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103 Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, 13(1): 103-18, jan./jun. 1999 CDD. 20.ed. 378.115 613.7 A DINÂMICA DO ESTUDO E PROMOÇÃO DA ATIVIDADE MOTORA HUMANA: TRANSIÇÃO DE FASE NA EEFE-USP? Edison de Jesus MANOEL * RESUMO Nos anos 60, o questionamento do “status” da Educação Física no sistema universitário norte- americano foi respondido com argumentos em favor de que ela se constituía numa disciplina acadêmica cujo objeto de estudo seria atividade motora humana. Nos anos 70, foi proposta a área de “Human Movement Studies” na Grã-Bretanha. Nos anos 80, houve uma proliferação de propostas em vários continentes tais como “Human Movement Science”, “Kinanthropology”, “Motricidade Humana”, sendo “Kinesiology” o termo de maior impacto no sistema universitário norte-americano, onde inúmeros departamentos de Educação Física passaram a adotá-lo. A ordem gerada pelo movimento da disciplina acadêmica da Educação Física caracterizou-se por uma compreensão mais abrangente e integrada dos fenômenos típicos da atividade motora humana. A desordem gerada ficou por conta do gradual distanciamento da área acadêmica “Kinesiology” da profissão Educação Física, a ponto de nos anos 90 haver um novo questionamento do “status” acadêmico da Educação Física na universidade. O presente trabalho discute alguns aspectos da evolução da Educação Física no âmbito acadêmico e universitário com enfoque na Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo. O desenvolvimento da área acadêmica da Educação Física foi baseado no paradigma reducionista da Ciência clássica. O progresso da área depende, no entanto, de uma mudança de paradigma com o estabelecimento de áreas integrativas com orientação sistêmica ou à complexidade onde as ciências básica e aplicada e tecnologia são integradas de forma dinâmica. A análise da trajetória da EEFE-USP sugere que ela deu passos importantes em tal direção em face do que poderia ser caracterizado uma transição de fase na estrutura acadêmica da instituição no início dos anos 90. UNITERMOS: Educação Física; Cinesiologia; História; Disciplina acadêmica. INTRODUÇÃO * Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo. Em seu livro “Essays in English History”, Taylor (1976) afirma que a história é, num certo sentido, uma forma de contar estórias. A história não é apenas um catálogo de eventos colocados na ordem correta como o horário de trens. Trata-se, antes de mais nada, da versão dos eventos. O historiador busca impor aos eventos algum tipo de padrão racional. Como qualquer cientista, lembra Taylor, o historiador está em busca de informações que confirmem sua visão ou a coloquem em cheque. A tentativa é vã, pois ao lembrar Heráclito, Taylor reafirma: tudo está em movimento (“panta rei”). O historiador deve estar consciente do fato de que ele está a desenhar um quadro que nunca esteve imóvel. A história é um quadro pintado a inúmeras mãos e passível, portanto, de constantes, e não raro, controversas interpretações. Ao discutirmos a trajetória da Escola da Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFE-USP), não temos a pretensão de apresentar um quadro definitivo de sua história.

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Dinamica, educação fisica, qualidade de vida, promoçao da saude

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CDD. 20.ed. 378.115613.7

A DINÂMICA DO ESTUDO E PROMOÇÃO DA ATIVIDADE MOTORA HUMANA:TRANSIÇÃO DE FASE NA EEFE-USP?

Edison de JesusMANOEL*

RESUMO

Nos anos 60, o questionamento do “status” da Educação Física no sistema universitário norte-americano foi respondido com argumentos em favor de que ela se constituía numa disciplina acadêmica cujoobjeto de estudo seria atividade motora humana. Nos anos 70, foi proposta a área de “Human MovementStudies” na Grã-Bretanha. Nos anos 80, houve uma proliferação de propostas em vários continentes tais como“Human Movement Science” , “Kinanthropology” , “Motricidade Humana” , sendo “Kinesiology” o termo demaior impacto no sistema universitário norte-americano, onde inúmeros departamentos de Educação Físicapassaram a adotá-lo. A ordem gerada pelo movimento da disciplina acadêmica da Educação Físicacaracterizou-se por uma compreensão mais abrangente e integrada dos fenômenos típicos da atividade motorahumana. A desordem gerada ficou por conta do gradual distanciamento da área acadêmica “Kinesiology” daprofissão Educação Física, a ponto de nos anos 90 haver um novo questionamento do “status” acadêmico daEducação Física na universidade. O presente trabalho discute alguns aspectos da evolução da Educação Físicano âmbito acadêmico e universitário com enfoque na Escola de Educação Física e Esporte da Universidade deSão Paulo. O desenvolvimento da área acadêmica da Educação Física foi baseado no paradigma reducionistada Ciência clássica. O progresso da área depende, no entanto, de uma mudança de paradigma com oestabelecimento de áreas integrativas com orientação sistêmica ou à complexidade onde as ciências básica eaplicada e tecnologia são integradas de forma dinâmica. A análise da trajetória da EEFE-USP sugere que eladeu passos importantes em tal direção em face do que poderia ser caracterizado uma transição de fase naestrutura acadêmica da instituição no início dosanos90.

UNITERMOS: Educação Física; Cinesiologia; História; Disciplina acadêmica.

INTRODUÇÃO

* EscoladeEducação FísicaeEsportedaUniversidadedeSão Paulo.

Em seu livro “Essays in EnglishHistory” , Taylor (1976) afirma que a história é,num certo sentido, uma forma de contar estórias. Ahistória não é apenas um catálogo de eventoscolocados na ordem correta como o horário detrens. Trata-se, antes de mais nada, da versão doseventos. O historiador busca impor aos eventosalgum tipo de padrão racional. Como qualquercientista, lembra Taylor, o historiador está embusca de informações que confirmem sua visão oua coloquem em cheque. A tentativa é vã, pois ao

lembrar Heráclito, Taylor reafirma: tudo está emmovimento (“panta rei” ). O historiador deve estarconsciente do fato de que ele está a desenhar umquadro que nunca esteve imóvel. A história é umquadro pintado a inúmeras mãos e passível,portanto, de constantes, e não raro, controversasinterpretações.

Ao discutirmos a trajetória da Escolada Educação Física e Esporte da Universidade deSão Paulo (EEFE-USP), não temos a pretensão deapresentar um quadro definitivo de sua história.

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Nossa análise carece de um levantamento maisdetalhado e minucioso de dados sobre a Instituição,sobre as pessoas que a fizeram ao longo de mais de60 anos, sobre o contexto em que a escola cresceu.Não se pretende fazer um levantamento históricoextensivo da área e da Instituição. A intenção éselecionar alguns eventos que contribuíram para acaracterização acadêmica e profissional da área anível nacional e internacional e que julgamosseremrelevantes para a compreensão da trajetória daEEFE-USP.

