A legalidade dos ifrs

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A LEGALIDADE DOS IFRS NAS PEQUENAS E MÉDIAS EMPRESAS Reinaldo Luiz Lunelli Ultimamente tem-se tratado muito sobre a aplicação das normas internacionais de contabilidade aplicável nas pequenas e médias empresas, em especial depois da Resolução CFC nº 1.255/2009 , que tornou de observância obrigatória o Pronunciamento PME emitido pelo CPC no final de 2009. O referido pronunciamento trata sobre a aplicação das IFRS também nas pequenas e médias empresas. Inúmeras autoridades da área contábil já se pronunciaram favoravelmente à aplicação destas normas em todas as empresas, independentemente de seu porte ou ramo de atividade, outras nem tanto assim. Outro fato é questionável. Será que com a utilização destas novas normas teremos realmente um ganho substancial de qualidade nas informações geradas pelo contador? E o custo de toda esta operação compensará o tempo demandado para os devidos ajustes? O grande ponto é que perdas também são previstas e este, a meu ver, é o maior entrave para a padronização das pequenas e médias empresas. O refinamento das informações contábeis exige um aperfeiçoamento imediato dos profissionais envolvidos no processo de geração dos demonstrativos e dados contábeis. Isto deverá ser feito através de treinamentos e horas gastas com o estudo, alteração de sistemas, planos de contas e forma de escrituração hoje utilizadas. Se efetivamente as normas forem aplicadas a todas as empresas, sem exceção, podemos afirmar que mais de 90% dos escritórios de contabilidade precisarão rever e alterar substancialmente seus procedimentos internos. Com isto o custo da operação também irá aumentar e os contadores deverão rever seus honorários que podem acabar ocasionando perdas ao invés dos ganhos esperados. Entendo que neste momento vale lembrarmos o princípio constitucional da legalidade que é encontrado no inc. II do art. 5º da carta magna, que diz o seguinte: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Assim, vemos que existe uma relativa liberdade aos profissionais, em nosso caso, de fazer tudo, menos o que é proibido por lei. Por força de lei os empresários e os profissionais não estão obrigados a seguir as ditas normas internacionais de contabilidade para as pequenas e médias empresas, pelo menos até que exista expressa revogação do previsto no Código Civil Brasileiro, mais especificamente em relação aos artigos 1.179 e seguintes. A Lei n° 6.404/76 também não obriga esta aplicação que, portanto é equivocada e não pode ser fruto de uma fiscalização corretiva. Nem mesmo os órgãos de classe, podem obrigar o profissional contábil a seguir as IFRS a não ser o texto legal. Portanto, no momento nenhuma punição poderá ser imposta a um empresário ou profissional que optar por manter seus padrões contábeis de acordo com a legislação fiscal e societária vigente nas pequenas e médias empresas, já que o padrão adotado e regulamentado por algumas entidades oficiais não tem qualquer força de lei.

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A LEGALIDADE DOS IFRS NAS PEQUENAS E MÉDIAS EMPRESAS

Reinaldo Luiz Lunelli

Ultimamente tem-se tratado muito sobre a aplicação das normas internacionais de

contabilidade aplicável nas pequenas e médias empresas, em especial depois

da Resolução CFC nº 1.255/2009, que tornou de observância obrigatória o

Pronunciamento PME emitido pelo CPC no final de 2009. O referido pronunciamento

trata sobre a aplicação das IFRS também nas pequenas e médias empresas.

Inúmeras autoridades da área contábil já se pronunciaram favoravelmente à aplicação

destas normas em todas as empresas, independentemente de seu porte ou ramo de

atividade, outras nem tanto assim.

Outro fato é questionável. Será que com a utilização destas novas normas teremos

realmente um ganho substancial de qualidade nas informações geradas pelo contador? E

o custo de toda esta operação compensará o tempo demandado para os devidos ajustes?

O grande ponto é que perdas também são previstas e este, a meu ver, é o maior entrave

para a padronização das pequenas e médias empresas.

O refinamento das informações contábeis exige um aperfeiçoamento imediato dos

profissionais envolvidos no processo de geração dos demonstrativos e dados contábeis.

Isto deverá ser feito através de treinamentos e horas gastas com o estudo, alteração de

sistemas, planos de contas e forma de escrituração hoje utilizadas. Se efetivamente as

normas forem aplicadas a todas as empresas, sem exceção, podemos afirmar que mais

de 90% dos escritórios de contabilidade precisarão rever e alterar substancialmente seus

procedimentos internos. Com isto o custo da operação também irá aumentar e os

contadores deverão rever seus honorários que podem acabar ocasionando perdas ao

invés dos ganhos esperados.

Entendo que neste momento vale lembrarmos o princípio constitucional da legalidade

que é encontrado no inc. II do art. 5º da carta magna, que diz o seguinte: “Ninguém será

obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Assim,

vemos que existe uma relativa liberdade aos profissionais, em nosso caso, de fazer

tudo, menos o que é proibido por lei.

Por força de lei os empresários e os profissionais não estão obrigados a seguir as ditas

normas internacionais de contabilidade para as pequenas e médias empresas, pelo

menos até que exista expressa revogação do previsto no Código Civil Brasileiro, mais

especificamente em relação aos artigos 1.179 e seguintes. A Lei n° 6.404/76 também

não obriga esta aplicação que, portanto é equivocada e não pode ser fruto de uma

fiscalização corretiva.

Nem mesmo os órgãos de classe, podem obrigar o profissional contábil a seguir as IFRS

a não ser o texto legal. Portanto, no momento nenhuma punição poderá ser imposta a

um empresário ou profissional que optar por manter seus padrões contábeis de acordo

com a legislação fiscal e societária vigente nas pequenas e médias empresas, já que o

padrão adotado e regulamentado por algumas entidades oficiais não tem qualquer força

de lei.

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Desta forma, a verdadeira obrigatoriedade a que estão sujeitos os empresários e

profissionais contábeis é em cumprir a lei, no caso das sociedades de menor porte,

trata-se das regulamentações trazidas pelo Código Civil Brasileiro e não por textos

complementares.

* Reinaldo Luiz Lunelli é contabilista, auditor, consultor de empresas, professor

universitário, autor de diversos livros de matéria contábil e tributária e membro da

redação dos sites Portal Tributário e Portal de Contabilidade.