A FRAGMENTAÇÃO DO TERRITÓRIO E O ESPAÇO PÚBLICO...

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE 2016 São Paulo BÁRBARA CAVALCANTE DE ANDRADE BARIONI A FRAGMENTAÇÃO DO TERRITÓRIO E O ESPAÇO PÚBLICO PARA O PEDESTRE NO BAIRRO DO BRÁS

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

2016São Paulo

BÁRBARA CAVALCANTE DE ANDRADE BARIONI

A FRAGMENTAÇÃODO TERRITÓRIO E OESPAÇO PÚBLICOPARA O PEDESTRE

NO BAIRRO DO BRÁS

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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

2016São Paulo

BÁRBARA CAVALCANTE DE ANDRADE BARIONI

ORIENTADORA: PROF. DRA. EUNICE HELENA SGUIZZARDI ABASCAL

A FRAGMENTAÇÃODO TERRITÓRIO E OESPAÇO PÚBLICOPARA O PEDESTRE

NO BAIRRO DO BRÁS

Dissertação apresentada ao Programade Pós Graduação em Arquitetura e

Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie para obtenção do título de

mestre em Arquitetura e Urbanismo.

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B253f Barioni, Bárbara Cavalcante de Andrade.

A Fragmentação do Território e o Espaço Público para oPedestre no Bairro do Brás / Bárbara Cavalcante de Andrade Barioni - 2016. 132 f. : il. ; 30 cm

Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2016.

Bibliografia: f. 128 – 132.

1. Ferroviária. 2. Brás. 3 Espaço público. 4. Fluxo pedestre. I. Título.

CDD 625

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de expressar meus sinceros agradecimentos a todos que contribuíram direta ou indiretamente na elaboração dessa dissertação de mestrado.

À professora Eunice Helena Sguizzardi Abascal pelo seu apoio e orientação. Na banca de qualificação, aos professores Ro-berto Righi e Carlos Eduardo Zahn pelas redefinições dos objetivos dessa dissertação.

Ao professor Carlos Andres Hernandes Arriagada que acreditou em mim quando eu mesma não acreditava.

Às amigas e colegas de turma Maria Isabel Camañes e Karina Diógenes que estiveram presentes durante esse período e contribuíram nas discussões sobre o projeto.

E à minha família, em especial ao meu querido esposo Eric Tenan Barioni, que soube pacientemente compreender minhas ausências, além do apoio, incentivo e auxilio nos diversos momentos desse trabalho.

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“A ideia de isolamento só pode ser experimentada durante o trajeto de um lugar a outro, isto é, quando

não está em lugar nenhum.”

Italo Calvino

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RESuMO

Esta pesquisa aborda a questão da fragmentação do espaço urbano ao longo de orlas ferroviárias, com ênfase no Bairro do Brás; procura-se compreender o processo de fragmentação a partir da fissura no território causada pela linha férrea, bem como as consequências de um território fragmentado para o espaço público e a limitação que essa fragmentação impõe ao pedestre. Tais questões serão discutidas à luz de um território que apresenta certas particula-ridades: o bairro do Brás.

O Brás, bairro localizado na zona leste da cidade de São Paulo, recebeu, a partir do final do século XIX, obras relacio-nadas à linha férrea que, a partir da primeira metade do século XX, veio a constituir em elemento da paisagem urbana naquele bairro, que se desenvolveria ao seu redor. O desenvolvimento urbano do Brás, por ter se dado de forma rela-cionada e definida pela ferrovia, atraiu indústrias que utilizaram da via férrea para escoar sua produção. Com a passa-gem de uma economia industrial a uma economia voltada aos serviços, o tecido urbano do bairro nas áreas lindeiras à ferrovia perdeu suas funções e se tornou descaracterizado.

A linha férrea que foi responsável pelo desenvolvimento do bairro hoje se configura como barreira e obstáculo ao fluxo pedestre, tornando-se assim responsável pela fragmentação do bairro. Por essa razão, o principal elemento existente que promove a articulação das porções divididas pela linha férrea é a estação ferroviária da CPTM – Companhia Pau-lista de Trens Metropolitanos.

Palavras chave: Orla Ferroviária, Brás, Espaço Público, Fluxo pedestre

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ABSTRACT

This research approaches the issues of urban fragmentation, the break on space made by the railroad tracks, as well as the consequences of having a fragmented public space and the limitations imposed on the pedestrians. Theses issues will be discussed based on a place which shows all these characteristics: the neighborhood called Brás.

Brás is located on the east side of São Paulo, city and state capital. It has received since the beginning of the 19th cen-tury different kinds of construction related to railroads, as to which, in the mid 20th century, had developed greatly around the neighborhood. This particular place had its development closely related to the railroad made which had attracted different kinds of industry and manufactures in order to have a better flow of their production.However, the economy changed from and industrial path to commercial and services one which has led to the mischaracterization of the tracks and the place.

Nowadays, the train station, Brás, which was key to the development of the neighborhood has become an obstacle in the pedestrian movement, turning itself into a divider of the space, the responsible of the fragmentation of the neighborhood. For such reason, it is the main element present which promotes the articulation of the portions of Brás is the train station managed by the public company, CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, Metropolitan Trains of São Paulo).

Key-words: Railroad Edge, Brás, Public Space, Pedestrian flow

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FIguRA 01 - Estação Brás em 1867. 21FIguRA 02 - Projeto de Carlos Ekman para Porteira do Brás 1914. 27FIguRA 03 - Viaduto Alberto Marino dec. 70. 28FIguRAS 4 e 5:Vista do Brás (Abril de 2016): Verticalização e adensamento. 42FIguRA 6: Porteira do Brás, década de 50 46FIguRA 7: Avenida Rangel Pestana, com a porteira do Brás aberta, déc. 60 47FIguRA 8: Vista aérea implantação do metrô Brás, década de 70. 49FIguRA 9: Porteira do Brás – 1950. 53FIguRA 10: Demonstrativo dos pontos de transposição da via férrea. 57FIguRAS 11 e 12: Dificuldade de travessia imposta ao pedestre. 59FIguRA 13: Apropriação do espaço público abaixo da linha do metrô. 60FIguRA 14: Esquema da Esfera Pública. 61FIguRA 15: Gráfico demonstrativo do uso e ocupação do solo em relação à área total objeto de estudo. 62FIguRAS 16 e 17: Área de lazer - Praça Benemérito Brás. 70FIguRA 18: Demonstrativo de verticalização. 73FIguRA 19: Gráfico demonstrativo de população em situação de rua 74FIguRA 20: Passagem abaixo do Viaduto Maestro Alberto Marino em segunda feira de manhã. 77

FIguRA 21: Passagem abaixo do Viaduto Maestro Alberto Marino em sábado de manhã. 77FIguRA 22: Passagem abaixo do Viaduto Maestro Alberto Marino em domingo de manhã. 77FIguRA 23: Praça Agente Cícero em segunda feira de manhã. 78FIguRA 24: Praça Agente Cícero em sábado de manhã. 78FIguRA 25: Praça Agente Cícero em domingo de manhã. 78FIguRA 26: Largo da Concórdia em segunda feira de manhã. 79FIguRA 27: Largo da Concórdia em sábado de manhã. 79FIguRA 28: Largo da Concórdia em domingo de manhã. 79FIguRA 29: Rua da Juta em segunda feira de manhã. 80FIguRA 30: Rua da Juta em sábado de manhã. 80FIguRA 31: Rua da Juta em domingo de manhã. 80FIguRA 32: Rua Barão de Ladário em segunda feira de manhã. 81FIguRA 33: Rua Barão de Ladário em sábado de manhã. 81FIguRA 34: Rua Barão de Ladário em domingo de manhã. 81FIguRA 35: Rua Coronel Francisco Amaro. 82FIguRA 36: Rua Coronel Francisco Amaro – Estação Brás CPTM. 82FIguRA 37: Rua Coronel Francisco Amaro – Estação Metrô. 82FIguRA 38: Rua Monsenhor de Andrade. 83

lISTA DE fIGuRAS

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FIguRA 39: Rua Gomes Cardin. 83FIguRA 40: Rua Dr. Almeida Lima. 83FIguRA 41: Rua Dr. Almeida Lima. 83FIguRA 42: Rua Monsenhor de Andrade. 85FIguRA 43: Rua Gomes Cardin. 85FIguRA 44: Rua Dr. Almeida Lima. 85FIguRA 45: Rua Dr. Almeida Lima. 85FIguRA 46: Estação Brás do Metro. 87FIguRA 47: Rua Monsenhor de Andrade. 87FIguRA 48: Rua Rodrigues dos Santos. 87FIguRA 49: Passarela Sobre Linha Férrea. 87FIguRA 50: Leito ferroviário coberto pela Avenue de France. 97FIguRA 51: Edifícios já instalados na Avenue de France. 97FIguRA 52: Área de lazer situada no setor Tolbiac. 99

FIguRA 53: Esquema elaborado pelo arquiteto Christian de Portzamparc para ilustrar as cidades da primeira e segunda eras. 100FIguRA 54: Croqui elaborado pelo arquiteto Christian de Portzamparc para Masséna Norte. 101FIguRA 55: Proposta de Masséna Norte elaborada pelo arquiteto Christian de Portzamparc. 102 FIguRA 56: Vista aérea de Masséna Norte, onde se verificam as quadras abertas. 102FIguRA 57:Áreas de circulação entre as quadras fechada. 103FIguRA 58:Áreas de circulação entre as quadras fechada. 103FIguRA 59: Parque Gleisdreieck 108FIguRA 60: Parque Gleisdreieck 108FIguRA 61: Projeto Cidade Pirelli. 115

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lISTA DE MApASMAPA 01 - Planta Imperial da Cidade de São Paulo 19MAPA 02 - Mapa de Expansão da Área Urbanizada da Região Metropolitana de São Paulo em 1872. 22MAPA 03 - Mapa de Expansão da Área Urbanizada da Região Metropolitana de São Paulo 1882 a 1914. 26MAPA 4: Lei de uso e ocupação do solo de 1972. 38MAPA 5: Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo. 39MAPA 6: Lei de Uso e Ocupação do Solo 2016. 41MAPA 7: São Paulo Railway - Ligando Santos a Jundiaí, 1935 44MAPA 8: E.F Central do Brasil - Ligando São Paulo ao Rio de Janeiro,1935 44MAPA 9: Rede de Metrô do Município de São Paulo. 50MAPA 10: Localização da orla ferroviária do Brás. 51MAPA 11: Demonstrativo da área objeto de estudo. 52MAPA 12: Demonstrativo dos pontos de transposição da via férrea. 56MAPA 13: Demonstrativo do percurso realizado para levantamento de dados. 64MAPA 14: Demonstrativo do uso e ocupação do solo. 67MAPA 15: Demonstrativo de escolas e equipamentos culturais. 71MAPA 16: Demonstrativo de adensamento populacional. 75MAPA 17: Localização de passagem abaixo do Viaduto Maestro Alberto Marino. 77MAPA 18: Localização da Praça Agente Cícero. 78MAPA 19: Localização do Largo da Concórdia. 79MAPA 20: Localização da Rua da Juta. 80

MAPA 21: Localização da Rua Barão de Ladário. 81MAPA 22: Localização da Rua Coronel Francisco Amaro. 82MAPA 23: Localização das ruas apresentadas nas figuras 37, 38, 39 e 40. 83MAPA 24: Demonstrativo das barreiras urbanas. 84MAPA 25: Localização dos Conjuntos Residenciais apresentados nas figuras 41, 42, 43 e 44. 85MAPA 26: Demonstrativo dos pontos de alagamento no bairro. 86MAPA 27: Demonstrativo de sistema viário e transporte público 90

MAPA 28: Área de intervenção do Projeto Paris Rive Gauche. 95MAPA 29: Setores da ZAC Paris Rive Gauche. 98MAPAS 30: Lehrter Stadtkwartier - Área de intervenção em 1994. 105MAPAS 31: Lehrter Stadtkwartier - Foto aérea em 2015. 105MAPAS 32: Ostbahnhof - Área de intervenção em 1994. 106MAPAS 33: Ostbahnhof - Foto aérea em 2015. 106MAPAS 34: Gleisdreieck - Área de intervenção em 1994. 107MAPAS 35: Gleisdreieck - Foto aérea em 2015. 107MAPA 36: Municipio de Santo André 110MAPAS 37: Projeto Eixo Tamanduateí, mapa de operações urbanas e parcerias executadas até o ano 2000. 113MAPA 38: Operação Urbana Lapa – Brás e sua área de abrangência. 124

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lISTA DE TAbElASTABElA 01 – População da cidade de São Paulo por distrito no periodo de 1886 a 1900. 24

TABElA 02 – População recenseada. 74

TABElA 03 – Domicílios por faixa de rendimento. 74

TABElA 04 – Crimes Registrados no Brás em 2015. 76

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lISTA DE SIGlASCPTM – Companhia Paulista de Trens Metro-politanos

DB – Deutsche Bahn

DEPAV – Departamento de Parques e Áreas Verdes

EMuRB – Empresa Municipal de urbanização

FEPASA – Ferrovia Paulista SA

gEP – grupo Executivo de Planejamento

HIS – Habitação de Interesse Social

HMP – Habitação de Mercado Popular

IBEC – International Basic Corporation

lPUOS – lei de Parcelamento, Uso e Ocupa-ção do Solo

PT – Partido dos Trabalhadores

PUB – Plano Urbanístico Básico

RFSA – Rede Ferroviária Federal SA

SAgMACS – Sociedade para Análises gráfi-cas e Mecanográficas Aplicadas aos Comple-xos Sociais

SEMAPA – Société d’Economie Mixte d’Amé-nagement de Paris

SNCF – Société Nationale des Chemins de Fer

ZAC – Zone d’Amenagement Concerté

ZC – Zona de Centralidade

ZED – Zona de Desenvolvimento Econômico 1

ZEIS – Zona Especial de Interesse Social

ZEu – Zona eixo de Estruturação e Transfor-mação Urbana

ZM – Zona Mista

ZOE – Zona de Ocupação Especial

ZuP – Zone à urbanizer en priorité

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SuMáRIO

Introdução 141. A produção do espaço urbano na cidade de São Paulo e a evolução histórica do bairro do Brás 171.1. Breve histórico do crescimento urbano do Brás: Do século XVI ao inicio do século XX 17

1.2. A legislação urbanística e a área de estudo 291.3. A estruturação viária 431.3.1. As ferrovias São Paulo Railway e Central do Brasil 431.3.2. Principais vias estruturadoras 471.3.3. O Metrô de São Paulo 49

2. O bairro do Brás: Uma análise de seu território 512.1.Delimitação da área objeto de estudo 512.2. Delimitação do problema de pesquisa: Transposições da Linha Férrea 532.3. O espaço público e o pedestre 61

2.4. Uma análise do território 622.4.1. Uso e ocupação do solo 622.4.1.1. Etapas de análise 622.4.1.2. Visita ao local 63

2.4.2. Construção das classificações 652.4.3. Análise do uso e ocupação do solo 68

2.5. Verticalização e adensamento 72

2.6. Limitações impostas ao pedestre 76

2.6.1. locais de Frequência Intermitente 77

2.6.2. Vazio permanente 82

2.6.3. Muros – Barreiras Intransponíveis 83

2.6.4. Conjuntos residenciais 85

2.6.5. Pontos de Alagamento 86

2.6.6. Iluminação pública 87

2.7. Sistema viário e transporte público 88

3. Estudos de caso de requalificação de orlas ferroviárias 91

3.1. A experiência francesa 92

3.1.1. ZAC Paris Rive gauche 94

3.2. O Caso de Berlim 104

3.3. O Eixo Tamanduateí 109

3.4. Considerações Finais do Capítulo 117

4. Recomendações para a requalificação urbana da orla

ferroviária do bairro do Brás 120

Considerações finais 126

Referencias Bibliograficas 128

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INTRODuÇÃO

O Bairro do Brás está localizado na região metropolitana de São Paulo, na zona leste do município, e teve seus primeiros registros no início do século XVIII. A partir de 1867, o bairro começou a rece-ber as primeiras obras relacionadas à linha férrea, de forma que foram estabelecidos, ao longo da orla ferroviária, armazéns, galpões e indústrias que utilizavam a ferrovia como forma de distribuição da sua produção para o mercado de todo o país. (TORRES, 1969).

Recentemente, com a passagem da economia industrial para uma economia de serviços, a estru-tura estabelecida ao longo da orla ferroviária perdeu suas funções e a ocupação industrial passou por um processo de esvaziamento. Trata-se, então, de um território que foi fragmentado e desca-racterizado, hoje possuidor de funções obsoletas e terrenos vagos.

É possível dizer que a ferrovia acarretou ao bairro uma dificuldade de transposição da linha férrea, principalmente no que diz respeito ao pedestre, que teve se servir-se de escassas passagens. Ademais, na atualidade a região padece de um descaso com a escala pedestre e com a qualidade dos espaços públicos; o que tornou o bairro fragmentado, sendo a própria estação ferroviária a melhor alternativa para interligar as porções isoladas de seu território.

De acordo com a Associação de Lojistas do Brás (2015), o bairro recebe cerca de 300 mil pessoas por dia, sendo assim considerado um importante centro de confecções e comércio têxtil de rua, por receber lojistas de todo o país que compram roupas para revender, além de servir ao consumidor final. Embora milhares de pessoas circulem pelo bairro todos os dias, não há ali uma infraestrutura de espaços públicos de qualidade para o pedestre, restando apenas calçadas estreitas que são normalmente compartilhadas com o comércio ambulante.

A qualidade do espaço público é também comprometida pela presença da linha férrea, que ora cria zonas de fronteira, caracterizadas por ruas sem saída, ora apresenta a passagem de uma por-

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ção do bairro à outra como um obstáculo, caracterizado pelas passarelas. Com o objetivo de evitar acidentes com pedestres, o recurso utilizado foi a segregação do tráfego: conduzindo o pedestre através de passarelas e construindo altos muros ao longo da via, de forma que o caminhante não tenha outra alternativa senão as passarelas. Isso significou sujeitar o pedestre a fluir por escadas localizadas em ambos os lados da travessia, o que não resolve o problema de carrinhos de bebês, cadeirantes ou bicicletas. Essa dificuldade de travessia pode ser um dos fatores responsáveis pelos diferentes tipos de desenvolvimento que cada uma dessas porções apresenta. Tais possibi-lidades são reflexões que possibilitam enunciar o problema de pesquisa que orienta esta disser-tação: quais são as causas dessa fragmentação do bairro do Brás, que a ferrovia parece ser uma das principais condicionantes? Que soluções haveria para minimizar ou combater esse estado de configuração do bairro, tendo em vista a melhoria da situação do pedestre?

Assim, a pesquisa foi dividida em três etapas: fundamentação conceitual, pesquisa de campo e análise dos dados coletados.

A partir da leitura da bibliografia fundamental e pesquisas de campo, e produção de dados primá-rios, tais como mapas e análises fotográficas, bem como um conjunto de informações e registros foi possível uma caracterização da dimensão pedestre na área objeto de estudo.

O intuito foi realizar um levantamento bibliográfico com base em material já elaborado, constitu-ído principalmente de livros e artigos científicos. Autores referenciais que foram utilizados para esse fim são: Maria Celestina Teixeira Mendes Torres que escreveu o livro “O Bairro do Brás” (1969), no qual descreve a historia do bairro do Brás; Maria Elizabet Paez Rodrigues (2006), cujo tema de dissertação de mestrado é “Radial Leste, Brás e Mooca: diretrizes para requalifi-cação urbana”; Regina Maria Prosperi Meyer e Marta Dora grostein, responsáveis pelo livro “A leste do centro – Territórios do urbanismo” (2010), que analisa projetos, problemas e potencia-lidades dos bairros localizados a leste do centro da cidade de São Paulo. Além disso, pode-se citar Candido Malta Campos Neto (2002), Nestor goulart Reis (2004), Roberto Righi (1975), Nadia Someckh (2008), entre outros, que foram essenciais para a revisão bibliografia acerca do

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levantamento das legislações urbanísticas que atuaram ao longo do recorte temporal, bem como no desenvolvimento da estrutura viária na cidade de São Paulo. Ademais, Jan gehl (2013), Jane Jacobs (2000) e Jaime Lerner (2010) auxiliaram nessa pesquisa na identificação dos problemas e potencialidades relacionados ao tratamento do espaço publico para o pedestre.

Estudos comparados de territórios que se apresentavam fragmentados, e para os quais foram pro-postos Projetos urbanos que visaram à conexão desses territórios – Projeto Eixo Tamanduatehy, em São Paulo, a ZAC Paris Rive gauche (França) e o caso da orla ferroviária de Berlim (Alemanha), possibilitaram insumos para propor suplantar as dificuldades pedestres e de espaço público veri-ficadas no Brás. A pesquisa de campo no Bairro do Brás, com o objetivo de realizar uma leitura in loco do território considerado lote a lote, manteve seus registros através de levantamento fotográfico e de observação e elaboração própria de mapas. Pretendeu-se observar, analisar e compreender as transformações ocorridas em Berlim, e na França, tomando como referência o projeto da Ope-ração urbana Paris Rive gauche. No Brasil, o projeto elaborado para o Eixo Tamanduateí, estudos de caso de orlas ferroviárias que receberam tratamento do espaço público, privilegiando a escala pedestre, bem como a verificação das melhores práticas para a elaboração e recomendações para a requalificação da área objeto de estudo, com ênfase em espaços públicos de qualidade para o pedestre.

A partir da caracterização da situação específica do Brás e sua orla ferroviária, foi realizada uma análise das possibilidades de apropriação do espaço urbano, tendo em vista a qualificação do espaço público para o pedestre. A caracterização da situação contém ilustrações e análises grá-ficas produzidas para o melhor entendimento e análise dos processos estudados.

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Capítulo 01

1. A pRODuÇÃO DO ESpAÇO uRbANO NA CIDADE DE SÃO pAulO E A EvOluÇÃO hISTóRICA DO bAIRRO DO bRáS

1.1. Breve históriCo do CresCimento urBano do Brás: do séCulo Xvi ao iniCio do séCulo XX

A cidade de São Paulo foi o primeiro núcleo urbano brasileiro estabelecido fora da orla marítima. Tinha como principal interesse estratégico o controle da rota de penetração que levava às minas de Potosí, na Bolívia (caminho do Peabiru), para assim proteger a região sul da colônia da amea-ça de invasão espanhola. Embora distante da orla marítima, à cidade de São Paulo foram aplica-dos os mesmos critérios de localização das tradicionais cidades portuguesas: a cidade alta, no caso caracterizada pela região do colégio dos padres jesuítas, se contrapunha à cidade baixa, caracterizada pelo Rio Tamanduateí e zona do mercado. (CAMPOS NETO, 2012).

O processo de colonização da cidade de São Paulo se iniciou na década de 1530, com uma expedição de Martim Afonso1 que, após uma tentativa frustrada de subir o Rio Prata, acabou por investir na ocupação da região de São Vicente, ponto estratégico na disputa entre espanhóis e portugueses. No entanto, era necessário não apenas o controle da costa, como também o cami-nho para o planalto. Por essa razão, após a ocupação de São Vicente, Martim Afonso partiu para a região de Piratininga (primeiro nome do Rio Tamanduateí), que está situada em um importante

1 Martim Afonso de Sousa (Vila Viçosa, c.1490/1500 — Lisboa, 21 de julho de 1564), foi um nobre e militar português, 1º Donatário da Capitania de São Vicente

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entroncamento do caminho indígena do Peabiru, que ligava o litoral às bacias dos rios Paraná e Paraguai, e daí ao altiplano boliviano. (CAMPOS NETO, 2012).

Martim Afonso fundou então duas vilas: São Vicente, no litoral, que se tornaria a primeira sede da capitania, e Piratininga, no planato. No entanto, nenhuma das duas foi uma escolha feliz: São Vicen-te foi rapidamente superada por Santos e Piratininga, que, por sua vez, desapareceu sem deixar vestígios, de forma que não existe consenso entre os historiadores sobre sua real localização. Pela proximidade ao Rio Tamanduateí, é possível especular que era localizada no atual bairro do Ipiran-ga, Bom Retiro, Pari, ou até mesmo o Brás. (CAMPOS NETO, 2012).

A cidade de São Paulo, por sua vez, fundada em 1554, manteve-se, durante mais de três séculos, como uma cidade sem grande expressão urbana em âmbito nacional. (ACKEL; CAMPOS NETO, 2008).

