A EFICÁCIA OU INEFICÁCIA DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA...

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Resumo: o presente artigo visa a analisar, de modo breve, a eficácia ou a ineficácia da medida de segurança como instituto de apenação aos indivíduos que praticam conduta ilícita e são, juridicamente, inimputáveis. A rigor, as medidas de segurança têm a finalidade diversa da pena, pois tem caráter preventivo, e visam ao tratamento daquele que praticou o ato delituoso. Neste artigo, apresentar-se-á a evolução do conceito de sanção penal, entre os quais a aplicação das medidas de segurança. Para tal, será demonstrado as espécies, os pressupostos para sua aplicação, a sua natureza jurídica, os preceitos estabelecidos pelo Código Penal bem como as garantias e os princípios constitucionais fundamentais à aplicação dessa sanção penal. Observou-se ainda, o posicionamento dos Tribunais Superiores acerca desse tema, assim como as divergências doutrinárias referentes à medida. Para ampliar o escopo de análise, realizou-se uma revisão bibliográfica, e com igual objetivo, foi realizado uma visita ao Presídio Feminino do Distrito Federal, ala dos submetidos a medida de segurança, com o objetivo de fundamentar, pela via da observação, o que fora analisado ao longo da escrita deste trabalho. Palavras-chave: Medida de segurança, inimputabilidade, periculosidade. Abstract: this article aims to analyze, briefly, the effectiveness or ineffectiveness of the secu- rity measure as a sanction Institute to individuals who practice illegal conduct and are legally imputable. Strictly speaking, the security measures have a purpose pen, it has a preventive nature, and aim to treatment of him who committed the criminal act. In this article, it shall be presented to the evolution of the concept of criminal sanction, including the applicable tion of security measures. To this end, we intend to demonstrate the species, the conditions for its implementation, its legal status, the precepts established by the Penal Code as well as the guarantees and the fundamental constitutional principles the application of this penalty. There was also the position of the superior courts on this subject, as well as the doctrinal differences concerning the measure. To expand the scope of analysis, we carried out a literature review, and with the same goal, was carried out a visit to Prison Female Federal District, wing of un- dergoing a security measure, in order to support, by means of observation, which was ana- lyzed along the writing of this work. Keywords: security measure, unaccountability, dangerous. Sumário: Introdução. 1. Princípios relacionados ao tema. 2. Evolução Histórica. 3. Pena e Medida de Segurança. 4. Medida de segurança. 4.1. Natureza Jurídica. 4.2. Sistemas. 4.3. Pressupostos. 4.4. Espécies. 4.5. Prazo. 4.6. Desinternação. Conclusão. Referencial bibli- ográfico. A EFICÁCIA OU INEFICÁCIA DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA THE EFFECTIVENESS OR INEFICANCIA SECURITY MEASURES Denise de Carvalho Sousa Graduando do curso de Direito das Faculdades Integradas Icesp Promove

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Resumo: o presente artigo visa a analisar, de modo breve, a eficácia ou a ineficácia da medida

de segurança como instituto de apenação aos indivíduos que praticam conduta ilícita e são,

juridicamente, inimputáveis. A rigor, as medidas de segurança têm a finalidade diversa da

pena, pois tem caráter preventivo, e visam ao tratamento daquele que praticou o ato delituoso.

Neste artigo, apresentar-se-á a evolução do conceito de sanção penal, entre os quais a

aplicação das medidas de segurança. Para tal, será demonstrado as espécies, os pressupostos

para sua aplicação, a sua natureza jurídica, os preceitos estabelecidos pelo Código Penal bem

como as garantias e os princípios constitucionais fundamentais à aplicação dessa sanção

penal. Observou-se ainda, o posicionamento dos Tribunais Superiores acerca desse tema,

assim como as divergências doutrinárias referentes à medida. Para ampliar o escopo de

análise, realizou-se uma revisão bibliográfica, e com igual objetivo, foi realizado uma visita

ao Presídio Feminino do Distrito Federal, ala dos submetidos a medida de segurança, com o

objetivo de fundamentar, pela via da observação, o que fora analisado ao longo da escrita

deste trabalho.

Palavras-chave: Medida de segurança, inimputabilidade, periculosidade.

Abstract: this article aims to analyze, briefly, the effectiveness or ineffectiveness of the secu-

rity measure as a sanction Institute to individuals who practice illegal conduct and are legally

imputable. Strictly speaking, the security measures have a purpose pen, it has a preventive

nature, and aim to treatment of him who committed the criminal act. In this article, it shall be

presented to the evolution of the concept of criminal sanction, including the applicable tion of

security measures. To this end, we intend to demonstrate the species, the conditions for its

implementation, its legal status, the precepts established by the Penal Code as well as the

guarantees and the fundamental constitutional principles the application of this penalty. There

was also the position of the superior courts on this subject, as well as the doctrinal differences

concerning the measure. To expand the scope of analysis, we carried out a literature review,

and with the same goal, was carried out a visit to Prison Female Federal District, wing of un-

dergoing a security measure, in order to support, by means of observation, which was ana-

lyzed along the writing of this work.

Keywords: security measure, unaccountability, dangerous.

Sumário: Introdução. 1. Princípios relacionados ao tema. 2. Evolução Histórica. 3. Pena e

Medida de Segurança. 4. Medida de segurança. 4.1. Natureza Jurídica. 4.2. Sistemas. 4.3.

Pressupostos. 4.4. Espécies. 4.5. Prazo. 4.6. Desinternação. Conclusão. Referencial bibli-

ográfico.

A EFICÁCIA OU INEFICÁCIA DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA THE EFFECTIVENESS OR INEFICANCIA SECURITY MEASURES

Denise de Carvalho Sousa Graduando do curso de Direito das Faculdades Integradas Icesp Promove

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Introdução

Inicia-se o presente trabalho, apresentando a evolução das medidas de segurança e a sua

aplicabilidade. Nota-se, segundo os pressupostos da criminologia pré-científica, que alguns

agentes que mantinham um comportamento criminoso não eram percebidos socialmente como

responsáveis pelos seus atos. Assim sendo, de acordo com esses estudos criminológicos, o

crime era tratado como produto de uma causa independente da vontade do indivíduo. No ato

do crime, o agente poderia estar acometido pela influência de um espírito demoníaco (período

demonológico). Igualmente, ele não seria responsável se se apresentasse anomalia

craniofaciais (fase frenológica). Considerava-se, também, aspectos físico-morfológicos que,

se observados no agente, o eximia da culpa (fase fisionômica). Por último, por meio de Pinel,

na fase psiquiátrica, a responsabilidade recaia sobre um quadro psicopatológico nato.

