A GENTE E NÓS E O SEU TRATAMENTO EM UM LIVRO DIDÁTICO DE PORTUGUÊS COMO LÍNGUA ADICIONAL

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A gente e nós e o seu tratamento em um livro didático de português como língua adicional Daniela Doneda Mittelstadt e Letícia Grubert dos Santos Submetido em 01 de maio de 2012. Aceito para publicação em 05 de junho de 2012. Publicado em 30 de junho de 2012. Cadernos do IL, Porto Alegre, n.º 44, junho de 2012. p. 433-456 POLÍTICA DE DIREITO AUTORAL Autores que publicam nesta revista concordam com os seguintes termos: (a) Os autores mantêm os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Creative Commons Attribution License , permitindo o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria do trabalho e publicação inicial nesta revista. (b) Os autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não exclusiva da versão do trabalho publicada nesta revista (ex.: publicar em repositório institucional ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial nesta revista. (c) Os autores têm permissão e são estimulados a publicar e distribuir seu trabalho online (ex.: em repositórios institucionais ou na sua página pessoal) a qualquer ponto antes ou durante o processo editorial, já que isso pode gerar alterações produtivas, bem como aumentar o impacto e a citação do trabalho publicado. (d) Os autores estão conscientes de que a revista não se responsabiliza pela solicitação ou pelo pagamento de direitos autorais referentes às imagens incorporadas ao artigo. A obtenção de autorização para a publicação de imagens, de autoria do próprio autor do artigo ou de terceiros, é de responsabilidade do autor. Por esta razão, para todos os artigos que contenham imagens, o autor deve ter uma autorização do uso da imagem, sem qualquer ônus financeiro para os Cadernos do IL. POLÍTICA DE ACESSO LIVRE Esta revista oferece acesso livre imediato ao seu conteúdo, seguindo o princípio de que disponibilizar gratuitamente o conhecimento científico ao público proporciona sua democratização. http://seer.ufrgs.br/cadernosdoil/index Sábado, 30 de junho de 2012 23:59:59

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Este trabalho tem por objetivo analisar o tratamento dado aos pronomesa gente e nós no livrodidático “Novo Avenida Brasil1 : curso de português para estrangeiros” (LIMA et al, 2008). Partimos do pressuposto de que a variação linguística é inerente à linguagem e de que o uso da linguagem é uma forma de ação social (CLARK, 2000), e, assim, entendemos que discussões acerca das novas tendências da língua portuguesa devam fazer parte das tarefas de ensino de português como língua adicional. A partir da análise do livro didático, apresentamos uma proposta de tarefa para a abordagem do pronome a gente em um curso básico de português como língua adicional.

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A gente e ns e o seu tratamento em um livro didtico de portugus como lngua adicional Daniela Doneda Mittelstadt e Letcia Grubert dos Santos Submetido em 01 de maio de 2012. Aceito para publicao em 05 de junho de 2012. Publicado em 30 de junho de 2012. Cadernos do IL, Porto Alegre, n. 44, junho de 2012. p. 433-456 POLTICA DE DIREITO AUTORAL Autores que publicam nesta revista concordam com os seguintes termos: (a)Osautoresmantmosdireitosautoraiseconcedemrevistaodireitodeprimeirapublicao,comotrabalho simultaneamente licenciado sob a Creative Commons Attribution License, permitindo o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria do trabalho e publicao inicial nesta revista. (b) Os autores tm autorizao para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuio no exclusiva da verso dotrabalhopublicadanestarevista(ex.:publicaremrepositrioinstitucionaloucomocaptulodelivro),com reconhecimento de autoria e publicao inicial nesta revista. (c) Os autores tm permisso e so estimulados a publicar e distribuir seu trabalho online (ex.: em repositrios institucionais ounasuapginapessoal)aqualquerpontoantesouduranteoprocessoeditorial,jqueissopodegeraralteraes produtivas, bem como aumentar o impacto e a citao do trabalho publicado. (d)Osautoresestoconscientesdequearevistanoseresponsabilizapelasolicitaooupelopagamentodedireitos autorais referentes s imagens incorporadas ao artigo. A obteno de autorizao para a publicao de imagens, de autoria doprprioautordoartigooudeterceiros,deresponsabilidadedoautor.Porestarazo,paratodososartigosque contenham imagens, o autor deve ter uma autorizao do uso da imagem, sem qualquer nus financeiro para os Cadernos do IL. POLTICA DE ACESSO LIVRE Estarevistaofereceacessolivreimediatoaoseucontedo,seguindooprincpiodequedisponibilizargratuitamenteo conhecimento cientfico ao pblico proporciona sua democratizao. http://seer.ufrgs.br/cadernosdoil/index Sbado, 30 de junho de 2012 23:59:59 433 A GENTE E NS E O SEU TRATAMENTO EM UM LIVRO DIDTICO DE PORTUGUS COMO LNGUA ADICIONAL Daniela Doneda Mittelstadt Letcia Grubert dos Santos** RESUMO:Estetrabalhotempor objetivo analisarotratamentodadoaos pronomesa genteensnolivro didticoNovoAvenidaBrasil1:cursodeportugusparaestrangeiros(LIMAetal,2008).Partimosdo pressuposto de que a variao lingustica inerente linguagem e deque o uso da linguagem uma forma deao social (CLARK, 2000), e, assim, entendemos quediscusses acerca das novas tendncias da lngua portuguesa devam fazer parte das tarefas de ensino de portugus como lngua adicional. A partir da anlise do livro didtico, apresentamos uma proposta de tarefa para a abordagem do pronome a gente em um curso bsico de portugus como lngua adicional. PALAVRAS-CHAVE: material didtico; variao lingustica; portugus como lngua adicional. 1. INTRODUO

Avariaoconstitutivadaslnguas humanas,ocorrendoemtodososnveis. Elasempreexistiuesempreexistir, independentementedequalquerao normativa.Assim,quandosefalaem LnguaPortuguesaestsefalandode umaunidadequeseconstituidemuitas variedades. PCN Emnossaprticacomoprofessorasdeportuguscomolnguaadicional(PLA)1, tantonocontextobrasileirocomonoexterior2,semprenosdeparamoscomquestes relacionadasabordagemdadiversidadelingusticadoportugusbrasileironoensino.A exemplo disso, temos a escolha dos pronomes pessoais tu e voc e as implicaes terico-metodolgicasdecorrentesdessaopoparaotrabalhoemsaladeaula,umavezque,na Bolsista CAPES de mestrado em Lingustica Aplicada na UFRGS: [email protected]** Mestre em Lingustica Aplicada pela UFRGS, aluna especial do curso de doutorado: legrubert@gmail.com1UtilizamosotermolnguaadicionalseguindoopropostoporSchlattereGarceznosReferenciais CurricularesdoRioGrandedoSul(RGS,2009).Segundoosautores,otermolnguaadicional(emvezde lngua estrangeira ou segunda lngua) enfatiza o acrscimo do portugus a outras lnguas que j fazem parte dorepertriodoindivduoetambmressaltaque,aserviodacomunicaotransnacionale/ouda participaocidadcontempornea,adistinoentrenativo/estrangeiroouprimeira/segundalnguano relevante. 2 LetciaSantosministrouaulasnaCoreiadoSul(2007-2008)eDanielaMittelstadtnaVenezuela(2010). AtualmenteLetciaSantosministraaulasnaEscolaBemBrasil(escoladeensinodelnguaportuguesapara falantesdeoutraslnguasnacidadedePortoAlegre)eDanielaMittelstadtnoProgramadePortuguspara Estrangeiros da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPE-UFRGS). 434CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 maioriadoslivrosdidticosdePLA,opronometupreteridoemrelaoaousodevoc (RICARDI, 2005). Nesse sentido, por sermos provenientes de Porto Alegre, regio na qual osfalantesutilizamopronometunasmaisvariadassituaessociais,asalinciado pronome voc nos materiais de ensino de PLA sempre nos impeliu a mostrar aos alunos que opronomeretotuusadorecorrentementeemalgumasregiesdoBrasil,equenoest em desuso ao contrrio do que se poderia inferir da proposta pedaggica de grande parte dos materiais didticos dessa rea. Aindaemrelaonossaprtica,emdiferentescongressosecursosdeformao dosquaistivemosaoportunidadedeparticipar,entramosemcontatocommuitos professores que trabalhavam com o ensino de PLA no exterior, embora, em diversos casos, notivessemformaoespecficanareaetomassemcomopilarfundamentalparaseu trabalho a viso de linguagem subjacente proposta de ensino do livro didtico selecionado pelas suas instituies de ensino.Ainda sobreessa questo, percebemosquevrios desses professores,quandosedeparavamcomumexemplodefalaquenofosseaquela representada no livro didtico, abordavam questes de variao lingustica em sala de aula por meio de um ensino prescritivo de certo e errado, muitas vezes cultuando um ensino que estereotipa a fala do brasileiro. Assim, pensamos que em muitos contextos no tem sido oportunizado ao aluno o conhecimento da ampla gama de variedades lingusticas existentes e inerentes linguagem. Diantedisso,torna-seaindamaissalienteaimportnciademateriaisdidticosque realmenteajudemosprofessoresemsuaprtica,mostrandopeculiaridadesdalnguaque estoimbricadasnasculturasexistentesnoBrasil.Almdisso,jquemateriaisdidticos apresentam limitaes na sua tentativa de refletir a complexidade da diversidade lingustica doportugusbrasileiro,entendemosqueaelaboraodemanuaisdoprofessorque estimulem a discusso sobre essa complexidade e orientem o trabalho em sala de aula seja fundamental.Sobessaperspectiva,pensamosqueomanualdoprofessordeveriasinalizar asoportunidadesdediscussoquepodemserfeitascomosalunosacercadeaspectos sociolingusticosrelevantesparaosobjetivosdeaprendizagem,combaseempesquisas sociolingusticas atuais sobre as tendncias da lngua portuguesa. Partindodessasreflexes,entendemosqueseriarelevantesistematizaradiscusso acercadevariedadeslingusticasnasaladeauladePLA,tomandocomobaseumlivro didtico de grande representatividade no ensino de PLA no Brasil e no exterior o Novo AvenidaBrasil1:cursodeportugusparaestrangeiros(NAB1)3 (LIMAetal,2008).Em relaoaospronomespessoais,apresenadetunocontextobrasileiromencionadano livro,mesmoqueescassamente.Contudo,oquerealmentesetornousalientefoiatotal ausnciadopronomeagente4.Buscamos,ento,averiguardequemodoaspesquisas 3 O livro Novo Avenida Brasil 1 foi selecionado para este estudo, pois foi e utilizado como livro didtico nos cursos de nvel bsico ministrados pelas pesquisadoras tanto no Brasil quanto no exterior, primeiramente nasuaversoantigae,maisrecentemente,nasuaedioatualizada.,almdisso,umdoslivrosmais utilizados para o ensino de PLA no mundo. 4 Aquinosreferiremoslocuoagentecomoumpronomeporentendermosque:a)possuiinterpretao pronominal(deprimeirapessoadopluralearbitrria);b)possuiumcomportamentosintticoigualaodos pronomes(nohmodificaopossvel);ec)ognerodeterminadopelainterpretao(nopor especificao lexical) (MENUZZI, 2000). Maiores explicaes sobre o uso de a gente sero dadas no decorrer do artigo. A gentee ns e o seu tratamento em435 um livro didtico de portugus como lngua adicional sociolingusticasabordamoseuusonoportugusbrasileiro.Aps,analisamosamaneira pelaqualomanualdoprofessordenossoobjetodepesquisasugereoensinodaprimeira pessoa do plural. A partir dessa anlise, propomos uma tarefa e suas respectivas orientaes para o professor em relao aos usos de a gente no portugus brasileiro, de modo a suscitar discusso em sala de aula sobre variao lingustica. Assim, este trabalho5 busca mostrar a importncia de a gente no ensino de PLA de modo a dialogar com professores da rea sobre como o pronome pode ser abordado em sala de aula, luz da sociolingustica variacionista.Naprimeirapartedesteartigo,discutimosacercadevariaolingusticano portugus brasileiro e estudos sobre como abord-la no ensino. Em seguida, apresentamos alguns resultados de estudos atuais sobre o uso da forma inovadora a gente como pronome pessoalnoportugusbrasileiro.NasseesdedicadasanlisedolivroNAB1edoseu manualdoprofessor,tecemoscomentriossobreaorganizaodessematerialdidticoe sobre como so abordadas questes de variao lingustica para o ensino de PLA. Por fim, apresentamosumapropostadetarefavoltadaparaalunosdenvelbsicodePLAeque objetiva discutir a forma a gente. 2.VARIAOLINGUSTICADOPORTUGUSBRASILEIRO:QUAL PORTUGUS EU ENSINO? Arespostaparaaperguntadottulodestaseopareceteravanadonosltimos anos quando se pensa no contexto de ensino de portugus como lngua materna a partir do adventodosParmetrosCurricularesNacionais(PCN)em1998(BRASIL,1998).Em relao aos objetivos do ensino de diferentes padres de fala e de escrita de portugus como lngua materna, os PCN do terceiro e quarto ciclos, por exemplo, afirmam que: oquesealmejanolevarosalunosafalarcerto,maspermitir-lhesa escolhadaformadefalaautilizar,considerandoascaractersticase condiesdocontextodeproduo,ouseja,saberadequarosrecursos expressivos,avariedadedelnguaeoestilosdiferentessituaes comunicativas[...].Aquestonodeerro,masdeadequaos circunstnciasdeuso,deutilizaoadequadadalinguagem(BRASIL, 1998, p. 31). Conformeacitaoacima,percebe-sequeosPCNpriorizamumensinodelngua maternavoltadoparaaadequaodalinguagemadiferentessituaescomunicativas,em detrimento da dicotomia certo ou errado que permeia, tradicionalmente, o ensino de lnguas na escola. Ao promover um ensino calcado na adequao discursiva, tendo como ponto de partidasituaesdeproduodefinidas(interlocutor,propsitoepapeldoenunciador),a questodavariedadelingusticatorna-seevidenteenecessria,promovendo,portanto,a 5 Este trabalho fruto da discusso acerca de estudos da variao lingustica como prtica social e de outras reflexesterico-metodolgicassobreoensinodeLnguaPortuguesaabordadosnadisciplinadeSeminrio de Variao Lingustica e Prticas Sociais do Programa de Ps-Graduao em Letras da UFRGS no segundo semestrede2011,sobaorientaodaprofessoraDra.ElisaBattisti.Agradecemosprofessorapelos comentrios feitos em verses anteriores deste trabalho. 436CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 necessidade de discusso, em sala de aula, de outros elementos inerentesao uso da lngua portuguesa que no apenas a acurcia gramatical.No que tange ao ensino de PLA, ainda h muito a ser discutido a respeito da postura que o professor deve adotar frente s variedades do portugus brasileiro e de que modo ele podesensibilizaroalunoparaariquezadoidiomapormeiodeprticaspedaggicas ancoradasemestudoslingusticosatuais,semdesprestigiarcertosfalaresbrasileiros. Podemos,contudo,perceberumamudananoensinodePLA,principalmentedepoisda implementaodoexameparaobtenodoCertificadodeProficinciaemLngua Portuguesa para Estrangeiros (Celpe-Bras), que faz uma avaliao de desempenho e no de itens isolados de gramtica e vocabulrio. Deacordo comSchlatter (2006), j foi possvel perceberumamodificaonoensinoenaaprendizagemdePLAquehistoricamentese limitavaaprticasestruturalistas,comofocoempreenchimentodelacunaseensinode regras gramaticais e vocabulrio , os quais passaram a voltar-se para o uso da lngua para comunicaooraleporescrito,levandoemcontaocontextodainterao,aoinvsde focalizarexclusivamenteconhecimentosobrealngua(SCHLATTER,2006,p.175,grifo da autora). Pode-se ver, portanto, que o ensino de PLA era, assim como o ensino deportugus como lngua materna, pautado em um ensino principalmente estruturalista. A mudana que senotaemambososcontextosdeensinodelnguaportuguesa,pormaisquesvezes