A primeira menção ao bairro do Brás data do final do século XVII, e se refere ao povoado em torno da capela erguida ao Senhor Bom Jesus do Matozinho, pelo português José Bráz. A capela se situava no “caminho que, vindo da cidade passava pela Luz e Pari, para seguir rumo à Penha” (ARROYO, apud TORRES, 1969, p. 44). Nas proximidades da capela havia uma parada para os tropeiros que circulavam por esse caminho. Tal parada foi reconhecida oficialmente somente após a elevação da capela do Brás, no ano de 1819. A capela também se tornava uma importan-te parada aos fiéis que se dirigiam em procissão, levando a imagem de Nossa Senhora da Penha de França, da capela de mesmo nome à igreja da Sé. (TORRES, 1969).

A peregrinação dos fiéis beneficiava a freguesia do Brás, pois estreitava os laços que a ligavam ao centro urbano de São Paulo. Esse caminho viria a constituir a futura principal artéria do bairro: as Avenidas Rangel Pestana e Celso garcia, eixo em torno do qual se processou o povoamento da porção oriental da cidade, unindo assim a colina histórica ao bairro da Penha. No ano de 1810, foi construída a ponte do Carmo, com a finalidade de transpor o Rio Tamanduateí, ligando a ladei-ra do Carmo ao Aterrado do Brás, atual Avenida Rangel Pestana (TORRES, 1969).

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Mapa 01 - Planta Imperial da Cidade de São Paulo 1810. FONTE: http://smdu.prefeitura.sp.gov.br/historico_demografico/1872.php. Acesso em 20 mar. 2014.

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Nesse mesmo período, a colônia ingressava no circuito do comércio mundial. Desenvolveram-se culturas de exportação lucrativas: açúcar, tabaco, algodão e café. Na cidade de São Paulo se concentravam os fluxos comerciais e as atividades administrativas (CAMPOS NETO, 2002). Com o impulso de crescimento desencadeado pelo café, surgiu a necessidade de reestrutu-ração do território, baseada na criação de canais de exportação. Esse sistema de transporte utilizaria um corredor de escoamento que desembocaria no Porto de Santos. A ligação entre a capital e o porto se intensificou na década de 1820, devido ao movimento das tropas de mulas, que já faziam suas paradas nas proximidades da capela do Senhor Bom Jesus do Matozinho.

No ano de 1836, Daniel Pedro Muller realizou o primeiro recenseamento da cidade de São Paulo, no qual constavam 659 habitantes na freguesia do Brás, sendo 328 brancos, 156 ne-gros e 175 índios. O povoamento crescia ao longo da estrada da Penha, mas problemas com o arruamento retardavam muitas vezes a legalização das datas de terra. Sem um plano geral de arruamento, as ruas do bairro se abriam de forma irregular, apresentando numa mesma rua larguras variáveis. (TORRES, 1969).

A perspectiva da construção da estrada de ferro ligando Santos à Jundiaí e passando pelo Brás foi motivo para solicitar a revogação da concessão de datas de terras, concedidas inicialmente para ocupação de chácaras. As principais motivações, para tanto, eram evitar o processo de de-sapropriação por parte da Companhia da Estrada de Ferro, assim como evitar a incerteza relativa ao traçado das vias, já que, certamente, haveria necessidade de diminuir o comprimento das ruas. Surgia com isso a questão da barreira criada pela ferrovia. Quando a Câmara reconheceu a impos-sibilidade de passagem pelas ruas cortadas pela via férrea, sugeriu à Companhia de Estrada de Ferro a abertura de uma nova via. A Companhia, por sua vez, apresentou a contraproposta de exe-cução de “tapagens” ao redor do traçado férreo. Como os moradores não concordaram com isso, a comissão de Contas sugeriu então à Câmara que algumas ruas fossem fechadas, mas que a Rua Marechal fosse aberta à circulação. Nela haviam já oito casas, propondo assim que a Companhia instalasse uma porteira para evitar acidentes. (TORRES, 1969).

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Em 1856, o Barão de Mauá recebeu concessão para construir e explorar uma estrada de ferro que ligaria o porto de Santos à cidade de Jundiaí, passando pelo bairro do Brás. Privilégio esse que con-taria logo em seguida com o capital inglês, formando assim a São Paulo Railway (CAMPOS NETO, 2002), que seguiu o eixo condutor das margens do Rio Tamanduateí. Os trilhos da São Paulo Railway foram colocados ao nível do rio, retificado no ano de 1850. A ferrovia foi responsável pela formação de uma faixa industrial, numa zona de terrenos úmidos da várzea, e por esse motivo, abandonados, no arco ao leste e ao norte do centro de São Paulo (TORRES, 1969). Esse corredor de escoamento viria a ser o nexo central do sistema de transportes, comandando o sistema de interiorização da pro-dução e canalização das exportações. A concentração do fluxo comercial sobre o eixo São Paulo-Santos teria um enorme impacto sobre o crescimento da cidade (CAMPOS NETO, 2002).

Enquanto à São Paulo Railway foi concedido o monopólio do porto santista, as demais ferrovias podiam demandar a capital, embora algumas delas sofressem ramificação a partir de Campinas ou Jundiaí. No entanto, com o advento da Sorocabana, vinda do oeste, e da Central do Brasil, vinda do leste, no ano de 1877, cuja principal estação está situada na Freguesia do Brás, a capital se tornou o principal polo de transporte do sistema. (CAMPOS NETO, 2002).

A passagem da ferrovia e a construção da Estação do Norte foram en-tão responsáveis por uma demanda por terrenos ligados à armazéns e fabricas, de forma que já no ano de 1878, ali se instalaram manufaturas de massas, moveis, funilarias, fundições e a seguir fabricas de tecidos e, como resultante, o uso residencial para operários. Dessa forma, o Brás tornou-se um dos primeiros subúrbios populares, onde se constituiu um forte e emergente mercado de imóveis para armazéns, manufaturas, ca-sas e cômodos de aluguel. (ROLNIK, 1997).

Além da inauguração das ferrovias, que tornou a cidade de São Paulo um importante entroncamento ferroviário, outro fator colaborou para o inten-so crescimento demográfico da cidade: o comprometimento da expansão FIguRA 01 - Estação Brás em 1867. FONTE: http://www.estacoesferrovia-

rias.com.br/b/fotos/braz67.jpg. Acesso em 05 abr. 2015.

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das rivais Campinas e Santos, que foram atingidas por uma epidemia de febre amarela. Como em São Paulo a ameaça era quase inexistente, aqueles que dispunham de meios foram levados a se transferir para a capital, de onde podiam ir à Santos de trem (ACKEL; CAMPOS, 2008). Em 1872 o bairro do Brás contava com aproximadamente 2.300 moradores. Já em 1886, o censo Provincial indica 6000 habitantes, havendo quase triplicado sua população em catorze anos. O bairro co-meçava então a receber um grande contingente de italianos recém chegados, e ali se instalaram muitas fabricas, atraídas pelo baixo custo dos terrenos e pela facilidade de mão de obra. Por essas razões, o Brás chegou a ser o distrito da capital mais populoso durante esse período (RIgHI, 1975).

Mapa 02 - Mapa de Expansão da Área urbanizada da Região Metropolitana de São Paulo em 1872.FONTE: Emplasa. Disponivel em: http://smdu.prefeitura.sp.gov.br/historico_demografico/img/mapas/urb-1872.jpg. Acesso em: 08 ago 2014

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Durante o governo do presidente da província João Teodoro (1872 a 1875), foram efetivadas uma séries de melhorias na cidade de São Paulo, tais como a reforma do Jardim da Luz, a regularização do Largo dos Curros (atual Praça da República), João Teodoro e Rua da Palha (atual Rua 7 de abril). Bem como houve também o alargamento das ruas do Pari, do gasômetro, do Hospício e Municipal, com a finalidade da cria-ção de um circuito viário em torno da cidade que ligasse as áreas de expansão urbana e garantisse aces-so às estações ferroviárias do Brás e da Luz (CAMPOS NETO, 2002). Esse ambicioso conjunto de obras é lembrado pelos historiadores como a “segunda fundação” de São Paulo. O objetivo de João Teodoro, explicitado em seus relatórios à Assembleia Provincial, era de “transformar a capital num polo residencial e de negócios, concentrando impulso de desenvolvimento da província e atraindo os detentores do poder econômico, até então dispersos pelo interior.” (MATTOS apud ACKEL; CAMPOS NETO, 2008, p.16).

Dando continuidade ao plano esboçado por João Teodoro, seria aberta uma avenida ligando o Ipi-ranga ao Brás, passando pela várzea do Tamanduateí, a ser saneada e drenada, passando pela rua João Teodoro e pela futura avenida Tiradentes. Para então chegar à ponte grande sobre o rio Tietê, o que prefigurava as soluções viárias circulares adotadas em futuros planos viários da cidade de São Paulo. O então Presidente da Província de São Paulo, João Alfredo Correia de Oliveira não teve opor-tunidade de dar prosseguimento à sua arrojada ideia, mas seu substituto, o Visconde de Parnaíba, deu início ao planejamento de edificações institucionais de grande porte na capital. Para tanto, dele-gou ao Engenheiro-Arquiteto Francisco de Paula Ramos de Azevedo os projetos dos prédios gêmeos das Secretarias da Agricultura e Fazenda no largo do Palácio (atual Pátio do Colégio), o Quartel da Luz, a Escola Modelo do Brás e grande parte das demais construções oficiais em São Paulo. Assim como residências particulares foram erguidas nos novos loteamentos de prestígio, destinadas aos fazendeiros, comerciantes e capitalistas que procuravam a capital, como já antecipara João Teodoro (ACKEL; CAMPOS NETO, 2008).

Nos anos de 1880 e 1890, prestigiosos loteamentos foram implantados na vertente oeste da cidade, enquanto que nas várzeas ribeiras, ao longo da estrada de ferro (Lapa, Barra Funda, Bom Retiro, Pari, Brás, Belém, Mooca e Ipiranga) instalaram-se fábricas, galpões e armazéns, juntamente a vilas ope-rárias e cortiços para abrigar a crescente população trabalhadora (ACKEL; CAMPOS NETO, 2008). A conformação geral de um parque industrial paulistano tinha como características principais peque-

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nos estabelecimentos para transformação e estocagem localizados junto ao centro de São Paulo, na região da Santa Ifigênia, Luz e Liberdade. Enquanto unidades maiores, principalmente do setor têxtil, e alguns pequenos estabelecimentos metalúrgicos e mecânicos que dependiam dos serviços urba-nos se localizavam próximos às bifurcações das estradas de ferro Central do Brasil e Santos- Jundiaí, no bairros do Brás, Mooca, Belenzinho e Tatuapé. (RIgHI, 1975).

Instalou-se no bairro do Brás, no ano de 1886, a Hospedaria dos Imigrantes, possibilitando à capital o papel de centro distribuidor de trabalhadores para todo o Estado. Embora não haja dados concretos, há indícios de que parte desses imigrantes permaneceram na cidade, onde acreditavam que as oportuni-dades de ascensão eram maiores, o que contribuiria para o rápido crescimento populacional da cidade de São Paulo. Esse crescimento foi responsável pela primeira crise habitacional da capital paulista. Nos bairros da Santa Ifigênia, Bom Retiro, Bexiga e Brás a situação encontrada era a mesma: casas para acomodar de seis a oito pessoas chegavam a abrigar de trinta a quarenta moradores (BONDUKI, 2004).

População da cidade de São Paulo por distritos (1886 - 1900)

Distritos 1872 1886 1890 1893 1900

Sé 9.213 12.821 16.395 29.518Santa Ifigênia 4.459 11.909 14.025 42.715Consolação 3.357 8.269 13.337 21.311Brás 2.308 5.998 16.807 32.387Núcleo Urbano 19.337 38.977 60.554 125.931Núcleos Isolados (Penha, N. Sra. Do Ó e São Miguel) 3.906 5.033 4.370 4.844

Total 23.243 44.030 64.934 130.775 239.820Crescimento Anual do Período 5% 11% 28% 9%

TABElA 01: População da cidade de São Paulo por distritos no período de 1886 a 1900. FONTE: BONDUKI, 2004

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Até o limiar do século XX, as propostas para planejar a cidade de São Paulo se multiplicavam, sem que o poder público assumisse um programa ou plano abrangente. Após a proclamação da República em 1889, São Paulo obteve maior autonomia no quadro político nacional, e o novo desenho político-institu-cional atribuiu ao poder municipal novas incumbências. A pavimentação das ruas, a construção de es-tradas, de pontes e viadutos, o transporte público, a iluminação e implantação de jardins – passariam à responsabilidade municipal, até então atribuída ao governo provincial (ACKEL; CAMPOS NETO, 2008).

O primeiro prefeito da cidade de São Paulo após a proclamação da República foi Antonio da Silva Prado, que se dedicou ao cargo entre os anos de 1899 e 1910. Durante sua gestão, empreendeu um programa abrangente de intervenções urbanas, transformando, no seu primeiro ano de man- dato, a Intendência de Obras em Diretoria de Obras Municipais. Essa diretoria passou a ter como diretor Victor Freire, que exerceu o cargo por 27 anos (de 1899 a 1926). Juntos, Antonio Prado e Victor Freire procuraram iniciar uma transformação decisiva no espaço da cidade, especialmente na área central. Iniciaram, então, o projeto de cunho paisagístico: remodelação do Jardim da Luz, urbanização e arborização da Avenida Tiradentes, ajardinamento da Praça da República (1902 a 1905), um novo arranjo para o Largo do Arouche, além de correção das margens do Rio Taman-duateí e da várzea do Carmo, com plantio de grama e árvores. Também deram início a interven-ções “saneadoras” na área da praça da Sé, com a demolição de dois quarteirões ocupados por usos indesejados: pequenas casas, cortiços e pontos de prostituição (CAMPOS NETO, 2002).

No entanto, para além do Tamanduateí crescia uma outra cidade, em um ritmo mais intenso do que as obras de Antonio Prado. Na zona leste, os bairros da Mooca, Brás e Belenzinho formavam um mundo à parte, subordinado aos apitos das fábricas, abrigando em cortiços ou vilas operárias a imensa população de imigrantes. O cinturão industrial crescia ocupando as várzeas, à beira de espaços de prestigio, sendo considerados enclaves incômodos, o contrário da capital que se pretendia construir. Ou seja, de um lado, os bairros industriais, a população operária e os arra-baldes populares se avolumavam à margem das políticas dominantes de intervenção urbanística, direcionado à área central e aos loteamentos da elite. (CAMPOS NETO, 2002).

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Nessa época, os bairros industriais, tais como o bairro do Brás, ficavam obrigatoriamente junto às ferrovias, que dependiam do abastecimento de carvão mineral vindo do exterior, principalmente da Inglaterra, para mover suas máquinas. Somente após a Primeira guerra Mundial (1914-1918), quando as industrias passaram por uma crise de abastecimento de carvão, passou-se a utilizar energia elétrica fornecida pela Light, substituindo a caldeira a vapor. A instalação da ferrovia em São Paulo foi então responsável por transformar a cidade em um centro industrial, no qual a base da economia já não era mais a produção agrícola. Contudo, a partir de 1922 iniciou-se a construção de rodovias, que davam fácil acesso a novas regiões e auxiliavam o escoamento da produção e a distribuição de produtos industriais. A cidade então se impunha como centro de uma imensa e rica região produtiva e sofreu uma explosão populacional. No ano de 1890, São Paulo possuía 65.000 habitantes. Três anos mais tarde, esse número havia dobrado; em 1915, a cidade possuía aproxi-madamente 500.000 habitantes e, em 1930, já contava com aproximadamente 900.000 habitantes. Tratou-se de um crescimento de aproximadamente 80%, comparável a muitas das principais cida-des da Europa (REIS FILHO, 2004).

Mapa 03 - Mapa de Expansão da Área urbanizada da Região Metropolitana de São Paulo 1882 a 1914. FONTE: Emplasa. Disponível em: http://smdu.prefeitura.sp.gov.br/historico_de-mografico/img/mapas/urb-1890-1900.jpg. Acesso em: 08 ago 2014

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A partir da análise do mapa que representa a área urbanizada no ano de 1882 e posteriormente em 1914, é possível verificar a expan-são do limite de uma região de urbanização contínua no vetor leste da cidade, flanco externo de uma fronteira que havia se expandido a partir do Brás, entre o caminho da Penha e a Estrada de Ferro. Sendo um bairro de fronteira e de grande demanda gerada pela expansão fabril do Brás, um empreendimento nessa zona, além de garantir um alto e imediato retorno do investimento, permitia que o investidor se beneficiasse da valorização futura do bairro, quando a fronteira se deslocasse para mais adiante. (ROLNIK, 1997).

Embora o desenvolvimento do bairro do Brás tenha sido forte-mente influenciado pela ferrovia, o desafio que as autoridades e a população enfrentaram no período pós guerra foi o das “porteiras da Inglêsa”, solução encontrada pela ferrovia São Paulo Railway, que instalou uma imensa porteira afim de evitar os acidentes. A prefeitura contratou o engenheiro Dr. Arthur Krug para apresentar uma solução ao problema, para que a Prefeitura oficia-se a São Paulo Railway. O relatório apresentado no ano de 1916 afirmava não ser possível a solução por uma linha subterrânea, devido à proximidade com o lençol freático, a qualidade do terreno e o alto custo de uma obra desse porte. O pior caso era o da Rua Cel-so Garcia, que permanecia com o tráfego interrompido durante grande parte do dia devido às manobras do trem. A melhor solu-ção seria uma via elevada com passagem acima do nível. A pri-meira proposta a ganhar destaque na imprensa paulistana foi do arquiteto Carlos Ekman em 1914, na qual previa a construção de um viaduto sinuoso que permitiria a circulação tanto pela avenida Rangel Pestana, como também pela própria via elevada.

FIguRA 02 - Projeto de Carlos Ekman para Porteira do Brás 1914. FONTE: http://www.saopauloantiga.com.br/as-porteiras-do-bras/. acesso em 10 abr. 2016.

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No entanto, a passagem acima do nível da ferrovia se tornaria uma realidade somente em 1949, ano em que foi inaugurado o viaduto do gasômetro. O novo viaduto, que existe até hoje, desafogou um pouco o trânsito, mas não trouxe solução aos problemas da travessia das porteiras na avenida Rangel Pestana. Esse problema foi resolvido apenas no ano de 1968, quando ocorreu a inaugura-ção do viaduto Alberto Marino. (TORRES, 1969).

FIguRA 03 - Viaduto Alberto Marino dec. 70. FONTE: http://www.saopauloantiga.com.br/as-porteiras-do-bras/. Acesso em 10 abr. 2016.

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Fica evidente que a modernização da cidade de São Paulo tinha como princípio a europeização da aparência de alguns bairros dos setores de renda média e alta, bem como a completa reconstrução do novo centro. De forma a explicitar a separação da cidade em dois cenários: um do lado oeste do Anhangabaú, onde está situada a Praça do Patriarca e a Praça da República, no qual se percebe maior preocupação com o refinamento das soluções urbanísticas. Outro, do lado leste da Praça da Sé, onde está situado o Parque Dom Pedro e o Bairro do Brás. Construído com maior simplicidade, possibilita perceber que foi estabelecida uma diferença entre os espaços urbanos em ambos os cenários; já a modernização técnica, provinda das linhas de bondes elétricos, obras de saneamento e serviços de eletricidade, foi estendida a uma boa parte dos bairros operários (REIS FILHO, 2004).

1.2. a legislação urBanístiCa e a área de estudo

As primeiras décadas do século XX foram marcadas pelos planos de Victor Freire e do urbanista francês Joseph-Antoine Bouvard para os “melhoramentos da cidade de São Paulo”. No ano de 1910, a Diretoria de Obras Municipais apresentou uma proposta intitulada “Melhoramentos do Centro da Cidade de São Paulo”, desenvolvida pelo diretor Victor Freire, juntamente com o Enge-nheiro Eugênio guilhem. Esse plano partia da premissa de que o “triângulo central” deveria ser desafogado. Pouco tempo após a apresentação do plano de Victor Freire, o governo do Estado apresentou um outro plano elaborado pelo Engenheiro Samuel das Neves, no qual se vislumbra-vam diretrizes menos atreladas à colina histórica, defendendo a implantação de uma avenida central, nos moldes da intervenções de Pereira Passos, no Rio de Janeiro. O plano de Neves al-terava dramaticamente o tratamento dado ao Vale do Anhangabaú, procurando assim preservar os interesses imobiliários atingidos pelo projeto da Prefeitura. (ACKEL; CAMPOS NETO, 2008).

Com o propósito de resolver o impasse entre o plano elaborado por Victor Freire e o plano de Samuel das Neves, a Diretoria de Obras Municipais, cujo diretor era o próprio Victor Freire, con-tratou um consultor, o engenheiro e arquiteto frances Joseph-Antoine Bouvard. Bouvard colabo-

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rava como consultor urbanístico de Buenos Aires desde 1907. O plano de Bouvard abrangia uma área maior do que aquela envolvida pelos planos da Prefeitura e do Governo do Estado. Em seus princípios, ia de encontro às posições defendidas por Victor Freire, já que propunha uma estru-tura viária radial, com avenidas partindo do centro, mas que respeitavam os contornos do relevo natural. Ademais, previa a implantação de dois parques no entorno da colina histórica, sendo um no Vale do Anhangabaú e outro na várzea do Tamanduateí. O plano foi dividido em três seções e transformado em lei pela Câmara, de forma que sua implantação fosse gradual, ao longo das décadas de 1910 e 1920. (ACKEL; CAMPOS NETO, 2008).

A partir de 1915, foi desencadeada a discussão sobre o novo Código de Obras, que se apoia- va em novos conceitos sanitários, sobre a salubridades das ocupações urbanas, priorizando a insolação e a ventilação ao invés de cubagens mínimas. No entanto, para o então Diretor de Obras Victor Freire, a ocupação paulistana, composta por casas individuais organizadas em lotes estreitos e compridos, permitiria ruas locais mais estreitas e exigiria maior proporção de terrenos livres no lote – assim, para que se garantisse a salubridade seria preciso controlar a ocupação dos terrenos e a altura dos edifícios (CAMPOS NETO, 2002). Essa nova ordem sanitária afetaria diretamente o bairro do Brás, que desde o início do século era um reduto de habitações operárias, contendo casas com acomodações para seis ou oito pessoas que abrigavam, num ambiente insalubre, até quarenta indivíduos. (BONDUKI, 2004). A exploração das possibioidades rentistas do mercado imobiliário nos bairros suburbanos representava uma das principais possibilidades de mobilidade social para imigrantes que chegavam ao país com pouco ou nenhum dinheiro. A estratégia desses imigrantes, que inicialmente moravam em cortiços, era comprar terrenos à prestação e, após pagarem o terreno, hipotecá-lo, e com o dinheiro ganho, construir pequenas casas para alugar (ROLNIK, 1997). No afã de aumentar os rendimentos desse investimento, era comum utilizar toda a área do terreno para a construção de todo tipo de alojamento, o que resultava em habitações insalubres e cortiços. Desde 1881, já se procurava a regulamentação de cortiços, mas havia uma grande demora para que as leis relativas a essa normatização fossem apreciadas pelo legislativo Provincial.

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Durante sua estadia em São Paulo, Joseph-Antoine Bouvard foi convidado a prestar consultoria a Édouard Fontaine de Laveleyer, um representante de capitais estrangeiros que buscava uma apli-cação rentável no setor de terrenos. A partir dessas consultas, nasceu a Companhia City, em 1912, que posteriormente implantou os atuais bairros do Jardim América, Pacaembu, Alto de Pinheiros, Boaçava e Alto da Lapa, destinados às classes média e alta. Nesses terrenos a Companhia City implantaria os bairros-jardim, modelo com muitas inovações do urbanismo moderno. Essas inova-ções só foram possíveis devido à revisão do Código de Obras e da Lei de Parcelamento de 1923, que não exigia mais um traçado ortogonal para as vias, e criou assim uma hierarquização das vias e traçados livres. (ACKEL; CAMPOS NETO, 2008).

Entretanto, a expansão da cidade não se baseava apenas nas orientações da Lei de Loteamento e da Companhia City. A ferrovia, bem como a oferta de energia elétrica, foram responsáveis pela implantação de indústrias e, consequentemente, pelo surgimento dos bairros operários, habitados por imigrantes e principalmente pela população trabalhadora. Acumulando-se ao longo da linha férrea, nas áreas baixas e planas da várzea dos rios Tietê e Tamanduateí, surgiram bairros como Brás, Lapa, Barra Funda, Bom Retiro, Pari, Belém, Mooca, entre outros. Dessa forma, permanecia a segregação socioespacial que foi criada anos antes: a aglomeração fabril e operária estava cen-tralizada no bairro do Brás, enquanto a “cidade oficial” se localizava na colina histórica, onde as intervenções urbanísticas eram priorizadas. A única tentativa de intermediação entre o centro e a zona leste da cidade era o projeto esboçado para o Parque Dom Pedro II. (CAMPOS NETO, 2002).