Nessa época, as medidas de segurança, tal como a concebemos, ainda não haviam sido

instituídas e os "loucos criminosos" eram tratados de maneira desumana pela sociedade à

época. O trabalho, portanto, visa a demonstrar as mudanças históricas em relação à

implantação de tais medidas, nas quais a presença de um fator criminógeno nesses indivíduos

começam a ser percebidas de outro modo. Por essa razão, passaram a ser separados dos

criminosos comuns e alocados em Hospitais de Custódia, sendo submetidos a um tratamento

biopsicossocial e, principalmente, psiquiátrico. O objetivo de tal medida era evitar a

emergência desse fator criminógeno, assim, protegendo, também a população da

periculosidade desses indivíduos.

Assim sendo, a medida de segurança é uma espécie de sanção penal aplicada a indivíduos

que cometem crimes e são considerados inimputáveis, pois possuem doença mental ou

desenvolvimento mental incompleto ou retardado, previstos no artigo 26 do Código Penal.

Existem várias divergências sobre essa medida, pois entra em conflito com princípios

constitucionais. O Código Penal deixa explícito em seu artigo 97, § 1⁰, a indeterminação do

tempo aplicado para o cumprimento da pena, o que caracteriza a perpetuidade, sem contar nas

condições inóspitas dos estabelecimentos aos quais são submetidos para cumprimento da

medida. Diante disto, questiona-se: A medida de segurança é eficaz ou ineficaz para

solucionar os atos criminosos cometidos por inimputáveis? No decorrer do trabalho, serão

apontadas as observações para tal questionamento e outros pontos importantes que não podem

deixar de ser mencionados.

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Metodologicamente, para o desenvolvimento deste artigo, foi realizada no dia 16 de

novembro uma visita à Penitenciária Feminina do Distrito Federal (popularmente conhecida

como Colméia), propondo-se a adentrar o cotidiano desses agentes submetidos à medida de

segurança. Também, foram utilizadas leituras prévias de diversos autores, onde se utilizou

como metodologia de procedimento, o método explicativo, que procura analisar e demonstrar

os fatos explicando o porquê das coisas. Foi utilizado também, o método indutivo, que por sua

vez procura estudar cada caso chegando a uma conclusão, partindo de fatos particulares e

comprovados.

Diante do atual quadro de discussões doutrinárias, a escolha do tema se justifica porque

esse breve estudo pretende ampliar o escopo do debate sobre os direitos desses indivíduos

tutelados em tais instituições. Com isso, espera-se lançar outra luz ao tema, ao processo de

ressocialização de tais indivíduos, verificando-se, por fim, se tal medida produz ou não

impactos na redução de criminalidade dos submetidos a esse tratamento.

Princípios relacionados ao tema

Sinteticamente, considerando os aspectos principiológicos da Constituição Federal, essa carta

traz em seu interior os valores fundamentais sem os quais uma sociedade pode existir. Como

norma limitadora do poder político do Estado, esses princípios também asseguram aos

cidadãos direitos individuais fundamentais.

Portanto, segundo tais princípios, na atual Constituição, observa-se que todo cidadão tem

direitos e garantias resguardadas e assegurados pelo Estado. Assim sendo, da mesma maneira

que o Estado tem o poder de punir, detendo o monopólio legal da violência, ele também tem a

obrigação de manter o bem-estar e a segurança dos cidadãos.

Consequentemente, o princípio da reserva legal ou da legalidade é um princípio de suma

importância, pois ele opera como regulador dos poderes do Estado e está previsto no artigo 5º,

inciso XXXIX da Constituição Federal de 1988.

"Artigo 5º, inciso XXXIX - não há crime sem lei anterior que o

defina, nem pena sem prévia cominação legal".1

Cezar Roberto Bitencourt, em sua obra, Tratado de Direito Penal, acerca do princípio da

1 BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 11 de novembro

de 2015.

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legalidade se refere:

Em termos bem esquemáticos, pode-se dizer que, pelo princípio da

legalidade, a elaboração de normas incriminadoras é função exclusiva da lei,

isto é, nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena criminal

pode ser aplicada sem que antes da ocorrência desse fato exista uma lei

definindo-o como crime e cominando-lhe a sanção correspondente. A lei

deve definir com precisão e de forma cristalina a conduta proibida.2

Para Guilherme de Souza Nucci (2011)3, O Princípio da Legalidade ou da Reserva Legal

demonstra claramente que, uma norma incriminadora só poderá ser aplicada a um indivíduo,

se a lei para o ilícito penal tiver sido estabelecida antes do mesmo do ato ser cometido.

Nesse âmbito, com o intuito de ampliar a discussão, convém também analisar o princípio

da dignidade da pessoa humana previsto no artigo 1⁰, inciso III da Constituição Federal de

1988, que serve como unificador de todos os princípios. Devendo por sua vez, garantir a um

inimputável, por exemplo, um tratamento em local adequado, assim como a presença de

profissionais especializados.

Com o mesmo entendimento, se posiciona DEGANI:

A dignidade da pessoa humana, princípio constitucional explícito,

consagrou-se como um valor que visa a proteger todo e qualquer ser humano

contra tudo que lhe possa levar ao desrespeito, sendo-lhe inerente e

independente de qualquer requisito ou condição, tais como: raça, cor,

religião ou sexo.4

Acerca do Princípio da Igualdade está claramente descrito na Constituição Federal que

todos os cidadãos são iguais, independente de raça, sexo, credo religioso ou de qualquer outra

natureza, com isso, o Estado tem a obrigação de tratar a todos de maneira igualitária.

O princípio da igualdade prevê a igualdade de aptidões e de possibilidades

virtuais dos cidadãos de gozar de tratamento isonômico pela lei. Por meio

desse princípio são vedadas as diferenciações arbitrárias e absurdas, não

justificáveis pelos valores da Constituição Federal, e tem por finalidade

2 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal - 15. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva,

2010. p. 41 3 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal - 7. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2011. p. 85 4DEGANI, Priscila Marques. Princípio da dignidade da pessoa humana. Disponível em

<http://jus.com.br/artigos/32131/principio-da-dignidade-da-pessoa-humana>. Acesso em: 06 de novembro de

2015.

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limitar a atuação do legislador, do intérprete ou autoridade pública e do

particular.5

De modo a elucidar o contexto a partir do qual se desenvolve essa análise, observemos o

Princípio da Proporcionalidade, previsto no Art. 5º incisos XLVI e XLVII, ambos presentes

na CF/88. Segundo tal princípio, garante-se que, para cada crime cometido, será aplicada uma

pena, na qual sua complexidade será estabelecida de acordo com grau do agravo cometido.

Com isso, percebe-se que, por mais que o indivíduo seja infrator e até mesmo que cause

algum perigo a sociedade, ele continua tendo esse direito garantido.

