A Imaginação Sociológica

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A imaginação sociológicaConhecer o conceito de imaginação sociológica, de Wright Mills.

Hoje em dia, quando se fala na contribuição da Sociologia para a formação do jovem do ensinomédio, é comum a referência ao despertar da imaginação sociológica como sinônimo de criatividade,inventividade, capacidade de inovação e experimentação, habilidades que estariam sendorequisitadas pela sociedade contemporânea. Ora, o conceito de imaginação sociológica do sociólogonorte-americano Charles Wright Mills (1916-1962) não é esse, ou é muito mais do que isso.

Wright Mills, nascido no Texas (EUA), graduou-se em Sociologia, fez mestrado em Filosofia edoutorado em Sociologia e Antropologia pela Universidade de Wisconsin. Entre 1947 e 1962,lecionou na Universidade de Colúmbia, Nova York, onde publicou o núcleo de sua contribuição àsciências sociais. Foi leitor atento de Max Weber, tendo organizado com Hans H. Gerth uma coletâneade textos do primeiro, publicada no Brasil com o título Ensaios de Sociologia (1971). Entre suasprincipais obras destacam-se: New Men of Power (1948), A Nova Classe Média (1951), Caráter eEstrutura Social (1953) e A Elite do Poder (1956).

Após uma visita a Cuba, em 1960, publicou A Verdade Sobre Cuba, livro que foi um enormesucesso de vendas e o colocou sob a mira do FBI. Por outro lado, também em 1960, na Rússia,ergueu um brinde em favor da publicação das obras do proscrito Trostsky na U.R.S.S. Esses fatosilustram a independência de pensamento de Wright Mills, que defendia uma sociologia que não seapegasse a esquemas e modelos rígidos que planificam a reflexão. Wright Mills opunha-se a umasociologia baseada em testes, por meio de métodos controláveis, de hipóteses construídas a partirde leis gerais. Recuperou o sentido original do termo methodos como caminho para se chegar a umfim. No ofício de sociólogo, o trabalho intelectual é também artesanal, e esse profissional não deveseparar o seu trabalho de sua experiência de vida, para o enriquecimento de ambos, tanto otrabalho quanto a própria vida.

O livro intitulado A Imaginação Sociológica foi publicado originalmente nos EUA, em 1959. Nolivro, Wright Mills fez uma análise das “escolas” que dominavam a sociologia americana, criticando,principalmente, o funcionalismo de Talcott Parsons (1902-1979) e os métodos quantitativos de PaulLazarsfeld (1901-1976).

Parsons é citado como exemplo de uma sociologia prolixa, com uma linguagemdesnecessariamente inacessível ao público. Wright Mills sai em defesa da tradição clássica dasciências sociais e de uma sociologia que estimule a reflexão sem perder a conexão com as inúmerasfacetas da realidade.

O primeiro capítulo, intitulado A Promessa, é o texto-referência para esta aula. A promessa,neste caso, é justamente a tarefa da sociologia de estimular a imaginação sociológica, que é a:

[...] Capacidade de passar de uma perspectiva para outra – do político para opsicológico; do exame de uma única família para a avaliação comparativa

dos orçamentos nacionais do mundo; da escola teológica para a organizaçãomilitar; de considerações sobre uma indústria de petróleo para estudos depoesia contemporânea. É a capacidade de oscilar entre as transformaçõesmais impessoais e remotas e os traços mais íntimos da pessoa humana – ede ver as relações entre os dois. Por trás de seu uso está sempre o anseio

por conhecer o significado social e histórico do indivíduo na sociedade e no

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período em que ele tem sua qualidade e seu ser (MILLS, 2009, p. 86).

Esse “passar de uma perspectiva para outra” permite uma visão ampliada da sociedade e deseus componentes. Pela imaginação sociológica é possível ampliar a compreensão da intrincadainter-relação entre os fatos da biografia individual e os fatos sociais e históricos, como uns afetamoutros e vice-versa, uma vez que “os fatos da história contemporânea são também fatos sobre osucesso e o fracasso de homens e mulheres individuais” (MILLS, 2009, p. 81).

Não basta apenas a informação. Aliás, muita informação confunde a pessoa; especialmente emtempos de internet, podemos acrescentar, ela não é capaz de distinguir e analisar o que vê. Ainformação deve ser objeto da reflexão, de modo que o indivíduo seja capaz de chegar a explicaçõessobre o que está acontecendo na sua vida em conexão com o que está acontecendo no mundo evice-versa. Essa é a imaginação sociológica, “uma qualidade mental que os ajude [aos homens] ausar a informação e desenvolver a razão de modo a alcançar sínteses inteligíveis do que estáacontecendo no mundo e do que pode estar acontecendo dentro deles mesmos” (MILLS, 2009, p.83).

A imaginação sociológica não é, portanto, apenas imaginação no sentido de criatividade, mas éum modo de pensar que permite a ampliação da consciência de si e do mundo. Não há maneiramelhor nem mais bonita de terminar esta aula, senão transcrevendo o último parágrafo do capítulo APromessa:

É por isso, em resumo, que se espera que através da imaginação sociológicaos homens possam agora captar o que está acontecendo no mundo, e

compreender o que está se passando em si mesmos como minúsculos pontosde interseção de biografia e história dentro da sociedade. Em grande parte, a

visão autoconsciente que o homem tem de si mesmo como pelo menos umoutsider, se não um estrangeiro permanente, repousa sobre uma percepção

absorta da relatividade social e do poder transformador da história. Aimaginação sociológica é a forma mais frutífera dessa autoconsciência.

Mediante seu uso, homens cujas mentalidades abrangeram apenas uma sériede órbitas limitadas chegam muitas vezes a se sentir como se tivessemdespertado de repente numa casa com que haviam apenas suposto ter

familiaridade. Correta ou incorretamente, chegam muitas vezes a sentir quepodem agora suprir-se de sínteses adequadas, avaliações coerentes,

orientações abrangentes. Decisões mais antigas, que outrora pareciamsólidas, agora lhes parecem produtos de uma mente inexplicavelmente

obtusa. Sua capacidade de espanto é revigorada. Eles adquirem uma novamaneira de pensar, experimentam uma transposição de valores: numa

palavra, por sua reflexão e por sua sensibilidade, compreendem o significadocultural das ciências sociais (MILLS, 2009, p. 87).

Quiz

1 A "imaginação sociológica" é um conceito de Wright Mills, que se refere a umcerto tipo de qualidade mental que:

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Supõe criatividade e inventividade aplicadas à solução dos problemas sociais

Implica habilidade para interpretar o mundo à luz das teorias clássicas das ciênciassociais

Significa capacidade de criar suas próprias visões de mundo, deixando de lado ascontribuições das ciências sociais

Associa experiências individuais e conjuntura histórica

ReferênciasMILLS, Charles Wright. A promessa. In: CASTRO, Celso (Seleção e introdução). Sobre o artesanatointelectual e outros ensaios. Rio de Janeiro: Zahar, 2009, p. 81-87.