Embora contasse com o Plano Bouvard, em 1920 a Prefeitura era acusada de operar “sem pla-nos preestabelecidos”. Por essa razão, um novo plano foi encomendado a ulhôa Cintra, o que resultou em um “projeto de irradiação e expansão” apresentado à Câmara no ano de 1922, que consistia em uma estrutura de circuitos perimetrais sucessivos, apoiados em vias radiais. Ainda que a ideia tenha sido bem recebida pela Câmara, nos anos seguintes a municipalidade adiantou a execução de apenas um trecho do perímetro, que funcionaria como mais uma avenida radial. Trata-se do alargamento da ladeira do Carmo (atualmente início da Avenida Rangel Pestana), que fazia a ligação entre a colina histórica e o bairro do Brás. (CAMPOS NETO; SOMEKH, 2008).

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Entretanto, em meados da década de 1920 a cidade de São Paulo é acometida por uma crise que teria sérias consequências sobre a perspectiva de expansão. Durante a gestão do prefeito Firmiano Pinto, entre 1920 e 1926, ocorreu a chamada “Revolta Paulista de 1924”. A cidade rece-bia um grande contingente de “rebeldes” que, chefiados por Miguel Costa e Isidoro Dias Lopes, ocuparam a capital paulista por aproximadamente um mês, provocando a fuga do presidente do estado, Carlos de Campos. A cidade protagonizou intensos tiroteios com tropas federais envia-das pelo governo de Artur Bernades, com o intuito de restaurar os poderes instituídos. As forças “rebeldes” não obtiveram o apoio do povo e, ao início dos bombardeios, os paulistanos optaram por abandonar a cidade, em busca de segurança, partindo assim a cidades do interior. Fugiram principalmente dos bairros industriais, pois sua localização estratégica representava fatores favo-ráveis a uma possível tomada de posição. O Brás foi atingido por granadas e metralhadoras, de-vido a sua posição, cortado por duas importantes estradas de ferro e de sua importância econô-mica, decorrente de sua função industrial e comercial. (TORRES, 1969). Durante esse episódio, a vida industrial, comercial e institucional do município foi paralisada. A revolução era considerada uma perturbação para a vida econômica e as atividades urbanas, extrapolando assim as ques-tões meramente políticas. (CAMPOS NETO, 2002).

Restaurada a ordem, três anos após a “Revolta Paulista”, o prefeito Pires do Rio nomeou ulhôa Cintra presidente da Comissão de Melhoramentos do rio Tietê. graças a recursos da comissão, foi encomendado a Prestes Maia, engenheiro civil e arquiteto, formado pela Escola Politécnica de São Paulo, o desenvolvimento de um “plano geral” para a cidade de São Paulo. O plano foi apresentado em maio de 1930, mas nunca foi transformado em lei, pois a revolução de 1930 dissolveria a Câmara e deporia Pires do Rio e ulhôa Cintra, de forma que a comissão do Tietê perderia sua autonomia e recursos (CAMPOS NETO; SOMEKH, 2008). Após a escolha de Pres-tes Maia como prefeito da capital, seis meses após o golpe do Estado Novo, surgiria a oportuni-dade de implementação de seu plano de avenidas. No seu primeiro mandato, de 1938 a 1945, Prestes Maias deu prioridade às grandes obras viárias, no chamado Perímetro de Irradiação, composto pelas avenidas Senador Queiroz, Ipiranga, São luis, além dos viadutos Nove de Ju-lho, Jacareí, Dona Paulina, a Praça Clóvis Bevilacqua (atualmente integrada à Praça da Sé), o

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alargamento da Avenida Rangel Pestana e a Avenida Mercúrio. Essas obras atingiram também algumas vias radiais, sendo elas os túneis da Avenida Nove de Julho, as avenidas Liberdade, Cásper Líbero, Rio Branco, as ruas Barão de Limeira, Major Diogo, assim como o início do “sis-tema Y” (Avenida Prestes Maia, pistas do Vale do Anhangabaú e a Ponte das Bandeiras) e a segunda perimetral (Avenida Duque de Caxias e Rua Amaral gurgel). (CAMPOS NETO, 2002).

Faltava então, para que fosse obtida a conclusão da estrutura viária e de transportes do Plano de Avenidas, algumas radias principais e secundárias (como a Radial Leste), a conclusão do chama-do “sistema Y” (com a Avenida Itororó, atual 23 de Maio) e do segundo circuito perimetral (que seria redesenhado na década de 1950). Faltavam também a criação do terceiro perímetro (marginais dos Rio Tietê e Pinheiros, Avenida dos Bandeirantes e Tatuapé), a transferência das linhas ferroviárias para a margem direita do rio Tietê, que jamais aconteceu, e também o sistema de transporte base-ado em ônibus, que se firmou definitivamente em 1945 (CAMPOS NETO; SOMEKH, 2008).

Para a implantação do Plano de Avenidas, Prestes Maia utilizava como instrumento a lei Muni- cipal 2.611, de 1923, assim como para a abertura dos loteamentos da Companhia City; essa lei regulava a abertura de novos loteamentos em São Paulo e criava a hierarquização das vias. Prestes Maias, todavia, tendia a minimizar a importância da lei de Parcelamento, Uso e Ocu-pação do Solo, propondo integrá-lo ao seu sistema viário e estabelecer áreas de verticalização terciária junto ao perímetro de irradiação e trechos inicias das radiais. Bem como previa a ver-ticalização residencial no prolongamento dessas perimetrais, comércio local nas vias coletoras e bairros residências nos vãos da malha, assumindo um caráter de unidades de vizinhança (CAMPOS NETO; SOMEKH, 2008). Devido à sua função comercial e industrial, o bairro do Brás não sofreu alterações em relação ao adensamento populacional proporcionado pelo Plano de Avenidas. Com isso, o alargamento da Avenida Rangel Pestana fez com que esta fosse consi-derada a principal radial do vetor leste, e sua maior contribuição ao bairro.

A partir da década de 1950, a preocupação da prefeitura se voltou à criação de parâmetros que dessem suporte ao crescimento populacional que a cidade enfrentava. Na década de

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1940, a população de São Paulo havia ultrapassado a marca dos dois milhões de habitantes. O então prefeito lineu Prestes encomendou um estudo a uma entidade de consultoria técnica a países em desenvolvimento, a IBEC (International Basic Economy Corporation), que já ha-via elaborado um trabalho semelhante para a cidade de Caracas e era presidida por Nelson Rockfeller. Esse estudo tinha como objetivo coordenar uma intervenção urbanística municipal que abordasse as diferentes posições, de forma a conciliar o crescimento da cidade com a adequação de infraestrutura, principalmente na área dos transportes. A direção do estudo foi confiada ao engenheiro e advogado nova-iorquino Robert Moses, que estava à frente das prin-cipais iniciativas e equipamentos urbanos realizados em Nova Iorque durante as décadas de 1930 e 1960. Ao contrário do Plano de Avenidas, o plano elaborado por Moses esboçava uma organização setorial. Assim, considerava as noções de zoneamento, sistema viário, saneamen-to e áreas verdes, compondo um conjunto de recomendações que, embora não fizessem parte de um plano urbanístico, contribuiu para orientar a intervenção municipal. As indicações do Re-latório Moses influenciaram o bairro do Brás em relação à qualidade ambiental e urbana, pois apresentavam recomendações sobre praças e parques, considerando pequena a desativação de 10% das glebas a lotear para áreas verdes, e questionando sua localização, geralmente em ilhas do sistema viário. (RODRIguES, 2006).

No ano de 1949, um projeto de Lei de uso e Ocupação do Solo foi executado pelo Departamento de urbanismo da Prefeitura de São Paulo, mas foi barrado ao chegar à instância legislativa. O mesmo se sucedeu com outras duas novas versões do zoneamento, surgidas em 1952 e 1955. Ao mesmo tempo, o crescimento urbano à margem da lei passou a ser objeto de anistias periódicas. Nos anos de 1953, 1955, 1962 e 1968 as ruas dos loteamentos clandestinos foram oficializadas em massa, ao passo que os serviços urbanos e de infraestrutura eram gradualmente estendidos à periferia. (CAMPOS; SOMEKH, 2008).

Com a derrota dos projetos de lei do Plano Diretor e de um zoneamento abrangente, os técnicos induziram a Prefeitura a legislar por decreto, promovendo a partir de 1954 a extensão do Artigo 40 do Código de Obras, que definia vias estritamente residenciais a diversos bairros de classe alta.

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No lugar da monufuncionalidade do Artigo 40, adotou-se o princípio de unidade de vizinhança, dis-tribuindo residências unifamiliares, prédios de apartamento, comércio e serviços de âmbito local.

Diante da ausência de um zoneamento abrangente, nos bairros operários, a exemplo do distrito do Brás, o fator de ordenação espacial foi a ferrovia. Nestes bairros, as atividades industriais se mescla-riam aos núcleos terciários e habitações operárias, com uma organização orientada principalmente por fatores inerentes à ferrovia, assim como as áreas de proximidade às estações apresentam, até os dias de hoje, vocação de polarização de atividades. No segmento de mercado imobiliário, nesses bair-ros atuava um outro tipo de investidor, que associava investimentos para a instalação de uma indústria ao desenvolvimento imobiliário da região em questão. Foi esse o caso de Antonio Álvares Penteado, que construiu, no ano de 1889, na rua Flórida, no Brás, a Fábrica de Tecidos de Aninhagem, que ocu-pava 12.000 metros quadrados e em 1900 empregava cerca de 800 operários. Nas proximidades da fábrica foram construídas casas e vilas de aluguel para operários e empregados de estabelecimentos comerciais, que se envolviam na abertura de novas ruas. O objetivo das indústrias ao edificar vilas era obter renda do capital empregado na compra dos terrenos e diversificar seu investimento na cidade, ou ainda garantir a presença permanente de certos funcionários (ROLNIK, 1997).

Entre 1955 e 1957 foram aprovadas as primeiras leis abrangentes, independentes do código de obras, que adotavam alguns padrões modernos de zoneamento. No ano de 1955, a Lei de Ruídos limitou zonas estritamente residenciais, industriais e uma zona central, tendo como base o argumento de evitar o incômodo do barulho, e assim estipulando os usos incômodos que não poderiam se instalar em cada uma das zonas. Já a lei aprovada em 1957 tinha como base a pro-posta de Anhaia Mello, desenvolvida em conjunto à Comissão Orientadora do Plano da Cidade de 1954. Tal lei estabelecia um coeficiente máximo de aproveitamento, padronizado para todo o município, equivalente a quatro vezes a área do lote para edifícios residências e seis vezes a área do lote para usos comerciais e de serviços, de forma que fosse substituído o antigo controle de alturas em função da largura da rua. Até 1966, várias manobras foram utilizadas para burlar os coeficientes, até que o coeficiente seis foi aprovado para todos os usos. Nesse intervalo, a cidade de São Paulo continuou sem um plano diretor. (CAMPOS NETO; SOMEKH, 2008).

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Além de não ter havido o estabelecimento prévio de uma forma especifica de uso e ocupação, nos bairros operários, como Brás e Bom Retiro, não eram proibidos usos que não eram permiti-dos em outras regiões da cidade, como o Triângulo Central. A zona suburbana ganhava, assim, como atributo, o oposto à zona residencial exclusiva. O interesse dos investimentos estava na possibilidade de mescla de usos, o que, além das possibilidades geradas pela ferrovia, abria oportunidades imobiliárias aos pequenos e grandes investidores (ROLNIK, 1997).

Nos anos seguintes, as ideias de Padre lebret e da SAGMACS (Sociedade para Análises Grá-ficas e Mecanográficas Aplicadas aos Complexos Sociais) representaram uma alternativa cen-trada nas necessidades do homem, conciliando desenvolvimento econômico e bem estar social. Essas ideias, assim, influenciaram o pensamento de acadêmicos e profissionais. Os esforços de Lebret em São Paulo corresponderam a uma primeira tentativa de se implantar um planejamento urbano democrático que procurasse combinar bases científicas a princípios e valores éticos. Seu estudo, publicado em 1958, não foi consolidado como base para um plano diretor, mas teve grande importância nas concepções subsequentes de planejamento urbano.

O plano seguinte foi elaborado durante o governo autoritário de Faria Lima (1965 a 1969), que, através da criação do gEP (grupo Executivo de Planejamento), transferiu o planejamento urbano diretamente ao Gabinete do Prefeito do Município de São Paulo, desvinculando do Departamento de Urbanismo. O PUB (Plano Urbanístico Básico) foi concebido como o Plano Diretor que faltava para São Paulo e deveria orientar o crescimento da cidade até 1990, priorizando os transportes coletivos, melhorias nas condições de moradia, serviços e equipamentos, ampliação da oferta de serviços urbanos, in-tegração de imigrantes e indivíduos marginalizados, ampliação das oportunidades de participação da comunidade, bem como aumento no número de empregos por meio de estímulos às atividades econômicas, reconhecendo a necessidade de tratar problemas em escala metropolitana. Estabele-cia, assim, diretrizes quanto a: usos e ocupação do solo, através de densidade e zoneamento; inter-venção do poder público no mercado fundiário urbano, através de compra de terrenos que seriam beneficiados por futuros investimentos públicos; descentralização de serviços e equipamentos; trans-porte coletivo em detrimento do individual; criação de um sistema de planejamento e participação da população na elaboração do plano.

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Os trabalhos desenvolvidos no PUB não tiveram continuidade com o fim da gestão Faria Lima. Em 1970, foi escolhido pela Assembleia Legislativa um novo governador, Laudo Natel, que tomou posse no início de 1971 e elegeu como prefeito da cidade de São Paulo José Carlos de Figueiredo Ferraz, engenheiro e defensor do controle de crescimento urbano. No ano de 1971, por meio da lei 7.670, criou-se a EMuRB (Empresa de urbanização), com a finalidade de desenvolver projetos urbanos para a cidade de São Paulo. Com a implantação da Companhia do Metrô e suas obras, também se fez necessária a criação de leis municipais para atender às demandas urbanísticas que essa implantação acarretaria, tendo como principais instrumentos o Plano Diretor de Desen-volvimento Integrado (1971) e a legislação de Zoneamento (1972). A Lei de Zoneamento procurou seguir as tendência de ocupação existentes, sobretudo na área central (CAMPOS NETO, 2008).

A Lei de uso e Ocupação do Solo de 1972 estipulou para o bairro do Brás o uso misto definido como Z4 e uma área de Z6 de uso predominantemente industrial. As zonas identificadas como Z2 e Z3 têm pouca representatividade, pois embora viabilizassem a verticalização nos limites máximos permitidos pela lei, não suscitaram o interesse de investidores imobiliários (FElDMAN, 2005), pois o parcelamento na região já era uma realidade difícil de alterar, tratando-se de um tecido urbano totalmente consolidado. (RODRIguES, 2006). Presume-se que os subdistritos defi-nidos como Z4, juntamente às Z5, receberiam os terminais ou principais estações da embrionária rede de metrô.

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A Lei de Zoneamento de 1972 perdurou du- rante muitos anos. Embora a proposta de 1988 apresentasse um caráter liberal e o plano apresentado no ano de 1991 fosse mais ino-vador ou moderno, nenhuma proposta obteve sucesso ao tentar mudar sua essência. A par-tir das diretrizes do novo Plano Diretor Estraté-gico de São Paulo, aprovado em 2002 (Lei nº 13.430 , de 13 de setembro de 2002), dos ins-trumentos do Estatuto da Cidade (lei Federal 10.257 de 2001) e da aprovação dos Planos Diretores Regionais. Estes foram elaborados para as Subprefeituras, então foi promulga-da em 2004, sob a gestão da então prefeita Martha Suplicy, uma revisão da Lei de 1972, a nova lei de uso e Ocupação do Solo para o município - lei nº 13.885, de 25 de agosto de 2004 (MASCARENHAS, 2014), que estabele-cia que cada subprefeitura deveria apresentar um Plano Regional Estratégico.

Ao bairro do Brás foram definidos dois usos principais: ZM (Zona Mista), porções do território destinadas a usos residenciais e não residen-ciais; e ZCP - Zonas de Centralidade Polar, por-ções do território da zona mista destinadas a ati-vidades típicas de áreas centrais ou subcentros regionais, caracterizadas pela coexistência en-tre os usos não residenciais e a habitação, mas com predominância de usos não residenciais.

MAPA 4: Lei de uso e ocupação do solo de 1972. FONTE: Mapa elaborado pela autora, sobre Mapa Digital da Cidade (MDC) com dados de FElDMAN, 2005.

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MAPA 5: Lei de Uso e Ocupação do Solo 2016. FONTE: Prefeitura de São Paulo.

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Novos Rumos do deseNvolvimeNto uRbaNo do bRás

O Novo PDE (Plano Diretor Estratégico lei 16.050/2014), aprovado no ano de 2014, e a lPUOS (lei de Parcelamento, uso e Ocupação do Solo, LPuOS LEI Nº 16.402, DE 22 DE MARÇO DE 2016).), aprovada em fevereiro de 2016, devem garantir, juntos, as transformações da cidade para os próximos 16 anos.

O PDE identifica como território estratégico para estruturação dinâmica a orla ferroviária, pois esta concentra atividades econômicas e espaços produtivos em processo de transformação. Esses ter-ritórios deverão ser objeto de projetos urbanos que orientem propostas de alteração do padrão de urbanização, com o objetivo de equilibrar a distribuição de moradia e emprego e renovar os usos do seu parque fabril, pretendendo, assim, melhores condições de vida urbana. O principal objetivo são as transformações estruturais orientadas ao maior aproveitamento da terra urbana com o au-mento nas densidades construtiva e demográfica e implantação de novas atividades econômicas de dimensões metropolitana, atendendo a critérios de sustentabilidade e garantindo a proteção do patrimônio arquitetônico e cultural, em especial o ferroviário e o industrial. (SÃO PAuLO (SP) LEI Nº 16.402, DE 22 DE MARÇO DE 2016).

A LPuOS estabelece para o bairro do Brás uma ZEu (Zona Eixo de Estruturação e Transformação urbana), onde o objetivo é a promoção do adensamento construtivo, populacional, de atividades econômicas e de serviços públicos, além da diversificação de atividades e a qualificação paisa-gística dos espaços públicos de forma a adequar o uso do solo à oferta de transporte público co-letivo; além disso, foram estabelecidas ZCs (Zonas de Centralidade), ZMs (Zonas Mistas), ZEIS 3 (Zona Especial de Interesse social), ZDE (Zona de Desenvolvimento Econômico 1) e ZOE (Zona de Ocupação Especial), que são áreas onde o objetivo é a manutenção de usos não residenciais exis-tentes, bem como o fomento às atividades produtivas, a diversificação de usos ou o adensamento populacional moderado, a depender das diferentes localidades que constituem estes territórios. (SÃO PAuLO (SP) LEI Nº 16.402, DE 22 DE MARÇO DE 2016).

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MAPA 6: Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo 2016. FONTE: Prefeitura de São Paulo

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Na prática, o que se pretende para a região é o aumento populacional no distrito que já pos-sui uma infraestrutura de transporte consolida-do, criando mecanismos que permitam que os empreendimento imobiliários se estabeleçam à margem da ferrovia e metrovia, bem como a ma-nutenção dos usos residenciais existentes.

O incentivo ao aumento nas densidades cons- trutivas influenciou o bairro desde a aprovação do PDE, no ano de 2014. Com o aumento da densidade construtiva, a tendência é a altera-ção paulatina da paisagem do bairro, que mo- dificaria assim o baixo gabarito existente. A verticalização já pode ser percebida com a mu- dança gradual de sua paisagem, que recebeu, em 2014 e 2015, empreendimentos imobiliários de grande porte.

FIguRAS 4 e 5:Vista do Brás (Abril de 2016): Verticalização e adensamento. FONTE: Autora, em 8 de abr. de 2016.

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1.3. a estruturação viária

1.3.1. as feRRovias são Paulo Railway e CeNtRal do bRasil

O desenvolvimento do distrito do Brás, bem como o da cidade de São Paulo, está intimamente ligado à evolução da cultura cafeeira e à expansão do transporte ferroviário. A cultura do café foi responsável pela ocupação de toda a região centro-oeste da província e também pela consolida-ção do transporte ferroviário, que substituiu o transporte movido a tração animal na ligação entre os centros produtores e o porto de Santos. (KuHL, 1998). Antes da industrialização, a tendência de escolhas de sítios às margens da ferrovia já existia, apesar das várzeas. Isso se explica pelo poder indutor de crescimento urbano dessas áreas, o que se confirmou posteriormente, com a chegada da indústria. (LANgENBuCH, 1968).

As primeiras aglomerações urbanas do bairro do Brás surgiram antes do estabelecimento da fer-rovia, em meados do século XVIII. No ano de 1855 foi assinado um contrato para a criação da Companhia de Estrada de Ferro D. Pedro II. Deveria ser construída uma linha de dois ramais que ligaria o Rio de Janeiro a São Paulo e a Minas gerais. Posteriormente, transformar-se-ia na Estrada de Ferro Central do Brasil. No mesmo ano, na Província de São Paulo seria sancionada uma lei re-ferente às ferrovias, que concederia à empresa Aguiar, Viúva, Filhos & Cia. e à Platt & Reid o direito à construção de uma estrada de ferro que ligaria porto de Santos à cidade de Jundiaí, que seria posteriormente chamada São Paulo Railway. uma vez aprovadas, essas duas leis criaram condi-ções para o estabelecimento efetivo da primeira ferrovia de São Paulo. A construção da linha férrea pela São Paulo Railway foi iniciada em novembro de 1860, sendo inaugurada em 16 de fevereiro de 1867. Na época da inauguração oficial, as estações que pertenciam a essa linha eram: Santos, Cubatão, Raiz da Serra, Alto da Serra (Paranapiacaba), Rio grande, Santo André, Brás, São Paulo, Água Branca, Perus, Francisco Morato e Jundiaí. (KuHL, 1998).

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Uma vez que o tecido urbano se formava ao redor da orla fer-roviária e da área próxima ao Rio Tamanduateí, era inevitável a conformação da linha férrea como uma barreira urbana em rela-ção à ligação entre os bairros formados limitrofes a linha, cuja úni-ca alternativa de ligação eram as porteiras existentes na época. (RODRIguES, 2006).

A partir de 1914 o sistema ferroviário começou a ser prejudicado pelas dificuldades de importação, mostrando-se praticamente es-tagnado e sem grandes possibilidades de expansão, além da falta de planejamento, previsão ou coordenação das atividades do setor ferroviário. Dessa forma, a única opção viável foi a ampliação do sistema rodoviário que, a partir de 1930, recebia investimentos ma-ciços. (REIS FILHO, 2004).

A estação do Brás, datada de 1865, era uma construção simples, retangular, feita à base de tijolos. O edifício atual data de 1897 e atualmente se encontra integrado ao conjunto formado pela Es-tação Roosevelt, que atendia às duas ferrovias (Central do Brasil e São Paulo Railway) e foi integrada a Estação de Metrô Brás, já que ambas se encontram no bairro do Brás. A entrada principal da Central do Brasil se localizava na área que hoje corresponde ao Largo da Concórdia. A entrada da São Paulo Railway se localizava na área onde hoje abrange o metrô Brás.

O conjunto conta ainda com passarelas para pedestres, construí-das em estrutura metálica, que passam horizontalmente sobre os trilhos, sendo duas entre as estações Mooca e Brás e uma entre a Estação Brás e a Estação luz.

MAPA 8: E.F Central do Brasil - Ligando São Paulo ao Rio de Janeiro,1935FONTE: http://www.estacoesferroviarias.com.br/b/braz.htm. Acesso em 20 mai. 2015

MAPA 7: São Paulo Railway - Ligando Santos a Jundiaí, 1935FONTE: http://www.estacoesferroviarias.com.br/b/braz.htm. Acesso em 20 mai. 2015

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Entre 1939 e 1965, a estação Roosevelt viu triplicar o número de viagens de trens suburbanos par-tindo dessa estação em direção à linha tronco; esse número foi quintuplicado no que diz respeito a viagens em direção à variante de Poá. Tal fenômeno sinaliza um forte crescimento da demanda por parte dos novos habitantes da cidade, migrantes que têm como única opção morar nas crescentes periferias, mesmo que trabalhem em bairros mais centrais. (RODRIguES, 2006).

