A atração por África - África 21 Online · que o continente ocupa no turismo mundial ......

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Nº 95 - ABRIL 2015 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / R$ 15 MOÇAMBIQUE Assassínio de Gilles Cistac ainda por explicar BRASIL Dilma Rousseff resiste ao cerco A atração por África TURISMO A modesta fatia que o continente ocupa no turismo mundial está a engordar com os visitantes a diversificarem os seus destinos ANGOLA OGE aprovado no Parlamento

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Nº 95 - abril 2015 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / r$ 15

MOÇAMBIQUE

Assassínio de Gilles Cistacainda por explicar

BRASIL

Dilma Rousseffresiste ao cerco

A atração por ÁfricaTURISMO

A modesta fatia que o continente ocupa no turismo mundialestá a engordar com os visitantesa diversificarem os seus destinos

ANGOLA OGE aprovadono Parlamento

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4 abril 2015 – África21

África21 Revista de Política, Economia e CulturaPropriedade Nova Movimento, LdaSociedade de Marketing, Comunicação e CulturaRua Frederico Welvitch, n.º 82Bairro do Maculusso – Luanda, [email protected] por MovipressUma divisão da Nova Movimento, Lda

Diretor Carlos Pinto [email protected]@sapo.ptDiretora Comercial Fernanda Osó[email protected]@gmail.comTécnica Comercial Yuma TraçaAssistente Direcção Comercial Patrícia FilipeRepresentação em Portugal Triangulação, LdaRua Bento Jesus Caraça, 16 – 2º Dto1495-686 Cruz QuebradaApartado em Lisboa: 190591990-999 LISBOADiretora administrativa Marina [email protected]@sapo.pt

Representação no Brasil Belisan Editora, Comércio e Serviços Ltda [email protected]ção de Angola Adriano de Sousa, Alberto Sampaio, Carlos Severino,Luís Ramiro, António Dombele, Pedro Kamaka, Ruben Kamaxilu e Teixeira CândidoRedação de Portugal João Carlos, Miguel Correia, Nicole Guardiola, Nuno Macedo e Teresa SoutoRedação do Brasil Carlos Castilho e João BelisarioColaboradores permanentes Almami Júlio Cuiaté (Bissau), Augusta Conchiglia (Paris), Charles Shorungbe (Lagos), Emanuel Novais Pereira (Maputo), Fernando Lopes Pereira (Bissau), Gaye davis (Pretória), Gláucia Nogueira (Praia), Itamar Souza (Nova Iorque), João Vaz de Almada (Maputo), Juvenal Rodrigues (São Tomé), Luís Costa (Washington), Manrique S. Gaudin (Buenos Aires), Natacha Mosso (Praia), Paul Cooper (Houston), Rodrigues Vaz (Lisboa) e Valerie Thorin (Paris)

Colunistas Alves da Rocha, Conceição Lima, Corsino Tolentino, Fernando Pacheco, Germano Almeida, João Melo, José Carlos de Vasconcelos, Luís Cardoso, Mallé Kassé, Odete Costa Semedo e Pepetela Fotografia Agência Angop, Agência Lusa, Agência France

Presse, Arquivo África21, Arquivo Digiscript, Fernanda Osório, Jornal de Angola e Ruth MatchabeProjeto gráfico, paginação e pré-impressão [email protected] em Angola MovimídiaGestão e Comercialização de MeiosRua Frederico Welvitch, n.º 82Bairro do Maculusso — Luanda, AngolaFernanda Osório [email protected] Traça [email protected]ção e assinaturas em Angola MovipressRua Frederico Welvitch, n.º 82Bairro do Maculusso – Luanda, AngolaTel: 244 912 442 [email protected]ção, Assinaturas e Publicidade no BrasilBelisan Editora, Comércio e Serviços Ltda. - ME CNPJ 08.629.179/0001-52Estrada Rodrigues Caldas Nº 297CEP 22.713-372- Taquara – Jacarepagua Rio de Janeiro- RJDistribuição em Portugal URBANOS PRESS, S.ARua 1º de Maio - Centro Empresarial da GranjaJunqueira2625-717 Vialonga

Publicidade e assinaturas em Portugal Triangulaçã[email protected]@sapo.ptImpressão em Angola: ImprimarteEstrada Viana - Catete, Km 36 – Angola Francisco Nunes [email protected].: +244 931 696 890Impressão em Portugal: PrinTipoAlto da Boavista, Estrada de Paço de Arcos, nº 77Pavilhão 20 – 2735-197 CACÉMTelefone: (351) 214 906 020 Impressão no Brasil: Blue Print Gráfica Editora LtdaRua José Mendes de Souza, 7 – Sampaio Corrêa Saquarema/RJ – CEP 28990-000Tels.: 22 2654.7154 / 22 2654.1112Tiragem total: 11.000 exemplaresOs artigos assinados refletem a opiniãodos autores e não necessariamente da revista.Toda a transcrição ou reprodução, parcialou total, é autorizada, desde que citada a fonte.A correspondência deve ser dirigida à MovipressRua Frederico Welvitch, n.º 82Bairro do Maculusso – Luanda, Angola.Tel.: 244 912 442 453Portal www.africa21online.com

A luta que Dilmatem de enfrentar

Angola tem OGE revisto aprovado no Parlamento

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O assassinato de Gilles Cistac

sumÁrio

33Para a economia voltar a funcionar, espera-se que o Governo retome os contratos mantidos com as empresas privadas

Carlos Severino

O atentado que matou o constitucionalista Gilles Cistac é visto por muitos como um ataque à liberdade de expressão em Moçambique

Emanuel Novais Pereira

40 O escândalo da Petrobras serviu aos partidos da oposição para exigir a destituição da Presidente do Brasil, mas Dilma Rousseff prepara um pa-cote de leis contra a corrupção

Carlos Castilho

África e o turismoEm 2013 o continente africano recebeu globalmente 53 milhões de turistas, apesar da instabilidade política e dos conflitos armados em alguns países

Miguel Correia e Natacha Mosso

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aos leitores

[email protected]

África ganha espaço o turismo mundial

A cota de África no turismo mundial não vai além de três por cento. Apesar de ser o continente que menos turistas acolhe, ultrapassou recentemente a bitola dos 50 milhões de visitantes por ano.

Estudos credíveis de instituições internacionais referem que o crescimento

desta marca tende a aumentar em muitos países africanos, excluindo aqueles demasiado afetados pela instabilidade política e nos conflitos militares internos ou fora das suas fronteiras.

O turismo em África tem muito para oferecer. Capacidades que não se confinam às paisagens naturais, praias, vida selvagem, gastronomias distintas. E civilizações e culturas milenares, patentes nos 129 sítios considerados património mundial que se podem apreciar em 37 países.

Nos dias de hoje, os principais destinos do viajante em busca de lugares apreciáveis estão em Marrocos, Egito, África do Sul, Zimbabwe e Tunísia. Mas há outros países que sobem na escala do turismo, graças às apostas de investimentos em infraestruturas básicas, como sejam Angola, Cabo Verde, Moçambique e República Democrática do Congo.

No entanto, na Tunísia, incluída no grupo dos países mais visitados, onde o turismo representa o principal contributo para a sua economia, tudo pode ter sido subvertido em 19 de março. Dia em que o Museu do Bardo (o segundo maior museu africano) de Tunes sofreu o atentado que provocou a morte de 20 turistas estrangeiros, revindicado pelo Estado Islâmico.

Recuperado da abortada «primavera» de 2011, o país magrebino superou ao longo de quatro anos o ciclo violento de crises sociopolíticas e a transição para a democracia fez-se de modo quase pacífico, contrastando com as outras nações árabes. A poucas horas de voo da Europa, de onde chegam mais de cinquenta por cento dos turistas, a Tunísia oferece-lhes um povo acolhedor crente de que as manifestações de radicais religiosos estariam controladas. Dois dos autores eliminados do atentado eram jovens tunisinos jiadistas regressados da Síria ou Iraque.

O futuro próximo dirá se o turismo africano vai ficar na mira dos terroristas assassinos, sejam eles do Boko Haram ou do Estado Islâmico.

Carlos Pinto santos

aos leitores

Rubricas11 Antena2118 Gente72 Empresas & Negócios78 Insumos86 Cults90 Livro do Mês92 Ver, Ouvir Ler

36 CRÓNICA DA TERRA Fernando Pacheco

44 OPINIÃO Mallé Kassé

46 TUNÍSIA Atacada pelo Estado Islâmico Nicole Guardiola

48 ÉBOLA Lições a aprender Nicole Guardiola

52 OPINIÃO Carlos Lopes

54 GUINÉ-BISSAU Doadores e desenvolvimento sustentável Almami Cuiaté

60 CABO VERDE Reconstruir depois do vulcão Natacha Mosso

66 BRASIL Cotas raciais e sociedade João Belisario

70 AMÉRICA LATINA Reforma dos serviços secretos Manrique S. Gaudin

74 CPLP Potencial energético comum João Carlos

84 UCCLA 30 anos de atividade João Carlos

95 MEMÓRIA Herberto Hélder Zetho Gonçalves

António Luvualu de CarvalhoA paz e estabilidade na Região dos Grandes Lagos

é crucial para AngolaJoão Carlos

A luta que Dilmatem de enfrentar

6 Entrevista

Crónicas39 Pepetela57 Odete Costa Semedo63 Germano Almeida69 Muniz Sodré96 João Melo

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6 abril 2015 – África21

Entrevista António Luvualu de Carvalho, professor e analista político

“A paz para a RDC também é prioridadepara a diplomacia angolana”

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Angola está mais que preparada para responder aos desafios que impõe o esforço para a paz e estabilidade na Região dos Grandes Lagos, diz o pro-fessor na Universidade Lusíada de Angola. Para este académico, o combate contra o Boko Haram exige apoio da solidariedade internacional.

João Carlos

África21 Que avaliação faz ao esforço para a me-lhoria do sistema de ensino em Angola? As políti-cas públicas estão no bom sentido?Com certeza absoluta. Acredito que está a ser feito um grande esforço por parte do Governo central, porque se nos atermos às estatísticas, em abril de 2002, quando o país conseguiu a paz final com a assi-natura do Memorando de Luena, tínhamos perto de 30 mil estudantes universitários. Ou seja, 13 anos depois, vemos que houve um aumento significativo. Muita gente necessitava de estudar e de ter conheci-mentos e, agora, o Governo e as universidades priva-das, que também são atores importantes, estão muito preocupados em apostar na qualidade.

Temos visto o Ministério do Ensino Superior a tomar medidas positivas, exigindo corpos docentes melhor qualificados para que tenhamos também alunos mais bem preparados. O Governo lançou o Plano Nacional de Desenvolvimento, que contempla um Programa Nacional de Formação, que visa acima de tudo diferenciar os docentes nacionais para que tenhamos também discentes diferenciados.

Foi uma aposta certa e agora novos caminhos abrem-se também à formação profissional, com cur-sos mais profissionalizantes, para que o país tenha bases sólidas que garantam o seu desenvolvimento.

Angola necessita de muitos recursos humanos qualificados. Será possível expandir as universida-des por todo o país como meio para o desenvolvi-mento científico e da inovação tecnológica? Se não estou errado, já temos pelo menos uma universidade em todas as 18 províncias. Sendo mais otimista, há universidades do Estado em todas as re-giões académicas, mas também já existe um empreen-dedorismo mais ativo com vários empresários a apostarem no setor privado. Por exemplo, falo da Universidade Lusíada onde trabalho; temos estrutu-ras em Cabinda, Luanda, Benguela, Zaire, Lobito e Lunda Sul. O mapa vai crescendo. Outras universi-dades privadas vão também fazendo o seu papel.

Temos que apostar muito fortemente na for-mação. Aliás, países que conseguiram um desen-volvimento sustentável fixo, como Japão, Correia do Sul, e Portugal, assim o fizeram. A aposta no capital humano será um fator decisivo para ga-rantir a continuidade do crescimento económico do país, porque a formação científica é a base do desenvolvimento.

Ultrapassado o diferendo político-diplomático luso-angolano, e uma vez que se prevê a realização da cimeira bilateral ao mais alto nível, considera que é possível alargar ainda mais a cooperação entre Angola e Portugal?Acredito que sim. A recente visita a Angola do ministro português Rui Machete foi prova de que estava «enterrado o machado» que ainda separava algumas partes, porque, como digo sempre, as relações entre os Estados poderão ter registado um resfriamento em 2013, mas as relações entre os dois povos continuaram. Angola continua a ser um parceiro estratégico para Portugal. É o maior par-ceiro comercial em África.

Deve-se incrementar a cooperação na área dos vistos. A área da saúde também deve merecer maior cooperação. Os hospitais privados portu-gueses têm tido, acima de tudo, uma grande base de clientes angolanos. Agora, espera-se que os hospitais privados possam deslocalizar-se para Angola e levar o seu saber fazer para servir mais as populações. Na área da educação, Portugal conti-nua a ser um parceiro privilegiado e estratégico. Na agricultura, também podemos contar com a experiência portuguesa. No ramo das ciências e da investigação biomédica podemos desenvolver ainda mais a cooperação para que algumas doen-ças raras possam ser combatidas. E uma área sempre plausível é o turismo. Podemos aprender muito com os operadores turísticos portugueses para explorar ao máximo as grandes potencialida-des angolanas.

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8 abril 2015 – África21

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A crise económica provocada pela queda do preço do petróleo tem suscitado algum receio por parte de investidores estrangeiros, nomeadamente portugueses, pelo potencial reflexo nos negócios. Justifica-se este receio?Os receios de alguns empresários portugueses são justificáveis na medida em que muitos deles fizeram uma forte aposta no desenvolvimento das respetivas empresas e indústrias, a contar com a tendência de crescimento do mercado angolano. Num primeiro momento, muito antes desta crise económica no mercado internacional, o Governo de Angola tinha lançado a nova Pauta Aduaneira, em março de 2014, que já regulamentava a entrada no país de al-guns produtos que tinham sofrido aumentos subs-tanciais nos seus custos de importação.

Na altura, foi feito um desafio a muitos empresá-rios, não só portugueses, de deslocalização das suas

DA URSS A PROFESSOR UNIVERSITÁRIO

Não revela a idade. Prefere dizer que está na fase intermédia, entre a idade de Cristo e os 40 anos. «O local de nascimento também está envolvido em mistério». Os pais estudavam na URSS. Estava sempre dividido entre Luanda e Moscovo, Minsk (Bielorússia) e Yarkov, na Ucrânia. Só em 1994, regressa definitivamente a Angola com a mãe. Fixaram-se na província da Huíla, onde frequentou a Escola Mandume e André Mufaio, e depois a Escola Portuguesa do Lubango. Licenciou--se em Relações Internacionais na Universidade Lusíada de Angola (ULA).

Em 2005, quando frequentava o 3.º ano do curso, é selecionado como moni-tor. Assim começa a sua carreira, tendo passado também pelo Centro Desportivo e Cultural da ULA. Em 2008, parte com destino a Portugal para fazer mestrado, regressando dois anos depois a Luanda, após a defesa da dissertação sobre «Angola, Economia e Petróleo, 2002-2010», que deu título ao seu primeiro livro.

Entretanto, assumiu o cargo de coordenador do curso de Relações Interna-cionais na ULA. Foi diretor do Gabinete do Centro de Estudos de Investigação Científica e pós-Graduções e é agora professor na Faculdade de Ciências So-ciais e Humanas e diretor do Gabinete de Cooperação e Relações Institucionais da ULA. Agora é convidado da Universidade Lusíada de Lisboa para dar aulas no âmbito de uma pós-graduação euro-afro-americana, mantendo a colabora-ção com aquele centro de investigação científica.

Tem vários livros publicados: A Nova Política Externa de Angola no Contexto Internacional (obra coletiva), União Africana, Quo Vadis? e Angola - Um Actor Importante no Peace-making e Peace-keaping em África.

“Há países dos Grandes Lagos que, desde 2005, não regularizam a situação das suas quotas na organização”

indústrias, porque assim também iriam garantir mais postos de trabalho para os angolanos. Com a queda do preço do barril de petróleo no mercado internacio-nal houve a necessidade de fazer uma reestruturação na economia nacional e, claro, o Ministério do Comércio tomou as medidas que conhecemos e al-guns empresários portugueses sentem-se limitados em poderem exportar para Angola porque foram fi-xadas algumas cotas de importação – aliás como existem também na União Europeia.

De toda a forma, é uma crise que desperta para a necessidade de medidas de diversificação da economia visando reduzir a dependência do petróleo?Sim. António Agostinho Neto dizia que a agricultura é a base e a indústria um fator estratégico. Sempre seguimos este ditado. Agora, mais do que nunca, de-ve-se apostar na diversificação da economia e a im-portação de indústria para instalação em Angola é certamente um fator estratégico.

O que se pretende é criar novos fatores de produção para garantir mais emprego e fazer com que o país se torne autossustentável e desenvolvido o suficiente para que, quando haja estas crises nos mercados internacionais, não possamos viver como um país que tem a doença holandesa. O próprio FMI disse claramente que Angola não precisava de um resgate para a sua economia, mas de implementar medidas que passem, por exem-plo, pela redução dos subsídios aos combustíveis. Porque acredita-se que o país tem potencial não só no ramo das energias renováveis e não renováveis como no ramo da agricultura e da indústria.

Considera que a crise na região dos Grandes La-gos, nomeadamente na República Democrática do Congo, é uma ferida difícil de sarar?Tem havido desenvolvimentos positivos. Desde que assumiu em 15 de janeiro de 2014 a presidên-cia da Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), Angola conseguiu redinamizar esta organização e levar alguma paz aos Grandes Lagos, embora não seja ao nível que se pretende. Em março de 2014, Angola conseguiu, juntamento com as Nações Unidas e as autorida-des da RDC, o desmantelamento do grupo rebelde M23, mas infelizmente renasceram as Forças Democráticas para a Libertação do Rwanda, que até agora continuam a ser combatidas na via diplo-mática como a nível local para que desarmem e deixem as populações em paz. A paz para a RDC é também uma prioridade para a diplomacia angolana, porque, como sabemos, Angola e a RDC partilham

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a 13.ª maior fronteira do mundo. Tendo paz na RDC haverá também paz em Angola.

A 11 de março terminou em Luanda o X Fórum dos Ministros dos Negócios Estrangeiros da CIRGL. Enquanto presidente da organização e no âmbito da sua permanência no Conselho de Segurança da ONU, Angola tem colocado a região na agenda inter-nacional para que seja possível aplicar o Pacto de Defesa, Segurança e Estabilidade dos Grandes Lagos, que diz que nenhum país membro pode atacar ou desestabilizar outro país. E o que a ONU constatou é que havia indícios fortes de que países como Rwanda e Uganda estariam a fazer vista grossa aos rebeldes que atacassem a RDC. Não é isso que se pretende.

Estivemos com o Presidente José Eduardo dos Santos na RDC, vimos que é um país que quer crescer, tem potencialidades e vamos aguardar que as partes em conflito, os rebeldes e o Governo, possam chegar a uma plataforma de entendimento.

Mas ainda existem muitos fatores de bloqueio, difíceis de se ultrapassar até que Angola deixe a presidência em 2016?A questão fundamental, como constatamos na RDC, é para onde é que vão os rebeldes das Forças Democráticas para a Libertação do Rwanda. Onde é que serão enquadradas estas pessoas? Sabemos que é uma fação que advém do genocídio do Rwanda, de 1994. Não são nem queridos no Rwanda nem bem-vindos na RDC. Estão a viver ilegalmente na RDC há 21 anos. Portanto, criando-se uma zona pacífica para lá viverem o que é que iriam desen-volver depois? É que as Forças Democráticas para a Libertação do Rwanda também não querem se-guir um roteiro para a paz porque são forças poten-cialmente belicistas.

Espera-se que até Angola abandonar a presidên-cia da organização já tenha sido encontrada uma so-lução. Sabe-se que o modelo de paz em Angola só deu certo porque o Governo abriu mão de tudo, reinte-grou todas as forças, não só da UNITA, e é isso que se espera que a RDC, Rwanda ou Uganda façam.

Nesta fase de contenção financeira, Angola estará em condições de vencer os desafios que se lhe colo-cam para a pacificação efetiva na região, dado os custos que isso implica?Angola está a racionalizar os seus recursos, mas tam-bém está preparada para enfrentar estes desafios, a nível interno e externo. Apesar de estar a reestruturar a sua economia, o Governo não abriu mão face aos desafios nos Grandes Lagos. Mas também não vamos querer que suporte sozinha a carga de 14 países mem-bros, além dos países observadores.

“Espera-se uma maior pró-atividade das autoridades da Nigéria, porque o Boko Haram é uma enorme ameaça”

“Com a queda do preço do barril de petróleo no mercado internacional houve necessidade de fazer uma reestruturação na economia nacional”

Há países dos Grandes Lagos que, desde 2005, não regularizam as suas quotas. A conjuntura interna-cional está difícil para todos e tem de haver empenho de todos para vencer os desafios. A organização é hoje mais saudável e acredita-se que o país que suceder a Angola, pensamos que venha a ser o Quénia, consiga manter esta dinâmica.

Indo mais para Norte, na Nigéria, temos o drama do terrorismo alimentado pelos radicais extremis-tas do Boko Haram. É um problema que deve merecer uma resposta veemente de todos os países africanos?Não é um problema só da Nigéria. É um problema transfronteiriço. O grupo já ameaça o Chade e quer ameaçar o Níger. Nos Camarões tem havido comba-tes nas florestas. O Boko Haram chegou a fazer víti-mas, inclusive raptou reféns, atingindo também fami-liares dos membros do Executivo camaronês.

É muito preocupante porque o fenómeno pode alastrar-se e deixar de ser uma questão só da CEDEAO (Comunidade Económica e de Desen-volvimento dos Estados da África Ocidental) para passar a ser também uma questão da CEEAC (Co-munidade Económica dos Estados da África Cen-tral). E quando é assim constitui perigo para os paí-ses dos Grandes Lagos ou da África Central, da qual Angola também faz parte. A solidariedade africana tem que se fazer sentir. Já foi aprovado um contin-gente africano para ajudar as autoridades nigerianas a combater o Boko Haram.

O grupo radical tem feito atos muito sangren-tos, condenáveis a todos os níveis. Uma das grandes críticas feitas a nível internacional é que o combate no plano interno não tem sido aquilo que se espera. Espera-se por uma maior pro-atividade das autori-dades da Nigéria.

A recente aliança ao Estado Islâmico não justifica-ria uma maior solidariedade ou apoio internacio-nal pela sua ligação ao terrorismo?Naturalmente. O Estado Islâmico tem feito ações horríveis, inclusive destruindo património da huma-nidade. O facto do seu líder Muhammad Abubakar Shekau ter feito juramento de prestar lealdade ao Estado Islâmico é uma questão ainda mais preocupante. Talvez os EUA engajem mais esforços no combate ao Boko Haram. A resposta da comunidade internacio-nal tem sido assimétrica nestas questões. O Boko Ha-ram massacra milhares de pessoas e a comunidade in-ternacional não reage tão energicamente como, por exemplo, aos atentados do Charlie Hebdo em Paris. Não vemos a mesma solidariedade em África, na mesma proporção com que foi feita em França.

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10 abril 2015 – África21

FIL - Feira Internacional de Luanda | Estrada de Catete | Km 12 | CP. 6127 Luanda - AngolaINSCRIÇÕES E INFORMAÇÕES: Tel:. +244 926 405 978 / 70 / 923 676 731E-mail: [email protected] Feiras e as datas poderão sofrer alterações

FEIRAS MAIO - AGOSTO 2015

www.fil-angola.co.ao | facebook.com/filangola

Onde os seus negócios acontecem!

14 ‐ 17 MAIOINSTALAÇÕES DA FILDA

LUANDA

ANGOLA 2015

4º SALÃO INTERNACIONAL DAS

TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO

E COMUNICAÇÕES DE ANGOLA

O DESAFIO DO SECTOR DAS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

NO CONTEXTO DA DIVERSIFICAÇÃO DA ECONOMIA

04 ‐ 07 JUNHOINSTALAÇÕES DA FILDA

LUANDA

5ª EDIÇÃO DA FEIRA INTERNACIONAL DE TECNOLOGIAS AMBIENTAIS

PROMOVER AS NORMAS AMBIENTAIS EM

TODOS OS SECTORES DA ECONOMIA

06 ‐ 09 AGOSTOINSTALAÇÕES DA FILDA

LUANDA

5

“A Vida Faz-se nos Municípios”Engº. José Eduardo dos Santos

21 ‐ 26 JULHOINSTALAÇÕES DA FILDA

LUANDA

5

FILDA 40 ANOS DE INDEPENDÊNCIA DE ANGOLA

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antena21

46 mil contas de apoiantes no Twittertinha o Estado Islâmicono final de 2014

“O meu Governo não irá permitir que se incite ao ódio contra outras comunidades

NARENDRA MODI, primeiro-ministro indiano

Importação de armas em África aumentou 45% numa décadaAs importações de armas em África aumentaram 45% entre 2005 e 2014. Os dados são do Instituto Internacio-nal de Pesquisas da Paz de Estocolmo. Os três maiores importadores foram a Argélia (30%), Marrocos (26%) e Sudão (6%). A África Subsariana foi responsável por 42% das importações de todo o continente.

Neste período, as importações da Argélia aumenta-ram 3%; mas as do segundo país que mais importou, Marrocos, subiram onze vezes. Em 2014, as principais entregas à Argélia incluíram um porta-helicópteros da Itá-lia, o último lote de 48 sistemas de defesa aérea da Rússia e cerca de 50 canhões automáticos chineses. Enquanto isso, Marrocos recebeu uma fragata de França. Ambos têm ainda grandes encomendas em curso.

Já a Nigéria e os Camarões receberam armas de di-versos fornecedores tendo em conta a urgência de me-lhorarem o seu equipamento para enfrentarem o Boko Haram. Em 2014, estes dois países pediram e recebe-ram helicópteros da China e da Rússia, e veículos blinda-dos da China, da República Checa, da África do Sul e da Ucrânia. O Canadá também forneceu veículos blindados, mas com produção feita localmente (na Nigéria) ou nos Emirados Árabes Unidos.

No sentido inverso, entre 2010 e 2014 o continente africano foi responsável por 9% de todas as exportações de armas. Os Estados Unidos continuam a ser o maior exportador mundial, seguidos por Rússia, China, Alemanha e França. Juntos, estes cinco países foram responsáveis por 74% do volume de exportações de armas.

Angola ratifica o tratado de proibição total de ensaios nuclearesAngola tornou-se o 164.º Estado a ratificar o Tratado de Proibição Total de Ensaios Nucleares (CTBT). O instrumento de ratificação foi depositado em Nova Iorque a 20 de março. Luanda assinara o CTBT em 27 de setembro de 1996, apenas três dias após a abertura do tratado para assinatura. A ratificação segue-se ao anúncio feito pelo país, em setembro de 2013, durante a Conferência sobre o artigo XIV, de que o Conselho de Ministros angolano havia enviado o CTBT para a Assembleia Nacional, em abril desse ano, para aprovação e ratificação. Angola também tem mostrado o seu apoio ao Tratado ao votar regularmente a favor do CTBT, na Assembleia Geral das Nações Unidas.

Em África, apenas três países não assinaram ainda o tratado – Maurícias, Sudão do Sul e Somália –, e oito países terão ainda de o ratificar: Comores, República do Congo, Egito, Guiné Equatorial, Gâmbia, São Tomé e Príncipe, Suazilândia e Zimbabwe.

O CTBT proíbe todas as explosões nucleares, em qualquer lu-gar e por qualquer pessoa ou entidade. A CTBTO, organização responsável pelo tratado, tem vindo a construir um Sistema Interna-cional de Monitorização para se certificar de que nenhuma explosão nuclear passe despercebida. Atualmente, cerca de 90% da rede foi implantada, incluindo 31 estações em 22 países africanos. Os da-dos da monitorização por parte da CTBTO são também usados para fins que não a verificação, como a monitorização de sismos, o alerta para maremotos e a deteção de radioatividade após acidentes nucleares.

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12 abril 2015 – África21

“Cada degola, cada estátua destruída e cada burka deveriam mostrar à Europa quem é o inimigo, o radicalismo islâmico

FERREIRA FERNANDES, jornalista português

Consumare na defesa dos consumidores e por uma participação cidadãA Consumare - Organização Internacional de Associações de Consumidores de Língua Portuguesa promove este ano um in-quérito a todos os associados, que contribuirá para a realização de um curso de formação intensiva, destinado aos técnicos das associações membros. Está igualmente prevista a realização de estudos aplicados à defesa dos consumidores nos países membros.

A organização, criada em maio de 2014 em Lisboa e presidida por Portugal, tem já como instrumento de aproximação o site www.consumare.pt, aberto a todos que pretendam informação, partilha e troca de legislação, atividades e projetos. Um dos seus objetivos é ajudar a fortalecer a defesa do consumidor nos países e territórios de língua oficial portuguesa com vista a aumentar a participação cidadã, bem como fomentar a cooperação em várias atividades inerentes a esta área. No seu primeiro ano de existên-cia, a Consumare assinalou a data de 15 de março, Dia Mundial dos Direitos do Consumidor, ao sublinhar a importância da cria-ção e da consolidação de uma organização comum nos países lusófonos de defesa dos direitos dos consumidores.

São fundadores oito associações lusófonas, entre as quais a Federação Angolana de Associações de Consumidores, que pre-side a Assembleia Geral. Incluem o grupo a Proteste – Associa-ção Brasileira de Defesa do Consumidor, a Associação Para a Defesa do Consumidor de Cabo Verde e de Portugal, a Associa-ção do Consumidor de Bens e Serviços da Guiné-Bissau, bem como Associação Moçambicana para o Estudo e Defesa do Con-sumidor e a Associação São Tomense de Defesa do Consumidor, sendo Macau o primeiro membro observador.

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Vencer a pobreza para salvar os elefantes de África Dentro de cinco anos será talvez demasiado tarde para salvar o elefante em África, alertam os defensores da fauna selva-gem ameaçada de extinção, reunidos pela segunda vez no mês de março em Gaborone, capital do Botswana.

