A construção da identidade negra no filme Jubiabá - Maria Angela Pavan e Dennis de Oliveira

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    A construo da identidade negra no filme "Jubiab"

    Maria Angela Pavan1

    Dennis de Oliveira2

    Resumo

    Este texto foi realizado tendo como referncia a filmografia de Nelson Pereira dos Santos,na qual se constata sua preocupa!o com a exclus!o dos negros na sociedade "rasileira#Seus filmes a"ordam temas relevantes para compreens!o da forma!o da sociedade nad$cada de %&'(& e nos permite pensar as quest)es a"ordadas nos di*logos e nosrelacionamentos inter+raciais no percurso de aldo -do filme .u"ia"*/ em "usca de suaidentidade# 0tilizamos para tanto os referenciais te1ricos de Stuart 2all na constitui!o deuma topologia conceitual para as culturas de matriz africana, particularmente as percep)esde corpo, estilo, tempo, al$m de fazer uma an*lise da tra3et1ria do personagem principal do

    filme#Palavras-chave: Processos medi*ticos e culturais4 M5dia e racismo4 6inema e rela)esraciais

    ntroduo: A !r- !roduo de Jubiab

    Nelson Pereira dos Santos estava em sua mel7or fase quando escreveu o

    roteiro e dirigiu o filme .u"ia"*# Pensou em realiz*+lo em fins de 89:; quando aca"ava de

    produzir o filme Mem1rias do 6*rcere, uma adapta!o da o"ra de

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    transtornos para a produ!o do filme que deveria ser iniciado em setem"ro# Dezem"ro $

    ver!o, muita agita!o em Salvador, tanto que Nelson Pereira dos Santos resolve parar as

    filmagens e no final de dezem"ro muda toda a equipe para 6ac7oeira, cidade tranqGila H

    uma 7ora de Salvador# Na tranqGilidade, o cineasta Nelson roda .u"ia"* por trs meses# Seu

    fil7o NeI $ o diretor assistente e "rao direito do pai para todos os assuntos so"re a

    produ!o#

    As pessoas perguntavam com curiosidade so"re a nova produ!o para

    Nelson Pereira dos Santos, e levavam como referncia o filme premiado Mem1ria do

    6*rcere# Mas o diretor n!o deixava por menos a compara!o e respondia desta maneira

    No fao um filme em cima do outro, fao um ao lado dooutro. No para superar o anterior, um outro espao, um outro campo deinteresse (...)Vou fazer Jubiab no maior astral, descontrado, poderei eercer

    meu prazer esttico li!remente."#

    Ada!tao: um e#erc$cio de reescrever uma hist%ria

    Em decorrncia dos v*rios prmios rece"idos pelo filme Mem1rias do

    6*rcere, Nelson estava vivendo um momento de muita segurana em rela!o a sua

    capacidade em produzir filmes#

    Juando comenta so"re a adapta!o do livro de

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    anteriores em Mem1rias 89:;': -nico que perce"e este desafeto na

    pele e referencia sua ang>stia apenas no final, quando no momento de uma assem"l$ia

    sindical prestes a decretar uma greve, ele demonstra seus sentimentos at$ ent!o selados#

    A constru!o do personagem aldo marca a narrativa do filme# Na infQncia,

    comea a perce"er as diferenas e na adolescncia comea a desenvolver um ol7ar cr5tico

    que se concretiza na fase adulta como "oxeador# Este $ outro momento em que o filme

    difere do livro porque no livro de .orge Amado, aldo comea como "oxeador# .* no filme,

    ele se constr1i como "oxeador na idade adulta# .orge Amado deu total li"erdade para

    Nelson Pereira dos Santos4 o escritor n!o acompan7ou o roteiro e nem mesmo as filmagens#

    &ma leitura: a construo da identidade do !rotagonista - 'aldo

    Escol7emos o tema Rconstru!o da identidade do protagonistaR porque ficou

    evidente a luta da constru!o da identidade do personagem aldo no filme# O personagem $deslocado de seu mundo no morro e colocado em um n>cleo familiar de "rancos# No in5cio,

    7* o estran7amento inicial, mas as diferenas n!o s!o denotadas, perce"e+se apenas um

    sentimento de n!o pertencer aquele espao# Juando ainda menino, aldo que 3* tem as