Apesar da ferrovia ser um sistema viário indutor do crescimento urbano, ela não foi capaz de acompanhar o ritmo de desenvolvimento da cidade de São Paulo. Os trens de subúrbio passam a viajar com superlotação nos horários de pico, e os passageiros passaram gradativamente a viajar de ônibus. (LANgENBuCH, 1968). Não tendo condições de rivalizar com as rodovias, mui-tas das linhas ferroviárias do Estado de São Paulo se tornaram obsoletas. Algumas linhas ferro-viárias até mesmo obstruíram a evolução de regiões cujo desenvolvimento havia ocorrido graças às ferrovias. Com o fim do privilégio de exploração das estradas de ferro pelas suas empresas fundadoras, cujo contrato normal era de 90 anos, o Estado passou a assumir gradativamente esse sistema de transporte, em decadência desde as décadas de 1940 e 1950. No ano de 1946, o governo Federal assume as linhas da São Paulo Railway, que passa a ser administrada pela RFSA (Rede Ferroviária Federal S.A.), empresa vinculada ao Ministério dos Transportes. Em 1971, o Governo do Estado criou a FEPASA (Ferrovia Paulista S.A.), incorporando assim as cinco Com-panhias operantes no Estado: a Estrada de Ferro Sorocabana, a Companhia Paulista de Estradas de Ferro, a Companhia Mogiana, a Estrada de Ferro de Araraquara e a Estrada de Ferro de São Paulo e Minas. O propósito era de unificar a rede de transportes ferroviários dentro do Estado de São Paulo e modernizar sua estrutura. Posteriormente, a CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) assumiria a parte da rede da RFFSA localizada dentro da região metropolitana de São Paulo. (KuHL, 1998).

O processo de urbanização que se desenvolveu no âmbito da ferrovia apresentou uma estrutura-ção funcional precoce que precede e se sujeita à implantação do sistema viário, o que pode ser explicado pelo desprezo anterior pela urbanização das várzeas, que só é motivada por outras van-tagens locacionais. A ferrovia, no caso, foi responsável pela ordenação do espaço urbano, orien-

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tando a implantação das indústrias e instituindo nucleações suburbanas, como no caso do Brás. (RIgHI, 1975). Posteriormente, a ferrovia foi responsável pela obstrução da evolução do bairro, devido à barreira criada pela ferrovia e às porteiras da mesma, que dificultariam a ligação entre o centro da cidade e o eixo leste.

FIguRA 6: Porteira do Brás, década de 50

FONTE: http://www.saopau-loantiga.com.br/as-porteiras-do-bras/. Acesso em 10 abr. 2016.

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1.3.2. PRiNCiPais vias estRutuRadoRas

As estradas da província de São Paulo eram, no geral bastante precárias, com escassos tre-chos calçados. Ainda assim, a circulação nunca foi interrompida, pois seu uso era intenso e aumentava à medida em que a cidade crescia. Além da circulação, as estradas também tiveram papel importante no povoamento. Dentre as estradas mais importantes até o advento ferroviário está a Rua do Brás, atual Avenida Rangel Pestana, que demandava ao Rio de Ja-neiro, passando pela freguesia do Brás, Penha e pela Vila de Mogi das Cruzes. A estrada que levava ao Rio de Janeiro contava com duas paradas, uma no Brás e outra na Penha. Além do pouso das tropas, a estrada São Pau-lo-Rio contava com o albergue e esta-belecimento comercial de José Braz, português radicado no ano de 1730. (LANgENBuCH, 1968).

A expansão urbana determinou a am-pliação no serviço de transportes cole-tivos por meio de bondes, iniciado no início do século XIX. A instalação das linhas obedeceu então ao leito das ra-diais históricas, comunicando a área central aos bairros de classe alta e conferindo acessibilidade a áreas que passavam a ser ocupadas pela classe média emergente. (RIgHI, 1975). Em 1901, o Brás já possuía bondes elétri-cos que circulavam pela antiga Ave-nida Intendência, atual Avenida Celso

FIguRA 7: Avenida Rangel Pestana, com a porteira do Brás aberta, déc. 60

FONTE: http://www.saopauloantiga.com.br/as-porteiras-do-bras/. Acesso em 10 abr. 2016.

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garcia, e pela Avenida Rangel Pestana. Tratava-se de uma das principais linhas de bonde do lado leste da cidade: as linhas 6 e 7 Penha-Praça Clovis passando pela Avenida Rangel Pesta-na e Celso garcia. Em 1914, o trajeto já atendia de forma confortável aos habitantes do bairro do Brás e Mooca, considerando-se trajetos intra-urbanos e trajetos até o centro histórico da cidade. (RODRIguES, 2006). O sistema de bondes desapareceria oficialmente no ano de 1957, dando lugar ao sistema de ônibus sobre rodas.

Para além da ferrovia, que centralizou o crescimento urbano ao longo das linhas, a implantação da Avenida Radial Leste atuou como uma ligação entre os bairros do Brás e Mooca, que alterou o traça-do viário. Consequentemente, alterou-se o tecido urbano consolidado anterior à sua construção de forma radical, sendo assim responsável por um segundo grau de intervenção viária para o bairro do Brás. Essa avenida já fazia parte do Estudo do Plano de Avenidas de Francisco Prestes Maia e tinha como finalidade promover a ligação entre o bairro e o centro, no sentido leste-oeste da cidade de São Paulo. (RODRIguES, 2006).

Um outro elemento que alterou a dinâmica viária da região e funcionou como barreira foi a “porteira da Inglêsa”. Embora um estudo sobre a questão tenha sido encomendado no ano de 1916, somente em 1968 o trânsito na região do Brás somente viria a melhorar de fato quan-do antigos planos urbanísticos foram colocados em prática. A Radial leste desviava parte do transito, diminuindo o tráfego das Avenidas Rangel Pestana e Celso garcia para os lados do Bairro da Mooca. A Avenida Celso garcia já se configurava uma importante artéria de grande movimentação, mas passava grande parte do dia fechada pelas porteiras, nem sempre para a passagem dos trens, mas para manobras de trens vazios. A solução apresentada era uma via elevada. A situação apresentou relativa melhoria com a implantação do Viaduto do gasômetro, que ligou a Rua do gasômetro ao Largo da Concórdia, desafogando parte do trânsito da Ave-nida Rangel Pestana. O problema da porteira do Brás foi solucionado no ano de 1968 com a construção do Viaduto Alberto Marino, construído em oito meses, sobre o trilho da Estrada de Ferro Santos Jundiaí. (TORRES, 1969).

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1.3.3. o metRô de são Paulo

O Plano urbanístico Básico (PuB) elaborado durante o governo do prefeito Faria Lima (1965 a 1969) previa a construção de 815 km de vias expressas, formando uma malha ortogonal, que co-briria toda a área urbanizada da cidade. Além disso, previa uma ampla rede de 450km de linhas de metrô, sendo 187 km destes ao longo das faixas de ferrovia. Previa por fim a construção de uma rodoviária principal à margem do Tietê e outras rodoviárias secundárias nos centros sub-regionais. (CAMPOS NETO; SOMEKH, 2008).

Após inúmeras propostas para a implantação do Metrô em São Paulo, no ano de 1968 é aprovado o estudo encomendado ao consorcio alemão HMD (Hochtief-Montreal-Deconsult). O plano consi-derava a integração à estrutura ferroviária existente, mantendo a estrutura viária rádioconcêntrica da cidade e privilegiando a área central, na tentativa de minimizar as desapropriações para implantação das linhas e estações. A primeira linha implantada foi a Linha Norte-Sul, quase toda subterrânea, o que tornou sua execução custosa e lenta, de forma que a inauguração se deu em 1974. Com a finalidade de minimizar o impacto dos altos cus-tos do metrô subterrâneo, uma nova rede básica seria proposta em 1975, reforçando assim o aproveitamento do sistema ferroviário. Foi então que, na administração de Olavo Setúbal (1975 a 1979), ocor-reu a implantação da linha Leste-Oeste do Metrô, toda em superfície, aproveitando a faixa paralela aos trens da antiga Central do Brasil. (ZIONI, 2008). O primeiro trecho da linha foi inaugurado no ano de 1981 e o bairro do Brás se beneficiou com isso, pois recebia um trans-porte público de massa mais moderno, confortável e mais veloz. A implantação do metrô representou para o Brás um terceiro nível de intervenções viárias, somando-se à linha férrea e a Avenida Radial Leste. (RODRIguES, 2006).

FIguRA 8: Vista aérea implantação do metrô Brás, década de 70.

FONTE: http://www.estacoesferroviarias.com.br/r/roosevelt.htm. Acesso em 20 mai. 2015.

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A linha 3 – Vermelha do Metrô, que corta a região do bairro do Brás, está inserida em uma rede metropolitana de trens com cinco linhas em operação. Ao todo são 68,5km de rede, 61 estações e 154 trens. Em 2014, foram transportados 1,1 bilhão de passageiros no sistema. Representa, assim, um dos principais elementos de ligação entre o distrito do Brás e o restante do município, visto que somente nesse distrito existem três estações: Pedro II, Brás e Bresser-Mooca.

MAPA 9: Rede de Metrô do Município de São Paulo. FONTE: < www.metro.com.br >. Acesso em:01/05/2015

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MAPA 10: Localização da orla ferro-viária do Brás. FONTE: Mapa elabo-rado pela autora.

Capítulo 02

2. O bAIRRO DO bRáS: uMA ANálISE DE SEu TERRITóRIO

2.1. delimitação da área oBjeto de estudo

O problema central desta pesquisa gira em torno da orla ferroviária do bairro do Brás, sua dificuldade de transposição, bem como aquilo que é acarretado por tal dificuldade, em termos de percepção e apropriação do espaço na orla.

A barreira que a linha férrea representa, impõe limites principalmente ao pedestre. Os limites, sejam eles ferrovias, portos, ou até mesmo vias, tendem a fragmentar os espaços, pois rompem com a continuidade e a visibilidade. Entende-se por fragmentação a cesura no território causada por elemento estruturador.

Pode se dizer, analisando desenvolvimento urbano do bairro do Brás, que a fragmentação espacial é res-ponsável também pela patente segregação socioespacial verificada em sua evolução.

O bairro do Brás está localizado na região leste da cidade de São Paulo e é conhecido por ser um impor-tante polo de comércio especializado. Por esse motivo, de acordo com a Associação de Lojistas do Brás, o bairro recebeu, no ano de 2014, cerca de 300 mil pessoas diariamente.

O objetivo deste trabalho, tendo em vista as questões preliminares, é estudar a problemática da presença da ferrovia no bairro. O enfoque parte da dificuldade de transposição da linha férrea, principalmente pelo pe-destre, e a fragmentação do território gerada pela presença da cesura representada pela via, uma vez que a própria estação se impõe como a melhor alternativa para interligar as porções em que o bairro se subdividiu.

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Assim, o processo para delimitação da área de estudo necessitava primeiramente da definição de um recorte espacial, estabelecendo assim de qual orla ferroviária se fala. Considerou-se então como orla ferroviária um re-corte de superfície onde a ferrovia se instalou desde a sua construção, no século XIX, somada ao espaço ime-diatamente adjacente a ela, ou seja, considera sempre a quadra unida à linha férrea , onde não há via que se-pare o lote da ferrovia. O mesmo conceito foi utilizado para delimitar a região de estudo a partir da presença da linha de metrô. Embora a linha, no trecho do bairro do Brás, seja de superfície, pode-se dizer, por hipótese, que se configura como um obstáculo em pontos opor-tunamente apontados. A área total resultante e que re-presenta a área objeto de estudo é de 1,01Km². Dessa forma, é possível verificar no mapa 11, que representa a área objeto de estudo, que na porção sudeste, esse limite extrapola a delimitação do distrito do Brás pois, embora o trecho da ferrovia esteja inserido na frontei-ra do distrito, o que se considera como orla, ultrapassa esse limite.

São objetos (recorte espacial) para esta pesquisa o trecho das ferrovias da CPTM (antiga estrada de ferro Central do Brasil e antiga São Paulo Railway, hoje San-tos Jundiaí), que estão inseridos no limite administrativo do distrito do Brás, assim como o mesmo trecho da Li-nha 3 – Vermelha do Metrô e toda orla adjacente a eles.

A área objeto de estudo está representada no mapa 11.MAPA 11: Demonstrativo da área objeto de estudo. FONTE: Mapa elaborado pela autora, sobre Mapa Digital da Cidade (MDC)

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2.2. delimitação do proBlema de pesquisa: transposições da linha Férrea

O bairro do Brás é um típico exemplo de desenvolvimento urbano orientado pelo transporte e pela infraestrutura dessa natureza. A partir de 1867, o bairro começa a receber as primeiras obras re-lacionadas à linha férrea. Com isso, ao longo da orla ferroviária foram estabelecidos armazéns, galpões e indústrias, que utilizavam a ferrovia como forma de distribuição da sua produção para o mercado de todo o país. (TORRES, 1969). Já nesse período, tiveram início os acidentes e atropela-mentos na via férrea, sinalizando que, desde seu surgimento, a ferrovia representava um obstáculo.

A solução foi instalar uma imensa porteira, conhecida no passado pela imprensa e pela população como “Porteira da Ingleza”, em referência à ferrovia São Paulo Railway. Era con-trolada manualmente e a cada cinco minutos veículos e pedestres tinham que esperar a passagem do trem, de forma que a espera podia chegar a quase meia hora, em virtude das ma-nobras de trens. Os pedestres e veí-culos se amontoavam. A porteira do Brás, que antes era sinônimo de se-gurança e do desenvolvimento trazido pelos trens, passou então a ser vista como um dos entraves à necessidade do paulistano se deslocar pelo Brás. FIguRA 9: Porteira do Brás – 1950. FONTE: Acervo Estadão. Disponivel em: http://acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,um-no-

vo-viaduto-no-bras-para-acabar-com-o-transito,9899,0.htm. Acesso: 08 ago 2014.

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No ano de 1881, a mancha urbana que representa o bairro do Brás já havia ultrapassado o perí-metro das ferrovias do Norte (Estação Central do Brasil) e ferrovia Santos Jundiaí (Estação Brás). A cidade registrava, então, forte presença de imigrantes europeus, que contribuíram para a expansão do comercio e da indústria. (RODRIgRuES, 2006).

Com o declínio da cafeicultura, no final do século XIX, a cidade já era considerada um grande entreposto comercial e possuía um parque industrial leve e serviços em expansão. As áreas de várzea começaram a ser aterradas e as propriedades rurais deram lugar aos loteamentos de tra-çado ortogonal paralelo à linha férrea. (RODRIgRuES, 2006).

No ano de 1949, foi inaugurado o viaduto do gasômetro, que prestigiava apenas veículos, despre-zando os pedestres. O novo viaduto, existente até hoje, desafogou o trânsito, mas não solucionou os problemas da travessia das porteiras na avenida Rangel Pestana, que só seria resolvido no ano de 1968, com a inauguração do viaduto Alberto Marino. (TORRES, 1969).

A travessia da ferrovia deixa de ser um problema no que diz respeito ao trafego de veículos, no entanto. Em relação ao pedestre, o principal elemento articulador entre as porções do bairro di-vididas pela linha férrea seria a própria estação Integrada do Brás, que integra os trens da CPTM e do Metrô. O conjunto conta ainda com passarelas para pedestres construídas em estrutura metálica que passam horizontalmente sobre os trilhos, sendo uma entre as estações Mooca e Brás e duas entre as estações Brás e Luz.

Devido à transição de uma economia eminentemente pautada pelo setor secundário, de natureza industrial, característica da primeira metade do século XX (HARVEY, 1989), para uma economia de serviços, a infraestrutura estabelecida e usos originais ao longo da orla ferroviária perderam suas funções. De maneira que as plantas industriais passaram por um processo de esvaziamento, causado pelo deslocamento das atividades industriais ou sua obsolescência. Observou-se en-tão a transformação de um território, acentuando a sua fragmentação,caracterizada por trechos

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pouco acessíveis, devido aos entraves produzidos por esse sistema de transporte que corta a área (MEYER, 2010) e descaracterizado, com funções obsoletas e terrenos vagos.

Peter Marcuse (2004) definiu a segregação socioespacial identificando três principais formas de expressão do fenômeno: cultural, funcional e diferença no status hierárquico. Abordando a primeira categoria, a de segregação cultural, pode-se dizer que as transformações de ocu-pação social do bairro do Brás vêm se evidenciando: uma vez foi um bairro industrial eminen-temente ocupado por imigrantes, sobretudo italianos (TORRES,1969), e hoje é ocupado por grupos sociais diversos, entre eles, nordestinos e latino-americanos. Do ponto de vista da se-gregação funcional, resultante da lógica econômica (id., ibid.), que tem como produto espacial uma clara divisão de atividades desempenhadas pelos bairros e regiões da cidade, verifica-se que o Brás vem transitando de uma ocupação fortemente industrial e de serviços à produção industrial, sedimentada na primeira metade do século XX, a uma outra divisão funcional. Essa outra lógica de ocupação, que convive com a primeira e seus remanescentes, na forma de gal-pões e plantas industriais em processo de transformação, tem ênfase em atividades terciárias, resultantes do funcionamento de comércio especializado no setor de confecções e outros comércios varejistas, que se localizaram no bairro atendendo ao novo perfil social. (RODRI-GUES, 2006).

É possível supor também, nos dias atuais, que a dificuldade de transposição da via férrea e escassas passagens existentes, levando a uma patente desarticulação de ambos os lados da ferrovia e linha do metrô, configura um obstáculo para o desenvolvimento da região e do bairro em questão. Tais infraestruturas fragmentam o território, por desconectar o bairro, que possui poucos pontos para a travessia, principalmente de pedestres. Essa abordagem e análise de-ram origem ao mapa 12.

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MAPA 12: Demonstrativo dos pontos de transposição da via fér-rea. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC)

Viadutos

Passarelas

Passagem em nível

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Rua Capitão Faustino de Lima Rua Carneiro Leão

Viaduto Gasômetro

9

Viaduto Maestro Alberto Marino

10

1 2

Rua Caetano Pinto XTorquato Neto

Rua Piratininga

Rua Domingos Paiva

Rua Domingos Paiva

Rua Visconde de Parnaíba Rua Visconde de Parnaíba

Rua Rodrigues dos Santos Rua Rodrigues dos Santos

Praça Agente Cicero

3 4

5 6

7

8

FIguRA 10: Demonstrativo dos pontos de transposição da via férrea. FONTE: Autora, 03 ago. 2015. Vistas aéreas: Google Maps, acesso em 15 ago. 2015.

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Em toda extensão do recorte espacial existem apenas duas passagens para automóveis sobre a linha férrea. O Viaduto do gasômetro e o Viaduto Maestro Alberto Marino são paralelos e não possuem faixa para travessia de pedestre. Ademais, apenas o segundo possui ciclofaixa im- plantada. As áreas imediatamente ligadas a esses viadutos não possuem um bom tratamento do espaço público. Em muitas cidades, principalmente nos países emergentes, a necessidade gera grande parte do tráfego de pessoas. Já em outras partes do mundo, o que possibilita o fluxo de pessoas é o convite à caminhada (GEHl, 2013). No espaço adjacente a esses viadutos, nenhum desses dois aspectos foi privilegiado, o que torna menos provável que um pedestre se arrisque na travessia dos obstáculos.

Destinadas ao pedestre, verificam-se três passagens. uma passarela corresponde ao número 6 do mapa 12, saindo da Rua Rodrigues dos Santos e chegando pela lateral de galpão à Rua Coro-nel Francisco Amaro. A passarela número 7 também se encontra na lateral de uma edificação que margeia a linha férrea, ligando a Rua Coronel Francisco Amaro à Praça Agente Cícero, localizada em frente à Estação Brás da CPTM, antiga Estação Roosevelt. Por fim, a passagem de número 8 é parte da Rua Visconde de Parnaíba, que faz a ligação entre os dois pontos da mesma rua, e que fora interrompida pela ferrovia; está, assim, localizada na lateral do Museu da Imigração, antiga Hospedaria do Imigrante. Essas passarelas feitas de ferro se encontram degradadas pelo tempo. Ademais, estão escondidas por edificações. Se apresentam, assim, dois problemas ao pedestre. O primeiro deles é a localização das passarelas, escondidas pelas edificações que dificultam sua visualização, tornando-as inseguras, pois não existem os “olhos para a rua” que asseguram que os espaços públicos estejam sempre monitorados (JACOBS, 2000). O outro problema é aquilo que Jan gehl (2013) chama de desvio irritante e interrupção sem sentido, que aborrecem o pedestre e tornam mais difíceis as caminhadas. Para que uma caminhada seja confortável, é necessário que o espaço da não possua muitas interrupções, e tampouco obstáculos.

O obstáculo surge também na forma de escadas. Com a finalidade de prevenir acidentes com pedestres, a solução foi segregar o tráfego, conduzindo o pedestre através de passarelas e obri-gando-o a subir altos muros ao longo da via. Isso significou sujeitar o pedestre a escadas em

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ambos os lados da travessia, o que não resolve o problema de carrinhos de bebês, cadeirantes ou bicicletas. (GEHl,2013).

A linha férrea também compromete a qualidade do espaço público, pois ora cria zonas de fronteira, caracterizadas por ruas sem saída, ora apresenta a passagem de uma porção do bairro à outra como um obstáculo, caracterizado pelas passarelas.

FIguRAS 11 e 12: Dificuldade de travessia imposta ao pedestre. FONTE: Autora, em 08 ago. 2015.

Em relação às passagens em nível, abaixo da linha aérea do Metrô, percebe-se que não causa uma cesura no bairro e tampouco a interrupção das vias. O principal problema causado pela linha é a falta de tratamento do espaço público. Não existe ali qualquer ponto que crie interesse no pedestre, que estimule a caminhada ou a permanência. Esse abandono do espaço público e falta de trata-

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mento é responsável pelo problema da apropriação e ocupação das áreas abaixo da linha férrea por pessoas em situação de rua.

FIguRA 13: Apropriação do espaço público abaixo da linha do metrô. FONTE: Autora, em 08 ago. 2015.

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2.3. o esPaço PúbliCo e o PedestRe

São considerados espaços públicos os lugares urbanos que, em conjunto com infraestruturas e equipamentos coletivos, dão suporte à vida em comum, como ruas, avenidas, praças e par-ques. Nessa acepção, são bens públicos, carregados de significados, palco de disputas e con-flitos, mas também de festas e celebrações. (CASTRO, 2013). Há uma pequena diferença en-tre o que se considera como esfera pública e espaço público. A esfera pública é tudo o que pode ser visto ao nível dos olhos. É, portanto, mais abrangente do que os espaços públicos, pois inclui as fachadas dos prédios. A esfera pública é onde a experiência do pedestre acontece. (KARSSENBERg; LAVEN; gLASER; VAN’THOFF, 2015).

FIguRA 14: Esquema da Esfera Pública. FONTE: KARSSENBERg; LAVEN; gLASER; VAN’THOFF, 2015, p.15

Jan gehl (2009) divide as atividades realizadas no espaço público em três categorias: (i) atividades necessárias, que envolvem as atividades obrigatórias ou tarefas cotidianas, como o trajeto à escola ou trabalho; (ii) atividades opcionais, aquelas nas quais a participação depende do desejo do sujeito, de forma que essa categoria necessita que as condições externas sejam favoráveis em relação ao clima e o ambiente físico; e (iii) atividades sociais, que são todas as atividades realizadas em espa-ços públicos e dependem da presença de outras pessoas. Tanto as atividades opcionais quanto as atividades sociais dependem diretamente da qualidade do espaço, e a melhora qualitativa dessas

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atividades são observadas em áreas onde foram estabelecidas ruas para pedestres ou zonas livres do tráfego de carros. Considera também que uma cidade com boa qualidade dos espaços públicos é onde os espaços interiores dos edifícios são complementados pelos usos dos espaços exteriores e onde espaços públicos tem mais possibilidades de funcionamento, para isso é necessário que o pa-vimento térreo dos edifícios interaja com os espaços públicos. Espaços públicos de qualidade devem ser versáteis e receber os três tipos de atividades descritas. Em outras palavras, deve-se considerar a qualidade ambiental não apenas em relação ao espaço publico, mas também da esfera pública.

Uma boa estratégia para a criação de uma esfera públicas de qualidade é o tratamento do pavimento térreo das edificações, o que Hans Karssenberg chama de “Plinth”. um Plinth é o andar térreo de um prédio, é a parte crucial para a cidade ao nível dos olhos. A cidade não é apenas um entorno fun-cional, mas um entorno de experiencias. A função foi uma característica dominante no planejamento urbano das ultimas décadas, no entanto estamos experimentando uma mudança de “fazer a cidade” para “viver a cidade”. Sendo assim, uma boa estratégia para o pavimento térreo, de forma que ofe-reça uma experiencia satisfatória ao pedestre, é a diversificação de funções, incluindo as funções sociais e de habitação (KARSSENBERg; LAVEN; gLASER; VAN’THOFF, 2015). Jeff Speck (2016) reforça a ideia de mesclas de usos como estratégia para criação de espaços públicos de qualidade e aponta que o zoneamento é responsável pela criação dessa diversificação de usos, no entanto, segundo o autor, as cidades devem manter seus códigos e leis atualizados de forma que haja um equilíbrio adequado entre as diversas atividades em seus centros.

