre o grande assunto da imortalidade da alma. Um dia, fizemos a loucura de redigir um contrato, escrito com nosso sangue, afirmando que qualquer um dos dois que morresse primeiro, viria manifestar-se ao outro, para dissipar a dvida que poderamos conservar sobre a continuidade da vida depois da morte. G. partiu para a ndia e mais ou menos esqueci que ele existia.

Estava eu, pois, mergulhado no meu banho, gozando deliciosamente o bom calor que aquecia meus membros entorpecidos e preparava-me para me levantar, q;:ando, olhando para a cadeira onde eu tinha posto minha roupa com grande espanto, vi nela sentado meu amigo G. a olhar para mim, tranqilamente! No posso dizer como sa do banho, porque, ao recuperar os sentidos, me vi estendido no soalho. Esta apario ou o fenmeno que apresentava meu amigo j l no estava mais. Fiquei de tal modo impressionado que, sem demora, quis escrever todos estes pormenores, com a data do dia, 19 de Dezembro .

Lorde Brougham acrescenta que logo ao chegar a Edimburgo encontrou uma carta da ndia, anunciando-lhe a morte de seu amigo, ocorrida no dia 19 de Dezembro .

Na sua relao, o sbio escritor expe que seu sonho, apesar da sua clareza to caracterstica, pode ter sido somente uma coincidncia imprevista com o falecimento de seu amigo. Mas, ao relat-lo, Myers faz notar, com justa razo, que a descrio do banho e da observao no concorda com esta

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hiptese. Poderia pensar numa iluso produzida pela roupa atirada na cadeira; mas, e o olhar? Alucinao? No: Lorde Brougham declara que em sua longa existncia nunca teve alucinao. Somos levados a admitir nesse caso a ao da alma do morto sobre o esprito do amigo, traduzindo-se ela por uma imagem.

Pelo conhecimento que temos, atualmente, dos fenmenos psquicos, o que podemos inquirir se a apario se efetuou no momento da morte ou depois dela. A apario deu-se no dia 19 de Dezembro, pelas 2 horas da manh (talvez no dia 20) . O amigo faleceu na ndia, no dia 19.

A que horas? Ignora-se, mas sabido que a hora mais adiantada medida que se caminha para Leste.

A probabilidade est a favor dum intervalo mais ou menos longo aps o falecimento . Compreende-se muito bem que Lorde Brougham no se atreve a declarar a sua opinio e refugia-se na hiptese do sonho, bem pouco provvel, entretanto. Pensamos, normalmente, que se tivssemos visto somente uma observao deste gnero, poderamos permanecer na dvida. Mas existem tantas! E em todas as pocas!

E suficiente folhearmos as obras psquicas antigas para nelas encontrar casos anlogos aos de Lorde Brougham .

Abramos, por exemplo, o livro de Dom Calmet, publicado em 1746. Dissertations sur les aparitions des anges, des dmons et des esprits et sur les revenants, no captulo XLVI da segunda parte (pg. 375), e l encontraremos, sob o ttulo: Pessoas que fizeram entre si a promessa, de virem dar notcias do outro mundo, depois da sua morte, as seguintes linhas:

A histria do Marqus de Rambouillet, que apareceu depois da morte ao Marqus de Prcy, afamada . Estes dois fidalgos conversavam entre si sobre outra vida, como pessoas no muito persuadidas do que dela se diz, e combinaram entre si que o primeiro que morresse viria dar notcias suas ao outro. O Marqus de Rambouillet partiu para Fiandres, onde guerreavam ento, e o Marqus de Prcy ficou em Paris, retido por uma grande febre. Seis semanas depois, ouviu puxar as cortinas da cama, e, voltando-se para ver quem era, avistou o Marqus de Rambouillet com gibo de couro e botas. Saiu da cama para abra-lo, mas Rambouillet recuou alguns passos, disse-lhe que viera para cumprir sua palavra; que tudo que diziam da outra vida era verdade; que ele devia mudar de modo de agir; que breve perderia a vida. Prcy fez novos esforos para abraar o amigo, mas s abraou o ar; ento Rambouillet, vendo-o incrdulo, mostrou-lhe o lugar onde fora ferido nos rins, donde ainda parecia correr sangue.