tmida, leva-nos a pensar em que portugus, ento, ensinar. Ao tomarmos como pressuposto o construto de uso da linguagem como forma de ao social (CLARK, 2000), entendemos que a variao inerente linguagem humana e, portanto, ao tratarmos dessas questes em sala de aula de lngua adicional, podemos mostrar ao aluno que o que est em jogo em seu aprendizadonoasimplesautomatizaodeumcdigoprontoeacabado,esima incluso em sua vida de um elemento fundamental das culturas de um povo (ou de vrios), que serve para mediar suas interaes, segundo o percurso scio-histrico e ideolgico dos participantes envolvidos, ou, em outras palavras, a adio de novas lnguas a seu repertrio lingustico. Acreditamos, portanto, que a sala deaula de PLA (e tambm a deportuguscomo lnguamaterna)possaserpalcoparadiscussessobrevariao,mostrandoque, dependendodocontexto,doestiloedointerlocutor,hdiferentesformaspossveisparaa comunicao, e que saber usar a lngua de formas distintas mister para atuar em diferentes comunidades de prtica6. Aindaemrelaoaqualportugusensinar,pensamosquetantoanormaculta7 quanto a padro8 devam possuir seu espao em sala de aula, e, para tanto, essencial que o professortenhaacessoapesquisasociolingusticasatuais.Almdisso,importanteque existaummomentoemsaladeaulaparamostrarasformasestigmatizadas,poispodeser umamaneiradereiterarquenosoerradase,sim,formasque,porumaquestode 6 Entendemos comunidades de prtica como grupos de indivduos reunidos em torno de um empreendimento comum (ECKERT, 2000, p.35). 7 Nohnaliteraturaespecializadaumconsensosobreadefiniodenormaculta.Apesardisso,neste trabalho a entenderemos como o conjunto de fenmenos lingusticos que ocorrem habitualmente no uso dos falantes letrados em situaes monitoradas de fala e escrita (FARACO, 2008). 8 DeacordocomBagno(2007),anorma-padronopropriamenteumavariedadedalngua,masum construto scio-histrico que serve de referncia para estimular um processo de uniformizao. A gentee ns e o seu tratamento em437 um livro didtico de portugus como lngua adicional mercado9 (BOURDIEU, 2008), foram consideradas no aceitas para determinadas situaes, normalmente em contextos mais formais. Contudo, acreditamos que deva haver a discusso de que no so formas aleatrias e, dependendo do interlocutor, podem ser mais adequadas do que outras. sobesseenfoquequebuscamosanalisar,nestetrabalho,omodocomoolivro didtico NAB1 representa a diversidade do portugus brasileiro e de como explicita, ou no, suavisosobreessadiversidadenasorientaesparaodesenvolvimentodastarefasque lidam com a fala do brasileiro, apresentadas no manual do professor. Para guiar o presente trabalho, partimos das seguintes perguntas: 1.ONAB1evidenciaquealnguaapresentavariabilidadenosfenmenos gramaticais? 2.Oquedizemaspesquisassociolingusticasatuaisquantoaoparadigma pronominal no portugus brasileiro em relao a a gente e ns? 3.Avariaolingusticanousopronominalestcontempladanolivrodidtico NAB1? 4.O que seria importante mencionar em um manual do professor de PLA a partir depesquisasacercadaformainovadoraagentenoparadigmapronominaldo portugus brasileiro?5.Comopodemserabordadososusosdaprimeirapessoadopluralemtarefas para o ensino de PLA? Apresentaremosnaprximaseoosreferenciaistericosutilizadoscomosuporte para alcanar os objetivos mencionados. 3.OPARADIGMAPRONOMINALDOPORTUGUSBRASILEIRO:OUSODE NS E A GENTE Tomandocomorefernciaparaoestudoinicialdoparadigmapronominalem relaoanseagenteasasseresdereconhecidasgramticasdoportugusbrasileiro, percebemosquehcertadivergnciaentreasexplicaessobreousodessespronomese sua ocorrncia segundo a prtica lingustica dos brasileiros (LOPES, 1998). Neves (2000), porexemplo,noincluiopronomeagenteemseuquadrodepronomespessoaispara referncia s trs pessoas gramaticais. Segundo a autora, o sintagma nominala gente seria empregadocomopronomepessoalnalinguagemcoloquial.Emrelaoaisso,Bechara (2006)afirmaqueagenteseriausadocomopronomepessoalforadalinguagem cerimoniosa. 9 SegundoBourdieu(2008,p.65),Emmatriadeproduosimblica,ocondicionamentoexercidopelo mercadoporintermdiodaantecipaodaspossibilidadesdelucroassumenaturalmenteaformadeuma censura antecipada, de uma autocensura, determinando no apenas amaneira de dizer, isto , as escolhas de linguagemamudanadecdigo(codeswitching)dassituaesdebilinguismooudonvelde linguagem, mas tambm daquilo que poder e que no poder ser dito. 438CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 Aoanalisaraapresentaodospronomespessoaisemdiversasgramticas normativas10,Lopes(1998)dizqueospontosquepoderiamserconsideradosmais problemticos nas gramticas avaliadas seriam a excluso de formas amplamente utilizadas na linguagem coloquial e o equvoco nas noes de nmero e pessoa. No tocante forma a gente,aautoraafirmaque,namaioriadasgramticasanalisadas,hcontradiona apresentaodessesintagma,oraapresentando-ocomopronomepessoal,oracomoforma detratamento,oumesmocomopronomeindefinido,sendoque,paraessasafirmaes, destinam-se apenas notas ou observaes de rodap.Jemrelaoapesquisassobreousodenseagente,pode-sedizerquehum nmero crescente de estudos que buscam avaliar o desenvolvimento da forma inovadora a gente no sistema pronominal doportugus brasileiro.A preferncia,cada vez maior, pelo usodaformaagentecomopronomepessoal,emdetrimentodens,vemsendoapontada comopartedemltiplasreorganizaesgramaticaisemcursonoportugusbrasileiro (ZILLES,2002,2005,2007a,2007b),queseriamefeitodeumareestruturaodo portugus brasileiro em relao ao Portugus Europeu, a qual impeliria diversas mudanas morfossintticascomoocasodoparadigmapronominaledosistemadeconcordncia verbal (ZILLES, 2007b). Em relao ao primeiro processo foco deste trabalho , temos a implementaodousodeagentecomopronomepessoaldeprimeirapessoadoplural (ZILLES,2007b).Essareestruturaodoparadigmapronominaldoportugusbrasileiro, segundo Monteiro (1994, p. 146), pode ser oriunda de uma possvel reduo do sistema de conjugaoverbalaexemplodoqueocorreucomaextinodevseaemergnciade voc,umamudanacompleta;nocasodousodeagente,emvezdens,haveriauma mudana considerada em curso. Em relao a isso, Zilles (2007a) menciona que:

Oencaixamentolingusticodeagente,aexemplodoqueocorreucoma introduodevoc/vocs,tambmest,indiretamente,acarretandomudana noparadigmadaconcordnciaverbal,apontandoparasuareduo,jqueo mais frequente encontrarmos o novo pronome seguido de verbo na 3 pessoa do singular. (p. 30)

Lopes(2001,p.140-141)assinalaque,comoemtodoprocessodemudana lingustica, agramaticalizao da formaa gentefoi lenta e gradual e envolveu um estgio intermedirio no qual o nome gente perdeu o trao sinttico de plural e cristalizou-se como umnomesingular,sendoatribudaaeleumainterpretaosemnticacoletivaegenrica. Aindaemrelaoaessavarivel,outroaspectodeseuprocessodemudanaesteve relacionadoquestodaconcordnciadegnerodapalavragente:quandosubstantivo, pertenceaognerofeminino;jnacondiodepronome,aformaagentepodeaparecer acompanhada tanto de formas femininas, quanto de formas masculinas (adjetivos, nomes), sendoaseleodegneroindicadapeladesignaodofalanteepelosreferentesquea acompanham.Castilho(1997,p.37,apudZILLES,2007a)apontaqueousodapalavra gentecomofonteparaamudananoquadropronominalpessoaldoportugusbrasileiro 10 A pesquisadora analisou as seguintes gramticas: Gramtica Fundamental da Lngua Portuguesa (CHAVES de MELLO, 1980); Nova Gramtica do Portugus Contemporneo (CUNHA; CINTRA, 1985); Gramtica da lngua portuguesa (MATEUS et al., 1983); Gramtica normativa da lngua portuguesa (ROCHA LIMA, 1983); e Gramtica Histrica da Lngua Portuguesa (SAID ALI, 1964). A gentee ns