2.4. uma análise do território

2.4.1. uso e oCuPação do solo

2.4.1.1. etapas de análise

Para a análise do tecido urbano, foi realizado um levantamento de uso e ocupação do solo in loco e lote a lote. As visitas aconteceram em três momentos, de forma que se pudesse comparar a frequência em

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diferentes ocasiões, afim de defrontar os dados que dizem respeito ao fluxo de pessoas.

Dessa forma, foram seguidas as seguintes etapas, que serão detalhadas no tópico a seguir:

1. Visita ao lugar e levantamento fotográfico;

2. Construção das classificações;

3. Análise do uso e ocupação do solo;

2.4.1.2. visita ao lugar

As visitas foram realizadas em três diferentes dias da semana - sábado, domingo e segunda feira, sempre no período da manhã, afim de verificar qual o tipo de frequência que o espaço possui. O percurso realizado foi o mesmo nos diferentes períodos. Foi tido como ponto de chegada e par-tida a Estação Brás da CPTM. Iniciou-se o trajeto passando pelo Largo da Concórdia, seguindo sentido noroeste, sempre margeando a orla ferroviária, até chegar ao cruzamento entre a Rua São Caetano e a Avenida do Estado, atravessando assim os trilhos pela passagem em nível lo-calizada na Avenida do Estado. Sempre margeando a linha férrea, retornou-se sentido sudoeste até o ponto onde existe a Estação Brás do Metro. Nesse ponto, desviou-se para o sentido sudo-este, seguindo a via aérea referente à linha do Metrô, até chegar à estação Pedro II. Seguiu-se então novamente a estação Brás do Metrô, partindo dali no sentido da estação Bresser Mooca, atravessando novamente a linha férrea na Avenida Alcântara Machado e retornando outra vez ao ponto de encontro das vias do Metrô e da CPTM, de onde o percurso segue na direção da Esta-ção Bresser do Metrô, onde a travessia acontece justamente pela estação. Retornou-se então à estação Brás, pelas ruas adjacentes ao quarteirão limítrofe da via.

O percurso realizado está representado no mapa 13, a seguir.

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MAPA 13: Demonstrativo do percurso realizado para levantamen-to de dados. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapra Digital da Cidade (MDC).

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2.4.2. CoNstRução das ClassifiCações

A LPuOS considera cinco diferentes categorias de uso com finalidade urbana, sendo elas: uso Habitacional, Uso Comercial, Uso de Serviços, Uso Institucional e Uso Industrial.

No entanto, para demonstrar a variedade de usos encontrados na área objeto de estudo, foi ne-cessário esmiuçar essas categorias, de forma a ilustrar a abordagem desejada e a complexidade da mistura de usos. Assim, da construção das classificações surgiram quinze diferentes usos, sendo eles:

ÁREA DE LAZER: Se enquadra nesse item somente lotes e edificações onde exista equipamento público para o uso de lazer e esporte.

COMÉRCIO E SERVIÇOS: Nessa categoria se enquadram lotes utilizados com a única finalidade do comércio e do serviço com fechada ativa. Consideram-se também antigos galpões industriais convertidos em comércio.

CONJuNTO RESIDENCIAL: Considerou-se lotes que apresentam grande adensamento populacio-nal, abrangendo desde o condomínio residencial, que ocupa todo o lote, até edificações de meio de quadra acima de quatro pavimentos de apartamentos.

EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO: Entram nesse grupo lotes onde exista previsão futura de cons-trução de um empreendimento imobiliário, assim como obras em curso.

ENTIDADE RELIgIOSA: Considera locais de culto religioso de qualquer conformação. Esse caso também se aplica para antigos galpões industriais convertidos em templo.

ESTACIONAMENTOS/gARAgEM DE ÔNIBuS: Esses estabelecimentos funcionam como parada para ônibus de viagem, bem como estacionamento para carros de passeio.

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ESTAÇõES DE METRÔ E LINHA FÉRREA: Edificação destinada a embarque ou desembarque de passageiros da CPTM e Metrô, assim como a área destinada aos trilhos em nível.

GAlPãO: Nessa categoria estão inseridos galpões de caráter industrial ou de armazenamento. Pode eventualmente abordar galpões industriais vazios ou abandonados.

HOTEl: Em sua maioria funcionam como edificação mista, sendo o piso térreo dedicado ao comér-cio e os demais pavimentos dedicados às atividades do hotel.

METRÔ: Considerou-se separadamente da linha férrea e estações, pois possui como característica sua via aérea.

PRAÇA: Considerada como área pública, sem construções ou equipamentos de uso público.

RESIDêNCIA uNIFAMILIAR: Edificação destinada a abrigar apenas uma família. Eventualmente, também pode se referir a residências convertidas em cortiços.

SOCIAl/INSTITUCIONAl: Edificações de uso público, gerenciadas pela Prefeitura, Estado ou Ins-tituição privada.

USO MISTO: Inclui, concomitantemente, o uso residencial e o uso não residencial, como comércio e serviço.

VAZIO: Envolve terrenos sem edificação ou uso.

A reunião dos dados de uso e ocupação do solo, levantados in loco, somada à classificação desses usos, resultou no mapa 14, que utilizou como base cartográfica o Mapa Digital da Ci-dade (MDC).

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MAPA 14: Demonstrativo do uso e ocupação do solo. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

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2.4.3. aNálise do uso e oCuPação do solo

A partir do mapa de uso e ocupação do solo, foi gerado um gráfico que utiliza a área dedicada a cada um dos usos, onde se pode verificar a porcentagem de cada uso em relação à área total ob-jeto de estudo. O gráfico está representado na figura 15.

FIguRA 15: Gráfico demonstrativo do uso e ocupação do solo em relação à área total objeto de estudo.

FONTE: gráfico elaborado pela autora.

Pode-se perceber, assim, que o bairro do Brás é afetado diretamente pelo sistema viário citado abaixo, fator esse que resulta no obstáculo da mobilidade e acessibilidade intra-urbana.

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• Ferrovia CPTM: antiga estrada de ferro Central do Brasil, que hoje abrange as linhas 11 (Coral) e 12 (Safira); bem como a antiga São Paulo Railway ou Santos Jundiaí, atualmente linha 10 (Turquesa).

• Linha 3 – Vermelha do Metrô.

Igor guatelli (2012) explica que viadutos têm a finalidade de ligar pontos distantes da cidade, mas acabam por desarticular espaços próximos. Foi isso que aconteceu com a área objeto de estudo, com a diferença de que esse fenômeno ocorre em relação não só aos viadutos, mas também em relação à ferrovia.

O Brás é conhecido como um importante núcleo comercial, principalmente no que diz respeito ao comercio temático, apresentado por exemplo nas ruas Oriente e Barão de Ladário, onde há o co-mercio voltado à indústria têxtil. Outra porção do bairro concentra o comércio voltado a maquinários pesados para a indústria de transformação. Já o comércio e serviços locais acontece de forma dis-persa, sem a formação de centralidades. Analisando o mapa 14 e o gráfico da figura 15, torna-se claro que, no que diz respeito a orla ferroviária, embora os comércios se encontrem concentrados, essa não é a atividade predominante, representando apenas 7% da área objeto de estudo.

Por outro lado, verifica-se que outros usos dão suporte ao comércio. Esse é o caso dos estacionamen-tos e garagens de ônibus, que foram separados numa categoria única pois a quantidade de lotes dis-pensada para esse uso é equivalente à área destinada ao comercio. Esses espaços funcionam como pequenos terminais de ônibus de excursão que trazem compradores de diversos estados do Brasil.

Destinado a esse mesmo público, há os hotéis com características distintas das convencionais. Geralmente são utilizados por compradores de outros estados que ocupam o espaço por um curto período de tempo, e possuem o térreo dedicado ao comércio e os demais pavimentos dedicados às atividades do hotel.

A presença de galpões de caráter industrial ainda é grande, mas parte deles teve seu uso mo-dificado para depósitos logísticos que dão suporte ao comercio especializado da região. Existe também a dificuldade de determinar quantos desses galpões se encontram em atividade ou aban-

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donados. Percebe-se que parte dos galpões foram convertidos em outros usos, e por isso foram somados nos usos atuais. No entanto, essa conversão de usos sinaliza as mudanças que o bairro e principalmente sua orla ferroviária vêm sofrendo devido a mudança de uma economia industrial para uma economia voltada aos serviços.

No caso do uso residencial, é possível verificar três categorias: residência unifamiliar (3% da área e estudo), conjuntos residenciais (9%) e uso misto (2%). Se somadas, as categorias representam 14% da área objeto de estudo. Os conjuntos residenciais estão distribuídos ao longo da linha do metrô e os usos mistos estão pulverizadas pela região, mais presentes nas áreas de concentração de comércio. Já as residências unifamiliares estão concentra-das em pequenas vilas.

Embora o Novo Plano Diretor, aprovado no ano de 2014, incentive o adensamento popu-lacional próximo a linhas de transporte, encontra-se, ao longo da linha férrea, somente um lote com essas características. Esse lote é produto da demolição de antigos galpões indus-triais localizados em miolo de quadra.

Em relação a área de lazer, na região da orla ferroviária do bairro do Brás, verifica-se ape-nas um lote com tais características. Esse lote é a Praça Benemérito Brás, que se configu-ra como um parque urbano e apresenta local para caminhadas, bem como duas quadras poliesportivas a céu aberto. Localizada abaixo da área referente à linha 3 do Metrô, essa praça configura 2% da região estudada.

Nos edifícios institucionais está contabilizado uma unidade da Fundação Centro de Atendi-mento Socioeducativo ao Adolescente (FuNDAÇÃO CASA/SP), que se encontra na região limítrofe a área de estudo, aparecendo destacada no mapa 15, mas não contabilizada no gráfico. As edificações de uso educacional são representadas pelo Memorial do Imigrante, que se localiza na Rua Visconde de Parnaíba, e também abrange uma unidade da universi-dade Anhembi Morumbi. Além disso, há três escolas de ensino fundamental, quatro unida-des voltadas ao ensino infantil, duas unidades do SESI/SENAI e uma ETEC, voltadas para o

FIguRAS 16 e 17: Área de lazer - Praça Beneméri-to Brás. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

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ensino técnico profissionalizante, inseridas dentro do distrito do Brás, mas apenas a ETEC consta dentro do limite da área de estudo.

MAPA 15: Demonstrativo de escolas e equipamentos culturais. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC) com dados de gEOMAPAS Disponível em: http://downloadfolhasscm.prefeitura.sp.gov.br/. Acesso em: 20 set 2014

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A finalidade principal de orientar a produção imobiliária para áreas localizadas ao longo dos eixos de transporte coletivo é justamente concentrar moradia e trabalho em uma mesma região para di-minuir os deslocamentos, bem como buscar a integração territorial das políticas públicas de trans-porte, habitação, emprego e equipamentos sociais.

Percebe-se então que a região já possui um número considerável de habitações, e seguindo o ca-minho que o Novo Plano Diretor indica, tende-se a aumentar o contingente populacional da região. No entanto, as áreas que dizem respeito equipamentos de saúde, comércio local, sociais e de lazer público necessitam se desenvolver, de forma que essa nova população não tenha que se deslocar até outros bairros para ter suas necessidades atendidas.

Jan gehl (2013) cita que a densidade sozinha não produz vida nas ruas. Enquanto muitas pesso-as moram e trabalham em edifícios de alta densidade, os espaços urbanos do entorno podem se tornar escuros e ameaçadores, pois a vida na cidade não se desenvolve de forma automática em resposta à alta densidade.

Existem, na região, também espaços vazios e subutilizados que têm potencial para a conversão nas atividades que a comunidade local demanda. Na área objeto de estudo, esses espaçoes são predo-minantemente áreas remanescentes da desapropriação para a implantação da linha 3 do metrô.

2.5. vertiCalização e adensamento

A densidade demografica do distrito do Brás² é de 83,61hab/ha numa área de 3,5km² (350ha), densidade é considerada baixa se compararmos aos distritos vizinho como a Mooca (98,34hab/ha) ou Tatuapé (111,80hab/ha). Ou ainda se comparado com os 73,87hab/ha, densidade da área urbanizada da cidade de São Paulo³.

A figura 18 demonstra o grau de verticalização da área objeto de estudo a partir do levantamento in loco de uso e ocupação do solo.

2 Dados relativos ao ano de 2010, disponível em: < http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras/subprefeituras/dados_demo-graficos/index.php?p=12758 >. Acesso em 16 abr. 2016.

3 Dados relativos ao ano de 2010, disponível em: < http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=355030 >. Acesso em 16 abr. 2016.

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Nota-se que, com exceção das edificações de uso residencial de alta densidade, o baixo gabarito das construções é predominante. Aqui se reforça a questão dos conjuntos residenciais concentra-dos na orla da linha 3 do Metrô, tornando essa área a mais verticalizada e adensada.

Assim como há a setorização dos usos, aqui é possível verificar que, do ponto de vista do adensa-mento, também há divisão em setores.

Ao analisar a legislação urbanística, é possível verificar que o cenário relacionado à verticalização não deu prioridade à região do Brás. No entanto, a nova lei de zoneamento aprovada no ano de 2016 tende a mudar essa realidade, pois privilegia o adensamento populacional em zonas onde haja infraestrutura de transporte público consolidado.

No entanto, a densidade populacional não pode ser a única ferramenta para a produção da vida e da segurança nas ruas. Altas densidades podem ser fruto de uma verticalização pontual, e possuir um entorno sem vida, escuros ou ameaçadores, pois a vida na cidade não se desenvolve de forma automá- tica em resposta à alta densidade. (GEHL, 2013). Jaime lerner (2003) afirma que o espaço urbano deve ser entendido como uma integração de funções, rendas, idades, pois a combinação desses elementos fomenta a vida nos espaços públicos.

FIguRA 18: Demonstrativo de verticalização. FONTE: Mapa Elaborado pela autora.

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Apesar do desejo do governo do município no adensamento populacional no bairro do Brás, as linhas de transporte que cruzam seu território, impactaram no declínio de sua população a partir da década de 1950.Ano 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010População 67950 63971 51251 44886 33536 25158 29265

O bairro do Brás possui como característica a colônia de italianos que se instalou na região, devido ao incentivo dado a imigração estrangeira , nos últimos anos do século XIX (TORRES, 1969). Atualmente, a população de imigrantes da região tem se complementado pela presença de imigrantes latino america-nos e asiáticos, vivendo e trabalhando em situação irregular.Não existem estatísticas oficiais a respeito dessa população e sua forma de ocupação, no entanto a observação in loco, mostra que parte dessa população vive em cortiços, ou moradias insalubres.Ao contrario da população residente, a população de pessoas em situação de rua teve aumento expressivo até o ano de 2011, apresentando queda apenas no recenseamento de 2015 como é possível verificar na figura 19.A população residente no bairro do Brás de acordo com Censo realizado no ano de 2010 era de 29265 habitantes, distribuída em 10110, o que gera uma média de 2,89 pessoas por domicilio. Sen-do que 37% desses domicílios tem renda entre 2 e 5 salários mínimos, faixa de renda considerada baixa, se considerado a faixa dos distritos vizinhos, como Tatuapé e Mooca. Além de possuir 4,21% dos domicílios declarados sem nenhuma renda. 2000

0

500

1000

1500

2000

2500

2009 2011 2015

Pessoas em situação de rua

Pessoas Acolhidas

Total de pessoas recenseadas

FIguRA 19: Censo da população em situação de rua.

FONTE: IBgE – Censos Demograficos de 2000, 2009, 2011 e 2015

DistritosDomicilioS PArticulAreS PermAnenteS

TotalClasses de rendimento nominal mensal domiciliar (salário mínimo)

Até 1/2 Mais de 1/2 a 1 Mais de 1 a 2 Mais de 2 a 5 Mais de 5 a 10 Mais de 10 a 20 Mais de 20 Sem rendimento

São Paulo 3.574.286 20.129 225.166 588.778 1.212.485 714.900 380.801 224.798 202.016

Brás 10.110 35 459 1.558 3.707 2.732 985 202 426

Moóca 26.456 41 695 1.829 6.315 7.332 5.856 3.279 1.104

Tatuapé 32.734 74 866 2.032 6.591 8.590 8.325 4.897 1.342

TABElA 03: Domicílios por faixa de rendimento. FONTE: IBgE – Censo Demográfico de 2010.

Fica evidente então a deterioração e degradação urbana, caracterizada pela perda e empobreci-mento da população residente, a proliferação de cortiços e moradias insalubres através da subdivi-são de imóveis, a fragmentação do espaço urbano pelo sistema viário de transporte, altos índices de violência urbana e pessoas em situação de rua.

TABElA 02: População recenseada. FONTE: IBgE – Censos Demográficos de 1950, 1960, 1970, 1980, 1991, 2000 e 2010

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MAPA 16: Demonstrativo de adensamento populacional. FONTE: gEOMAPAS Disponível em: http://downloadfo-lhasscm.prefeitura.sp.gov.br/. Acesso em: 20 set 2014

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2.6. limitações impostas ao pedestre

Assim como a análise de uso e ocupação do solo gerou classificações distintas, aqui as figuras também seguem uma espécie de classificação. A forma com que as images foram agrupadas tenta aproximar diversas problemáticas encontradas na área objeto de estudo, de forma que não segue exatamente o trajeto descrito acima. Os problemas detectados estão todos relacionados ao espaço público e suas formas de uso.

Jane Jacobs (2000) afirma que, para obter espaços públicos seguros, é necessário que haja uma vigilância natural, que é proporcionada por um número substancial de estabelecimentos e outros locais públicos dispostos ao longo das calçadas. No entanto, Kassenberg ressalta que não se deve contar apenas com lojas e/ou varejo para criar uma esfera pública melhor. uma boa estratégia, segundo o autor, é olhar para novas funções econômicas, como locais de coworking, restaurantes e bares (nesse caso existe um limite), funções sociais como escolas e, sobretudo habitação no andar térreo.

Essas informações são importantes para analisar o bairro do Brás, pois embora o bairro receba mi-lhares de pessoas diariamente, andar por suas ruas não proporciona uma sensação de segurança.

Hoje boa parte do Brás está degradada. Isso se deve em boa parte ao co-mércio informal, atividades ilegais, tráfico de drogas, roubos e furtos, prédios descaracterizados, má condição das vias. Muito do que é ilegal está no Brás hoje, desde os camelôs que trabalham sem nenhum tipo de permissão pas-sando pelos ônibus clandestinos que partem para o Nordeste, pela venda e consumo de entorpecentes na luz do dia até as oficinas que em plena era di-gital, da modernização fabril, escravizam imigrantes latinos. (BASANI, 2011).

Todos os itens citados acima impactam diretamente a percepção em relação à segurança para o pedestre. Um levantamento da Secretaria de Estado da Segurança Pública de São Paulo apresenta os seguintes índices para o bairro:

crimes registrados no 8º DP - Brás - 2015Roubos 109Furtos 433Homicídios 1Lesões Corporais 73Estupros 4Trafico de drogas 4

TABElA 4: Crimes registrados no Brás em 2015. FONTE: Secretaria de Estado da Segurança Pública de São Paulo.

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A análise do seu território pode apontar para as seguintes possíveis causas:

2.6.1. locais de frequência intermitente

Ao realizar visitas em três diferentes dias da semana, percebe-se em alguns pontos que a cir-culação de pessoas se altera conforme o funcionamento do comércio, sofrendo com o esvazia-mento da região aos domingos, dia em que o comércio de rua tem sua rotina alterada.

Grandes centros comerciais podem resultar em monocultura e tornar a rua vulnerável, dema-siadamente movimentada durante o dia e deserta à noite. (KARSSENBERg; LAVEN; gLASER; VAN’THOFF, 2015).

A passagem abaixo do Viaduto Maestro Alberto Marino está localizada na saída principal da es-tação Brás da CPTM, antiga Estação Roosevelt, e é o acesso para a zona de comércio do bairro.

MAPA 17: Localização de passagem abaixo do Viaduto Maestro Alberto Mari-no. FONTE: Mapa elaborado pela auto-ra sobre Mapa Digital da Cidade (MDC)

FIguRA 20: Passagem abaixo do Viaduto Maestro Alberto Marino em segunda feira de manhã. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 21: Passagem abaixo do Viaduto Maestro Alberto Ma-rino em sábado de manhã. FONTE: Autora, em 08 ago. 2015.

FIguRA 22: Passagem abaixo do Viaduto Maestro Alberto Ma-rino em domingo de manhã. FONTE: Autora, em 23 ago. 2015.

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No grupo de imagens da Praça Agente Cícero é possível verificar claramente o fenômeno da de-sertificação em determinado período da semana.

Outro ponto que é possível perceber é que, nos dias úteis, a rua se torna mais frequentada, por ser caminho para outro lugar. Aos sábados soma-se a função de passagem aos vendedo-res ambulantes e o caráter comercial do bairro fica mais evidente, pois as lojas utilizam parte das calçadas para a exposição dos seus produtos e os vendedores ambulantes tomam conta inclusive de parte do leito carroçável, obrigando o pedestre a circular no espaço destinado aos carros. Já aos domingos o local encontra-se numa realidade oposta, completamente vazio e abandonado. Esse tipo de frequência intermitente se verifica por toda a região onde o comercio temático é predominante.

MAPA 18: Localização da Praça Agente Cícero. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

FIguRA 23: Praça Agente Cícero em segunda feira de manhã. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 24: Praça Agente Cícero em sábado de manhã. FONTE: Autora, em 08 ago. 2015.

FIguRA 25: Praça Agente Cícero em domingo de manhã. FON-TE: Autora, em 23 ago. 2015.

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De segunda a sábado a região recebe um grande contingente de visitantes. Aos domingos as ruas se encontram vazias e essa desertificação transmite uma sensação de insegurança aos que optam por circular na região.

Jane Jacobs (2000) citava os “olhos da rua” como elementos importantes na segurança dos espaços públicos (especialmente as ruas e passeios), pela possibilidade de vigilância natural que proporcionam. Isso se percebe claramente ao circular pelo bairro em momentos diferentes, no que diz respeito à presença de pessoas.

MAPA 19: Localização do Largo da Con-córdia. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

FIguRA 26: Largo da Concórdia em segunda feira de manhã. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 27: Largo da Concórdia em sábado de manhã. FONTE: Autora, em 08 ago. 2015.

FIguRA 28: Largo da Concórdia em domingo de manhã. FONTE: Autora, em 23 ago. 2015.

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A Rua da Juta é mais um exemplo do esvaziamento urbano. Nesse conjunto de fotos, pode-se verificar inclusive a tipologia remanescente do galpão industrial convertido em uso comercial. Uma característica dessa ocupação industrial remanescente são as calçadas estreitas.

O cenário é agravado pela presença de carros, que circulam na via de mão dupla invadida pelos vendedores ambulantes onde carros e pedestres disputam por espaço. Ou seja, a am-bulantagem (vendas ambulantes), que inicialmente têm a função de atrair o pedestre para o espaço público, apresenta uma função ambígua, já que ao mesmo tempo em que representa a presença no espaço público, representa também a apropriação privada desse mesmo espaço.

MAPA 20: Localização da Rua da Juta. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

FIguRA 29: Rua da Juta em segunda feira de manhã. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 30: Rua da Juta em sábado de manhã. FONTE: Autora, em 08 ago. 2015.

FIguRA 31: Rua da Juta em domingo de manhã. FONTE: Autora, em 23 ago. 2015.

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O comercio varejista no pavimento térreo é um bom catalisador da esfera urbana, o que pode ser verificado nas imagens da Rua Barão de Ladário. De um lado está localizado o edifício per-tencente à Caixa Econômica Federal, onde acontece parte de suas funções administrativas. Nesse trecho não há fachada ativa ou qualquer atividade que interesse o pedestre, nem ao menos a atividade do comércio ambulante. Embora poussua um passeio mais largo e seja essa a zona sombreada pela manhã, o pedestre opta por circular do outro lado da rua, onde existe atividade comercial, já que a calçada está cheia de outros pedestres e ambulantes.

MAPA 21: Localização da Rua Barão de Ladário. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

FIguRA 32: Rua Barão de Ladário em segunda feira de ma-nhã. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 33: Rua Barão de Ladário em sábado de manhã. FONTE: Autora, em 08 ago. 2015.

FIguRA 34: Rua Barão de Ladário em domingo de manhã. FONTE: Autora, em 23 ago. 2015.

