A Expansao Arabe Na Africa e Os Imperios Negros de Gana Mali e Songai Secs. VII XVI Segunda Parte

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A expansão árabe na África e os Impérios negros de Gana, Mali e Songai (sécs. VII-XVI) - Segunda Parte Ricardo da Costa (Ufes) IV. Civilizações negras ao sul do Saara (1): a Terra dos Maqzara e o reino de Tekrur 21. Feira livre em Atar (cidade a oeste da Mauritânia) No extremo oeste da África setentrional, entre os atuais países de Mali e da Mauritânia, ao longo do rio Níger até mais a oeste, na escarpa do Tagant, com limite ao sul nos rios Senegal e Bakoy, desenvolveram-se as primeiras civilizações negras conhecidas: os Maqzara, o reino de Tekrur, e os famosos Impérios de Gana (Wagadu), ou o “Império do Ouro”, como ficou sendo chamado, e o de Songai (ou de Gao). Essas culturas negras que giravam em torno do Baixo Senegal (nome de toda essa região) foram o resultado de um desenvolvimento autóctone bastante recuado (e de natureza pagão-animista), iniciado provavelmente na era cristã, aliado ao avanço berbere-islâmico em direção ao sul do Saara no século IX. Essa expansão berbere havia se dirigido tanto no leste ao sul do Egito, para obter o controle das minas de ouro do Sudão, quanto no oeste ao sul de Magreb, e aqui no Baixo Senegal a expansão basicamente tivera como motivação o desejo de dominar as rotas cada vez mais desenvolvidas dos tráficos de ouro, de sal e de escravos, este último um tráfico que nunca parou de crescer desde então até meados do século XIX (KI-ZERBO, s/d: 130). O tráfico de escravos escravos que eram utilizados em sua maior parte no serviço doméstico ou como soldados acontecia tanto no sentido do sul para o norte do Saara quanto o inverso. (DAVIDSON, 1992: 146.) Apesar das dificuldades naturais de se atravessar o deserto, muitas caravanas de muçulmanos cruzavam o Saara a oeste para comerciarem escravos, sal, cavalos e metais (ouro e cobre) com as populações negras. Os berberes também compravam dos negros marfim, peles de animais, plumas de avestruz e sementes de cola (com cafeína); em troca, traziam cobre, espadas decoradas de Damasco, louças e talheres finos.

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A expansão árabe na África e os Impérios negros de Gana,

Mali e Songai (sécs. VII-XVI) - Segunda Parte

Ricardo da Costa (Ufes)

IV. Civilizações negras ao sul do Saara (1): a Terra dos Maqzara e o reino

de Tekrur

21. Feira livre em Atar (cidade a oeste da Mauritânia)

No extremo oeste da África setentrional, entre os atuais países de Mali e da

Mauritânia, ao longo do rio Níger até mais a oeste, na escarpa do Tagant, com

limite ao sul nos rios Senegal e Bakoy, desenvolveram-se as primeiras civilizações

negras conhecidas: os Maqzara, o reino de Tekrur, e os famosos Impérios de Gana

(Wagadu), ou o “Império do Ouro”, como ficou sendo chamado, e o de Songai (ou

de Gao). Essas culturas negras que giravam em torno do Baixo Senegal (nome de

toda essa região) foram o resultado de um desenvolvimento autóctone bastante

recuado (e de natureza pagão-animista), iniciado provavelmente na era cristã, aliado ao avanço berbere-islâmico em direção ao sul do Saara no século IX.

Essa expansão berbere havia se dirigido tanto no leste ao sul do Egito, para obter

o controle das minas de ouro do Sudão, quanto no oeste ao sul de Magreb, e aqui

no Baixo Senegal a expansão basicamente tivera como motivação o desejo de

dominar as rotas cada vez mais desenvolvidas dos tráficos de ouro, de sal e de

escravos, este último um tráfico que nunca parou de crescer desde então até

meados do século XIX (KI-ZERBO, s/d: 130). O tráfico de escravos – escravos que

eram utilizados em sua maior parte no serviço doméstico ou como soldados –

acontecia tanto no sentido do sul para o norte do Saara quanto o inverso. (DAVIDSON, 1992: 146.)

Apesar das dificuldades naturais de se atravessar o deserto, muitas caravanas de

muçulmanos cruzavam o Saara a oeste para comerciarem escravos, sal, cavalos e

metais (ouro e cobre) com as populações negras. Os berberes também

compravam dos negros marfim, peles de animais, plumas de avestruz e sementes

de cola (com cafeína); em troca, traziam cobre, espadas decoradas de Damasco, louças e talheres finos.

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Partindo-se do Magreb (de Fez, mais a oeste, ou mesmo de Trípoli), os viajantes

islâmicos utilizavam quatro rotas conhecidas através do deserto para chegar a quatro importantes pontos de comércio ao sul. Da esquerda para a direita:

1) De Awdaghost e Tekrur (na Mauritânia atual) para Tindouf, até Marrakech,

Fez e Túnis;

2) De Tombuctu (no Mali) também para Fez e Túnis, mas passando por

Taouden;

3) De Gao (também no Mali) para Trípoli, passando por Ghadames;

4) De Agadez, mais ao centro, no Níger, também para Trípoli, passando por

Ghadames ou por Murzuk.

22. Mapa das rotas pré-coloniais da África Setentrional

Graças a essas regulares rotas de comércio transaarianas estabelecidas pelos

berberes islamizados é que se tem notícia escrita das civilizações negras ao sul do

Saara. Um viajante e geógrafo muçulmano chamado al-Bakri (século XI) escreveu

a principal fonte para essa região, um livro chamado Descrição da África (de

1087). Abu Ubayd al-Bakri, filólogo, poeta, geógrafo, historiador e erudito

religioso, viveu em Qurtuba (Córdoba), Al Mariyya (Almeria) e Ishbiliya (Sevilha),

onde morreu em 1094. Ele ficou conhecido por seus comentários a várias obras,

principalmente o Sharth Kitav al amthal de Abu Ubayd al-Qasim ibn Sallam, e o Al

'Ali fi sharh al amáli, de al-Qali. A intenção desses comentários muito difundidos na

Idade Média era esclarecer os casos em que o significado desejado por um

conhecido autor não estava claro. Então o comentarista explicava as expressões

pouco comuns e fazia as necessárias correções para os novos e futuros leitores.

(Poetas andalusíes sevillanos)

Embora al-Bakri, da mesma forma que Tácito em sua obra Germânia (no século I),

nunca tenha ido pessoalmente à região que descreve em sua obra, ele conversou

com viajantes e comerciantes, além de consultar obras de geógrafos muçulmanos,

e pôde assim fazer um precioso registro de segunda mão sobre aquelas culturas

negras. (KI-ZERBO, s/d: 131-141; Al-Bakri’s online guide to Ghana Empire)

23. Mapa das culturas negras de Tekrur, Awdaghost e Gana

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In: KI-ZERBO, Joseph. História da África Negra I. Lisboa: Publicações Europa-América, s/d, p. 137.

Assim, tomando como base esse depoimento muçulmano (e de outros, como

veremos), sabemos que, já a partir do século IX, uma confederação de tribos

berberes sob o comando de Tilutan (836-837) – os lemtunas, os mesufas e os

djoddalas – conseguiram impor sua autoridade sobre vários grupos negros e

negro-berberes instalados ao redor de um povoamento chamado Awdaghost, que

ficava bem no centro da região do Baixo Senegal. Todas essas culturas próximas a

Awdaghost tinham uma defesa natural que as protegiam de ataques, as escarpas do Tagant, que formam um grande semicírculo natural protetor naquela região.

Outro escritor islâmico, Al-Idrisi (Abu al-Idrisi, muçulmano de Ceuta, no Marrocos,

educado em Córdoba, na Espanha) (RONAN, 2001: 113) nos informa que o nome

desse reino era País de Qamnuriya (Mauritânia) ou Terra do Maqzara dos Negros

(Ard Maqzarati es Soudan). Bem no centro da rota do sal, de Buré ao sul até

Teghazza, esse reino teria tanto no sul quanto no norte um povoamento

concentrado em um cinturão de cidades: ao sul, Awlil, Sila, Tekrur, Daw e Barissa;

ao norte Qamnuriya e Nighira. No entanto, na época da chegada dos berberes

islâmicos, as rotas com o sul (Senegal) teriam desaparecido, restando o contato e

comércio com o norte islâmico.

*

Um pouco à esquerda do reino de Maqzara, havia outro importante reino negro, na

trilha da famosa “rota saariana do ouro” (que passava por Walata e Sidjilmasa até

Fez): era o reino do Tekrur. No século IX, esse reino era governado por uma dinastia peule vinda de Hodh: eram os Dia Ogo.