    ;

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    caracter5sticas dos meninos de seu lugar de origem o morro, "usca em seu tempo livre o

    prazer de "em viver, mesmo nas situa)es dif5ceis#

    As imagens iniciais s!o as crianas no morro se relacionando com os adultos,

    ouvindo+os, acompan7ando as m>sicas que est!o tocando, mas um ol7ar de muito respeito#

    2* um ol7ar de alteridade de am"os que fica evidente na primeira cena, as crianas correm

    3untas e descem um elevado em dire!o a um grupo de adultos que est!o cantando e os

    acompan7am no "atuque# Num corte de cena em seguida mostra o pai .u"ia"* que $

    representado pelo ator sica inicial $ de $ T$ti e

    a edi!o do som $ muito perspicaz, entra o "arul7o da c7uva devagar em fade$outdo sam"a

    e a"re ofade$incom a imagem de .u"ia"* saindo da casa# Ainda de"aixo da c7uva aldo-criana + AntUnio .os$ Santana/ est* com seus amigos e $ c7amado por sua tia Luisa -=ut7

    de Souza/ que seca o seu ca"elo, oferece um prato de comida e de um instante para outro

    diz que n!o o con7ece#

    aldo interrompe a alimenta!o e corre para c7amar o pai .u"ia"* que vem

    para a3ud*+lo# Esta $ a cena que antecede as demais, onde se perce"e a am"igGidade de

    emo)es que aldo experimenta ainda criana# 0ma rela!o de aconc7ego e

    estran7amento, de cuidados e desafetos, e tudo isso fica transparecido em seu ol7ar de

    menino, quando tenta entender a tia que tem pro"lemas#

    0ma cena id5lica, porque nela est* contida o medo que aldo sente do

    a"andono que est* por vir e c7ora, e por este motivo $ retirado da casa# No morro 7* a

    solidariedade mas tam"$m o a"andono porque mesmo diante do grande pro"lema da tia,

    aldo tem que ir em"ora# Neste momento aldo se despede do pai .u"ia"*, que l7e d* de

    presente um amuleto protetor e pede para que ele volte quando crescer#

    aldo desce o morro espiando para tr*s, a imagem denota a liga!o com a

    religiosidade e respeito ao pai .u"ia"*, onde aldo encontra sua prote!o e segurana, e suaidentidade fica marcada atrav$s deste respeito e liga!o com o pai .u"ia"*#

    Esta descida para o asfalto $ misteriosa mas c7ega a seu o"3etivo, a casa do

    comendador Verreira -=aImond Pellegrin/# De imediato, n!o foi aceito por Am$lia a

    empregada da casa -6at7erine =ouvel/ que vivia dizendo

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    %m ne&ro a'ui dentro, isso no !ai dar em boa coisa."

    Mas aldo adolescente -Lu5s Santos de Santana/ como 3* sa"e lidar com as

    palavras + 1dio e amor + logo se adapta, e cresce nesse espao ameaador e defende+se

    respondendo para Am$lia#

    Para preservar sua identidade, aldo "usca o tempo todo o lado "om das

    situa)es# O comendador convida aldo para tra"al7ar em seu armaz$m# Am$lia -"ranca e

    racista/ com raiva mente que aldo ol7a para Lindinalva -Vranoise

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    oferta para perder a pr1xima luta e topa por 8&& mil reis, conta para todos que fingiu ser

    comprado# Diz B2omem n!o se compraC# ?odos riem e "e"em os 8&& mil reis#

    Em outra cena aldo aparece lendo o 3ornal e se depara com a foto de

    Lindinalva com o noivo# Neste momento 7* uma elipse dele ainda adolescente e repete+se a

    frase rancos de merda...."