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MAPA 22: Localização da Rua Coronel Francisco Amaro. FONTE: Mapa elabo-rado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

FIguRA 35: Rua Coronel Francisco Amaro. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 36: Rua Coronel Francisco Amaro – Estação Brás CPTM. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 37: Rua Coronel Francisco Amaro – Estação Metrô.FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

2.6.2. vazio permanente

Da mesma forma que a visita em três períodos distintos fez perceber que existem zonas com diferentes tipos de frequência, outros pontos se mostraram estáveis, mantendo-se vazios na maior parte do tempo.

Essa porção do bairro não possui características comerciais, portanto não existem picos de frequ-ência e desertificação do espaço público.

A rua Coronel Francisco Amaro margeia a linha férrea. Nesse ponto não há edificações adjacentes à ferrovia, mas apenas calçada do lado oposto da rua. Embora nessa rua exista o acesso principal de um conjunto residencial, o passeio se mantém sem a presença de pedestres. Mesmo com a aproximação da entrada lateral da estação Brás da CPTM e do Metrô, o número de pessoas circulando não se intensifica.

Os espaços públicos vazios causam um sentimento de insegurança, inibindo a circulação de pe-destres. Isso se dá pela falta de tratamento do espaço público, bem como do pavimento térreo, responsáveis pela comunicação direta entre o espaço público e o privado.

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MAPA 23: Localização das ruas apresen-tadas nas figuras 37, 38, 39 e 40. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC)

FIguRA 38: Rua Monsenhor de Andrade. FON-TE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 40: Rua Dr. Almeida Lima. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 39: Rua Gomes Cardin. FONTE: Auto-ra, em 03 ago. 2015.

FIguRA 41: Rua Dr. Almeida Lima. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

2.6.3. muros – barreiras intransponíveis

A barreira, a fragmentação do bairro e impossibilidade de transposição da linha férrea são apenas al-guns dos problemas.

A fragmentação do espaço público tem como seu principal representante o muro, que se impõem como limite.

Os limites são uma característica tipica de ambiente onde existe a presença de ferrovias que tendem a fragmentá-los, limitando a continuidade e também a visibilidade. (LYNCH, 2011)

Jane Jacobs (2000) menciona que zonas de fronteira, nas cidades, geralmente criam bairros decaden-tes. Verifica-se que em cada uma dessas ruas há um problema diferente, causado pelo mesmo agente: a fronteira, aqui representado pelo muro.

Na rua Monsenhor de Andrade, por exemplo, a imediação do muro está ocupada por moradores de rua. Já na rua gomes Cardin, o que se verifica é um galpão convertido em estacionamento e um cená-rio de desertificação. A rua Dr. Almeida Lima é cortada ao meio e possui do lado norte da ferrovia um local sem circulação de pessoas, ocupado por moradores de rua e a face mais ao sul da ferrovia é o acesso às dependências do pátio ferroviário que, embora se encontre conservada, também sofre com o esvaziamento.

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Ao analisar o mapa 24, logo se constata a repe-tição da problemática da fragmentação, caracte-rizada pela fronteira que a linha férra representa. Essa análise revela trechos pouco acessíveis, onde frações de territórios geograficamente próxi-mos transformam-se em trechos isolados. É impor-tante lembrar que elementos estruturadores – nes-se caso a ferrovia – ao passo em que promovem uma relação metropolitana ou regional, produzem no nível local uma descontinuidade no tecido ur-bano. (MEYER, 2010).

As linhas férreas são exemplos clássicos de fron-teira, aqui caracterizadas pelas ruas sem saída, muitas vezes fechadas por muros ou grades. O distrito que fica de um dos lados da linha pode ser melhor sucedido do que o outro. Contudo, inde-pendente do desenvolvimento que tenham essas porções, é provável que ocorram distante dessas fronteiras, inseridos no núcleo urbano, de forma que quanto mais próxima à linha férrea, mais de-cadente essa zona. (JACOBS, 2000)

No mapa 24 há duas situações que caracterizam a fronteira: as ruas sem saída, que possuem ape-nas um acesso; e as ruas interrompidas pela linha férrea, sendo às vezes desviadas pela barreira e outras sendo literalmente cortada, tendo continui-dade do outro lado da via.

MAPA 24: Demonstrativo das barreiras urbanas. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC) com dados MEYER, 2010.

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MAPA 25: Localização dos Conjuntos Residenciais apresentados nas figuras 41, 42, 43 e 44. FONTE: Mapa elabo-rado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC).

FIguRA 42: Rua Monsenhor de Andrade. FON-TE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 44: Rua Dr. Almeida Lima. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

FIguRA 43: Rua Gomes Cardin. FONTE: Auto-ra, em 03 ago. 2015.

FIguRA 45: Rua Dr. Almeida Lima. FONTE: Autora, em 03 ago. 2015.

2.6.4. Conjuntos residenciais

usos únicos de grandes proporções nas cidades têm entre si uma característica comum: a criação de fronteiras (JACOBS, 2000). Ou seja, além da barreira que a linha férrea oferece à área de estudo, outro fenômeno contribui para a desertificação do espaço público: os conjuntos residenciais.

Em cada uma das imagens, encontram-se conjuntos residenciais, completamente fechados e imper-meáveis, que esterilizam e deterioram seu entorno, pois a única finalidade do pedestre nessas áreas é o acesso aos conjuntos.

No caso das ruas Coronel Francisco Amaro e Torquato Neto, o espaço público acontece no limite entre a linha férrea e o muro do conjunto residencial. Já no caso das ruas Visconde de Parnaíba e Hipódro-mo, sua face posterior é o limite da ferrovia. Mas em todos os casos o cenário é de calçadas vazias de pessoas e nenhum equipamento público destinado a receber a população residente nos conjuntos.

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2.6.5. Pontos de alagamento

Pontos de alagamento são reflexo do esgota-mento das capacidades da infraestrutura de drenagem, construídas para minimizar os im-pactos de um fenômeno natural, a chuva. Os impactos dos alagamentos causam consequên-cias em diversos setores da economia, inclusive na circulação de pedestres nos espaços públi-cos, que além do evidente desconforto, torna a circulação nos dias de chuva um risco eminente.

A vulnerabilidades às inundações é resultado de um conjunto de fatores, como o alto nível de impermeabilização do solo urbano, a diminuição da cobertura vegetal, as ocupações irregulares de zonas baixas da cidade incentivadas pela especulação imobiliária e sistema deficiente de drenagem urbana. (MEDEIROS, 2015). Esses fatores estão presentes no bairro do Brás, que possui topografia composta por áreas de vár-zea entre os rios Tamanduateí e Tietê, possuin-do baixo índice de declividade, além dos trilhos da São Paulo Railway, que foram instalados no nível do rio.

Os pontos de alagamento presentes na área ob-jeto de estudo estão representados no mapa 26:

MAPA 26: Demonstrativo dos pontos de alagamento no bairro. FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cidade (MDC) com dados de GE-OMAPAS Disponível em: http://downloadfolhasscm.prefeitura.sp.gov.br/. Acesso em: 20 set 2014

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FIguRA 46: Estação Brás do Metro. FONTE: Autora, em 14 mai. 2016.

FIguRA 47: Rua Rodrigues dos Santos. FONTE: Autora, em 14 mai. 2016.

2.6.6. iluminação pública

A qualidade de vida nos centros urbanos, principal-mente no período noturno, está intrinsecamente liga-da à iluminação pública. Essa que pode ser consi-derada como um instrumento da cidadania permite aos habitantes da cidade desfrutar, plenamente, do espaço público no período noturno. Além de estar diretamente ligada à segurança pública no tráfego, a iluminação pública previne a criminalidade, facili-ta a hierarquia viária, orienta percursos e aproveita melhor as áreas de lazer. A qualidade no sistema de iluminação pública favorece o comercio e o lazer noturno contribuindo, assim, para o desenvolvimen-to social e econômico da população. (AVER, 2013).

Já a falta ou a má qualidade da iluminação pública contribui para um cenário hostil ao pedestre, tornan-do o ambiente inseguro.

É possível verificar, nas imagens, a deficiência na iluminação pública da área objeto de estudo e o consequente esvaziamento dos seus espaços pú-blicos. A patente desarticulação do seu território se acentua no período noturno, quando as zonas de fronteira, ruas sem saída e principalmente as pas-sarelas de travessia para pedestres se encontram mal iluminados, acentuando o abandono e a preca-riedade do espaço público destinado ao pedestre.

FIguRA 48: Rua Monsenhor de Andrade. FONTE: Autora, em 14 mai. 2016.

FIguRA 49: Passarela Sobre Linha Férrea. FONTE: Autora, em 14 mai. 2016.

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2.7. sistema viário e transporte púBliCo

Ao MDC (Mapa Digital da Cidade), cartografia utilizada como base para esta pesquisa, se sobre-põem os mapas de Rede Estrutural de Transporte Público e o mapa de Sistema Viário Estrutural da Subprefeitura da Mooca. O objetivo era representar a estrutura viária principal da área objeto de estudo. A rede estrutural é destinada a receber a maior carga de tráfego, definindo os principais acessos ao bairro e ligações intraurbanas, compatibilizado com os diferentes modos de transporte, tanto público quanto privado, como se pode verificar no mapa 27.

Nele, nota-se que a área objeto de estudo, embora se trate da orla ferroviária, possui apenas duas paradas de ônibus que poderiam eventualmente servir de terminal de integração entre o transporte sobre trilhos e os demais meios de transporte. As paradas de ônibus não coincidem com o sistema viário estrutural, deixando claro que esse está dedicado ainda ao sistema de transporte individual.

A racionalização da infraestrutura de transporte já instalada poderia evitar a sobrecarga e a ocio-sidade de algumas regiões. No entanto, hoje o sistema viário estrutural é responsável pelos focos de degradação urbana, criando barreiras, perda da qualidade ambiental, entre outros problemas já levantados.

Inicialmente a ferrovia foi responsável pela indução do crescimento da região. Contudo, a alta fre-quência de trens tornou necessária a criação de barreiras ao longo dos trilhos para evitar acidentes no cruzamento de pedestres e veículos.

Somadas à ferrovia, tem-se avenidas de tráfego intenso e a linha metroviária, que juntas são res-ponsáveis pelo fracionamento do bairro e da área objeto de estudo.

Dentro do perímetro da área objeto de estudo, percebe-se que o que se considera como sistema viário estrutural, apto a receber um grande número de veículos, são os Viadutos do gasômetro e o

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Viaduto Maestro Alberto Marino, que atravessam a linha férrea e posteriormente a Avenida Alcânta-ra Machado. As demais vias de estruturação se encontram fora da área de estudo.

Portanto, apesar do crescimento do bairro ter se dado ao longo e em função da ferrovia, essa, as-sociada à linha do Metrô, acarretou no isolamento e degradação de algumas porções da região, visto a dificuldade de transposição que a barreira representa aos pedestres e aos demais sistemas de transporte.

Como visto no item 2.5 deste trabalho, o adensamento populacional se concentra em torno da linha leste do metrô. Já no entorno da ferrovia, o adensamento populacional é baixo e a infraestrutura de transporte já instalada permite que esse adensamento seja aumentado.

A prefeitura de São Paulo, durante a gestão do prefeito Fernando Haddad, iniciou a implanta-ção de ciclofaixas com o objetivo de criar o hábito de usar a bicicleta como meio de transporte. A estação Brás do metro possui bicicletários que disponibilizam vagas de estacionamento das 6h às 22h, o que incentiva o transporte intermodal, que envolve uma ou várias modalidades de transporte. No entanto, é possível verificar no mapa 27 que a oferta de ciclofaixa ainda não atende o bairro, tendo sido implantado em apenas uma via, o viaduto Maestro Alberto Marino, e tendo continuidade em parte da Avenida Rangel Pestana no sentindo oeste, rumo ao Parque Dom Pedro.

As estações do metrô Pedro II e Bresser-Mooca também podem atender aos habitantes dessa re-gião, assim como a estação Mooca da CPTM e o transporte sobre rodas, demonstrado no mapa como pontos de parada de ônibus. Ou seja, a oferta de transporte público nos âmbitos regional e local é grande, inserindo a região num sistema de ligação regional.

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MAPA 27: Demonstrativo de sistema viário e transporte público FONTE: Mapa elaborado pela autora sobre Mapa Digital da Cida-de (MDC) com dados de gEOMAPAS Disponível em: http://down-loadfolhasscm.prefeitura.sp.gov.br/. Acesso em: 20 set 2014

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Capítulo 03

3. ESTuDOS DE CASO DE REquAlIfICAÇÃO DE ORlAS fERROvIáRIAS

Com a passagem da economia predominantemente industrial para uma economia voltada ao comercio e informação, a estrutura estabelecida ao longo da orla ferroviária perdeu suas funções e a ocupação industrial passou então por um processo de esvaziamento. Observa-se então um território fragmentado e descaracterizado, com funções obsoletas e terrenos vagos, e esse pro-cesso pode ser verificado em diversas cidades do mundo.

Serão analisados aqui modelos de projetos urbanos de requalificação de orlas ferroviárias, os ins-trumentos utilizados para viabilizar sua execução, suas escalas e seus resultados, com a finalida-de de verificar as práticas que são passíveis de aplicação na realidade da área objeto de estudo.

Manuel de Solá-Morales (1997) descreve o crescimento urbano como a relação do espaço versus tempo, ou seja, a combinação ao longo do tempo das distintas operações sobre o solo e as edifica-ções, expressa pela sequência das formas e dos momentos construtivos que seguem em seu ritmo próprio. A construção da cidade seria, para o autor, a soma de três elementos principais: Parcela-mento (entendido como a transformação do solo rústico em solo urbano), Urbanização (compreen-de as operações de construção de infraestrutura urbana) e Edificação (refere-se à construção das edificações). Para que se dê forma ao processo físico e arquitetônico, portanto, o projeto urbano necessita combinar o solo, a edificação e infraestrutura. Esses elementos não se combinam de forma sistemática e ordenada, sendo justamente as múltiplas formas de combinações no tempo e no espaço responsáveis pela diversidade morfológica das cidades. Nessa lógica, há em São Paulo o instrumento da Operação urbana Consorciada, que trabalha como elemento urbanizador, con-forme a definição de Solà-Morales (1997), com a finalidade de viabilizar a implantação de projetos

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urbanos através da articulação entre o poder público e a iniciativa privada. Por outro lado, o Plano Diretor Municipal aparece como instrumento regulatório entre os três elementos citados pelo autor, sendo responsável pelas diretrizes que orientam o desenvolvimento da cidade.

É importante resaltar que tanto o Plano Diretor Estratégico quanto as Operações urbanas Con-sorciadas são instrumentos capazes de induzir o desenvolvimento de uma determinada região da cidade. Assim como os casos analisados, a ZAC (zone d’amenagement concerté) Paris Rive gauche, a reestruturação da orla ferroviária de Berlim e o Projeto Eixo Tamanduateí, apresentam diversos fatores em comum com a área objeto de estudo, a orla ferroviária do bairro do Brás. um exemplo de semelhança é a tentativa de requalificar vazios e galpões abandonados em espaços de qualidade, principalmente no que diz respeito a áreas públicas.

3.1. a eXperiênCia FranCesa

É possível identificar semelhanças entre as operações urbanas brasileiras e a experiência fran-cesa da ZAC, que consta no código de urbanismo francês desde 1967. Desde então, foi mantida sua característica original de combinar o planejamento de uso e ocupação do solo com um pro-grama de desenvolvimento de infraestrutura. (MALERONKA, 2010).

Anterior à ZAC, o código francês já contava com uma ferramenta de gerenciamento semelhan-te, a ZuP (zone à urbanizer en priorité), que vigorou entre os anos de 1959 a 1967 e já previa a parceria entre o poder publico e a iniciativa privada. A ZuP foi utilizada principalmente para enfrentamento do déficit habitacional e recuperação dos danos às áreas urbanas, causados pela Segunda Guerra Mundial. (lIBONI, 2015).

Em virtude do baixo custo dos terrenos em áreas suburbanas, as ZuPs eram implantadas nessas re-giões. Todavia, a escassez de infraestrutura urbana, principalmente de transporte, ocasionou uma difi-culdade no atendimento da população alvo dessas intervenções. As redes de metrô e a modernização

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dos trens suburbanos chegaram posteriormente às periferias, mas não impediram que os complexos habitacionais construídos nessas áreas permanecessem isolados, com grande concentração de de-sempregados e população carente subsistindo em edifícios sem manutenção adequada. Tal situação forçou a criação de políticas de ocupação e desenvolvimento de áreas centrais, tomando como refe-rencia o debate em torno da especulação e do preço da terra. (MALERONKA, 2010). Esses debates deram origem a instrumentos de planejamento e intervenções que garantissem ao poder público o encaminhamento das questões fundiárias de base: no ano de 1967 foi instituída a “Loi d’Orientation Foncière”, lei de orientação que reformulava o direito urbanístico francês: o urbanismo que afeta ao indivíduo e que trata da concessão de autorizações do direito de construir. (LIBONI, 2015). Esses são os principais instrumentos que favoreceram a flexibilização das leis urbanísticas na França, e foram responsáveis pela aplicação de diversos projetos urbanos em todo o pais desde 1970.

A legislação francesa define a ZAC como:

“Zonas de Ocupação Concertada” : são áreas nas quais uma comunidade ou órgão público decide intervir realizando, ou comissionando, o rearranjo urbanístico e a implantação de equipamentos públicos; atuando especialmente nos territórios que esta comunidade ou órgão adquiriu ou adquirirá para posteriormente ceder ou conceder o seu uso a usuários públicos ou privados” (FRANÇA, Lei Nº 1.208, de 13 de dezembro de 2000, apud LOBONI, 2015, p. 97).

Ou seja, de forma geral tratam-se da determinação de áreas de intervenção sujeitas a projetos de desenvolvimento e transformação urbana. (MALERONKA, 2010).

Esses instrumentos podem ser utilizados para viabilizar projetos de renovação ou reabilitação urbana, novos bairros residenciais, implantação de usos industriais, comerciais, de serviços ou turísticos, assim como instalação de equipamentos de uso publico, com a possibilidade de en-volvimentos de diversos agentes, tais como empresas privadas, sociedade de economia mis-ta com participação pública minoritária, promotores, construtores e sociedade civil minoritária. (MALERONKA, 2010).

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A participação social envolve também instituições de pesquisa e universidades, cujo papel é orientar os debates sobre projetos urbanos e mediar o jogo de tensões, através da interpretação do papel desempenhado pelo tecido social no projeto urbano. Esses debates têm o consentimen-to das principais instituições públicas envolvidas no processo. (ALVIM; ABASCAL; LIBONI, 2015).

Dessa forma, o poder público atua como um incorporador. uma vez definido o projeto de interven-ção e a área, todos os terrenos são adquiridos pelo Estado ou por uma organização terceirizada. Essa organização promove os investimentos necessários em infraestrutura e revende os terrenos à iniciativa privada, incorporando ao valor dos imóveis as melhorias em infraestrutura realizadas. (MALERONKA, 2010).

No ano 2000, a Lei de Solidariedade e Renovação urbana (SSRu, 13 de dezembro de 2000) sur-ge como instrumento regulamentador de unificação das práticas urbanísticas voltadas às ZACs e projetos urbanos, tendo como finalidade integrar os governos locais a essa modalidade de inter-venção. Com isso, articula-se o instrumento das Operações urbanas aos Projetos urbanos, tendo em mente que não é de maneira fragmentada e setorial que se deve conduzir as transformações da cidade. (AlVIM; ABASCAl; lIBONI, 2015).

3.1.1. zaC paris rive gauChe

Paris é, historicamente, marcada por um grande desequilíbrio na distribuição socioespacial de sua população e seus equipamentos urbanos. O setor oeste da cidade sempre concentrou a população mais rica, as administrações nacionais e as benfeitorias urbanas mais prestigiadas, ao passo que o setor leste sempre concentrou a maior parte da população trabalhadora e os conjuntos habitacionais. Dessa forma, a proposta de Paris Rive gauche tem a finalidade de diminuir essa desigualdade socioespacial, levando ao setor leste um programa que visa sua re-valorização, com a implantação de um novo distrito de atividades terciarias que tenha ênfase na ocupação por edifícios de escritórios. (lIBONI, 2015).

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Considerada pelo governo francês a maior operação urbana de Paris desde o Plano Haussmann no século XIX, o projeto de Paris Rive gauche cobre uma área de aproximadamente 130 hecta-res, incluindo 26 hectares de cobertura da rede ferroviária. (PARIS RIVE gAuCHE).

Trata-se de uma antiga área residual com terrenos vagos, a leste do rio Sena em Paris, onde os terrenos foram ocupados por usinas, galpões e armazéns, além de um pátio ferroviário que vem sendo coberto por lajes, em que são construídos os novos edifícios. Abrange três bairros franceses: Austerlitz, Tolbiac e Masséna. A intervenção inclui edificações emblemáticas e equi-pamentos públicos edificados, tais como a Biblioteca Nacional, projeto de Dominique Perrault, e a Universidade de Paris 7, além de edifícios comerciais, de serviços, escolas e equipamentos culturais. A área a ser revitalizada tem aproximadamente 130 hectares e surgiu com a finalidade de ligar os bairros ao Rio Sena, superando uma declividade do terreno coberto por linhas férreas que se situavam entre o bairro e o rio. (FERNANDES, 2008).

MAPA 28: Área de intervenção do Projeto Paris Rive Gauche. FONTE: Revista Au. Dis-ponivel em: http://au.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/176/paris-revi-gauche-urbanis-mo-sustentavel-116364-1.aspx. Acesso em 15 fev. 2015.

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A SEMAPA (Société d’Economie Mixte d’Aménagement de Paris) é a operadora da ZAC Paris Rive gauche e foi criada como uma sociedade de economia mista no ano de 1985 por iniciativa da pre-feitura de Paris. A municipalidade possuía 57% das ações, sendo sua maior acionista, e 20% das ações pertencem a Société Nationale des Chemins de Fer (SNCF), enquanto o restante das ações dessa empresa era dividido entre outras instâncias governamentais e instituições. Houve grande participação da empresa ferroviária nessa sociedade, o que contribuiu para a realização da in-tervenção. Cerca de metade das terras desta ZAC se situavam em áreas pertencentes à referida companhia, que flexibilizou a venda de terrenos em vista de lucros a longo prazo. (LIBONI, 2015).

Na década de 1990, a França sofreu uma importante crise imobiliária resultante de uma oferta de espaços destinados à atividade terciaria muito maior do que a demanda. Durante o mesmo perí-odo, ganhavam corpo manifestações populares que questionavam a qualidade das habitações sociais e a distância das regiões centrais que eram dotadas de melhor infraestrutura. Com isso, no ano 2000 foi aprovada a Loi Solidarité et Renouvellement urbains, que é um mecanismo que reor-ganiza aspectos do direito urbanístico francês e garante a participação popular nas decisões da cidade. Essa lei estabeleceu um índice mínimo de 20% de habitação social em relação à totalidade de residências de uma região, e devem ser construídas preferencialmente em áreas dotadas de infraestrutura urbana. Dessa forma, a ZAC Paris Rive gauche teve seu programa revisado, o que alterou seu prazo de entrega do ano 2006 para o ano 2020. (lIBONI, 2015).

O programa agora conta com uso residencial (20% - 5 mil unidades), serviços (18%). 30% da área destinada a bibliotecas e universidades, escritórios (32%) e 10 hectares de áreas verdes. O Ob-jetivo do programa é a criação de um polo econômico na cidade, equilibrando a relação moradia/trabalho e promovendo uma miscigenação de usos. (PARIS RIVE gAuCHE)

Ao incentivar que no bairro se instalem empresas multinacionais, e combinar funções e atividades diversificadas (habitação, escritórios, varejo, atividades educativas, artísticas e culturais), a opera-ção urbana Paris Rive gauche gera novas áreas destinadas ao estar público mais vivo e diversifi-cado. Seus objetivos principais eram:

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• Desenvolver um equilíbrio na cota de habitação social e moradias;

• Reforçar a função acadêmica da região e integrar a universidade à cidade;

• Consolidar a função de polo de emprego diversificado;

• Promover a conservação da herança cultural da região;

• Fortalecer o tráfego de pedestre e os transportes públicos;

• Melhorar a circulação entre o bairro e a cidade. (PARIS RIVE gAuCHE)

Parte da linha férrea foi coberta por espessas lajes de concreto, dando lugar a Avenue de France. Com isso, permitiu-se a continuação das ruas transversais existentes, criando uma ligação que integra o bairro à cidade. (PARIS RIVE gAuCHE)

FIguRA 50: Leito ferroviário coberto pela Avenue de France.

FONTE: < http://www.parisrivegauche.com/L-operation >. Acesso em:20/10/2015

FIguRA 51: Edifícios já instalados na Avenue de France.