Em 2006 a população africana de elefantes selvagens ti-nha sido avaliada em 550.000. Em 2013, aquando da primeira conferência internacional sobre o tema, só restavam 470.000. Apesar do plano de emergência então aprovado pelos países africanos, a hecatombe continuou. Com 25.000 a 30.000 ele-fantes abatidos todos os anos por caçadores furtivos, a taxa de mortalidade ultrapassa, a partir daqui, o ritmo de reprodu-ção da espécie. O declínio é particularmente rápido na África do Leste, sobretudo no Quénia e Tanzânia. O que significa que o elefante selvagem poderá desaparecer dentro de dez a vinte anos.

Segundo o ministro do ambiente do Botswana, Elias Matosi, a caça furtiva e o tráfico do marfim são controlados por orga-nizações criminosas internacionais que aproveitam os confli-tos, as desordens sociais e a corrupção para prosperar.

Um estudo apresentado por Julian Blanc, representante da CITES (Convenção Internacional contra o tráfego de espé-cies em perigo), mostra que os sítios onde se regista a maior diminuição do número de elefantes são também os que têm a mais elevada mortalidade humana, índice de pobreza extre-ma. A erradicação da miséria é parte inseparável da estratégia para salvar os elefantes, concluiu.

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556 mil milhões de dólares é quanto têm os dez homens mais ricos do mundo, valor que corresponde à soma das 78 economias mais pequenas do planeta, segundo a revista Forbes

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África21– abril 2015 13

Portugal em busca da cidadania e utopia Organizado pela Associação 25 de Abril (25 A) e enquadrado nas comemorações do quadragésimo aniversário da revolu-ção portuguesa de 1974, o «Congresso da Cidadania», rea-lizado na Fundação Gulbenkian em Lisboa a 13 e 14 de março, teve como objetivo declarado «debater o presente e o futuro para melhorar a qualidade da nossa democracia» e «obrigar os governantes a respeitar a dignidade dos portu-gueses enquanto cidadãos e a dignidade de Portugal no mundo». O título escolhido era «Rutura e Utopia para a Pró-xima Revolução Democrática» e durante dois dias várias dezenas de oradores subiram à tribuna para expor as suas propostas em torno de três temas: «Regeneração do sistema político», «Rumo estratégico para Portugal» e «Recuperação da economia. Devolver a esperança e preparar o futuro».

A participação excedeu as expectativas dos organizado-res e o coronel Vasco Lourenço, capitão de Abril e presidente da 25 A, resumiu com frontalidade o sentimento geral quando afirmou que «chegou o momento de dar um valente murro na mesa». Como nos outros países europeus sujeitos a drásti-cas curas de austeridade, Portugal aspira a mudanças políti-cas, económicas e sociais, mas ao contrário do que acontece na Grécia, Espanha ou França, o desejo de rutura permane-ce ultraminoritário, como os partidos e organizações cívicas que participaram mais ativamente no congresso. A atual maioria, o Governo e o Presidente foram os bombos da festa, os partidos da oposição clássica, socialista e comunista fica-ram prudentemente à margem. No público e entre os orado-res – incluindo vários protocandidatos às próximas elei-ções presidenciais como Carvalho da Silva e Sampaio da Nóvoa – predominavam os cabelos brancos, confirmando que se vier a acontecer uma nova revolução seguirá outros caminhos.

Coronel Vasco Lourenço, capitão de Abril e presidente da 25 A

DRRDC denuncia ingerências políticas

A embaixada dos Estados Unidos reconheceu ter financiado um encon-tro entre jovens ativistas sobre a boa governação e a democracia, que se efetuou em Kinshasa, na República Democrática do Congo, a 15 de março, e durante o qual dezenas de pessoas, algumas das quais es-trangeiras, e um diplomata americano foram detidos. Os jornalistas e o diplomata foram libertados de imediato. Três senegaleses do movimen-to cívico «y’en a marre» (estamos fartos) e um burquinabê membro do «balai citoyen» (vassoura cidadã), organizadora do levantamento popu-lar que provocou a queda do Presidente Blaise Compaoré, foram expul-sos a 18 de março. No mesmo dia, seis militantes e rappers congoleses foram libertados, mas outros sete continuam presos acusados de pre-parar «atos de violência». Desde o início do ano, o governo de Kinshasa tem denunciado ingerências estrangeiras na vida política nacional em plena crise de preparação das próximas eleições presidenciais. Depois de conseguir a partida de altos dirigentes da Missão da ONU (MONUSCO), exige agora o fim da intervenção da ONU em curso desde 1999, en-quanto o enviado especial do secretário-geral, o alemão Martin Kobler, e 170 organizações da sociedade civil defendem que os capacetes azuis devem permanecer pelo menos até às eleições.

…e teme ataques jiadistas Jovens muçulmanos estariam a ser recrutados no Kivu do Sul para ir combater no Norte e receber treino terrorista da ADF-Dalu, guerrilha ugandesa há muito implantada no Leste da RDC, segundo revelou a jornalista belga Colette Braeckman, citando fontes dos serviços secre-tos congoleses. Criada na década de 1990 pela fusão de dois grupos armados que lutavam contra o regime do presidente Yoweri Museveni, a ADF (sigla inglesa para Aliança das Forças Democráticas) figura desde 2001 na lista das organizações terroristas elaborada pelo Depar-tamento de Estado dos EUA. É dirigida desde 2007 por Jamil Mukulu, um cristão convertido ao islão. É atualmente constituída em exclusivo por islamistas radicalizados em contacto com os «shebab» da Somália e os jiadistas do Quénia. Outros muçulmanos congoleses radicalizados estariam a participar na reorganização do M23, a rebelião derrotada em 2013 no Leste da RDC, cujos ex-combatentes encontram-se refugiados no Uganda. As notícias da expansão do terrorismo jiadista na Região dos Grandes Lagos e da presença de somalis nas fileiras da ADF não são novas mas até agora os serviços secretos ocidentais não as leva-ram a sério. Como no caso da República Centro-Africana garantem não existirem indícios de radicalização religiosa entre a minoria muçulmana e acusam Kampala e Kinshasa de invocar esta pretensa ameaça de forma a obter apoios para os respetivos regimes.

2987deputados têm assento no Congresso Nacional Chinês, o maior parlamento do mundo

“As mulheres estão fartas de serem apenas apoiantes, não somos pom-pom girls

REMI SONAIYA, primeira mulher candidataà presidência da Nigéria

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14 abril 2015 – África21

LUANDA

LOjAS AFRICANA Mutamba – Rua Rainha Ginga (junto à sede da Sonangol) Hotel Skyna (hall do hotel) Av. dos Combatentes (junto ao restaurante Ritz) Shopping do Belas (junto à zona da restauração) Maianga – (junto à rotunda da Martal)

OUTROS REVENDEDORES Bombas Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro Bombas da Corimba Bombas Embarcadouro do Mussulo Casa dos Frescos Atrium - Junto ao Nova Vida Casa dos Frescos Baixa Mutamba Casa dos Frescos Brisas Talatona - Junto à Universidade Oscar Ribas Casa dos Frescos Conchas Talatona - Junto à sede do Banco BIC Casa dos Frescos Vila Alice - Junto ao Cine Atlântico Cita Café dentro da Hyundai - Rua Rainha Ginga Pastelaria Vouzelense Gestoffice - Junto à Universidade Lusíada (Ex-Papelaria Fernandes) Greenspot - Dentro do supermercado Max (Morro Bento) Galeria Hotel Alvalade Hotel Epic Sana Mutamba Quiosque Las Palmas - dentro do Aeroporto Inter. 4 de Fevereiro Supermercado Valoeste Shopping Carmo – B. Marianga, perto da antiga Embaixada da África do Sul Galeria Hotel Trópico Livraria Mensagem Rua do 1º Congresso do MPLA Mutamba Livraria Nguvulu - Vila de Viana – Junto à Igreja Católica Star Angola (Viana) Rua Comandante Valódia, prédio da Conservatória Livraria Sá da Bandeira – Maculusso Pastelaria Snack das Quatro - Talatona Livraria Papelaria Mestria – Kinaxixi, junto à farmácia do Kina Xixi Supermercado Jofrabo – Maculusso, junto à Liga Africana Universidade Metropolitana Bairro Livraria Lello Mutamba - Perto da Sonangol Distribuidora News Praia do Bispo - Perto do Mausoléu

LUBANGO Livraria Lello Centro Comercial Millennium Livraria Texto Editores

HUAMBO Ludim Centro Comercial – Cidade Alta - Rua Imaculada Conceição Mercado Central da Baixa

BIÉ Praça da Pouca Vergonha

BENGUELA Supermercados Martins e Neves Restaurante Tudo na Brasa Pastelaria Flamingo CAB (Café da Cidade)

LOBITO Livraria Independência - Bairro 28, junto ao mercado

NAMIBE Futuro sem limites FASHION, Lda. Livraria Texto Editores H30/cita na Rua 14 de Abril Cantinho do Saber

Postos de Vendada Revista ÁfriCa21

Ébola soma e segue O surto de ébola já fez mais de 10.000 vítimas (10.200 até 19 de março) na África Ocidental e a epidemia parece voltar a disparar na Serra Leoa e na Guiné Conacri. O aparecimento de novos focos sem contactos com pessoas contaminadas ou próximas de doentes coloca de maneira mais aguda a ques-tão da identificação do vetor de transmissão do vírus ao ho-mem. Enquanto não for conhecido, a epidemia não poderá ser dada como controlada e corre o risco de se tornar endé-mica segundo os especialistas em virologia.

Na Libéria, país onde o ébola fez o maior número de mor-tos, um novo caso de contaminação foi detetado 27 dias depois do último e quando as autoridades se preparavam para decla-rar o país «livre de vírus». Na Serra Leoa, com o maior número de pessoas contaminadas até à data, foi decretado o recolher obrigatório em Freetown e no norte do país de 27 a 29 de março. Durante 72 horas, 2,5 milhões de pessoas foram obriga-das a permanecer em casa enquanto equipas sanitárias visita-vam casa por casa para detetarem eventuais doentes. É na Guiné Conacri, de onde partiu a epidemia, que a situação é mais preocupante dada a disseminação dos novos focos de infeção por todo o país. Apesar disso, os governos ocidentais e as grandes ONG estão a repatriar militares e voluntários. A missão militar americana na Libéria terminou a 26 de março (ver artigo sobre o ébola nesta edição).

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5 milhões de engenhos explosivos terrestresforam retirados em Angola desde 2002,revelou João Baptista Kussumua,ministro da Assistência e Reinserção Social

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África21– abril 2015 15

“O preço do metro quadrado na Baía de Luanda está seguramente no top-5 a nível mundial e há procura para projetos ainda em papel

jOAQUIM FITAS, presidente executivo da construtora Soares da Costa

Muhammadu Buhari é o novo Presidente da NigériaO candidato da oposição, Muhammadu Buhari, venceu as eleições da Nigéria, realiza-das a 28 e 29 de março, tendo obtido 53,95% dos votos, enquanto o atual Presidente Goodluck Jonathan não conseguiu mais de 44,96%. Entre ambos houve uma diferença de cerca de 2,5 milhões de votos.

Ao fim de três derrotas, em 2003, 2007 e 2011, Buhari (72 anos), antigo general e ex-Presidente de um governo militar nos anos de 1980, de etnia peul e originário do Norte, de maioria muçulmana, prometeu livrar os nigerianos da corrupção, que é consi-derada um dos piores males da primeira potência económica de África.

É a primeira vez que no país um Presidente deixa o poder pela vontade expressa da população nas urnas. O Partido Democrático do Povo, de Jonathan, estava no poder desde o fim do regime militar, em 1999, mas tem vindo a perder popularidade devido so-bretudo a escândalos de corrupção. Simultaneamente, tem sido fortemente criticada, dentro e fora do país, a «inação» do atual Presidente perante as ofensivas do Boko Ha-ram, a seita islamista nigeriana cujos crimes e atrocidades ultrapassam os de todas as outras organizações terroristas, incluindo o Estado Islâmico de que se declarou vassalo.

Na reta final da campanha, Goodluck Jonathan (cristão) multiplicou as declarações otimistas acerca de derrota iminente do Boko Haram. Mas a afirmação de que «menos de um mês» seria necessário para completar a tarefa não convenceu ninguém. Buhari, agora eleito, diz que se converteu à democracia e promete acabar com a insurgência islamista.

Apesar da insegurança, das tensões sociais e das greves provocadas pela queda do preço do petróleo e da crise económica galopante, a comissão nacional eleitoral ga-rante ter feito «tudo o que era humanamente possível» para garantir um escrutínio «credível», incluindo nos campos de deslocados. Há, no entanto, receios de que os re-sultados possam criar nova instabilidade no país. Mesmo antes das eleições, duas das organizações regionais africanas de que fazem parte quatro dos PALOP, a CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental) e a CEEAC (Comunidade Económica dos Estados da África Central) convocaram uma cimeira conjunta para 7 e 8 de abril. Oficialmente tratar-se-á de afinar a estratégia anti-Boko Haram. Mas é a situa-ção do gigante regional que está no centro das preocupações.

A Nigéria será o tema em destaque da próxima edição da ÁfriCa21.

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Um tribunal de Abidjan condenou a 9 de março Simone Gbagbo, mulher do ex-Presidente da Costa do Marfim, a 20 anos de cadeia por «aten-tado contra a autoridade do Estado, participação num movimento insurrecional e perturbação da ordem pública». O Tribunal Penal Internacional (TPI) queria julgar a ex-primeira-dama pela sua participação nos atos de violência pós-eleitorais de 2011, que causaram mais de 3000 mortos, mas as autoridades marfinenses recusaram a sua extradição.

Detida com Laurent Gbagbo a 11 de abril de 2011, Simone foi desterrada para Odienne, no Norte do país, enquanto o ex-Presidente era leva-do para Haia onde aguarda o veredicto do TPI. O processo de 78 altos dirigentes do antigo regime – incluindo vários ex-ministros, a mulher e um filho de Laurent Gbagbo – durou dois meses e resultou em pesadas condenações. Combativa, a «dama de ferro», que os seus admiradores chamam de «mama» e os adversários de «bruxa», diz-se víti-ma de um processo político e disposta a continuar a batalha para levar perante a justiça os «cúmpli-ces» do Presidente Ouattara que continua a consi-derar como um «usurpador».

A justiça senegalesa teve também mão pesa-da para outro ex-poderoso que deixou de o ser, Karim Wade, filho do ex-Presidente Abdoulaye Wade. Acusado de enriquecimento ilícito e preso pouco depois do pai ter perdido as eleições de 2012, acaba de ser condenado a seis anos de prisão e ao pagamento de uma multa de 210 mi-lhões de dólares. O seu pai tinha regressado ao Senegal para mobilizar a opinião e Karim tinha sido designado a 21 de março candidato do Parti-do Democrático Senegalês, a formação fundada por Abdoulaye Wade às próximas eleições presi-denciais. Segundo o PDS, o processo foi uma pa-ródia de justiça destinado a assassinar politica-mente o seu candidato e provável vencedor.

Justiça e política nas condenações de Simone Gbagbo e Karim Wade

1000 milhões de pessoas no mundo nunca tiveram acesso à medicina moderna, de acordo com a OMS

Muhammadu Buhari venceu as eleições presidenciais

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16 abril 2015 – África21

“Sou africano com muito orgulho. Roubaram-nos o nosso passado, tentaram roubar a nossa história, mas a nossa cultura é só nossa

HICHAM AYUCOUCH, cineasta marroquino,vencedor do festival de cinema de Ouagadougou 2015

750 milhõesde pessoas não tem acesso a água potável, 325 milhões das quaisvivem na África Subsariana

Cidades africanas lançam prémio José Eduardo dos Santos A União das Cidades Africanas e a revista britânica African Business vão lançar em abril o «Prémio Africano José Eduardo dos Santos», para homenagear presidentes de câmaras, governadores de cidades de África e outras individualidades que se destacarem «nas boas práticas a nível da gestão urbana». O lançamento do prémio vai ocorrer entre 29 e 30 de abril, durante a realização de um fórum sobre infraestrutu-ras em África.

Este anúncio foi feito pelo ministro do Urbanismo e da Habitação, José António da Conceição e Silva, numa entre-vista à exclusiva à Angop, para abordar o estado do setor no país e o balanço de 40 anos de independência. Para o ministro, a criação da distinção com a designação José Eduardo dos Santos «revela, por si só, o reconhecimento da comunidade internacional daquilo que Angola tem estado a gizar na área de urbanismo e habitação», algo «encabe-çado pelo Presidente da República». O prémio vai ter perio-dicidade anual e abrange vários países.

Angola e República do Congoeliminam vistos de entradaAngola e República do Congo assinaram em março vários acordos de cooperação, incluindo sobre a supressão recíproca de vistos de entrada em passaportes diplomáticos e de serviço. Os acordos foram assinados durante a visita oficial de três dias que o Chefe de Estado congolês, Denis Sassou Nguesso, efetuou a Angola.

De acordo com o diretor para África e Médio Oriente do ministério an-golano das Relações Exteriores, Joaquim do Espírito Santo, as relações entre Angola e Congo «são de longa data e estão alicerçadas na longa história de libertação dos povos africanos, de independência política e afir-mação económica no contexto das Nações». Para o diplomata, os dois países vivem uma fase importante na sua política ativa, em que todos os esforços concorrem para o desenvolvimento económico e social, com vista à criação de condições para o bem-estar das suas populações e para o desenvolvimento dos dois países.

Combate à raiva custa milhões por anoMais de 235 mil cães, gatos e macacos vão ser vacinados contra a raiva em Luanda, numa tentativa das autoridades sanitárias para conter o surto de uma doença que só em vacinas poderá custar anualmente seis milhões de dólares. Só na província capital já morreram 34 pessoas por raiva desde o início do ano, 92% dos casos envolvendo menores de dez anos. No mesmo período, em toda a província, foram notificados 4290 casos de mordedura por animais.

«Podemos facilmente prevenir a raiva através de campa-nhas regulares de vacinação e de sensibilização comunitária, mas cujo impacto na vida das populações já se tornou um sério problema de saúde pública», alertou o representante da Organi-zação Mundial de Saúde (OMS) em Angola, Hernando Agudelo. A organização diz que o tratamento para a doença é 100 vezes mais dispendioso que a vacina.

«Em todos os municípios de Luanda a taxa de letalidade foi de 100%, e as autoridades estão particularmente preocupadas por-que 80% das vítimas abandonam o tratamento», reconhece a OMS. A organização estima que o África registe uma média de 24 mil mortes anuais por raiva, mais de 90% dos casos provocados pela mordedura de cães raivosos e em áreas urbanas.

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LADenis Sassou Nguesso fez visita oficial de três dias a Angola

Um ano de africa21online.comO portal africa21online.com celebra um ano de atividade. Lançado a 1 de abril de 2014, 0.afirmou-se já como um meio online de referência na abor-dagem jornalística em língua portuguesa ao continente africano. O portal já colocou online 10.150 peças, entre notícias, entrevistas, reportagens e es-tudos sobre os mais diversos temas. Os especiais sobre o ébola, as elei-ções na Guiné-Bissau, a CAN, o petróleo, a aviação em África, o turismo ou as eleições na Nigéria têm merecido uma atenção especial de quem acompanha o projeto. A abordagem ao vírus do ébola já contou, até hoje, com mais de 250 notícias e reportagens, com a redação do portal a acom-panhar com particular atenção as incidências da doença e os avanços em termos de investigação médica. Segundo as estatísticas, o portal tem uma audiência essencialmente angolana, portuguesa e brasileira, embora tam-bém apresente um número elevado de leitores em Moçambique, Cabo Verde, África do Sul, Grã-Bretanha e Estados Unidos.

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«Bartolomeu Dias» em São Tomé e PríncipeA fragata Bartolomeu Dias, com 172 militares da Marinha Portuguesa, escalou São Tomé e Príncipe, em meados de março, numa missão abrangente que incluiu a forma-ção dos efetivos do país africano. A operação denomina-da Mar Aberto «traduz o empenho de Portugal no fortale-cimento das relações de cooperação e confiança entre os PALOP e tem por finalidade cooperar no desenvolvimento de atividades tendentes à edificação de capacidades pró-prias dos países parceiros, no quadro da estrutura supe-rior das Forças Armadas, dos sistemas de segurança marítima e de autoridade marítima».

Comandada pelo capitão Paulo Cavaleiro Ângelo, a presença da fragata no arquilélago permitiu realizar ins-truções e treino em terra no domínio das operações de busca e salvamento marítimo e de vigilância e fiscaliza-ção, assim como ações de formação na área específica das operações de mergulho. Os militares da Guarda Costeira local também participaram em ações de treino de perícias de marinharia, abordagem e recuperação de náufragos, incluindo todas as disciplinas relacionadas com a segurança marítima. No âmbito do exercício inter-nacional Obangame Express, que se realizou após a iniciativa Mar Aberto, a fragata portuguesa embarcou, de 19 a 20 de março, uma equipa de militares da Guarda Costeira santomense, numa operação de treino dos parceiros regionais no combate às ameaças marítimas e à promoção da cooperação entre países africanos, euro-peus e os Estados Unidos da América.

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A(s) guerra(s) do Iémen A Arábia Saudita começou a 25 de março a bombardear as posições ocupadas pelos rebeldes hutis e os partidários do ex-Presidente do Ié-men Ali Abdallah Saleh (derrubado em 2011), que se apoderaram em fevereiro da capital Sanaa e ameaçavam conquistar o porto estratégico de Áden, à entrada do mar Vermelho.

A ofensiva saudita recebeu imediatamente o apoio das monarquias su-nitas da região e também do Egito, Turquia, Sudão, Paquistão e dos Esta-dos Unidos. Riad alega que a intervenção por agora aérea, mas que pode levar à intervenção de tropas terrestres, responde ao apelo do presidente Abd Rabo el-Mansur, reconhecido pela ONU e pela comunidade internacio-nal. Mas as declarações dos líderes da coligação – que não esperaram pela luz verde da Liga Árabe ou do Conselho de Segurança – mostram que esta manifestação de força tem como alvo principal o Irão, acusado de apoiar os hutis (minoria do norte do Iémen que pratica o zaidismo, ramo dissidente do xiismo). Os especialistas temem que esta «guerra por procuração» entre a Arábia Saudita e o Irão em solo iemenita tenha as mesmas consequências que no Iraque e na Síria e que o acirrar da violência sectária entre sunitas e xiitas faça o jogo dos salafistas e outros jiadistas que se reclamam do Estado Islâmico (EI), que consideram os monarcas e outros dirigentes sunitas como «heréticos» e idolatras.

Até recentemente, a ameaça terrorista no Iémen era representada pela Al-Qaeda na Península Arábica (AQPA), considerada como o ramo mais ativo da organização fundada por Bin Laden. Os Estados Unidos realizam há anos bombardeamentos contra posições da AQPA no sul do Iémen com a anuência da Arábia Saudita e das outras monarquias sunitas da região, também elas ameaçadas pela Al-Qaeda. Mas os atentados de 20 de março contra três mesquitas em Sanaa reivindicados pelo EI, que causaram 142 mortos e três centenas de feridos, revelam que aqui como no resto da nebu-losa terrorista o EI está a ganhar terreno em detrimento da Al-Qaeda.

Ataque a uma mesquita em Sanaa

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225feiticeiros e adivinhos foram detidos numa megaoperação na Tanzânia para travar assassinatos e ataques contra pessoas albinas

“A dedicação do povo namibiano à paz e à estabilidade tornou possível este prémio

HIFIKEPUNYE POHAMBA, presidente da Namíbia que recebeu o Prémio Mo Ibrahim, de Excelência na Liderança Africana

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18 abril 2015 – África21

Gente“Não haverá estado palestiniano enquanto eu estiver no poder

BENjAMIN NETANYAHU, primeiro-ministro de Israel

Namíbia festeja25 anos de independênciae sucessos As comemorações do 25.º aniversário da indepen-dência da Namíbia a 21 de março coincidiram com a tomada de posse do presidente eleito em de-zembro, Hage Geingob, e com a homenagem ao presidente cessante Hifikepunye Pohamba, galar-doado em março com o prémio Mo Ibrahim, pela boa governação em África.

O galardão instituído pela fundação criada pelo magnata sudanês das telecomunicações Mo Ibrahim é o mais valioso do mundo já que além do prémio de cinco milhões de dólares atribui ao esta-dista recompensado uma renda vitalícia de 200.000 dólares/ano. Considerado como uma es-pécie de «complemento de reforma» para os Chefes de Estado que se retiram passado o prazo constitucional previsto, o prémio Mo Ibrahim foi atribuído pela primeira vez em 2007 ao ex-Presi-dente moçambicano Joaquim Chissano e em 2008 ao botsuanês Festus Mogae. O cabo-verdiano Pedro Pires foi agraciado em 2011 e desde então o prémio ficou vacante, considerando o júri que nenhum Chefe de Estado africano preenchia os seus critérios de atribuição.

Elogiado pela sua modéstia e moderação, Pohamba, de 80 anos, é um histórico da SWAPO, o partido no poder na Namíbia desde a indepen-dência. Fez toda a sua carreira política na sombra de Sam Nujoma, o pai fundador e o seu «sucessor natural» em 2004 quando Nujoma renunciou a candidatar-se a um quarto mandato. O seu suces-sor foi primeiro-ministro da Namíbia durante 15 anos, sob o mandato de Nujoma e de novo desde 2012. Três anos mais novo que Pohamba, Geigob tem um perfil muito diferente. Formado em ciência política nos EUA, onde se exilou em 1964, fez carreira na ONU só regressando ao país em 1989 para participar na primeira campanha eleitoral.

O Presidente José Eduardo dos Santos, que se deslocou a Windhoek para as comemorações, lembrou os «enormes sacrifícios» que a indepen-dência da Namíbia custou a Angola.

REMI SONAIYA Primeira mulher candidata à presi-dência da Nigéria nas eleições de março, diz que as mulheres africanas estão fartas de só serem chama-das para fazer parte das «claques». Esta professora reformada (60 anos) não tinha a menor possibilidade de vencer num país onde as mulheres ocupam lugares de res-ponsabilidade, no governo e nos negócios, mas são politicamente subalterni-zadas. O clientelismo, os milhões gastos pelos grandes partidos em publicida-de, comícios e «prendas» deturpam a livre expressão da vontade eleitoral. «Pedem-me dinheiro em todo o lado. É lamentável mas é a realidade que sempre existiu aqui», diz. Sem acesso aos grandes meios de comunicação Remi Sonayia e o seu partido Kowa recorreram às redes sociais e ao porta-a--porta para fazer passar a sua mensagem centrada na dignidade, igualdade, resolução dos problemas sociais e luta contra a corrupção.

ANGÉLIQUE KIDjO Esta cantora e compositora originá-ria do Benim foi premiada com o seu segundo Grammy, pelo álbum Eve, descrito como uma home-nagem às mulheres africanas. «Para mim, a música é uma arma de paz, e hoje mais do que nunca, como artistas temos um papel a desempenhar na estabili-dade do mundo», disse ao receber o prémio em feve-reiro. Kidjo é também uma reconhecida ativista, defensora dos direitos das mulheres, tendo participado em diversas iniciativas para consciencializar o mundo para problemas como o tráfico de crianças, mutila-ção genital feminina, discriminação sexual e VIH/sida. «Para mim o silêncio mata. Muita da violência contra as mulheres continua porque elas a silen-ciam», afirma. Na música, é conhecida pela forma como se movimenta entre diferentes géneros musicais, do afropop aos estilos latinos, passando pelo gospel e pelo jazz. É reconhecida pela imprensa internacional como «diva» de África, ícone do continente e personalidade inspiradora.

THIKRA ALWASH Doutorada em engenharia civil, é a primeira mulher a liderar a Câmara de Bagdade nos 1252 anos da cidade. É vista como uma tecnocrata, sem afiliações partidárias, e dirigia até agora o de-partamento de projetos do Ministério da Educação do Iraque. Thikra Alwash foi nomeada para o cargo pelo primeiro-ministro Haider al-Abadi, de forma a substituir Naeem Aboub, figura que não colhia a simpatia da opinião pública. A escolha de uma mulher é vista como um ato importante, num país onde existem apenas duas ministras em 29 pastas, e no Parlamen-to, das 83 deputadas com assento, apenas 22 foram eleitas. Thikra Alwash é também a única mulher a presidir a uma câmara de uma capital de um país da Liga Árabe. Para o seu mandato, a engenheira quer sobretudo empenhar--se na recuperação geral de Bagdade. A cidade surge no último lugar da lista sobre qualidade de vida em cidades, da consultora Mercer.

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20 abril 2015 – África21

Paisagens naturais que vão da savana às altas montanhas, passando por praias e al-guns dos mais carismáticos rios e lagos do mundo. Uma diversidade cultural imensa, a vida selvagem no seu esplendor, um mun-do rural preservado e cidades com arquite-turas de várias épocas e estilos. Uma plura-lidade linguística com milhares de línguas e dialetos, uma gastronomia que explora a essência dos ingredientes e o peso da histó-ria de um continente que foi o berço da hu-manidade e onde se ergueram civilizações

como a do antigo Egito. As potencialidades são muitas e estão bem expressas nos 129 sítios considerados Património Mundial, localizados em 37 países.

África oferece muito. Mas ainda recebe poucos turistas. O continente apenas aco-lhe cerca de três por cento do turismo mun-dial. A falta de estratégias para a afirmação nos mercados internacionais, infraestrutu-ras deficientes, a instabilidade política e os conflitos militares em diversos países têm contribuído para que o setor não correspon-

O gradual crescimento do turismo em África

O TURISMO EM ÁFRICA

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da ainda às expectativas e desejos de muitos países. No entanto, tem vindo nos últimos anos a ganhar novos visitantes. Entre 1990 e 2012 registou um aumento de 300% e 2014 trouxe um novo incremento. Refle-xo desta tendência é a presença dos grandes grupos hoteleiros, que na África Subsariana se intensificou quase 30% em 2014.

Hoje, os principais destinos turísticos são Marrocos, África do Sul, Egito, Tunísia e Zimbabwe. Mas há países em ascensão, como Cabo Verde, e outros que estão a fa-

zer apostas fortes para o futuro. É o caso de Angola. O investimento é generalizado, e Estados como a RDC ou a Serra Leoa rece-beram no ano passado os primeiros grandes hotéis. O setor emprega, atualmente, cerca de 2,2 milhões de pessoas em todo o con-tinente e a conclusão de que o desenvolvi-mento de um turismo sustentável pode contribuir para o progresso e para a coesão social é hoje consensual.