e o seu tratamento em439 um livro didtico de portugus como lngua adicional pareceseguiratendnciadaslnguasque,deformageral,recorremaousodenomes genricos como fonte de pronomes pessoais. Estudossociolingusticossugeremqueousodaformaagentecomopronome pessoalremontaaosculoXIX,sendoassociadoaclassesmenosfavorecidas,fatoque corroboraria o uso da forma inovadora a um processo de mudana de baixo11 (change from below)(ZILLES,2005).Alinhando-seaessaperspectiva,oestudodeAssis(1988,apud ZILLES,2005)mostraqueousodaformainovadoraestvinculadoorigempopular, baseando-se nos resultados de sua pesquisa em uma comunidade rural em Minas Gerais. No estudo,opesquisadormostraqueosfalantessemescolarizaoapresentaramforte preferncia (86%) pelo uso de a gente, o que pode evidenciar que esse um processo que emerge dentro decomunidades de fala com menos prestgio no mercadolingustico12. Em relaoaisso,Lopes(1998),aoconfirmarashipteseslevantadasporOmena(1986), conclui que: os fatores lingusticos que condicionam o uso de ns e a gente so os mesmos, tantoparaosfalantescompoucaescolaridadequantoparaosdeformao universitriacompleta.Oprocessamentodamudanalingusticanosdois grupos,entretanto,estocorrendodeformadiferenciada.Nosfalantescom poucaescolaridade(OMENA,1986)asubstituiodensporagente encontra-seemumestgiomaisavanadodoqueentreosfalantescultos. Nestes ltimos os homens e as mulheres de meia-idade sofrendo presses sociaismaiores,emfunodesuasatividadesprofissionais,esto,talvez, retardando a efetivao da mudana. (LOPES, 1998, p. 14)

Agramaticalizao do uso dea gente no portugus brasileiro na posiode sujeito da orao: aumentasignificativamentedosanos1970paraosanos1990. Qualitativamente,expande-separanovoscontextos,ondeantesnoera possvel. Assim, inicialmente usado apenas com sentido genrico (...) estende-se para os contextos de referncia especfica (ZILLES, 2005, p. 32). 11 Labov(1994)distinguedoistiposdemudanadentrodeumacomunidadelingustica:mudanadecima (change from above) e mudana de baixo (change from below). Segundo o autor, a primeira est relacionada mudana lingustica que importada de uma comunidade de fala por outra, sendo que tal mudana geralmente provm de um modelo de prestgio e a maioria dos falantes tem conscincia da incorporao desse modelo. O outrotipodemudana,mudanadebaixo(changefrombelow),envolvediferentesmotivaesediferentes distribuiessociais,podendoserconsideradacomoumdesenvolvimentoespontneoqueemergedentroda comunidade de fala. No incio de seu desenvolvimento, os falantes da comunidade tm pouca conscincia da existnciadamudana.Essetipodemudanaestariarelacionado,segundoestudoshistricos,amotivaes lingusticas.Paraopesquisador,amotivaoparaessetipodemudanaseriamforassociais,como identidade local e solidariedade. 12 Usamos aqui a definio de Bourdieu (2008, p. 54):[..] o valor do discurso depende da relao de foras queseestabelececoncretamenteentreascompetnciaslingusticasdoslocutores,entendidasaomesmo tempo como capacidade de produo, de apropriao e apreciao ou, em outros termos, como capacidade de que dispem os diferentes agentes envolvidos na troca para impor os critrios de apreciao mais favorveis a seus produtos. 440CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 ApesquisadeZilles(2007a),realizadacom39informantesdobancodedadosdo projetoVariaoLingusticaUrbananoSuldoPasVARSUL,todosoriundosdePorto Alegre,mostraousodeagentecomoumamudanalideradapormulheres,sendoqueos resultados para faixa etria indicavam uma mudana em curso, pois os falantes mais jovens lideravamoseuusocomumadiferenarobustanopesorelativoemrelaoaosdemais idade.Destacamostambm,desseestudo13,queoinput(probabilidadegeraldeusodea gente) era muito alto (0,85), indicando que a mudana j estava bastante avanada.J no que tange variao estilstica, Zilles (2005) mostra que no h evidncias de que a escolha entre as formas ns ou a gente esteja relacionada a um estilo mais regulado/ cuidadodalngua,emboraousodeagentenofavoreaoestigmarelacionado concordncia verbal, o que poderia motivar seu uso em situaes que exigissem um maior monitoramento por parte do falante.Aotratardevariaoestilstica,Coupland(2001)apontaanecessidadedeselevar emcontapropsitoscomunicativoseidentidade,postulandoqueestiloarealizao situacional e de individualidade do discurso. De acordo com o autor,em geral os modelos sociolingusticosignoramosignificadosocialdoestilo,nolevandoemconta,emsuas anlises, questes como padres de seleo do que queremos significar, para quem, quando eonde.Sobessevis,osresultadosdoestudodeZilles(2007a)mostramqueousoda formainovadoraofereceumamaneiramaisseguradeseevitaroestigmaassociado omisso de concordncia verbal.Segundo Zilles (2007a), com o advento da imposio do padrodalnguaescritanosculo19,tem-seatribudovaloraonegativafaltade concordncia verbal na fala, o que poderia favorecer o uso de a gente como meio de evitar esseestigma.Contudo,aotratardaavaliaosocialdaformainovadoraemgneros textuaisescritos,apesquisadoraapontaqueaformanspareceserfavorecidaem detrimentodaformaagente.Segundoapesquisadora,paraquesejaapuradoseessa prefernciadefatoinstauradapelasrestriesdognerotextualemquestoouseest calcadaemoutroselementoscomo,porexemplo,aescolhadoescritornecessrio analisararelaoentreousodasformasinovadorasbemcomodosgnerostextuaisde formaacompreenderosmotivospelosquaisemdeterminadascircunstnciasimporta escrever como se fala ou recriar, na escrita, traos da fala, ao passo que, em outras, isso no mesmo possvel sem o nus de estigma para quem escreve (ZILLES, 2007a, p. 41). Avariaonaescolhaentreasformasagenteensnopareceestarrelacionada diretamenteacaractersticasespecficasdeseususurios(statussocial,idade,sexo)ou seja,essascaractersticasnolevamnorealizao,ouquasetotalnorealizaoda formaagente,comoapontamosresultadosdaspesquisassupracitadas,massimauma tendncia geral dos falantes de portugus. Em relao a isso, Eckert (2000)14 postula que as variveis lingusticas no so associadas simplesmente a determinados grupos sociais, mas 13 OutropontorelevantesalientadoporZilles(2007)refere-seaochamadoparmetrodosujeitonulo, afirmando que o portugus brasileiro estaria se encaminhando para o progressivo preenchimento do sujeito. 14 Eckert(2000)realizouumtrabalhodepesquisaetnogrficaemquatroescolasdesubrbiodeDetroit distinguindo dois grandes grupos sociais entre os adolescentes: jocks e burnouts. A pesquisadora observou que avariaolingusticamarcavaessasidentidadesequealigaoentreasvariveisqueindiciavamtais identidades se dava de modo indireto, por meio de prticas e ideologias constitutivas desses grupos. Assim, os gruposdejockseburnoutsexistiamporqueasquestesqueosdividiamsosalientesparaacomunidade escolar. A gentee ns e o seu tratamento em441 um livro didtico de portugus como lngua adicional simasuasprticaseideologias.Paraapesquisadora,avariaolingusticaestligada construodesignificadosocial.Emboraaindasejamnecessriosmaisestudosdecunho sociolingustico sobre a aparente preferncia pela forma inovadoraa gente, em detrimento dens,quevisemarelacionarvariaolingusticaorganizaosocialeaidentidades sociaisassimcomoorealizadopeloestudodeEckert(2000),entendemosquetal reflexodevafazerpartedasaulasdePLA,umavezquejhresultadosdeestudosque indicamessamudanaemcursonoparadigmapronominaldoportugusbrasileiro.Para isso,acreditamosqueseriaimportantequeosmateriaisdidticosdePLAabarcassemo novo paradigma pronominal, apresentando a forma inovadora a gente e que, no manual do professor,estivessemexplicitadasorientaessobreastendnciasdoportugusbrasileiro, demodoaguiarotrabalhodoprofessoremsaladeaulaesuscitardiscussessobre