FONTE: < http://www.parisrivegauche.com/L-operation/Le-programme >. Acesso em:20/10/2015

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Para que a intervenção fosse bem aceita pela população, foi necessário investimento em comunicação e conscientização da sociedade parisiense, pois a maior barreira foi cultural. (FERNANDES, 2008).

A intervenção pode ser dividida em quatro setores principais: Austerlitz, Tolbiac, Masséna e Brunese-au. Cada setor possui um arquiteto coordenador responsável, cuja função é um misto de concepção e coordenação, “onde define pouco a pouco um plano de massas detalhado, que anuncia um partido volumétrico e arquitetônico para cada quadra”. (T&A, 1994, p. 45 apud MALERONKA, Camila).

MAPA 29: Setores da ZAC Paris Rive Gauche. FONTE: < http://www.parisrivegauche.com/Projets-et-realisations >. Acesso em:20/10/2015

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Segue-se, então, uma explanação das principais características de cada setor:

Austerlitz: localizado no bairro de mesmo nome, esse setor pode ser subdividido em outros três subsetores – Austerlitz norte, Austerlitz sul e Austerlitz gare. É coordenado pelo arquiteto Christian Devillers. Nesse setor existem 133 unidades de interesse social datadas dos anos de 1950, e há a proposta de construção de 320 novas unidades. A partir da cobertura da estrada de ferro também será implantada uma faixa de solo criado. O subsetor Austerlitz Gare tem como arquitetos coorde-nadores AREP – Jean-Marie Duthilleul e o Atelier Jean Nouvel. Nesse subsetor também se encontra a gare d’Austerlitz, estação histórica, hoje em funcionamento, que opera com trens do sistema ferroviário intermunicipal. (RER – Reseau Express Regional).

Tolbiac: Também pode ser subdi-vidido em outros dois subsetores: Tolbic Norte e Tolbic Chevaleret. É nesse setor que está localizado a Biblioteca Nacional da França. O subsetor Tolbiac Norte foi fina-lizado no ano de 1998, ao passo que Tolbiac Chevaleret se encon-tra em andamento. (PARIS RIVE GAUCHE)

O subsetor norte possui uma área de lazer ligada à margem do rio Sena, com um passeio que liga as pontes Tolbiac e Bercy, com equipamentos para permanência e estar, além de uma piscina pú-blica. (PARIS RIVE gAuCHE) FIguRA 52: Área de lazer situada no setor Tolbiac. FONTE: < www.parisrivegauche.com >. Acesso em: 20/10/2015.

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Bruneseau: Subdividido em Bruneseau Norte e Bruneseau Sul. Nesse setor está localizado o Boule-vard Perférico e o Boulevard general Jean Simon, sendo o arquiteto-coordenador o Ateliers Lion & Associados. É o setor ocupado pelas oficinas da ferrovia. O plano, que está sendo reconsiderado, prevê a substituição dos trens por trens elétricos. (PARIS RIVE gAuCHE)

Masséna: Subdividido em Masséna Norte e Masséna Chevaleret, é coordenado pelo arquiteto Christian de Portzamparc e Ateliers Lion & Associés, sendo assim a primeira aplicação em grande escala dos conceitos de quadra aberta criados por Christian de Portzamparc. Por esse motivo, é o setor de maior interesse para esta pesquisa, devido ao tratamento dedicado ao espaço público. Christian de Portzamparc é autor de um clássico texto onde defende a quadra aberta como solução para os grandes aglomerados urbanos. (guERRA, 2011).

Utilizando inclusive Paris como referência, o arquiteto separa a história das cidades em três eras. A primeira seria a era compac-ta, na qual a rua é o resíduo entre as massas construídas. A se-gunda era seria uma rejeição à forma da rua, na qual os imóveis não são mais colocados de maneira adjacente, mas autônoma.

Já a terceira era seria a combinação entre as cidades da primeira e segunda eras. Dessa forma, a proposta do arquiteto, resultaria em:

“quadra aberta permite reinventar a rua: legível e ao mesmo tempo realçada por aberturas visuais e pela luz do sol. Os objetos continuam sempre autônomos, mas ligados entre eles por regras que impõem vazios e alinhamentos parciais. Formas individuais e formas coletivas coexistem. Uma arquitetura moderna, isto é, uma arquitetura relativamente livre de convenção, de volumetria, de modenatura, pode desabrochar sem ser contida por um exercício de fachada imposto entre duas fachadas contíguas” (PORTZAMPARC, 1997, p. 47).

FIguRA 53: Esquema elaborado pelo arquiteto para ilustrar as cidades da primei-ra e segunda eras. FONTE: Portzamparc, 1997, P. 47.

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Portzamparc não tinha a pretensão de “inventar” a quadra aberta, e tampouco um novo modelo de cidade, mas se preocupava em dar sentido histórico e consistência conceitual a um fenômeno urbano que acontecia de forma crescente em diversas grandes cidades. (guERRA, 2011).

Para criar o conceito de quadra aberta no projeto de Masséna, Christian de Portzamparc utiliza o polo universitário criado pela universidade Paris Diderot (Paris 7) com os edifícios universitários espalha-dos pela cidade, constituindo um campus aberto à cidade. A Escola Nacional Superior de Arquitetura Paris-Val de Seine ocupa um uma antigo galpão industrial, dando cor-po à utilização da estrutura existente e relembrando o passado industrial da região. (PARIS RIVE gAuCHE).

Ao invés de um programa de usos fixos, o arquiteto de-senvolve aqui uma regra per-mitindo variações de usos. Põe, assim, em prática e a nível da vizinhança, o con-ceito desenvolvido por ele na década de 80: o bloco aber-to e, como resultado, a rua aberta e diversificada.

FIguRA 54: Croqui elaborado pelo arquiteto Christian de Portzamparc para Masséna Norte. FONTE: http://www.portzamparc.com/fr/projects/quartier-massena/ >. Acesso em: 20 out. 2015.

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FIguRA 55: Proposta de Masséna Norte elaborada pelo arquiteto Christian de Portzamparc. FONTE: < http://www.portzamparc.com/fr/projects/quartier-massena/ >. Acesso em 20 out. 2015.

FIguRA 56: Vista aérea de Masséna Norte, onde se verificam as quadras abertas. FONTE: < www.parisrivegauche.com >. Acesso em 20 out. 2015.

Os edifícios são independentes e separados, permitindo que a rua tenha acesso ao lado interno dos blocos abertos, onde jardins são plantados. Todas as faces do edifícios são beneficiadas pela expo-sição à luz solar. A grande variedade de programas, volumes e materiais é implementada ao longo da rua, de forma a criar uma identidade. Assim sua inovadora “doutrina” urbana teve importância imediatamente reconhecida. (http://www.portzamparc.com/fr/projects/quartier-massena/)

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Portzamparc destaca em entrevista veiculada no site da ZAC Paris Rive gauch que, embora seu pro-jeto tenha a finalidade de incentivar a permeabilidade das quadras e a flexibilidade da ocupação, o que ocorre na prática é a tentativa por parte das incorporadoras de aumentar a área construída, tendo como resultado ocupações mais densas. É o mesmo caso das áreas de circulação e permeabilidade das quadras que se encontram muitas vezes fechadas por portões, permitindo o acesso apenas aos moradores.

FIguRA 57 e 58: Áreas de circulação entre as quadras fechada. FONTE: < https://www.youtube.com/watch?v=5XA_8dhIjNc >. Acesso em 20 out. 2015.

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3.2. o Caso de Berlim

Após a queda do muro de Berlim e a reunificação da Alemanha em 1990, a cidade passou de uma posição marginal a uma mais central, no que diz respeito aos eixos na escala do continente, transformando-se num importante polo de comunicação e transportes europeu. A malha ferro-viária do país, que havia se desenvolvido de forma desigual em cada uma das metades, sofre uma reorganização com a criação de uma empresa nacional de capital privado – a DB (Deutsche Bahn), que assume o patrimônio das empresas que antes eram administradas pelos governos capitalistas e comunistas. A empresa tem como missão a reorganização das ligações ferroviárias através de todo o país, além de reforçar a posição estratégica da Alemanha no contexto europeu. (SIlVA, 2012). O problema da orla ferroviária berlinense se insere, portanto, em um contexto glo-bal de descentralização da indústria e mudança de uma economia industrial para uma economia de serviços, no cenário nacional da reunificação da Alemanha ocidental e oriental. No contexto regional, tem-se a transformação da nova capital alemã após a queda do muro (NEFS, 2006).

Berlim possui três grandes áreas de intervenção na orla ferroviária: gleisdreieck, Ostbahnhof e Lehrter Stadtkwartier. Essas áreas constituem um projeto de reconstrução de Berlim como capital alemã e como nó de transportes entre Europa ocidental e oriental. Com as intervenções tam-bém deseja-se criar uma imagem da cidade como um importante centro cultural e de negócios. (NEFS, 2006).

Lehrter Stadtkwartier é um projeto de ocupação dos vazios urbanos no entorno da nova estação central de Berlim. Considerada uma área importante da cidade pela proximidade com o con-gresso alemão, trata-se de um ponto de cruzamento entre linhas de trem de alta velocidade e de alcance internacional. (NEFS, 2006). O distrito ao redor da antiga estação Lehrter possuía ca-racterísticas do inicio dos anos de 1990, com edifícios industriais, galpões e áreas degradadas, além do muro de Berlim que passava junto à área. O projeto da estação consiste na interligação

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das vias férreas que correm quinze metros abaixo do nível do solo às vias elevadas que correm no sentido leste-oeste, a dez metros de altura. (SIlVA, 2012).

A intervenção urbanística abrange 42 hectares e seu programa contempla uso residencial (26.500m²), comercial (6.000m²) e escritórios (112.500m²). O prazo estimado para a conclusão dessa área é o ano de 2010. (NEFS, 2006)

MAPAS 30 e 31: Lehrter Stadtkwartier - Área de intervenção em 1994 e foto aérea em 2015. FONTE: (MAPA 31): Senatsverwaltung für Stadtentwicklung (Secretaria de Planejamento) FONTE: (Mapa 32): google. Disponivel em: https://www.google.com.br/maps/@-23.4721906,-46.7031274,14z. Acesso em 20 out. 2015.

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Ostbahnhof possui uma área de 21 hectares pertencente a Anschutz, com-panhia ligada à indústria do entretenimento. A região tem programa voltado ao uso residencial, comercial e escritórios (aproximadamente 18 hectares) e uma grande arena esportiva. Na face norte da ferrovia se encontra o pátio ferroviário Wriezener Bahnhof (26 hectares), que será reutilizado para uso de empresas de produção e comércio para atacado. A arena tinha como prazo o ano de 2008 e seu entorno tem prazo máximo o ano de 2020, e até o momento não sofreu todas as intervenções previstas. (NEFS, 2006).

A principal obra ferroviária da cidade foi a construção de um túnel de 9 km no sentido norte-sul que faz intersecção com o eixo leste-oeste, onde esta localizada a estação Lehrter. Nesse ponto de convergência, optou-se pela construção da estação Ostbahnhof, criando o maior cruzamento ferroviário europeu, ponto de convergência de uma rede que liga a Rússia à Portugal no sentido leste-oeste e a Escandinávia à Itália no sentido nor-te-sul. A estação, além de ser um importante ponto de convergência de ferroviária, tem também um apelo simbólico quando dois “edifícios pon-te” destinados a escritórios são incorporados a ela. Além das funções diretamente ligadas ao transporte, foram previstas áreas complexas para comércio e serviços com a finalidade de criar a forte imagem de uma centralidade baseada na grande oferta de mobilidade representada pela estação. (SIlVA, 2012).

Os investimentos mais pesados de infraestrutura foram realizados em uma primeira etapa de reurbanização da área ao redor da estação, que assumiu uma escala monumental, quando erguida como um monumento à democra-cia alemã que tem papel importante na consolidação da cidade como centro cultural, administrativo e econômico. (SILVA, 2012). No entanto, até o ano de 2012 as obras de implementação do novo distrito não haviam sido iniciadas.

MAPAS 32 e 33: Ostbahnhof - Área de intervenção em 1994 e foto aérea em 2015. FONTE: (MAPA 33): < berliner-zeitung.de >. Acesso em 20 out. 2015. FONTE: (MAPA 34): google. Disponivel em: https://www.google.com.br/map-s/@-23.4721906,-46.7031274,14z. Acesso em 20 out. 2015.

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O último caso berlinense é Gleisdreieck. O plano contempla a conversão da estrutura ferroviária em parque público. O parque re-cebe esse nome devido aos viadutos da vi-rada do século XX sobre a estrada de ferro suspensa, que formam um triângulo no local. Desde 1945, gleisdreieck era um terreno composto por terrenos residuais, que agora podem ser pela primeira vez reintegrados à estrutura urbana (MARTINS, 2015). Com área de 62 hectares, o terreno está locali-zado entre o cruzamento de linhas de me-trô e trens metropolitanos, e seu programa contempla uso residencial, comercial e de escritório, mas tem como núcleo um parque que separará os cinco polos imobiliários dos trilhos ainda utilizados. Parte do parque está elevado no mesmo nível do entroncamen-to entre as linhas e contém trilhos, pontes e equipamentos ferroviários abandonados, cobertos por vegetação selvagem. O con-ceito utilizado pelo Atelier loidl (escritório responsável pelo projeto) era de desenvol-vimento da região e criação de uma nova imagem do local, sem deixar de evidenciar a história ferroviária da região. Parte do par-que foi inaugurada em 2011 (aproximada-mente 36 hectares) e o restante finalizado no ano de 2015. (NEFS, 2006).

MAPAS 34 e 35: Gleisdreieck - Área de intervenção em 1994 e foto aérea em 2015. FONTE: (MAPA 35): < Archdaily >. Disponivel em: http://www.archdaily.com.br/br/762169/gleisdreieck-park-atelier-loidl acesso em: 6 dez 2015. FONTE: (MAPA 36): google. Disponivel em: https://www.google.com.br/maps/@-23.4721906,-46.7031274,14z. Acesso em 20 out. 2015.

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O conceito criado pelo Atelier loidl foca principalmente no desenvolvimento futuro e na nova imagem do local, ao invés de sua história ferroviária. A história da região é o ponto de partida para uma nova viagem e não deve ser considerada conservadora. O novo parque tem como objetivo dar movimento ao local, alterando o próprio terreno, e assim deixando algo velho parecer novo. Pretende, portanto, ser um lugar onde os moradores e visitantes gostarão de passar seu tempo. (MARTINS, 2015).

O parque foi criado utilizando princípios básicos da arquitetura da paisagem. Sem qualquer deco-ração, o terreno é formado, mantido o mais simples possível, mas utilizando-se de detalhes finos, materiais interessantes e vegetação, que juntos se convertem em um conjunto de grande efeito po-ético. Trata-se de uma área de descanso verde na cidade, que cria uma experiência contemplativa e estimulante do espaço livre, visando a uma perceção refinada da cidade (MARTINS, 2015).

FIguRA 59 e 60: Parque Gleisdreieck FONTE: Archdaily. Disponivel em: http://www.archdaily.com.br/br/762169/gleisdreieck-park-atelier-loidl Acesso em: 6 Dez 2015.

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No começo da década de 1990, os especuladores imobiliários investiram nos numerosos terrenos disponíveis em Berlim, atraídos pelos investimentos públicos e pela alta expectativa em relação ao crescimento da cidade após a queda do muro. A contrapartida dessa reconstrução de Berlim são as críticas em relação à rigidez da quadra urbana Berlinense e às condições socioeconômicas dos projetos, incluindo seus efeitos de gentrificação e a questões de preservação de patrimônio cultural, industrial e ambiental. Esses fatores dificultaram o interesse de investidores para os megaprojetos. Havia dúvidas sobre a viabilidade do estádio em Ostbahnhof para produções culturais e esportivas de grande porte, pois a população de Berlim não possui grande poder aquisitivo, se comparada à a outras metrópoles. A proposta contava com aproximadamente 150 eventos por ano, com adesão média de 80% dos 16.000 lugares, o que parece pouco provável nesse contexto. A população orga-nizou protestos contra os investidores e seus projetos, pois apesar de haver imóveis desocupados, os aluguéis eram elevados artificialmente, expulsando estudantes e idosos que moraram no bairro na última década. galpões de iniciativas culturais, sociais e de lazer nas margens do rio e da ferrovia fo-ram demolidos para que depois se deixasse os terrenos vazios, à espera de investidores. Em 2004, o estoque habitacional cresceu em 2.489 unidades, já incluindo o fato de que muitas unidades na peri-feria oriental foram demolidas. A vacância em novas áreas de escritórios passa de 50%. (NEFS, 2006).

3.3. o eiXo tamanduateí

O município de Santo André, juntamente aos municípios de Diadema, São Caetano do Sul, Mauá, Ribeirão Pires, Rio grande da Serra e São Bernardo do Campo, compõem a Região do grande ABC, na Região Metropolitana de São Paulo. O município possui sérias restrições à expansão urbana, uma vez que mais da metade de sua área total (61%) pertence à Macrozona de Proteção Ambiental, onde está localizado o Reservatório Billings, na qual se inclui a “Área de Proteção aos Mananciais”, regulamentada por legislação estadual. (TEIXEIRA, 2010).

A ferrovia que faz a ligação entre o interior do estado de São Paulo ao porto de Santos teve um impor-tante papel na implantação do primeiro ciclo industrial da região do ABC, formado por uma nascente

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indústria metalúrgica que se instalou junto à linha férrea na várzea do rio Tamanduateí. Paralela à ferrovia, a avenida dos Estados se cons-tituiu como uma importante ligação viária entre a região do ABC e o centro de São Paulo, transformando-se também em favor do incentivo à implantação de industrias junto ao eixo formado pela própria aveni-da e a ferrovia (PMSA, 1999).

No final da década de 1950, a região do ABC acolheu a jovem in-dústria automobilística, além da já existente indústria metalúrgica. Sua localização estratégica, próxima à capital e ao maior merca-do consumidor do país, além de garantir fácil acesso ao porto de Santos, foi determinante para essa atividade. A intensa atividade industrial do ABC, sobretudo aquela envolvida com o setor auto-mobilístico, foi responsável pela geração de riqueza e uma forte organização sindical, o que permitiu o estabelecimento na região de uma categoria trabalhadora com parâmetro salarial diferenciado em relação aos padrões praticados no restante do Brasil. Com isso, o ABC passou à condição de uma das regiões mais ricas do país, que abrigava uma população com poder aquisitivo dos mais altos padrões nacionais. Durante esse período, a região do ABC reuniu a o 3º maior mercado consumidor do país, ficando atrás apenas de São Paulo e Rio de Janeiro.

A conversão da metrópole industrial para um mercado voltado ao setor terciário, impulsionado na dé-cada de 1980, atingiu vigorosamente a região do ABC na década seguinte. A revolução tecnológica, empreendida nos países desenvolvidos, juntamente às novas formas de organização do trabalho e as transformações da economia mundial, impactaram a economia local. Esse impacto pode ser verifica-do na transformação dos processos produtivos, que exigiu a substituição do maquinário tradicional por equipamentos de alta tecnologia. Tal fenômeno resultou, por um lado, na compactação das an-tigas plantas industriais, o que contribuiu para o surgimento de edificações desocupadas ou subuti-lizadas. Por outro lado, o fenômeno gerou a redução dos postos de trabalho industrial, sendo assim

MAPA 36: Municipio de Santo André FONTE: Secretaria de Desenvolvimento Urbano

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responsável pelo crescimento do desemprego estrutural. O parque industrial do município foi fruto do primeiro ciclo industrial, e portanto, possuía aparato tecnológico em geral obsoleto, intimamente ligado à ferrovia e menos favorecido em relação às rodovias que ligam o porto de Santos. No entanto, ao pas-so que município de Santo André sofria com a retração da economia industrial, assumia também um importante papel no setor terciário, que entre 1990 e 1994 aumentou sua participação nos empregos regionais de 25% para 36%. O número de estabelecimentos comerciais cresceu nesse mesmo perío-do em 48,8%, ao passo que os estabelecimentos industriais tiveram queda de 13,6%. (PMSA, 1999).

O Eixo Tamanduateí é um projeto de requalificação urbana, isto é, investimento em parceria com o setor privado, mas implementado pelo poder público, sobre tecido urbano consolidado, consi-derado ocioso e estratégico do ponto de vista da cidade. Essa área, de uso predominantemente industrial (conforme lei de uso e ocupação do solo de 1976), é composta por grandes glebas vazias e/ou desocupadas, em processo de redimensionamento das atividades existentes, bem como de alteração de uso, em decorrência do processo de reestruturação produtiva da Região do ABC e do município de Santo André, ocorrido a partir da década de 1990. (TEIXEIRA, 2010).

A elaboração desse projeto se baseou na existência de um eixo linear, com área de 12,8 km² e 10,5 km de extensão, entre o rio Tamanduateí (que atravessa o ABC e deságua no rio Tietê) e o sistema de transporte, formado pela antiga ferrovia Santos-Jundiaí e pela Avenida dos Estados. (TEIXEIRA, 2010).

O projeto foi idealizado no ano de 1998, durante a gestão do prefeito Celso Daniel, candidato pelo PT (Partido dos Trabalhadores), entre os anos 1997 e 2000. As políticas adotadas anteriormente pela prefeitura do PT tinnham como característica a intervenção em áreas de baixa renda, espe-cialmente voltadas à infraestrutura social, compreendendo educação, saúde e saneamento básico. A partir da proposta para o Eixo Tamanduateí, é possível verificar uma mudança no rumo dessas diretrizes, cujas políticas públicas passaram também a privilegiar ações de revitalização e estética urbana, a partir do binômio novas centralidades/grandes projetos urbanos. Dessa forma, tem-se o lançamento do projeto “Eixo Tamanduateí”, com caráter empresarial, voltado prioritariamente ao atendimento das demandas de mercado. (TEIXEIRA, 2010).

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Partindo da diretriz da construção de uma nova centralidade no eixo, o processo foi encaminhado a partir da constituição de equipes de urbanistas europeus e paulistanos, lideradas por urbanis-tas renomados, como Christian de Portzamparc, Eduardo Leira, Joan Busquets e Candido Malta Campos Filho, de forma que em conjunto apresentassem uma proposta urbanística para o eixo. As propostas foram apresentadas publicamente em abril de 1999. Nessa ocasião, os participan-tes se reuniram para a apresentação de seus trabalhos, que foram julgados por uma comissão formada por um grupo promotor para o projeto. (LIBONI, 2015).

Segundo Aparecida Netto Teixeira (2010), a proposta para o Eixo pode ser dividida em três fases po-líticas. A primeira fase, voltada para a concepção e implantação do projeto, foi de 1997 a 2000 e con-tou com a condução política de Celso Daniel. Caracterizou-se por uma estrutura centralizada e pela imposição de uma proposta técnica “fechada”, elaborada pela equipe de consultores contratada para o projeto e inadequada à realidade fundiária da região, visto que parte dos terrenos destinados a rece-ber intervenções pertencia à iniciativa privada. Na segunda fase, que foi de 2001 a 2002, marcada por conflitos internos e reformulações, a condução política do “Eixo” foi compartilhada entre o ex-prefeito Celso Daniel e o Secretário de Desenvolvimento Urbano de Santo André. Nessa fase foi adotado um conceito de “urbanismo participativo”, que tornou o processo mais democrático, já que o objetivo era captação pública da renda do capital imobiliário e fundiário para promoção da requalificação urbana da área com ações integradas de participação popular, desenvolvimento econômico e inclusão social. A terceira fase se deu entre os anos de 2003 e 2004, e caracterizou-se pela interface com o momento político de reformulação do Plano Diretor. Além disso, foi marcada pela alteração da condução políti-ca do projeto, que foi assumida pelo Secretário de Desenvolvimento urbano, em virtude da morte de Celso Daniel, em 2002. Assumiu-se assim o caráter empresarial do projeto, sob o argumento do “Eixo Tamanduateí” ser um grande negócio imobiliário que deveria acompanhar as tendências de mercado. Durante a terceira fase, houve ainda a discussão e aprovação de um novo Plano Diretor do município, baseado nos instrumentos conferidos pelo Estatuto da Cidade aprovado em 2001.

Até 2005 foram aprovadas diversas intervenções no perímetro do Eixo Tamanduateí, que compreen-deram três Operações urbanas. Dado que essas intervenções foram concebidas antes da aprovação

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do estatuto da cidade, sua operação não seguiu as diretrizes estabelecidas por essa lei. Assim, po-de-se dizer que as propostas têm como principal característica o estreito diálogo entre empreendedo-res e o poder publico, excluindo a participação da sociedade no processo decisório. (lIBONI, 2015).