Miguel Correia e nataCha Mosso

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22 abril 2015 – África21

Karnak era menor do que o Papyrus ou o Lótus, na-vios da Primeira Catarata,

grandes de mais para passar pelos canais da represa de Assuão. Os passageiros subiram para bordo, indo logo procurar as suas aco-modações. Como o navio não estava cheio, muitos tinham cabines no tombadilho de passeio. Toda a parte fronteira desse tomba-dilho era ocupada por um salão envidraça-do, onde os passageiros podiam sentar-se para admirar o rio. No tombadilho de bai-xo, ficava a sala de fumo e o pequeno salão, e no tombadilho inferior a sala de jantar. Deixando as malas na cabina, Poirot voltou ao tombadilho, para apreciar a partida, indo

O turismo em África há muito que se baseia na exploração das belezas naturais e na sua inigualável vida selvagem, apesar da ameaça da caça, de alguns conflitos armados e das alterações climáticas que põem em causa a sua sustentabilidade. Embora seja o continente que menos turistas recebe, os últimos anos têm revelado um aumento sustentado de visitantes e uma significativa melhoria das infraestruturas e de opções turísticas. A marca dos 50 milhões de turistas por ano já foi ultrapassada.

reunir-se a Rosalie, que estava debruçada na amurada».

O barco afasta-se então lentamente do cais e desliza pelas águas tranquilas do rio Nilo. Lá dentro está prestes a dar-se um drama, num dos romances mais famosos da escritora inglesa Agatha Christie, Morte no Nilo, publicado em 1937. O Egito está lá, nas suas páginas. Tal como uma África en-tão muito em voga, a do antigo Egito dos faraós e toda a riqueza do seu passado.

Esta era uma das atrações do continente de finais do século XIX até meados do sécu-lo XX, então acessível aos europeus, que juntamente com os norte-americanos eram os principais clientes da oferta de uma

África ainda colonial. A outra que marcava forte presença retratou-a, por exemplo, Er-nest Hemingway, no seu As Verdes Colinas de África. Nas quatro partes em que se divi-de o livro, o escritor revela-se a si próprio através de relatos de caçadas. Caçadas numa savana ali tão bem retratada, com todos os seus encantos e vicissitudes. Caçadas que eram procuradas por muitos, o que aliás contribuiu para o declínio de muitas espé-cies e a quase extinção de algumas.

Hoje o continente é em termos turísti-cos muito mais do que um passado faraóni-co ou o chamamento para uma caçada. A pluralidade da oferta é explorada por di-versos países, principalmente pelos que têm tido condições e estabilidade política nas últimas décadas e que apostaram neste setor, alguns deles já com forte expressão ainda na época colonial. Marrocos, África do Sul ou Tunísia são alguns exemplos.

Atualmente, cerca de 2,2 milhões de pessoas trabalham na área, o que representa 5,3% da força de trabalho no norte do continente e 2,4% na África Subsariana, segundo dados referentes a 2014 do African Tourism Monitor, a publicação anual sobre turismo editada pelo Banco Africano de Desenvolvimento, Associação de Viagens de África e pela Casa de África da Universi-dade de Nova Iorque.

Um continente em busca do turismo

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Há inúmeros parques nacionais por todo o continente que permitem a realização de safaris

O TURISMO EM ÁFRICA

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São diversos os países a apresentarem um aumento sustentado do número de visi-tantes e a Organização Mundial do Turis-mo (OMT) apontou um crescimento para o continente de 5% em 2013. No ano pas-sado as estatísticas voltaram a registar um novo aumento, embora ainda não tenham sido divulgados números oficiais. No total, o impacto foi de 53 milhões de turistas em 2013 e mais de 34 mil milhões de dólares na economia dos diversos Estados.

Marrocos, África do Sul, Egito, Tunísia e Zimbabwe são, por esta ordem, os desti-nos mais procurados. Mas há países que começam a dar nas vistas e a surgir com mais presença nos catálogos das agências internacionais. São, por exemplo, os casos de Moçambique, Cabo Verde, Uganda, Gana, Gâmbia ou, mesmo de forma ainda suave, o Sudão ou o Togo, além de outros que há muito potenciam as suas mais-valias, principalmente naturais, como o Quénia ou a Tanzânia, com o seu Serengueti, palco de dezenas de documentários. Estes dois últi-mos têm sabido explorar as suas belezas na-turais, que vendem através dos mais diversi-ficados pacotes turísticos.

Segundo dados de 2013 da OMT, apenas 6% dos turistas são do continente. Cerca de 52% são europeus, 22,9% da América do Norte, 10% das Caraíbas e

América do Sul e 3,6% do Médio Oriente, o que obriga a que usem essencialmente o avião como meio de transporte. Tal facto é ainda um condicionador do desenvolvi-mento do turismo africano, pois há menos companhias a voar para África do que para outros continentes, menos ligações e, conse-quentemente, tarifas mais elevadas. No en-tanto, também neste aspeto o cenário tem evoluído na última década, com a melhoria de muitas companhias de aviação africanas e o aumento de rotas aéreas por parte de transportadoras dos grandes mercados de proveniência de turistas, como a Europa.

As potencialidadesMas se as estatísticas registam um cresci-mento, a verdade é que o continente ainda é

o que menos turistas recebe, com apenas 3% do total mundial. Um número aproxi-mado ao que recebeu, por exemplo, no ano passado a Itália (47 milhões), e inferior aos da China (55 milhões) ou de Espanha (60 milhões).

Em termos regionais, as alterações polí-ticas vividas nos últimos anos no Norte de África, e toda a agitação social e económica que provocaram, acabaram por afetar o mercado turístico. Reflexo disso mesmo foi a quebra do número de quartos. Enquanto na África Subsariana estes aumentaram quase 30%, no Norte houve uma redução de 10%. No entanto, com exceção de al-guns países, como a Líbia, 2014 já trouxe um crescimento e 2015 promete seguir a mesma tendência.

Um continente em busca do turismo

A Tunísia procura ressuscitar o turismo, após anos de instabilidade política e social. Os constrangimentos financeiros têm dificultado a estratégia do Governo, mas a proximidade com a Europa e a qualidade das infraestruturas tem ajudado na captação de turistas, estratégia que pode, no entanto, ter sido beliscada com o recente atentado no Museu do Bardo em Tunes

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A mais-valia a diversos níveis que o tu-rismo pode trazer aos países e às suas popu-lações tem sido nos últimos anos reconheci-da por inúmeras entidades internacionais e governos. E as potencialidades do continen-te em termos turísticos estão bem patentes nos 129 sítios considerados Património Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cul-tura (Unesco), localizados em 37 países.

África do Sul, Marrocos, Etiópia, Egito, Quénia, Senegal, Tanzânia e Tunísia são os países com mais locais classificados, todos eles com mais de cinco. Já doze Estados, in-cluindo Cabo Verde (Cidade Velha) e Moçambique (Ilha de Moçambique) apenas têm um. Curiosamente, e demonstrando a expressão do património cultural por todo o continente, há mais locais classificados como Património Cultural do que Natural. Com algumas exceções devido a conflitos arma-dos, todos eles são presença forte nos itinerá-rios turísticos de cada um dos países.

Uma das imagens que África necessita vencer aos olhos do mundo é a de ser enca-rada como um todo. Visão que em parte fi-cou da época colonial, acaba por afetar a afirmação da diferença, essencial em turis-mo. Mas há estratégias para a afirmação do setor que são gerais, segundo o Africa Tourism Monitor, e que vão ao encontro de um turismo inclusivo. A melhoria da cadeia de fornecimento alimentar, investindo-se no acesso direto a fornecedores locais, como agricultores e pescadores; o investimento nas populações com baixos rendimentos, através de formações e estágios no sentido de as preparar para trabalhar na área; o apoio a

artistas através de infraestruturas, mercados, formação, marketing e comunicação ou ainda o apoio a produtores locais, nomeada-mente na área da alimentação, integrando--os como parte do produto turístico.

A inclusão social e o turismo sustentável acabam por ser hoje prioridades em muitos países emergentes, e Zimbabwe, Ruanda, Uganda e Gâmbia são considerados casos de sucesso de boas práticas, segundo o Africa Tourism Monitor 2014.

Mais do que caçadas e safarisFotografias do então rei espanhol Juan Carlos a caçar elefantes em África correram o mundo em 2012. O incómodo com o acontecimento foi grande e este foi mais um passo que contribuiu para a decisão da sua abdicação. Um século antes, tal aconteci-mento não teria abanado a sociedade espa-nhola e espantado o mundo. A caça grossa era incentivada, embora controlada por di-versos decretos, mas a preservação da vida

CURIOSIDADES África recebeu 53 milhões de visitantes em 2013, o que corresponde a 3% dos turistas mundiais

No Quénia, 9% da população ativa trabalha na área do turismo, que contribui com 12% para o PIB do país

O número de turistas em África aumentou, segundo o Banco Mundial, 300% entre 1990 e 2012

Segundo o African Tourism Monitor, em 2014 trabalhavam cerca de 2,2 milhões de pessoas na área do turismo

Em 2013, a maioria dos turistas que visitou África foram europeus: 52% do total

O turismo angolano dá atualmente emprego a cerca de 200 mil pessoas

O destino africano mais procurado em 2013, último ano em que há dados oficiais, foi Marrocos, com 10,05 milhões de turistas

39,1% dos turistas que visitaram o Egito em 2014 eram do Leste Europeu

Angola pretende captar, em 2020, cerca de 4,7 milhões de turistas, segundo o Instituto de Fomento Turístico de Angola

Um dos mais conhecidos parques nacionais de África, o Serengueti, ocupa uma área que equivale a 14% do país em que se situa, a Tanzânia

Londres foi em 2014 a cidade mais visitada do mundo, com 18.690.000 de visitas

5700 passageiros embarcam num avião a cada minuto

Um dos ex-líbris do continente é o Monte Kilimanjaro, com a sua neve no topo. No entanto, perdeu 85% da cobertura branca no último século, passando de 12 km2 para apenas 2 km2

O número de turistas que simplesmente procura as belezas naturais do continente tem aumentado nos últimos anos

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selvagem, com algumas exceções, tinha pouca expressão. Na prática, a regulamenta-ção acabava por ser mais uma ferramenta do domínio colonial sobre a população local, nomeadamente sobre a gestão dos recursos alimentares, bem como do marfim ou peles. Nessa época, a atração turística passava pela organização de caçadas.

«O animal surgiu no regato baixo e pedregoso. Naquele momento apenas pensava em que era perfeitamente possível alvejá-lo mas para isso era necessário alcan-çá-lo e ultrapassá-lo; alcancei-o, ultrapassei--o e disparei. Ouvi o ruído da bala e como o animal seguia a trote, esta pareceu explodir mais à frente. Com um resfolgar sibilante caiu prostrado, esparrinhando água e ron-cando». Assim escrevia Ernest Hemingway, em As Verdes Colinas de África. Assim se caçava então. E continua-se a caçar. Se a caça furtiva é um problema, a caça legal é uma solução turística para diversos países e, por vezes, para o próprio controlo das espé-

cies. Embora contestada por muitos, no-meadamente por associações conservacio-nistas, é praticada em diversos Estados, como na África do Sul.

Contudo, hoje, muitos governos agem no pressuposto de que um elefante vale muito mais vivo do que morto, e a natureza, os safaris e a atração do mundo selvagem e de toda a sua diversidade são o grande car-tão-de-visita de África. Não é por acaso que a maioria dos documentários sobre vida selvagem é produzida em solo africano. É onde se encontram os grandes mamíferos, como os big five (leão, elefante, rinoceronte, leopardo e búfalo), onde está grande parte dos grandes predadores e tem ainda vastos territórios que podem ser explorados.

Se em relação a safaris a oferta é imensa, há dois parques que se têm destacado: Kru-guer, na África do Sul, e o Serengueti, na Tanzânia. Este último ocupa 14% do terri-tório do país e alberga os maiores mamíferos do planeta, que podem ser fotografados.

Para os amantes dos safaris, os dois revelam diferenças. O Serengueti destaca-se pela migração dos gnus e zebras, algo que com tal dimensão só existe neste parque. Por outro lado, no Kruguer é mais fácil encon-trar rinocerontes, além de animais raros, como os cães selvagens. A própria paisagem é diferente. O Serengueti apresenta-nos uma paisagem mais despida, enquanto o Kruguer destaca-se pela vegetação, que na época das chuvas toma conta das vistas. Diferenças também nas acessibilidades e nos preços, tudo mais em conta no parque sul-africano. Quem visita os dois não hesi-ta: o Kruguer é um parque fácil e acessível, o Serengueti, se vivido na sua plenitude, bem mais duro. Até nas doenças: se o risco de se apanhar malária existe em ambas as regiões, no Serengueti as probabilidades são bem maiores.

Se os safaris nos diversos parques natu-rais e a vida selvagem, seja nas savanas, seja nas altas montanhas, ainda se apresentam como um dos principais polos de atração, e são cada vez mais exploradas com mais e melhor oferta de infraestruturas e progra-mas, há novas áreas a emergir, como o turis-mo cultural. Exemplo recente e já com su-cesso é o roteiro turístico lançado na África do Sul, que segue a história de Nelson Mandela. Denominado «Madiba Inspired Tourist Attractions», leva os visitantes a al-guns dos lugares mais marcantes da vida de Mandela, que morreu em dezembro de 2013. O roteiro passa por diversos locais, incluindo a prisão da ilha de Robben, onde o estadista esteve 27 anos encarcerado, ou a sua casa no Soweto. Aliás, o ministro do turismo sul-africano, Marthinus van Schalkwyk, realçava no ano passado o facto de Mandela, por si só e devido às políticas seguidas desde que foi eleito Presidente, ter contribuído de forma decisiva para o cresci-mento do turismo no país. «Mandela dei-xou um grande legado para o nosso turis-mo, estimulando pessoas de todos os países a visitarem o destino por conta própria» afirmou, destacando: «Foi graças à sua visão e aos seus princípios que a nossa indústria de turismo se desenvolveu tanto».

O sucesso sul-africanoO site de turismo TripAdvisor elegeu em 2014, mediante votação dos seus visitantes,

Os turistas estão a regressar aos poucos ao Egito, após a revolução que afastou Hosni Mubarak do poder. Apesar das tensões políticas ainda existentes, o número de visitantes no terceiro trimestre do ano passado subiu 70% face a igual período de 2013.

O antigo Egitocontinua a cativarum elevado númerode turistas, principalmenteda Europa de Leste

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O TURISMO EM ÁFRICA

turísticas, que explora as potencialidades existentes nesta área, dada a diversidade e qualidade da oferta. Das praias aos safaris nos grandes parques, passando pela vivência em algumas cidades e pelo turismo cultural, com inúmeros museus – com destaque para o Museu do Apartheid –, a nação de Man-dela dá cartas neste setor. Com a vantagem de possuir sistemas de saúde e de transportes de qualidade, questão considerada por muitos na hora da escolha. É também neste país que se realiza o maior evento do setor em África, a Feira Internacional de Turis-mo, com palco em Durban, no mês de maio, que todos os anos conta com centenas de expositores de todo o continente.

Mas se a indústria turística tem estado em ascensão no país, tem havido momen-tos menos felizes. A Copa de 2010 foi um deles, com o total de visitantes bastante abaixo do previsto. A meta apontava para 450 mil, mas o número de turistas ficou--se pelos 310 mil, o mais baixo registado desde a Copa de 1994, nos Estados Uni-dos da América.

O turismo de nichosCostuma dizer-se que um turista tem lo-cais que pode ou não optar por visitar. Há lembranças que pode ou não levar. Mas se há algo a que não pode fugir são refeições. A gastronomia é encarada como um im-portante fator em termos turísticos. Além do retorno financeiro, a restauração pode contribuir para a inclusão social e para o

os 25 melhores destino do mundo. Cidade do Cabo, na África do Sul, e Marraquexe, em Marrocos, são as presenças africanas, numa lista dominada por destinos europeus.

A nação arco-íris tem estado, nos últi-mos anos, regularmente em destaque nos media. A BBC Travel selecionou cinco ci-dades do mundo que estão a ganhar espaço na lista das melhores para visitar, mas que ainda não fazem parte das escolhas dos tu-ristas. Joanesburgo aparece em primeiro lugar, realçando a BBC o facto de ter dei-xado o apartheid para trás e de se ter conse-guido impor como uma cidade com múl-tiplas ofertas.

A África do Sul apresenta-se no conti-nente como o país com mais infraestruturas

A recuperação do Parque Nacional da GorongosaO Parque Nacional da Gorongosa, em Moçambique, já teve uma das maiores con-centrações de leões de África, cerca de seis mil elefantes, mais de três mil hipopóta-mos e dois mil impalas. Hoje os números são claramente outros, embora tenham vindo a aumentar nos últimos anos, depois da razia da Guerra Civil que o afetou gravemente. Os tempos são de otimismo e o turismo é uma das alavancas de um projeto que também conta com as áreas da preservação e investigação.

Situado no centro de Moçambique, perto da Beira, o parque, gerido pela Funda-ção Kerr, tem hoje cerca de quatro mil quilómetros quadrados, com uma zona tam-pão de 3300, e inclui desde 2010 a importante serra da Gorongosa, interessante pelas suas características naturais e biodiversidade. Num país com uma fauna bra-via riquíssima, e com diversos parques e reservas naturais, a Gorongosa destaca-se pela forma como se tem desenvolvido, e é hoje local de destino de turistas de todo o mundo e de múltiplos projetos de pesquisa científica e preservação da vida animal.

A última década trouxe a construção de diversos empreendimentos turísticos em vários países

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As florestas do Uganda abrigam duas das grandes atrações do país, os chimpanzés e os gorilas

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de são opções em diversos países. De acordo com o Banco Africano de Desen-volvimento, os investimentos nestas áreas têm aumentado significativamente na úl-tima década.

Mas embora o continente venha a afirmar-se de forma crescente em termos turísticos, muitos dos seus Estados conti-nuam a ocupar os lugares cimeiros na lista de países menos visitados do mundo, se-gundo dados estatísticos da OMT e da ONU. Estão lá, por exemplo, a Somália, o Chade, a Líbia ou a Guiné Equatorial. Os conflitos armados, a instabilidade política de alguns Estados e as acessibilidades con-tinuam a ser o calcanhar de Aquiles para a generalidade dos países africanos, que para se afirmarem em termos mundiais têm que vencer mercados mais acessíveis, que apre-sentam uma indústria turística mais desen-volvida, preços mais baixos e maior núme-ro de ligações aéreas.

Miguel Correia

Por vezes esquecido, o Botswana apresenta diversos argumentos turísticos. País conhecido pelos seus diamantes, alberga o parque que apresenta o maior número de elefantes do mundo, o Chobe National Park, além de uma das maiores reservas de caça africanas, a Central Kalahari Game Reserve.

Quando está ameaçado um dos cartões-de-visita A convivência entre o Homem e os animais selvagens nunca foi pacífica e mais difícil se tem tornado à medida que os seres huma-nos vão conquistando território a inúmeras espécies. O caso dos elefantes é o mais notório, pois é com facilidade que estes in-vadem o espaço ocupado pelo homem, no-meadamente as suas culturas. Se a vida selvagem e os safaris são um dos cartões--de-visita do continente, a verdade é que este se encontra ameaçado.

A caça ilegal há muito que é um problema em África, principalmente em relação aos big five (leão, elefante, rinoceronte, leopardo e búfalo). Parte desta caça procura fins comer-ciais ou desportivos, outra visa matar e afastar animais selvagens de zonas habitadas e dos recursos agrícolas. Na Etiópia são frequentes as caçadas organizadas por agricultores. E em outros países, como Angola e Moçambique, é costume matarem-se animais que se aventu-ram até zonas habitadas ou cultivadas.

Paralelamente a estas questões, o aces-so a recursos escassos, como a água, tam-bém tem sido alvo de disputas e atenção das autoridades de diversos países. Há fontes de água que servem humanos e animais, com todas as situações de tensão que tal implica.

No Quénia, a solução passou pela cons-trução de 400 km de cerca eletrificada, que percorrem o Parque Nacional de Aberdare, onde se encontram locais que pelas caracte-rísticas do terreno recebem muita chuva. A rede permite que os cerca de 40 mil agriculto-res da região semeiem e criem os seus ani-mais em segurança.

Os números da caça ilegal têm aumenta-do exponencialmente. Se em 2007 foram abatidos 13 rinocerontes, este ano o número está nos três por dia. Se em 1979 havia um milhão e meio de elefantes, hoje não passam dos 500 mil, com algumas populações mais isoladas em risco de extinção. Há cinco anos que o nascimento de paquidermes não chega para repor a população, apontando as organi-zações conservacionistas para uma média de um elefante morto a cada 15 minutos. Para agravar a situação, as alterações climáticas afetam já a biodiversidade no continente, questão que continua a não ser alvo da devida atenção internacional.

desenvolvimento de regiões mais afasta-das dos grandes centros. O facto de poder ser explorada, em muitos casos, com pe-quenos investimentos, facilita a sua explo-ração por núcleos familiares, nomeada-mente em locais rurais.

Segundo um estudo da Associação In-ternacional de Turismo Alimentar (WFTA), o valor acrescentado de uma es-tratégia de turismo alimentar aumenta a chegada de turistas e o dinheiro despendido por estes, adiantando a WFTA que apenas 8,1% dos entrevistados num inquérito valo-rizam a comida gourmet, o que facilita os investimentos em comida local, simples, em que se privilegia os pratos regionais e o res-petivo saber fazer das pessoas.

De facto, a expansão da indústria tu-rística tem trazido com ela novas estraté-gias para captar visitantes e o turismo de nichos começa a ter expressão. O turismo gastronómico, mas também o turismo aventura, o turismo rural, o turismo para a diáspora ou o crescente turismo de saú-

Após décadas em que se privilegiavam as caçadas, hoje as máquinas fotográficas e os binóculos dominam as savanas

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próxima grande fronteira do turismo mundial». A frase chega-nos através das pági-

nas do jornal britânico The Guardian, e espelha as potencialidades de Angola, mas também a aposta que o Governo tem feito nos últimos anos no setor. A reportagem sobre o país e o seu turismo salientou como área de referência o turismo de natu-reza, mas também a pesca desportiva ou o golfe. Os jornalistas britânicos partiram à descoberta do rio Kwanza, «longe da agita-ção da capital», explorando também o Parque Nacional da Kissama, localizado a 75 quilómetros de Luanda, e onde é possí-vel encontrar elefantes, girafas, gnus ou macacos.

As referências elogiosas do The Guar-dian dificilmente poderiam ter sido escri-tas há uns anos, quando o país se encontra-va em guerra civil. Com a paz veio a construção de novas infraestruturas, como aeroportos, a reabertura de linhas de cami-nho-de-ferro, a melhoria das estradas, a edificação de unidades hoteleiras, novas unidades de ensino e a melhoria da restau-ração. A qualidade de vida das populações melhorou de forma substancial e, conse-quentemente, a capacidade de Angola para desenvolver a área turística. O país abriu--se a si próprio e ao mundo.

O número de turistas tem aumentado nos últimos anos e a aposta do Governo

passa por chegar aos 4,6 milhões de entra-das em 2020, o que representará 3% do Produto Interno Bruto (PIB), contra os atuais 0,34%. O aumento de visitantes tem sido galopante desde o início do sécu-lo. Em 1999, o seu número não ultrapas-sou os 45 mil, em 2003 pouco passou dos cem mil (106.625) e em 2004 chegou aos 194 mil. No ano passado, o número mais do que triplicou em relação há dez anos somando 650 mil turistas.

Segundo os últimos dados do Ministé-rio da Economia, o país conta atualmente com 183 hotéis e 88 aldeamentos, num total de 17.885 camas. Números bem dis-tantes dos verificados no final da época colonial, quando apenas existiam 57 uni-dades hoteleiras e um número de camas que não chegava às quatro mil.

«O turismo em Angola registou um crescimento significativo nunca antes vis-to, mesmo durante o período colonial». As palavras são de Eugénio Clemente, diretor--geral do Instituto de Fomento Turístico de Angola (INFOTUR), que realça: «Em 12 anos de paz foram construídos 96 ho-téis, 188 pensões e 160 agências de viagens nas 18 províncias, além de outros serviços que estão associados à indústria». Mas na sua opinião é necessário fazer mais: «É preciso articular outros setores de produ-ção nacional de forma a reduzir os custos de alguns serviços».

De facto, além da necessária construção de algumas infraestruturas e da melhoria de outras, os elevados custos de alguma da oferta são um entrave ao desenvolvimento do turismo, nomeadamente do interno, que representa dois terços do movimento de turistas no país. Luanda é das cidades mais caras do mundo e a hotelaria tem ainda preços muito elevados se comparada com outros mercados.

De acordo com o Plano Diretor do Turismo, o objetivo passa por explorar os países da Comunidade para o Desenvolvi-mento da África Austral (SADC), mas par-tir também para mercados mais globais, com especial atenção ao Reino Unido, França, Alemanha e Estados Unidos, além de Portugal, que continua a contribuir com um número significativo de turistas.

A forma como o país esteve presente na Bolsa de Turismo de Lisboa (BTL), realiza-da em fevereiro, demonstra a importância que o setor tem hoje na estratégia de desen-volvimento de Angola. Além de outros destinos, o pavilhão, um dos maiores do

O renascimento do turismo em Angola

Angola colocou o turismo como uma das prioridades na sua estratégia para diversificar a economia. O setor emprega hoje mais de 200 mil pessoas e movimentou dois mil milhões de dólares em 2014. O país recebeu cerca de 600 mil turistas no ano passado, mas a aposta do Executivo passa por atrair 4,6 milhões em 2020, o que significará 3% do Produto Interno Bruto.

«A

A estratégia para captação de turistas passa pela valorização das belezas naturais do país

Baía de Luanda

O TURISMO EM ÁFRICA

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certame, divulgou as suas Sete Maravilhas Naturais, recentemente eleitas. As Quedas de Calandula (Malanje), a Floresta de Maiombe (Cabinda), a Lagoa do Carumbo (Lunda Norte), as Grutas do Nzenzo (Uíge), o Morro do Moco (Huambo), as Quedas do rio Chiumbe (Lunda Sul) e a Fenda da Tundavala (Huíla) representa-ram, desta forma, as belezas naturais do país. O pavilhão destacava ainda as Quedas de Mupa (Huambo) e do Binga (Cuanza Sul), a Serra da Leba (Namibe), assim como as Pedras de Pungo Andongo e o Parque Nacional de Cangandala (ambos em Ma-lanje), além de aspetos relacionados com a sua história, cultura e tradições. Uma decla-rada aposta no turismo de natureza.

Como forma de afirmação do setor, o INFOTUR assumiu uma estratégia de esta-belecimento de parcerias com entidades es-trangeiras. As diretrizes estão no Plano Na-cional de Desenvolvimento do Turismo, aprovado em 2011, e passam pela formação adequada de recursos humanos. «Com as parcerias, o Instituto de Fomento Turístico de Angola pretende elevar as competências dos gestores e acabar com o grande número de gestores estrangeiros», afirmou Eugénio Clemente.

O interesse das companhias de aviação«Angola é um destino que começa a dar passos na indústria turística e que hoje já possui infraestruturas que nos garantem

qualidade e bons momentos de lazer», afir-ma António Cruz, da agência Abreu, uma das marcas de referência do setor em Portu-gal, um dos principais mercados emissores de turistas para o país.

O recente interesse das próprias compa-nhias de aviação apresenta-se como mais um fator demonstrativo do despertar de Angola em termos internacionais. É certo que parte da viabilidade das novas rotas é fruto da circulação de empresários e traba-lhadores, mas os turistas começam a ganhar espaço nos aviões. Qatar Aiways, Turkish Airlines e Singapore Airlines são três com-panhias que manifestaram recentemente interesse em voar para Luanda, onde já operam, entre outras, a South African Airli-nes, Air Namibia, Ethiopian Airlines, TAP (Portugal), Air France, British Airlines,

Para o britânico The Guardian, Angola é a próxima grande fronteira do turismo mundial

KLM (Holanda), Lufthansa (Alemanha), Iberia (Espanha), Brussels Airlines (Bélgica) e Fly Emirates (Arábia Saudita).

Uma das áreas ainda por explorar, mas a que o Executivo tem dado atenção, é a dos navios de cruzeiro, que têm gra-dualmente vindo a aumentar as suas pas-sagens pelo país, embora tal esteja depen-dente da melhoria das condições de acolhimento dos navios nos portos nacio-nais e da capacidade de atração junto das companhias privadas.

Certa é a aposta no importante mer-cado do turismo interno, como afirmou recentemente Pedro Mutindi, ministro da Hotelaria e Turismo à imprensa: «Es-tamos convencidos que podemos imple-mentar um verdadeiro programa de turis-mo interno e turismo social, capaz de criar mobilidade turística interna, por via de programas de excursionismo, carava-nismo e de campismo».

Miguel Correia

DR

DR

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30 abril 2015 – África21

aumento do iva e a introdução da taxa turística foram fatores determinantes para a queda do

setor considerado o motor da economia cabo-verdiana. Depois de um 2013 auspi-cioso, com o arquipélago a ser classificado pelo Índice de Competitividade de Via-gens e Turismo anual como o país africano a registar o maior aumento de chegadas de turistas internacionais, com um acrésci-mo de 27%, colocando-o no primeiro lugar enquanto destino turístico entre os PALOP, terceiro na CPLP e quarto na região da África Subsariana, em 2014 o fluxo turístico abrandou. Ainda assim, não começou mal, já que até junho o número de hóspedes que deu entrada nos estabele-cimentos hoteleiros aumentou 4,3%, comparado com o mesmo período do ano anterior.

Mas foi a partir do segundo semestre que o canário se inverteu significativamen-te. A queda foi de tal forma acentuada que agravou as contas externas, de acordo com o último relatório de 2014 do Banco de Cabo Verde (BCV) sobre os Indicadores Económicos e Financeiros. Além dos fato-res apontados, o relatório fez saber que a concorrência de mercados próximos teve igualmente um peso na queda do fluxo turístico no arquipélago. Segundo o Ban-co Central, os mercados considerados concorrentes de Cabo Verde, nomeada-mente Tunísia e Egito, entraram em pro-cesso de franca recuperação e lançaram-se numa forte campanha de promoção, uma disputa que o país não pôde acompanhar devido aos custos mais elevados «agrava-dos pela harmonização e alargamento da base de incidência do Imposto sobre o

Valor Acrescentado (IVA), bem como pela introdução da taxa turística».