Esse trabalho teve como ponto departida uma questão do presente: Como a EducaçãoFísica pode ser estruturada de forma a serreconhecida como uma área profissional eacadêmica? Uma análise histórica pode lançar luzao problema do presente, bem como estimular abusca de caminhos para o futuro. É com essaperspectiva que as mudanças ocorridas na EEFE-USP, ao longo dos anos, serão analisadas.Acredita-se que o reconhecimento acadêmico daárea é influenciado e influencia a história dainstituição. Ela é entendida como um sistema vivoe complexo de acordo com a concepção de Miller(1978), ou seja, ela está em constante troca dematéria/energia e informação com o meioambiente, ela é composta de vários elementos cujainteração gera propriedades e características quenão podem ser encontradasnoselementos isolados.

O objetivo do presente trabalho édiscutir se as mudanças ocorridas na EEFE-USPcaracterizariam uma transição de fase na formacomo a área acadêmica é estruturada. Essaavaliação será feita com base em alguns aspectosdo processo evolutivo da área dos últimos 100anos.

A COMPREENSÃO DA ATIVIDADEMOTORA E A PROFISSÃO EDUCAÇÃOFÍSICA

Pode parecer estranho a profissionaisde outras áreas que a Educação Física, e osindivíduos que nela atuam, ainda não tenham clarodo que trata sua profissão. A atuação doschamadosprofessores de Educação Física é conhecida delonga data. No século XIX, já há registros dosurgimento de organizações profissionaisrepresentativas do que viria a ser chamado deEducação Física, particularmente na Europa e nosEstadosUnidos (Park, 1989).

No Brasil, os famosos pareceres deRui Barbosa no final do século XIX trazem idéiasfundamentais sobre o papel da atividade motora nodesenvolvimento e formação do indivíduo, abrindocaminho para a institucionalização da EducaçãoFísica no ensino (Marinho, 1980). No início doséculo XX, Fernando de Azevedo usa de sua sólidaformação humanista para desenvolver um tratadosobre a Educação Física que impressiona ao jáconsiderar a atividade motora como um meiofundamental de integração de aspectos biológicos,psicológicos, sociaise culturais (Azevedo, 1920).

O grande debate sobre a natureza daprofissão ocorreu, no entanto, em função dequestões acadêmicas. No final dos anos 50 e iníciodos anos 60, a Educação Física, entre outras áreas,sofreu intensas críticas a partir de um julgamentode que ela não era academicamente orientada. Istoocorreu nos Estados Unidos onde se argumentouque só deveriam fazer parte da universidadeinstituições devotadas à produção deconhecimento. Essa exigência atingiu em cheio osdepartamentos de Educação Física cuja capacidadeprodutiva foi posta em descrédito. Istodesencadeou um amplo debate sobre a identidadeacadêmica e profissional da área. Há dois marcosimportantes que podem ser identificados nessedebate (cf. Lawson, 1984). Primeiro, a colocaçãode que a Educação Física pode ser considerada umcampo eminentemente acadêmico ou umadisciplina acadêmica (Henry, 1964). Segundo, anecessidade de diferenciarmos entre o artesão e oprofissional na Educação Física (Morford, 1972).

A disciplina acadêmica, segundoHenry (1964), caracteriza-se por um corpo deconhecimentos organizado sobre a atividademotora que possui valor em si próprio semnecessidade de demonstrar seu valor prático. Istolevou pesquisadores a voltarem-se cada vez maispara pesquisas fundamentais sobre a atividademotora, distanciando-se de problemas relevantespara a profissão como desenvolvimento demétodos, técnicas e programas de promoção daatividade motora. Ao mesmo tempo, Morford(1972) diferenciava o artesão do profissional combase no conhecimento que ambos utilizam parabasear suas ações. O artesão lança mão de umconhecimento tácito, oriundo de sua experiência eda transmissão da prática e convívio comindivíduos mais experientes. O profissional tomadecisões e age com base em conhecimentoscientíficos transmitidos em cursos formais depreparação profissional de nível médio e superior.

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Neste sentido, a atuação na Educação Física estariamuito mais para o artesão do que para oprofissional. Entretanto, se considerarmos que aEducação Física é academicamente orientada,instala-se um problema que persiste ainda hoje: adisciplina acadêmica produz conhecimentos quenão são orientados a problemas práticos, logocomo pode o profissional utilizá-los em suaatuação? Ciente desse problema, Henry reviu suaposição em artigo publicado uma década depois desua contribuição original (Henry, 1978). Nele,Henry afirma que a disciplina acadêmica seriaconstituída tanto com o suporte das pesquisasbásicas como com o das aplicadas. Entretanto, essenovo posicionamento teve pouco impacto na área eHenry é conhecido mais pelo seu trabalho de 1964(Park, 1994).

A discussão sobre o caráteracadêmico da área não ficou circunscrito à Américado Norte. De fato, ela havia acontecido muito antesna Europa, em particular na Alemanha. Em virtudeda língua, as idéias discutidas na Alemanhapassaram desapercebidas durante muito tempo. Dequalquer forma, Haag (1979) trouxe para osleitores de língua inglesa um resumo da evoluçãoda área acadêmica na Alemanha. Esse processo,como aponta Haag, teve início bem antes dos anos60 quando foram estruturadas as chamadasCiências do Esporte. Essas ciências eram e sãotratadas como áreas aplicadas das CiênciasNaturais, Sociais e Humanas (veja tambémAmadio, 1993). A iniciativa pioneira dos alemãesnão deixou de esbarrar em problemas para odesenvolvimento da área acadêmica. A estreitaligação com as ciências tradicionais, tambémchamadas de ciências-mãe, gerou uma certaambigüidade sobre qual seria o objeto de estudodessas ciências (cf. Zecevic, 1994). Por exemplo, aPsicologia do Esporte utilizaria o esporte como umcampo de investigações sobre o comportamentohumano ou ela estaria envolvida com o estudo dasdimensões psicológicas do comportamento noesporte? Essa indefinição tem levado à constantebusca de uma melhor definição das Ciências doEsporte particularmente no que diz respeito àsrelações entre teoria e prática (cf. Haag, Hardman,Meier, Naul, Pfisten, Singer & Zecevic, 1995).

Não há como negar que o aumentogradual das pesquisas com enfoque na atividademotora resultou num grande volume deconhecimentos em várias dimensões dessefenômeno: biológico, psicológico, social, cultural efilosófico. Esse processo é marcado pelo

surgimento e consolidação de várias sub-disciplinas, como Fisiologia do Exercício,Biomecânica, Aprendizagem Motora,Desenvolvimento Motor, Psicologia do Esporte,Sociologia e Antropologia do Esporte, entre outras.