No que diz respeito especificamente à proporcionalidade em concreto, ou

seja, aquela levada a efeito pelo juiz, sua aferição não é tão tormentosa

quanto aquela que deve ser realizada no plano abstrato. Isso porque o art. 68

do Código Penal, ao implementar o critério trifásico de aplicação da pena,

forneceu ao julgador meios para pudesse, no caso concreto, individualizar a

pena do agente, encontrando, com isso, aquela proporcional ao fator por ele

cometido. Assim, por exemplo, se depois de analisar, isoladamente, as

circunstâncias judiciais o juiz concluir que todas são favoráveis ao agente,

jamais poderá determinar a pena-base na quantidade máxima cominada ao

delito por ele cometido, o que levaria, ao final de todas as três fases, a

aplicar uma pena desproporcional ao fato praticado.6

Finalmente, outro princípio do qual não se pode fugir a análise, pois tem grande relação

com o estudo demonstrado neste artigo, é o Princípio da Individualização da pena (Art. 5º

inciso XLVI da CF). Descrito na obra de Rogério Greco (2011)7, o doutrinador formula que o

legislador deverá impor a pena em conformidade com a conduta praticada em relação ao bem

acometido. Sendo mais didático, o autor insiste na sua exposição, exemplificando, que, tal

princípio, ao ser aplicado àquele que executa um crime hediondo deverá responder o agente

com mais severidade do que àquele que pratica um homicídio culposo. Com isso, explicita-se

que, com tal princípio, que a pena deve ser administrada segundo o grau de importância e da

gravidade do ato.

5 JusBrasil, Princípio Constitucional da Igualdade. Disponível em: < http://anajus.jusbrasil.com.br/

noticias/2803750/principio-constitucional-da-igualdade>. Acesso em: 07 de novembro de 2015. 6 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal - Parte Geral - 13 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011. p. 76 7 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal- Parte Geral - 13 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011. p. 69-70

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Evolução Histórica

Na história do Direito Penal, a pena era imposta ao indivíduo sem que existissem critérios

claros e gerais aplicáveis a todos na mesma situação delituosa. Não é sem razão que a pena

era pensada como um tipo organizado de vingança social, aplicada a todos que infringiam

algum tipo de norma social, independentemente da gravidade do ato relacionado ou do grau

de periculosidade apresentado pelos agentes infratores. Com a sistematização do Direito

Penal, as leis penais passavam a assegurar critérios objetivos e aplicáveis aos infratores dos

bens protegidos pelo Estado. De acordo com o entendimento do ilustre doutrinador Fernando

Capez sobre pena:

Sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma

sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na

restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a

retribuição punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação social e

prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade.8

A julgar pelo exposto neste item, é correto, pois, reconhecer a existência da pena como

um fato histórico primitivo, bem como considerar o Direito Penal a primeira e mais antiga

camada da história da evolução do Direito. Além disso, as diversas fases da evolução da

vingança penal deixam evidente que não se trata de uma progressão sistemática, com

princípios, períodos e épocas capazes de distinguir cada um de seus estágios, mas algo que foi

se desenvolvendo para atender as necessidades de seu tempo.9

Não sem razão, doutrinariamente, entende-se que ambos, o Direito Penal em conjunto

com a sistematização das leis, surgiram para estabelecer e reorganizar o Estado de modo a

assegurar a todos um convívio social pacífico e harmonioso. Assim, descreve Cesar Roberto

Bittencourt em sua obra “Tratado de Direito Penal”;

Quando as infrações aos direitos e interesses dos indivíduos assumem

determinadas proporções, e os demais meios de controle social mostram-

se insuficientes ou ineficazes para harmonizar o convívio social, surge o

Direito Penal com sua natureza peculiar de meio de controle social

8 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal - Parte Geral - 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 384-385 9 MASSON, Cleber Rogério. Direito Penal esquematizado – Parte Geral – 4 ed. ver. atual. e ampl. São Paulo:

Método, 2011. p. 53

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formalizado, procurando resolver conflitos e suturando rupturas

produzidas pela desinteligência dos homens.10

Como discutido até então, a arbitrariedade que imperava no âmbito legal no que tange à

aplicação da lei a quem cometia infrações penais, também era notada na classificação e no

tratamento daqueles considerados inimputáveis. Atribuía-lhes como fator criminógeno

padrões decadentes de imoralidade que justificava os desvios de conduta. Assim sendo, o

agente não era responsável pelos atos, pois o impulso ao crime era de ordem imperativa e fora

do controle do indivíduo. Na história da criminologia, então, observaremos que

Na época clássica (séculos XVII e XVIII), os critérios para definir a loucura

ainda não eram médicos - a designação de louco [criminoso] não dependia

de uma ciência médica. Esta designação era atribuída à percepção que

instituições como a igreja, a justiça e a família tinham do indivíduo e os

critérios referiam-se à transgressão da lei e da moralidade. No final do século

XVII, foi criado, em Paris, o Hospital Geral. Neste hospital, iniciou-se "a

grande internação"; a população internada era heterogênea, embora pudesse

ser agrupada em quarto grandes categorias: aos devassos (doentes venéreos),

os feiticeiros (profanadores), os libertinos e os loucos. O Hospital Geral não

uma instituição médica, mas sim assistencial. Não havia tratamento. Os

loucos eram vistos como doentes e, por isso, integravam um conjunto

composto por todos os segregados da sociedade. O critério da exclusão

baseava-se na inadequação do louco à vida social.11(grifo meu)

Ao longo do desenvolvimento da criminologia, até a escola positiva, imperava um senso

comum jurídico de que não existia uma distinção entre o crime e a loucura. Na ausência de

parâmetros precisos, em razão do parco desenvolvimento das ciências criminais, compreender

a motivação que, induzia alguns indivíduos ao crime, parecia pouco provável. Assim, é

compreensível que o Estado os tratassem como criminosos, uma vez que praticaram um ato

delituoso, porém também eram classificados como loucos, porque não era arrazoado a

manutenção de tal conduta naqueles indivíduos.

Na Idade Média, informados por parâmetros médico-religiosos, passou-se a entender que

esses indivíduos deveriam ser separados dos outros criminosos. No entanto, atuavam de forma

10 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal - Parte Geral - 21. ed. rev., atual. e ampl. - São

Paulo: Saraiva, 2015. p. 35 11 PINHEIRO, Carla. Psicologia jurídica - 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. - (Coleção direito vivo) P. 50

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errônea, pois eles eram colocados em estabelecimentos e asilos, jogados à própria sorte, onde

muitas vezes eram acorrentados.

No século XVIII, na França, foram feitas as primeiras análises desses doentes por

médicos, mais precisamente por Phillippe Pinel, que teve a visão de separar os loucos que

cometiam crimes dos criminosos comuns, colocando-os em manicômios para que fossem

realizados tratamentos adequados, diferente da forma que era feita anteriormente.

Para os indivíduos tachados como loucos, a lei passou a classificá-los, seguindo agora

padrões médicos, como inimputáveis. A medicina, então, respaldou o campo criminal acerca

desse tema, definindo que os indivíduos com algum tipo de anormalidade mental, que não

tinham a capacidade própria de responder por si só pelos seus atos. Nesse caso, se um

indivíduo considerado legalmente como inimputável cometer algum crime, seria realizada

uma avaliação por uma equipe especializada. Em seguida, comprovada a inimputabilidade do

agente, o juiz determinaria uma sanção penal diversa da pena que um indivíduo comum

responderia. Nasce daí a Medida de Segurança. Tal como descritos, no artigo 26 do Código

Penal de 1940, classificam-se como inimputáveis.

Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou

desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou

da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de

determinar-se de acordo com esse entendimento.12

O Código Penal de 1940 adotou o sistema chamado duplo binário. Instituto esse que o

inimputável cumpria duas penas, ao mesmo tempo, sendo elas; a medida de segurança e a

pena privativa de liberdade. Após a Reforma Penal de 1984, o sistema até então utilizado foi

extinto e entrou em vigor o sistema vicariante, que é considerado também como sistema de

substituição, em que o indivíduo cumpre ou a pena ou a medida de segurança.

Pena e Medida de Segurança

"Art. 4º O Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas

atividades de execução da pena e da medida de segurança".13

12BRASIL. Decreto-Lei n⁰ 2.848 de 07 de dezembro de 1940. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/

ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 11 de novembro de 2015. 13BRASIL. Lei de Execução Penal n⁰ 7.210 de 11 de julho de 1984. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L7210.htm>. Acesso em: 11 de novembro de 2015.

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Apesar de a medida de segurança, assim como a pena, serem uma sanção penal, existem

algumas distinções entre uma e outra. Esclarecendo, se, por um lado, a medida de segurança

propõe-se a prevenção, objetivando que o inimputável não volte a cometer novamente crimes.

Por outro lado, a pena tem o caráter retributivo como forma de reprimir o ato ilícito, assim

como também o caráter preventivo para que o criminoso não volte a atacar o bem jurídico. A

medida de segurança tem por fundamento para a sua aplicação, exclusivamente, a

periculosidade, enquanto na pena observa-se a culpabilidade do agente. O prazo para as penas

se constitui de período determinado em lei, enquanto as medidas de segurança não tem prazo

determinado, de modo que só se extingue esse prazo com a cessação da periculosidade do

inimputável. As penas são aplicadas aos imputáveis e semi-imputáveis e as medidas de

segurança aos inimputáveis e em alguns casos aos semi-imputáveis.14

Assim se posicionam também, Luiz Flávio Gomes e António Garcia-Pablos de Molina:

A medida de segurança, como espécie do gênero sanção penal, também no

sistema jurídico penal brasileiro conta com finalidade preventiva especial

(procura-se por meio dela, evitar o cometimento de novos crimes).

Distingue-se, desse ponto, da pena visto que a esta se atribui a finalidade

retributivo-preventiva. A pena, antes de tudo, por força do art. 59 do CP, é

retributiva (é castigo). Mas também conta com finalidade preventiva,

sobretudo geral (efeito intimidatório). Fundamento: as medidas de segurança

tem por fundamento a periculosidade do agente (a pena, por turno, tem por

fundamento primeiro a culpabilidade). O agente é sancionado não somente

pelo que ele "fez" (cometimento de infração penal). Não existe medida pré-

delitual no nosso Direito Pena, ou seja, pressuposto jurídico primeiro para a

imposição de uma medida de segurança é a prática de uma infração penal.

Antes de o sujeito delinqüir não é possível impor-lhe qualquer medida de

segurança, nos termos do Código Penal.15

Medida de Segurança

Até então, este trabalho discorreu acerca do percurso histórico e do contexto sócio jurídico

de modo a contextualizar a aplicação da medida de segurança. Também se preocupou em

demonstrar como os agentes infratores inimputáveis eram desrespeitados e severamente

castigados diante de uma situação fora do alcance deles próprios. Todavia, ao longo do tempo

14 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal - 21 ed. rev., ampl. e atual. - São Paulo: Saraiva,

2015. p.860 15 GOMES, Luiz Flávio, Molina António Garcia-Pablos de. Coleção Ciências Criminais - 2 ed. rev., atual. e

ampl. - São Paulo: Revista dos Tribunais Ltda. 2010. p. 620-621

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e, apesar do progresso científico, esses indivíduos continuam sofrendo o mesmo tipo de

tratamento. À mercê da Justiça, eles ainda se vêem envolvidos nesse conflito, pois existem

diferentes posicionamentos sobre o assunto, tanto no Código Penal, quanto na Constituição

Federal e nos Tribunais Superiores.

As medidas de segurança são medidas de natureza totalmente preventivas, impostas pelo

Estado àqueles indivíduos inimputáveis que cometem crimes, tendo por finalidade após a

cessação da periculosidade, a reinserção desses agentes ao convívio social. Com a

comprovação da inimputabilidade, o indivíduo, não cumpre pena e sim medida de segurança.

No entendimento de Fernando Capez, medida de segurança é:

"Sanção penal imposta pelo Estado, na execução de uma sentença, cuja

finalidade é exclusivamente preventiva, no sentido de evitar que o autor de

uma infração penal que tenha demonstrado periculosidade volte a

delinqüir".16

Para Guilherme de Souza Nucci, a medida de segurança, além de prevenção, também tem

finalidade curativa. Vejamos:

Trata- se de uma forma de sanção penal, com caráter preventivo e curativo,

visando a evitar que o autor de um fato havido como infração penal,

inimputável ou semi-imputável, mostrando periculosidade, torne a cometer

outro injusto e receba tratamento adequado.17

Natureza Jurídica

No campo jurídico, a natureza da medida de segurança tem sido um assunto do qual ainda

existem algumas divergências doutrinárias. A corrente minoritária administrativista trata pelo

viés meramente administrativo, enquanto a corrente penalista compreende a natureza da

responsabilidade do agente pela ótica exclusivamente penal. Portanto, segundo o

entendimento administrativista, a medida de segurança não pode ser considerada como pena,

pois parte da premissa de que se cumpre pena somente aquele que praticou ilícito suscetível

de tal punição. Em razão desse fato, entendem a necessidade da culpa como elemento

definidor da responsabilidade. Como consequência, no caso, em exame, observa-se que não

cabe aplicar pena a quem foi considerado inimputável.

Todavia, no entendimento majoritário, a corrente penalista entende que a medida de

16 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal - Parte Geral - 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 467 17 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal - 7. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2011. p. 576

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segurança tem natureza jurídica exclusivamente penal, pois tanto a pena como a medida de

segurança são aplicadas por meio do caráter jus puniendi do Estado. Assim sendo, tem o

poder político e pode agir na punição do criminoso, seguindo a ritualística penal cabível em

cada caso. Como menciona Noronha (2014):

Se a pena também possui fim preventivo, por seu lado a medida de

segurança participa de sua natureza, já que não deixa de ser reação contra o

ataque ao bem jurídico. Ambas são manifestação do jus puniendi estatal,

colimando que o indivíduo que delinqüiu e se revelou perigoso não torne a

delinquir, e ambas são aplicadas jurisdicionalmente.18

Com o mesmo entendimento, Júlio Fabbrini Mirabete amplia:

A medida de segurança não deixa de ser uma sanção penal e, embora

mantenha semelhança com a pena, diminuindo um bem jurídico, visa

precipuamente à prevenção, no sentido de preservar a sociedade da ação de

delinqüentes temíveis e de recuperá-los com tratamento curativo.19

Desse modo, conclui-se que as medidas de segurança têm caráter jurisdicional aplicado

àqueles que demonstram ofensividade ao bem jurídico, assim ela apenas age de forma a

proteger a sociedade da periculosidade de determinados indivíduos.