24. Tipo de construção na área rural da Mauritânia

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O Tekrur, segundo Al-Idrisi, era um reino com um soberano independente, que

possuía tropas e escravos, e era muito famoso por seu senso de justiça. Com um

comércio ativo, o reino de Tekrur importava lã, cobre e pérolas do Marrocos e exportava ouro e escravos para o norte berbere-muçulmano.

Aqui faço um breve parêntese para a questão da escravidão. Muito antes da

chegada dos brancos europeus, as tribos, reinos e impérios negros africanos

praticavam largamente o escravismo, da mesma forma os berberes e demais

etnias muçulmanas. Imaginar os portugueses, castelhanos e italianos lançando

seus marinheiros em caçadas aos negros no coração das florestas africanas não resiste ao menor exame histórico.

O Islamismo praticou desde cedo o escravismo. Antes mesmo de Maomé, já no

século VI mercadores árabes freqüentavam todos os portos da costa oriental da

África, trocando cereais, carnes e peixes secos com tribos bantus por escravos. As

populações negras também consideravam a escravidão um fato normal. Por

exemplo, nas minas de sal-gema de Targhaza (exatamente na rota do Tekrur em

direção a Marrakech), milhares de negros morriam para prover uma caravana de

camelos cada vez maior de ano a ano – por volta de 1200 eram entre cinco e seis

mil camelos que transportavam esse sal para o sul. Outro bom exemplo é o rei de

Mali, Mansa Mussa (1312-1332): negro e muçulmano, quando chegou ao Cairo em

peregrinação a Meca em 1324, trouxe consigo quinhentos escravos, também

negros, cada um com uma bola de ouro na mão (tratarei mais adiante de Mansa Mussa) (HEERS, 1983: 79; DE BONI, 2003: 317-333).

*

Por fim, a base alimentar do povo do reino do Tekrur era o milhete (um tipo de

milho pequeno), peixe e leite (ROSENBERGER, 1998: 338-358.). Vestiam lã (os

mais poderosos) e algodão (a maior parte da população). Seu primeiro rei a

converter-se ao Islamismo foi War Jabi Ndiaye. Com ele, todos os súditos também se converteram (Jabi Ndiaye morreu em 1040) (KI-ZERBO, s/d: 133).

V. Civilizações negras ao sul do Saara (2): o Império de Gana (c. 300-1075)

25. O Império de Gana

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O reino de Gana é chamado assim por causa do título de seus soberanos. Era

também chamado de Ugadu (país dos rebanhos). Nessa época, o clima era

bastante úmido, o que favorecia a criação de gado e a agricultura. Por volta do

século IX, viviam na região do Hodh e do Auker pastores de origem berbere e

cultivadores negros sedentários que, com o passar do tempo, se mesclaram. Em

876, outro cronista muçulmano, Iacub, escreveu: “O rei de Gana é um grande rei.

No seu território encontram-se minas de ouro e ele tem sob sua dominação um

grande número de reinos” (citado por KI-ZERBO, s/d: 135).

V.1. Gana renasce na descrição de Al-Bakri

Em 970 o viajante muçulmano Ibn Hawkal viajou de Bagdá até a margem do rio

Níger, e não hesitou em dizer do imperador de Gana: “É o mais rico do mundo por

causa do ouro” (citado por KI-ZERBO, s/d: 133). Um século depois, outro cronista,

Al-Bakri nos dá informações mais precisas, como disse, em sua obra Descrição da

África (de 1087). É esse texto, essa fonte que a partir de agora abrimos espaço para descrever o reino de Gana. (Al-Bakri’s online guide to Ghana Empire)

26. A mesquita de Djenne (Jenne, Djena), no Mali

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A mesquita de Djenne era um dos principais centros de peregrinação islâmica nas regiões meridionais do

Saara e a cidade um importante entreposto comercial entre a África do Norte e a África Sudanesa. Djenne fica localizada no centro-sul do Mali, próxima a um dos vales do rio Níger.

V.1.1. O reino de Gana

Al-Bakri nos conta:

O reino de Gana está povoado pelos povos de Soninke, que chamam sua terra de Wagadugu ou Wagadu. O nome Gana é o título do rei que governa aquele império. O Estado de Soninke é forte, e seu rei controla 200.000 soldados, 40.000 dos quais arqueiros que protegem as rotas de comércio de Gana. O poder do rei de Gana provém do monopólio da enorme quantidade de ouro produzida em seu reino. Esta riqueza permite aos de Soninke construir e manter enormes cidades, além de uma capital com uma população estimada entre 15.000 e 20.000 habitantes. Soninke também usa sua riqueza para desenvolver outras atividades econômicas, tais como a tecelagem, a ferraria e a produção agrícola.

27. Arqueiro de terracota, de Mali (séc. XIII-XV?)

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61,9 cm de altura

V.1.2. A capital de Gana

A capital de Gana é chamada Kumbi Saleh. A cidade consiste na reunião de duas cidades que se unem em uma planície, a maior delas habitada por muçulmanos e com doze mesquitas (ver imagem 28). Kumbi Saleh possui também um grande número de juízes e de homens instruídos. Ao redor de ambas as cidades há poços de água doce e potável, e próximos a eles, terras cultivadas com vegetais. A cidade habitada pelo rei está a seis milhas da outra cidade (muçulmana) e é chamada de Al-Ghana. A área entre as duas cidades é coberta com casas feitas de pedra e de madeira. O rei tem um palácio e choças de formato cônico, cercadas por paredes. Na cidade do rei, não muito longe da corte de justiça real, há uma mesquita. Os muçulmanos que vêem em missões ao rei podem rezar ali. Há ainda uma grande avenida, que cruza a cidade de leste a oeste.

28. Figura eqüestre de terracota, de Mali (séc. XIII-XV?)

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70,5 cm de altura

V.1.3. O rei de Gana

O rei adorna a si mesmo como se fosse uma mulher, usando colares ao redor do pescoço e braceletes em seus antebraços. Quando se senta diante do povo, fica sobre uma elevação decorada com ouro e se veste com um turbante de pano fino. A corte de apelação fica em um pavilhão abobadado, com dez cavalos estacionados e cobertos com um tecido bordado com ouro. Atrás do rei ficam dez pajens segurando escudos e espadas, ambas decoradas com ouro. À sua direita ficam os filhos dos vassalos do país do rei, vestindo esplêndidas roupas e com os cabelos trançados com ouro. O governador da cidade senta-se na terra diante do rei e os ministros ficam do mesmo modo, sentados ao redor. Na porta do pavilhão estão cães de excelente pedigree e que dificilmente saem do lugar de onde o rei está, pois estão ali para protegê-lo. Os cães usam ao redor de seus pescoços colares de ouro e de prata cheios de sinos com o mesmo metal. A audiência é anunciada pela batida em um longo cilindro oco que se chama daba. Quando os povos que professam a mesma religião se aproximam do rei, caem de joelhos e polvilham suas cabeças com pó, uma forma de mostrar respeito por ele. Quanto aos muçulmanos, eles cumprimentam-no somente batendo suas mãos. (Al-Bakri’s online guide to Ghana Empire)

29. Vila de Songo, no Mali, com pequena mesquita ao centro

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Os tipos de “casas cônicas” descritas por Al-Bakri em sua obra ainda podem ser vistas no Mali, como mostra a

fotografia acima da Vila de Songo, no Mali.

V.1.4. A economia e a justiça em Gana

O rei cobra o imposto de um dinar de ouro para cada carga de asno com sal que entra em seu país, e dois dinares de ouro para cada carga de sal que sai. (dinar era uma moeda de ouro criada pelos califas muçulmanos; seu equivalente em peso era o mitkal - 4,722 gramas). Os impostos são cobrados também pelo cobre e qualquer outra mercadoria que entra e sai do Império. O melhor ouro do país vem de Ghiaru, uma cidade distante da capital 18 dias de viagem. Todas as peças de ouro que são nativas e encontradas nas minas do Império pertencem ao soberano, embora ele deixe o povo ter um pouco de ouro em pó, isso certamente com o conhecimento de todos. Sem essa precaução, o ouro não só se tornaria abundante como praticamente perderia seu valor. Quando um homem é acusado de negar um crime, um chefe pega um barril fino de madeira ácida e amarga de provar e coloca nela um pouco de água. Depois disso, ele dá essa bebida ao réu para que a beba. Se o homem vomita, sua inocência é reconhecida e ele é felicitado. Se não vomita e a bebida permanece em seu estômago, a acusação é aceita e justificada.

30. Mesquita de Bandiagra, no Mali

Bandiagra: quatro mulheres da etnia dos dogons, com seus trajes típicos, em frente à mesquita, tendo à

frente um sorridente homem com uma coroa e vestido com um tecido cor de vinho. Todos estão descalços.

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Observe o belo contraste entre as cores dos personagens e o tom amarelo-tijolo do cenário.