Entretanto, as sub-disciplinas não sóse tornaram cada vez mais autônomas em relação àEducação Física, como também contribuíram paraa emergência de um campo trans-disciplinar com ofoco na compreensão da atividade motora (Brooks,1981). Em função disso, novas denominaçõessurgiram tais como Cinesiologia (Newell, 1990a),Cineantropologia (Renson, 1989), Ciência doMovimento Humano (Whiting 1982), Ciências daAtividade Física (Bouchard, 1992), Ciências doEsporte (Haag, 1979), Estudos do MovimentoHumano (Whiting, 1975), Motricidade Humana(Sérgio, 1987), entre outros. Algumasdenominações tinham a preocupação de ressaltar oaspecto da atuação profissional da Educação Físicaou do Esporte, por exemplo, Motricidade Humanaou Ciências do Esporte. Outras surgiram tentandoenfatizar o lado puramente acadêmico da áreacomo Cinesiologia ou Ciência do MovimentoHumano, cujos conhecimentos seriam de grandeutilidade não só para a Educação Física mastambém para outras profissões como Medicina eFisioterapia.

O empenho na consolidação dadisciplina acadêmica da Educação Física tem sidoconsiderado como algo negativo para a profissão.Bressan (1979) afirmou que a ênfase ao caráteracadêmico da área fez com que os departamentosde Educação Física voltassem sua atenção paraquestões de interesse das disciplinas-mãe. SegundoBressan, essa seria uma estratégia suicida do pontode vista do jogo de forças políticas presente nabusca de valorização e prestígio no meiouniversitário. Locke (1990) tem afirmado demaneira incansável que a disciplina acadêmica comsua estrutura de sub-disciplinas oferece umconhecimento tão fragmentado que pouco éaplicado para a solução de questões profissionaisda Educação Física. Na mesma linha de raciocínio,Mariz de Oliveira (1993) afirma que a EducaçãoFísica além de tudo não obedece aos critérios paraser uma disciplina acadêmica. Sem dúvida, aEducação Física estaria num estágio de pré-ciênciase forem considerados os critérios para aconfiguração de uma disciplina: objeto de estudopróprio, metodologia de pesquisa própria eestabelecimento de um paradigma aceito pelacomunidade científica (Ross, 1978). Na verdade,

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Mariz de Oliveira (1993) adota a posição de que aEducação Física não vai a lugar algum enquantoinsistir no discurso científico, pois, enquantoprofissão, ela não tem necessidade de umadisciplina acadêmica para legitimá-la.

Lovisolo (1996) ressalta que aEducação Física é antes de tudo uma arte, tendovida própria e independente de uma prováveldisciplina acadêmica. Aliás, para Lovisolo, a buscaincessante pelo estabelecimento e defesa dadisciplina acadêmica na área recai sobre umainterpretação errônea do próprio papel dauniversidade e das unidades que a compõem.Evidentemente, Lovisolo e outros não negam aimportância de uma área acadêmica em contatodireto com a Educação Física. Lima (1994) eTeixeira (1993), por exemplo, colocam a EducaçãoFísica como sendo uma profissão dependente deconhecimentos produzidos por outras áreas, entreas quais estaria a Ciência do Movimento Humanoou Motricidade Humana.

Betti (1996) reclama a ausência deuma orientação pedagógica na disciplinaacadêmica. Betti entende que a legitimação daprofissão passa pela formação de uma áreaacadêmica sólida, mas esta deveria ser de cunhoeminentemente pedagógico. Isto atenderia maisdiretamente as expectativas e necessidades dosprofissionaisda área.

O crescente distanciamento entre adisciplina acadêmica e a profissão começou com atendência a se mudar o nome da área no âmbitouniversitário (de Educação Física paraCinesiologia, Ciência do Movimento Humano, vejaNewell, 1990b para mais detalhes). Como já foimencionado anteriormente, houve a tendência dosprofissionais de Educação Física voltarem suasatenções para temas de pesquisa mais pertinentespara as ciências-mãe. Em conseqüência, as áreasmais aplicadas e de maior relevância para aEducação Física tiveram o seu desenvolvimentoprejudicado.

A ênfase na pesquisa básica presentena Cinesiologia, gerou uma aversão às iniciativasde caracterização acadêmica da área, vistas semprecomo mais preocupadas com o “status” da mesmadiante das ciências ou disciplinas tradicionais(Locke, 1990). Ao mesmo tempo, houve um vazioacadêmico no que diz respeito à proposição de umaárea associada à Educação Física. De fato, osindivíduos ligados à Cinesiologia rebateram oscríticos da disciplina acadêmica pontuando a suaineficácia em estabelecer uma agenda acadêmica

para o desenvolvimento de uma pedagogia outeoria da Educação Física. Nesse rol, destacamosasduras críticas de Wade (1991) feitas às posições deLocke (1990) entre outros, crítico freqüente emordaz do modelo de disciplina acadêmica. Aindefinição e crise de identidade acadêmica daárea, o seu distanciamento da Cinesiologia, foramalguns dos fatores que culminaram com um novoquestionamento sobre o “status” da EducaçãoFísica na universidade nos anos 90 (por exemplo,Newell, 1990b).

As concepções que consideram aprofissão desvinculada da produção deconhecimentos atribuem um estado extremamentepassivo para a Educação Física. Ela fica sempre nadependência do que outrasáreasvenham a produziros conhecimentos necessários à prática daEducação Física.

Baseados numa visão sistêmica,pode-se dizer que a Educação Física acaba sendotratada como um sistema fechado, ou seja, é umasistema que processa energia mas é fechado àinformação (cf. Bertalanffy, 1977). A ordem(conhecimento sistematizado) é sempre imposta defora para dentro. Uma das características de umaprofissão é a de que ela não só aplicaconhecimentos mas também participa do processode geração e renovação de conhecimentos a seremaplicados (Kroll, 1982). Ou seja, a profissão podeser entendida como um sistema aberto, e como tal,caracteriza-se pelas constantes trocas deinformação com o meio (sociedade), gerando novasinformações (Manoel, Dantas, Duarte, Pereira,Lima & Collichio, 1987). Da consideração daEducação Física como um sistema aberto decorreque é questionável desprezar o caráter acadêmicoda Educação Física para dar ênfase apenas àprofissão. Na dinâmica dos sistemas, a dimensãotemporal é um aspecto fundamental pois eles estãoem constante busca para vencer a 2a. Lei daTermodinâmica, isto é, para vencer a tendência emdireção ao aumento de desordem (Prigogine &Stengers, 1984). O envolvimento mais direto com ageração de conhecimentos constitui-se nomecanismo para garantir à profissão a suaconstante renovação, ou seja, aumento contínuo deordem.

Talvez o aspecto mais interessantenessa discussão é constatar que o embate entre oacadêmico e o profissional marcou a EducaçãoFísica a pouco mais de um século atrás. Park(1989) levantou dados evidenciando que no finaldo século XIX, já havia a discussão para

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transformar a profissão de forma que ela tivesseuma sólida base acadêmica e científica. Park cita aafirmação de Luther Gullick que em sua fala noquinto encontro anual da Sociedade Americanapara o Avanço da Educação Física em 1890,saldava a “nova profissão da Educação Física queenvolvia um profundo conhecimento do serhumano através das disciplinas de fisiologia,anatomia, psicologia, história e filosofia” .