Sinais de retomaOs novos investimentos para as ilhas do Sal e da Boa Vista – consideradas as duas ilhas mais procuradas pelos turistas – demons-tram a retoma da confiança no mercado turístico-imobiliário e anima as autoridades nacionais.

O Mélia Dunas Beach Resort & Spa, da holding inglesa The Resort Group, inau-gurado em outubro de 2014, o lançamento da primeira pedra para a construção do Hotel Hilton, a construção do Lhana Beach Hotel, do grupo Meliá Hotels Internatio-nal, todos no Sal, o anúncio, por parte da Sociedade de Desenvolvimento Turístico das Ilhas de Boa Vista e Maio (SDTIBM) de dois novos projetos a arrancarem no se-gundo semestre deste ano são sinais que para o chefe do governo cabo-verdiano, José Maria Neves, representam «uma clara reto-ma de investimentos turísticos em Cabo Verde» e um «aumento de confiança por parte dos investidores».

«Isto é importante para Cabo Verde, para o crescimento da nossa economia e importante para a geração de empregos. Na medida em que tivermos mais hotéis,

mais resorts, teremos mais possibilidades de gerar mais empregos, particularmente para os jovens cabo-verdianos. Os dados aqui apresentados mostram que vamos ter mais 700 empregos, aspeto importante, já que a Escola de Hotelaria e Turismo de Cabo Verde e a Direção-Geral do Turismo vão colaborar com o The Resort Group na formação de jovens cabo-verdianos para ingressarem no mercado de trabalho», res-salvou Neves.

Relativamente aos investimentos para o Sal, trata-se de projetos que, de acordo com José Maria Neves, irão ter um signifi-cativo impacto no contexto socioeconómi-co da ilha. Só o Mélia Dunas Beach Resort, o maior hotel-resort construído em Cabo Verde, e orçado em aproximadamente 127 milhões de dólares, tem capacidade para receber à volta de 100 mil turistas por ano e emprega 700 funcionários, na sua maio-ria nacionais, o que representa uma massa salarial de cerca de 6 milhões de dólares. Além disso, anualmente deve receber em média 86 mil turistas, alcançando um vo-lume de negócios de 48 milhões de dóla-res, fazendo com que o Estado de Cabo Verde arrecade perto de 20 milhões de dólares em receitas.

Cabo Verde quer continuar a crescerDepois de um 2014 em queda, o turismo no arquipélago começa a dar sinais de retoma com o anúncio de novos projetos

Cabo Verde ocupa o primeiro lugar no destino turístico nos PALOP, é o terceiro na CPLP e o quarto na África Subsariana

O

DR

Ilha da Boa Vista

O TURISMO EM ÁFRICA

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África21– abril 2015 31

No caso da Boa Vista, a SDTIBM afiança que dois novos projetos a arrancar este ano representam um acréscimo de 1500 quartos e investimentos estimados em 42 milhões de dólares. O presidente do conselho de administração daquela insti-tuição, Avelino Bonifácio, revela que a SDTIBM espera ainda fechar acordos para mais dois ou três novos projetos, «que deve-rão arrancar, provavelmente em 2016, re-presentando mais de mil novos quartos e investimentos que poderão oscilar entre 42 a 53 milhões de dólares». Bonifácio não avança com os nomes dos investidores, mas sabe-se que um forte grupo hoteleiro, o Summerset Continental, do Dubai, está interessado em investir num hotel de alto standard com 149 quartos na Praia de Cha-ve, considerada uma das áreas privilegiadas para investimentos turísticos. Quanto à ilha do Maio, Bonifácio prevê que com a cons-trução de um porto de longo curso e do ae-roporto internacional, poderão arrancar um ou dois investimentos ainda este ano e mais dois em 2016.

Ainda assim, o presidente da Câmara do Turismo de Cabo Verde (UNOTUR) defende que o arquipélago deve deixar de apostar apenas no turismo de sol e praia,

passando a optar por um modelo multiface-tado. Gualberto do Rosário considera que o modelo atual do turismo é «volátil, de baixo valor acrescentado e altamente concentrado num único operador que detém 70% da quota do mercado». E sugere que, face a cenários promissores do crescimento sus-tentado do turismo no horizonte de 2030, o arquipélago mude de enfoque e integre na sua oferta turística a história, a cultura e a natureza. Para o presidente da UNOTUR será este o modelo que vai permitir a Cabo Verde ter uma imagem de marca, e fazer com que o seu turismo seja conhecido pela singularidade e genuinidade daquilo que oferece. Paralelamente, defende que este novo modelo que propõe tenha como pila-res um Estado promotor, regulador e par-ceiro que aposte efetivamente na promoção da iniciativa empresarial endógena.

Turismo de cruzeiro Um segmento do turismo cabo-verdiano em desenvolvimento é o do turismo de cruzeiro que regista um expressivo aumento desde 2013. De acordo com os dados apre-sentados pelo Plano Estratégico do Turismo de Cruzeiro, o ano de 2013 apresentou va-lores superiores aos esperados para o turis-mo de cruzeiros do país, com um cresci-mento de 111% face a 2012 no que respeita ao número de passageiros. Nesse ano, este segmento cresceu em todos os portos de Cabo Verde, com um aumento de 96% de navios e 98% de passageiros, representando um total de 75 mil visitantes. Já em 2014, dados da Empresa Nacional de Portos de Cabo Verde (Enapor) indicam que os dife-rentes portos do arquipélago foram escala para 157 navios de cruzeiro, que trouxeram de janeiro a maio mais de 45 mil turistas. Porto Grande, na ilha de São Vicente, con-tinua a liderar os indicadores de turismo de cruzeiros do país, mas nos últimos anos tem visto reduzir-se o seu peso no total, devido ao aumento de tráfego nas restantes ilhas, nomeadamente as de Santiago e Santo Antão.

nataCha Mosso

O turismo de cruzeiro no arquipélago tem registado um expressivo aumento desde 2013

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32 abril 2015 – África21

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África21– abril 2015 33

orçamento de 2015 revisto, em função da queda do preço do petróleo no mercado inter-

nacional, foi aprovado a 19 de março, com os votos favoráveis não só do MPLA, partido no poder, mas também da oposi-cionista FNLA. Os outros três partidos da oposição com assento na Assembleia Nacional (UNITA, CASA-CE e PRS), previsivelmente, votaram contra.

Espera-se, assim, que a partir de abril os ministérios e outros órgãos do Estado

retomem os contratos que forem mantidos com as empresas privadas, voltando a pôr a economia a funcionar. Até ao mês passado, esses órgãos apenas receberam fundos para pagar aos seus funcionários e outras despe-sas correntes. O Estado é o maior cliente do país, o que torna o setor privado larga-mente dependente dos contratos públicos. Como a África21 noticiou na edição an-terior, todos os ministérios foram orienta-dos para reduzir cerca de 60% desses con-tratos, devido aos cortes orçamentais.

Uma preocupação particular dos empresários é saber quando e como se-rão pagas as dívidas em atraso. Aproxi-madamente desde setembro do ano pas-sado, várias companhias deixaram de receber quaisquer pagamentos, o que afeta sobretudo as pequenas e médias empresas. Algumas delas já esgotaram as suas reservas, não pagando salários desde o início deste ano. De igual modo, estão sem condições de honrar os seus com-promissos fiscais e laborais.

angola

Economia à espera do Estado

Agora que o orçamento de 2015 revisto foi aprovado pelos parlamentares, espera-se que a economia retome o seu funcionamento normal, embora todos os atores tenham de ajustar-se aos profundos cortes adotados

Carlos severino

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OPequenos e médios empresários clamam pelos pagamentos do Estado para saírem do sufoco

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34 abril 2015 – África21

A África21 quis saber junto do Mi-nistério das Finanças quando é que essas dívidas começarão a ser pagas. Para isso, contactou por email o Gabinete de Comu-nicação e Imagem do referido organismo, no passado dia 23 de março, mas até ao fecho da presente edição não recebeu qualquer resposta, nem sequer a acusar a receção do email.

Contenção e especulaçãoEm 2 de março, o Diário da República publicou as medidas adotadas pelo Gover-no para enfrentar a atual crise financeira. As mesmas foram agrupadas em quatro ti-pos de ações: conjunturais, estruturais, ad-ministrativas e metodológicas e políticas e diplomáticas.

Entre as medidas conjunturais, e além da revisão do orçamento, já consumada, destacam-se ainda a manutenção da estabi-lidade geral dos preços, o controlo das re-servas internacionais de maneira a cobrir no mínimo cinco meses de importações, a diminuição da despesa pública, a garantia do funcionamento normal da administra-ção pública, saúde, educação, assistência e proteção social, forças armadas e serviços de segurança, a manutenção de recursos para realizar 54 programas de caráter social e, finalmente, o aumento das receitas não petrolíferas em 900 milhões de dólares.

No plano estrutural, as medidas anticri-se contemplam a manutenção do ritmo de crescimento da economia e o aceleramento da diversificação económica. Relativamente ao primeiro objetivo, as autoridades esti-mam ser possível um crescimento de 6%, ao contrário da maioria dos organismos in-ternacionais, que o situam entre os 2% e os 4%. Quanto à diversificação económica, é de realçar a mobilização de fundos internos e externos para apoiar «projetos empresa-riais privados dirigidos» em setores produti-vos não petrolíferos (agricultura, pescas, in-

BNA liberaliza importação de divisas para aliviar pressão

dústria, comércio, transportes e logística, e hotelaria e turismo).

As medidas preveem também ações no domínio externo, em especial a busca de novos financiamentos e a renegociação dos atuais acordos de dívida. Espera-se que isso, aliado à comercialização interna de títulos do Tesouro, já em curso, possibilite a cobertura do défice orçamental, fixado em 7% do Produto Interno Bruto (PIB).

De destacar, ainda, o reconhecimento, por parte das autoridades, da necessidade de incluir no pacote de medidas para fazer face à crise «uma campanha de marketing e es-clarecimento». Contudo, até agora, nada indica que essa campanha esteja em anda-mento e, caso esteja, os seus resultados não são visíveis. Assim, persiste entre os analistas e os agentes económicos, sobretudo, um clima de insegurança e pessimismo, gerador de fenómenos e comportamentos que po-dem agravar a crise, em vez de reduzi-la.

Um desses fenómenos é o aumento da especulação cambial no mercado negro. Com efeito, o dólar na rua desvalorizou-se cerca de 50% em três meses (janeiro a março). Rumores não confirmados apon-tam para o suposto envolvimento de fun-cionários e responsáveis de bancos comer-ciais nessa ação. O Banco Nacional de Angola (BNA), questionado por esta revis-ta, diz desconhecer qualquer envolvimento de funcionários bancários no mercado ne-gro de divisas, mas pede a quem souber de quaisquer factos que o comprovem que os denunciem aos órgãos competentes.

O Gabinete de Comunicação e Ima-gem do BNA escreveu o seguinte, em

email dirigido à África21: «O BNA tem o controlo da emissão monetária em kwan-zas, por ser o banco emissor da moeda na-cional, mas não tem o controlo das divisas que circulam no mercado paralelo, por-que, primeiro, não é o banco emissor des-sas divisas e, segundo, não é sua função controlar as divisas que cada indivíduo possui. As divisas entram no país por várias fontes e tendem a cambiar-se no mercado paralelo porque existe de facto uma opor-tunidade de ganho».

Comunicação do Governo sobre a crise parece incapaz de conter onda pessimista

Acrescenta a referida fonte: «O BNA não tem conhecimento de práticas fraudu-lentas por parte de funcionários de bancos comerciais que possam estar a injetar dóla-res no mercado paralelo a partir de divisas que os bancos adquirem no mercado ofi-cial. Entretanto, o BNA não exclui a possi-bilidade da existência de tais práticas que lesam os interesses nacionais e afetam ne-gativamente a economia e solicita, por isso, a quem tiver conhecimento e estiver em posse de provas efetivas de tais práticas que as denuncie junto das autoridades poli-ciais, em particular a polícia económica».

De notar que, em março, a diferença entre a taxa de câmbio oficial e a do parale-lo acentuou-se um pouco mais, sobretudo em Luanda, pois, por um lado, o BNA realizou menos leilões de divisas e, por ou-tro, as divisas vendidas foram priorizadas para as importações e não para as necessi-dades dos particulares (férias, estudos, saú-de, etc.). Entretanto, o banco central acaba de liberalizar a importação de divisas por parte dos bancos comerciais, o que, espera--se, pode aliviar um pouco a atual pressão sobre as mesmas.

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África21– abril 2015 35 África21– DEZ 2014 / JAN 2015 73

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36 abril 2015 – África21

crónica da terra

Políticas públicas e igualdade de oportunidades

rata-se de um dos raros espaços de estudo e reflexão pluralista onde, com elevada qualida-

de, cristãos e não-cristãos debatem temas socialmente relevantes que possam concorrer para a tomada de consciência de responsabilidades sociais – e políticas, acrescento eu – para a colaboração institucional em busca de um futuro melhor.

A edição deste ano teve como pano de fundo a igualdade de oportunidades. Como foi dito, não se deve dar de favor, como é recorrente em Angola por parte do governo a todos os níveis, o que é devido por justiça. Daí a importância do entendimento do conceito de «igualdade de oportunidades» para o qual foi muito importante a apresentação de um texto do professor Alfredo Bruto da Costa. Este prestigiado professor universitário português foi ministro dos Assuntos Sociais do governo de Maria de Lourdes Pintassilgo (final dos anos 70), membro do Conselho dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais do Conselho da Europa e atualmente in-tegra o Conselho de Estado em Portugal. Infeliz-mente, por motivos de saúde, não pôde estar pre-sente para apresentar o texto de viva voz.

Hoje é pacífica a ideia de que o conceito de de-senvolvimento inclui não apenas o crescimento, mas também a distribuição, e parece haver cada vez mais interesse por parte de estudiosos e de agências internacionais, como o Banco Mundial, pela ques-tão da desigualdade, principalmente de rendimen-tos. A distância entre ricos e pobres, em quase todos os países, tem-se alargado nas últimas décadas. Num relatório divulgado em janeiro, a OXFAM previa que, ao ritmo atual, 2016 poderá ser o ano em que a riqueza de 1% da população mundial poderá ultrapassar a acumulada pelos outros 99%.

Mas é igualmente importante aprofundar a compreensão da desigualdade. Bruto da Costa socor-re-se também do Banco Mundial (Relatório sobre o Desenvolvimento Mundial, de 2006) para argumentar que oportunidades desiguais conduzem a resultados desiguais e reforçam o poder político desigual, e este, por sua vez, modela instituições e políticas que ten-dem a promover a persistência das condições iniciais, ou seja, a bloquear a mobilidade social.

Estratégia de reconciliação e reconstruçãoEstas considerações vão ao encontro das minhas reflexões sobre a situação da desigualdade e das po-líticas públicas que o Executivo angolano tem ado-tado desde 2002.

Apesar de parecer repetitivo dizê-lo, a paz repre-sentou uma excelente oportunidade para desenho e concretização de um projeto nacional inclusivo, que acabou por se perder porque a estratégia de reconci-liação e reconstrução adotada foi errada – e há muita gente que concorda comigo com base em argumentos muito sólidos.

Inicialmente, as coisas pareciam bem delinea-das. Acreditou-se que seria possível encontrar um razoável equilíbrio entre direitos políticos e cívi-cos, por um lado, e direitos económicos e sociais, por outro, que tem sido crucial nos países com sucesso em matéria de democracia e desenvolvi-mento. Porém, algumas mudanças no contexto provocaram uma inflexão que resulta numa sucessão de equívocos que estão a conduzir o país para uma situação social, e mais tarde política, difícil de sus-tentar. Entre tais mudanças, não pode deixar de ser destacada o aumento da produção de petróleo em paralelo com a subida do preço no mercado

Fernando Pacheco é ocoordenador do OPSA

Desde 1999, a CEAST – Conferência Episcopal de Angola e S. Tomé e o Mo-saiko – Instituto para a Cidadania, duas das instituições mais credíveis do país, ambas ligadas à Igreja Católica, têm vindo a organizar quadrienalmente, com notável regularidade, o que é conhecido por Semana Social Nacional.

fernando PaCheCo

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África21– abril 2015 37

internacional, que aceleraram sintomas e os efeitos da chamada doença holandesa.

O partido no poder elaborou uma agenda na-cional de consenso que, apesar de pouco consen-sual, poderia ter representado uma base minima-lista de entendimento, mas rapidamente ela desapareceu do léxico político. A partir dessa altu-ra, passou-se à confrontação e à redução de todos os espaços pluralistas. A atividade da sociedade ci-vil que sobreviveu tem vindo a ser fortemente condicionada. A comunicação social pública está ao serviço do partido no poder e a privada pratica-mente nas mãos de grupos direta ou indiretamente ligados a esse partido.

A estratégia adotada subalternizou o reforço das capacidades individuais e institucionais, sobrevalo-rizou a construção de infraestruturas e alimentou a corrupção. Não foi, claramente, o melhor caminho para se conseguir uma acumulação primitiva do capital mais abrangente e equilibrada.

Regresso ao texto de Bruto da Costa e para aquilo que ele sublinha com base no relatório do Banco Mundial referido. Primeiro, os diferentes ti-pos de desigualdade (políticas, económicas e socio-culturais) interagem entre si e isso modela as insti-tuições e as regras da sociedade. Segundo, o funcionamento das instituições afeta as oportunida-des e a capacidade de prosperar das pessoas. Tercei-ro, a desigualdade de oportunidades económicas reforça o poder político desigual, que, como se viu, modela instituições e políticas que bloqueiam a mobilidade social, pois tendem a promover a persis-tência das condições iniciais.

Daí a pertinência da citação do Papa Francisco no Gáudio do Evangelho, utilizada pelo professor

Bruto da Costa: «Enquanto não forem radicalmen-te solucionados os problemas dos pobres, renun-ciando à autonomia absoluta dos mercados e da es-peculação financeira e atacando as causas estruturais da desigualdade social, não se resolverão os proble-mas do mundo e, em definitivo, problema algum. A desigualdade é a raiz dos males sociais».

No caso angolano, tudo isto se aplica, pelo me-nos com muita frequência, aos membros de partidos da oposição, aos empresários que não são militantes do partido no poder e às organizações da sociedade civil que se reclamam independentes do poder cons-tituído. E aplica-se também a crianças de um muni-cípio qualquer do interior que, para além de terem péssimos professores, por vezes não vão à escola por não terem agasalho ou roupa que as proteja da chuva, como pessoalmente pude constatar. Tais crianças não terão as mesmas condições de partida, nem as mesmas oportunidades que terão as da mesma idade que frequentam o novo e caríssimo Colégio Angola-no de Talatona.

Também penso nisso ao constatar a dificulda-de dos apoiantes do Executivo em lidar com as críticas. O trabalho de académicos sérios que estu-dam Angola e concluem que a política de recons-trução do Executivo poderia ser mais assertiva, não pode ser confundido com «politiquice» barata, que leva jornalistas e por vezes intelectuais de re-nome a associarem imediatamente, de acordo com a teoria da conspiração tão do agrado desse tipo de pessoas, tais académicos a figuras e acontecimen-tos do passado, que tendem a ter cada vez menos importância para a solução dos novos problemas do país. Para bem de todos, é preciso sair com ur-gência deste patamar.

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Há crianças que não vão à escola por não terem agasalho ou roupa que as proteja da chuva, como pessoalmente pude constatar

A comunicação social pública angolana está ao serviço do partido no poder e a privada praticamente nas mãos de grupos direta ou indiretamente ligados a esse partido

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38 abril 2015 – África21

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África21– abril 2015 39

doramos slogans, comprazemo-nos com eles. Por isso, eles vão mudando, conforme as modas

ou conforme o entendimento do chefe. Os últimos foram «O resgate dos valores morais» e «Contra a vio-lência doméstica». Antes houve «A municipalização» disto e daquilo. Sem que se visse qualquer alteração da situação, em qualquer dos casos.

O mais interessante talvez tenha sido o do «resgate dos valores morais», apanhado de um discurso do Presidente da República, o qual nunca é citado as-sim, simplesmente, mas com todos os títulos e nomes, começando por Sua Excelência. Nessa fase do «resgate» chegou a haver seminários, reuniões por todo o lado, palestras, entrevistas a sociólogos, sacerdotes, psicólogos, polí-ticos. Meses a fio. A única vantagem que vejo nessa campanha durando mais de um ano foi que hoje as diferentes jotas devem ter vergonha de repetir as «maratonas» (como chamavam então) rega-das a cerveja quase de borla, nacional ou estrangeira, para arregimentarem seguidores para comícios políti-cos das suas cores. Como uma das necessidades do «resgate» era combater a tremenda onda de alcoolis-mo grassando na juventude (e não só), hoje fica mal promover uma maratona dessas. Infelizmente tam-bém não há das outras, onde se corre, o que seria bom para a saúde pública.

Atualmente, por causa do há muito anunciado abatimento do preço do petróleo, voltou-se a um an-tigo «Diversificar a Economia», vindo dos tempos da independência. De vez em quando aparecia em al-gum discurso, sempre orientador, mas esquecido no momento dos canapés e bebidas. Agora veio para ficar e se espalhar mais depressa que um vírus. E não dis-cordo, tem de se recorrer a ele, mesmo a sério. Desta vez vai para lá do discurso, esperamos, com a nossa habitual capacidade de acreditar.

Ultrapassou o texto oficial e os editoriais de ór-gãos de informação para entrar na entrevista econó-mica e não económica, conversas de quintal, discus-sões nos candongueiros, até mesmo numa aula qualquer. Aconteceu na inauguração de uma escola primária num kimbo, em que o responsável que cor-tou a fitinha (ah, as fitinhas!) logo proclamou que

aquela escola era um exemplo de como se diversificava a economia. Fiquei quase catatónico e até hoje não compreendi onde o discursante queria chegar. Aposto que ele também não. Comigo alguns milhares que ainda prestam atenção à propaganda, tentando deci-frar a notícia aí escondida. Vai acontecer em breve

quando houver um jogo de futebol importante, será um acontecimento de diversificar a economia, claro.

O slogan funciona pois como um gancho. Daqueles de alpinista, que se atira na esperança de apanhar alguma rocha que trave a queda iminente. É o gancho do discurso. Se alguém não sabe como terminar uma fala, a parte mais difícil sendo o final, como todos sabemos, atira-se o gancho. O de agora é «diversificar a economia». Permite

mais umas frases que milhares repetiram antes de nós, mas não faz mal, o que interessa é parecer de palavra fácil, pois ninguém já escuta o sentido das palavras.

No entanto, há gente criativa. Assim acontece com o meu amigo Laurindo, amputado de uma per-na, que vive de pedir esmola num semáforo da cidade. Sempre que sou obrigado a parar no sinal, dou-lhe uma nota de 100 kwanzas. Ontem, ele disse, temos de diversificar, mano. Diversifica-me masé aí 200 kwan-zas. Já estava o sinal verde mas procurei o correspon-dente para lhe dar. O Laurindo está cheio de razão, diversificar é apenas outra forma de dizer «atualiza o discurso». Porque os 200 que lhe dei ontem signifi-cam os 100 que lhe dava há anos, com o custo de vida a disparar. Tudo sempre por causa da crise.

Os ganchos, esses, estão para ficar.

A crónica de Pepetela

Diversificar ou atualizar?A

O Laurindo está cheio de razão, diversificar é apenas outra forma de dizer «atualiza o discurso»

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40 abril 2015 – África21

moçambique

s primeiras horas da manhã do dia 3 de março, em que viria a ser morto a tiro, Gilles Cistac (53

anos) cumpria um hábito diário: pequeno--almoço tomado no restaurante ABFC, na interseção da Av. dos Mártires da Machava com a Av. Eduardo Mondlane, dentro da chamada zona nobre da capital moçambi-cana. Um táxi descaracterizado esperava-o à porta. A próxima paragem seria na Pro-curadoria da República da Cidade de Ma-puto, onde o académico ia dar seguimento à queixa-crime que tinha formalizado, dias antes, contra um desconhecido, que na rede social Facebook usava o pseudónimo «Calado Calachinicov».

«Dos mesmos comentaristas já senti sinais de intolerância política, académica e, até, de racismo. Ignorei-os. Agora, apare-cem a acusar-me da prática de atos crimi-nosos. Acho que já basta», declarou, a pro-pósito da queixa, Gilles Cistac ao semanário Savana (editado em Maputo), naquela que foi a sua última entrevista a um órgão de comunicação social.

Na sua conta pessoal, entretanto desa-tivada, «Calado Calachinicov» publicou um texto em que acusava Cistac de ter ob-tido a nacionalidade moçambicana, em 2010, de forma fraudulenta, sublinhando

que os pronunciamentos públicos do inves-tigador favoráveis à pretensão da Renamo, o maior partido da oposição, de criar pro-víncias autónomas visavam instigar a vio-lência e a divisão do país.

Na sequência das eleições gerais em15 de outubro e depois de ter visto rejeitados todos os pedidos de anulação dos resulta-dos, que alega serem fraudulentos, Afonso Dhlakama, líder da Renamo, iniciou uma espécie de campanha pós-eleitoral pelas províncias em que obteve melhores resulta-dos do que o candidato presidencial da Frelimo, Filipe Nyusi. Perante multidões, Dhlakama começou por exigir a criação de regiões autónomas nas províncias em que saiu vencedor, o que vários políticos e ana-listas ligados à Frelimo, no poder há 40 anos, defendiam ser inconstitucional.

Com aparente indiferença a esta pre-tensão da Renamo, uma vez que não se lhe conhecem ligações a este partido, Gilles Cistac atrairia a atenção dos meios de co-municação social ao afirmar que a exigência seria constitucional, desde que substituída pela designação de «províncias autóno-mas», numa opinião que fundamentava com os artigos sobre a categoria das autar-quias locais. Na prática, o constitucionalis-ta entendia que a transformação das pro-

víncias em autarquias locais não impunha alterações na Constituição moçambicana. Se na calada muitos o criticaram por esta posição, outros tantos, como o porta-voz da Frelimo, Damião José, não se abstive-ram de o fazer em público. «Será que o académico Cistac, se estivesse na Argélia ou na França, teria a coragem de assumir a postura que tem estado a assumir, que é uma ofensa e desafio aberto à vontade do povo moçambicano?», questionou Damião José, durante uma conferência de impren-sa, no final de fevereiro.

Ao estilo de Al CaponeNaquela terça-feira, o taxista de Gilles Cistac não o esperava sozinho. Dentro de um carro, quatro homens aguardavam que o académico entrasse no táxi. Assim que o fez, o som dos disparos de uma metralhadora automática ecoou pela ave-nida que homenageia o primeiro presi-dente da Frelimo. Cistac ainda consegue sair do banco traseiro do carro, mas acaba

GILLES CISTAC

O misterioso homicídio de um “mártir da liberdade”

Mais do que um ataque dirigido a Gilles Cistac, o assassínio do constitucionalista franco-moçambicano

foi interpretado pela opinião pública como uma ofensiva contra a liberdade de expressão em Moçambique

eManuel novais Pereira MAPUTO

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por desfalecer na rua, rolando em agonia até se imobilizar de bruços. Uma mancha de sangue alastra-se nas costas da camisa de tom bege que veste. Captada com um telemóvel, a imagem difunde-se vertigi-nosamente pelas redes sociais e há de ser destacada na capa de grande parte dos jornais do dia seguinte.

Três quarteirões separam o restauran-te ABFC do Hospital Central de Mapu-to, mas o constitucionalista só seria leva-do para a unidade de saúde 40 minutos depois do atentado, na mesma altura em que a polícia chega ao local. À porta do bloco operatório do hospital afluem ami-gos, académicos, representantes de orga-nizações da sociedade civil, políticos de partidos da oposição, jornalistas. As pri-meiras teorias sobre as razões do ataque começam-se a formar e, com maior ou menor emotividade, todas parecem con-vergir: este foi um crime motivado pela opinião de Cistac favorável à criação das províncias autónomas.

Em diferido, os testemunhos recolhi-dos pelos jornalistas vão entrando nos no-ticiários da hora de almoço das televisões moçambicanas. Na estação privada STV, um advogado comenta em estúdio o aten-tado e estabelece uma relação com as decla-rações do bastonário da Ordem dos Advo-gados de Moçambique, Tomás Timbane, que, no dia anterior, durante a cerimónia de Abertura do Ano Judicial e perante o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, havia apontado duras críticas à atuação «arbitrária» das autoridades policiais, «um dos elos mais fracos do Estado».

De um Conselho de Ministros inter-rompido, chega a declaração titubeante do conselheiro António Gaspar, que condena «o ato macabro» em nome do Governo e apela aos clínicos para que «tudo façam para salvar a vida de um homem vítima de um ato sem justificação». O apelo será em vão e, quando é transmitido, já o diretor do HCB, João Fumane, declarara o óbito de Gilles Cistac, que «não resistiu», dada a «gravidade dos ferimentos e a grande quantidade de sangue que perdeu».

Os danos colaterais de uma execução pública Em catadupa, a condenação do homicídio chega de todos os quadrantes da sociedade: «crime bárbaro», «intolerância política», «voz da liberdade silenciada», «substituição do diálogo pela inteligência das balas», «vergonha nacional». Procuram-se culpa-dos e estabelece-se um padrão. São recor-dados os que perderam a vida em situações semelhantes, «em nome da liberdade», e à cabeça surge o caso do jornalista Carlos

“Já senti sinais de intolerância política, académica e até de racismo”, tinha declarado Gilles Cistac, dias antes, na entrevista ao Savana

Manifestação pacífica em Maputo reuniu centenas de pessoas no local onde Gilles Cistac sofreu o atentado

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Cardoso, morto a tiro, em 2000, não muito longe do local onde Cistac sofreu o atentado.

A polícia convoca a imprensa e declara que «os criminosos eram em número de quatro, sendo três de raça negra e um bran-co». Em alguns jornais, a versão é desmenti-da pelos testemunhos recolhidos pelos jor-nalistas no local: dentro do carro não seguia nenhum homem caucasiano. São também elencados os homicídios que ficaram sem culpados, o último dos quais do juiz Dinis Silica, baleado em 8 de maio de 2014, à luz do dia, junto a uma esquadra, em pleno centro da capital. A capacidade de investiga-ção da polícia é posta em causa.