variao lingustica15.Ainda em relao ao uso de ns e a gente, importante ressaltar que existe um uso varivel na concordncia. De forma a exemplificar esse uso, temos: acanoIntildoUltrajeaRigor,emquehfrasescomoAgentesomos inteu, que mostra o uso dea gente acompanhado da 1 pessoa do plural.Zilles (2007a) aponta para esse fenmeno, afirma, contudo, que nos dados da sua pesquisa dequatrocomunidadesdoRioGrandedoSul,essefenmenopraticamenteno ocorre na fala dos adultos. Nesse mesmo sentido, Menuzzi (2000) afirma que no h variaoentreAgentevaieAgentevamos,jqueestaltimaforma consideradaagramatical.JManzonieSantos(2011)afirmamqueemAlagoaso uso dessa variao frequente. a cano Conselho de Mulher de Adoniran Barbosa com a frase o pogressio vemdotrabaio,entoamanhcedo,nisvaitrabalhar,quemostraousode ns acompanhado da 3 pessoa do singular. DuasgramticasnormativasaModernaGramticaPortuguesa,deEvanildo Bechara(2006),eaNovaGramticadoPortugusContemporneo,deCunhaeCintra (2008) , que iremos tomar como representativas de outras gramticas, abordam a ausncia de marcas de concordncia verbal como uma falha que deve ser evitada, e a presena dessas marcas como a forma correta, que deve ser seguida, o que mostra haver estigma em relao variaodeconcordnciausadanosexemplosmencionados.Acreditamosqueabordar essa variao em sala de aula seja importante para ressaltar que existem formas distintas de concordnciaquandodousodenseagenteequeaescolhaporpartedofalantepode acarretar, ou no, estigmas. Apsaanlisesobreoquepesquisassociolingusticasafirmamemrelaoaos pronomesnseagente,naprximaseoapresentaremosaanlisedolivroNAB1eas orientaes presentes no manual do professor desse material didtico. 15 No estamos, com isso, dizendo que a responsabilidade de atualizao sobre as formas inovadoras da lngua portuguesarestrinja-seaos autores de materiais didticos, umavez queinerenteao trabalho do professor a constante atualizao e pesquisa-ao em sua rea de atuao. 442CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 4. O LIVRO NOVO AVENIDA BRASIL 1: UMA BREVE ANLISE O NAB1 a verso atualizada do livro Avenida Brasil 1: curso bsico de portugus para estrangeiros, publicado pela EPU (Editora Pedaggica e Universitria), de So Paulo. O primeiro livro, lanado em 1991, constava de 12 unidades (chamadas Lies no livro) e eraacompanhadoporumLivrodeExerccios,tambmcom12Lies,almdoLivrodo Professor, dois CDs e um Glossrio Portugus Alemo Ingls Francs Espanhol. Emrelaosdiferenasentreaprimeiraversoeaversoatualizadaest, principalmente, a reorganizao do material: o primeiro livro foi dividido em dois e o Livro deExercciospassouaintegraroLivro-Texto.Algumasdasimagensforamsubstitudas, masamaiorpartedolivrocontinuaamesma,noincorporandopossveismodificaes advindas dos estudos mais recentes da rea de Ensino de Lnguas de forma mais ampla e de Portugusdeformamaisespecfica.Aseguirapresentamosumquadrocomalgunsdos objetivos do livro. Quadro 1 Temas, Funes Comunicativas e Aspectos lingusticos Livro NAB1 (LIMA, 2008) Tpico(s)Funes comunicativa(s)Aspectos lingusticos 1. Conhecer pessoas (nomes, nacionalidades, endereo, profisso, nmeros) Cumprimentar; pedir e dar informaes pessoais, anotar recados, soletrar, despedir-se, comunicar-se em sala de aula. Verbos: presente (- ar, -er), substantivos (masculino e feminino); Pronomes possessivos (seu /sua); preposies: (em + artigo). 2. Encontros(encontros com outras pessoas, atividades de lazer, horrios). Apresentar algum, propor; convidar; perguntar as horas; comunicar-se em sala de aula. Verbos: ir, poder, ter; futuro imediato; pronomes demonstrativos. 3. Comer e beber (restaurante, bar, convites, alimentao, a mesa) Propor, pedir informaes, pedir alguma coisa; agradecer. Verbos: -er , gostar de, estar, ser; preposies: de + artigo. 4. Hotel e cidade Expressar desejos, preferncia, dvida, confirmar algo, reclamar, perguntar por localizao, direo; aconselhar, desaconselhar. Pronomes interrogativos; imperativo. A gentee ns e o seu tratamento em443 um livro didtico de portugus como lngua adicional 5. Moradia Definir; identificar coisas; expressar contentamento e descontentamento; comparar; localizar. Verbos: pretrito perfeito -ar, -er, -ir; comparao: mais, menos, to; comparativos irregulares; preposies locais. 6. Dia-a-dia Falar sobre atividades do dia-a-dia, retratando-as. Verbos: pretrito perfeito (irregulares) Pronomes oblquos o(s), a(s), lo(s), la(s) importante salientar que o livro NAB1 utilizado como livro didtico em diversas instituiesdeensinodePLAnoBrasilenoexterior,mesmosetratandodeumlivrode 1991equepassouporpoucasmodificaesnesselongoperodo.Apesardacrescente demandadoensinodePLA,principalmentesobumaperspectivadeusodalinguagem tomando-se como referncia a concepo de linguagem adotada pelo exame Celpe-Bras , so poucos os materiais didticos que se propem a abarcar as descobertas sociolingusticas mais atuais. Emrelaoaoaspectomaisespecficodestetrabalho,ousodeagenteem comparaoaousodens,percebe-sequeoslivrosdePLA,demaneirageral,aindano abordamoprimeiro.NapesquisadeRicardi(2005),porexemplo,emumaabordagem sobre as formas pronominais em outros livros didticos de PLA, a autora aponta uma baixa ocorrncia no uso de a gente nos livros analisados, afirmando que a relativamentebaixaocorrnciadeagentenoslivrosdePLEnoscausaespanto, vistoquesabidoqueessaformapronominalvemsuplantandoopronomens cada vez mais, como ficou provado em inmeras pesquisas sociolingusticas que estudaram a alternncia ns/a gente. (p.91) EmrelaoaoNAB1,percebemosqueopronomenspermeiatodoomaterial, aparecendo no livro sempre que h a conjugao de algum verbo, sendo utilizado tambm emdiferentesexercciosestruturais;nohmeno,contudo,aopronomeagenteeseus usos. Percebe-se assim, que ns considerado, no livro 1 do Novo Avenida Brasil, como a nica forma a ser ensinada, j que tampouco h qualquer referncia a a gente no manual do professor, que ser mais bem analisado na prxima seo. 5. AS ORIENTAES NO MANUAL DOS PROFESSORES DO LIVRO NAB1 Na apresentao do manual dos professores do livro NAB1, os autores afirmam que olivrodestina-seaestrangeirosdequalquernacionalidade,adolescenteseadultosque queiram aprender Portugus parapoderem comunicar-se com os brasileiros e participar de suavidacotidiana(LIMA;BERGWEILER,2009,p.3)equeoseuobjetivomaiorde levaroalunoacompreendereafalar(LIMA;BERGWEILER,2009,p.3).Emborao 444CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 manual refira-se nova edio do NAB1, os autores no mencionam se houve atualizao terico-metodolgica nas suas tarefas16. Emrelaoprimeiraliodolivro(LIMA;BERGWEILER,2009,p.25),o manual afirma que os pronomes tu e vs no esto nas tabelas de conjugao de verbos do NAB1,masqueimportantequeoprofessorserefiraaesseaspecto.Emrelaoao pronome tu, o manual afirma que seu uso limitado a algumas partes do pas e que, quando utilizado,comumqueoverbosejaconjugadona3pessoadosingular,poranalogiaa voc. J no que concerne ao uso de vs, afirma-se que esse pronome est ausente na lngua falada,eporissoasuaexclusodatabeladeconjugaoverbal(LIMA;BERGWEILER, 2009, p. 25). H tambm uma explicao sobre o uso de o senhor/ a senhora, na qual se salienta a sua importncia para referir-se a pessoas de mais idade ou que meream respeito especial (LIMA; BERGWEILER, 2009, p. 26). Nesse sentido, parece haver no manual uma preocupaocomalnguafaladaeaimportnciadelevar-seemcontaocontextoparaa comunicao. Assim, surpreende que no haja, em todo o manual, qualquer meno ao uso de a gente, com o pronome ns sendo apresentado como a nica possibilidade para