    Na luta acontece o esperado, perde e sai derrotado#

    Este momento do filme inicia a cenas paralelas da vida da casa do

    comendador com a vida de aldo# O comendador aparece em um "ordel onde perde todo o

    seu din7eiro por uma paix!o, B?eteC -M*rcia SantWanna/#

    Lindinalva aparece com o noivo, 7* tam"$m v*rios cortes entre a festa no

    "ordel e a casa do comendador# Neste dia o noivo entra no quarto de Lindinalva e faz amor

    com ela# A narrativa se mistura e o flas7 "acX anuncia aldo#Em seguida o comendador morre e o noivo sica so"e e retorna a cena do "ordel e

    agora Lindinalva se apresenta para tra"al7ar no "ordel# No momento que Lindinalva vai

    para o quarto com um vel7o entra novamente a eli!sede 'aldo adolescentepara tomar

    c7ampan7e com ela#

    aldo retorna para o "ar BLanterna dos afogadosC e reencontra seu

    empres*rio do "oxe, Luigi , que o convida para tra"al7ar no circo onde con7ece =oselda-ez$ Mota/ com quem tem um caso de amor e na noite de amor novamente aparece a cena

    de Lindinalva#

    (

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    Mas o circo dura pouco porque o empres*rio do "oxe em uma de suas

    "e"edeiras so"e no trap$zio onde cai e morre# O circo aca"a e aparece cenas paralelas de

    Am$lia cuidando do fil7o de Lindinalva#

    aldo volta para a7ia e encontra um amigo que $ l5der do sindicato das

    docas que o convida para tra"al7ar# Em seguida vai at$ o "ar Blanterna dos afogadosC e

    encontra o amigo

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    Segundo =oger astide o negro tem esta conota!o entre a popula!o da

    Am$rica Latina#

    ne&ro no entrou na formao da psi'ue coleti!a ou doscaracteres nacionais na /mrica 0atina como ne&ro" mas, nasobser!ao de Joa'uim Nabuco, no 'ue se refere ao rasil, como ne&roreduzido a escra!ido". /l&uns traos fundamentais da psicolo&ia dospo!os da /mrica 0atina, o desprezo pelo trabalo manual consideradocomo um esti&ma, .o amor pela ostentao, todas estas influ1ncias ne&ati!asso conse'21ncias da instituio da escra!ido do 'ue fruto cultural."3

    aldo no filme demora para se conscientizar de sua fora como 7omem no

    seu espao# Voi fiel aos seus sentimentos, em"ora tivesse que riscar seu camin7o atrav$s de

    atal7os n!o desen7ados# Em suas andanas "uscava concretizar sua identidade, mesmo

    atrav$s de uma 7ist1ria de amor imposs5vel#Ymaginamos uma continua!o de .u"ia"* de Nelson Pereira dos Santos,

    aldo lutando pelos direitos 7umanos dos negros, entrando em ?enda dos Milagres para

    gritar 3unto com Pedro Arcan3o as "ar"*ries que a popula!o negra sofre ainda 7o3e#

    Ymaginamos tam"$m aldo com um amor real sem as elipses de Lindinalva pertur"ando

    sua necessidade ainda pueril de viver a fantasia amorosa#

    aldo e Lindinalva se envolvem com amores instrumentais 3* que n!o

    podem elevar para o real o amor imagin*rio# Ysso a"re espao para uma atitude passiva de

    Lindinalva em rela!o a concep!o de sua classe social# S1 quando n!o 7* mais

    possi"ilidades para manter a vida constitu5da, que a empregada e dama de compan7ia de

    Lindinalva "usca a a!o instrumental de aldo#

    relacionamento puro tende a ser, nos dias de o4e, a forma predominantede con!!io umano, no 'ual se entra pelo 'ue cada um pode &anar e se

    continua apenas en'uanto uma das partes ima&inem 'ue esto proporcionadoa cada uma satisfa5es suficientes para permanecerem na relao."6

    AS?YDE, =oger# As contri"ui)es culturais dos africanos na Am$rica Latina, ed#Ztica, 898, p# 8%(%A0MAN, igmunt# Amor L5quido so"re a fragilidade dos laos 7umanos# a7ar ed# =., F&& pg#888#

    :

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    (etforas do cor!o e estilo

