A Crise Simbólico-Arquetípica Da Adolescência1
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8/17/2019 A Crise Simbólico-Arquetípica Da Adolescência1
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A Crise Simbólico-Arquetípica da Adolescência1
Carlos Amadeu Botelho Byington2
Palavras Chave:Adolescência – Fases do desenvolvimento simbólico arquetípico da Consciência –
Arquétipo da Alteridade – Anima e Animus – Processo de Individuação – Arquétipo
Matriarcal – Arquétipo Patriarcal – Consciência Coletiva.
Resumo
A adolescência é a quarta fase do desenvolvimento simbólico arquetípico da
personalidade e corresponde, no nível endócrino, ao amadurecimento das glândulas
sexuais. Nesta fase, que vai dos 12 aos 20 anos de idade, os jovens tendem a se
diferenciar da família original e a buscar um grupo próprio (a patota) através do qual
começam a construir sua inserção social.
Esta fase é regida arquetipicamente pelo Arquétipo Patriarcal na posição ativa e
pelo Arquétipo da Alteridade (Anima e Animus) na posição passiva.
A integração e o exercício do Arquétipo Patriarcal pela personalidade do
adolescente ensejam o processo de polarização, no qual o adolescente confronta e
desafia a autoridade parental e coletiva e busca exercer o poder à sua maneira. Como,
porém, ainda não sabe como fazê-lo, oscila entre uma posição de soberbia e arrogância e
outra de impotência e desamparo.
A polarização do adolescente desnorteia os pais porque, por um lado, eles são
confrontados, desafiados e até desacatados, caso resolvam reprimir o adolescente, e, por
outro, são solicitados a amparar o adolescente quando ele regride e procede de maneira
infantilizada.
Junto com a polarização de dominância patriarcal, a adolescência apresenta a
ativação dos arquétipos da Anima, do Animus e da Alteridade, que propiciarão o início da
relação dialética entre as polaridades, necessária à formação da nova família e à
transformação criativa da sociedade.
1 Palestra proferida no Congresso Brasileiro de Psicologia & Adolescência, promovido pela EPPA Escola Paulista de Psicologia
Avançada. São Paulo, 15 de outubro de 2010.2 Médico Psiquiatra e Analista Junguiano. Membro fundador da Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica. Membro da Associação
Internacional de Psicologia Analítica. Criador da Psicologia Simbólica Junguiana. Educador e Historiador.E-mail: [email protected] site: www.carlosbyington.com.br
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A Cr ise Simbólico-Arquetípica da Adolescência
Para contextualizarmos a importância da quarta fase arquetípica da formação da
Consciência, que é a crise da adolescência, no processo de individuação, farei
inicialmente uma breve descrição das sete fases da vida, todas com intensos e típicoscomponentes simbólicos e arquetípicos.
1ª Fase: Intra-uterina – O processo de formação do Ego e da Consciência inicia-
se com a fase intra-uterina. Cada vez mais, estudamos e conhecemos melhor as reações
da futura criança durante a formação do embrião e do feto. As reações aversivas do feto
ao líquido amniótico quando a mãe fuma ou ingere certos medicamentos e drogas, por
exemplo, são muito significativas. Além disso, é de igual ou muito maior importância
também, nesta fase, o conjunto de reações dos pais, da família e da cultura à concepçãoe à gestação do novo habitante planetário em quem, ao nascer, serão projetados
inúmeros significados simbólicos, que afetarão grandemente a formação futura da sua
identidade.
2ª Fase: Primeira Infância – do nascimento aos 2 anos de vida. Esta fase
apresenta uma grande dominância do Arquétipo Matriarcal, com o Ego emergente na
posição dominantemente passiva. O Arquétipo Matriarcal é aqui conceituado não só como
o arquétipo do feminino, mas essencialmente como o arquétipo da sensualidade, que
engloba também o masculino. Como o Ego se forma dentro do Self familiar, notamos aqui
a presença dos complexos parentais e do Arquétipo Patriarcal ao lado do Matriarcal, junto
com os significados do vínculo entre eles e as reações da criança dentro do quatérnio
primário (Byington, 2008). A vivência do Arquétipo Matriarcal se da, nesta fase,
basicamente de forma passiva, pois a forma ativa é essencialmente atuada pelos pais.