referir-se primeira pessoa do plural. Emoutrostrechosdomanual,humatentativadefazerumadiferenciaoentrea norma culta e a norma-padro. Um exemplo disso a referncia que faz preferncia dos brasileirosporusarofuturoimediatoemgnerosoraisemdetrimentodofuturosimples. Apesardisso,nosoapresentadasmaioresinformaesparaoprofessorsobreoporqu dessa tendncia. Na mesma linha, ao direcionar o trabalho do professor em relao lio 6, humanotadealusodiferenaentreoqueprescritoeoqueosfalantesrealmente utilizam:aotratardousodospronomesoblquoso(s),a(s),lo(s),la(s),oguiaapontaque sonormalmentesubstitudospeloempregodeele(s),ela(s)nalinguagemquechamam no manual de popular, podendo tal substituio ser encontrada tambm na fala de pessoas cultas. Ainda em relao lio 6, o manual chamaa ateno do professor parao fato de queodilogointrodutriodalioestbaseadonarotinadeduasmulheres,Dona Conceio,empregadadomstica,eDonaCeclia,professora,oquepoderiapropiciara discusso em sala de aula sobre as diferenas de classe social no Brasil. No entanto, apesar deseremmencionadasasprincipaisdiferenasentreocotidianodasduasmulheres, sobretudo quanto ao padro de vida que elas possuem, no h uma problematizao quanto s variantes usadas por essas brasileiras, ou seja, ao tipo de linguagem que elas usam e sua condiosocioeconmica.Taldiscussopoderiasertilparasuscitarquestessobre variedadelingusticaemsaladeaula,umavezquepoderiamsercontrastadasalgumas escolhaslingusticasutilizadasporDonaCecliaque,provavelmente,noapareceriamno repertrio de Dona Conceio e vice-versa. Ao concluir a anlise desse manual, ressaltamos que no h nele referncias sobre a origem dos participantes envolvidos nagravao dos dilogos ou seja,no h meno regio de origem dos falantes , permitindo, desse modo, a idealizao de que h unicidade 16 Embora no seja o foco deste trabalho, comparamos o manual da primeira edio do Livro Novo Avenida Brasil 1 com o da edio atualizada. Constatamos que no houve mudanas significativas quanto ao construto de linguagem subjacente s tarefas em ambas as edies. A gentee ns e o seu tratamento em445 um livro didtico de portugus como lngua adicional nafaladosbrasileiros,tendoemvistaqueadiscussosobredialetosregionaisno contemplada na anlise dos dilogos orais nas tarefas do livro. Assim, parece-nos que tanto o livro NAB1 quanto o seu manual abordam de forma muito tmida as diferentes variantes do portugus brasileiro e as contribuies das pesquisas sociolingusticas.Noquesereferemaisespecificamenteaopronomeagente,embora altamentemarcadonafaladosbrasileirosdetodasasregies(conformevimos anteriormente), ainda no um aspecto considerado relevante pelos autores do NAB1, uma vez que no h, no manual do professor, nenhuma orientao sobre como abord-lo. Deformaacolaborarcomadiscussosobreousodeagenteemsaladeaula, mostraremosnaseoaseguirumatarefaquecriamosparaumnvelbsicodeportugus de acordo com a temtica da lio 3 do livro analisado. Pretendemos, assim, dar exemplos decomoaspesquisasmaisrecentesdareapodementrarnoensinodePLA,mesmoem nveis mais principiantes. 6.OQUEAGENTEFAZAGORA?:CAMINHOSPARAACONSTRUODE TAREFAS PARA ABORDAR A FORMA A GENTE EM NVEIS INICIAIS At aqui falamos sobre como a gente tem sido cada vez mais usado pelos brasileiros, mostrandoalgumaspesquisassociolingusticasqueocomprovam.Tambmelucubramos acerca das explicaes dadas pelo livro didtico NAB1 e pelo seu manual do professor para questes de variao lingustica e para a total ausncia de a gente no material.Nesta seo, mostraremos algumas possibilidades sobre como pode ser abordado em sala de aula o pronome a gente, por entender que o seu ensino seja importante para ter uma prticaquelevaemcontaousodalinguagemdosfalantesdeportugusbrasileiro.Para tanto, alm dos pressupostos tericos j aqui discutidos, levaremos em conta que: a)muitoimportanteotrabalhocomtextosautnticos17,desdeosprimeiros nveis18. b) Apr-tarefatemcomoprincipaisobjetivos:apresentarotpicodatarefa, despertandoointeressedosalunosemparticipar;promoveraexposiolngua-alvo,demodoaajudarosalunosalembrarouaaprendervocabulriotilparaa realizaodatarefa;garantirquetodososalunostenhamcompreendidooquea tarefaenvolve,quaisosseusobjetivosequaisresultadosseroproduzidosou esperados (WILLIS, 1996). c)Em nveis mais bsicos, necessrio dar mais auxlio nas tarefas, o que pode ser feito, tambm, por perguntas de mltipla escolha as quais tero por objetivo ajudar o aluno na compreenso do texto. d)Textonodeveserpretextoapesardeestarmosmostrandonesteartigocomo podeserabordadaumaquestogramatical,otextofoiescolhidoapartirdeuma temtica importante para os alunos de nvel bsico I (alimentao) e, por tratar-se de um texto autntico, acaba trazendo em si o que realmente est ocorrendo na lngua. 17 Entendemostextoautnticocomoaquelequefoidesenvolvidoparapreencherumpropsitosocialna comunidade lingustica na qual foi produzido (LITTLE; SINGLETON, 1988). 18 Para mais esclarecimentos sobre o uso de textos autnticos em nveis bsicos, ver Andrighetti (2009) 446CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 Almdisso,atemticaescolhidarecorrenteemnveisiniciaisepensamosquea tarefa aqui proposta poderia ser utilizada como um material extra nas aulas de PLA (para professores que trabalham com oNovo AvenidaBrasilI,a tarefa poderia ser utilizadanalio3,quetratasobreatemticadaalimentao).Comoaformaa gente,deacordocomomostradonodecorrerdotrabalho,maishabitualem contextosoraisoudelesderivado,nabuscapelotextoasertrabalhado, procuramosentrevistasqueabordassemalgumaspectoculinrio.Dessaforma,o uso de a gente foi encontrado. Aseguir,ento,faremosumadiscussosobretrsetapasdeumatarefaque propomos para exemplificar como o professor pode, desde nveis bsicos, abordar o uso de a gente. No pretendemos dizer que este seja o nico caminho, e, sim, uma possibilidade de abordagem. Por uma questo de espao, no abordaremos todas as etapas da tarefa, mas as que pareceram mais relevantes para a nossa discusso: a)a pr-tarefa b)a etapa relacionada ao uso de a gente c)a produo final Naprximaseo,apresentaremosastrsetapasacimamencionadas,discutindo como podem ser abordado o paradigma pronominal de primeira pessoa do plural. 6.1. A tarefa: vida gastronmica em So Paulo

Ovdeoescolhidoparacomporatarefafoiumareportagemdeumespecialdo JornaldaGlobosobreos457anosdacidadedeSoPauloquefoiaoaremjaneirode 201119.Optamosporessevdeocomofonteparaaelaboraodatarefasobreousodea gente,poisosalunos,deformageral,tminteressepelotemadareportagemvida gastronmicaeacidadedeSoPaulo.Almdisso,portermoscomoguiatemticasde interessedealunosdenvelbsico,acreditamosquetrabalharcomatemticada alimentao fosse relevante. Comrelaoaovdeo,areprtercircula,demetr,pelacidadedeSoPaulo, parando em diferentes estaes para ir a restaurantes de comidas tpicas de diversas partes do mundo. Dessa forma, vai mostrando um pouco da variedade de opes gastronmicas na cidade.Parafazeropasseio,areprtercontacomaajudadeumachefdecozinha,quea acompanhaportodoopercurso.Duranteovdeo,soapresentadasdiferentes caractersticasdecadarestaurante,assimcomoalgumasdesuaspeculiaridades.Em diferentesmomentos,somostradascomidasexticaseaexplicaosobrecomoso preparadas. H diferentes sotaques no vdeo, com pessoas de diferentes regies do Brasil e domundo.Nessesentido,acreditamosquesejaimportantearealizaodetarefas 19 O vdeo pode ser encontrado no Youtube: http://www.youtube.com/watch?v=KSxBRqkJZWA. Acesso em 28 de dezembro de 2011. A gentee ns e o seu tratamento em447 um livro didtico de portugus como lngua adicional possibilitadoras/mediadoras,poissemelasprovavelmentenohaveriaacompreensodo vdeo por alunos de nvel bsico. Parainiciarotrabalhocomovdeo,umadasformastrazeroconhecimentodo alunotona.Dessaforma,propomos,aseguir,apr-tarefa.Pensamosque,almdeuma tarefaquebusquelevaroalunoaagirnomundo,importantequehajainstruesque auxiliemoprofessoradesenvolveressatarefaemsaladeaula,dandoindicaessobre comopodemserabordadasquestesdevariao,porexemplo.Portanto,nostrechosda tarefaquemostraremosaseguir,hsempreumaindicaodecomooprofessorpoderia desenvolv-la,poisseriamaisummomentoparaqueelerefletissesobrecomoeoque ensinar. 