    Segundo Stuart 2all, o multiverso das culturas populares negras pode ser

    sintetizado em trs aspectos a+/ o corpo como capital cultural4 "+/ a m>sica como

    express!o e c+/ o estilo como conte>do -e n!o como uma mera BcascaC dissociado do

    conte>do/#

    ?odos estes trs aspectos aparecem no filme, particularmente na tra3et1ria do

    personagem aldo e sua afirma!o identit*ria como negro# Esta afirma!o identit*ria se

    radicaliza nos seus encontros'confrontos com os personagens "rancos# E estes aspectos

    marcam profundamente as rela)es inter+$tnicas na 7ist1ria#

    A m>sica marca o am"iente em que nasce e vive o personagem central do

    filme -o filme a"re com uma roda de sam"a e todos os personagens parecem "rotar desta

    reuni!o musical, como se fossem paridos pela melodia/# A m>sica $ tam"$m como umtotem para as crianas que o"servam a roda de sam"a com um misto de admira!o e

    venera!o# A m>sica neste cen*rio al$m de transcender , congrega e $ o signo que desperta

    o respeito pelos mais vel7os#

    O estilo de aldo $ a sua marca e seu conte>do# Desde o seu 3eito gingado de

    andar, suas roupas e sua forma de o"servar de forma o"l5qua -o malandro anda, assim, de

    !is 7 8ico uar'ue/# O estilo das culturas populares negras que"ram a linearidade da

    l1gica ocidental, ao tecer suas rela)es tangenciando e reconstruindo outras rela)es#

    Mas a distin!o racial mais n5tida $ em rela!o a percep!o corporal# Em

    v*rias passagens do filme, fica demonstrado -denotado/ as distintas percep)es corporais

    entre "rancos e negros# 6itamos algumas

    a-) morte e aus*ncia + A ?ia Luiza $ internada e se ausenta no in5cio do

    filme, com o corpo em mo!imento# A mul7er do comendador morre com a degenera!o do

    corpo que vai ficando cada vez mais inerte# O mesmo ocorre com o comendador, quando

    morre do cora!o no "ordel# A de&eneraodo corpo dos personagens "rancos infere um

    uso instrumental do mesmo, ao passo que o corpo em mo!imento, em transe,implica emuma percep!o corporal pr1xima do sagrado, t5pica das culturas populares negras#

    b)no viver Lindinalva perde suas esperanas quando na morte de seu pai

    se v sem alternativa e tristemente se prostitui# .* =oselda -representada pela atriz ez$

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    Motta/ amiga de aldo conta sua vida que foi pautada de muitas dores, mas de sua dor

    "rota criatividade para dana, mo!imentos e sorrisos#

    c-) castigo cor!oral,!raer cor!oral o uso instrumental do corpo fica

    evidente tam"$m no castigo f5sico imposto pelo comendador a aldo, o que implica em

    vilipendiar o corpo# 6ontrariamente a isto, ap1s ser castigado, aldo se mastur"a o corpo

    que foi o"3eto do castigo do "ranco, $ agora o"3eto de seu prazer#

    d-) cor!os em movimento + duas formas de corpos em movimento e de

    express!o pela dana na cena em que os capoeiristas liderados por aldo cruzam as IaI*s

    3ovens negros e mul7eres negras expressando, cada qual a seu modo, seus estilos negros#

    e-) Pai Jubiab + 2all afirma que estas caracter5sticas das culturas negras

    devem+se ao fato delas n!o terem o seu centro na logotecnia, por isto as formas de

    express!o se deslocam para estilos, musicalidades e corpo# O Pai .u"ia"*, elemento centralna constru!o da identidade de aldo $ um su3eito de poucas palavras e muitos ol7ares# A

    sua express!o facial 3* $ suficiente para expressar os conte>dos necess*rios# Na verdade $

    um ol7ar que expressa tam"$m a eloqGncia amorosa do pai#

    f-) 'aldo ca!oeira e luta bo# Juando o Bempres*rioC Luigi o con7ece e

    que lev*+lo para o "ox, pergunta Voc1 luta bo-", aldo responde 9ou capoeira"-e n!o

    Bluto capoeiraC/ capoeira $ uma forma de ser, $ um elemento integrante da sua identidade

    e n!o uma atividade externa ao seu et7os# 0utar alguma coisa eser uma coisaaparecem

    aqui como um di*logo complexo, entre uma l1gica discursiva ocidental e outra negra#

    (etforas do es!ao - rodas

    A n!o linearidade das culturas populares negras tam"$m se expressa pela

    organiza!o em rodas# A roda de samba, no in5cio do filme, a roda do candombl, em

    v*rios momentos quando 7* as cerimUnias religiosas, a roda do bo, quando 7* a luta com

    participa!o de aldo esta roda se demonstra tanto na disposi!o do p>"lico como nos

    movimentos que aldo faz durante a luta no ringue, a roda de capoeira, a roda do circo, a

    roda do mo!imento de corpo de ia 0uiza e :ez ;otta, a roda na reunio dos porturios#