Durante os dias seguintes, a contesta-ção chega às ruas, primeiro com uma ma-nifestação reprimida pela polícia antimo-tim na cidade da Beira, porque «não foi autorizada», depois com uma marcha pací-fica em Maputo, que termina a meio, também com a intervenção da Força de

Intervenção Rápida (FIR), porque a orga-nização não tinha autorização para a parte final do percurso.

Num contexto de protesto contra o alegado ataque à liberdade de expressão que se diz que a morte de Cistac represen-tou, a opinião pública serve-se destas inter-venções policiais para justificar a mensa-gem que alguém escreveu num cartaz e afixou à porta da Faculdade de Direito da Universidade Eduardo Mondlane, onde o académico lecionava: «Em Moçambique não existe liberdade de expressão».

Um homicídio por explicarEmbora a opinião de Gilles Cistac sobre a legalidade da criação das províncias autó-nomas possa ser entendida como contro-

versa, certo é que o próprio Presidente moçambicano sugeriu, durante o encontro com Afonso Dhlakama, em fevereiro, que a Renamo apresentasse a sua proposta ao Parlamento, para que fosse votada, o que, entretanto, o partido já fez. A votação de-verá acontecer durante o mês de abril e promete estar ladeada de um grande me-diatismo, decorrente da pressão e das ameaças de instabilidade que Dhlakama tem espalhado nos comícios populares que tem promovido na região Centro e Norte.

E é neste contexto, com a imagem do poder político inevitavelmente afetada pe-los estilhaços do homicídio, que uma per-gunta se forma em todos os círculos de opinião: a quem serviu a morte de Gilles Cistac?

Após as eleições de 15 de outubro, Afonso Dhlakama iniciou uma campanha pós-eleitoral pelas províncias onde obteve melhores resultados do que candidato presidencial da Frelimo, Filipe Nyusi

O constitucionalista entendia que a transformação das províncias em autarquias locais não impunha alterações na constituição moçambicana

Estudantes de Gilles Cistac conduziram a manifestação até à Faculdade de Direito, da UEM. A marcha seria depois reprimida pela FIR quando seguia para a Praça da Independência

A chegada de Rosimele Cistac, filha do académico (à esquerda), foi o momento mais emotivo da manifestação

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África21– abril 2015 43DÁ O SALTO EM SAPO.AO

Quando o SAPO dá o salto a internet dá o salto. Quando o SAPO dá o salto a tecnologia dá o salto. A informação dá o salto, o país dá o salto, o mundo dá o salto. O SAPO deu o salto para uma imagem mais moderna, mais simples de navegar e com novos conteúdos. Vamos todos dar o salto?

O SAPO DEU O SALTO.

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Uma República sem republicanos!

uma grande operação de marketing, o ex-Presidente Abdou Diouf, secretário-

-geral da Organização Internacional da Francofo-nia, aproveita a cimeira organizada em finais de novembro em Dakar para lançar o seu livro Mé-moires (Memórias), publicado pelas edições Seuil. Como se pode imaginar, tornou-se o tema do momento: uns achavam deselegante o momento escolhido para «vender», outros achavam bem que o autor tivesse feito coincidir o lançamento do li-vro com o fim do mandato na OIF e o fim da sua vida pública.

Rapidamente, a leitura de Mémoires mostrou a inutilidade desse debate, porque os senegaleses descobriram o carácter «elevado» do conteúdo do livro. Diouf, Presidente de 1981 a 2000, tratava mais de problemas pessoais (o que um ministro dizia sobre um outro, como X conseguiu seduzir a esposa de Y para casar com ela, etc.).

Porém, o autor revelou indiretamente que a sociedade senegalesa não tinha acabado com os velhos demónios da divisão social em castas. Sen-ghor, ao escolher Diouf como sucessor, deu-lhe três nomes como possíveis primeiros-ministros. Segundo Diouf, a esposa de Senghor, Colette, uma francesa de origem, pergunta ao marido por-que é que propôs os três; Senghor responde: «Co-lette, proponho-lhos porque eles nunca poderão criar-lhe problemas no sufrágio universal». Co-mentário de Diouf: «Colette conhecia bem a so-ciedade senegalesa e sabia que os três eram gente de baixa casta»! Será uma convicção de Diouf ou simplesmente uma constatação relativa às tradi-ções da sociedade senegalesa?

A sociedade senegalesa tradicional foi histori-camente regida por um sistema rígido de castas; grosso modo havia os aristocratas, as classes traba-lhadoras ou «castas» e os «escravos». Sob a autori-dade colonial, especialmente a da França com a

sua política de assimilação, a educação foi ofereci-da, e até imposta, aos detentores do poder tradi-cional com a instauração da «escola dos filhos de chefes». Na altura, muitos chefes recusavam man-dar os filhos à escola francesa por medo de com-promisso com o sistema estrangeiro e, no lugar dos filhos, eles enviavam os filhos dos subalternos. O resultado foi a formação de muitos jovens tidos como «castados». A sociedade tradicional não ti-nha nenhuma consideração pelas castas trabalha-doras (artesãos, pescadores, etc.), produtoras de riqueza e bases do bem-estar económico e social. O islão e o cristianismo não conseguiram pôr co-bro a essa divisão e acabaram por acomodar-se.

Muitos dramas foram vividos por causa desse problema de castas. Muitos estratagemas foram encontrados. Num contexto de «não ditos», os fi-lhos «de castas» viram-se obrigados a criar família, casando com estrangeiro(a)s ou pessoas de «sangue misturado» que não estavam condicionadas por esse tipo de consideração.

A escola pública, ao dar as mesmas oportuni-dades às crianças, visava apagar as «diferenças re-sultantes do nascimento». O lema do Senegal in-dependente traduz esse desejo de unidade de todos: «Um povo, um objetivo, uma fé».

Desde o derrube de Diouf, os demónios ador-meceram e despertaram recentemente com o dis-curso seguinte: «É um descendente de escravos. Os aldeões tiraram-no de lá... Os proprietários da fa-mília dele continuam vivos. Ele sabe que é escravo deles. Vocês, senegaleses, podem aceitá-lo como chefe, eu nunca aceitarei. O meu filho nunca aceitará. Em outras situações, tê-lo-ia vendido».

Estas palavras não datam de há séculos longín-quos, mas de 23 de fevereiro de 2015 (cf. os 15 diários senegaleses de 24 do mesmo mês) e foram proferidas pelo ex-Presidente Abdoulaye Wade, falando do atual presidente Macky Sall.

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Mallé Kassé é docente da Universidade Cheikh Anta Diop (UCAD) de Dakar

O fim do ano de 2014 e o início de 2015 revelaram aos senegaleses que vive-ram sempre numa «república» dirigida por antirrepublicanos: dois presiden-tes profundamente enraizados em valores tradicionais estruturantes de uma sociedade senegalesa que muitos pensavam ultrapassada pela mentalidade da «elite moderna». O despertar foi doloroso!

a opinião de mallé kassé

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da pobreza da família (o pai foi guarda noturno numa escola) e conseguido ser chefe dos 13 mi-lhões de senegaleses. Sinal de que a inteligência é igualmente partilhada em todas as camadas so-ciais; sinal de que a escola pública, hoje sabotada por políticas liberais, deve permanecer um santuá-rio cuidado, porque é capaz de produzir valores esclarecidos, de dar uma formação a todos os filhos e filhas de um país, abrindo assim todas as oportu-nidades contra todos os obscurantismos.

O interesse da reação de dois dirigentes que recorrem, em certas situações, a valores não repu-blicanos, apesar de dirigirem uma República, resi-de na chamada de atenção para o exercício do po-der por estes lados. A relação com o passado, a relação com o saber, a relação com o tempo mere-cem uma reflexão contínua para compreender a nossa elite dilacerada entre um passado idealizado e um presente frustrado. O nosso problema hoje não é um problema de dinheiros, de recursos, mas, antes, um «concertar» das nossas mentes para ter-mos a capacidade de pensar e de ler a nossa histó-ria, termos a coragem de olhar para o espelho e ti-rarmos toda a sujidade coberta pelos fatos e boubous (túnicas) do último grito.

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A sociedade senegalesa tradicional foi historicamente regida por um sistema rígido de castas

O autor desse discurso disse ser o africano mais diplomado do Cairo ao Cabo. O certo é que, em pleno século XXI, está atolado na lama da hierar-quia social pré-colonial.

A explicação de Diouf, a reação de Wade, porque ao filho, antigo ministro «do céu e da ter-ra», foram pedidas contas no Tribunal, são revela-doras da complexidade da mente da elite africana, em geral, oeste-africana em particular.

O saber adquirido na escola ocidental não pa-rece ter tido uma ação profunda na personalidade. O saber aparece aqui como um instrumento, uma vassoura que se deita fora depois de se limpar su-perficialmente a entrada da casa. A dimensão transformadora, subversiva do saber académico é abafada porque vivemos numa sociedade com uma força de inércia insuspeita: basta ver a postura dos grandes quadros do Estado perante o canto do griot falando da coragem imaginária dos antepas-sados! Muito dinheiro é ostensivamente distribuí-do pelo descendente da nobreza inventada e ali cantada!

Num espaço normal, avaliando o mérito e o desempenho dos cidadãos, o atual Presidente me-receria louvores por ter vencido obstáculos apesar

Preparação de tecidos para os boubous, vestuário tradicional do Senegal

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46 abril 2015 – África21

atentado de Tunes revela um nível de sofisticação no planea-mento e execução da operação

muito superior aos anteriores ataques terro-ristas na Tunísia, reivindicados por grupos ou indivíduos ligados aos Irmãos Muçul-manos ou à Al-Qaeda.

O alvo, data e hora da carnificina foram cuidadosamente escolhidos para provocar o maior impacto sobre as opiniões públicas

do Magrebe e dos países de origem das víti-mas e os maiores danos políticos e económi-cos à Tunísia, único país árabe a ter conse-guido até agora transições quase pacíficas da ditadura para a democracia e de um gover-no de maioria islâmica para outro de orien-tação laica.

Joia do património nacional e sítio mais visitado pelos turistas de passagem pela capi-tal tunisina, o Bardo é o segundo maior

museu de África e da bacia Mediterrânica. As suas coleções arqueológicas, instaladas num palácio construído no século XV, re-tratam a história da Tunísia ao longo de vários milénios e através de várias civiliza-ções, fenícia, cartaginense, romana, cristã e islâmica. Para os tunisinos, é o símbolo de uma identidade nacional forte e original, que não pode ser reduzida ao carácter pre-dominantemente árabe e muçulmano da sociedade atual.

O museu situa-se a escassas dezenas de metros da sede do Parlamento tunisino, no interior do mesmo recinto e protegido pelos mesmos guardas e sistema de segurança. Na hora do ataque estava em curso uma sessão parlamentar dedicada ao exame das estratégias antiterroristas, que incluía a audi-ção de altos responsáveis das forças armadas e de segurança.

A data também não parece ter sido esco-lhida ao acaso. O 20 de março é a festa na-cional da Tunísia, comemorativa da inde-pendência alcançada em 1956. São as primeiras comemorações organizadas de-pois da vitória eleitoral do partido laico Nidda Tounés e a laboriosa formação de

“Somos todos tunisinos”O ataque de 18 de março contra o Museu do Bardo em Tunes, que causou a morte de 20 turistas estrangeiros, não é apenas o mais mortífero registado neste país do norte de África desde 2002, quan-do um kamikaze fez explodir uma cisterna de gás contra a sinagoga da ilha de Djerba. Ao revindicar a autoria do atentado de Tunes, o Estado Islâmico lançou um aviso ao mundo inteiro e fez subir a fasquia da «guerra contra o terrorismo» na Europa e não só.

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Protesto frente ao Museu do Bardo, no dia a seguir ao atentado

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um governo de união nacional entre este e os islamistas do Ennahda. O novo chefe da diplomacia tunisina, Taieb Baccouche, in-telectual e sindicalista, ex-dirigente da UGTT, encontrava-se em Paris para prepa-rar a visita de Estado do Presidente Beji Caid Essebsi a França, agendada para 7 e 8 de abril.

Com este ataque, os terroristas mataram vários coelhos de uma só cajadada, como se diz vulgarmente. Não só reafirmaram a sua vontade totalitária em relação a qualquer expressão cultural e identitária alheia à sua conceção sectária do Islão (patente já em outras destruições do património da huma-nidade, no Afeganistão, no Mali, no Egipto e mais recentemente no Iraque) como um ódio cego que não poupa civis desarmados (turistas) de qualquer nacionalidade e obe-diência religiosa (muçulmanos incluídos), mulheres e crianças. Evidenciaram também a sua capacidade operacional, visando a ca-beça do poder político democrático – repre-sentado pelos parlamentos eleitos que os radicais islamistas consideram ímpios e

cionam o atentado de Tunes com o de Paris contra o Charlie Hebdo, através da figura de Bubaker al Hakim, um franco-tunisino, conhecido desde 2003 pelos serviços anti-terroristas, que seguiram a sua pista do Ira-que à Líbia, passando pelas prisões sírias e francesas.

Em todo o caso, fica de novo evidencia-do o perigo que representa o regresso aos países de origem de milhares de jiadistas re-crutados para combater os «infiéis» e os «maus muçulmanos» na Síria e no Iraque. Os tunisinos seriam os mais numerosos, entre 3000 e 5000, um terço dos voluntá-

dói», ou seja, alvos suscetíveis de afetar gra-vemente as economias dos países-alvo, au-mentando em consequência a miséria e os sentimentos de injustiça e revolta no seio das respetivas populações, em particular entre os jovens. A indústria petrolífera, ou-trora poupada pelos terroristas na Argélia e no Sinai, e o turismo, no caso do Egito e agora da Tunísia, estão doravante sob a mira dos jiadistas na sua estratégia de destruição das estruturas nacionais dos Estados.

Os tunisinos perceberam instintiva-mente o sentido do ataque e reagiram de imediato, entoando o hino nacional, aplau-dindo as forças de segurança e manifestan-do-se nas ruas de Tunes com a bandeira nacional para exigir a formação de uma «frente patriótica antiterrorista».

Na Europa também a emoção é grande, não apenas pela identidade da maioria das vítimas do atentado de Tunes mas pela confirmação da existência de metástases do cancro do Estado Islâmico na Líbia e no Magrebe, a escassas centenas de quilómetros das costas meridionais de Itália. Mas, infe-lizmente, as primeiras reações apontam para o reforço das medidas securitárias e das limi-tações à circulação de pessoas e bens entre as duas margens do Mediterrâneo. Os tunisi-nos estão particularmente amargos face aos efeitos previsíveis do atentado de Tunes so-bre o turismo, principal fonte de riqueza e de empregos da economia nacional, que dava sinais de recuperar da crise consecutiva à revolução de 2011. Dizem que os apoios prometidos pelos Estados Unidos e a União Europeia à jovem e frágil democracia tunisi-na tardam a ser concretizados apesar dos especialistas reconhecerem que a guerra contra o terrorismo não pode ser ganha barricando-se de forma irracional atrás das fronteiras e aumentando o arsenal de meios de vigilância e repressão posto à disposição dos serviços policiais. «A Tunísia está dis-posta a colaborar com os países vizinhos e com a União Europeia na luta contra o ter-rorismo porque combatemos um inimigo comum», disse o primeiro-ministro Habib Essid.

Mas é de união e desenvolvimento in-clusivo e solidário que o mundo carece para atacar o mal pela raiz, e estes objetivos estão longe de figurar entre as prioridades da geopolítica mundial.

contrários à lei divina – apesar dos controlos e aparatos policiais e militares.

A identidade dos autores materiais do atentado, se vier a ser confirmada, está também carregada de ameaças. Segundo as autoridades tunisinas, Yassine Abidi e Ha-tem Khachnaoui, os dois assaltantes mortos, eram «extremistas salafistas que deixaram a Tunísia em dezembro e foram treinados na Líbia». Informações não confirmadas rela-

rios estrangeiros nas fileiras do Estado Islâ-mico, mas nenhum país no mundo escapa ao fenómeno. A importância do papel da internet e das redes sociais na propaganda do Estado Islâmico e o profissionalismo e a sofisticação dos seus agentes fazem com que a ameaça seja agora global e muito difícil de detetar e neutralizar.

Outra dimensão a ter em conta é a capa-cidade dos jiadistas de «golpear onde mais

Turistas a serem evacuados do Museu do Bardo

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O Museu do Bardo é o símbolo da nacionalidade tunisina que não se reduz ao carácter predominantemente árabe e muçulmano da sociedade atual

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ébola

a conferência internacio-nal de Bruxelas em 3 de março, coorganizada pela União Euro-

peia e Nações Unidas, falou-se sobretudo do futuro «depois do ébola». Os governos dos três países africanos mais afetados – Guiné Conacri, Libéria e Serra Leoa – fi-xaram como objetivo «zero novos casos até meados de abril». Alpha Condé, Pre-

sidente da Guiné Conacri, pediu um «plano Marshall» para ajudar a África Ocidental a reconstruir-se «como depois de uma guerra».

Para os doadores, que no pico da epide-mia tinham prometido 4900 milhões de dólares, não é preciso angariar mais dinhei-ro. Do que se trata agora é de assegurar que os fundos são devidamente aplicados.

«Temos a prova de que o ébola pode ser vencido», diz a Organização Mundial de Saúde (OMS) que considera, no entanto, que a batalha não está definitivamente ga-nha. A imprensa e a opinião pública interna-cional já viraram a página e começam a es-quecer o pânico de há uns meses. O alívio é compreensível. Mas de que servirá ter gasto centenas de milhões de dólares para erradicar o ébola se tudo fica como dantes e dentro de meses ou anos outra epidemia ainda mais mortífera se propaga pelo mundo inteiro?

Aprender com os erros Em relação a este surto, a resposta local, re-gional e internacional foi a melhor possível? Muitas das vítimas não poderiam ter sido salvas? Noel Tordo, responsável pelas es-tratégias antivirais no Instituto Pasteur de Paris, ao qual pertence o laboratório que identificou o ébola nas amostras colhidas na Guiné Conacri em março de 2014, afirma que «ninguém foi particularmente brilhan-te». A lista das «falhas», atrasos e erros de diagnóstico cometidos pelas autoridades nacionais, a OMS, as ONG e a comunida-

Que saúde pública depois da epidemia?

O ébola já matou mais de dez mil pessoas na África Ocidental e continua a matar na Guiné Conacri e na Serra Leoa, mas

o contágio declina e o risco de pandemia parece agora afastado

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A epidemia do ébola contribuiu para o lançamento da campanha sanitária universal

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em África ou em qualquer outra latitude. Dizem que os três países em causa estavam particularmente vulneráveis face a um vírus desconhecido na região porque são os mais pobres, com índices de desenvolvimento humano (IDH) dos mais baixos do mun-do e serviços de saúde quase inexistentes, devido a décadas de ditadura (no caso da Guiné Conacri) e às guerras civis que dilace-ram a Libéria e a Serra Leoa. Azar da história e infeliz coincidência de que a chamada co-munidade internacional não teria nenhuma culpa.

Os resultados de um estudo realizado pelos departamentos de sociologia das uni-versidades de Cambridge e Oxford e pela London School of Hygiene and Tropical Medicine, publicados em dezembro, apon-tam em sentido oposto, responsabilizando o FMI e as condições de crédito impostas a estes países entre 1990 e 2014. Segundo os autores «os sistemas de saúde foram enfra-quecidos pela exigência de reformas econó-micas, redução das despesas públicas e dos salários da função pública, bem como a libe-ralização dos sistemas de saúde», exigências reiteradas em 2013, ano em que o FMI se opôs ao «aumento das despesas sociais ape-sar das necessidades gritantes».

O FMI rejeita estas acusações mas são cada vez mais numerosas as vozes que acu-sam as instituições financeiras internacio-nais e as suas políticas liberalizantes e de privatizações de serem responsáveis pelo brutal agravamento das carências e desigual-dades no acesso aos cuidados de saúde.

Por uma cobertura sanitária universal Sob o pretexto de combater os défices e o desperdício, os serviços públicos de saúde foram sujeitos a «curas de austeridade» que privam as populações mais carenciadas de acesso aos cuidados primários; as ajudas ex-ternas foram canalizadas de preferência para as ONG e outras organizações privadas, alegadamente melhores gestoras; a própria OMS, financiada a 80% por contribuições voluntárias dos governos e fundações priva-das, tem visto o seu orçamento «encolher» drasticamente desde 2008 e é acusada de ser manipulada pelos grandes grupos farma-cêuticos e as fundações privadas.

de internacional em geral é longa e deu azo a polémicas e trocas de acusações.

A correção dos erros mais flagrantes es-tará na origem do atual refluxo, mas ficaram sem resposta questões essenciais. Continua por identificar o vetor de transmissão do vírus ao homem, o que inviabiliza a adoção de estratégias específicas para evitar novos surtos, como a vacinação das populações em risco. Por outro lado, não existe nenhum tratamento preventivo ou curativo específi-co contra o ébola ou outras febres hemorrá-gicas semelhantes, o que resulta da orienta-ção e do financiamento dados à investigação científica no domínio da saúde. Não haven-do motivação do setor privado para encon-trar medicamentos para muitas das doenças infecciosas tropicais, o essencial das pesqui-sas científicas sobre os vírus desenvolveu-se nas últimas décadas no âmbito da guerra bacteriológica e da luta antiterrorista.

A epidemia do ébola acelerou os resulta-dos alcançados pela Agência de Saúde Pú-blica do Canadá e pela firma britânica GSK (GlaxoSmithKline), em colaboração com o

Instituto Americano das Alergias e Doenças Infecciosas (NIAID), que foram autoriza-dos pela OMS a experimentar as suas vaci-nas, a partir de novembro de 2014 na Gui-né Conacri e de fevereiro deste ano na Libéria. As experiências foram promissoras mas os resultados podem ser inconclusivos se, como nos casos anteriores, este surto se extinguir «naturalmente» por interrupção da cadeia de transmissão.

Serão os governos africanos, a começar pelos da Guiné Conacri, Libéria e Serra Leoa, os únicos ou os principais responsá-veis pelas dimensões da tragédia? A maioria dos analistas afirma que um surto deste gé-nero tem pouca probabilidade de se repetir

A imprensa e a opinião pública internacional já viraram a página e começam a esquecer o pânico de há uns meses

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Vacinas experimentais foram autorizadas na Libéria e na Guiné Conacri

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50 abril 2015 – África21

Preocupações de eficiência e sustentabi-lidade económica levaram a ONU a abdicar do princípio da «saúde para todos» definido em 1978 em Alma Ata, como um direito humano fundamental e inalienável. Em consequência, os Objetivos de Desenvolvi-mento do Milénio (ODM) incluíram me-tas precisas e quantificáveis em matéria de saúde materno-infantil e de combate às grandes pandemias (sida, malária, tubercu-lose). As ajudas ao desenvolvimento e a cooperação internacional seguiram o mes-mo roteiro, contribuindo para desarticular ainda mais os sistemas públicos de saúde dos países africanos.

Foi o fracasso destas políticas e as refor-mas empreendidas por vários países, tendo como objetivo a cobertura sanitária univer-sal, que levaram a ONU e o Banco Mundial a mudar de paradigma. Em dezembro de 2012, a assembleia-geral da ONU aprovou uma resolução a favor da cobertura sanitária universal e propôs a sua inscrição nos ODM para o período 2015-2030.

Em dezembro de 2014, a primeira «jornada mundial da cobertura sanitária universal», coorganizada pela OMS, o Banco Mundial e a Fundação Rockfeller, lançou uma coligação mundial para acele-rar o acesso de todos a cuidados de saúde de qualidade. A epidemia do ébola na

África Ocidental é expressamente aponta-da como um dos motivos para o lança-mento desta campanha mundial. Segundo Margaret Chan, diretora-geral da OMS, ficou provado que «para se poder detetar com rapidez as situações anómalas, há que oferecer cuidados de saúde de boa qualida-de e a preços acessíveis a todos e não apenas às populações abastadas das zonas urbanas; é preciso dispor de infraestruturas, pessoal devidamente formado, equipado e abaste-cido com medicamentos e meios de diag-nóstico rápidos e fiáveis, e criar redes de informação capazes de orientar as estraté-gias e de mobilizar os recursos necessários sempre e em todo o lado».

Os objetivos são ambiciosos, a questão do financiamento permanece em aberto. O mercado e a iniciativa privada não fun-cionam, no entender do britânico Robert Yate. O economista consultor do governo de Londres e da OMS estima que «a chave está num financiamento público e obrigató-

rio» e num sistema universal em que os «os ricos pagam pelos pobres» e os países mais desenvolvidos pelos mais frágeis ou sinistra-dos. A batalha é política e até agora o fiel da balança pendeu a favor das teses liberais se-gundo as quais cada um deve ser responsá-vel pela sua própria saúde e o serviço públi-co de saúde deve obedecer ao princípio do utilizador-pagador.

O ébola veio lembrar que, face à doença como face às alterações climáticas, «estamos todos no mesmo barco», os vírus não conhe-cem fronteiras e nem os países mais desen-volvidos podem garantir a 100% a seguran-ça dos seus cidadãos contra a ameaça de um vírus ou bactéria desconhecida que a globali-zação fez surgir da selva africana, amazónica ou asiática onde estava escondido.

Se a comunidade internacional ignora as lições do ébola talvez outra epidemia ainda mais mortífera a obrigue a encarar o desafio da saúde para todos. Segundo os epidemiologistas poderia ser a SARS (Sín-drome respiratória aguda severa). Causada por um coronarovirus detetado na China em 2002, causou 700 mortos em três dezenas de países de todos os continentes em 2003-2004. Um vírus da mesma família surgido em 2013 na Arábia Saudita causou até hoje três centenas de mortos em 15 países e continua ativo.

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A maioria dos analistas afirma que um surto deste género tem pouca probabilidade de se repetir em África ou em qualquer outra latitude

Os Presidentes Alpha Condé (Guiné Conacri) e Ellen johnson Sirleaf (Libéria) na conferência internacional sobre o ébola realizada na Bélgica

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A anulação da dívida externa dos países afetados pelo ébola é a melhor solução possível

uase um ano volvido sobre a epidemia de ébola mais mortífera a que se assistiu até hoje,

finalmente se vislumbra uma luz ao fundo do túnel relativamente ao recuo da doença na Guiné Conacri, Libéria e Serra Leoa. No entanto, apesar das respostas atualmente em curso, a batalha encontra-se longe de estar ganha – o próximo obstáculo a vencer é o de conter os devastadores efeitos socioeconómicos da epidemia nos três países.

Em 2013, as perspetivas económicas dos países afetados afiguravam-se promissoras, no seguimento de reformas então levadas a cabo. A Serra Leoa e a Libéria, por exemplo, eram consideradas a segunda e a sexta economias mais dinâmicas do mundo: o impacto duro do ébola refreou a recuperação eco-nómica pós-conflito nestes países e ameaça agora, por sua vez, a retoma das conquistas nos planos económico e social.

Antes do surgimento do vírus do ébola, as taxas de crescimento em 2014 na Guiné Conacri, Libéria e Serra Leoa estimavam-se, respetivamente, em 4,5%, 5,9% e 11,3% comparativamente aos 1,3%, 1% e 6,6% pós-ébola. Este foi o resultado de um decréscimo das vendas, das atividades nos restau-rantes e hotéis, da redução dos transportes públicos, das quedas no setor da construção e na diminuição da presença de empresas estrangeiras: as repercus-sões fizeram-se sentir numa baixa da procura de serviços e na desaceleração das atividades comerciais afins. Os preços dos bens de primeira necessidade acabaram por aumentar na medida da redução das provisões de géneros alimentares e dos empregos

perdidos. Acresce ao que acaba de descrever-se as restrições nacionais aos transportes aéreos, maríti-mos e terrestres, bem como o encerramento das fronteiras que afetaram seriamente o comércio entre os países vizinhos e a nível internacional, de uma maneira geral.

Os resultados nas finanças públicas dos países afetados são devastadores, tendo causado a redução das receitas fiscais e um aumento das despesas, em particular no setor da saúde. Desta forma, assiste-se ao agravamento do défice orçamental e, consequen-temente, ao enfraquecimento das capacidades do governo na contenção da doença e no reforço da economia através de medidas de incentivo orça-mental. Se sérias contramedidas não forem adota-das, a desaceleração económica vai permanecer.

O apoio da comunidade internacional é impor-tante e necessário para a resolução das lacunas fi-nanceiras. Contudo, grande parte deste apoio tra-duz-se em empréstimos, o equivalente ao subsequente avolumar do fardo da dívida externa dos três países afetados. A título de exemplo, no fi-nal de novembro de 2014, dos 157.111.429 milhões de dólares em compromissos adicionais que foram aprovados pela Libéria, 60% dos 60.604.272 milhões que foram pagos são empréstimos. Se a isto se acrescentar a dívida externa da Guiné Conacri, da Libéria e da Serra Leoa, que em 2013 ascendia a 1,2 mil milhões, 542 milhões e 1,4 mil milhões de dó-lares, respetivamente, estamos a falar de um total de 3,1 mil milhões de dólares. Este montante represen-ta aproximadamente 190%, 320% e 180% das ex-portações destes países e ilustra de forma clara que as exportações estão muito abaixo dos títulos de dí-vida, isto quando o fardo da dívida externa destes países é já bastante pesado. Cumulativamente ao aumento das respetivas dívidas na ausência de flu-xos financeiros cruciais (o que se traduz em sobre--endividamento), estes países não estarão à altura de recuperar dos respetivos atrasos e de, portanto, satis-

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a opinião de carlos lopes

Antes da epidemia do ébola, Serra Leoa e a Libéria eram consideradas a segunda e a sexta economias mais dinâmicas do mundo

Carlos Lopes é secretário executivo da UNECA - Comissão Económica para África das Nações Unidas

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da educação, da agricultura e segurança alimentar e o setor dos serviços.

Uma maior capacidade orçamental permitirá que os três países, indubitavelmente, atinjam os seus objetivos de desenvolvimento social e econó-mico a longo-prazo no contexto da agenda de de-senvolvimento pós-2015, além de reforçar os seus crescimentos e perspetivas de retoma económica, o que resultará no reembolso regular da dívida.