6.1.1. Parte I : Pr-Tarefa ComopodeserobservadonoQuadro2,apr-tarefatemcomoobjetivolevaros alunos a terem noes bsicas sobre o que vir na tarefa principal e estimul-lo a interagir comseuscolegasdemodoalevantarvocabulrioquepoderauxiliarnacompreensodo vdeo.Emrelaosinstruesparaoprofessor(Quadro3),procuramosapontaralguns caminhospossveis,buscandomostrarquenohsomenteum:deacordocomonvelde conhecimentodosalunos,apr-tarefapodesermaisoumenosaprofundada,buscando sempre que sejam proporcionados novos aprendizados. A partir da discusso da pr-tarefa e da apresentao da temtica a ser trabalhada, o professor pode partir para a etapa de compreenso do vdeo. Quadro 2 Pr-tarefa 1.Voc conhece muitos restaurantes no Brasil? 2.Que tipo de comida voc j comeu aqui: a.Brasileiras: () do norte () do nordeste () do centro-oeste ( ) do sul () do sudeste b.Outras: () chinesa () grega () rabe() japonesa () indiana () italiana () alem () coreana () judaica () francesa () Outras. Quais? _____________________________________ 3.Listeosingredientesdospratosquevoccomeu.Vocpodeusaro dicionrio! 4.OquevocsabesobreacidadedeSoPaulo?Listealgunsadjetivosquea caracterizem. 448CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 Quadro 3 Orientaes para o professor sobre a pr-tarefa Professor:Utilize o momento da pr-tarefa para contextualizar o tema que ser discutido nareportagem:restaurantescomcomidasdediferenteslocaisdomundoemSoPaulo. InstigueosalunosaconversaremsobresuasexperinciasgastronmicasnoBrasil: restaurantes que j frequentaram, surpresas que tiveram por no conhecerem o vocabulrio docardpiodosrestaurantesetc.,estimulando-osaconstruremseulxicoacercadesses temas.Aideiaqueesseprimeiropassoleveemtornode15minutos.Seosalunosj estiverem bem familiarizados com o vocabulrio de restaurante, voc pode levar cardpios derestaurantesdediferentesnacionalidades,paraqueosalunosdiscutamsobreoque gostam e o que no gostam do cardpio etc. Alm disso, interessante j perguntar sobre o que os alunos conhecem sobre a cidade de So Paulo, a qual ser foco do vdeo. 6.1.2. Parte I I : Refletindo sobre a Linguagem do Vdeo Em relao parte II (Quadro 4), acreditamos que nesse momento que o professor poder sensibilizar o aluno para o uso daforma inovadoraa gentecomopronome pessoal na medida em que o uso desse pronome recorrente na fala da reprter e da pessoa que foi convidadaaparticipardareportagem.Asinstruesparaoprofessorsoapresentadasno Quadro5.importantesalientarqueasperguntasfeitasaseguir,emgrandepartede identificao de informaes, tm como objetivo que o aluno atente para a forma a gente e seus usos e tambm que tenha uma ajuda da tarefa para a compreenso do vdeo. Contudo, no seriam, em absoluto, as nicas perguntas a serem feitas sobre o vdeo, j que h muitas outrasquestesaseremexploradas.Apesardeentenderqueperguntassobreoutros aspectos devam ser feitas na tarefa, no sero aqui apresentadas por no serem o foco deste trabalho. Quadro 4 Compreenso do Vdeo VocvaiassistiraumvdeoquefalasobrediferentestiposdecomidanacidadedeSo Paulo Brasil. A reprter vai, de metr, para restaurantes. 1.Assista primeira parte do vdeo duas vezes, sem som. Responda: a)Quem vai com Marina Arajo (reprter) conhecer a cidade? _______________ b)Quais comidas voc v no incio do vdeo? a.() salame b.() coco c.() feijo d.() leite condensado e.() queijo f.() arroz g.() outras. Quais? _____________________________ A gentee ns e o seu tratamento em449 um livro didtico de portugus como lngua adicional c)Quais dessascomidas voc jexperimentou? Vocgostou? Elas so comuns no seu pas? d)Quais lugares aparecem no incio do vdeo? a.() rua movimentada b.() praa/ largo c.() barraquinha/ banquinha de comida d.() shopping e.() armazm 2.Vejanovamenteovdeo.Agoracomsom.Oquedizareprternoinciodovdeo? Complete: a.MarinaArajo:Destavez,______________________umaviagempelababel gastronmica que a cidade de So Paulo. () eu vou fazer () ns vamos fazer () voc vai fazer () a gente vai fazer b.Marina Arajo: ____________, aqui tem de tudo de diferentes culturas. () Galera () Pessoal () Gente () Ouvinte c.Marina Arajo: Quem vai guiar __________ a chefe de cozinha Letcia Massula. () a gente () gente () nos () me d.Marina Arajo: O que ___________________ hoje aqui, no Largo da Concrdia? () eu vou fazer () ns vamos comer () voc vai ver () a gente vai ver e.LetciaMassula:_____________________pelaculturabrasileira,comono poderia deixar de ser. () eu vou iniciar () ns vamos passear () voc vai comear () a gente vai comear 450CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 Quadro 5 Orientaes para o professor sobre a compreenso do vdeo Professor:Logo no incio do vdeo a reprter afirma: a gente vai fazer uma viagem pela babel gastronmica que a cidade de So Paulo. Escreva essa frase nalousa e converse com os alunos sobre os significados dela. A partir disso, oriente os alunos a lerem a tarefa 1. Tire possveis dvidas dos alunos quanto instruo do enunciado da tarefa e pea que elesassistamprimeirapartedovdeosemsom.Essaprimeiraparteobjetivareduzira ansiedadedosalunos,deformaqueelestenhamcontato,primeiramente,comaparte visual do vdeo, e, posteriormente, com o vdeoe o udio juntos. Dessa forma, eles tero maistempoparaatentarparaquestesqueseroimportantesparaacompreensooral. Dependendo do nvel dos alunos, importante incluir um breve glossrio ao lado da tarefa, com as palavras que possam gerar maior dificuldade. Passe duas vezes essa parte do vdeo, observandocomoelesrespondemtarefa.Apsconferirasrespostasdosalunos,etirar possveis dvidas, volte a ateno deles para a parte 2. O objetivo da segunda etapa levar o aluno a perceber o uso de a gente ao longo da reportagem, no discurso da reprter e da convidadaqueparticipadareportagem.Leia-acomosalunosparaqueelesnotenham dvidas em relao ao que devem considerar em sua compreenso do vdeo.Recomenda-selevaromapadaslinhasdemetrdeSoPauloparaaaulaparamostrarospontosda cidadequeareprterpercorre.Tambmrecomendasque,apsasperguntasde identificaodeinformaes,sejamproblematizadasoutrasquestesdovdeo,tambm essenciais para um maior entendimento do que nele levantado. 6.1.3. Parte I I I : Refletindo sobre o uso de a gente no vdeo Naetapa3,oprofessorteraoportunidadededebatercomosalunosquestes concernentesaescolhaslingusticasfeitaspelosfalantes(Quadro7).Aotrazertonatal discusso, os alunos tero a oportunidade de questionar o uso de a gente em detrimento de ns e de refletir sobre questes de variedade estilstica (Quadro 6), pensando na realizao situacionaledeindividualidadedodiscurso(COUPLAND,2001,ECKERT,2000),e avaliando a adequao da linguagem ao contexto de produo, isto , ao gnero discursivo, como explica Bakhtin: Nsaprendemosamoldaronossodiscursoemformasdegnerose,quando ouvimosodiscursoalheio,jadivinhamososeugneropelasprimeiraspalavras, adivinhamosumdeterminadovolume(isto,umaextensoaproximadado conjunto do discurso), uma determinada construo composicional, prevemos o fim, isto,desdeoinciotemosasensaodoconjuntododiscursoqueemseguida apenas se diferencia no processo da fala. (BAKTHIN, 2003, p. 283) Portanto,aotrabalharcomdiferentesgnerosdiscursivosemsaladeaula,o professortemmaissubsdiosparadiscutircomseusalunosquestesconcernentes variao lingustica de acordo com o gnero envolvido na comunicao. A gentee ns e o seu tratamento em451 um livro didtico de portugus como lngua adicional Quadro 6 Anlise do uso de a gente 3.Analise as frases acima e responda: a.a gente pode ser substitudo por: () eu () voc () ns 4.Gente refere-se: () ao pblico () reprter () reprter e chef de cozinha 5.Observe o verbo aps a gente. Ele normalmente fica: a.