Park (1989) relata ainda outrasmanifestações da época que evidenciam uma faltade atitude mais científica para o desenvolvimentode procedimentos de atuação. Entre 1890 e 1900,houve um grande número de manifestações e açõespráticas no sentido de se estabelecer uma formaçãoacadêmica para os profissionais da área. Em algunscasos, houve a criação de cursos de preparaçãoprofissional cujos currículos consistiam dedisciplinas de orientação acadêmica oferecidaspelas áreas de ciências naturais e humanas. Havia,então, o oferecimento de um conjunto deconhecimentos abrangente sobre o homem e asociedade numa concepção que só recentementepassou a predominar em cursos de preparaçãoprofissional na área, particularmente no Brasil.

O movimento para uma orientaçãomais acadêmica da Educação Física perdeu suaforça nos primeiros anos do século XX. Istoaconteceu, talvez, pela falta de uma direção maisefetiva para a formação de recursos humanos comnível superior, ou seja, não houve umdesenvolvimento paralelo de programas de pós-graduação na área (Park,1989).

O processo histórico da áreaencontra um paralelo interessante com o história daMedicina no mesmo período. Park (1991) temargumentado que a Medicina, assim como aEducação Física, passou por um debate semelhantena segunda metade do século XIX. A Medicina erauma profissão em crise e sofria com a falta de umabase científica mais sólida. Com osdesenvolvimentos importantes na área de FisiologiaExperimental na Europa, várioscursosde Medicinaforam remodelados passando a incorporar maisdisciplinas de cunho teórico e básico. Isto levou auma embate entre os acadêmicos e os profissionais,entre os “teóricos” da fisiologia médica e os“práticos” da clínica médica. Embora o embateentre essas classes permaneça até hoje, houve umreconhecimento na época de que ambos deveriamcaminhar juntos, em prol de uma Medicina maissólida em termos acadêmicos. Nesse caso, a opçãodos médicos foi clara: a legitimidade profissional

passa pela legitimação acadêmica. Park (1991)relata esforços de membros da Medicina imbuídosde integrar teoria e prática nesse período. Taisesforços contribuíram para tornar a Medicina numadas profissões mais bem sucedidas e respeitadas doséculo XX.

As lições da Medicina para aEducação Física eram claras a 100 anos atrás, masa Educação Física acabou por trilhar um caminhodiferente dando mais ênfase a uma profissãoorientada a procedimentos baseados na experiênciade indivíduos, ou seja, valorizou-se mais o artesãodo que o profissional. Essa tendência perdurou atéque o debate referente à dimensão acadêmica daárea foi reiniciado nos anos 60 na América doNorte.

É interessante notar os paralelosentre os dois eventos separados por quase umséculo. Em 1890, o movimento em direção àvalorização do aspecto acadêmico da EducaçãoFísica tocou no problema chave da integração deconhecimentos e em última instância da relaçãoteoria e prática. O mesmo problema acaba por serlevantado após 1960. A diferença é que a práticapredominou após 1890. Enquanto de 1964 até osdias atuais, a teoria ou a ênfase à pesquisa básicatendeu a predominar na área.

Vários autores têm discutido essaproblemática (Charles, 1992; Christina, 1989;Corbin, 1993; Wade, 1991, entre outros) de váriospontos de vista. Sem entrar em detalhes doconteúdo desse amplo debate, poderíamos dizerque os problemas da área são claros e pelo menosdois deles merecem destaque. Primeiro, o desafiode integrar conhecimentos de áreas e níveis deanálise diferentes. O objetivo é o de evitar afragmentação do conhecimento sobre um fenômenoque é complexo. Segundo, o desafio de vencer adicotomia teoria e prática, onde a conseqüênciamaisevidente é o problema da validade ecológica.

SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS ENTRE1890 E 1990: DO OBJETO DEESTUDO/ATUAÇÃO E PARADIGMAS

Como foi argumentado por Park(1989, 1991), os paralelos entre eventos separadospor um século são muito informativos para umentendimento do estado atual da área. Em face dosproblemas detectados acima, é interessanteexplorarmos mais esses paralelos tendo porreferência dois tópicos, o objeto de estudo/atuação

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da Educação Física e os paradigmas científicosdessasépocas.

As visões do objeto deestudo/atuação em 1890 e 1990 apresentamalgumas similaridades importantes. Em ambas asépocas, a atividade motora era reconhecida comoum fenômeno complexo. Em 1890, a EducaçãoFísica sofreu grande influência de avançosocorridos nas áreas de Biologia e PsicologiaExperimental (Park, 1989). Assim, a atividademotora era vista como base física da mente oucomo expressão de processos fisiológicos epsicológicos. A atividade motora sistemática, ou otreinamento físico, seria importante para odesenvolvimento de processos mentais e neurais,além de ser base para valores estéticos e morais.No Brasil, essa concepção é veiculada porFernando Azevedo entre 1915 e 1920.

O paradigma predominante na épocaera o mecanicista e reducionista, que estava noauge de sua influência nas ciências em geral. Oséculo XX é o período em que esse paradigmapassa a ser questionado, principalmente paraexplicar fenômenos de complexidade organizada(Bertalanffy, 1952). Desta forma, a atividademotora, ao ser reconhecida como um fenômenocomplexo, requereria uma abordagem complexa nasua investigação, o que na época era inexistente.

Em 1990, a concepção sobre oobjeto de estudo/atuação recoloca a questão dacomplexidade. A atividade motora é vista comoformação de padrão, num sistema de característicasnão-lineares e distante do equilíbrio termodinâmico(cf. Kelso, 1995). Além disso, a atividade motorapassa a ser vista como uma das condições básicaspara a qualidade de vida dos indivíduos (Bouchard,Shephard & Stephens, 1994).

Como foi dito anteriormente, oséculo XX caracteriza-se por um período de crisena ciência, seguido de uma revoluçãoparadigmática (cf. Kuhn, 1970). Assim, oparadigma que passa a influenciar as ciências emgeral, e o estudo da atividade motora, emparticular, é o sinergético, da complexidade ousistêmico (cf. Bertalanffy, 1977; Haken, 1983;Yates, 1987). É preciso ressaltar que osdesenvolvimentos da disciplina acadêmica nosúltimos 30 anos ocorreram em grande parte combase numa concepção mecanicista e reducionista. Afragmentação da área nesse período não deixa deser conseqüência da aplicação desse paradigma(Tani, 1988). Com a crescente influência doparadigma sistêmico, o pesquisador da atividade

motora passa a estar munido de um instrumentalconceitual e metodológico mais apropriado. Alémdisso, o problema da integração entre as áreastorna-se passível de solução a partir doreconhecimento de isomorfismos que denotam oprincípio da organização atuante nos diferentesníveis de complexidade dos fenômenos. Assim,pode-se unir diferentes áreas em torno das mesmasquestões, usando uma linguagem comum (cf.Bertalanffy, 1952, 1977). Não se pode esquecer,ainda, a grande contribuição da Física deste séculopara as ciências naturais e humanas, expressa noprincípio da complementaridade (Bohr, 1958/1995;Pattee, 1978). Nas ciências do comportamento,Hinde (1990) demonstra como a integração ecomplementaridade entre descrições obtidas emdiferentes níveis de análise contribuem para umavisão integral do comportamento.