A boa notícia é a de que o apelo à anulação da dívida externa não caiu no vazio, na medida em que grandes instituições internacionais como a União Africana e, mais recentemente, o Fundo Monetário Internacional (FMI) já iniciaram con-versações. A ação do FMI (que se traduziu num apoio de 100 milhões de dólares para alívio da dí-vida dos três países em questão nos próximos dois anos, graças a um fundo de afetação especial para a prevenção e intervenção em caso de catástrofe) constitui já um primeiro passo, e apreciado, no processo de anulação da dívida. Significa não ape-nas um precedente – oferece a possibilidade de uma abertura para acordos similares com outros credores bilaterais e multilaterais.

Uma oportunidade justa para a planificação a longo-prazo da retoma económica necessita de uma base sólida. As declarações sobre a anulação da dívi-da já estão feitas. Agora é tempo de agir. É a melhor solução possível.

Artigo publicado no Le Monde Afrique, a 17 de fevereiro de 2015

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fazer as necessidades orçamentais e de equilibrar a balança de pagamentos.

A anulação da dívida – o alívio crucial O apelo da Comissão Económica das Nações Unidas para África no que toca à anulação da dívida externa dos três países mais afetados pela epidemia do ébola dar-lhes-á a margem de manobra de que necessitam para enfrentar os complexos desafios socioeconómi-cos com que neste momento se defrontam.

A medida da anulação da dívida externa já foi anteriormente aplicada para apoiar países grave-mente afetados por choques súbitos, como catástro-fes naturais ou epidemias. O Haiti, por exemplo, beneficiou neste sentido depois do terramoto de 2010. A anulação da dívida externa destes três países trazer-lhes-á a possibilidade de reorientar e investir os recursos financeiros destinados ao reembolso da dívida com vista a reforçar os frágeis sistemas de saúde nos meios rurais e urbanos, incluindo neste re-forço a capacitação de profissionais de saúde. Os seto-res estratégicos da economia mais seriamente afeta-dos que beneficiarão da anulação da dívida serão os

Na ausência de fluxos financeiros cruciais, estes três países não estarão à altura de recuperar dos respetivos atrasos

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guiné-bissau

o quinto encontro deste gé-nero, a primeira coisa que cha-mou a atenção na mesa redonda

na capital da Europa comunitária foi a ex-tensão e grandeza da comitiva guineense, composta por mais de quarenta personali-dades dos três órgãos de soberania, de di-versas sensibilidades políticas e de vários setores da sociedade civil, encabeçada pelo Presidente José Mário Vaz.

A deslocação do Chefe de Estado não estava inicialmente prevista, mas a presen-ça do seu homólogo senegalês Macky Sall, cuja intervenção para sensibilizar os deci-sores franceses a apoiarem o evento ele so-licitou, podia deixá-lo mal na fotografia se não fosse. A pletórica composição da dele-

gação vinda de Bissau destinava-se a enviar aos doadores uma forte mensagem de consenso nacional à volta da iniciativa e da visão e estratégia de desenvolvimento até 2025, documentos examinados na confe-rência. E de que este é o momento oportu-no para a comunidade internacional dar a mão à Guiné-Bissau e fornecer-lhe os fun-dos indispensáveis à implementação da sua agenda de reformas, sobretudo as definidas como prioritárias e estruturantes de curto/médio prazos. Entre estas, saliente-se a modernização dos cruciais setores de segu-rança, justiça, administração e energia, para permitir ao país superar as suas fragili-dades, consolidar a estabilidade das insti-tuições democráticas repostas com as elei-

ções de abril/maio de 2014, a fim de poder diversificar e redinamizar a sua economia e combater a pobreza a longo prazo.

O início da transiçãoEm causa está a mobilização de mais de dois mil milhões de dólares, para custear mais de 200 projetos e outras iniciativas, cuja execu-ção os dirigentes guineenses acreditam que poderá determinar o início da «transição do país para uma sociedade próspera e segura». Contudo, tal como assinalou o ministro da Economia e Finanças guineense, Geraldo Martins, além de mobilizar recursos, as au-toridades de Bissau procuram ainda «federar vontades à volta da visão estratégica de de-senvolvimento», uma visão própria, valida-de em amplos fóruns nacionais, com a con-tribuição da diáspora, e sem a tutela internacional. Otimistas, apostam sobretu-do na disponibilidade das organizações multilaterais, e têm motivos para isso, uma vez que o entendimento dos seus parceiros externos também é de que este é o timing apropriado para o «empurrão» que o país precisa para acabar com o ciclo de instabili-

Nunca uma conferência internacional de apoio ao país gerou tanta expectativa e adesão interna e externa, como a reunião de 25 de março em Bruxelas, alvo de uma campanha de promoção e exposição mediática sem precedentes

alMaMi Júlio Cuiaté BISSAU

Uma esperança chamada mesa redonda

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dade e entrar nos eixos. E estão dispostos a dar um tratamento de exceção à singular si-tuação da Guiné-Bissau.

Isto é o que explica, em parte, o facto da União Europeia – o principal parceiro multilateral do país – ter arcado com o es-sencial das despesas do evento, incluindo as faturas de viagem e estadia dos numerosos participantes e convidados guineenses. E justifica também o nível e a variedade dos representantes das organizações financeiras internacionais e de outros parceiros tradi-cionais da Guiné-Bissau e investidores con-vidados à conferência, que ultrapassaram duas centenas.

O secretário-geral das Nações Unidas endereçou uma mensagem à conferência, lida por um dos seus adjuntos, o subsecretá-rio-geral e chefe do Departamento de As-suntos Políticos da ONU, o diplomata norte-americano Jeffrey Feltman. Mas não se trata apenas de uma questão de dinheiro. Para o chefe do Governo guineense, Do-mingos Simões Pereira, a mesa redonda poderá ser considerada «um sucesso» se os parceiros considerarem os projetos coeren-tes, exequíveis e credíveis, seja qual for o va-lor angariado.

Por seu lado, o Chefe de Estado, Má-rio Vaz, defende que o ideal seria obter

maior percentagem de fundos na modali-dade de ajuda pública ao desenvolvimento, porque se forem sob a forma empréstimos, a sua aplicação teria de garantir retorno, caso contrário, o ônus dos erros de sua gestão recairia sobre as futuras gerações. Embora o programa da conferência tenha previsto uma sessão de pledging, de declara-ção de intenções dos doadores, o Governo entende que é depois da mesa redonda que realmente tem lugar a mobilização de re-cursos, com a negociação dos engajamen-tos feitos na conferência. Bastante decisivo será nomeadamente a conferência de in-vestidores, nos próximos meses, na capital guineense, em que estará na mesa o alinha-var de projetos concretos, alinhados com os principais eixos do programa do Gover-no (2014/18), entre os quais a boa-gover-nação, a infraestruturação, a agroindústria e o desenvolvimento de polos urbanos nas regiões do interior.

Um dos pontos fortes e simultanea-mente uma incógnita das propostas levadas a Bruxelas é a promessa de fazer da biodiver-sidade a imagem de marca da estratégia de desenvolvimento guineense, impondo a gestão racional dos recursos naturais como elemento transversal das políticas públicas em todas as esferas de atividade.

UM PAíS SANTUÁRIODA BIODIVERSIDADEA criação de riqueza em estreita harmo-nia com a valorização durável dos ecos-sistemas marinhos e terrestres é um dos eixos transversais da visão estratégica apresentada pelo Governo guineense na recente mesa redonda. Bissau quer fa-zer da conservação da biodiversidade a sua imagem de marca, por constatar que hoje e amanhã a sua economia depen-derá da gestão criteriosa dos recursos naturais renováveis, exigência também ditada pelas alterações climáticas.

Em questões ambientais, a Guiné--Bissau é uma referência. As áreas pro-tegidas ocupam 15%, e este ano vão passar para 26%, com a particularidade de as populações residentes nesses ter-ritórios serem livres de explorar os diver-sos recursos ai disponíveis, mas de for-ma racional. Os mangais, vegetação da orla marítima onde se reproduzem várias espécies piscatórias, cobrem 8% do país, a maior proporção mundial. O ar-quipélago dos Bijagós, no Sul, com as suas 80 ilhas, foi classificado como re-serva da Biosfera pela Unesco.

Colocar a biodiversidade no centro do desenvolvimento é uma ideia atrativa, mas na prática requer vontade política para aplicar a legislação neste domínio, assim como recursos para a sensibiliza-ção da população e dos decisores. Impli-ca igualmente estudos, estatísticas e seguimento, condições que, para Alfredo Silva, diretor-geral do Instituto da Biodi-versidade e Áreas Protegidas (IBAP) ainda estão por garantir. Porém, este responsável reconhece que a situação começa a mudar para melhor.

NOVO MINISTRO DA ADMINISTRAçÃO INTERNA TRêS MESES DEPOISForam precisos pouco mais de três meses para o Presidente e o primeiro-ministro se entenderem sobre o perfil do novo ministro da Administração Interna, pasta sem titular nomeado desde novembro último, a seguir à demissão de Botche Candé, apanhado nas malhas da sensível questão da presença de elementos da rebelião do Casamansa em território da Guiné-Bissau. Desde então, o Chefe de Estado e de Governo mantive-ram um braço de ferro para colocar no lugar uma personalidade da sua preferência, e só a pressão de ter que garantir uma imagem de coesão nacional nas vésperas da mesa redonda com os doadores é que forçou a encontrar um nome de consenso, Oc-távio Alves, um jurista e técnico sénior do Ministério dos Negócios Estrangeiros, onde tem a categoria de embaixador.

Alves (55 anos), é um ex-aluno da Escola Piloto de Conacri, o viveiro de quadros do PAIGC, e cursou Direito em Lisboa. Tem a reputação de profissional competente e rigoroso, algo distante das lides políticas (nas presidenciais de 2014 apoiou o candidato independente Paulo Gomes), pelo que a sua escolha mereceu tanto a aceitação da Presidência da República como da Primatura. Possui ainda o mérito de conhecer bem a casa, onde já tinha estado, como secretário de Estado da Ordem Pública, no Governo do deposto primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, período em que lidou estreitamente com a crucial reforma do setor da segurança. Antes, Octávio Alves dirigiu o Tribunal de Contas e o Ministério Público.

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Consolidar a reforma do sector judicial, tornando-o mais ágil e moderno para garantir o acesso dos cidadãos ao direito e à justiça, é um dos propósitos do Plano Nacional de Desenvolvimento, PND. Entre os objectivos está o de assegurar a cidadania plena através da universalização do registo civil de nascimento e do acesso a documentos básicos como o bilhete de identidade. Com as acções do PND para esse sector, mais um milhão e meio de cidadãos e cidadãs passarão também a ter bilhete de identidade. Para além de modernizar e informatizar os serviços notariais, está previsto o aumento do número de conservadores e notários, bem como o de o�ciais de registo.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO

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Por detrás da pobreza extrema,há bovinos e caprinos!

e há décadas para cá, muitos países africanos fo-ram levados a assumirem sugestões de estratégias

para a redução da pobreza das suas populações, ou para o seu desenvolvimento.

Hum... vem aí mais uma das minhas lembranças! E peço desculpa àqueles que a memória do passado choca, ainda que se trate de pretéri-tos bem recentes. Entre os anos oitenta e noventa, esteve na moda o Programa de Ajustamento Estrutural, o famoso PAE, que subalternizou a área social em favor dos se-tores económico e financeiro. A organização da Banca & companheiros de fila ditaram as regras, subtilmente, e muitos foram atrás da dita estratégia para concluírem, alguns anos depois, que o programa foi mais forma e formalidades do que conteúdo e substância para fomentar o desenvolvimento.

No momento da adesão, entendeu-se que o PAE podia ser determinante para se atingir o desenvolvimento dos países africanos ao sul do Sara. Porém, o processo de busca desse desenvolvimento foi concebido com os olhos postos na esfera económica, assente em premissas rígidas como o estabeleci-mento das taxas de utilização dos serviços sociais básicos, ex-tinção ou redução de certos subsídios, despedimentos de funcionários públicos, privatizações de empresas estatais, en-tre outras medidas severas que acabaram por limitar os resul-tados do Programa.

Anos se passaram, chuva vai, chuva vem (até parece uma história, mas tenho de cronicar este assunto desta forma), eis que apareceu de novo a Banca & companheiros de fila para apresentarem a esses mesmos países o caminho para se sair do buraco em que se enfiaram durante os anos do Programa.

Pois é. Muita gente deixou de ir aos centros de saúde, optando pelos curandeiros, onde pagam com galos ou panos de pente. As empresas privatizadas passaram a ser tudo, me-nos a alternativa para a revitalização do mercado e criação de emprego. Umas viraram armazéns, outras, depósitos de ferro-velho.

Tempos depois, em sinal de mea culpa, uma nova fórmu-la: a estratégia para diminuir a pobreza. Os técnicos foram treinados para medir a penúria, as fichas de inquérito elabora-das e os profissionais puseram pés à obra. Percorreram o país de lés a lés para, no fim, concluírem que, afinal, somos todos pobres; que ter cabeças de gado, chiqueiro com dezenas de

cabeças de suíno, ou rebanhos de ovelhas, não significa estar fora do perigo da pobreza.

Eis mais uma daquelas minhas dúvidas crónicas: como transformar os bens ou as reservas de riquezas da nossa gente em algo que beneficie e torne digna a vida das famílias que

possuem esses bens? Porquanto não é raro encontrarmos nos arredores de Bissau, Biom-bo, Oio, Bafatá ou Cacheu, crianças dos sete aos onze anos montadas em bois, levando-os ao pasto e orientando-os, com assobios e ur-ras, para os bebedouros naturais, os pequenos lagos que entrecortam alguns desses lugares.

Durante a transumância, muitas crianças são privadas de irem à escola, para acompa-nharem os pais na pastorícia. Esses gados são bens, tal como as malas de panos de pente e

os fios de ouro são reservas familiares que podem reverter-se a favor dos membros desse agregado.

Porém, nunca se questionou, nos inquéritos sobre a po-breza, como são utilizados esses bens e como fazer essas reser-vas se reverterem em favor das famílias que as possuem. Sabe--se que, entre os vários grupos étnicos, os bens são guardados para a celebração da morte.

É durante o choro que centenas de panos são colocados no caixão e uns tantos são doados aos filhos, sobrinhos e netos do defunto; é durante esse ritual que dezenas de bovinos e caprinos são abatidos, e tudo em nome de um choro gordo, onde o lema é beber e comer com fartura, num puro ato de celebração da morte.

Mas voltemos ao inquérito sobre a pobreza, ao questiona-mento sobre os gastos feitos durante as cerimónias fúnebres, a origem dessas despesas para, a seguir, apontar a necessidade de se mudarem os parâmetros de interpretação da pobreza.

A partir daqui, confesso a minha dificuldade de encon-trar um caminho para encorajar as pessoas a utilizarem as suas riquezas, também, em favor da dignificação e celebra-ção da vida humana! Pois, por detrás da pobreza há rique-zas ocultas!

A crónica de Odete Costa Semedo

[email protected]

Sabe-se que entre os vários grupos étnicos os bens são guardados para a celebração da morte

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Consolidar a reforma do sector judicial, tornando-o mais ágil e moderno para garantir o acesso dos cidadãos ao direito e à justiça, é um dos propósitos do Plano Nacional de Desenvolvimento, PND. Entre os objectivos está o de assegurar a cidadania plena através da universalização do registo civil de nascimento e do acesso a documentos básicos como o bilhete de identidade. Com as acções do PND para esse sector, mais um milhão e meio de cidadãos e cidadãs passarão também a ter bilhete de identidade. Para além de modernizar e informatizar os serviços notariais, está previsto o aumento do número de conservadores e notários, bem como o de o�ciais de registo.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

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s padrões de precipitação, o tempo e as características do gravanito (período seco na esta-

ção das chuvas) e da gravana (estação seca), a subida do nível do mar, as tempestades costeiras e a erosão que se assiste na margi-nal, são indicadores de que o clima em São Tomé e Príncipe está a mudar. As altera-ções climáticas estão, por isso, a ser inte-gradas nas várias estratégias e programas de desenvolvimento. De salientar que São Tomé e Príncipe já fez o Plano Nacional de Ação para a Adaptação (NAPA).

Nesse sentido, foi organizada uma ação de formação prática de duas semanas, desti-nada a técnicos de diversos setores de orga-nismos centrais, locais, regionais e represen-tantes da sociedade civil, com o objetivo de

sensibilizá-los para que apliquem uma «len-te climática», ou seja, que tenham em conta «as possíveis soluções para esses impactos» nos programas de desenvolvimento.

«A formação foi montada com base num Plano Nacional de Desenvolvimento de um país fictício, que é o Zanadu, e as pessoas aqui representam entidades gesto-ras da água, da agricultura, trabalham para esses ministérios ou são um grupo de con-sultores que tem de identificar os impac-tos, os sistemas de interesses e depois as soluções para esses problemas, bem como todos os atores envolvidos», explicou Inês Mourão, uma das consultoras da Chaos, a ONG que está a executar a formação.

A ação incluiu a avaliação da viabilida-de das opções de adaptação. Estas soluções foram apreciadas do ponto de vista custo/benefício, custo/eficácia e selecionadas para se desenhar um projeto. «Com base em tudo isto, culminamos com as opções dentro do que é um formulário de projeto que poderia ser de uma Direção-geral do

Ambiente, de uma Direção do Plano e Fi-nanças ou que uma ONG poderia apre-sentar para fazer face a esses problemas», disse a responsável à África21.

Por outro lado, a razão fundamental da existência desta capacitação sobre a inte-gração da adaptação às mudanças climáti-cas nos planos de desenvolvimento «é jus-tamente evitar que continuemos a ter projetos a nascerem e a morrerem sem que haja um programa ou uma visão de longo prazo de questões que têm a ver com mu-danças climáticas», como sublinhou Adéri-to Santana, especialista santomense em mudanças climáticas.

Inês Mourão defende que «o impor-tante é tornar as estratégias, os planos e os projetos à prova do clima. É reconhecido que as mudanças climáticas são uma das principais ameaças aos objetivos do desen-volvimento. O clima hoje é completamen-te diferente. Estamos habituados a planear de uma determinada maneira, sem ter esses fatores em conta e queremos que as pessoas saiam daqui com essa sensibilidade».

O projeto, financiado pelo Fundo português do Carbono, tem enquadra-mento regional. É compartilhado com Moçambique e Cabo Verde. A finalida-de é que venha a haver uma troca de ex-periências.

As mudanças climáticas estão a ser integradas nas estratégias e programas de desenvolvimento do país

são tomé e príncipe

Adaptação às mudanças climáticasHá diversos indicadores de que o clima em São Tomé e Príncipe está a sofrer profundas alterações

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Aumentar a disponibilidade, nos pontos de venda, de bens essenciais produzidos no país é uma das estratégias do Plano Nacional de Desenvolvimento. Até 2017, Angola pretende desenvolver e manter um conjunto de infra-estruturas logísticas e de distribuição que possibilite o abastecimentode produtos nacionais em todas as províncias. Para além de aumentar o número de estabelecimentos comerciais, o PND vai assegurar a existência de reservas alimentares estratégicas, bem como incentivar o comércio rural e a criação de novos empregos.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

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Aumentar a disponibilidade, nos pontos de venda, de bens essenciais produzidos no país é uma das estratégias do Plano Nacional de Desenvolvimento. Até 2017, Angola pretende desenvolver e manter um conjunto de infra-estruturas logísticas e de distribuição que possibilite o abastecimentode produtos nacionais em todas as províncias. Para além de aumentar o número de estabelecimentos comerciais, o PND vai assegurar a existência de reservas alimentares estratégicas, bem como incentivar o comércio rural e a criação de novos empregos.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

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vulcão acordou e, com ele, as potencialidades adormecidas do Fogo. Foi neste tom que

Luís Pires, presidente da Câmara Muni-cipal de São Filipe, justificou a necessi-dade de se fazer uma aposta num desenvol-vimento mais amplo, que seja integrador

A reconstrução de Chã das Caldeiras, património natural de Cabo Verde, completamente devastado pela última

erupção vulcânica, deve integrar um processo de estratégia de desenvolvimento do país e da ilha do Fogo e não apenas

dessa localidade

nataCha Mosso PRAIA

cabo verde

de todas as potencialidades da ilha e não apenas da localidade de Chã das Caldei-ras, no fórum «Reconstrução da ilha do Fogo», realizado no mês de março, na cidade de São Filipe.

«O Fogo tem grandes potencialidades nos domínios agroindustriais, turísticos e

culturais. Estamos numa ilha com uma terra extraordinariamente fértil, com ca-racterísticas microclimáticas especiais, produzindo curiosamente uma diversida-de impressionante de produtos. É um privilégio, uma dádiva da natureza, ter-mos nestas terras lávicas e, ao mesmo tempo, frutas tropicais, temperadas e mediterrânicas. Transformar a ilha em terras do vinho é possível. Urge, por isso, um plano a sério para a promoção da rota do vinho, a partir de Chã de Caldeiras», disse Luís Pires. O autarca defende, em paralelo, um plano «a sério» para promo-ver as rotas das montanhas, tendo o vul-cão e a paisagem lunar de Chã de Caldei-ras como singulares produtos do turismo cabo-verdiano, do café e dos sobrados.

Para que isso seja alcançado, exige-se algumas medidas prioritárias e urgentes, como o estabelecimento de linhas de crédito com juros bonificados para os agricultores, aposta nas energias renová-veis, criação de meios de escoamento de produtos, transporte com melhores tarifas

Começar de novoJO

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e previsibilidade e investimentos com repercussão no turismo.

Tendo a erupção vulcânica revelado algumas insuficiências em matéria de se-gurança e proteção civil, o fórum serviu também para se elencar as ações que vi-sam aumentar a capacidade de resposta em situações de catástrofes naturais. A começar pela monitorização da movi-mentação do vulcão, estendendo-se à formação das comunidades sobre a for-ma como devem lidar com situações de risco, a inclusão no ensino de temas as-sociados a calamidades naturais e seus riscos, criação de condições para cons-trução de mais uma via de acesso a Chã das Caldeiras – por razões de emergência ou para a circulação de pessoas e bens – e a operacionalização do aeródromo dos Mosteiros com obras de melhoria e sua transformação em Heliporto de apoio ao Serviço Regional da Proteção Civil.

Novo assentamentoConsiderada a maior expectativa do fó-rum, a construção do novo assentamen-to depende, segundo o primeiro-minis-tro, José Maria Neves, de um novo estudo para definir a melhor zona de realojamento para os deslocados de Chã das Caldeiras, que tenha em conta os riscos e aspetos técnicos, devendo os re-sultados ficar concluídos até ao final de março. Trata-se, porém, de uma matéria que não é consensual.

Para Mustafa Eram, guia e morador da Chã das Caldeiras, é viável reabitar na caldeira do vulcão, alegando que existem espaços seguros para o regresso das pes-soas. Já Carlos Pina, geógrafo, especialista em planeamento regional e um dos ora-dores do fórum, entende que o novo assen-tamento populacional deve ser construído no município de Santa Catarina, por ser o local que garante melhores acessibilidades e permite a construção de todas as infraes-truturas sociais, o que, em sua opinião, vai criar uma nova dinâmica económica nas zonas próximas.

Entretanto, um inquérito de opinião levado a cabo pelo Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica revelou que a maioria dos inquiridos, todos antigos moradores e deslocados de Chã, prefere

que o novo assentamento seja edificado numa localidade próxima à Chã das Cal-deiras, seguido de um número que opta por viver no município de São Filipe.

Enquanto isso, 110 casas construídas aquando da erupção vulcânica de 1995 se-rão reabilitadas e será criado um mecanismo de compensação para as pessoas que perde-ram os seus bens na erupção. Por se tratar de uma zona com elevado potencial agrícola, particularmente a produção da uva utilizada no fabrico do vinho da região, o Ministério do Desenvolvimento Rural fez saber que

deu o viticultor, para quem uma solução definitiva demoraria mais tempo.  

Onda de solidariedadeNo arquipélago, foram várias as iniciativas individuais e coletivas de angariação de di-nheiro e géneros, para apoiar as vítimas da erupção vulcânica que fez desaparecer Portela e Bangaeira, os dois povoados que integravam Chã das Caldeiras. Diversos países responderam aos apelos das autori-dades cabo-verdianas para acudirem às populações deslocadas, tendo sido os paí-ses lusófonos os primeiros a agir.

Portugal enviou a fragata Álvares Ca-bral com equipamento de telecomunica-ções, um helicóptero, camas, cobertores e máscaras respiratórias, e apoiou a monito-rização da erupção. De Angola chegaram apoios e donativos no valor de sete mi-lhões de dólares, traduzidos em meios de biossegurança, comunicação, géneros ali-mentícios, equipamentos e materiais de emergência. Luanda cedeu ainda três es-pecialistas da proteção civil e um de rein-serção social. A Guiné-Bissau doou 75 mil dólares, São Tomé e Príncipe fez uma doação individual por parte dos membros do governo, de 20% dos seus salários, enquanto Timor-Leste apoiou com 500 mil dólares. A Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) avançou com uma contribuição de 13 mil dólares e apelou aos países membros para assistirem Cabo Verde.

O chefe do governo cabo-verdiano garantiu rigor e transparência na gestão dos recursos arrecadados, tendo assegu-rado que nenhum centavo será desviado para outros fins que não seja a reconstru-ção da ilha do Fogo. O Executivo irá publicar, trimestralmente, e em todos os jornais do país, a relação dos recursos recebidos e a sua aplicação, para conhe-cimento da população em geral.

A erupção de 23 de novembro afetou toda a população de Chã das Caldeiras, com a destruição total de 260 das casas dos po-voados de Portela e Bangaeira, e de escolas, hotéis, centro de saúde e estradas. As lavas cobriram uma área com cerca de 520 hecta-res, 120 dos quais são terras agrícolas. Cerca de 2000 pessoas foram evacuadas e realoja-das em centros de acolhimento.

Os países lusófonos foram os primeiros a responder aos apelos das autoridades cabo-verdianas

JOÃO

REL

VAS/

EPA

“É um privilégio, uma dádiva da natureza, termos nestas terras lávicas frutas tropicais, temperadas e mediterrânicas”, afirmou Luís Pires, presidente da Câmara Municipal de São Filipe

serão criadas todas as condições para a sua produção até à construção da nova adega – a anterior foi consumida pelas lavas. Até lá, a Associação de Solidariedade e Desenvolvi-mento Económico, proprietária de uma das adegas, disponibilizou-se a ceder espaços e equipamentos para todo o processo de pro-dução da última colheita. Mas ao que tudo indica esta hipótese não é do interesse dos viticultores de Chã das Caldeiras. Através do seu representante, David Montrond, solicitaram o apoio do Governo na identifi-cação de uma solução já que se aproxima a época da colheita da uva.

«Precisaremos de um lugar, ainda que provisório, com as mínimas condi-ções para produzirmos o nosso vinho e para salvar a produção do ano», defen-

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uando vi metade da cabeça do meu primo surgir assim de repente na porta entreaberta da minha

loja (é como chamo ao espaço onde vendo os meus ser-viços de advogado), acreditei estar a ser confrontado com o seu fantasma. É isso, pensei, esse doido morreu e agora vem pregar-me partidas. É que ele tinha embarcado oito dias antes, numa viagem que pretendia de muitos dias, talvez meses ou mesmo anos. Vou fazer uma revisão completa à máqui-na, disse à despedida (ele considera que um hospital não é muito diferente de uma oficina de mecânica e bate-chapa), trocar as peças que podem ser substituídas, ataman-car as outras para as quais ainda não há su-plentes e no fim concluir tudo com uma pequena cirurgia plástica, coisa breve, apenas esticar um pouco a pele do rosto, sempre sonhei ter nascido chinês.

Não fiz comentários, cada um gasta o seu dinheiro como melhor lhe aprouver. Vou sentir a tua falta, disse--lhe, não fiques por lá, olha que aqui é que é a nossa ta-padinha. Ele ria-se: Não fico não, disse, sou como o Romeu do Almeida Garrett, vivo ou morto, hei de vol-tar. E agora voltava morto. Vade retro, estiquei-lhe a mão esquerda fazendo figa canhota, fui teu primo e amigo, mas já não tens parte neste mundo, procura o teu lugar no espaço superior.

Mas em vez disso ele aproximou-se de mim ainda em gargalhadas: Apalpa-me, disse estendo-me a mão, sou eu, teu primo, em carne e osso. Apalpei, era mesmo ele. Então posso abraçar-te, perguntei apenas por descargo de consciência. Podes, respondeu abraçando-me com força, não há nada no mundo que se compare a estes grãozinhos de terra, concluiu.

Mas eu estava curioso. Partindo do principio de que estás mesmo vivo, disse-lhe, diz-me então o que aconte-ceu para teres regressado tão rápido, tu que ias para me-ses, se não anos. Hei de contar-te, ainda que coberto de vergonha e humilhação, disse ele, sabes, a primeira, e única, aliás, consulta que fiz foi com o urologista. Ho-mem de meia-idade, muito correto. Certamente que não é a primeira vez que vem a este tipo de consulta, começa. Bem, por acaso é a primeira vez. Errado, na sua idade já devia ter feito pelo menos uns dez toques, vou ter que o examinar, ver como está a sua próstata.

Olhei para ele aflito, mas ele limitou-se a apontar-me a marquesa: baixe as calças e deite-se. Posição de galinha assada! A sua voz era calma, educada, via-se que estava habituado àquelas lides. Eu sorria constrangido enquan-

to descia as calças, atrapalhado com o sa-pato. Não precisa tirar o sapato, disse en-quanto calçava as luvas. Devo ter fechado os olhos porque só senti que delicadamen-te me espetava e escarafunchava. Durou um bocado que pareceu uma eternidade e quando ele retirou o dedo e achei que já podia levantar-me, ele ordenou. Agora ponha-se na posição em que a Alemanha de Hitler perdeu a guerra!

Por um momento hesitei, mas depois reconsiderei. Se já me tinha posto na posi-

ção de galinha assada, que poderia custar perder a guerra como a grande Alemanha, até que poderia ser apenas uma nostálgica recordação histórica, sobretudo agora que a Sra. Merkel levava de vencida toda a Europa e o resto do mundo, não com os canhões Berta ou Dora, antes com simples austeridade económica. Dobrei-me, pois, à vontade do tratador e mais uma vez sujeitei-me à sua opressão que ele praticava com uma espécie de mal-doso deleite. Ah vida, pensava de joelhos e cabeça dobra-da sobre a marquesa como numa oração, como é duro o teu aguilhão!