Breve recebeu Prcy, pelo correio, a confirmao da morte do Marqus de Rambouillet, e ele mesmo, envolvido nas guerras civis, na batalha do Faubourg Saint-Antoine, nela foi morto.

E provvel que esta histria fosse mais ou menos arranjada, sobretudo no que diz respeito s palavras do fantasma; mas tambm provvel que no

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fosse totalmente inventada. E encontrada numa obra de Collin de Plancy, escrita para combater a credulidade e a superstio (11) . Depois de t-la relatado e com mais pormenores ainda, ele acrescenta:

Admitindo-se a verdade de todas as circunstncias deste fato, nada se pode, contudo, dele deduzir a favor dos fantasmas. No difcil compreender que a imaginao do Marqus de Prcy, excitada pela febre e perturbada pela recordao da promessa que ele e Rambouillet tinham feito, lhe tenha representado o fantasma do seu amigo que ele sabia estar no exrcito e arriscado de ser morto; talvez mesmo estivesse informado que deviam naquele dia travar combate com o inimigo. As circunstncias no ferimento do Marqus de Rambouillet e da predio da morte de Prcy, que se realizou, tem algo de mais grave; entretanto, aqueles que sentiram a fora dos pressentimentos no custaro a compreender que o Marqus de Prcy, cujo esprito, agitado pelo ardor da molstia, acompanhava seu amigo por todos os riscos da guerra e esperava sempre ver o seu fantasma anunciar-lhe o que lhe devia acontecer. O seu esprito teria previsto que o Marqus de Rambouillet fora morto por um tiro de mosquete nos rins e que ele mesmo, pelo ardor e vontade que tinha de se bater, estava nos casos de morrer no primeiro combate. Antes de dar f a fatos que ultrapassam as coisas habituais preciso deles ter prova cabal; e, neste caso no existem nem testemunhas, nem monumentos, nem historiadores que meream inteira confiana.

Este raciocnio muito discreto, e por essa justa apreciao das coisas que aplicamos hoje, em nossas pesquisas, as exigncias do mtodo experimental e por isso que os inquritos verificam os fatos relatados.

Mas no devemos repelir todas as narraes, pois cada um deve ter o cuidado de s admitir os fatos comprovados por um inqurito. Eis porque importante, para a nossa instruo pessoal, compararmos todas as observaes sem termos nenhuma idia preconcebida. Notemos que procuram todos os pretextos para fugirem da afirmao: Lorde Brougham fala em alucinao ; Collin de Plancy em pressentimento . Permaneamos independentes.

Foi talvez a dificuldade, digamos mesmo a impossibilidade de admitir-se a presena real do fantasma do Marqus de Rambouillet, com vesturio de guerra e de botas, que impediu a aceitao dessas histrias. Pensamos hoje que, como no caso do amigo de Lorde Brougham, no h apario material nesse caso, h a ao do esprito do morto sobre o do vivo.

Antes de continuar, podemos perguntar a ns mesmos em que consistem exatamente esses fantasmas, cujas manifestaes aqui examinamos.

Um longo estudo desses fenmenos levou-me a concluir, com Myers, que nada nos autoriza a afirmar que o fantasma que aparece seja a prpria pessoa, no sentido habitual da palavra. Trata-se antes dessas formas alucinatrias ou fantasmas aparentes que ns estudamos no segundo volume, projees que vemos com certeza, sem concluir com isso que a apario fosse a prpria pessoa viva; do mesmo modo o que chamamos um espectro ou alma no de

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modo nenhum a prpria pessoa falecida: existe certamente uma conexo entre o espectro e o ente humano morto, conexo essa que est por determinar, mas no uma identidade completa.

Foi o que expusemos no tomo II, no captulo O pensamento produtor de imagens .

Um fenmeno pstumo, escrevia por sua vez Myers, pode ser uma manifestao da energia pessoal persistente ou somente a indicao que um certo poder, com a idia fixa em uma pessoa que conhecemos