V.1.5. A religião em Gana

Ao redor da cidade do rei há choupanas abobadadas e bosques onde vivem os feiticeiros, homens encarregados de seus cultos religiosos. Ali se encontram também os ídolos e os túmulos dos reis. Estes bosques são guardados: ninguém pode entrar ou descobrir seus recipientes. As prisões dos vivos também estão ali, e se alguém é aprisionado lá, nunca mais se ouve falar dele. Quando o rei morre, constroem uma enorme abóbada de madeira no lugar do enterro. Então trazem-no em uma cama levemente coberta e colocam-no dentro da abóbada. A seu lado colocam seus ornamentos, suas armas, e os recipientes que ele usava para comer e beber. A serpente é a guardiã do Estado e vive em uma caverna que lhe é devotada. Quando o rei morre, seus possíveis sucessores se reúnem em uma assembléia, e a serpente é trazida para picar um deles com seu focinho. Essa pessoa é então chamada para ser o novo rei.

A descrição de Al-Bakri é sucinta e clara. A população de Gana, rodeada de hortas,

pepinos, palmeirais e figueiras, vivia assim em uma espécie de oásis protetor na

fronteira sul do deserto. Como disse acima, a mesquita de Djenne tornava a região

um importante centro islâmico, com um comércio bastante próspero. Al-Bakri nos

diz a respeito: “A criação de carneiros e de bois é aí particularmente próspera. Por

um simples mitkal (moeda de ouro equivalente ao dinar – 4,722 gramas) podem-

se comprar pelo menos dez carneiros. Encontra-se muito mel, que vem do país

dos Negros. As gentes vivem desafogadamente e possuem muitos bens” (citado

em KI-ZERBO, s/d: 136).

O escritor muçulmano não se esquece da cozinha e a graça das moças da terra:

“Encontramos também jovens com uma linda cara, tez clara, corpo esbelto, seios

direitos, cintura fina, ombros largos, ancas abundantes, sexo estreito, etc” (citado

em KI-ZERBO, s/d: 136).

Embora devamos ter uma prudência em relação aos textos dos cronistas

muçulmanos, pois, como disse, alguns deles foram redigidos com base em

narrativas orais e consulta a obras, não no local, a obra de Al-Bakri nos sugere um

grau de islamização ainda bastante fraco das populações negras (André Miquel é

ainda mais rigoroso: “No Ghâna, de resto directamente atingido pelo choque

almorávida, tanto o povo como o rei ter-se-iam mantido pagãos, sòmente sendo tocados pelo Islame os intérpretes e certos funcionários...”. MIQUEL, 1971: 216).

Tanto o rei, que ainda era escolhido com base em tradições animistas – a picada

da deusa-serpente –, quanto uma parte do povo teriam ainda se mantidos pagãos

(embora se deva observar que a cidade com maior densidade demográfica descrita

por Al-Bakri era a muçulmana, com suas doze mesquitas). Segundo Ki-Zerbo, esse

era o culto do deus-serpente do Uagadu (Uagadu-Bida), antepassado-totem dos

Cissés: “Segundo a lenda, saía da toca no dia da entronização dos reis e recebia

em sacrifício anualmente a mais bela rapariga da terra. Um dia, diz-se, Maghan,

vendo a sua noiva, a jovem virgem Sai, entregue à serpente, matou o réptil. Mas o

pitão era o deus da fecundidade. Teria sido o seu desaparecimento que

desencadeara a desertificação do país” (KI-ZERBO, s/d: p. 138). Deve-se ainda

atentar para o fato de o Império ter, segundo as estimativas dos especialistas, cerca de um milhão de habitantes (DAVIDSON, 1992: 147).

De resto, Al-Bakri parece ter delimitado bastante bem a separação entre as duas

culturas religiosas naquele momento: um bom exemplo disso é a saudação das

pessoas quando se aproximavam do rei. Os animistas jogavam terra em sua

cabeça em sinal de respeito, os muçulmanos batiam palmas, notável e marcante

diferença que mostra o ainda baixo grau de penetração islâmica junto ao rei e à

corte de Gana. Em suma, sabemos da existência desse rico império negro e

escravocrata graças aos viajantes islâmicos e à presença muçulmana na região,

com seu grupo letrado, mas que ainda não se misturara efetivamente com a

população autóctone, nem conseguira penetrar na casa real, ainda de forte

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tradição animista.

Para finalizar, como eram fisicamente os homens de Gana? Outro cronista islâmico

que viveu duzentos anos depois de al-Bakri, o historiador al-Umari (1301-1349),

nos informa que o povo era “alto, de compleição preta retinta e cabelos

encrespados”. Um dos informantes de al-Umari lhe disse que “o ouro é extraído

cavando-se buracos na profundidade que chegam à altura de um homem e são

encontrados embutidos nas laterais dos buracos, ou às vezes no fundo deles” (DAVIDSON, 1992: 148).

Os séculos IX e X viram o apogeu do império negro de Gana. No entanto, no

século XI, com o avanço almorávida, aqueles territórios foram teatro de grandes

convulsões, como veremos a seguir.

VI. A gesta dos almorávidas (c. 1056-1147)

31. O Império Almorávida em sua maior extensão (c. 1110)

Os almorávidas, cuja dinastia começou em 448 (20 de março de 1056), eram formados por várias tribos que se diziam descender de Himyar. As mais célebres são as de lamtuna (ou lemtuna), da qual o príncipe dos crentes Ali ibn Taxufin faz parte, e os chadala. Saídas do Yêmen nos tempos de Abu Bakr Siddiq, que as enviou para a Síria, elas passaram depois para o Egito e depois se transferiram para o Magreb, com Musa ibn Nusayr. Seguiram depois para Tariq até o Tanger, mas seu gosto pelo isolamento as empurraram para o interior e ali habitaram até a época que vamos tratar (Kamil fi-l-Tarij, de Ibn al-Athir. In: SÁNCHEZ-ALBORNOZ, 1986, tomo II: 108).

No século XI, do Saara Espanhol ao Marrocos, surgiu um poderoso movimento

berbere islâmico que varreu a costa setentrional da África até chegar à Península

Ibérica, conferindo um novo caráter e dramaticidade tanto às culturas da África do

Norte quanto à Reconquista Ibérica cristã. Para entendê-lo, é preciso levar em

conta que, durante muito tempo, os berberes, como vimos, foram reticentes com o

Islã, mas depois de terem se convertido transformaram-se em uma das etnias africanas que abraçaram a fé do Corão com mais força.

No entanto, no século X, o Islamismo ainda era praticado em muitas áreas

orientais africanas de maneira bastante permissiva. Isso ocorria especialmente

com muitas tribos de chefes berberes da costa atlântica da Mauritânia, como os

sanhadjas. Por exemplo, eles cumpriam a obrigação da peregrinação a Meca

somente como uma formalidade política. Assim, ao retornar de Meca e parar em

Kairuan, Yaya ibn-Ibrahim, chefe dos djoddalas, foi se consultar com um sábio

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muçulmano de nome Abu Amiru (de Fez) e foi repreendido por este por sua

ignorância em relação à fé. O sábio, chocado com o baixo nível de conhecimento

da Lei corânica dos djoddalas, decidiu procurar um teólogo para instigá-lo a ir até

àquele povo berbere e guiá-lo à luz da verdade sagrada. Encontrou Abdallah ibn

Yacine, um grande letrado da cidade de Sidjilmasa, que aceitou ir pregar entre os djoddalas.

Contudo, os berberes o receberam muito mal. Não gostaram nem um pouco das

práticas ascéticas de Yacine, queimaram sua casa e o expulsaram. Yacine então se

retirou (cerca de 1030) com dois discípulos da etnia berbere dos lemtunas, Yaya

ibn Omar e seu irmão Abu Bakr (não confundir com o califa do mesmo nome do

século VII), para algum lugar desconhecido da costa atlântica. Foi então que

começaram a receber adeptos. Quando chegaram ao milhar, Ibn Yacine batizou-os de Al-Morabetin (aqueles do ribat), palavra que deu origem a almorávida.

O ribat era uma espécie de convento militar muçulmano erguido nas fronteiras do

dar al-islan (a “Casa do Islã”) e que acolhia voluntários piedosos que desejavam se

retirar do mundo e que ali ficavam sob as ordens de um veterano (sheikh) para se

purificar e sair em missões conforme o desejo do sheikh (DEMURGER, 2002: 43.

Demurger define o ribat em uma obra dedicada às ordens militares cristãs porque

muitos historiadores consideram o ribat o antecessor islâmico das ordens militares e o autor discute essa tese, da qual discorda).

A idéia de posto de vigília e mosteiro fortificado foi mais tarde valorizada pelo sufismo:

Os sufis levavam um modo de vida que buscava a união com Deus por meio do

amor, do conhecimento baseado na experiência e ascese que levaria a uma união

estática com o Criador bem-amado. Essa invocação tinha o objetivo de desviar a

alma das distrações mundanas para libertá-la até o vôo da união com Deus. Uma

das formas do dhikr era um ritual coletivo chamado justamente de hadra: os

participantes repetiam constantemente o nome de Alá, cada vez mais rapidamente

até se chegar a um transe e perda da consciência do mundo sensível” (COSTA, 2002: 73-74).