    =oda implica em n!o linearidade e possi"ilidades de tangenciamento# ?am"$m

    aponta para perspectivas de movimentos c5clicos -retorno/ e de ruptura -romper o c5rculo e

    criar outro/ e imprevisi"ilidade# Perce"e+se em aldo o retorno constante H imagem da sua8&

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    primeira namorada Lindinalva tam"$m produto do seu primeiro confronto racial, 3* que

    ela era "ranca# Este retorno aparece na imagem e tam"$m na express!o de uma re"eldia

    3uvenil -o seu "ord!o rancos de merda, filos da puta"sempre falado quando lem"ra da

    moa/# As possi"ilidades de ruptura acontecem a cada momento quando vai para a

    capoeira, para o "ox, para o circo, mas a ruptura decisiva s1 ocorre com a morte de

    Lindinalva, li"ertando de um passado que n!o se esvai e, principalmente, com a

    interven!o de pai .u"ia"* -Baldo, n!o est* na 7ora de voc tra"al7ar[C/, momento em

    que as rodas se rompem e aldo camin7a para um outro destino infere+se, pela cena, que

    3* autUnomo em rela!o ao Pai .u"ia"* que, diante do seu discurso pol5tico, se a3oel7a e

    dese3a BAx$ a"*C vendo o ex+menino camin7ar para diante#

    (etforas do tem!o - !resente

    B tempo anda mais lento 'uando desloca$se mais rpidopelo espao. Vi!er o presente re4u!enesce mais rpido 'ue !i!er denostal&ia ou se preocupar em demasiado com o futuro" (ltima $ marcada pela descarta"ilidade e

    por uma frustra!o com o futuro# A cultura neoli"eral vive o presente movida por um

    ceticismo'cinismo e "usca um 7edonismo esvaziado# As culturas negras vivem o presente

    pela "usca da intensidade do momento s!o l1gicas de tempo que n!o se confundem#

    Por isto, o viver no presente de aldo n!o implica, necessariamente, na nega!o de

    passado e futuro# O passado tem um valor da lem"rana, como o seu romance com

    Lindinalva, da revolta contra os Bbrancos de merda, filos da puta"e da venera!o pela

    experincia, no caso de Pai .u"ia"* e das ra5zes, que $ o seu eterno retorno para o "airroonde nasceu#

    A cena do in5cio do filme ilustra muito "em o que podemos c7amar de

    BdeslocamentoC, como se aldo ao segurar a m!o da amiga de sua tia Luiza conduzindo+o

    ao mundo Europeu que est* perto logo a"aixo do lugar onde ele vive# E o carrega para uma

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    cultura sem ritos, sem m>sica, sem o Pai .u"ia"*# Na imagem traduzida para o filme ele d*

    um ol7ar para tr*s como quem se despede# Mas $ uma despedida sem desenraizamento, se

    desloca sem perder seus valores latentes#Nesta rela!o com o passado, o que o impede de

    romper a roda c5clica em "usca da roda do futuro $ a lem"rana de Lindinalva, como um

    dese3o podado pelo racismo, que s1 se resolve com o seu reencontro com a moa e a morte

    dela este passado de revolta e frustra!o, que o prendia ao ciclo do presente se esvai e o

    passado das ra5zes e venera!o pela experincia -Pai .u"ia"*/ o impulsiona para o futuro#

    Note+se que nesta l1gica temporal, 7* uma inter+rela!o entre passado, presente e futuro e

    cada um destes momentos, quando $ vivido como presente se torna a referncia da

    intensidade# Norval aitello(afirma que a no!o de tempo $ distinta entre as culturas, 7*

    aquelas que se referenciam no passado -culturas com um discurso m5tico, 7er1ico, de

    exalta!o de tempos gloriosos/, no presente e no futuro -culturas com um discursomessiQnico, de sacrif5cio do presente em prol da constru!o de um pro3eto ut1pico/# Esta

    divis!o de aitello $ interessante, por$m peca por uma certa linearidade# As culturas que se