() na primeira pessoa do plural b.() na primeira pessoa do singular c.() na terceira pessoa do singular d.() na terceira pessoa do plural. 6. Converse com seu colega sobre as questes abaixo: a) Por que voc acha que a reprter utilizou a forma a gente ao invs de ns? b) Quando voc conversa com falantes de portugus voc ouve mais a forma a gente ou ns?D exemplos. c) Na sua lngua, existe esse tipo de opo ao usar os pronomes pessoais?Comente. RESUMINHO: Usamos a gente com o verbo normalmente conjugado na ___________________ em contextos parecidos com o uso de _________,Exemplos: No Brasil, a gente vai para a escola aos 5 anos. Durante a escola, a gente tem frias em janeiro. Aps os 18 anos, a gente tem que votar para presidente. A gente vai para uma festa aps a aula. Se voc quiser, pode ir com a gente. Quadro 7 Orientaes para o professor sobre a anlise do uso de a gente Professor: A terceira etapa da unidade didtica tem por objetivo levar os alunos a refletir sobre as diferenas entre o uso da forma a gente e ns. Estudos sociolingusticos apontam queousodaformainovadoraagenteestcrescendoemtodopas,emdiversosnveis socioeconmicos.Portanto,importantemostraraosalunosqueelespodemincorporar essa nova forma a seu repertrio lingustico e que eles certamente vo se deparar com ela em diversas situaes ao interagirem com falantes de portugusbrasileiro. Como a tarefa sugere,importantesalientarasquestesdeconcordnciadopronome.Aproveitepara fornecermaisexemplosaosalunosdesituaesemqueusamosagente.Dependendodo 452CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 nvel da turma, possvel aprofundar mais o seu uso, mostrando situaes nas quais se usa agenteparaindeterminarosujeitogramatical.Tambmpodeserlevantadaaquestodo estigma que muitas vezes sofrem brasileiros que usam a gente acompanhado de um verbo conjugado na primeira pessoa do plural. 6.1.4. Parte I V: Produo final: E o que a gente faz com isso? Apstrabalhar,nastarefasanteriorescomdiferentesrestaurantesdeSoPaulo focandonasuadiversidade,bemcomocomousodeagente,entendemosqueoaluno precisedeummomentoemquepossafazerusodoaprendidoparafazeralgonomundo. Acreditamosquesejaimportante,apsasetapasjdescritas,quehajaummomentode discussosobreoutrosaspectosdovdeoquetambmsorelevantesparaoentendimento doqueestavaocorrendoali(osmotivosquelevamSoPauloaser,comodizareprter uma babel gastronmica, o metr como forma de deslocamento na cidade, entre outros). Semessasetapas,ovdeoacabafuncionandosomentecomoumaferramentaparaa discusso gramatical, sem ser compreendido em relao a outros aspectos. Contudo, como nossoobjetivoaquiodesalientarcomofeitoousodalocuoagenteepossveis motivos para a escolha da reprter de us-la, no abordaremos essas necessrias etapas.Deformaaproporqueosalunosfizessemusodorecursolingusticotornadofoco na aula, bem como acerca da temtica alimentao, sugerimos a seguinte tarefa (Quadro 8) e orientaes para o professor (Quadro 9), buscando fornecer subsdios para que os alunos pudessem atuar de forma mais efetiva em contextos que assim o exigissem: Quadro 8 Produo Final Rena-secomoutrosdoiscolegas.Vocsvoaumdosrestaurantesdovdeo.Decidaqual restaurante com os colegas e depois conte para a turma. O roteiro abaixo pode ajudar! Decida: Onde? Quando? Qual comida? Conte para a turma! A gente gosta de ___________________________________________(tipo de comida) A gente vai _________________________________________________ (restaurante) A gente vai ____________________________________________________ (quando) A gente quer _______________________________________________ (qual o prato) A gente prefere ________________________________________________________ A gente ________________________________________________ (voc completa!) A gentee ns e o seu tratamento em453 um livro didtico de portugus como lngua adicional Quadro 9 Orientaes para o professor sobre a produo final Professor:Altimapartedatarefaserveparaqueoalunopossapraticardeforma contextualizadaoquefoidiscutidonasetapasanterioresemumasituaoquepoderia acontecer em um contexto extraclasse. Para tanto, oriente o trabalho dos alunos em pequenos grupos,explicitandoosobjetivosdatarefa:conversarcomogrupoacercadosrestaurantes queforamapresentadosnovdeoeescolherumdelesparavisitarcomaturma.Salientea importncia de os alunos usarem a forma a gente para marcar a primeira pessoa do plural. misterressaltarqueastarefasapresentadasnoesgotamosusosdeagente,e somente objetivam levar o aluno a um primeiro contato com essa forma e mostrar maneiras de abord-la mesmo com alunos de ainda limitado repertrio em PLA. Nesse vis, estamos de acordo com Castro da Silva (2011), que afirma ser importante trabalhar com outros usos de a gente em sala de aula como, por exemplo, uma maneira de tornar o sujeito indefinido. Apesardenotermosexploradoessesusosnastarefasdestetrabalho,acreditamosque devam tambm ter espao em contextos de ensino de PLA. 7. CONSIDERAES FINAIS Partindodeestudossociolingusticosdecunhovariacionistasobreaforma inovadora a gente no portugus brasileiro, foi possvel estabelecer alguns parmetros para o ensino do paradigma pronominal do portugus brasileiro para alunos de PLA. Como vimos nafundamentaoterica,oportugusbrasileiroestpassandoporumperodode reestruturaes lingusticas, e isso mostra que estamos caminhando para a simplificao dos pronomes pessoais, o que estaria impulsionando o uso da forma inovadora a gente. Embora as gramticas normativas doportugus brasileiro ainda no relatem essaquesto de forma sistemtica apresentando, muitas vezes, o pronome a gente apenas em notas de rodap , essencialqueoprofessorabordeesseassuntonasaladeauladePLA,umavezqueo alunosedepararcomessaformainovadoraaosecomunicarcomfalantesdeportugus brasileiro. AotomarmoscomorefernciaparaanlisenestetrabalhoolivroNAB1, procuramosmostrarqueaindahmuitoaserdiscutidoepropostoparaoensinodePLA, sobretudo em relao produo de material didtico que compartilhe da mesma viso de linguagemdoExameCelpe-Bras,ouseja,quecompreendaalnguacomoumelemento vivo, em constante mudana. A partir do trabalho com tarefas pedaggicas que fomentem a discussoacercadadiversidadelingusticapresentenoportugusbrasileiro,oalunode PLA ter oportunidade de refletir e discutir acerca da variao lingustica em sala de aula e construirconstantementeseuconhecimentoaointeragircomalnguaemcontextos autnticos de uso. 454CADERNOS DO IL, n. 44, junho de 2012 EISSN:2236-6385 REFERNCIAS ANDRIGHETTI,GrazielaHoerbe.Aelaboraodetarefasdecompreensooralparao ensinodeportuguscomolnguaadicionalemnveisiniciais.2009.196f.Dissertao (Mestrado em Letras) Instituto de Letras, UFRGS, Porto Alegre, RS. BAGNO,Marcos. Nada nalngua poracasoPorumapedagogiadavariao lingustica. 1a ed. 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From the analysis of the textbook selected, it is proposedataskfortheapproachofthepronounagenteinabasiccourseofPortugueseasanadditional language. KEYWORDS: textbook; language variation; Portuguese as an additional language.