A TRAJETÓRIA DA ESCOLA DEEDUCAÇÃO FÍSICA E ESPORTE DA USP

Após o levantamento e análise dealguns eventos históricos sobre a Educação Físicapassamos a considerar a trajetória da Escola deEducação Física e Esporte da USP. O objetivo émostrar como essa instituição se comportou emrelação aos eventos históricos citados e discutir atéque ponto as mudanças que ela passou trazemcontribuições para os dois problemas centrais darelação entre disciplina acadêmica e profissão.

A Escola de Educação Física eEsporte originou-se a partir de um decreto estadualem 1931, iniciando suas atividades em agosto de1934 (Amadio & Bueno, 1994). Durante mais de20 anos, a Escola de Educação Física funcionoucomo uma Instituição isolada, sendo incorporadoao sistema estadual de ensino superior em 1958.

A trajetória dessa Instituição podeser caracterizada por três fasesdistintas:

Pr imeira fase 1930-1960

As características da Instituição sãoclaramente resultantes dos eventos ocorridos entre1890 e 1900. As disciplinas, em sua maioria, sãoorientadas àsatividadescom predominância para asde caráter desportivo. As bases científicas são

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fornecidas pela incursão dos médicos através dooferecimento de disciplinas academicamenteorientadas como Fisiologia do Exercício,Cinesiologia, Biometria entre outras. Esse foi umprocesso similar na maioria das instituições deensino da Educação Física, onde ocorreunovamente um embate entre teóricos (médicos) epráticos (professores de Educação Física) (cf.Melo, 1996). As dimensões psicológicas, sociais eculturais da Educação Física, tão amplamentedefendidas no início do século (cf. Azevedo, 1920)eram pouco abordadas. Nessa fase, a Instituiçãocaracterizou-se, essencialmente, por umapreocupação voltada para o ensino e sua difusão.

Segunda Fase 1969-1977

A Escola é incorporada àUniversidade de São Paulo em 1969, e com issopassa a haver a necessidade de ampliar as suasatividades, particularmente, a pesquisa. O ímpetopara a produção de conhecimentos tem comomarco importante a criação do primeiro curso depós-graduação da área na América Latina. Váriosdocentes são enviados para o exterior afim decumprirem programas de pós-graduação. Forma-seo primeiro centro de pesquisa voltado,primordialmente, para a investigação de questõesbiológicas como Fisiologia do Exercício eAntropometria. Coincidentemente, outrasinstituições são estruturadas nesse período comorientação acadêmica. Merecem destaque oLaboratório de Fisiologia do Exercício(LABOFISE) da Escola de Educação Física eDesportos da Universidade Federal do Rio deJaneiro e o Laboratório de Aptidão Física de SãoCaetano (posteriormente denominado de Centro deEstudos do referido Laboratório, CELAFISCS). Osindivíduos envolvidos nesses dois laboratórios naépoca, foram os principais mentores da criação doColégio Brasileiro de Ciências do Esporte - CBCE(Araújo, 1998).

Terceira Fase 1982-1989

Retornam do exterior (Estados Unidos,Japão e Alemanha), docentes com título de doutorem Educação Física e áreas afins. Inicia-se umdebate em vários níveis da Instituição em torno dequestões acadêmicas e profissionais. Hábasicamente um confronto de idéias entre umavisão tradicional de Educação Física, típica daprimeira fase, e uma visão de Educação Física

academicamente orientada. Ocorrem mudançasimportantes na graduação e pós-graduação. O cursode Mestrado é reformulado, com a criação da áreade Pedagogia do Movimento Humano. Há tambéma criação do curso de Doutorado (o primeiro daAmérica do Sul) com a área de Biodinâmica doMovimento Humano, e a criação dos cursos deBacharelado em Educação Física, de Bachareladoem Esporte e do novo curso de Licenciatura emEducação Física, facultativo aos bacharéis emEducação Física. Aqui cabe destacar também o quese passava no cenário nacional no que diz respeitoà caracterização acadêmica da área. O CBCE haviasido projetado para ser uma sociedade científicamulti-profissional com um objeto de estudo emcomum: o esporte (Araújo, 1998). Isto explicaria,talvez, porque o CBCE teve atuação tímida para acaracterização acadêmica nos seus anos iniciais.Mas como é ressaltado por Araújo, o CBCE foimudando sua característica, passando a congregarprincipalmente profissionais da Educação Física. Jáao final dos anos 80, o CBCE passou a ser umainstituição quase que exclusivamente voltada para aEducação Física.

A criação dos cursos de pós-graduação “strito sensu” gerou um debate sobre ocaráter acadêmico da área. Em alguns casos, osprogramas foram estruturados em concepções bemdelimitadas da área de conhecimento (Canfield,1988). Outro evento que estimulou discussõessobre o caráter acadêmico foi devido àreestruturação dos cursos de graduação queculminou com legislação referente à figura dobacharel na área. Seja na pós-graduação ou nagraduação, a mesma questão era colocada: qual é ocorpo de conhecimentos que dá sustentação à área?A resposta a essa questão só veio reforçar a linhade raciocínio que considera que a legitimidadeprofissional passa pela legitimidade acadêmico-científica (por exemplo, Betti, 1996; Bouchard,1992; Tani, 1996; Wade, 1991). As discussõessobre o caráter acadêmico em nível institucionalestão de alguma forma refletida em váriaspublicações do final dos anos 80 e início dos anos90 (como Bracht, 1993; Canfield, 1988; Gaya,1994; Lovisolo, 1995; Mariz de Oliveira, 1988;Tani, 1988, 1996).

Retornando à EEFEUSP, um dosaspectos interessantes que emerge da análise de suatrajetória diz respeito à natureza teleológica dealgumas mudanças ocorridas. Por exemplo, naSegunda Fase 1969-1977, a criação do curso deMestrado em Educação Física foi um ato de

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coragem, na medida em que a produção deconhecimento na Instituição era tímida e restrita aalgumas áreas. Adotando-se uma posição maisconservadora, seria de se esperar que houvesseprimeiro a produção e acúmulo suficiente deconhecimentos para se propor a criação de umcurso de pós-graduação. O fato da criação do cursode Mestrado ter ocorrido antes que houvesse esseacúmulo de conhecimentos, colocou o curso comosendo algo ainda do futuro em termos relativos.Isto criou, por outro lado, uma pressão maior paraque os membros da Instituição se comportassem deacordo com um estado futuro, ou seja, em funçãode uma meta a ser alcançada.

Na Terceira Fase 1982-1989, ocorrea criação dos cursos de bacharelado em EducaçãoFísica e Esporte. A existência de um bachareladopressupõe a existência de um corpo organizado deconhecimentos que oriente a atuação profissional eacadêmica. Novamente, nota-se que esse corpo deconhecimentos está em formação, ou seja, é algodo futuro que passa a “determinar” ocomportamento presente dos membros daInstituição (cf. Tani, 1997).