No tempo dos almorávidas não se têm notícias desse sentido preciso de guarnição

religiosa. Nessa época, a palavra ribat significava “sua seita, seu corpo, suas

forças, sua guerra santa”. O único autor que empregou a palavra precisa de rabita

(fortaleza) foi Ibn Abi Zar, em sua obra Rawd al Qirtas (de 1326), portanto, duzentos anos depois do período de Yacine (KI-ZERBO, s/d: 143).

A missão dos almorávidas era impor a verdadeira fé pela força aos não-crentes. A

partir de 1042, eles se lançaram em uma furiosa jihad a partir das regiões do

Adrar e do Tagant, ambas hoje no coração do Saara Espanhol, contra os djoddalas

e os lemtunas, tendo Yacine como chefe espiritual e Yaya como general. Negros do

Tekrur logo se juntaram a eles, desejosos de se opor ao Império de Gana. Yaya foi

expulso do exército, por não concordar com os saques e violações cometidos por

seus soldados. Após um breve e novo retiro espiritual, ele conseguiu novas

adesões de discípulos e se lançou novamente no deserto. Isso, somado à pregação

religiosa de Yacine, fez com que as forças almorávidas ganhassem uma grande

adesão de soldados (cerca de 30.000 homens armados de lanças, machados,

maças, a pé, a cavalo e em camelos). Esse motivado exército religioso varreu todo o Sudão ocidental.

Yaya morreu em 1056 em uma batalha contra os djoddalas próxima a Atar. Yacine

atacou o Marrocos (Maghreb el-Acsa) e morreu no ano seguinte, quando os

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almorávidas passaram a ser dirigidos pelo emir Abu Bakr. Este fundou em 1062 a

cidade de Marrakech, apoderou-se de Fez, Tlemcen (capital dos zenatas) e alargou

seu poder até Argel. Depois disso, Abu Bakr retornou para o sul e se instalou no Tagant, decidido a atacar e submeter o Império negro de Gana.

32. Mesquita de Koutoubia, Marrakech (séc. XII)

VI.1. Os almorávidas na Península Ibérica

Mas antes de tratar do declínio de Gana e de sua derrota para as forças

almorávidas, abro um pequeno parêntese à conquista almorávida da Península

Ibérica (1092-1094), devido à sua importância para o processo da Reconquista

cristã. Nas palavras do conde D. Pedro de Portugal, filho bastardo do rei D. Dinis e

famoso cronista do século XIV, os almorávidas eram “os melhores cavaleiros que

os mouros tinham” (Crónica Geral de Espanha de 1344, 1990, vol. IV, cap.

DLXVIII: 34). Esses monges-soldados muçulmanos haviam declarado uma guerra

santa contra “os muçulmanos depravados dos reinos ibéricos” (CAHEN, 1992:

295).

33. O movimento almorávida – do Saara Espanhol à Península Ibérica (c. 1042-1087)

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In: KI-ZERBO, Joseph. História da África Negra I. Lisboa: Publicações Europa-América, s/d, p. 144.

Mesmo antes da invasão almorávida na Península Ibérica, os governantes dos

reinos de taifas, mais tolerantes com a convivência e a afinidade entre moçárabes

e andaluzes, já não se interessavam pela guerra santa. A palavra taifa (que

significa “partido, facção”) designa os principados que se constituíram na Hispânia

sobre os restos do califado omíada de Córdoba (MIQUEL, 1971: 216). Por

exemplo, o rei de Granada, „Abd Allãh Nãsir, conta em suas memórias que o hadjib

Almançor (Muhammad ibn Abi „Amir) não conseguiu convencer os andaluzes a

fazer a guerra, pois eles “...declararam-se incapazes de participar nas suas

campanhas e alegaram (...) que não se achavam preparados para combater e, por

outro lado, que a sua participação nas campanhas os impediria de cultivar a terra” (MATTOSO, 1985: 194).

Outro bom exemplo da nova mentalidade dicotômica desses invasores berberes é a obra Ódio a cristãos e judeus do pensador cordovês Ibn Abdun (séc. XII):

Um muçulmano não deve fazer massagem em um judeu nem em um cristão, nem tirar suas sujeiras ou limpar suas latrinas, pois o judeu e o cristão são mais indicados para essas atividades, que são tarefas para gentes vis (…) Deve proibir-se às mulheres muçulmanas que entrem nas abomináveis igrejas, pois os clérigos são libertinos, fornicadores e sodomitas” (Tratado de Ibn Abdun. In: SÁNCHEZ-ALBORNOZ, tomo II: 219).

Curiosamente, os almorávidas praticavam a cinofagia – morte de cães – uma

prática e hábito culinário pré-islâmico presente em um hadith do profeta: “Os anjos não entram em uma casa onde há um cão”:

A Hadith consiste na tradição oral das tribos que habitavam a Arábia mais os ensinamentos de Maomé que não foram para o Livro, mas que foram se formando através dos anos. Esta tradição é que conta a história do Profeta, dos santos e dos outros profetas menores, entre estes Jesus. Os mulçumanos acreditam também nos gênios, fadas, nos espíritos bons e maus, em práticas mágicas e outras coisas que, proibidas aos fiéis, podem ser usadas pelos descrentes (KHALIDI, 2001: 16-17).

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Eles também inovaram a sociedade dos nômades berberes e as das fronteiras do

mundo negro, trazendo inovações táticas no modo de se fazer a guerra.

Acrescentaram aos exércitos regulares três fileiras de arqueiros – precedendo a

Europa cristã em quase dois séculos na superioridade da infantaria de arqueiros

sobre a cavalaria. Além disso, numa revolução ideológica dos aspectos mentais do

conflito, incluíram grupos com grandes tambores, com o intuito de aterrorizar os inimigos.

34. Exército muçulmano partindo para o ataque (1237)

Iluminura das “Estações de Hariri” (1237), manuscrito da Biblioteca Nacional de Paris. Esta cena representa

uma pequena paragem antes do ataque decisivo, quando tocam as trombetas e rufam os tambores. Ela pode estar se referindo a uma das primeiras batalhas do Islão na Península Ibérica. No entanto, os trajes dos

guerreiros e os jaezes das montadas apontam para uma origem oriental e para a época em que a iluminura foi elaborada. In: MATTOSO, José (dir.). História de Portugal. Antes de Portugal. Lisboa: Editorial Estampa, s/d,

p. 399.

Este novo estilo de guerra, mais agressivo, era marcado basicamente pela

fundamentação religiosa (MATTOSO, 1985: 194). Isto os distinguia dos outros

islamitas andaluzes da Península, desprezados pelos berberes almorávidas. Assim,

aconteceu a partir do século XI uma “internacionalização” do conflito na Península

Ibérica. De um lado, cristãos peninsulares ligados ideologicamente ao restante da

Europa, especialmente ao reino franco; de outro, muçulmanos ibéricos dos reinos

de taifas auxiliados pelo conjunto de aliados da África do Norte, por sua vez

intransigentes na ortodoxia. Nesse contexto deram-se as vitórias portuguesas do

primeiro rei de Portugal, Afonso Henriques, na batalha de Ourique (1146), e na

tomada da cidade de Lisboa (1147), com o auxílio de cruzados vindos do norte europeu.

VI.2. A queda do Império de Gana (1203)

Até esse avanço almorávida, o Império de Gana conseguira suportar os ataques

estrangeiros, tanto de tribos inimigas quanto dos próprios berberes, graças ao seu

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exército composto de guerreiros soldados, cavaleiros e arqueiros – citados por Al-

Bakri em sua obra, como vimos. No entanto, apesar de uma forte resistência, eles

foram derrotados pelos almorávidas e sua capital, Kumbi Saleh, foi tomada e

saqueada, por volta de 1076. Com essa vitória, os almorávidas receberam um

poderoso reforço, devido às conversões dos negros de Gana. Disso nos informa o

cronista Al-Zuhuri: “As gentes do Gana tornaram-se muçulmanas em 1076 sob a influência dos lemtunas” (citado por KI-ZERBO, s/d: 147).

Abu Bakr prosseguia em sua tentativa de unificar as tribos berberes e com elas

atacar Gana. No entanto, morreu em uma escaramuça por causa de uma flecha

envenenada (1087). Gana reconquistou sua independência, mas após a

devastação e saque de sua capital, dez anos antes, o reino negro nunca mais

conseguiu recuperar seu antigo poderio. Pelo contrário, as caravanas passaram a

se desviar das rotas que privilegiavam o coração de Gana, e os comerciantes

passaram a optar por Tombuctu, Gao e Djena. Os muçulmanos ricos se refugiaram

em Walata, especialmente depois do segundo saque da capital, Kumbi, em 1203,

por parte do rei sosso Sumaoro Kanté. Paralelo a esse declínio comercial

aprofundou-se o processo de islamização das etnias negras, embora sem nunca

atingir todas as camadas da população – e, de resto, o islamismo negro era bastante mesclado com práticas animistas.