Sistemas

Existem dois sistemas acerca da aplicabilidade da medida de segurança. Refere-se aqui, ao

sistema duplo binário e ao sistema vicariante. No primeiro sistema, entende-se que as penas

eram cumulativas, portanto se cumpria a pena e a medida de segurança ao mesmo tempo,

contudo no sistema vicariante, considerado como medida de substituição, o indivíduo cumpria

ou a pena ou a medida de segurança. O sistema duplo binário foi extinto e, depois da reforma

penal de 1984, passou a vigorar apenas o sistema vicariante. Dessa forma, sintetiza Cezar

Roberto Bitencourt:

Consciente da iniqüidade e da disfuncionalidade do chamado sistema “duplo

binário”, a Reforma Penal de 1984 adotou, em toda a sua extensão, o sistema

vicariante, eliminando definitivamente a aplicação dupla de pena e medida

de segurança, para os imputáveis e semi-imputáveis. A aplicação conjunta de

pena e medida de segurança lesa o principio do ne bis in idem, pois, por mais

que se diga que o fundamento e os fins de uma e outra são distintos, na

18 NORONHA, E. Magalhães. Introdução e Parte Geral - 38 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva. 2004. p. 313 19 MIRABETE, Júlio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal - 26 ed. rev. e atual. Rio de

Janeiro: Atlas. 2010. p. 347

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realidade, e o mesmo indivíduo que suporta as duas conseqüências pelo

mesmo fato praticado. Seguindo essa orientação, o fundamento da pena

passa a ser “exclusivamente” a culpabilidade, enquanto a medida de

segurança encontra justificativa somente na periculosidade aliada a

incapacidade penal do agente. Na pratica, a medida de segurança não se

diferenciava em nada da pena privativa de liberdade. A hipocrisia era tão

grande que, quando o sentenciado concluía a pena, continuava, no mesmo

local, cumprindo a medida de segurança, nas mesmas condições em que

acabara de cumprir a pena. Era a maior violência que o cidadão sofria em

seu direito de liberdade, pois, primeiro, cumpria uma pena certa e

determinada, depois, cumpria outra “pena”, esta indeterminada, que

ironicamente denominavam medida de segurança.20

Pressupostos

Para a aplicação das medidas de segurança é necessário o preenchimento de alguns

pressupostos, os quais são imprescindíveis para a aplicação da medida. São eles: prática de

um ato punível, identificação da periculosidade do agente e a detecção de inimputabilidade.

Isso posto, deverá ser comprovado que existiu a prática de um ato punível para que, a

partir daí, sejam avaliados outros pontos, pois se for provado quesitos como: presunção de

inocência, coação irresistível ou qualquer outro fator que não represente um ato punível, será

descartada a aplicação da medida de segurança.

Além disso, igualmente deverá ser constatada a presença de periculosidade no indivíduo,

pois a partir disto, o juiz determinará se o mesmo necessita de tratamento biopsicossocial e

psiquiátrico, visando a minimizar ou a controlar o fator criminógeno de modo que a sociedade

esteja protegida.

Como ilustra o nobre jurista Damásio de Jesus, na concepção de periculosidade:

A verificação da periculosidade se faz por intermédio de um juízo sobre o

futuro, ao contrário do juízo de culpabilidade, que se projeta sobre o

passado. Nessa verificação, o juiz vale-se de fatores (ou elementos) e

indícios (ou sintoma) do estado perigoso.21

20 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal - 15 ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Saraiva,

2010. p. 780 21 JESUS, Damásio de. Direito Penal - 33 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 590.

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Partindo do pressuposto acima, amplia Souza (2015):

O fundamento norteador das medidas de segurança ainda está extremamente

ligado entre a loucura e o perigo. Haja vista que isolamento dos portadores

de doença mental passa a ser justificado pelo risco para a harmonia social,

legitimado por meio da periculosidade.22

E, por fim, deverá ser constatada também a inimputabilidade do agente, pois ao imputável

a sanção determinada em lei é a pena. Ao semi-imputável deverá ser aplicada a pena ou a

medida de segurança, se o agente necessitar de tratamento, isso de acordo com o que o juiz

determinar, e ao inimputável sim, aplicar-se-á a medida de segurança. Vejamos o

posicionamento de Cezar Roberto Bitencourt acerca do tema:

a) Prática de fato típico punível — E indispensável que o sujeito tenha

praticado um ilícito típico. Assim, deixara de existir esse primeiro requisito

se houver, por exemplo, excludentes de criminalidade, excludentes de

culpabilidade como erro de proibição invencível, coação irresistível e

obediência hierárquica, embriaguez completa fortuita ou por forca maior) —

com exceção da inimputabilidade —, ou ainda se não houver prova do crime

ou da autoria etc. Resumindo, a presença de excludentes de criminalidade ou

de culpabilidade e a ausência de prova impedem a aplicação de medida de

segurança. b) Periculosidade do agente — E indispensável que o sujeito que

praticou o ilícito penal típico seja dotado de periculosidade. Periculosidade

pode ser definida como um estado subjetivo mais ou menos duradouro de

antissociabilidade. E um juízo de probabilidade — tendo por base a conduta

antissocial e a anomalia psíquica do agente — de que este voltara a

delinquir. O Código Penal prevê dois tipos de periculosidade: 1)

periculosidade presumida — quando o sujeito for inimputável, nos termos do

art. 26, caput; 2) periculosidade real — também dita judicial ou reconhecida

pelo juiz, quando se tratar de agente semi-imputável (art. 26, parágrafo

único), e o juiz constatar que necessita de “especial tratamento curativo”. c)

Ausência de imputabilidade plena — O agente imputável não pode sofrer

medida de segurança, somente pena. E o semi-imputável só

excepcionalmente estará sujeito a medida de segurança, isto e, se necessitar

de especial tratamento curativo, caso contrario, também ficara sujeito

22 SOUZA, Daniela Moreira de. A natureza jurídica das medidas de segurança e o conceito subjetivo de

periculosidade. Disponível em: < http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,a-natureza-juridica-das-medidas-

de-seguranca-e-o-conceito-subjetivo-de-periculosidade,52823.html>. Acesso em: 09 de novembro de 2015.

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somente a pena: ou pena ou medida de segurança, nunca as duas. Assim, a

partir da proibição de aplicação de medida de segurança ao agente

imputável, a ausência de imputabilidade plena passou a ser pressuposto ou

requisito para aplicação de dita medida.23

Espécies

As medidas de segurança são divididas em duas espécies e estão previstas no artigo 96⁰ do

Código Penal, in verbis:

"Art. 96. As medidas de segurança são: I - Internação em hospital de

custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro

estabelecimento adequado; II - sujeição a tratamento ambulatorial"24.