Não há como deixar de ver aInstituição como um sistema aberto e vivo (cf.Miller, 1978) com elementos em competição, emconflito e cooperação, mudando em taxasdiferentes ao longo do tempo. O conjunto dasinterações entre eles delineia um quadro que nuncaé estático, embora o sistema seja marcado porestabilidade temporária. A EEFE-USP apresentaum quadro onde a instabilidade tem sidopredominante nas últimas duas fases em vista dasmudanças que foram promovidas. Trata-se demudanças internas deflagradas em resposta aoambiente em que ela se encontra, a USP. Apesar daUSP ser orientada ao ensino e à extensão, é napesquisa que ela se distingue. A sua tradição é a deser uma universidade voltada para produção deconhecimento. Isto criou e cria uma grande pressãopara aquelas unidades que não tem esse perfil.Neste sentido, podemos falar de um processoadaptativo (cf. Choshi & Tani, 1983; Manoel,1989, 1992; 1993; Manoel & Connolly, 1995,1997; Tani, 1982, 1989) pelo qual a Instituição tempassado. O problema é o de que estruturas queteriam que ser reorganizadas não possuíamflexibilidade ou diversidade suficiente paraenfrentar asdemandasde adaptação.

A natureza das mudanças ocorridasna Segunda e Terceira Fases podem estar impondorestrições (“constraints” ) no comportamento dos

elementos da Instituição, de forma a causaremflutuações no sistema levando-o a uma forma deadaptação auto-organizacional (Tani, 1995).Nessas condições, o sistema pode apresentar umsalto qualitativo em sua estrutura, ou seja,apresentar uma transição de fase, como éobservado em fenômenos naturais e artificiais(Haken, 1983; Prigogine & Stengers, 1984).

1982-1989: TRANSIÇÃO DE FASE NA EEFE-USP?

Tendo em consideração osproblemas detectados na evolução acadêmica daEducação Física e asmudançasocorridasna EEFE-USP, poderíamos perguntar se a Instituição nãoestaria passando por uma transição de fase. Essatransição estaria sendo considerada em função dacapacidade da instituição para tratar os doisproblemas identificados a partir da análise doseventos históricos da Educação Física: a) o desafiode integrar conhecimentos de áreas e níveis deanálise diferentes em função da complexidadeenvolvida na atividade motora humana; b) odesafio de vencer a dicotomia teoria e prática ondea conseqüência mais evidente é o problema davalidade ecológica.

Os problemas decorrentes dasmudanças ocorridas nas Segunda e Terceira Fasespodem ser resumidos na necessidade de conduzirpesquisas e organizar o corpo de conhecimentosobtidos através delas. A necessidade de integraçãodo conhecimento e a relação teoria e prática estãocertamente envolvidasnesse processo.

Dentre as mudanças ocorridas naTerceira Fase, e que de uma certa forma continuamaté hoje, há indicação de que elementos daInstituição (sejam indivíduos, grupos de estudo,laboratórios, departamentos) começaram aapresentar um comportamento que reflete algunspassos importantes para suplantar os doisproblemas levantados.

Há um indício de uma preocupaçãoem distinguir pesquisas em três esferas (Básica,Aplicada e Tecnológica) e buscar oestabelecimento de um fluxo dinâmico deconhecimentos e problemas entre elas. A ênfase aocaráter profissional da Educação Física,negligenciando seu papel na produção deconhecimento, vai na contramão das tendênciasobservadas em vários campos também tidos comoeminentemente profissionais. Esse é o caso da

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Medicina e da Engenharia. Os processos degeração, transmissão e aplicação de conhecimentotendem a ser desenvolvidos de forma integrada emtodas as áreas da universidade, não importando seseu caráter é profissional ou não. Essa tendência éencontrada inclusive em empresas que destinamrecursos não só para o desenvolvimentotecnológico como também para pesquisas aplicadase até básicas. Vale lembrar que na atuaçãoprofissional surgem problemas cuja soluçãodemanda novos conhecimentos. A produção desseconhecimento nem sempre é realizada por áreas depesquisa básica. Num mundo onde a comunicaçãoe o acesso à informação são essenciais, vemoscomo perigosa a dependência de que outrosproduzam o conhecimento necessário para aresolução de problemas que afligem a profissão.Se a Educação Física ficar à espera que outrosproduzam o conhecimento de que ela necessita há orisco de que seusprocedimentos técnicose serviçostornar-se-ão obsoletos muito rapidamente. Comofoi dito anteriormente, de um ponto de vistasistêmico, estaria se atribuindo à profissão umcaráter de sistema fechado (veja Waddington,1981, para uma discussão mais aprofundada desseproblema).

Com o reconhecimento de quesistemas de produção de conhecimentos e de benssão sistemas abertos passou-se a estabelecer umacrescente integração entre as pesquisas básica,aplicada e tecnológica (Bunge, 1981). Os modelosde produção do conhecimento mais tradicionaisconsideravam cada tipo de pesquisa como módulosnão só distintos mas independentes, com fluxo deconhecimento de mão única (da pesquisa básicapara a tecnologia). Entretanto, como apontaGoldemberg (1998), a tendência atual é a crescentesobreposição entre esses módulos com fluxo dedupla mão. Como conseqüência é comum encontrarna universidade campos de atuação ditosprofissionais, como Medicina e Engenharia, quetêm investido na investigação científica como umaforma eficiente de inovar procedimentos deintervenção na sociedade. Atualmente, o empenhona pesquisa é comum a um instituto de ciênciabásica como a uma faculdade de caráterprofissional. Um exemplo dessa tendência pode serencontrado no campo denominado por Varela(1988) de Ciências e Tecnologias da Cognição.Esse campo envolve, de forma interrelacionada, aPsicologia Cognitiva, Neurociências, Linguística,Epistemologia e Inteligência Artificial. Ospesquisadores nessas áreas reconhecem que para

produzir máquinas inteligentes (tecnologia) épreciso entender a mente (pesquisa básica oufundamental). Ao mesmo tempo, modelos teóricossobre o funcionamento da mente só são válidos namedida em que ofereçam suporte para gerarmáquinas realmente inteligentes. O fluxo é tãodinâmico entre as áreas que é um exercício fútildiscutir-se sobre as fronteiras entre elas. Isto sugereque, no conjunto, elas se tornaram parte de ummacro-sistema. A falta de uma dessas áreascompromete o sistema como um todos. Há indíciosde uma preocupação na EEFE-USP de se ampliaras atividades de pesquisa nas três esferas, básica,aplicada e tecnológica, bem como estreitar os laçose dinamizar o fluxo de informações entre elas. Porexemplo, em outros ensaios procuramos mostrarcomo a área de Comportamento Motor daInstituição tem estabelecido estratégias paracaminhar nessa direção (cf. Manoel, 1995, 1996).