MAPAS 37: Projeto Eixo Tamanduateí, mapa de operações urbanas e parcerias executadas até o ano 2000. FONTE: lIBONI, 2015

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As operações urbanas implantadas no Eixo Tamanduateí tiveram como suporte legal as diligências contidas no Plano Diretor do município de Santo André de 1995, limitadas se comparadas àquelas previstas no Estatuto da Cidade aprovado no ano de 2001. Tais diligências não deixavam claras as definições dos atores que deveriam ser envolvidos no processo de proposição e implantação das operações urbanas, tendo se limitado à participação da administração municipal e da iniciativa privada. Consequentemente, o instrumento urbanístico das operações urbanas no município foi empregado, em sua maioria, com o objetivo de viabilizar o emprego de empreendimentos comer-ciais em área de uso industrial, especialmente ao longo das Avenidas Industrial e dos Estados. Tratam-se de áreas já atraentes para o mercado imobiliário, resultando na implantação de mega-empreendimentos comerciais (shoppings, hotéis, hipermercados, universidade privada), através, preferencialmente da flexibilização de índices urbanísticose e da doação de terrenos públicos, relacionado à isenção de IPTu. (TEIXEIRA, 2010).

As operações urbanas implementadas no ambito do eixo são as seguintes: Industrial I (shopping ABC Plaza); Industrial II (complexo hoteleiro Íbis/Mercure); Pirelli (centro empresarial Cidade Pirelli, parcialmente implantado); universidade uniABC; Pão de Açúcar e Carrefour (comércio varejista); Terminal Rodoviário de Santo André; e o global Shopping. Apenas três intervenções resultaram na produção de espaços públicos, e são elas: a operação urbana Pirelli (miniparque) e as parcerias do Pão de Açúcar (Praça 18 do Forte) e Carrefour (Praça do Carrefour).

Nesse cenário, destaca-se a Operação Urbana Pirelli, implantada no terreno que correspondia ao complexo industrial do grupo de mesmo nome, que teve sua planta compactada após desativação de sua fábrica de cabos. A empresa planejava a implantação de um grande empreendimento, cha-mado Cidade Pirelli. Seu programa contemplava torres que abrigariam serviços, shopping Center, restaurantes e um hotel. Tal programa ia de encontro aos interesses do poder publico de mudança do caráter industrial para a implantação de empreendimentos imobiliários comerciais. (lIBONI, 2015). Em relação à produção do espaço público, essa operação urbana teve como resultado a implantação, pelo empreendedor, de praça urbanizada, com área de aproximadamente 17.000 m², adjacente ao projeto “Cidade Pirelli”. Todavia, a praça não é adequada do ponto de vista qualitati-

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vo, tendo resultado na implantação de algumas quadras de esporte, caminhos cimentados, além de bancos e mesas pré-moldados, fornecidos pela Depav (Departamento de Parques e Áreas Ver-des). (TEIXEIRA, 2010).

FIguRA 61: Projeto Cidade Pirelli. FONTE: < http://www.edorocha.com.br >. Acesso em: 10 abr. 2016.

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Na parceria com o grupo Pão de Açúcar, o beneficio ao empreendedor foi a autorização para a ampliação de suas instalações, localizadas entre a linha férrea e a Avenida dos Estados. Em contra-partida, o grupo executou a reestruturação da Praça “18 do Forte”, com área de aproximadamente 15.000 m², próxima às instalações do hipermercado. A praça é localizada em nível inferior ao do viaduto 18 do Forte (viaduto Adib Chammas), em área de intenso tráfego de veículos. A implan-tação de uma área cimentada, bancos e mesas pré moldadas torna o lugar pouco atrativo, o que resulta na pouca utilização do espaço pela população local.

No caso da parceria com o hipermercado Carrefour, o empreendedor ganha o direito da constru-ção em área anteriormente ocupada pelo clube de funcionários da indústria química ADC Rhodia. A contrapartida é o investimento voltado à produção de espaço público para a implantação de um parque em uma área de 10.000 m², que representam 25% da área total do empreendimento. A proposta executada contempla passeio público arborizado e equipamentos permanentes, como playground, bancos, mesas e pergolado. Sem qualquer interação com o entorno, o parque foi im-plantado na extremidade do terreno. (TEIXEIRA, 2010).

A proposta para o Eixo Tamanduateí, do ponto de vista geral, pode ser considerada uma tentativa ousada de reverter a crise econômica ocasionada pela desindustrialização e pela transição para uma economia baseada no setor terciário. No entanto, a alteração da condução política do projeto e a adoção de um partido com caráter privatista foram responsáveis por melhorias, do ponto de vista urbanístico, apenas no entorno dos empreendimentos viabilizados. A ausência de um agente incorporador deixou uma lacuna responsável pela descontinuidade do plano. Esse agente incor-porador, por sua vez, deveria integrar os interesses de todos os atores em função de um objetivo comum, que no caso é a requalificação da região.

Finalmente, um projeto desse porte deve levar em consideração não apenas as características mercadológicas, no intuito de alavancar o desenvolvimento econômico de uma região. Deve-se também considerar a qualidade ambiental, proporcionando à sociedade espaços públicos de qua-lidade e possibilitando a apropriação por toda a sociedade, através de projetos habitacionais e

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de espaço público. Isso deve ocorrer por meio de mecanismos públicos que interfiram na relação entre desenvolvimento econômico e desenvolvimento social de forma equilibrada.

3.4. Considerações Finais do Capítulo

Ao analisar os casos de intervenção urbanística da ZAC Paris Rive gauche, as propostas para a orla ferroviária de Berlim e o Projeto Eixo Tamanduateí, foi possível relacionar uma grande variedade de características em comum com a área objeto de estudo, a orla ferroviária do bairro do Brás. Tais semelhanças se dão tanto do ponto de vista das potencialidades, quanto em relação aos desafios a serem superados.

Todas as áreas descritas se situam em regiões que apresentavam uma grande acessibilidade e vitalidade econômicas, proporcionadas pela proximidade com as instalações ferroviárias. No en-tanto, a passagem da economia industrial para a economia voltada ao setor terciário deixou como sequela a desarticulação e um tecido fragmentado, representado por glebas vazias, além de gal-pões industriais abandonados e/ou subutilizados.

Em relação ao Projeto Eixo Tamanduateí é possível analisar que o poder público foi pouco eficiente no que diz respeito ao direcionamento do desenvolvimento urbano da região, constatando uma pequena quantidade de melhorias urbanas e a incapacidade de criação de espaços públicos de qualidade, não havendo então qualquer avanço social relevante. A situação é então reflexo da mudança de gestão e principalmente do caráter privatista adotado. Essa situação se torna ainda mais dramática quando é considerado que grande parte da propriedade fundiária do perímetro da intervenção é predominantemente privada, o que dificulta a aquisição por parte do poder publico, impossibilitando intervenções a favor da coletividade.

Outro fator que dificultou a implantação do “eixo” foi a ausência de um agente incorporador. O caso da ZAC Paris Rive gauche parece indicar um caminho para equacionar essa questão. O

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desenvolvimento da ZAC, assim como o detalhamento do projeto urbano, a criação de parcerias e a implantação das intervenções foi confiado a uma empresa semipública, que possui autono-mia para a gestão do projeto, o que as agências públicas brasileiras de desenvolvimento urbano não possuem. No entanto, no caso Frances também pode ser verificado o caráter privatista que marcou o projeto do Eixo Tamanduateí. Após visita de campo da professora Eunice Helena Sguiz-zardi Abascal, realizada em novembro de 2014, a mesma constatou que a ZAC Paris Rive gauche apresenta áreas de preeminência monofuncional e pouco dinamismo, principalmente nos setores Tolbiac e Austerlitz, abrigando um número reduzido de tipologias residências e corporativas. (Al-VIM; ABASCAL; LIBONI, 2015). O arquiteto Christian de Portzamparc também relata, em entrevista veiculada no site da ZAC Paris Rive gauche, que embora o projeto para Masenà tivesse a intenção de incentivar a permeabilidade das quadras, na prática a infuência das incorporadoras deu origem a ocupações mais densas e com maior área construida do que fora previsto.

A requalificação da orla ferroviária de Berlim, embora tivesse como finalidade o retorno das pessoas e do capital às regiões centrais, teve como contrapartida altas taxas de desemprego, alta vacância imobiliária e falta de investidores. Tais resultados geraram dúvidas sobre a viabilidade do projeto e os verdadeiros objetivos das intervenções de grande porte na região. Apesar das intervenções terem relevância para o futuro da cidade, no caso de Berlim o modelo de investimento envolveu parcerias entre o setor público e privado, levando em consideração apenas as características mer-cadológicas do investimento, o que acarretou um problema em relação ao excedente habitacional, causado pelo aumento dos aluguéis artificialmente, gerando assim um processo de gentrificação que expulsa estudantes e idosos que viviam nesses bairros na última década.

A intervenção nos moldes franceses teve uma maior intervenção do poder público e aparenta ter avançado mais rapidamente no enfrentamento das questões sociais. No entanto, continuou-se a apoiar num programa voltado principalmente à construção de escritórios, pois conferia maior via-bilidade ao projeto.

O Plano Diretor Estratégico da cidade de São Paulo, aprovado no ano de 2014, e a lei de zoneamen-

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to, aprovada no início de 2016, também reconhecem a orla ferroviária como território estratégico para o desenvolvimento metropolitano, julgando necessário o desenvolvimento de projetos urbanos que orientarão as transformações urbanísticas, sociais e econômicas com um melhor aproveita-mento da orla ferroviária. Seria promovido assim o adensamento dessa região, contribuindo-se para o retorno do movimento de espraiamento que ocorreu na cidade de São Paulo, assim como a redução do chamado movimento pendular, equilibrando a relação emprego/moradia. A área objeto de estudo se insere nesse contexto, pois possui uma orla ferroviária abandonada, além de uma grande demanda de habitação e da necessidade de espaços públicos de qualidade.

É possível relacionar os casos apresentados ao que se pretende para a orla ferroviária de São Paulo: adensamento populacional em local dotado de infraestrutura urbana e de transportes, como são as orlas ferroviárias; além da criação de empregos, por meio do incentivo para novos setores da economia se instalarem no local; e utilização de tecido residual para chegar a esse objetivo. A aceitação das consequências ao promover uma região através de intervenções no espaço urbano depende da decisão da autoridade responsável por harmonizar o projeto urbano como um todo. To-davia, é necessário pesar a forma de administração dessas intervenções para que questões como a gentrificação e a especulação imobiliária não afetem no resultado da intervenção.

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Capítulo 04

4. RECOMENDAÇõES pARA A REquAlIfICAÇÃO uRbANA DA ORlA fERROvIáRIA DO bAIRRO DO bRáS

O distrito do Brás tem seus primeiros registros no início do século XVIII e, a partir de 1867, a região começa a receber as primeiras obras relacionadas à linha férrea e ao longo da orla ferroviária se estabelecem armazéns, galpões e indústrias, que utilizavam a ferrovia como forma de distribuição da sua produção para o mercado de todo o país.

Seu desenvolvimento está intrinsecamente ligado à ferrovia e, ao analisar-se minuciosamente os planos urbanísticos implantados na cidade de São Paulo, bem como seu desenvolvimento viário, é possível verificar que os bairros industriais, para além do Tamanduateí, tais como a Mooca, Brás e Belenzinho ficaram à margem dos planos urbanísticos, direcionadas à área central e aos loteamentos da elite. Com a ausência de um zoneamento abrangente, que incluísse os bairros operários, o fator de ordenação espacial foi a própria ferrovia, onde as atividades industriais se mesclam aos núcleos terciários e habi-tações operárias, possuindo uma organização orientada principalmente por fatores inerentes à ferrovia.

Recentemente, com a passagem da economia industrial para uma economia voltada ao setor terciário, a estrutura estabelecida ao longo da orla ferroviária perde suas funções e a ocupação industrial passa por um processo de esvaziamento. Observa-se então um território fragmentado e descaracterizado, com funções obsoletas e terrenos vagos, de forma que a linha férrea que foi responsável pelo desenvolvimento do bairro hoje se configura como uma barreira e um obstáculo ao pedestre, sendo responsável pela fragmentação do bairro e tendo como principal elemento para articular as porções divididas pela linha férrea a própria estação da CPTM.

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A presença da ferrovia na superfície tem como consequência o entrave na comunicação entre os lados, tornando realidade o problema da malha urbana descontínua, descaracterizada ou sem identidade definida, cujas edificações com frequência voltam as costas para a barreira ferroviária.

O posicionamento da ferrovia, em superfície, limitou as soluções para sua transposição a viadutos e passarelas, que hoje apresentam uma quantidade insuficiente. A construção de novas passagens sobre a ferrovia não resolve esse problema, podendo tornar mais evidente a necessidade de recon-duzir o cruzamento ao nível do solo.

O Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo identifica como território estratégico para estruturação dinâmica a orla ferroviária e consequentemente para o Brás, pois concentra atividades econômicas e espaços produtivos em processo de transformação.

A Lei de Parcelamento, uso e Ocupação do Solo estabelece para o bairro do Brás usos cujo ob-jetivo é a promoção do adensamento construtivo, populacional, atividades econômicas e serviços públicos com diversificação de atividades e a qualificação paisagística dos espaços públicos de forma a adequar o uso do solo à oferta de transporte público coletivo.

A relação a seguir apresenta recomendações que complementam as propostas do Plano Diretor e da lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo, no que tange ao adensamento urbano, a requa-lificação urbana, a fragmentação do território causada pela linha férrea e principalmente o espaço público para o pedestre.

• Estabelecimento de usos diversificados, tais como educacional, saúde, cultural e habitacional, privilegiando HIS (Habitação de Interesse Social) e HMP (Habitação de Mercado Popular); incentivando assim a pluralidade econômica;

• Resgate dos espaços públicos através da apropriação coletiva;

• Recuperação de áreas degradadas, privilegiando zonas onde haja habitações precárias e zonas de fronteira;

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• garantir que os espaços públicos tenham usos adequado e inclusivo a todos os habitantes, especialmente os portadores de necessidades especiais;

• Adensar áreas subutilizadas, incentivando a moradia popular e otimizando a infraestrutura existente;

• Criação de uma identidade local através da valorização do patrimônio histórico e cultural;

O problema de pesquisa pode então ser dividido em dois tópicos principais: Território fragmentado e tratamento do espaço público para o pedestre.

Em relação à fragmentação do território, os problemas existentes são: dificuldade de transposição da linha com poucos ponto de travessia para pedestres e passarelas existentes encontram-se de-gradadas e inseguras, quadras de grandes dimensões, sistema de circulação descontínuo; áreas subutilizadas, drenagem deficiente, densidades demográficas baixas, além da criação de zonas de fronteira.

Analisando os casos estudados, a cobertura da ferrovia por grandes lajes foi adotada como partido para o problema da fragmentação no projeto de Paris Rive gauche, permitindo a ligação entre os bairros e o Rio Sena além da construção de novos edifícios sobre essas lajes.

Recomenda-se para a área objeto de estudo uma operação a longo prazo, podendo incluir a co-bertura da linha férrea, total ou em pontos específicos, de forma que fosse possível a continuação das ruas transversais existentes, criando uma ligação entre os fragmentos do bairro, baseada no caso francês. Dessa forma, as porções do bairro, separadas pela linha férrea, estariam ligados por vias seguras, o que resolveria o problema da travessia não só para pedestres, mas também para cadeirantes, ciclistas e carrinhos de bebê, tornando o bairro mais inclusivo. A recomenda-ção também é uma opção para a problemática da fragmentação, caracterizada pela fronteira que a linha ferra representa. Essa recomendação envolve projeto urbano de grande porte e a inter-venção de diversos agentes da sociedade, bem como demanda certo tempo para que comece

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a apresentar resultados. Além do que, a aceitação das consequências ao promover uma região através de intervenções no espaço urbano depende da decisão da autoridade responsável por harmonizar o projeto urbano como um todo, no entanto deve-se pesar a forma de administração dessas intervenções para que questões como a gentrificação e a especulação imobiliária não afetem no resultado da proposta.

Essa perspectiva aponta que a melhor saída para o estabelecimento do tecido urbano nesse trecho seria o rebaixamento do sistema de transporte sobre trilhos. uma intervenção desse porte deve ser realizada a longo prazo e envolveria um trecho de ferrovia maior do que o estudado nessa pesquisa.

A proposta de rebaixamento da linha férrea já havia sido cogitada no ano de 2004, em propos-ta vencedora do concurso do Bairro Novo4, permitindo assim a integração da área do Bairro Novo aos bairros vizinhos. A proposta foi então retomada na Operação urbana Lapa-Brás (2009-2012) tinha como premissa o rebaixamento da linha férrea com a finalidade de reestabe-lecimento do tecido urbano, o melhor aproveitamento da orla ferroviária, a promoção do aden-samento dessa região. Entre outras diretrizes, consta no Termo de Referência da Operação urbana Consorciada a substituição das linhas ferroviárias da CPTM na superfície (considera-das uma barreira para o desenvolvimento da região), por um sistema subterrâneo sobre trilhos, acompanhada da implantação de uma avenida com características de via parque (via urbana), com calçadas largas, ciclovia e arborização por todo o seu percurso. Dessa forma, com as intervenções propostas, buscava-se uma total requalificação desse espaço, o que alteraria substancialmente o desenho do bairro. No entanto, essa intervenção nunca chegou ao detalha-mento que demonstrasse qual a proporção das intervenções e quais seriam as modificações no desenho da região. Atualmente, a Operação urbana Lapa-Brás não está mais em pauta, embo-ra o Pano Diretor Estratégico aprovado no ano de 2014 continue considerando essa uma área potencial e reconhecendo a orla ferroviária como território estratégico para o desenvolvimento metropolitano, julgando necessário o desenvolvimento de projetos urbanos que orientarão as transformações urbanísticas, sociais e econômicas, mas possui planos menos audaciosos.

4 O Concurso do Bairro Novo foi promovido pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil e pela Prefei-tura de São Paulo, voltado para a construção de um bairro predomi-nantemente residencial, na região da Água Branca, uma antiga área industrial atualmente subutilizada, segregada pela ferrovia.

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Para uma operação envolvendo o rebaixamento da linha férrea, é necessário o desenvolvimento de um plano baseado em diretrizes propostas pelo poder público, de acordo com a legislação urbanística vigente, através da participação da sociedade civil, visando uma intervenção benéfica para a cidade. É possível identificar semelhanças entre as operações urbanas brasileiras e a experiência francesa da ZAC, instrumentos que podem ser utilizados para viabilizar projetos de renovação ou reabilita-ção urbana, novos bairros residenciais, implantação de usos industriais, comerciais, de serviços ou turísticos, assim como instalação de equipamentos de uso público, com a possibilidade de envolvimentos de diversos agentes, tais como empresas privadas, sociedade de economia mista com participação pública minoritária, promotores, construtores e sociedade civil minoritária. No en-tanto, no caso da ZAC foi criada uma sociedade de economia mista para a administração de toda a operação. Portanto, para que a experiência francesa seja aproveitada no caso do Brás, pode ser necessária a presença de um agente incorporador.Em relação ao espaço público para o pedestre, os principais problemas apontados por essa pesqui-sa são: Edifícios subutilizados e áreas degradadas e descaracterizadas; equipamentos e mobiliários urbanos insuficientes, deteriorados ou inexistentes; espaços públicos ociosos, iluminação pública ineficiente; áreas de inundação.

MAPA 38: Operação Urbana Lapa – Brás e sua área de abrangência. FONTE: Prefeitura de São Paulo.

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Objetivando tornar a área objeto de estudo eficiente para o pedestre e os espaços públicos mais saudáveis, tem-se a proposta cujas principais recomendações espaciais são: • Requalificar os espaços públicos através do estimulo a atividades de comércio e serviços, prevenindo

o comércio monufuncional, responsável pela frequência intermitente dos espaços públicos;• Preservar e difundir o patrimônio cultural e arquitetônico;• Estimular a integração entre os espaços e os edifícios através do tratamento do pavimento térreo das

edificações e da miscigenação de usos;• Estimular o incremento dos usos de serviços, comércio e habitacionais, inclusive no pavimento térreo,

de modo a promover a vitalidade da região em todos os períodos do dia e em todos os dias da semana; • Induzir o aumento da taxa de permeabilidade do solo e de retenção de águas pluviais, favorecendo

o desempenho da rede de drenagem; • Ampliar a oferta de espaços públicos e áreas verdes induzindo a apropriação pelos usuários;• Regulamentação, normatização e fiscalização do comércio ambulante na região;• Reversão da desvalorização imobiliária e recuperação da função residencial.• Aumento de vias dotadas de ciclovia para facilitar os deslocamentos;• Incentivo aos usos dos imóveis industriais subutilizados ou abandonados para usos que valorizem a

arquitetura original com valor histórico;• Estimular desenvolvimento econômico e social, por meio de incentivo atividades de médio e pequeno

porte, gerando emprego que utilizem mão de obra residente na região.• Incentivo aos usos mais dinâmicos dos passeios públicos, promovendo interatividade entre a

atividades instaladas pavimento térreo das edificações a fim de fortalecer a vida urbana nos espaços públicos através de fachada ativa, evitando a multiplicação de planos fechados na interface entre as construções e o passeio público; e

• Ampliação da rede de iluminação pública, de forma a promover segurança e a indução da apropriação dos espaços públicos no período noturno.

• Preservação dos moradores antigos da região, evitando o processo de gentrificação, através de investimento do poder público para atender à uma demanda da sociedade. Viabilizando o planejamento que atenda a população local e evitando que o o investimento do capital privado, por meio da valorização imobiliária “expulse” a população residente.

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CONSIDERAÇõES fINAIS

O conjunto de recomendações aqui listados tomou como base os casos de estudo e os problemas levantados no capítulo de análise do território do bairro do Brás, tendo como preocupação principal o espaço público destinado ao pedestre a dificuldade que a linha férrea apresenta aos mesmos.

A leitura do território, realizada in loco, ofereceu conhecimento valioso da área objeto de estudo, deixando evidente seus problemas e potencialidades, de forma que nenhuma outra fonte seria ca-paz de fornecer.

A leitura do histórico do Brás a partir dos planos urbanísticos propostos para a cidade de São Paulo comprovou o descaso do poder público no planejamento de bairros operários, fora do perímetro central ou dos loteamentos de elite, o que permitiu que seu crescimento fosse orientado pela de-manda da ferrovia, sendo o bairro do Brás o primeiro bairro suburbano da cidade de Sã Paulo.

Foram analisados três estudos de caso, com características similares, de forma a filtrar as melhores práticas e utiliza-las para a produção das recomendações para a requalificação da área objeto de estudo. Todos os casos se situam em regiões que apresentavam uma grande acessibilidade e vita-lidade econômica, proporcionadas pela proximidade com as instalações ferroviárias e a alteração da economia industrial para a economia voltada para o setor terciário, que deixou como sequela a desarticulação e um tecido fragmentado, representado por glebas vazias, galpões industriais abandonados e/ou subutilizados. Tanto no Projeto Eixo Tamanduateí quanto no caso da orla fer-roviária de Berlim, percebe-se uma falha na condução dos projetos, o que ocasionou, no caso de Berlim, altas taxas de desemprego, alta vacância imobiliária e falta de investidores, que geraram dúvidas sobre a viabilidade do projeto e os verdadeiros objetivos das intervenções de grande por-te na região e, no caso do Eixo Tamanduateí, uma pequena quantidade de melhorias urbanas e a incapacidade de criação de espaços públicos de qualidade, não havendo então qualquer avanço

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social relevante. Isso leva a crer que a condução no processo de requalificação urbana, princi-palmente em operações de grande porte, deve utilizar como ferramenta um agente incorporador, como no caso de Paris Rive gauche, capaz de gerir os demais agentes envolvidos no processo, não permitindo que uma certa camada da sociedade se privilegie, deixando as camadas mais vul-neráveis à margem. Foi possível então relacionar os casos apresentados ao que se deseja para a orla ferroviária de São Paulo: adensamento populacional em local dotado de infraestrutura urbana e de transportes, criação de empregos através do incentivo para novos setores da economia se instalarem no local e utilização de tecido residual para chegar a esse objetivo.

Finalmente conclui-se que o bairro do Brás possui um grande entrave ao seu desenvolvimento, caracterizado pela barreira que a linha ferra representa, mas dispõe de potencialidades que justi-ficam uma requalificação. A pesquisa aqui realizada esteve sempre direcionada a obter resultados que ofereçam à orla ferroviária do bairro do Brás uma mudança sensível de seus ambientes, com ênfase no tratamento do espaço público, de forma que a mobilidade do pedestre seja beneficiada, agregando assim valor ao bairro como um todo.

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