Depois de diagnosticada a inimputabilidade, o agente deverá cumprir a medida de

segurança detentiva ou restritiva. Caberá ao juiz a determinação de qual é cabível no caso em

exame. Para tal, o magistrado considerará não apenas o tipo de crime cometido, mas também

o grau de periculosidade do agente. Se o crime for punível com reclusão, o agente deverá

cumprir medida detentiva em Hospital de Custódia ou em outro estabelecimento com o

mesmo fim. Se, no caso em questão, tiver cometido crime com pena de detenção, deverá ser

instituído a ele medida de segurança restritiva, sendo submetido também a tratamento

ambulatorial.

"Art. 97 - Se o agente for inimputável, o juiz determinará sua

internação (art. 26). Se, todavia, o fato previsto como crime for

punível com detenção, poderá o juiz submetê-lo a tratamento

ambulatorial".25

Se um indivíduo imputável, no decorrer do cumprimento de uma pena, demonstrar algum

retardo ou desenvolvimento de doença mental, a pena deverá ser convertida em medida de

segurança. Assim como, também, poderá ser alterada a medida restritiva para medida

detentiva a qualquer momento do tratamento. Nos casos em que tal mudança ocorre, ela é

23 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal - 15 ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Saraiva,

2010. p. 781-782 24 BRASIL. Decreto-Lei n⁰ 2.848 de 07 de dezembro de 1940. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/

ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm. Acesso em: 11 de novembro de 2015. 25 BRASIL. Decreto-Lei n⁰ 2.848 de 07 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/

ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 12 de novembro de 2015.

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determinada pelo juiz a partir de uma avaliação acerca do comportamento agente. Tal

afirmativa se encontra descrita no artigo 183 e 184 da LEP, in verbis:

Art. 183. Quando, no curso da execução da pena privativa de liberdade,

sobrevier doença mental ou perturbação da saúde mental, o Juiz, de ofício, a

requerimento do Ministério Público, da Defensoria Pública ou da autoridade

administrativa, poderá determinar a substituição da pena por medida de

segurança. Art. 184. O tratamento ambulatorial poderá ser convertido em

internação se o agente revelar incompatibilidade com a medida.26

O tratamento ambulatorial será realizado sem a necessidade de internação e sem a

necessidade de um médico em tempo integral. O agente deverá apenas comparecer ao hospital

em período determinado pelo médico para dar continuidade ao tratamento.

O Hospital de Custódia ou estabelecimento ao qual o inimputável será direcionado deverá

ser dotado de instalações adequadas, assim como equipe interdisciplinar de profissionais

especializados. Segundo o artigo 43⁰ da Lei de Execução Penal, caso a família do indivíduo

queira e tenha um médico de confiança, poderá contratá-lo para ser o responsável pelo

tratamento, podendo ser tanto para o internado quanto para o que cumpre o tratamento

ambulatorial.

Entre as várias descrições de autores, sobre Hospitais de Custódia e Estabelecimentos

adequados, vale ressaltar a de Cezar Roberto Bitencourt:

a) Hospital de custódia e tratamento psiquiátrico: “Hospital de custódia e

tratamento psiquiátrico” não passa de uma expressão eufemística utilizada

pelo legislador da Reforma Penal de 1984 para definir o velho e deficiente

manicômio judiciário, que no Rio Grande do Sul e chamado de Instituto

Psiquiátrico Forense. Ocorre que, apesar, da boa intenção do legislador,

nenhum Estado brasileiro investiu na construção dos novos

estabelecimentos. b) Estabelecimento adequado: O que seria

estabelecimento adequado? A lei não diz, mas da uma pista, quando fala que

o internado tem direito de ser “recolhido a estabelecimento dotado de

características hospitalares”, para submeter-se a tratamento (art. 99 do CP).

Ironicamente, por apresentarem “características hospitalares”, os

26 BRASIL. Lei de Execução Penal n⁰ 7.210 de 11 de julho de 1984. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L7210.htm>. Acesso em: 13 de novembro de 2015.

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manicômios judiciários tem sido considerados "estabelecimentos

adequados”.27

Prazo

De acordo com o artigo 171 da LEP, só poderá dar início à medida de segurança após

transitada em julgado a sentença, juntamente com a expedição da guia de execução e depois

da ciência da aplicação da medida ao Ministério Público.

O prazo determinado para a medida de segurança é um assunto delicado e com muitas

divergências doutrinárias, pois existem posicionamentos diferentes sobre a mesma questão no

campo jurídico.

Tendo a medida de segurança por finalidade a cura, o agente será sujeitado a medida e o

tempo máximo da sanção será indeterminado. Será determinada pela autoridade competente, a

realização de perícia médica anual ou, a qualquer tempo antes do prazo mínimo, até que se

verifique a cessação da periculosidade do agente.

Referente ao entendimento da indeterminação temporal, o Código Penal só menciona o

prazo mínimo de 1 a 3 anos. Com isso, o inimputável criminoso será submetido à medida até

que ele seja considerado apto ao convívio social, caso contrário, ele permanecerá cumprindo a

medida de segurança, chegando, em alguns casos, morrer ainda cumprindo a medida. O art.

98 elucida a questão de modo breve e claro:

Art. 98 - Na hipótese do parágrafo único do art. 26 deste Código e

necessitando o condenado de especial tratamento curativo, a pena privativa

de liberdade pode ser substituída pela internação, ou tratamento

ambulatorial, pelo prazo mínimo de 1 (um) a 3 (três) anos, nos termos do

artigo anterior e respectivos §§ 1º a 4º.28

Diante disso, abriram-se várias discussões, pois o próprio Código Penal, em seu artigo 75,

diz que o prazo máximo para aplicação das penas privativas de liberdade não pode ser

27 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal - 15 ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Saraiva,

2010. p. 783 28 BRASIL. Decreto-Lei n⁰ 2.848 de 07 de dezembro de 1940. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/

ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em: 14 de novembro de 2015.

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superior a 30 anos. Todavia, a aplicação de um prazo indeterminado para as medidas de

segurança tal como menciona o mesmo Código Penal, entra em confronto com a Constituição

Federal, que deixa claro a proibição de penas de caráter perpétuo, em seu artigo 5⁰, inciso,

XLVII, alínea b. O nobre jurista Cezar Roberto Bitencourt demonstra com clareza tal

entendimento.

As duas espécies de medida de segurança — internação e tratamento

ambulatorial — tem duração indeterminada, segundo a previsão do nosso

Código Penal (art. 97, § I a), perdurando enquanto não for constatada a

cessação da periculosidade, através de pericia medica. Pode-se, assim,

atribuir, indiscutivelmente, o caráter de perpetuidade a essa espécie de

resposta penal, ao arrepio da proibição constitucional, considerando-se que

pena e medida de segurança são duas espécies do gênero sanção penal [...]