Mas finalmente ele cansou-se, deu por terminada a sua tarefa e mandou-me levantar e vestir. Pelo menos já me livrei deste exame que será talvez o mais incómodo, pensa-va enquanto me compunha. Mas quando me disse que não tinha encontrado nada do que esperava, pelo que eu deveria regressar uma semana depois para nova sessão, despedi-me dele e dali segui para uma agência de viagens. E aqui me tens, se não inteiro, pelo menos ainda vivo.

A crónica de Germano Almeida

As gargalhadasdo meu defunto primo

Devo ter fechado os olhos porque só senti que me espetava e escarafunchava delicadamente

[email protected]

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brasil

brasil está definitivamente dividido entre petistas e antipetistas num antagonis-mo difícil de ser enquadrado nas linhas

clássicas da lógica partidária. Os seguidores do Partido dos Trabalhadores, ao qual Dilma Rousseff é filiada, defendem a presidente, mas são contra o programa de austeridade econômica que ela implantou no seu se-gundo mandato e exigem uma reforma política que acabe com a corrupção nas campanhas eleitorais. Já o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), o partido Democratas (DEM) e o Partido Socialista Brasileiro (PSB) querem a saída da chefe de governo, mas defendem o programa de ajuste econômico e também condenam a corrupção.

A oposição procurou dar um caráter plebiscitário às manifestações convocadas pela internet por um grupo de organizações desconhecidas para a esmaga-dora maioria dos brasileiros. A contagem do número de participantes ganhou características de apuração de votos, só que os resultados pecaram pela falta de exati-dão. O diário O Globo, crítico do governo de Dilma Rousseff, disse que a polícia estimou em 2,3 milhões o total de participantes em 150 cidades brasileiras. A TV Globo, do mesmo grupo jornalístico, reprodu-ziu declarações de organizadores dos protestos afir-mando que 2,9 milhões de pessoas foram às ruas no domingo em que os antipetistas se vestiram de verde e amarelo (cores nacionais) em todo o país.

Além da polêmica terceira volta (terceiro turno no jargão brasileiro) o outro motivo de tensão era a possi-bilidade de atos de violência já que a polarização e radi-

calização das paixões políticas atingiram níveis críticos nas semanas anteriores às manifestações, depois da su-cessão de denúncias sobre o envolvimento de altos funcionários da estatal Petrobras no financiamento ilegal de partidos que apoiam o governo Dilma. Outro fator foi a intensa mobilização de grupos políticos ultra-conservadores a favor do impedimento (impeachment) imediato da presidente e da insistência de uma minoria radical em cobrar a volta dos militares ao poder.

Bombeiros petistas e antipetistasHavia o temor de confrontos violentos entre petistas e antipetistas nas ruas de São Paulo, a cidade mais pola-rizada politicamente na atual conjuntura brasileira. Os petistas realizaram em 13 de março marchas na capital paulista e em várias outras cidades brasileiras, tornando público o seu desafio à campanha dos antipe-tistas para desestabilizar o governo Dilma. Mas o pior não aconteceu para alívio dos dois lados já que entre a marcha dos petistas e os protestos dos antipetistas, sur-giram vários «bombeiros» em ambos os lados procu-rando esfriar a temperatura política.

Os partidos de oposição ao governo trataram de desvincular-se tanto da campanha a favor do impe-dimento da presidente como dos apelos a um novo golpe militar no Brasil. Os ex-ministros do Supre-mo Tribunal Federal, Ayres Britto e Carlos Velloso, afirmaram respectivamente que não há base jurídica real para propor um afastamento da presidente, e que um eventual retorno dos militares ao poder é inconstitucional.

Manifestações de ruaagravam indefinições políticas

As manifestações antigovernamentais de 15 de março pretendiam ser uma es-pécie de terceira volta das eleições presidenciais de 2014, mas apesar da pre-sidente Dilma Rousseff ter conseguido sobreviver a um desafio direto ao seu mandato, os protestos foram suficientemente numerosos e generalizados para transformá-la numa virtual refém política da classe média urbana brasileira.

Carlos Castilho FLORIANÓPOLIS

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No lado o Partido dos Trabalhadores, o ex-presi-dente Luís Inácio Lula da Silva amenizou sua retórica confrontacionista ao mesmo tempo em que porta-vozes da presidente adotaram um perfil conciliador, afirman-do que os protestos oposicionistas foram legítimos e que o governo iniciará um diálogo com a oposição. Nada de muito concreto em termos de iniciativas novas, fato que pode ser explicado pela existência de fortes rumores sobre divergências entre a presidente Dilma e seu antecessor, Lula da Silva. O pomo da discórdia estaria na política de ajuste fiscal, na estratégia de combate à corrupção e ao temor de que a reduzida agressividade política da presi-dente comprometa irremediavelmente a volta de Lula ao poder nas eleições presidenciais de 2018.

Os protestos de 15 de março mostraram o alto grau de insatisfação da classe média brasileira que saiu às ruas na proporção de cinco pessoas para cada parti-cipante das marchas petistas, integradas basicamente por sindicalistas, estudantes, agricultores sem terra e baixa classe média, a principal beneficiária dos progra-mas de redistribuição de renda adotados pelos gover-nos do Partido dos Trabalhadores desde 2002. A insa-tisfação dos oposicionistas esbarra, no entanto, na ausência de propostas concretas e objetivas para acabar com o impasse entre governo e oposição.

O quadro político brasileiro provavelmente não mudará rapidamente porque a situação é bem mais complexa do que imaginam os oposicionistas. Para o governo deixar de ser refém da insatisfação popular, este necessita de resultados econômicos rápidos e ca-pazes de reduzir o aumento generalizado de preços.

Precisa também reformar o sistema de financiamento de campanhas eleitorais para impedir doações ilegais de empresas a partidos políticos, e punir os responsá-veis pela lavagem de dinheiro gerado pelo superfatu-ramento de obras públicas que vai para contas ilegais em paraísos financeiros.

A recuperação da economia não tem prazo realista para produzir resultados animadores por-que depende:

a) Da situação internacional, especialmente do petróleo;

b) Do fim da seca que provocou aumentos de até 66% nas contas de luz dos brasileiros;

c) Do restabelecimento da confiança dos empresá-rios privados na política econômica do governo.

Por seu lado, a reforma política depende da aprovação de projetos pelo Congresso brasileiro, onde o governo é minoritário, desde que ficou clara a «traição» do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), que teoricamente é aliado de Dilma mas na prática obstrui os projetos governistas, na Câmara de Deputados e no Senado.

O julgamento dos funcionários e políticos envol-vidos no escândalo de propinas da Petrobras só deve começar em maio ou junho e vai se prolongar pelo menos até dezembro ou janeiro de 2016. Assim, o governo dificilmente terá resultados palpáveis capazes de atenuar a irritação da classe média urbana antes do final do ano, o que implica um longo período de ins-tabilidade política com risco de gerar um perigoso cli-ma de ingovernabilidade.

A oposição procurou dar um caráter plebiscitário às manifestações convocadas pela internet

Pelo menos dois milhões de brasileiros saíram à rua em protesto

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brasil

previsão foi feita pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, em

março, quando assinou uma resolução que estabelece cotas raciais nos concursos públi-cos para cargos efetivos no STP e no Con-selho Nacional de Justiça (CNJ). A resolu-ção ora assinada regulamenta a lei, aprovada pelo Congresso em 2014, que determina a reserva de 20% de vagas para negros em concursos públicos sempre que o número de vagas for superior a três. A lei aplica-se a concursos realizados no âmbito da adminis-tração pública federal, das autarquias, fun-dações públicas, empresas públicas e socie-dades de economia mista controladas pela União. Lewandowski acredita que o exem-plo deverá ser seguido por outros tribunais. Alguns estão discutindo o tema e em breve o assunto deverá ser submetido ao CNJ.

Poderão concorrer a estas vagas os candidatos que se autodeclararem negros ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça usado pelo Instituto Brasileiro de Geogra-fia e Estatística.

Dados do Ministério da Educação (2013), veiculados num estudo publicado na revista Fórum, sobre os dez anos das co-tas raciais para as universidades públicas, mostram que após adesão de algumas uni-

versidades ao sistema de cotas a percenta-gem de negros que cursam ou concluíram um curso superior no Brasil passou de 4% em 1997 para 19,8%, em 2013 (trata-se da etapa em que se verificou maior evolução da taxa da população negra, cerca de 200%), com destaque para a ação desenvolvida pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Passados dez anos, 32 das 38 uni-versidades estaduais (provinciais) já adota-ram modelos de ações afirmativas.

A maioria das universidades federais só adotou o sistema de cotas em 2012, quando foi aprovada a lei que as obriga a destinar 50% das matrículas a estudantes que se auto-declaram negros, pardos ou índios, os de baixa renda ou os que tenham feito integral-mente o ensino médio em escolas públicas. Em 2013 o número de vagas disponível para cotistas era de 188 mil. Na edição de 2014 do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 58,85% dos inscritos se declararam negros enquanto no Programa Universidade para Todos (PROUNI) chegavam a 51,73%.

A política de cotas foi sem dúvida a principal responsável pela evolução positiva da participação de negros e índios no ensino superior, criando oportunidades, diminuin-do as desigualdades entre os diferentes gru-pos raciais que compõem o mosaico popu-lacional brasileiro, mas ainda é preciso

Supremo Tribunal Federal do Brasil

adota cotas raciais

Instituído no Brasil em 2002 pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em 2004 pela Universidade de Brasília e a partir de 2012 pela maioria das universidades federais, o sistema de cotas raciais aos poucos se estende a outros setores da sociedade e, em breve, o Brasil deverá adotar a política de cotas em todo o poder judiciário

João Belisario RIO DE JANEIRO

Ricardo Lewandowski, presidente do STF

vencer muitas resistências e, segundo repre-sentantes de movimentos sociais, avançar para as universidades que ainda não adota-ram o sistema, entre elas duas das considera-das as melhores e maiores do Brasil: a USP e a UNICAMP.

Grande melhoria da situação social dos afrodescendentes Os indicadores construídos a partir do cen-so de 2010 feito pelo IBGE e a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), em 2001 e 2012, reproduzidos no livro «Situação social da população negra por estado», editado pelo Instituto de pes-quisa econômica aplicada e pela secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Ra-cial (SEPPIR), confirmam que a população

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manteve-se relativamente alta a disparidade entre brancos e negros na população com renda per capita familiar acima de um e meio salário mínimo se mesmo com algu-ma redução das desigualdades. Em 2001 estavam nesta faixa 23,3% dos brancos e 6,5% dos negros. Em 2012, estas percenta-gens chegavam a 36% entre os brancos e 15,6% entre os negros.

Entre 2001 e 2012 verificou-se um no-tável progresso em matéria de condições de habitação, com redução no padrão de desi-gualdade racial por situação de moradia. Os negros apresentaram uma evolução mais pronunciada do que os brancos, e as regiões não metropolitanas uma evolução mais acelerada que as metropolitanas. Quanto ao mercado de trabalho, que mostrou uma evolução positiva em todo o país, a popula-ção negra também se beneficiou das políti-cas sociais adotadas.

Segundo a publicação da SEPPIR, «houve redução da desigualdade racial no acesso a melhores ocupações, com sensível aumento de renda. Contudo, as característi-

houve uma melhoria geral nos rendimentos entre 2001 e 2012, inclusive com avanço na renda dos negros, insuficiente, no entanto, para eliminar as desigualdades. Em 2012 o valor obtido pelos negros nunca foi superior a 62,9% do que é pago aos brancos.

Quanto à escolaridade, considerando a população com mais de 15 anos, em 2012, 23% dos brancos tinham menos de quatro anos de estudo; entre os negros, este percen-tual atingiu 32,3%.

Em 2001, a população branca com nove anos ou mais de estudo era de 39,8% e subiu para 55,5% em 2012; na população negra, o mesmo indicador passou de 22,5% para 41,2%. A proporção de pessoas bran-cas com doze anos ou mais de estudo cres-ceu de 13,3% para 22,2%, enquanto entre os negros aumentou de 3,5% para 9,4%.

No ensino médio a desigualdade entre brancos e negros também sofreu relevante redução: em 2001, a frequência líquida dos brancos era o dobro da dos jovens negros e em 2012 a diferença passou a ser de um quarto. No ensino fundamental, as taxas de escolarização líquida praticamente se iguala-ram em 2012.

Além das ações afirmativas para a pro-moção da igualdade de oportunidades no ensino superior, Luiza Bairros, ex-ministra da secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da Repú-blica, afirmou, na apresentação do livro, que a melhora nas condições de vida de mulheres e homens negros verificada nos últimos anos se deve ao «efeito combinado de iniciativas governamentais que susten-tam a política de promoção da igualdade racial, a partir de outras duas dimensões principais: políticas socioeconômicas ge-rais que impulsionam a inclusão da popu-lação negra, com destaque para a expansão do mercado de trabalho formal, a política de valorização do salário-mínimo e a am-pliação da cobertura da previdência social e dos programas de redução da pobreza; ações para o atendimento a direitos básicos da população negra, por meio da incorpo-ração da perspetiva racial na execução de políticas setoriais, como previsto no Pro-grama Brasil Quilombola e no Plano Na-cional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana».

negra brasileira, que em 2013 representava 53% do total (negros e pardos), deixou de estar concentrada entre os mais pobres.

A parcela com menos de meio salário mínimo passou de 65,8% em 2001 para 38,6% em 2012, embora ainda seja maio-ritária entre os pobres. Em 2012, o total de brancos nesta faixa de renda era de 19,2%. Na categoria intermédia, de meio a um e meio salário mínimo, e que segun-do a definição brasileira supera a pobreza, brancos e negros tinham em 2012 uma participação muito próxima, 44,9% e 45,8%, respetivamente.

A redução da pobreza e também da de-sigualdade neste período estendeu-se a todas as raças, sobretudo para a população negra. Segundo a publicação, entre 2001 e 2012

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A política de cotas foi a principal responsável pela evolução positiva da participação de negros e índios no ensino superior

cas da ocupação e da remuneração ainda são, indiscutivelmente, a arena na qual os negros encontram as maiores desvantagens, refletindo os efeitos do racismo e da discri-minação nas condições de inserção. Os ne-gros ainda ocupam posições mais precárias, recebem remunerações menores e são mais afetados pela desocupação.

Comparando 2001 e 2012, nota-se uma grande redução na proporção de deso-cupados em todas as faixas de idade, mas não nas desigualdades. Entre os trabalhado-res negros de 22 a 29 anos a taxa de desocu-pação permaneceu 31% superior à dos brancos e entre os trabalhadores de 45 a 60 anos a taxa dos negros passou a ser 21% superior à taxa dos brancos, que em 2001 era de 16%. O estudo revela também que

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O PROFIR constitui uma das componentes do Programa de Industrialização de Angola 2013-2017 e agrega um conjunto de medidas e um plano de acção que, de forma articulada com outros programas em curso ao nível local, concorrem para o fomento da pequena indústria rural.

O PROFIR tem como objectivo estimular os empresários, camponeses e pequenos agricultores a criar pequenas indústrias enquanto importante alavanca de diversificação das oportunidades de emprego e a melhoria da qualidade de vida nos municípios, bem como gerar rendimento das comunidades no meio rural e dinamizar a economia local.

MINISTÉRIO DA INDÚSTRIA

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Um samba que destoa na avenidamagine-se uma África representada por imagens do homem de Neandertal (que, aliás, não é originá-

rio dali), acompanhadas por alas de indivíduos riquíssi-mos, cobertos de marfim, ouro e pedras preciosas, chegando ao Brasil em navios também deslumbrantes, sem os tormentos da escravidão. Assim desfilou a ima-ginação da escola de samba Beija-Flor, sediada na cida-de fluminense de Nilópolis, para sagrar--se vencedora no torneio das escolas do carnaval carioca deste ano.

Observa o escritor nigeriano Wole Soyinka, Prêmio Nobel de Literatura em 1986: «Sempre que vou ao Brasil tenho a impressão de que uma parte do país pensa ‘não temos nada a ver com a herança africa-na’». Soyinka tem razão ao falar de «uma parte» apenas, porque oficialmente o Brasil é o único país latino-americano com um dis-positivo legal (Lei 10639/09) que obriga a sociedade inteira a assumir a herança cultural africana como uma precondi-ção essencial do desenvolvimento do conhecimento.

É uma lei acatada, mas não cumprida: a África que costuma desfilar no carnaval é a do desconhecimento. É difícil meter na cabeça dos carnavalescos cariocas qualquer noção de realidade africana. Até aí parecem admissíveis os absurdos históricos e antropológicos, considerando-se o grau de liberdade ficcional das esco-las de samba com relação aos seus temas.

Este ano, porém, o exagero na dose foi além de to-das as medidas. Subvencionado por dez milhões de reais [cerca de três milhões de dólares], o enredo da Beija-Flor homenageava a África na figura da Guiné Equatorial, uma ditadura de quase quatro décadas, violadora dos direitos humanos e campeã, não da ale-gria, mas da opressão econômica e política de seu povo. E assim, de repente, um mal-estar público, que nor-malmente poderia dissipar-se nas Cinzas da Quaresma, ganhou foros de questão cultural, política e moral, com repercussão continuada na grande imprensa brasileira.

Cultural: As escolas de samba constituem uma sin-gularidade cultural que resultou da coalizão de músicos negros com moradores de bairros pobres do Rio de Ja-neiro. Mas o atual excesso de efeitos de show business e a hipertrofia do dinheiro atuam na contracorrente dessa singularidade.

Política: Enquanto espetáculo central da maior festa popular do país, com dinheiro público investido,

o desfile das escolas de samba está sujeito a pressões de várias ordens.

Moral: É longa a história do patrocínio de contra-ventores (bicheiros e, depois, traficantes de drogas) ao desfile. Não apenas isso: gente saída dos porões de tor-tura e matança do regime militar dirigiu abertamente o espetáculo. Por que todo o clamor midiático de agora a

propósito dos dez milhões doados pela Guiné Equatorial à Beija-Flor?

Possivelmente pela grande visibilida-de midiática daquilo que o grego antigo chamava de hubris, a desmedida, a ser punida pelos deuses.

Em primeiro lugar, o exagero da dis-sipação de riquezas por parte de Teodoro Obiang Mangue, o Teodorin, filho do ditador Teodoro Obiang Nguema Mba-sogo. Em segundo, o contraste entre a

riqueza do país e as más condições de vida da popula-ção. Sabe-se que o dinheiro doado à Beija-Flor seria suficiente para abastecer de água potável Malabo, a ca-pital federal, onde menos da metade da população tem acesso ao líquido, e dez por cento das crianças morrem antes de completar cinco anos. Não há imprensa livre, nem rádio, nem tevê. Universidade? Existe uma, sim, mas sem eletricidade e sem alunos.

Com carnaval e tudo, o Brasil encara atualmente, além de maus prognósticos financeiros, uma crise mo-ral espelhada em escândalos de corrupção generalizada. Empresários e políticos estão sendo postos na cadeia. E agora pairam suspeitas sobre os canais escusos do di-nheiro de Teodoro Mangue para chegar à escola de samba. Aos olhos da esfera pública brasileira, tudo isso é demais – é a hubris temida pelo velho grego.

O indigno que vem de fora junta-se ao podre que exala de dentro.

A crónica de Muniz Sodré

Sabe-se que o dinheiro doado à Beija-Flor seria suficiente para abastecer Malabo de água potável

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70 abril 2015 – África21

ma sucessão de incapacidades e de intromissões grosseiras na vida democrática de diferentes países

americanos detonou, em princípios do ano, quando se soube que os dispendiosos servi-ços de inteligência não eram outra coisa que uma perigosa base operativa de espiões in-

ternos ou de meros serventes que se ofere-ciam à melhor oferta e para qualquer tarefa. Desde então, iniciou-se um processo de re-visão que, embora sem responder primeiro às perguntas centrais de «porquê» e «para quê», se destina a «restruturar, reforçar e profissionalizar» – os três termos são idên-

ticos – as agências de espionagem da Argen-tina e do Perú.

Com uma demora inocultável, os go-vernos dos dois países prosseguiram um caminho que tinha começado a ser per-corrido pela Colômbia em 2011 e que fora precedido por uma farsa de reorgani-zação imposta no Chile em 2004, quase um quarto de século depois do fim da ditadura civil-militar liderada pelo gene-ral Augusto Pinochet (1973-1990).

A partir de 15 de janeiro, uma suces-são de publicações da imprensa peruana mostrou que a Direção Nacional de Inte-ligência (DINI) se dedicava a espiar polí-ticos – incluindo a vice-presidente Marisol Espinoza e o ex-Presidente Alan García –, jornalistas e líderes sindicais. Três dias depois, na Argentina, aparecia morto o procurador Alberto Nisman, encarregue

Labirintos dos serviços secretosamérica latina

A tortuosa história dos serviços secretos americanos parece ter começado a percorrer o caminho da sua restruturação. Embora por enquanto as mudanças pareçam apenas formais, no Perú e na Argentina procura-se tornar transparente o trabalho dos espiões. A Colômbia já tivera que fechar a sua agência em 2011 e o Chile fez uma espécie de modificações em 2004.

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Milhares de pessoas juntaram-se na Plaza de Mayo, em Buenos Aires, para protestar contra a morte do procurador Alberto Nisman

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çá-la e profissionalizá-la». Anunciou-o a 9 de fevereiro, e logo a 12 soube-se o nome do encarregado da tarefa. Trata-se de José Martín Sal y Rosas, um ex-camarada de Humala no exército e na Escola das Amé-ricas dos Estados Unidos, uma entidade de fama criminal mais conhecida na América Latina como a «Escola dos Ditadores».

Piloto com larga experiência, Sal y Rosas foi condenado a nove anos de pri-são por colaborar com os narcotraficantes do cartel mexicano de Tijuana, depois de se ter provado que utilizava aviões Anto-nov do exército para transportar cocaína peruana destinada ao México. Por cada viagem que realizava com proteção mili-tar, o cartel de Tijuana pagava-lhe 80 mil dólares, apenas isso. A pena começou a ser cumprida em 2007, no entanto, ao fim de quatro anos, num belo dia e sob a maior discrição, foi libertado e nomeado chefe da DINI, onde administra os 7,6 milhões de dólares anuais de gastos confi-denciais da Direção.

Este «contratempo» – a divulgação de que Sal y Rosas dirigiria a restruturação da DINI – obrigou a prolongar o período de encerramento da agência, de 180 para 240 dias, mas ele manter-se-á responsável por essa tarefa.

Debate público na ArgentinaNa Argentina o processo é mais transpa-rente. O Governo enviou ao Congresso o projeto de lei que dissolve a SIDE e cria a Agência Federal de Inteligência (AFI). Além disso, deu à sociedade civil a possi-bilidade de expor propostas numa au-diência pública. Os únicos que se nega-

ram a participar no processo deliberativo foram os deputados da oposição, que sem nenhuma razão aparente recusam fazer parte de qualquer ato oficial e até garan-tem que, se alguma vez chegarem ao go-verno, anularão todas as leis democratica-mente aprovadas desde maio de 2003, quando assumiu o poder Néstor Kirch-ner, marido e antecessor da atual Presi-dente Cristina Fernández.

Apesar da maior transparência, no en-tanto, todo o pessoal da ex-SIDE, com a sua antiguidade, e sobretudo com os vícios que lhes permitiram sobreviver a todos os regimes e a todos os presidentes, passam a integrar os quadros da futura AFI.

O modelo proposto no projeto de «restruturação, reforço e profissionaliza-ção» do Governo argentino tem gigantes-cas diferenças com o atual, estipulado por igual para todos os países americanos desde o fim da II Guerra Mundial quando, no quadro na Guerra-fria, os Estados Unidos impuseram um esquema de defesa e inteli-gência adequado aos seus interesses, «algo assim como umas mini-CIA, com os seus objetivos e a sua corrupção», disse o politó-logo argentino Óscar Laborde.

Timidamente, no Chile e no Uruguai, muitas vozes reclamam que se comece a falar do tema, tomando como ponto de partida o modelo argentino. Há vários as-petos que atraem os setores progressistas de ambos os países. A liquidação da SIDE traz consigo a proibição aos futuros serviços secretos de participar em qualquer ativida-de relacionada com a repressão e utilização (dos espiões) como força policial, e só se aplicará a inteligência criminal quando obedecer a um pedido judicial expresso relativamente a uma causa específica. Os valores concedidos aos organismos dos serviços secretos serão públicos e apenas serão confidenciais os que estejam relacio-nados com o cumprimento de ações rela-cionadas com serviços secretos.

O projeto estabelece em 15 anos o pra-zo para a divulgação dos arquivos mas, no que representa um grande avanço a favor dos direitos civis, qualquer pessoa com inte-resse legítimo poderá pedir a disponibiliza-ção imediata de informação que a afete.

O governo argentino enviou para o Congresso um projeto de lei transparente que dissolve a SIDE e cria a Agência Federal de Inteligência

Por cada viagem que realizava com proteção militar, o piloto peruano Sal y Rosas recebia do cartel mexicano de Tijuana apenas 80 mil dólares

da paralisada investigação a um atentado terrorista perpetrado em 1994 contra a AMIA, uma entidade da comunidade ju-daica, em que morreram 85 pessoas. Soube-se então que Nisman era manipu-lado pelos espiões da CIA que operavam a partir da chamada «missão» na embaixada dos Estados Unidos, mas também pelo chefe dos serviços secretos Antonio Stius-so, o mais antigo agente da Secretaria de Inteligência do Estado (SIDE). Por razões ainda não percebidas, Stiusso e os seus amigos da CIA usavam Nisman para tra-var a causa e encobrir os autores do maior atentado terrorista da história argentina.

Não menos turvo era o papel dos es-piões peruanos dedicados a intrometer-se na vida privada dos seus compatriotas. Depois das denúncias na imprensa, soube--se também que durante quatro anos pelo menos três agentes da secreta naval forne-ceram abundante informação confidencial a um grupo de supostos empresários pes-queiros italianos que, na realidade, eram espiões do Chile, um país com o qual até janeiro do ano passado o Perú disputava as suas fronteiras marítimas no Tribunal In-ternacional de Justiça de Haia. «Tínhamos salários muito baixos e por cada relatório os italianos [os chilenos] davam-nos 200 dólares», assim se justificou um dos impli-cados. Não foi essa a mais patética das de-clarações. Outro dos agentes perguntou: «se tantos camaradas trabalham para as empresas multinacionais porque não po-díamos nós aumentar os nossos rendimen-tos dando informações aos italianos [aos chilenos]?».

Ao Presidente peruano, Ollanta Hu-mala, não lhe restou outra alternativa se-não anunciar o «encerramento da DINI por 180 dias, a fim de restruturá-la, refor-

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quota-parte da Sociedade Nacio-nal de Combustíveis de Angola (Sonangol) na produção nacio-

nal de petróleo bruto subiu de 9%, em 2013, para 13% em 2014. No entanto, essa subida foi, de forma drástica, inver-samente proporcional aos resultados fi-nanceiros. De forma pragmática, Fran-

cisco de Lemos, presidente do Conselho de Administração da petrolífera angola-na, referiu-se ao ano de 2014 como um ano «bastante difícil» para o grupo, devi-do a um conjunto de fatores. «Tivemos resultados negativos em algumas empre-sas, mas noutras tivemos resultados posi-tivos. Não é uma situação de estranhar,

porque nós já esperávamos. No geral, o ano foi difícil», disse Francisco de Le-mos, numa conferência de imprensa realizada em Luanda para apresentação dos resultados anuais do grupo.

No final de 2014, a Sonangol apre-sentou um resultado líquido de 710,3 milhões de dólares, contra os três mil milhões de dólares alcançados no ano anterior, o que representa uma descida de 77%. As perdas foram justificadas com as flutuações do mercado, a baixa do preço do barril e com a redução da produção petrolífera.

«Nós experimentámos dois períodos que se revelaram cruciais para o nosso

Flutuações na produção de petróleo e a baixa do preço do barril contribuíram para uma redução dos resultados de 2014 da petrolífera angolana

adriano de sousa

empresas & negócios

NÚMEROS E FACTOS DO UNIVERSO SONANGOL

2014, um ano difícil para a petrolífera angolana

Apresentação dos resultados da Sonangol

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África21– abril 2015 73

dia mensal reduziu-se para 57 dólares o barril em dezembro», explicou o PCA da Sonangol.

Dito de outra forma, no período do ano em que a Sonangol teve os níveis de produ-ção mais baixos, registaram-se, no mercado, preços mais elevados, e, no segundo período do ano, quando a produção aumentou os preços baixaram consideravelmente.

Segundo Anabela Fonseca, adminis-tradora da Sonangol, os maiores clientes da petrolífera no ano de 2014 foram a Unitec, da China, que comprou à Sonangol 82.470.249 barris, o equivalente a 32,6% das exportações da Sonangol. A BP com-prou 20.869.934 barris (8%) e a Shell 9.287.217 barris. No que respeita ao desti-no das exportações, os países que mais compraram o petróleo angolano foram a China, Índia, Espanha, Canadá e Taiwan. Para o continente asiático seguiram 169.618.704 barris, enquanto para os Es-tados Unidos, no ano passado foi enviado apenas o equivalente a 3% das exportações de petróleo, um total de 7.616.341 barris (cerca de oito carregamentos).

Além da exportação do petróleo bruto, Anabela Fonseca lembrou que a Sonangol tem a sua atividade internacio-nal de exportação do produto refina-do. Neste âmbito, a concessionária an-golana exportou para São Tomé e Príncipe gasóleo, gasolina, e JET 1 em pequenas quantidades. Exportou igual-mente nafta e fuel, assim como uma pe-quena quantidade de gás butano e pro-pano proveniente da Sonagás.

Metas para o futuroSobre o futuro, o presidente do Conse-lho de Administração da Sonangol apontou uma meta de produção de dois milhões barris por dia, além do alcance de um rácio de reservas/produção de

NÚMEROS E FACTOS DO UNIVERSO SONANGOL

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Francisco Lemos, presidente do Conselho de Administração da Sonangol

As perdas foram justificadas com as flutuações do mercado, baixa do preço

do barril e redução da produção petrolífera

pelo menos 20 anos. É esperança da pe-trolífera atingir o patamar, em 2020, de uma quota de mercado de produção própria correspondente a 20% da pro-dução nacional de petróleo bruto. Outro dos objetivos delineados é a manutenção da liderança no mercado de refinados de petróleo bruto e gás, não inferior a 65%, como indicou Francisco de Lemos.