VIII. O Império de Mali (c. 1235-1500)

A queda do Império de Gana abriu um vácuo de poder. A grande questão era:

quem tomaria agora o controle das rotas comerciais próximas das fontes

auríferas? Os almorávidas fracassaram em sua tentativa de monopolizar o tráfico.

O reino que parecia mais próximo de conseguir esse intento era o reino sosso dos

Kantés, ao sul de Gana. Em 1180, surgiu um guerreiro, Diarra Kanté, de um clã de

ferreiros animistas adversários do Islão. Feiticeiro famoso e de prestígio, Kanté

conseguiu tomar a cidade de Kumbi Saleh, mas sem ocupar as jazidas de ouro,

controladas agora por uma tribo de camponeses, os malinqués (“homem de Mali”).

Kanté, após dominar o Dyara, o Bakunu e o Bumbu, apoderou-se da região do Buré.

35. Mapa do Império de Mali (século XIV)

Kanté foi um pequeno interregno entre dois impérios, Gana e Mali. Quanto ao

segundo, não se conhecem as origens do reino de Mali (ou Mandinga). Diferentes

etnias viviam naquela região. Seus chefes se diziam “caçadores-mágicos”, todos

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com ritos iniciatórios mais ou menos comuns. Esses clãs estavam unidos pelo

chamado “parentesco de brincadeira”, isto é, um curioso direito e dever de fazer

troça uns aos outros. O chefe gozava do monopólio das pepitas de ouro. A

estrutura social baseava-se em uma grande família que dispunha de um campo

comunitário (foroba) próximo à aldeia. Logo um dos herdeiros sosso tomou o título de mansa (ou maghan), isto é, imperador.

Paralelo a esse processo de integração por parte dos sosso acontecia a conversão

ao Islamismo. Baramendana foi o primeiro rei a se converter, graças ao pai de Abu

Bakr, em 1050. A tradição conta que Baramendana estava desesperado por causa

de uma longa seca. Então se dirigiu a um devoto lemtuna que o levou a um monte

para passar uma noite rezando. Pela manhã choveu, e o rei mandou destruir os ídolos animistas e se converteu ao Islamismo.

36. O Império de Mali com seus reinos “vassalos” (século XIV)

In: KI-ZERBO, Joseph. História da África Negra I. Lisboa: Publicações Europa-América, s/d, p. 165.

A partir de 1150 se conhece relativamente bem a cronologia dos reis de Mali.

Hamana, Djigui Bilali (1175-1200), Mussa Keita, Naré Famaghan (1218-1230) e

principalmente Sundjata (ou Mari Djata, o “Leão do Mali”), todos com estórias

recheadas de lendas e mitos e transmitidas também pelos griot, os “transmissores

de ouvido” de cada etnia que passam de geração para geração as tradições de sua cultura.

Na época de Sundjata, Mali era um reino essencialmente agrícola. Os malinqués

desenvolveram a cultura do algodão, do amendoim e da papaia, além da criação

de gado. Sundjata instituiu uma associação de trinta clãs (de artesãos, de

guerreiros, de homens livres – que, no entanto, eram chamados de “escravos da

coletividade”, os ton dyon). Com o crescimento do reino, a categoria dos escravos se multiplicou – recorde que sempre os reinos negros praticaram a escravidão.

Com o filho de Sundjata, Mansa Ulé (1255-1270) e seus sucessores – Abubakar I,

Sakura, Abubakar II – até Mansa Mussa (ou Kandu Mussa, 1312-1332), o reino de

Mali passou a ser conhecido no mundo ocidental. Em 1324, Mansa Mussa realizou

uma peregrinação a Meca, passando pelo Egito e com a intenção de maravilhar os

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soberanos árabes.

37. Figura sentada, Mali (século XIII)

Observe as feições alongadas do rosto do personagem, aliás, de todo o corpo. Pode-se, assim, ter uma noção

do tipo físico predominante então, além de uma contemplação de posturas e gestos corporais.

O Tarikh es Soudan! (1655), de autoria do mouro Es Saadi, nos informa que ele

atravessou o deserto passando por Walata e pelo Tuat com 60.000 mil servidores

(escravos), evidentemente um exagero – as cifras hoje estão por volta de 500.

(HEERS, 1983: 79). Chegou ao Cairo com cerca de duas toneladas de ouro (!), em pó e em pepitas. O cronista Al-Omari (†1349) nos conta:

Quando da minha primeira viagem ao Cairo, ouvi falar da vinda do sultão Mussa (...) E encontrei os habitantes do Cairo todos excitados a contarem as largas despesas que haviam visto fazer às suas gentes. Este homem espalhou pelo Cairo ondas de generosidade. Não deixou ninguém, oficial da coroa ou titular de qualquer função sultânica, sem receber dele uma quantia em ouro. Que nobre aspecto tinha este sultão! Que dignidade e que lealdade! (citado por KI-ZERBO, s/d: 171)

Mansa Mussa foi tão generoso que ao sair do Cairo foi obrigado a pedir um

empréstimo a um riquíssimo mercador de Alexandria, para que pudesse manter sua largueza até chegar a Meca...

Sua peregrinação fez o Império de Mali ser conhecido por todo o mundo, e os

mapas europeus passaram a citá-lo. Por exemplo, o de Angelo Dulcert Portolano

(1339), e o Atlas catalão de Abraão Cresques (1375), elaborado para o rei da

França Carlos V, o Sábio, que traz nitidamente o nome da capital (Ciutat de Melli),

além do rei de Mali, Mansa Mussa, sentado em seu trono e segurando uma pepita

de ouro.

38. Mapa do Norte da África (manuscrito catalão de 1375)

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Este mapa catalão do século XIV do Norte da África tem quatro reis, três africanos: o rei Mansa Musa de Mali

(sentado, com uma gema de ouro na mão direita), o rei de Organa, o rei da Núbia e o rei da Babilônia.

39. Detalhe do mapa do Norte da África (manuscrito catalão de 1375)

Os dois números em vermelho marcam dois textos. São eles: 1. “Toda esta parte tem gentes que ocultam a boca; só se vêem seus olhos. Vivem em tendas e têm caravanas de camelos. Também possuem animais de cujas peles fazem excelentes escudos”. 2. “Este senhor negro é aquele muito melhor senhor dos negros de

Guiné. Este rei é o mais rico e o mais nobre senhor de toda esta parte, com abundância de ouro na sua terra” (tradução literal). Observe que embaixo do globo de ouro que o imperador Mansa Musa segura na mão direita

está a representação da cidade de Tumbuctu. In: DAVIDSON, Basil. “Os Impérios Africanos”, História em Revista (1300-1400). A Era da Calamidade. Rio de Janeiro: Abril Livros / Time-Life, 1992, p. 149.

De regresso para Mali, o imperador trouxe consigo um poeta-arquiteto, Abu Issak,

mais conhecido como Es Saheli. Com ele, construiu a grande mesquita de Djinger-ber, em Tumbuctu.

Os sucessores de Mansa Mussa tiveram dificuldades de manter um território tão

vasto. Depois de Maghan (1332-1336), até Mussa II (1374-1387), o reino de Mali

viu Tumbuctu ser saqueada, além de sucessivos assassinatos palacianos que

enfraqueceram o império. Lentamente a hegemonia passava para o reino de Gao,

que anexava uma a uma as províncias do leste, além de tomar a cidade de Djena,

metrópole comercial. No final do século XV o Tekrur passou para os domínios do

estado volofo. Houve um curto período confuso entre a hegemonia do Mali e do

Gao. Várias etnias foram arrastadas para o movimento dos peules do Bundu,

conduzido por Tenguella I (chamado de “o Libertador”). O imperador do Mali

tentou até uma aliança com D. João II de Portugal, mas nenhuma das missões portuguesas parece ter chegado a seu destino.

40. Mesquita de Djinger-ber, em Tumbuctu (século XIV)

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Ela preserva o mesmo estilo africano, tanto no tipo de material da construção quanto no estilo, reto, simples e

vertical. Observe os paus enfiados nas paredes (como nas outras mesquitas exibidas nas demais imagens): são andaimes usados ao longo dos séculos para restaurar os edifícios de adobe e estuque, após o castigo

sofrido pela construção nas concentradas e breves chuvas anuais.

VIII.1. A religião em Mali

Como todos os reinos negros islamizados desse período, a religião em Mali era um

misto de várias influências, especialmente as pagãs. Por exemplo, Mussa

desconhecia a interdição do Corão de ter mais de quatro mulheres, e os malinqués

comiam carnes proibidas pelo Islão. Sacerdotes com máscaras de aves praticavam

ritos animistas na corte. Em contrapartida, as festas religiosas islâmicas eram

celebradas com grande pompa. As crianças aprendiam o Alcorão, às vezes com

duros castigos – eram postas a ferro, por exemplo.