No entanto, não se pode ignorar que a Constituição de 1988 consagra, como

uma de suas clausulas pétreas, a proibição de prisão perpétua; e, como pena

e medida de segurança não se distinguem ontologicamente, e licito sustentar

que essa previsão legal - vigência por prazo indeterminado da medida de

segurança - não foi recepcionada pelo atual texto, constitucional. Em

trabalhos anteriores, sustentamos que em obediência ao postulado que proíbe

a prisão perpétua dever-se-ia, necessariamente, limitar o cumprimento das

medidas de segurança a prazo não superior a trinta anos.29

Diante de tal embate, deve-se também destacar o posicionamento dos Tribunais

Superiores no que tange às decisões tomadas sobre essa questão. Esse debate envolve não

somente a interpretação e a aplicação de leis ou discussões doutrinárias, ela afeta diretamente

as famílias do criminoso e, principalmente, o indivíduo que sofre, à mercê de uma decisão não

pacificada jurisprudencial e doutrinariamente pela e na Justiça. Essa indeterminação, em

alguns casos, fere a dignidade do próprio indivíduo já declarado pela perícia como

mentalmente incapacitado, deixando-os em uma pena de caráter perpétuo.

Nessa linha argumentativa, o Superior Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça

defendem que a medida de segurança ao contrário do que o Código Penal diz, não deve

perdurar enquanto não cessar a periculosidade, pois se isso não ocorrer, o indivíduo

permanecerá encarcerado por tempo indeterminado e até mesmo chegando a morrer dentro

29 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal - 15 ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Saraiva,

2010. p. 785

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desses estabelecimentos. Com isso, fere-se a Constituição Federal, tornando a medida de

segurança uma medida de caráter perpétuo, o que não é permitido em nosso ordenamento

jurídico.

Contudo, embora compartilhem dessa visão, os mesmos Tribunais Superiores ainda

divergem entre eles sobre o assunto.

O Superior Tribunal Federal, assim como descrito no artigo 75 do Código Penal, entende

que as medidas de segurança devem ter o tempo máximo de 30 anos, não podendo o agente

ultrapassar esse limite independente de qualquer outro quesito, caso contrário, estaria

cumprindo regime perpétuo. Segue julgado do STF, em que se verifica tal entendimento:

Ementa: PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS.

MEDIDA DE SEGURANÇA. CUMPRIMENTO DA MEDIDA EM

PRAZO SUPERIOR AO DA PENA MÁXIMA COMINADA AO DELITO.

PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. INÍCIO DO CUMPRIMENTO.

MARÇO INTERRUPTIVO. PERICULOSIDADE DO AGENTE.

CONTINUIDADE. PRAZO MÁXIMO DA MEDIDA. 30 (TRINTA)

ANOS. PRECEDENTES DO STF. DESINTERNAÇÃO PROGRESSIVA.

ART. 5º DA LEI 10.216 /2001. APLICABILIDADE. ALTA

PROGRESSIVA DA MEDIDA DE SEGURANÇA. PRAZO DE 6 (SEIS)

MESES. RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1. A prescrição da medida de

segurança deve ser calculada pelo máximo da pena cominada ao delito

cometido pelo agente, ocorrendo o março interruptivo do prazo pelo início

do cumprimento daquela, sendo certo que deve perdurar enquanto não haja

cessado a periculosidade do agente, limitada, contudo, ao período máximo

de 30 (trinta) anos, conforme a jurisprudência pacificada do STF.

Segue precedente:

Precedentes : HC107.432/RS , Relator Min. Ricardo Lewandowski, Primeira

Turma, Julgamento em 24/5/2011; HC 97.621/RS, Relator Min. Cezar

Peluso, Julgamento em 2/6/2009. 2. In casu: a) o recorrente, em 6/4/1988,

quando contava com 26 (vinte e seis) anos de idade, incidiu na conduta

tipificada pelo art. 129, § 1º, incisos I e II , do Código Penal (lesões

corporais com incapacidade para o trabalho por mais de 30 dias), sendo

reconhecida a sua inimputabilidade, nos termos do caput do artigo 26 do CP.

b) processada a ação penal, ao recorrente foi aplicada a medida de segurança

de internação hospitalar em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico,

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pelo prazo mínimo de 3 (três) anos, sendo certo que o recorrente foi

internado no Instituto Psiquiátrico Forense, onde permanece até a presente

data, decorridos mais de 23 (vinte e três) anos desde a sua segregação; c) o

recorrente tem apresentado melhoras, tanto que não está mais em regime de

internação, mas de alta progressiva, conforme laudo psiquiátrico que atesta

seu retorno gradativo ao convívio social. 3. A desinternação progressiva é

medida que se impõe, provendo-se em parte o recurso para o

restabelecimento da decisão de primeiro grau, que aplicou o art. 5º da Lei

10.216 /2001, determinando-se ao Instituto Psiquiátrico Forense que

apresente plano de desligamento, em 60 (sessenta) dias, para que as

autoridades competentes procedam à política específica de alta planejada e

reabilitação psicossocial assistida” fora do âmbito do IPF. 4. Recurso

provido em parte....30

O Superior Tribunal de Justiça se posiciona, seguindo os princípios da isonomia e da

proporcionalidade, tendo o mesmo raciocínio diante do caráter perpétuo das medidas, porém,

destaca que o agente deverá cumprir período máximo da pena, em abstrato, de acordo com

crime praticado, não podendo superar 30 anos. Nesse entendimento, segue posicionamento do

STJ:

EMENTA: EXECUÇÃO PENAL. HOMICÍDIO. PACIENTE

INIMPUTÁVEL. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA IMPRÓPRIA. MEDIDA

DE SEGURANÇA. PRAZO. LIMITAÇÃO. MÁXIMO DA PENA

ABSTRATAMENTE COMINADA AO DELITO. 1. Levando em conta o

preceito segundo o qual "não haverá penas de caráter perpétuo" (art. 5º,

XLII, b, da CF) e os princípios da isonomia e da proporcionalidade, a Sexta

Turma adotou o entendimento de que o tempo de duração da medida de

segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente

cominada ao delito praticado. 2. No caso, o paciente iniciou o cumprimento

da segunda internação em 11/2/1985, pela prática do delito previsto no art.

121, caput, do Código Penal, cuja pena máxima é de 20 anos. À época do

indulto concedido na origem (2/7/2009), cuja decisão está pendente de

análise pelo Tribunal a quo, já tinham decorrido mais de 24 anos de

segregação social, patente, portanto, o constrangimento ilegal. 3. Ordem

concedida para declarar o término do cumprimento da medida de segurança

30 JusBrasil. STF - RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS RHC 100383 AP (STF). Disponível

em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=titulo%3AHC+107.432%2FRS>. Acesso em: 15 de

novembro de 2015.