    referenciam no presente podem ter v*rias dimens)es, desde negar passado e futuro -como o

    discurso neoli"eral/ at$ articular estas dimens)es no presente -como $ o caso das culturas

    negras/#

    .onsidera/es finais

    O filme .u"ia"* $ um caldeir!o de significados# Enfoca as rela)es raciais a partir da

    distin!o de ol7ares de duas experincias s1cio+culturais distintas# O confronto destes

    ol7ares distintos -ol7ar "ranco e ol7ar negro/ $ resolvido, em v*rias partes do filme, pela

    violncia -f5sica e sim"1lica/ da 7egemonia da cultura "ranca# Em outras palavras, somente

    no usufruto de sua condi!o de 7egemonia, $ que a cultura "ranca se so"ressai#

    Por outro lado, os referenciais da cultura negra aparecem para o personagem como

    uma reserva de resistncia, um espao onde $ poss5vel captar as energias necess*rias para o

    enfrentamento com o "ranco# Da5, a importQncia do pai .u"ia"* que, no filme, representasim"olicamente a reserva das tradi)es culturais negras# K a esta Rreserva de energiaR que o

    personagem aldo vai "uscar foras para os diversos enfrentamentos#

    (AY?ELLO, Norval# O animal que parou os rel1gios# S# Paulo Anna"lume, F&&;8F

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    0ma outra referncia importante presente neste filme $ o trabalo como um

    instrumento valorativo de constru!o da su"3etividade# A ruptura com a experimenta!o,

    com o dinamismo da re"eldia 3uvenil de aldo se d* com o tra"al7o + u no aca 'ue est

    na ora de trabalar--pai .u"ia"*/# No tra"al7o, aldo se perce"e como parte integrante

    de uma coletividade -ao defender uma menina das sev5cias do coronel e tam"$m como

    liderana sindical na assem"l$ia dos portu*rios/# De uma perspectiva des"ravadora+

    individual, presente nas suas a)es da adolescncia, 7* uma transfigura!o para uma

    perspectiva coletiva+construtiva, presente na sua fase adulta, como tra"al7ador portu*rio# K

    o momento da emancipa!o, quando o seu pai .u"ia"* d* a palavra final, dese3a "oa sorte e

    se a3oel7a diante do novo l5der# 6om estes elementos, o filme .u"ia"* demonstra os

    elementos potencialmente transformadores da cultura negra e que 7* outras possi"ilidades

    de ol7ar a realidade que n!o as da cultura "ranca 7egemUnica#em diferente dos exemplos dos produtos audiovisuais dispon5veis na programa!o

    atual da televis!o como exemplo as novelas do in5cio da noite da rede glo"o / cor do

    pecado=, 8omear de no!o -que comeou realmente novamente o mesmo discurso de

    exclus!o da novela anterior/ e agora a novela que a cr5tica faz referncias a Pedro

    Almod1var, pela escol7a da dire!o de arte pelas cores e exageros dos personagens / lua

    me disse. Mas isso merece um outro artigo#

    O professor Arlindo Mac7ado no seu livro / ! le!ada a srio diz que s!o

    necess*rias referncias que sirvam como exemplos, desta forma mostramos o filme

    .u"ia"*, e o personagem ALDO + como referencia de um filme delicado que trata com

    respeito a riqueza da cultura negra#

    Refer*ncias bibliogrficas

    AMADO, .orge0Jubiab (>?#>).=io de .aneiro ed# =ecord,89:F

    AL?20SSE=, Louis# 9obre a reproduo# Petr1polis, =. @ozes, 899:#

    AY?ELLO, Norval# animal 'ue parou os rel@&ios, S!o Paulo ed# Anna"lume, F&&;

    AS?YDE, =oger# 9ociolo&ia, /s 8ontribui5es culturais dos africanos na /mrica 0atina+tentati!a de sntese# S#Paulo Ztica, 898#

    OLY@EY=A, Dennis e Maria Angela Pavan, artigo apresentado YN?E=6OM F&&, Ydentifica)es eestrat$gias nas rela)es $tnicas na telenovela BDa cor do PecadoC,

  • 7/22/2019 A construo da identidade negra no filme Jubiab - Maria Angela Pavan e Dennis de Oliveira

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