VIII.2. O imperador e sua corte em Mali (a descrição é de Ibn Batuta)

O cronista muçulmano Ibn Batuta (1307-1377), um dos maiores viajantes da

Idade Média, chegou a Mali quinze anos depois da morte de Mansa Musa, entre os

anos 1352-1353. Em um belo texto medieval, esse notável cronista muçulmano

nos informa o fausto da corte do imperador de Mali (o texto explicativo em

parênteses é de minha autoria):

O sultão tem uma cúpula elevada, cuja porta se encontra no interior de seu palácio e onde ele se senta com freqüência. Tem do lado das audiências três janelas em arco, de madeira, cobertas de placas de prata, e por baixo delas três outras guarnecidas de lâminas de ouro ou de prata dourada. Estas janelas têm cortinados de lã que são levantados no dia da audiência do sultão na cúpula (...) Da porta do castelo saem trezentos escravos, uns com arcos na mão, outros com pequenas lanças e escudos. Uns estão sentados, outros de pé. À chegada do rei, três escravos precipitam-se para chamar o seu lugar-tenente. Chegam os comandantes, assim como o pregador, os sábios juristas, que se sentam à esquerda e à direita, diante dos homens de armas. À porta, de pé, o intérprete dougha em grande aparato. Está soberbamente vestido, em seda fina. O seu turbante está ornado de franjas, que estas gentes sabem fazer admiravelmente. Tem um sabre a tiracolo, cuja bainha é de ouro. Nos pés botas e esporas (...) Tem na mão duas lanças curtas. Uma é de prata, a outra é de ouro. As pontas são de ferro. Os militares, o governador, os pajens ou eunucos e os mesufitas (mercadores berberes e sarakholés) estão sentados no exterior do lugar das audiências, numa longa rua, vasta e com árvores. Cada comandante tem diante de si os seus homens, com as suas lanças, os seus arcos, os seus tambores, as suas trompas, enfim, com os seus instrumentos de música feitos com caniços e cabaças, em que se bate com baquetas e que dão um som agradável (as trompas eram feitas de marfim das presas de elefantes). Cada um dos comandantes tem sua aljava às costas. Tem o seu arco à mão e anda a cavalo (...) No interior da sala de audiências e nas janelas vê-se um homem de pé. Quem desejar falar ao rei dirige-se primeiro ao dougha. Este fala ao dito personagem que está de pé e este último ao soberano. Instala-se então um grande estrado com três degraus debaixo de uma árvore. É o pempi. (segundo Al-Omari, o pempi era uma grande cadeira de ébano, parecida com um trono, com as medidas adequadas a uma personagem alta e gorda. De cada lado, uma defesa de elefante a cobri-lo, uma em frente da outra). É

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coberto de seda e guarnecido de almofadas. Por cima instala-se o guarda-sol, que parece uma cúpula de seda, no alto da qual se vê uma ave do tamanho de um gavião. O rei sai por uma porta aberta num ângulo do castelo. Tem o seu arco à mão e a aljava às costas. Traz na cabeça um solidéu de ouro, fixado por uma pequena faixa também de ouro, cujas extremidades são pontiagudas como facas e com mais de um palmo de comprimento. Na maioria das vezes, traz uma túnica vermelha e felpuda, feita com tecidos de fabricação européia chamados mothanfas. Diante dele saem os cantores, tendo na mão um kanabir de ouro e de prata (O kanabir era uma calhandra, isto é, uma espécie de cotovia, sabiá-do-campo). Atrás dele encontram-se cerca de trezentos escravos armados. O soberano caminha lentamente. Aproxima-se devagar e pára mesmo de vez em quando. Chegado ao pempi, deixa de caminhar e olha para os assistentes. Em seguida, sobe lentamente o estrado, como o pregador sobe ao púlpito. Uma vez sentado, tocam-se os tambores e fazem-se soar as trompas e as trombetas. (citado por KI-ZERBO, op. cit.: 176-177.)

Alguns dos pajens escravos do rei eram comprados no Cairo. Era expressamente

proibido espirrar em sua presença. Os cortesãos vestiam-se de branco, com

tecidos de algodão cultivado na própria terra. As jovens e mulheres escravas, em

contrapartida, andavam completamente nuas, para escândalo de Ibn Batuta. Ele

ainda estranhou a comida: “Dez dias depois de nossa chegada, comemos um

mingau que eles preferem a qualquer outra comida. Na manhã seguinte, estávamos todos doentes”. (citado por DAVIDSON, op. cit.: 150)

VIII.3. A organização política e a vida econômica

VIII.3. A organização política e a vida econômica

No século XVI, tempo de Mahmud Kati, historiador e conselheiro do Askia

Mohammed, o império tinha cerca de quatrocentas cidades e vilas. O sistema de

governo era descentralizado. Era dividido em províncias, administradas por um

dyamani tigui (ou farba). As províncias eram subdivididas em conselhos (kafo) e

aldeias (dugu). A autoridade da aldeia poderia ser bicéfala: um chefe político,

outro religioso. O farba recolhia impostos e requisitava tropas, caso necessário.

Havia ainda reinos subordinados que reconheciam a hegemonia do imperador, enviando regularmente presentes.

*

Um dos segredos do Império de Mali foi a maleabilidade de seu sistema político,

única lógica possível em uma estrutura sem burocracia, além da tolerância

religiosa. Povos tão variados como os tuaregues, os songais, os malinqués e os

peules, reconheceram, durante mais de cem anos, a soberania do imperador de

Mali. Há um elogio do cronista Ibn Batuta que expressa bem esse sentimento de confiança no funcionamento da estrutura do império:

Não é necessário andar de caravana. A segurança é completa e geral em todo o país (...) O sultão não perdoa a ninguém que se torne culpado de injustiça (...) O viajante, tal como o homem sedentário, não tem a temer os malfeitores, nem os ladrões, nem os que vivem de pilhagem. Os pretos não confiscam os bens dos homens brancos que venham a morrer nas suas terras, ainda mesmo que se trate de tesouros imensos. Depositam-nos, pelo contrário, em mãos de um homem de confiança dentre os brancos, até que se apresentem aqueles a quem revertam por direito e tomem conta deles. (citado por KI-ZERBO, op. cit.: 180)

Esse é um belo testemunho da grandeza do Mali, feito pelo maior viajante da época.

IX. O Império Songai (de Gao)

41. Máxima extensão do Império de Songai (século XVI)

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Uma das características mais perenes das sociedades pré-industriais e iletradas

(ou semiletradas) é a existência de mitos de origem relacionados à cultura e

especialmente ao poder monárquico, além de suas manifestações sociais, todos

mitos originários das tradições orais africanas (Controversial Origins). Além disso,

os homens das sociedades pré-industriais também tinham uma forma bastante

distinta de se relacionar com o mundo (a natureza) e com seus animais. O caso do

Império de Songai (ou de Gao) é um deles. Sua estória começa com o mito do

feiticeiro Faran Makan Boté. Ele nasceu de um pai sorko e uma “mãe-fada ligada

aos espíritos das águas”. Ao subir o rio, Makan Boté se aliou aos caçadores gows e

pescadores sorkos, e passou a exercer as funções de grande sacerdote (kanta)

junto a camponeses na região de Tillabery. Assim teriam nascido as energias

mágicas do Songai. (KI-ZERBO, op. cit.: 181)

Mas a lenda não pára aqui. Por volta do ano 500, príncipes berberes chegaram às

margens da curva do rio Níger e libertaram os pescadores sorkos e camponeses

gabibis do terror de um peixe-feiticeiro (seria um descendente de Makan Boté). O

autor da façanha teria sido Za Aliamen, e a partir de então sua dinastia reinaria

em Kukya até 1335 (no mapa acima, a região assinalada entre Tumbuctu e Gao).

Por volta de 1009, Diá Kossoi, décimo-quinto rei da dinastia fundada por Za

Aliamen, fixou sua capital em Gao. Ele foi o primeiro rei a se converter ao

Islamismo. Já no século XI, Gao rivalizava com a cidade de Kumbi, capital de Mali.

Esse surto de desenvolvimento despertou a cobiça dos malinqués: em 1325, Gao

foi conquistada pelo Império de Mali, mas em 1337, dois irmãos e príncipes

songaleses – Ali Kolen (ou Golon) e Suleiman Nar – conseguiram se desvencilhar

da dominação mali, e Ali Kolen fundou a nova dinastia dos Sis (ou Sonnis).