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imposta ao paciente. (STJ, Relator: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR,

Data de Julgamento: 11/10/2011, T6 - SEXTA TURMA).

Segue recurso:

RECURSO ESPECIAL. PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO.

INIMPUTÁVEL. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA IMPRÓPRIA.

PRETENSÃO MINISTERIAL DE AFASTAR ALIMITAÇÃO DA

MEDIDA DE SEGURANÇA. IMPOSSIBILIDADE. LIMITE

DEDURAÇÃO: PENA MÁXIMA ABSTRATAMENTE COMINADA AO

DELITO E PRAZO DE 30 ANOS PREVISTO NO ART. 75 DO CÓDIGO

PENAL. RECURSO DESPROVIDO. 1. Nos termos do atual

posicionamento desta Corte, o art. 97, § 1.º,do Código Penal, deve ser

interpretado em consonância com os princípios da isonomia e da

razoabilidade. Assim, o tempo de cumprimento da medida de segurança, na

modalidade internação ou tratamento ambulatorial, deve ser limitado à pena

máxima abstratamente cominada ao delito perpetrado ou ao limite de 30

(trinta) anos estabelecido no art. 75 do Código Penal, caso o máximo da pena

cominada seja superior a este período. 2. O Supremo Tribunal Federal, ao

examinar a controvérsia, manifestou-se no sentido de que a medida de

segurança deve obedecera garantia constitucional que veda as penas de

caráter perpétuo, nos termos do art. 5.º, XLVII, alínea b, da Constituição da

República, aplicando, por analogia, o limite temporal de 30 (trinta) anos

previsto no art. 75 do Código Penal. 3. Recurso especial desprovido (STJ,

Relator: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 13/03/2012, T5 -

QUINTA TURMA).31

Desinternação

A desinternação ocorrerá com a cessação da periculosidade do agente, aferida em uma

perícia médica. A liberação da medida de segurança será feita como uma forma de suspensão

da medida, sendo uma espécie de liberdade condicional. Determinar-se-á que o indivíduo

deverá se estabelecer de maneira que não apresente fato que demonstre periculosidade no

período de um ano. Se, nesse tempo, o inimputável cometer qualquer agravo ou demonstrar-se

perigoso, lhes será estabelecido o retorno à medida de segurança. Vale ressaltar que a lei não

menciona somente a prática de um novo crime, mas sim, a presença de periculosidade.

31 JusBrasil. STJ - HABEAS CORPUS: HC 174342 RS 2010/0096838-9. <http://stj.jusbrasil.com.br/

jurisprudencia/21458674/recurso-especial-resp-964247-df-2007-0144305-1-stj/inteiro-teor-21458675>. Acesso

em: 15 de novembro de 2015.

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21

De acordo com o artigo 178 da LEP para que ocorra a desinternação, o agente deverá

seguir os mesmos requisitos do livramento condicional.

Somente passado esse período, sem demonstrar nenhuma desordem comportamental, o

inimputável terá sua medida de segurança extinta.

Assim, sendo comprovada pericialmente a cessação da periculosidade, o juiz

da execução determinara a revogação da medida de segurança, com a

desinternação ou a liberação, em caráter provisório, aplicando as condições

próprias do livramento condicional (art. 178 da LEP). Na verdade, essa

revogação não passa de uma simples suspensão condicional da medida de

segurança, pois, se o desinternado ou liberado, durante um ano, praticar “fato

indicativo de persistência de sua periculosidade”, será restabelecida a

medida de segurança suspensa. Somente se ultrapassar esse período in albis

a medida de segurança será definitivamente extinta.32

Conclusão

Diante de todo o exposto, conclui-se que a medida de segurança não se mostra eficaz o

suficiente para realizar tudo que teoricamente determina a lei, pois a medida, assim como

meio de prevenção, também deveria funcionar com um tratamento com a finalidade de curar o

indivíduo.

Durante o desenvolvimento do trabalho, além de revisões bibliográficas, realizou-se uma

visita ao Presídio Feminino do Distrito Federal (Colméia), onde situa a ala específica para o

tratamento dos submetidos à medida de segurança. Nesta visita, realizou-se uma entrevista

com a diretora do presídio, a Delegada de polícia, Draª Deuselita Pereira Martins. Nessa

ocasião, a entrevista proporcionou observar vários pontos em relação à aplicação da medida

de segurança. Destaco, a princípio, a ausência no Distrito Federal de um Hospital de Custódia

ou de lugar adequado onde se possa alocar esses indivíduos.

Sobre esse aspecto, a inexistência de um espaço adequado, o único local ao qual foi

instituído pelo Estado para o cumprimento da medida é um presídio. Observa-se, de imediato,

a inadequação desse local uma vez que, lá, também se alocam indivíduos imputáveis,

submetidos ao cumprimento de pena pelo cometimento de algum delito. Nessa mesma

entrevista, constatou-se ainda que os agentes inimputáveis do sexo masculino ficam em um

32 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal - 15 ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Saraiva,

2010. p. 787.

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local separado, enquanto as do sexo feminino são colocadas junto com as detentas que

cumprem regime semi-aberto. Como resultante desse quadro, essa indistinção entre os

diferentes tipos de sanções às quais estão submetidas, configura constrangimento ilegal às

criminosas submetidas à medida.

Em razão do exposto, observou-se que, no caso em tela, as medidas de segurança não são

tratadas como realmente deveriam ser, tal qual ditam as leis, na forma de um tratamento,

visando a cura. São tratados como todos os outros indivíduos instalados dentro do presídio,

tendo por única diferença a existência de uma equipe de saúde responsável pelo tratamento

dos submetidos a medida.

De modo propositivo, elenco alguns dados para que a situação desses indivíduos, ao

cumprirem medida de segurança, funcionasse realmente. O Estado deveria, de fato, se

comprometer diante de uma situação tão delicada como essa, fornecendo condições

adequadas ao tratamento, visando a melhora desses indivíduos, oferecendo-lhes um suporte

de equipes especializadas para a realização de tratamento eficaz, em um local adequado. Em

pesquisa realizada em sites do governo federal, menciona-se a existência de projetos, mas,

infelizmente, até então nunca saíram do papel, pois entra governo e sai governo e nada se

resolve, ocasionando um verdadeiro descaso com o agente inimputável.

Igualmente, aferiu-se na pesquisa para a redação deste artigo que, em alguns casos, por

determinação da Justiça, quando esses agentes são liberados da medida, eles não têm para

onde ir, pois as famílias não os aceitam mais. Assim, muitos continuam internados.

Ante o exposto, chega-se à conclusão de que as medidas de segurança, tais como são

aplicadas atualmente, são ineficazes. De imediato, nota-se que a medida está longe do

almejado nas e pelas Doutrinas e Leis, se, no papel, elas estão muito bem definidas e

estabelecidas, na realidade dos submetidos a tal medida, elas vão além da punição, uma vez

que elas se impõem aos indivíduos como falta de respeito a ele, à sua família e à sociedade.

Referências

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