A Instituição assumiu de formaimplícita um modelo onde a Educação Física e oEsporte constituem-se em campos de conhecimentoe pesquisa num sentido lato. Elesseriam compostospor duas áreas, uma de caráter básico e outra decaráter aplicado-tecnológico. Essa proposta foidesenvolvida por Tani (1989) e é representada naFIGURA 1. As duas áreas do conhecimentoidentificadas são a Cinesiologia (Pesquisa básica -Estudo da Atividade Motora Humana) e aEducação Física e o Esporte (Pesquisa Aplicada eTecnológica). A Cinesiologia que se ocupa dainvestigação do fenômeno movimento humano deuma forma abrangente e profunda consiste de trêssub-áreas: Biodinâmica do Movimento Humano,Comportamento Motor Humano e Estudos Sócio-Culturais do Movimento Humano. A Biodinâmicado Movimento Humano estuda os mecanismos desustentação para a atividade motora (bioquímica,fisiológica) bem como de organização motora emseus aspectos físicos internos e externos(biomecânica). O Comportamento Motor Humanoestuda os processos neuropsicológicos daorganização motora em termos de controle,desenvolvimento e aprendizagem motora. A áreade Estudos Sócio-Culturais de Movimento Humanoestuda os aspectos sociais, antropológicos efilosóficosda atividade motora humana.

As pesquisas realizadas nessas sub-áreas seriam eminentemente básicas sendo,portanto, do interesse não só da Educação Física,mas de todo campo profissional cuja a preocupaçãoseja atuar sobre o comportamento motor humano,

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como a Fisioterapia, Medicina, Ergonomia, Terapia Ocupacional, entre outras.

Pesquisa Básica

CINESIOLOGIA

BIODINÂMICADO

MOVIMENTOHUMANO

COMPORTAMENTOMOTOR

HUMANO

ESTUDOSSÓCIO-CULTURAISDO MOVIMENTO

PEDAGOGIADO

MOVIMENTOHUMANO

ADAPTAÇÃODO

MOVIMENTOHUMANO

EDUCAÇÃOFÍSICA

Pesquisa Aplicada

FIGURA 1 - Estrutura da educação física enquanto uma área acadêmica (Tani,1989).

A Educação Física estariapreocupada em realizar investigações de cunhopedagógico e profissional que serviriam de basepara a elaboração e desenvolvimento de programasde Educação Física a nível formal e não formal(veja também O’Hanlon & Wandzilak, 1993). Suasáreas de concentração seriam duas, Pedagogia doMovimento Humano e Adaptação do MovimentoHumano. Em relação ao Esporte, incluído nomodelo por Tani (1996) recentemente, haveria acomposição de duas sub-áreas: TreinamentoEsportivo e Administração Esportiva.

A partir de 1989, com areformulação do curso de mestrado em EducaçãoFísica e a criação do doutorado, foramestabelecidas duas áreas de concentração na Pós-Graduação: Biodinâmica do Movimento Humano ePedagogia do Movimento Humano. Nesse sentido,a instituição assumiu, ainda que de forma implícita,

o modelo de Tani. As vantagens desse modelo sãovárias. Entre elas destacamos o fato dele lidar comambigüidade presente nos modelos deCinesiologia, Ciências da Atividade Física eCiências do Esporte. Isso se deve ao dilema queessas áreas enfrentam entre produzir conhecimentobásico orientado pela e para as chamadasdisciplinas-mãe e produzir conhecimento aplicadoaos problemas pertinentes à cada área de atuaçãoprofissional (Esporte e Educação Física).

A ciência tem duas funções, umavoltada para explicar por que as coisas são comosão e a outra voltada para desenvolver meios demanipulação do mundo material através de umconjunto de técnicas, práticas e invenções.Entretanto, muito freqüentemente, essas duasfunções são tratadas de forma desconexa comoaponta Lewontin (1991). O modelo de Tanipropicia um terreno fértil para suplantar essa

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dicotomia. Restam, com certeza, novos passos àfrente e nessa direção. A análise das idéias deVargas (1999) sobre a evolução da técnica etecnologia nos dá uma idéia do caminho trilhado eo que resta trilhar. Vargas distingue quatro etapasnesse processo:

a) Técnica do acaso: a fabricação de instrumentosnão se diferencia dosatosmateriais;

b) Técnica do artesanato: o instrumento éestático, não se desenvolve, a mesma técnica étransmitida de geração a geração ;

c) Técnica dos técnicos: surge com a ciênciamoderna a partir do século XVIII, o método deação é similar ao do cientista;

d) Tecnologia: resolução de problemas técnicosde uma forma generalizada desenvolvendoteoriasda prática.

A Educação Física num estado emque há pouca ou nenhuma produção deconhecimentos encontra-se na etapa 1. Os modelosambíguos da Cinesiologia, Ciências da AtividadeFísica e do Esporte propiciam à Educação Física eao Esporte atingirem a etapa 3. O modelo de Tani éo que mais oferece condições para que se atinja aetapa 4 correspondente à Tecnologia. Para que issose concretize, é fundamental que a instituiçãoamplie o modelo original com a inclusão das áreasde Comportamento Motor e Estudos Sócio-culturais do Movimento Humano, além das sub-áreas aplicadas de Adaptação do Movimento,Administração Esportiva e Treinamento Esportivo.Só assim será possível concretizar o estreitamentoentre a pesquisa e a tecnologia.

De nada adianta distinguir osdiferentes tipos de pesquisa se o paradigma que asorienta é de natureza reducionista. Neste sentido, éfundamental que se entenda o processo da pesquisaonde duasdimensõesdo reducionismo merecem serdestacadas (cf. Tani, 1988). No processo deinvestigação, o pesquisador parte de um fenômenoque é via de regra complexo, ou seja, aspropriedades que ele apresenta emergem dasrelações entre os elementos que o compõem. Opasso seguinte é a redução desse fenômeno a um

objeto que seja passível de ser investigado. Aseguir identificam-se as variáveis a seremestudadas. O procedimento é analítico e focalizadona fidedignidade. Essas etapas caracterizam o quese pode denominar de reducionismo metodológico.Ele é essencial para que a pesquisa atinja osobjetivos traçados. Entretanto, de posse dosresultados obtidos, um passo a ser seguido é o deretornar ao fenômeno complexo com objetivo deaplicar o conhecimento. Esse procedimentocaracteriza o que se pode denominar dereducionismo paradigmático. Ou seja, opesquisador tenta explicar um fenômeno complexoa partir da análise dos componentes. No caso desistemas caracterizados por complexidadeorganizada (Bertalanffy, 1977), esse procedimentoserá infrutífero pois a essência desses sistemasreside no padrão de interação entre oscomponentes. A atividade motora apresenta essascaracterísticas, o que demanda pesquisas comvisões alternativas às do paradigma reducionista,ou seja, pesquisas que adotem uma abordagemcomplexa de forma a garantirem uma maiorvalidade ecológica.