Suleiman Daman (ou Dandi), décimo-oitavo rei da dinastia Sonni, teria

conquistado a cidade de Mesma, mas foi com Sonni Ali (1464-1493), ou Ali Ber (o

Grande), ou ainda Dali (o Altíssimo), imperador songai e grande feiticeiro, é que o

império se afirmou definitivamente. Sonni Ali conquistou Tumbuctu – então sob o

domínio tuaregue –, realizando um verdadeiro massacre (1468), motivo pelo qual

os escritores muçulmanos terem-no apresentado como um tirano sanguinário, um ímpio. (Sunni Ali)

42. Representação de Sonni Ali, o Grande (1464-1493)

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Ali também conquistou Djenne (1473), após noventa e nove tentativas (!) dos

malinqués de se apoderar de volta da cidade, além do centro de Macina, um pouco

mais ao norte. Abriu ainda um canal d‟água a oeste do lago Faguibine (ver imagem

42) e ordenou a redação das atas oficiais do reino. Com sua morte, em 1492, seu filho Sonni Bakary assumiu a coroa, mas reinou somente um ano.

Em seguida, houve uma tomada do poder: o filho de Sonni renegou a fé islâmica e

um lugar-tenente chamado Mohammed Torodo, assumiu o trono, com o nome de

Askia Mohammed, com a ajuda dos ulemás, corpo de estudiosos. (HOURANI, op. cit.: 77)

Como Mussa, Askia também realizou uma luxuosa peregrinação a Meca em 1496,

com quinhentos cavaleiros e mil homens a pé. Esse mini-exército de escravos e

homens livres levava consigo 300.000 peças de ouro, um terço distribuído em

esmolas durante a viagem. No Hedjaz, Askia conseguiu do califa o título de “califa do Sudão”: Khalifatu biladi al-Tekrur.

Do califa Mohammed até Askia Ishak I (1539-1549), o império adquiriu cada vez

mais territórios, graças às guerras – e apesar das intrigas e assassinatos políticos

palacianos. Por exemplo, no tempo de Askia Mohammed Bunkan (1531-1537), o

imperador de Songai tinha uma grande corte com um harém, seus cortesãos

recebiam roupas de fazenda e braceletes (mantendo a tradição medieval do

soberano vestir, literalmente, seus convivas) e uma orquestra, com novos

instrumentos (trombetas e tambores) acompanhava o príncipe em suas viagens. A

guarda pessoal do soberano era composta de 1.700 homens. O império então se

estendia por mais de dois mil quilômetros, de Teghazza ao país dos mossi (norte a

sul), de Agades a Tekrur (leste a oeste)

43. Mapa do Império de Songai (Gao) e de seus vassalos (século XVI)

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In: KI-ZERBO, op. cit.: 181.

Mais bem organizado e estruturado que o império de Mali, Songai estava fundado

em torno da pessoa do imperador. No dia de sua entronização, ele recebia um

selo, uma espada e um Corão, além de conservar dois atributos mágicos antigos:

o tambor e o fogo sagrado (dinturi). A corte obedecia a um rígido protocolo: por

exemplo, o cuspe do príncipe não podia cair no chão, sendo recolhido nas mangas

de qualquer um dos setecentos homens vestidos de seda que o acompanhavam.

Como em Mali, todos os que se aproximavam dele deveriam cobrir a cabeça de pó, com raras exceções (no caso do general do exército, este utilizava farinha).

A formação do exército, dividido por sua vez em vários corpos, reestruturou a

sociedade: isento de ir à guerra, o povo trabalhava na terra, na produção

artesanal e no comércio. A “burocracia” era muito estratificada (citemos apenas

alguns cargos): os altos funcionários (os koy, os fari), ministros e governadores

das montanhas (tondi-fari), feiticeiras (que tinham a permissão de dirigirem-se ao

imperador pelo nome), o governador da província (gurma-fari) que era o celeiro

agrícola do império, o ministro da navegação fluvial (hi-hoy), o chefe dos

cobradores de impostos (fari-mondyo), o sacerdote do culto aos antepassados

(horé-farima), o inspetor das florestas (sao-farima), o chefe dos pescadores (ho-

koy), e ministro encarregado dos homens brancos residentes no império (korey-farima). Todos eram nomeados e demitidos pelo imperador a seu bel-prazer.

A economia songai é hoje calculada com base no número de escravos disponíveis

para o trabalho no campo. Por exemplo, uma terra com duzentos escravos deveria

produzir cerca de 250 toneladas de arroz por ano (1.000 sunus). O historiador Ki-

Zerbo descarta a possibilidade de comparação desse sistema escravocrata com o

feudalismo europeu, embora defenda um princípio semelhante para o caso

africano: a existência do sistema religioso-simbólico de dádiva e contra-dádiva

atenuava a opressão escravocrata. Pois o que interessava ao senhor da terra era

ter o maior número de famílias e aldeias de servos, não apenas a exploração econômica. (KI-ZERBO, op. cit.: 187-188)

Isso certamente é um caráter análogo ao sistema sócio-econômico vigente cerca

de quatrocentos anos antes na Europa medieval. Esse sistema, também chamado

de dom e contra-dom, está bem expresso em um documento, escrito pelo

historiador soninké de Tumbuctu, Mahmud Kati (Tarikh el-Fettach – a Crônica do

Buscador – obra escrita em 1520). Nele, há um interessante e expressivo diálogo

em que o imperador Askia Daud concede a liberdade a uma escrava. Ela, por sua

vez, sentindo-se presa a ele, declara:

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É necessário que eu te traga um tributo para que, com ele, te lembres de mim. Será de duas barras de sabão no princípio de cada ano.

Então o imperador respondeu:

E eu também quero, para obter o perdão do Altíssimo e a Sua indulgência, mandar-te pagar um tributo, que receberás de mim no princípio de cada ano e que será constituído por uma barra inteira de sal e por um grande pano preto. Aceita-o, pelo amor de Deus. (citado por KI-ZERBO, op. cit.: 188)

44. Página de um manuscrito de Mahmud Kati (1485)

Observe os comentários do próprio autor escritos nas margens.

O ouro e o sal serviam de moeda corrente em Songai, mas a principal moeda eram

os cauris, conchas de moluscos utilizadas como moeda de troca até meados do

século XIX – e isso do Sudão à China. De qualquer modo, os imperadores Askias

procederam a uma unificação de pesos e medidas para evitar fraudes.

As cidades do império eram bastante populosas, e parece que suas gentes se

orgulhavam disso. Um trecho da mesma obra de Mahmud Kati ilustra muito bem esse sentimento de auto-estima:

Tendo surgido uma contenda entre as gentes de Gao e as de Cano quanto a saber qual das duas cidades era a mais populosa, frementes de impaciência, jovens de Tombuctu e alguns habitantes de Gao intervieram e, pegando em papel, em tinta e em penas entraram na cidade de Gao e puseram-se a contar os grupos de casas, começando pela primeira habitação a oeste da cidade, e a inscrevê-las uma após a outra, “casa de fulano”, “casa de sicrano”, até chegarem às últimas construções da cidade, do lado leste. A operação levou três dias e contaram-se 7.626 casas, sem incluir as cubatas construídas de palha. (citado por KI-ZERBO, op. cit.: 189)

Esse certamente é um dos primeiros censos conhecidos em África, talvez mesmo

um dos primeiros do fim da Idade Média européia. Com ele, os historiadores puderam calcular uma população citadina de cerca de 100.000 habitantes.

IX.1. Tumbuctu renasce na pena de Al-Hasan (1483-1554)

45. Mesquita songai de Tumbuctu (séc. XVI)

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Todas essas cidades eram grandes centros de estudos, especialmente dos textos

religiosos e de Direito (notadamente a jurisprudência). Em sua obra Descrição da

África (1526), o granadino Al Hasan, chamado de Leão, o Africano (al-Hasan ibn

Muhammad al Wazzân az-Zayâtî, 1483-1554), nos dá preciosas e claras

informações sobre a cidade de Tumbuctu (os comentários em parênteses são meus):