3ª Fase: Segunda Infância – dos 2 até os 12 anos de idade. Nesta fase,
observamos a vivência do Arquétipo Matriarcal com o Ego na posição cada vez mais ativa
e o Patriarcal na posição dominantemente passiva. Observa-se aqui a interação do
embate entre os arquétipos Matriarcal e Patriarcal, que durará por toda a vida e que aqui
será especialmente tempestuosa, por ser primária. Dentro do referencial teórico da
Psicologia Simbólica Junguiana (Byington, 2008), o Arquétipo Patriarcal atua também na
personalidade do homem e da mulher. Ele é o arquétipo da organização e é, por isso,
altamente conflitivo com a sensualidade e a espontaneidade do Arquétipo Matriarcal.
4ª Fase: Crise da Adolescência – de 12 aos 20 anos. Trata-se da fase de
separação da família original e do preparo para a formação da nova família e da
transformação social. Nesta fase, os arquétipos matriarcal e patriarcal são vivenciados
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dominantemente na posição ativa. O prazer é buscado explicitamente, como, por
exemplo, na masturbação, na alimentação, na vestimenta e na diversão (sensualidade
matriarcal) e as obrigações são exercidas cada vez mais à maneira do Ego (organização
patriarcal). A busca do Outro fora da família, acompanhada do amadurecimento das
glândulas sexuais, enseja a ativação dos arquétipos da Anima, do Animus e daAlteridade, expressos no enamoramento e no encaminhamento da vocação.
Os Arquétipos da Anima, do Animus e da Alteridade são vivenciados de maneira
passiva, pois as vivências amorosas e vocacionais acontecem de forma aleatória, por
sincronicidade, nas quais o Ego é muito mais reagente do que agente.
5ª Fase: Fase Adulta – de 20 a 40 anos. Esta é a fase do casamento, da
construção da nova família e da vida profissional. Reativam-se aqui os arquétipos
Matriarcal e Patriarcal de maneira ativa, no aconchego conjugal dos filhos e do lar, juntocom o esforço profissional para prover a educação dos filhos e a vida familiar.
Desenvolve-se muito, no Self familiar, a integração dos Arquétipos da Anima, do Animus e
da Alteridade, havendo uma contenção destes pelos arquétipos parentais, para vivenciá-
los na relação conjugal e na criação dos filhos, ao invés de em outras relações amorosas
fora do lar.
6ª Fase: Maturidade – doa 40 aos 60 anos. Reativam-se os arquétipos da Anima,
do Animus e da Alteridade para diferenciar a personalidade, agora não mais da família
original, mas do coletivo em geral, para desenvolver a identidade ontológica, identidade
única de cada pessoa. Trata-se, pois, da segunda adolescência no processo de
individuação, que frequentemente coincide com a separação conjugal e a busca de
parceiros que melhor correspondam à individualidade conquistada. Muitas vezes, esta
segunda adolescência irá completar as limitações da primeira e continuar a aperfeiçoar a
separação da identificação com os pais, ainda pouco realizada. Sua característica mais
profunda será o exercício dos arquétipos da Anima, do Animus e da Alteridade em uma
obra criativa que diferencie a pessoa profissionalmente de forma significativa.
7ª Fase: Despedida e Transcendência – dos 60 aos 80 anos. Esta fase
corresponde à vivência do final da vida terrena e ao preparo para a vida eterna. Ela se
caracteriza pela vivência do sacrifício progressivo do corpo físico, através das doenças e
do enfraquecimento geral, em troca da aquisição da Consciência do corpo cósmico. Nesta
fase, a pessoa se desapega de maneira crescente dos arquétipos Matriarcal, Patriarcal e
de Alteridade em sua relação com a vida terrena, para vivenciá-los na grandiosidade do
universo. Através da meditação, vivenciam-se nesse sentido os arquétipos da Anima, do
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Animus e da Alteridade, junto com a ativação maciça do Arquétipo da Totalidade, para se
construir a vida além da morte no infinito e na eternidade.
Considerações Mais Amplas Sobre a Crise na Adolescência
A separação psicológica da família original, dentro do processo de individuação,como já vimos acima, ocorre dentro de uma crise caracterizada pela polarização do
Arquétipo Patriarcal integrado progressivamente pelo adolescente na segunda infância,
que o faz impor sua personalidade perante sua família. De agora em diante ele adquire
força para matar. Esse embate é intensificado pelo amadurecimento dos órgãos sexuais,
que o tornam também capaz de procriar. Ativam-se agora os Arquétipos da Anima, do
Animus e da Alteridade, que propiciam a busca e o encontro da vida e do mundo na
construção do seu próprio caminho. Esta aventura (ad-ventura=busca da felicidade) é degrande envergadura, o que enseja a ativação do Arquétipo do Heroi pelo Arquétipo
Central. Imbuído da sensualidade matriarcal e do poder patriarcal, o adolescente busca
intensamente a satisfação dos seus desejos e a imposição da sua autoridade, daí a força
da polarização no embate com os pais. Daí também a pujança da sua busca de aventura,
de conhecimento, integração e domínio do novo que frequentemente o conduzem à
onipotência e às situações de risco. Sua arrogância e soberbia não raramente são
coroadas com a morte.