Novamente, identifica-se naInstituição elementos preocupados com a questãoda validade ecológica. Tani (1979, 1992) propõeque se realizem pesquisas de natureza básica comum referencial sistêmico focalizado no problemasda complexidade organizada. Além disso, elepropõe que sejam realizadas pesquisas de caráterintegrativo e de síntese de conhecimentos onde sebusque verificar a aplicabilidade dosconhecimentos de pesquisa básica numa situaçãocomplexa (ver FIGURA 2). Esse tipo de pesquisaseria caracterizado por um procedimento sistêmicoe com foco na validade ecológica. Essas pesquisasnão são de característica aplicada no sentidoclássico, uma vez que elas são orientadas aodesenvolvimento de teorias. Ao mesmo tempo, aidentificação de princípios com validade ecológicaindicam os objetos de investigação para a pesquisaaplicada e o desenvolvimento tecnológico (cf.Manoel, 1995).

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FENÔMENOCOMPLEXO

OBJETODE

ESTUDORESULTADOS

REDUÇÃO

PROCEDIMENTOANALÍTICO

PESQUISAINTEGRATIVA

SÍNTESE DECONHECIMENTOS

VERIFICAÇÃO DAAPLICABILIDADE

DOSCONHECIMENTOS

RESULTADOSFENÔMENOCOMPLEXO

?PROCEDIMENTOSISTÊMICO

FOCO NAVALIDADEECOLÓGICA

FOCO NAFEDEDIGNIDADE

(Modificado deTani, 1989)

FIGURA 2 - Processo de pesquisa e o reducionismo metodológico e paradigmático (Adaptadode Tani, 1989).

A dinâmica da produção deconhecimentos nessa concepção reforça a noção deum sistema hierárquico, onde cada nível apresentaum certo grau de autonomia para investigarproblemas específicos. Ao mesmo tempo, cadanível influencia e é influenciado pelos demaisníveis no sentido de agir de forma coordenada, emfunção de um todo maior. São as duas faces deJano (cf. Koestler, 1982) com suas tendências auto-afirmativa (voltada para si mesma) e integrativa (abusca de agir em conjunto, voltada para o coletivo)nas áreas acadêmica e profissional da EducaçãoFísica (Manoel, 1996).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base na análise da trajetória daEEFE-USP, gostaríamos de sugerir que há indíciosde uma transição de fase nessa Instituição.Entende-se que ela começa a apresentar algunsindicativos para a solução de problemas que têmafligido e impedido o desenvolvimento daEducação Física enquanto uma área acadêmica eprofissional.

Deve-se ressaltar, no entanto, que ocurso das mudanças na Instituição ainda éimprevisível. Trata-se de um sistema aindaextremamente instável, como denota a interaçãoentre os departamentos, as comissões, oslaboratórios, os docentes. Vale lembrar que váriosdos atores envolvidos na mudança ocorrida na 3a.Fase ainda se encontram na Instituição. Há, aomesmo tempo, um aumento crescente de recursoshumanos formados após a 3a. Fase com orientaçãoacadêmica solicitada. Nesse período de maiorinstabilidade muito dependerá da forma como osseus elementos irão flutuar para determinar o cursodo processo. Até o momento, acaso e necessidadetem agido de forma cooperativa na instituiçãocomo é típico de sistemas abertos (cf. Jantsch,1980).

É importante ressaltar que o presenteensaio caracterizou-se muito mais por uma reflexãosobre a trajetória da EEFE-USP nos últimos 70anos. Não foram coletados dados empíricos dasfontes primária ou secundária para provar oudesqualificar nossa hipótese sobre a transição defase. Tratou-se de alinhavar algumas idéias sobre aestrutura acadêmica da Educação Física, seuprogresso, seus problemas, de forma a comentar

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alguns aspectos da trajetória da EEFE-USP.Olhando para o futuro muitas perspectivas seabrem.

Uma das direções a ser seguida pelaInstituição poderia estar numa análise maiscuidadosa do que Simon denomina de problema daartificialidade (Simon, 1993). Fenômenos naturaisapresentam uma característica de necessidade namedida em que eles são submissos às leis naturais.Fenômenos artificiais, por outro lado, têm comocaracterística a contingência em função de suamaleabilidade pelo ambiente. Para essesfenômenos, Simon argumenta a necessidade do

desenvolvimento das ciências que lidem com ocontingente, ou seja, não com como as coisas sãomascom como elaspodem vir a ser.

Segundo Simon (1993), asdificuldades que áreas profissionalizantes sempreencontraram para definir e produzir um corpo deconhecimentos academicamente sólido eprofissionalmente válido, residiram na falta de umacompreensão mais detalhada dos fenômenosartificiais. Em resumo, há a necessidade dodesenvolvimento das ciências do artificial. AEducação Física estaria entre elas.

ABSTRACT

THE DYNAMICS OF THE STUDY AND PROMOTION OF HUMAN MOTOR ACTIVITY:PHASE TRANSITION IN EEFE-USP?

In the 60’s, Physical Education was questioned as an academic subject in the north americanuniversity system, this was challenged by the proposition that Physical Education was an academic disciplinethat has human movement as its subject matter. In the 70’s Human Movement Studies was proposed as a fieldof study in Great Britain. In the 80’s there was considerable increase in proposals of such a discipline comingfrom different countries under different names like Human Movement Science, Kinanthropology, HumanMotricity, being Kinesiology the term with the greatest impact in the north american university system thatcan be gathered by the number of Physical Education Departments that switched to it. The order out of theacademic discipline movement was characterised by a wider understanding of human movement phenomena.The disorder out of the academic discipline movement was a gradual process by which Kinesiology andPhysical Education became apart as separate and often unrelated subjects. In the 90’s the academic status ofPhysical Education is challenged again. In the present essay we discuss some aspects of the changes thatPhysical Education as a field in the university underwent focusing on the School of Physical Education andSport of the University of Sao Paulo. This field developed according to the reductionism, a major paradigm inclassical science. Further development will depend upon a paradigmatic shift toward the creation ofintegrative areas that are systems or complexity oriented. In such a view basic and applied sciences andtechnology interweave in a dynamic mode. The analysis of the historical path of EEFE-USP suggests thatsteps were made in this direction in the early 90’s which may be considered a phase transition in the structureof the field.

UNITERMS: Physical education; Kinesiology; History; Academic discipline.

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AGRADECIMENTOS

Go Tani pela leitura crítica do presentetrabalho e pelas inúmeras discussões e reflexões sobre adisciplina acadêmica da Educação Física, ao longo dosúltimos 15 anos. Benedito Pereira pelas calorosasdiscussões sobre o modelo de disciplina acadêmica, aofinal das quais nós invariavelmente terminamos em ladosopostos. Aos dois revisores anônimos pelos comentários,críticas esugestões apresentadas.

Recebido para publicação em: 21 dez. 1998Revisado em: 31 maio 1999

Aceito em: 28 jun. 1999

ENDEREÇO: Edison de JesusManoelDepto. Pedagogia do Movimento do Corpo HumanoEscola de Educação Física e Esporte - USPAv. Prof. Mello Morais, 6505508-900 - São Paulo - SP - BRASILe-mail: [email protected]