O reino recebeu recentemente esse nome, depois que uma cidade foi construída por um rei chamado Mansa Suleyman, no ano 610 da Hégira (1232), próxima doze milhas de uma filial do rio Níger (Mansa Suleiman reinou nos anos 1336-1359. Na verdade, a cidade de Tumbuctu foi provavelmente fundada no século XI pelos tuaregues, e antes foi capital do reino de Mali em 1324). As casas de Tombuctu são choupanas feitas de pau-a-pique de argila, cobertas com telhados de palha. No centro da cidade há um templo construído de pedra e de almofariz por um arquiteto de nome Granata. (Ishak es Sahili el-Gharnati, trazido para Tumbuctu por Mansa Suleiman) Além do templo, há um grande palácio também construído pelo mesmo arquiteto, onde o rei vive. As lojas dos artesãos, dos comerciantes, e, especialmente, as dos tecelões de pano de algodão, são muito numerosas. As telas são importadas da Europa para Tombuctu, carregadas por comerciantes da Barbária. (Por caravanas de camelos que passavam pelo deserto do Saara vindas da África do Norte) As mulheres da cidade mantêm o costume de vendar seus rostos, com exceção dos escravos, que vendem todos os gêneros alimentícios. Os habitantes são tão ricos, especialmente os estrangeiros que se estabeleceram no país, que o rei atual deu duas de suas filhas a dois irmãos, ambos homens de negócios, pois era ciente de suas riquezas. (O autor se refere a Omar ben Mohammed Naddi, que não era de fato o rei, mas um representante do rei de Songai) Há muitos poços que contêm água doce em Tumbuctu. Além disso, quando o rio Níger está cheio, canais levam a água para a cidade. Grãos e animais são abundantes, de modo que o consumo de leite e de manteiga é considerável. Contudo, o fornecimento de sal é fraco, porque ele é levado daqui para Tegaza, que fica cerca de 500 milhas de Tumbuctu. Eu mesmo estava na cidade no momento em que uma carga de sal foi vendida por oito ducados. O rei tem um rico tesouro rico de moedas e pepitas de ouro. Uma dessas pepitas pesa 970 libras. (Como vimos, os escritores muçulmanos mencionam freqüentemente as fabulosas pepitas de ouro africanas, mas atualmente há a tendência de se considerar os tamanhos descritos por eles um exagero) A corte real é magnífica e muito bem organizada. Quando o rei vai de uma cidade a outra com as gentes de sua corte, monta um camelo e os cavalos são conduzidos manualmente por servos. Se a luta é necessária, os servos montam os camelos e todos os soldados montam nas costas dos cavalos. Quando alguém desejar falar com o rei, deve ajoelhar-se diante dele e curvar-se ao chão; mas isto é exigido somente daqueles que nunca falaram nem com o rei, nem com seus embaixadores. O rei tem aproximadamente 3.000 cavaleiros e uma infinidade de soldados de infantaria, todos armados com arcos feitos de funcho selvagem, e com o qual disparam setas envenenadas. (Funcho é uma planta aromática e ramosa, de grande importância medicinal) Este rei faz a guerra somente contra os inimigos vizinhos e contra aqueles que não aceitam lhe pagar tributo. Quando obtêm uma vitória, ele vende todos os inimigos, inclusive as crianças, no mercado em Tumbuctu. Os pobres cavalos nascem pequenos neste país. Os comerciantes usam-nos para suas viagens e os cortesãos para mover-se na cidade. Os bons cavalos vêem da Barbária. Chegam em uma caravana e, dez ou doze dias

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mais tarde, são conduzidos ao soberano, que, caso goste, os examina e paga apropriadamente por eles. O rei é um inimigo declarado dos judeus. Ele não permitirá que nenhum deles viva na cidade. Caso ouça que um comerciante da Barbária anda ou faz negócio com eles, o rei confisca seus bens. Há numerosos juízes em Tumbuctu, professores e sacerdotes, todos bem nomeados pelo rei, que honra muito as letras. Muitos livros escritos à mão e importados da Barbária são vendidos. Há mais lucro nesse comércio do que em toda a mercadoria restante. Ao invés de dinheiro, são usadas pepitas puras de ouro como moeda de troca. Para compras pequenas, escudos de cauris trazidos da Pérsia; quatrocentos cauris igualam um ducado. Seis ducados e dois terços correspondem a uma onça romana de ouro. (Como vimos, os cauris eram conchas de moluscos utilizadas como moeda, desde o Sudão até a China; um ducado de ouro sudanês deveria pesar cerca de 15 gramas) Os povos do Tumbuctu são de natureza calma. Têm um costume quase regular de caminhar à noite pela cidade (com exceção daqueles que vendem ouro), entre dez e uma hora da madrugada, tocando instrumentos musicais e dançando. Os cidadãos têm muitos escravos a seu serviço, tanto homens quanto mulheres. A cidade corre muito perigo de incêndios. Quando eu estava lá em minha segunda viagem (provavelmente em 1512), metade da cidade queimou no espaço de cinco horas. Com medo de o vento violento levar o fogo para a outra metade da cidade e também queimá-la, os habitantes começaram a tirar seus pertences. Não há nenhum jardim ou pomar na área que cerca Tumbuctu. (Leo Africanus: Description of Timbuktu, from The Description of Africa [1526])

IX.2. A educação no Império de Songai

Como em todo o mundo urbano islâmico, a educação era muito incentivada pelos

potentados locais. Tumbuctu e as demais cidades do Império de Songai tinham

muitos professores e uma antiga tradição de centros de estudos. Em Tumbuctu,

por exemplo, a universidade de Sankore, organizada em torno de três mesquitas

(Jingaray Ber, Sidi Yahya e Sankore), abrigava já no século XII cerca de 25.000

estudantes, isso em uma população de cerca de 100.00 pessoas, como vimos. (ver University of Timbuktu)

46. Universidade de Sankore, construída por volta do século IX

Doutores atravessavam o deserto para ministrar seus cursos ou assistir a alguma

disciplina de um colega. O cádi (juiz) de Tumbuctu, Mahmud, inspirava reverência

dos Askias e de seus ministros - suas funções eram distintas das do governador,

pois não tinha deveres políticos ou financeiros, cabendo-lhe somente decidir

conflitos e tomar decisões à luz do sistema islâmico de leis (HOURANI, op. cit.: 56)

Muitas vezes o cádi censurava abertamente o imperador nos conselhos, quando se

sentavam ao lado dos generais. Por exemplo, novamente segundo Mahmud Kati

em sua obra Tarikh el-Fettach (1520) – e se acreditarmos na sinceridade de seu

relato - ele teria dito pessoalmente ao Askia Mohammed, de quem era conselheiro:

Esqueceste ou finges esquecer o dia em que me foste procurar em casa e me pegaste pelo pé e pelas roupas,

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dizendo-me “Venho colocar-me sob a tua proteção e confiar-te a minha pessoa para que me livres do fogo do Inferno”? Foi por esse motivo que pus fora os teus enviados. (citado por KI-ZERBO, op. cit.: 190)

Como se vê – e Ki-Zerbo destaca muito bem isso em sua obra – a soberba

universitária tem longa tradição mundo afora, e aqui se misturava ao clericalismo

vigente no século XVI.

47. Universidade de Sankore, construída por volta do século IX (2)

48. Dois professores em Tumbuctu e uma turma corânica em aula

Desse celeiro de estudiosos de Songai, o mais ilustre sem dúvida foi Ahmed Baba

(c. 1556-1620). Nascido em Arauane (dez dias de marcha de Tumbuctu a Tuat),

Baba teria escrito setecentas obras (!), dentre elas um dicionário dos sábios do rito

malekita e um tratado sobre as populações do Sudão ocidental. Seus estudos

abrangiam praticamente todo o campo dos estudos islâmicos da época: Língua

Árabe, Retórica, Exegese corânica e Jurisprudência. Sua biblioteca tinha cerca de

1.600 obras.

49. Representação de Ahmed Baba

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Mahmud Kati escreveu com entusiasmo sobre esse ambiente cultural efervescente

no Império de Songai, e com ele termino minha narrativa da expansão muçulmana na África e o surgimento dos impérios negros ao sul do Saara:

Naquele tempo, Tombuctu era sem igual entre as cidades do país dos Negros pela solidez das instituições, pelas liberdades políticas, pela pureza dos costumes, pela segurança das pessoas e dos bens, pela clemência e compaixão para com os pobres e os estrangeiros, pela cortesia em relação aos estudantes e aos homens de ciência e pela assistência prestada a estes últimos. (citado por KI-ZERBO, op. cit.: 191)

Assim, até o século XVI, o Império de Songai, como o restante da África negra,

conheceu um grande desenvolvimento e expansão. No entanto, a partir de então,

os estados muçulmanos passariam a um expansionismo brutal (o primeiro deles o

reino de Marrocos, muito interessado nas minas de sal do outro lado do deserto).

Somado a isso, a Europa passou a conhecer a África e utilizá-la para seus fins

igualmente expansionistas. “É o começo de uma aventura sombria”, afirma Ki-Zerbo. (KI-ZERBO, op. cit.: 251)

50. Homem do povo de Dogon (Mali) de pé (séc. XVI?)

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Essa escultura de madeira patinada (com verniz oxidado pelo tempo e pela luz) é uma boa metáfora de

encerramento de nossa narrativa. A partir de então – século XVI – a África se ajoelhou e se rendeu a seus

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conquistadores muçulmanos e europeus, cada vez mais ávidos de homens e riquezas, cada vez mais aproveitadores, tanto do sistema escravocrata vigente entre os muçulmanos negros e berberes quanto de

suas rotas de comércio e exploração de metais e produtos.

*

Este trabalho é dedicado ao querido Professor Mário Maestri Filho, que nos

distantes idos de 1983 ministrou a então inédita disciplina "História da África" no

curso de História da Universidade Santa Úrsula, curso que tive a honra de assistir

como aluno e que me fez despertar o interesse pelas culturas negras medievais africanas.

X. Fontes utilizadas

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