A adolescência exige o sacrifício da infância e da dependência dos pais, o que é
muito tormentoso. Este sacrifício, morte e ressurreição desencadeiam um ataque
simbolicamente homicida aos pais. Em casos extremos, este ataque se torna literal e
defensivo, levando ao assassinato psicopático.
Se exercida de forma ativa, a polarização com os pais ocorre através de
enfrentamentos diários dentro de casa. Uma família até então pacata, pode, da noite para
o dia, passar a viver uma verdadeira guerra emocional na disputa da autoridade e da
auto-afirmação. É um ledo engano os pais acharem que podem reprimir a crise e revertê-
la à situação anterior, que caracterizava a segunda infância. Ao ter acesso ao Self cultural
além da dimensão espaço-tempo do Self familiar, o adolescente adquire um enorme
poder que, se reprimido dentro de um relacionamento neurótico defensivo, pode levá-lo a
recorrer à mentira, ao roubo, às drogas e ao crime para se afirmar de maneira
psicopática.
Nesse sentido, é importante que a crise familiar se realize principalmente dentro da
família, pois ali é a arena natural e o altar para o sacrifício e morte da infância.
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Quanto mais rica, promissora e pujante é a personalidade, mais energia ela terá
para investir na intensidade da crise da adolescência.
Acompanhei o caso de uma moça que aos treze anos passou a polarizar
intensamente com os pais. No entanto, seu pai havia tido uma educação muito tradicional
e era não só rígido, como agressivo. Passou a contra-polarizar com a filha ameaçando-ainclusive com a agressão física. O resultado é que ela passou a mentir e a sair de casa,
inclusive à noite. Aos 15 anos, tornou-se muito rebelde e não obedecia mais a ninguém.
Numa madrugada, a família recebeu um telefonema da delegacia dizendo que a filha
estava presa. O pai, a mãe e um advogado apressaram-se a ir saber o que havia
acontecido. O delegado, indignado, contou-lhes que a menina ofendera um garçom num
restaurante e desencadeara uma tal baderna que a polícia foi chamada. Contida,
algemada e levada para a delegacia, lá chegou furiosa. O delegado mandou queretirassem suas algemas e a primeira coisa que ela fez foi voar em cima dele e arranhar-
lhe o rosto. Durante a terapia de família determinada pelo Juizado de Menores, a
polarização foi vivenciada intramuros, como deveria ter sido originalmente. O dinamismo
patriarcal defensivo dela foi vivenciado dramaticamente e, com a participação crescente
da mãe, até então dominantemente ausente, foi contida e coordenada pelo analista até
que começou a arrefecer. Ao ser aprovada no vestibular, aos 18 anos, a jovem passou a
apresentar uma conduta cada vez mais equilibrada e responsável. Posteriormente,
formou-se em administração, casou-se, teve duas filhas, tornou-se empresária e uma
pessoa de grande determinação, maturidade e eficiência.
O resultado da crise de adolescência, por mais efervescente que seja, quando
acompanhada e contida pela família, pode se tornar um vaso excelente de transformação
para formar admiráveis personalidades. Esta é, sem dúvida, uma grande luta que às
vezes pode durar anos, com sofrimento, desgaste de energia e tempo, mas cujo resultado
pode ser altamente compensador.
Referências Bibliográficas
BYINGTON, Carlos Amadeu Botelho (1977). Adolescência e Transformação Social. ATerapia do Terapeuta de Adolescentes. Trabalho apresentado no IV Fórum para Estudoda Infância e da Adolescência. Salvador, 1977.
___________ (1988). Adolescência e Interação do Self Individual, Familiar, Cultural e
Cósmico. Introdução à Psicologia Simbólica da dinâmica familiar. Junguiana, Revista daSociedade Brasileira de Psicologia Analítica. São Paulo, no 6, pp. 47- 118, 1988.
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___________ (2004). A Construção Amorosa do Saber – Fundamento e Finalidade daPedagogia Simbólica Junguiana. São Paulo: W11 Editores, 2004.
___________ (2008). Psicologia Simbólica Junguiana – A viagem de humanização docosmos em busca da iluminação. São Paulo: Linear B, 2008.