Foram também definidos como objeti-vos fundamentais da estratégia de afirma-ção e desenvolvimento da Sonangol o iní-cio da construção das unidades de processo industrial da Refinaria do Lobito, em 2015, e a conclusão, em 2016, da constru-ção do Terminal Oceânico da Barra do Dande, com capacidade para 640.000 metros cúbicos de combustíveis e gás buta-no. A finalização dos parques de combustí-veis no Soyo, Lubango e Namibe também integra os planos da maior empresa ango-lana. A Sonangol prevê ainda a aquisição de quatro navios Suezmax (petroleiros com capacidade de grande armazenamen-to apropriados para navegar no Canal de Suez), dois dos quais já se encontram em construção. Ainda para 2015 está em perspetiva a construção dos edifícios sede da Sonangol em Cabinda, Soyo, Malange, Lobito, Huambo e Lubango.

desempenho. De janeiro a junho de 2014 experimentámos uma queda acen-tuada que atingiu a sua média diária mais baixa no mês de março. Essa média foi de 1.474.066 barris de petróleo por dia. Os efeitos dessa redução foram par-cialmente compensados com a variação positiva do preço do petróleo. Após ju-nho de 2014, a entrada em produção do campo Clov, no Bloco 17, e do campo Polo Oeste, em novembro do mesmo ano, permitiram a recuperação da pro-dução para cerca de 1.800.000 barris/dia. Nesse mesmo período, observou-se uma redução abrupta do preço médio de venda. De 110 dólares em junho, a mé-

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cplp

potencial existente em cada um dos países da CPLP, ainda que a escalas diferentes, é de

grande relevância e constitui um valor acrescentado que pode ajudar a reforçar a sua posição a nível mundial. As fontes não renováveis, como o petróleo, gás natural e

Nas últimas décadas, foram feitas no-vas descobertas de energias fósseis. Um grupo considerável de empresas em países como Portugal, Brasil, Angola e Moçam-bique já atua neste domínio, por impulso também do dinamismo gerado pela evolu-ção tecnológica.

Angola e Brasil ocupam uma posição inquestionável na produção e exportação de petróleo. Apesar de algum abranda-mento nos investimentos, as metas de produção angolana continuam elevadas e as «perspetivas largamente positivas», com previsão de ultrapassar os dois milhões de barris/dia em 2018, de acordo com o mais recente relatório da Business Monitor In-ternacional (BMI).

No entanto, muitos empresários com presença em Angola manifestaram alguma

Países lusófonos reivindicam lugar no mapa da energia mundial

carvão, bem como as renováveis que in-cluem a biomassa, hídrica, biocombustí-veis, eólica e solar, constituem uma enor-me base para a configuração de um modelo de desenvolvimento sustentável dos países deste bloco de descontinuidade geográfica.

Estima-se que o potencial energético dos países lusófonos, em 2015, corresponda em conjunto ao sétimo maior produtor do mundo de hidrocarbonetos. Os decisores consideram que o setor poderá contribuir para o reforço da influência dos «nove» na cena internacional. Em junho, discutem como beneficiar melhor dos recursos para um desenvolvimento sustentável.

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reserva em relação aos reflexos negativos da queda do preço do petróleo na economia angolana. Mas analistas consideram opor-tuna esta situação conjuntural para que o país possa refletir se deve continuar a de-pender em grande medida do petróleo ou se vai investir noutras fontes de rendimen-to, apostando no setor do oil&gas e no fomento, por exemplo, da indústria petroquímica.

Moçambique, cuja economia deverá crescer este ano 7,5%, continua a viver o boom no setor do carvão e gás natural, que tem conhecido nos últimos anos um gran-de desenvolvimento. As recentes descober-tas colocam o país da África Austral na rota do mercado mundial do gás, pela apetên-cia que tem suscitado junto de várias multinacionais.

Apenas um exemplo, o potencial ener-gético identificado no âmbito do projeto de cooperação entre Portugal e Moçambi-que acabou por influenciar a Agência In-ternacional de Energias Renováveis, que está a desenvolver a sua massificação. Pre-sentemente, mais de cem países associa-ram-se ao projeto. Em 2009, entre 2,4% e 2,8% da produção mundial de energia primária (fóssil e renovável, respetivamen-te) vieram dos referidos países, estimando--se que, em 2015, estes ocupem a posição de sétimo maior produtor mundial de hi-drocarbonetos. As previsões da organiza-ção indicam que, em 2025, a produção no conjunto dos países da CPLP poderá ocu-par o quarto lugar a nível global.

Mercado europeu alicia lusófonosOlhando para o bloco europeu e para o mundo, Portugal considera que não há mercado interno de energia sem interliga-ções. Esta visão é sustentada a nível oficial

uma vez que o país ambiciona reforçar a sua posição como exportador de energias reno-váveis para o centro da Europa, levando a que a União Europeia (UE) possa também substituir alguma da sua dependência ener-gética do gás da Rússia por outras rotas e outras fontes de abastecimento.

Daí o repto lançado por Jorge Moreira da Silva, ministro português do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia. «Nesse sentido, esta é uma oportunidade para vários países da CPLP», que podem utilizar os terminais de Sines e outras plata-formas da Península Ibérica como canais alternativos de entrada de gás na UE. Com as condições que já reúne, o Porto de Sines é assim apontado como possível porta de entrada das exportações de todos os países da Comunidade.

O grupo agora alargado à Guiné Equa-torial, pode constituir-se num bloco de peso e reforçar a sua influência na cena in-ternacional, como sublinha Murade Mu-rargy, Secretário Executivo da CPLP. O diplomata moçambicano ao serviço dos «nove» fala de «soberania energética da CPLP» como um dos vetores do desenvol-vimento, reconhecendo a importância geopolítica, geoestratégica e geoeconómica dos recursos energéticos ainda por explorar devidamente.

Declaração de Cascais define estratégiasAtentos a esta realidade, governantes, aca-démicos, empresários e especialistas dos países lusófonos reúnem-se em Portugal, no mês de junho, para debater o valor económico do setor e as soluções energéti-cas adequadas. A I Conferência sobre Energia para o Desenvolvimento da CPLP, que se realiza entre 23 e 25 de ju-nho no Centro de Congressos de Cascais, pretende consolidar a articulação de uma primeira visão de conjunto nesta área estratégica.

A conferência é antecedida da I Reu-nião de Ministros da Energia, a 23 de ju-nho, também em Cascais, somando con-tribuições oportunas que vão ajudar a caracterizar a tal visão sobre a realidade atual do mundo da energia nos países do grupo. Por esta via, os principais atores

nesta operação querem criar as condições para que a CPLP tenha uma voz cada vez mais forte no debate sobre energia a nível global. A discussão, como propõe Portu-gal, não deve cingir-se ao plano político e científico. «É importante que a isto esteja associada uma oportunidade de coopera-ção empresarial», referiu Moreira da Silva no ato de apresentação pública das várias iniciativas ligadas ao tema, previstas para os próximos meses.

Salimo Abdula, presidente da Confe-deração Empresarial da CPLP, insiste no

Muitos empresários presentes em Angola manifestam reserva com os reflexos negativos da queda do preço do petróleo na economia do país

papel do setor privado na concretização de políticas de desenvolvimento através de soluções adequadas, apontando que é pre-ciso saber usar a energia como fonte gera-dora de negócios e emprego duradouro. Por outras palavras, o desafio é valorizar o potencial existente, tornar o setor mais atrativo e competitivo, equacionando o lugar da CPLP no xadrez mundial. Por outro lado, como defende Abdula, é preci-so torná-lo mais sustentável no plano do desenvolvimento económico e social em benefício das populações dos países do grupo.

Os resultados destes eventos serão igualmente úteis para o diálogo internacio-nal, que decorre até ao final deste ano, so-bre as alternativas energéticas. A conferên-cia acontece numa altura crucial e pertinente em que também se discutem os Objetivos de Desenvolvimento do Milé-nio pós-2015. Porque, tal como a água, a energia faz parte de uma das pré-condições para o desenvolvimento e inclusão social sustentáveis. É provável que das conclusões de Cascais vingue a ideia de criação de um consórcio petrolífero da CPLP, proposta antes formulada por Timor-Leste.

Moçambique, cuja economia deverá crescer este ano 7,5%, continua a viver o boom no setor do carvão e gás natural

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76 abril 2015 – África21

publirreportagem

Orestaurante Sabores da Terra, si-tuado na baixa de Luanda, não se distingue apenas pela sua

gastronomia variada, excelência no serviço ou pela competência dos seus profissionais, mas também pela sua beleza e elegância.

Inaugurado a 27 de janeiro, o espaço tem atraído um público variado, sobretudo

José Alcouce, chefe de cozinha

Sabores da Terra encantam Luanda

o da classe laboral. «O nosso restaurante está aberto a todos os interessados. Sabe-mos que estamos numa zona em que se encontram instaladas muitas empresas e preocupamo-nos em atender também este público. Especificamente para as empresas, nós confecionamos pratos rápidos, um de peixe e outro de carne. Deste modo, quem

trabalha pode vir cá almoçar e fazê-lo co-modamente em uma hora, mais ou menos, que é geralmente o tempo disponível para almoço», explicou João Carlos Duarte, um dos sócios do estabelecimento.

Embora esteja numa zona também residencial, são mais os trabalhares que afluem ao restaurante, compreendendo

Foi inaugurado a 27 de janeiro, já se afirmou pela sua qualidade e oferece serviços de restauração, padaria e pastelaria. Está aberto toda a semana, emprega 40 pessoas, e é procurado por diversos tipos de clientes.

O serviço de qualidade é uma das mais-valias do Sabores da Terra

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A oferta é variada e um dos pontos fortes é o pão, já distribuído para outros estabelecimentos

tudo para garantir a excelência e qualidade que os nossos clientes merecem».

Uma paDarIa DE ELEIçãOO restaurante Sabores da Terra dá empre-go direto a 40 pessoas, dos quais «99% são nacionais». Nesta fase inicial o pessoal trabalha em dois turnos e a casa está aberta de segunda a segunda, a servir pequenos--almoços, lanches, almoços e jantares.

Todavia, um dos pontos fortes do res-taurante e que tem enchido de orgulho os seus proprietários é a sua padaria. Sabores da Terra é um dos poucos – senão o único – com serviço próprio de padaria à escala industrial. a padaria atende não só o res-taurante, mas também algumas empresas e até outros restaurantes, que solicitam a sua oferta. «Nós fazemos todo o tipo de pão, incluindo o integral, e brevemente vamos avançar para o pão de sementes. Quanto a bolos temos uma oferta diver-sificada, desde bolos para casamentos ou aniversários, a pastéis, entre outros», deta-lhou João Duarte. O Sabores da Terra está aberto entre as 6h30 e as 22h e dispõe de 88 lugares sentados.

cerca de 80% da clientela. «Se assim não fosse, nos fins-de-semana, que são os dias em que não há atividade empresarial, de-víamos ter uma afluência maior, o que não acontece», justificou.

Quanto ao atendimento, João Duarte garante que é o melhor que se pode encon-trar em Luanda. «Nós recrutámos pessoas

que vêm de outros restaurantes e pastela-rias, embora tenhamos dado oportunidade a pessoas que nunca trabalharam. apesar disso, contratámos ainda um formador que direciona e instrui os nossos funcionários. Temos também um acompanhamento constante por parte dos que têm mais ex-periência sobre aqueles menos experientes,

Inaugurado a 27 de janeiro, o restaurante tem atraído muitos clientes

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78 abril 2015 – África21

insumos

Bolsa de Casablanca no top-50 das praças financeiras internacionais A 17.ª edição do Global Financial Center Índex (GFCI), elaborado pelo think-tank londrino Y/Zen, coloca a bolsa de Casablanca no 42.º lugar entre 187 centros financeiros mundiais. A praça marro-quina, que progrediu nove lugares em relação ao índice anterior, mantém o segundo lugar em África atrás de Joanesburgo (32.º no ranking) e à frente da Maurícia. Nova Iorque, Londres, Hong Kong, Singapura e Tóquio lideram a classificação. O GFCI avalia a competitividade das praças financeiras a partir de dados que medem o clima dos negócios, o desenvolvimento do setor financeiro, o es-tado das infraestruturas e o nível do capital humano disponível, e mediante uma sondagem junto de 3500 profissionais do setor.

ABB constrói central elétrica a carvãona África do Sul O grupo tecnológico suíço-sueco ABB assinou com a Eskom, empresa pública de eletricidade da África do Sul, um contrato de 160 milhões de dólares para equipar uma central elétrica a carvão com os sistemas de última gera-ção. A central termoelétrica de Kusile, atualmente em construção, terá uma produção de 4800 MW e será a quarta maior do mundo. A ABB será responsável pelo desenvolvimento, instalação, arranque e otimização da central. Esta nova geração de centrais a carvão é mais efi-ciente e liberta menos gases com efeito de estufa que as centrais clássicas.

Noventa por cento da energia produzida pela Eskom deriva de centrais a carvão, único combustível fóssil exis-tente na África do Sul. A insuficiência da produção elétri-ca afeta gravemente a economia sul-africana e a entrada em funcionamento da central de Kusile destina-se a mi-norar os problemas causados pelos cortes de energia. A ABB é um dos líderes mundiais do setor das novas tec-nologias energéticas e já equipou outras centrais na África do Sul, Lesotho, Malawi, Botswana, Zâmbia, Zimbabwe e República Democrática do Congo.

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Uma nova capitalpara o EgitoO governo egípcio apresentou os planos da nova capital a construir em cinco anos entre as cidades do Cairo e Suez e que oferecerá uma melhor qualidade de vida a cinco mi-lhões de habitantes. O projeto apresentado pelo ministro da Habitação, Mustafa Ka-mal Madbuli, será 12 vezes maior que Ma-nhattan, três vezes maior que Washington, o seu aeroporto internacional será maior que os de Singapura e Londres. Além do Governo, do Parlamento e das embaixadas a nova metrópole incluirá 2000 estabeleci-mentos de ensino e 300 hospitais.

A construção da primeira fase levará en-tre cinco e sete anos e custará 45 mil milhões de dólares. A decisão foi tomada tendo em conta a saturação da aglomeração do Cairo cuja população de 18 milhões de habitantes deverá duplicar nos próximos 20 anos.

A nova capital – que não tem ainda nome – faz parte de um pacote de projetos de investimentos que o Governo egípcio apresentou aos potenciais investidores numa reunião em Charm el Cheik de 13 a 15 de março. A Arábia Saudita, os Emira-dos Árabes e o Koweit prometeram 12 mil milhões de dólares, dos quais três mil mi-lhões em depósitos no Banco Central do Cairo e o restante em investimentos nos mais variados setores. Mas o Egito pretende diver-sificar as suas fontes de financiamento. O chefe da diplomacia norte-americana, também presente em Charm el Cheik, ape-lou à comunidade internacional e aos merca-dos para apostarem na economia egípcia.

Ampliação do porto português de Sines A sociedade PSA de Singapura, que gere o terminal de contentores do porto de Sines, vai investir 40 milhões de dólares em obras de ampliação que farão do porto de águas profundas do sul de Portugal o terceiro da península ibérica, atrás de Valência e Al-geciras (Espanha). Sines irá também subir no ranking europeu, passando do atual vigésimo lugar para o oitavo, depois de Roterdão, Hamburgo e Antuérpia mas à frente de Barcelona e Génova. Um projeto mais ambicioso, avaliado em 130 mi-lhões, teve de ser abandonado após o fracasso das negociações entre três grandes ar-madores mundiais (Maersk, CMA/CGM e MSC) provocado pela oposição da China à construção em Sines de um novo cais com capacidade para receber ao mes-mo tempo três porta-contentores gigantes. O projeto inicial devia fazer de Sines uma escala das rotas marítimas entre a Europa, Ásia e Américas.

Série televisiva angolana Windeckconquista públicos africanos Lançada em Luanda em julho de 2012, a produção da f irma Semba Comunicação é atualmente difundida um pouco por todo o continente, como na Costa do Marfim, Ga-bão, Quénia e Senegal, em versão original com legendas em francês ou inglês. Amor, sexo, homossexuali-dade, dinheiro, moda e glamour são os ingredientes desta produção que conta com a participação nos papéis principais de personalidades famosas do mundo da moda e do cinema lusófono como Micaela Reis (ex-miss Angola em Portugal), os mane-quins Celso Roberto e Fredy Costa e os atores Ery Costa e Grace Mendes. O argu-mento não é muito original e segue as receitas das telenovelas brasileiras, mas a série deslumbrou os telespectadores africanos com as imagens de uma Angola ainda largamente desconhecida: paisagens fascinantes, interiores luxuosos das moradas do jet-set local, banda sonora que inclui velhos sucessos da música popular angolana e o célebre kuduro.

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80 abril 2015 – África21

insumos

Os presidentes do Egito e do Sudão e o primeiro--ministro etíope assinaram a 23 de março um acordo de princípio sobre a partilha das águas do Nilo. Os etíopes chamam-lhe «Barragem do grande renascimento» e esteve à beira de causar uma guerra entre o Egito e a Etiópia. Construí-da sobre o Nilo Azul, que fornece 85% da água que abastece o Sudão e o Egito, situados a ju-sante, será a maior de África (três vezes maior que a de Assuão no Egito) e a terceira maior do mundo. Os custos – avaliados em 4500 milhões de dólares – serão inteiramente suportados pelo Estado etíope mediante um empréstimo inter-no. Os trabalhos deverão estar concluídos em 2017 e a central eléctrica produzirá 6000 MW. Além de cobrir as necessidades energéticas da Etiópia permitirá exportar eletricidade para os países vizinhos, gerando receitas anuais de 700 milhões de dólares.

O Egito opunha-se à construção desta barragem alegando que o seu enchimento – que levará três a cinco anos – e a uti-lização de uma parte da água para a irrigação afetaria o caudal

do Nilo à entrada no território egípcio, garantido por tratados internacionais. O acordo assinado sela a reconciliação entre os dois países e a espetacular melhoria das relações entre o Egito e os países da bacia do Nilo desde a chegada ao poder do pre-sidente Abdel Fattah al-Sissi.

Etiópia vai ter maior barragem hidroelétrica africana

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A barragem do grande renascimento

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África21– abril 2015 81

Navios franceses para Moçambique Os estaleiros Constructions Mecaniques de Normandie (CMN) de Cherburgo estão em vias de realizar um desafio técnico e comercial: a entrega em dois anos dos 30 navios encomendados por Moçambique em 2013. A primeira en-trega a realizar em abril é constituída por 24 barcos de pesca (arrastões). Três trimarãs serão entregues em junho à Guarda Costeira e três lanchas de interceção em setembro. O cum-primento dos prazos era uma das condições essenciais do contrato de 200 milhões de dólares, mas a rapidez da sua execução vai permitir também libertar espaço para a constru-ção de navios encomendados por outros países nomeada-mente africanos.

Credit Suisse com Big Boss africanoO grupo financeiro helvético Credit Suisse, um dos maiores do mundo, anunciou a 10 de março a nomeação de Tidjane Thiam para o cargo de presidente executivo. Nascido em 1962 na Costa do Marfim, diplomado na Escola de Minas de Paris, enquanto ministro marfinense do Planeamento e do Desenvolvimento (1998-99), levou a cabo um ambicioso plano de privatizações. Exilado em Paris apés o golpe de Es-tado do general Guei, ocupou cargos de responsabilidade em vários grupos privados na capital francesa. Em 2007 parte para Londres e em 2009 é nomeado presidente executivo da companhia de seguros britânica Prudential, cargo que ocupa até agora, sendo o primeiro negro a liderar uma das empresas líderes do FTSE-100.

Fundado no século XIX, em Zurique, o Credit Suis-se, especializado na gestão de fortunas e investimentos, está presente em 50 países e emprega mais de 45.000 pessoas. Realizou em 2014 lucros superiores a 2000 mi-lhões de dólares. Tidjane Thiam substituirá em junho o atual presidente executivo, o americano Brady Dougan, que foi afastado em consequência do escândalo que obri-gou o Credit Suisse a pagar uma multa de 2,5 mil milhões de dólares nos Estados Unidos, depois de ter sido acusado de ajudar os seus clientes em operações de evasão fiscal.

ANGOLA E MOÇAMBIQUE Um relatório do Banco Nacional do Qatar coloca Angola e Moçambique entre os seis países mais promissores em 2015 para os investidores globais. A estes so-mam-se o Quénia, Nigéria, Tanzânia e Uganda, todos conside-rados pelo banco como «diamantes económicos reais». Os as-petos positivos não escondem, no entanto, «os variados riscos que os investidores têm de enfrentar», como «problemas de segurança, maus ambientes empresariais, fraca implementação de projetos e dúvidas sobre a sustentabilidade dos défices orça-mentais e da dívida pública».

BANCO DE DESENVOLVIMENTO DE ANGOLA O BDA fi-nanciou 863 projetos ligados aos setores de agricultura, indús-tria, comércio e serviços, entre 2006 e 2014. A indústria absor-veu 51% do crédito, a agricultura 35% e o setor dos serviços 14%. O administrador executivo do BDA, Walter Barros, indi-cou que a evolução total do crédito foi realizada por intermédio de operações diretas e indiretas, cofinanciamentos e crédito agrícola de investimento.

NOVO BANCO INTERNACIONAL Brasil, Dinamarca, Holanda e Rússia anunciaram a decisão de aderir ao Banco Asiático de Investimento em Infraestruturas (AIIB) proposto pela China. Com estas adesões, são já 42 os fundadores da nova instituição financeira internacional. Lançado em outubro passado em Pe-quim por 21 países asiáticos, o AIIB foi visto por analistas ociden-tais como um desafio à atual ordem financeira internacional, dominada pelos Estados Unidos e a Europa, e uma tentativa de criar uma alternativa chinesa ao Fundo Monetário Internacional e ao Banco Mundial.

ANGOLA-jAPÃO O Ministério da Economia de Angola em parceria com a Embaixada de Angola no Japão organizaram em março o Fórum Económico Angola-Japão que contou com a presença de 37 empresas e de 118 empresários provenientes do país asiático. O evento pretendeu promover as potencialida-des de investimento em Angola e desenvolver alicerces para a criação de parcerias. Atualmente operam em Angola oito empre-sas japonesas. Angola compra maquinaria, equipamentos e veículos ao Japão, enquanto este é comprador de petróleo e gás angolanos.

GRUPO PESTANA O maior grupo hoteleiro português abrirá em 2017 um hotel em Marraquexe. É o segundo do grupo em Marrocos, depois de Casablanca, inaugurado em 2013. O projeto, que fará a recuperação do antigo Club Med, resul-ta de uma parceria com a Caisse de Dépôt et de Gestion, maior investidor institucional de Marrocos, estabelecida ao fim de nove meses de negociações. Com este hotel, o Pes-tana somará um total de dez unidades hoteleiras em África.

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Tidjane Thiam

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82 abril 2015 – África2182 novembro 2014 – África21

A Nova Movimento – empresa angolana proprietária da África21 – montou um sistema de recolha de assinaturas regionalizado, a fim de poder atender melhor, com mais rapidez e de maneira mais vantajosa, os diferentes assi-nantes da revista.

Assim, as assinaturas serão recolhidas, conforme os casos, em três centros: Luanda, Lisboa e Rio de Janeiro. Com exceção dos assinantes de Angola e Bra-sil, todos os demais receberão o seu exemplar pelo correio a partir de Lisboa.

Como os custos de envio também são variáveis, conforme as re giões, o preço das assinaturas é igualmente regionalizado.

Eis, a seguir, um quadro explicativo, com a tabela de preços das assinaturas e com os detalhes acerca dos centros onde os pagamentos deverão ser feitos, conforme os endereços dos assinantes.

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TABELA DE ASSINATURASREGIÃO SEMESTRAL ANUAL BANCO SWIFT CONTA IBAN / AGÊNCIA AGENTEAngola KZ 6.000 KZ 10.000 Keve BRDKAOLU 809026 AO 06004700000080902615124 MovimentoBrasil R$ 120 R$ 200 ITAÚ 69854-5 Agencia 0532 BELISANPortugal € 20 € 35

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Para começar a receber as revistas, basta enviar a ficha de assinatura, juntamente com o cheque ou o comprovativo do pagamento bancário, para os endereços abaixo indicados. Se preferir, pode escanear a ficha e o comprovativo do pagamento e enviá-los para os endereços eletrónicos indicados para cada local.Assinantes de Angola Assinantes do Brasil Assinantes de Portugal, Movimento, Lda BELISAN EDITORA, União Europeia e resto do mundoRua Frederico Welwitschia, n.º 82 Belisan Editora, Comércio e Serviços Ltda. - ME Triangulação, LdaBairro do Maculusso CNPJ     08.629.179/0001-52 Apartado 19059Luanda Estrada Rodrigues Caldas Nº 297 1990-999 LisboaAngola CEP 22.713-372- Taquara – Jacarepagua [email protected] Rio de Janeiro- RJ [email protected]: 912 442 453 [email protected] [email protected]

Nº 95 - ABRIL 2015 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / R$ 15

MOÇAMBIQUE

Assassínio de Gilles Cistacainda por explicar

BRASIL

Dilma Rousseffresiste ao cerco

A atração por ÁfricaTURISMO

A modesta fatia que o continente ocupa no turismo mundialestá a engordar com os visitantesa diversificarem os seus destinos

ANGOLA OGE aprovadono Parlamento

q Desejo assinar a revista África21 por 6 mesesq Desejo assinar a revista África21 por um anoNome: ___________________________________________________________________________________________Morada: _________________________________________________________________________________________E-mail: __________________________________________________________________________________________Número de assinaturas:______ Início da(s) assinatura(s) (mês) _________________________________________Vou efetuar o pagamento através de:q Cheque n.º ___________________ _ do Banco _______________________ em nome de

q Movimento, Lda _____________ q BELISAN, Lda q Triangulação, Ldaq Transferência Bancária para

q Movimento, Lda _____________ q BELISAN, Lda q Triangulação, LdaNo valor de ______________________ (por extenso: _________________________________________________ )Assinatura _____________________________________________________________ Data ___/___/ __________

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press release

n CUPIDO ANGOLA E BANCO DE INVESTIMENTO RURAL A Cupido Angola foi a agência escolhida para desenvolver a campanha de lança-mento do Banco de Investimento Rural (BIR), o mais recente projeto bancário an-golano, especializado no financiamento de atividades e projetos ligados ao agronegó-cio. A campanha será focada num conceito institucional e terá uma estratégia multi-meios. De acordo com Leandro Laborinho, CCO da Cupido Angola, «o timing de lan-çamento deste projeto é ideal, visto a diver-sificação de investimentos e o agronegócio serem no momento prioridade do Executi-vo e dos empresários». Com a primeira agência na cidade de Malanje e escritório de representação em Luanda, o BIR ofere-ce produtos e serviços a empresas e em-presários nas áreas da agricultura, pecuá-ria, avicultura, agroindústria e aquicultura. O plano de expansão do BIR inclui as pro-víncias do Kwanza Norte, Kwanza Sul, Bengo e Uíge.

n CONFERÊNCIA DE RISK & COMPLIANCE PARA ENTIDADES FINANCEIRASA gestão do risco operacional e a crescen-te pressão legal e regulamentar exigem que os profissionais do setor bancário e segurador estejam constantemente atuali-zados. Face à crescente necessidade de

um constante update de informação prática e de partilha de experiências na área finan-ceira, o iiR Angola prepara em conjunto com os profissionais da banca e seguros, a 1.ª Conferência de Risk & Compliance a realizar a 21, 22 e 23 de abril em Luanda. O dia 21 será dedicado aos Hot Topics de Corporate Governance, Compliance, Ges-tão de Riscos e Auditoria Interna, com a participação das autoridades de supervisão

do setor bancário e segurador e de reputa-dos profissionais do setor financeiro em Angola. O seminário Forensic Control reali-za-se a 22 e 23 de abril, dois dias intensi-vos de formação sobre Fraude em Entida-des Financeiras.

n NÓS SOMOS ENERGIA Tra ta -se de um programa educati-vo sobre as fontes de energia limpas e eficiência ener-gética, para crian-ças do 4.º ano de escolaridade, cria-do pela Cabeólica e pelo ECREEE – Centro para as Energias Renováveis e Efi-ciência Energética da CEDEAO, contando com o apoio do Ministério da Educação e do Desporto e da Direção-geral de Energia de Cabo Verde. Este projeto pretende dar a conhecer, de forma didática e divertida, as diferentes fontes de energia, os impac-tos que provocam no meio ambiente e sensibilizar as crianças para uma utilização mais racional da energia elétrica. Nós So-mos Energia pretende ainda promover al-terações de comportamentos para fomen-tar a eficiência energética e valorizar os recursos naturais existentes no país. Inicia-da em março, abrange cerca de 80 alunos de São Vicente. Em abril o projeto será estendido a outras escolas do país.

n PROTTEjA SEGUROS, NOVO OPERADOR NO MERCADO ANGOLANOA Protteja Seguros iniciou a sua atividade em 2014 com a introdução do Seguro Au-tomóvel e do Seguro de Viagem. Em 2015 a seguradora pretende conquistar a con-fiança do mercado angolano, abrir mais agências em Luanda e nas restantes pro-víncias. Ao longo do ano, a empresa espe-

ra disponibilizar mais três seguros: o Segu-ro contra Acidentes de Trabalho, o Seguro contra Incêndios e Outros Danos, e o Se-guro de Responsabilidade Civil. «Temos a certeza que este setor pode ser um motor para o desenvolvimento económico do país», referiu Agostinho Kapaia, PCA da Protteja Seguros. A nova seguradora foi apresentada oficialmente em fevereiro, pelo presidente da Associação das Segu-radoras de Angola, Aguinaldo Jaime, numa cerimónia em que participaram José Antó-nio da Conceição e Silva, ministro do Urba-nismo e Habitação, e José Pedro de Mo-rais, governador do Banco Nacional de Angola.

n PROVA DE VINHOS DA DÃO SUL EM LUANDAO vinho Cabriz Colheita Selecionada, da região portuguesa do Dão, foi dado a pro-var em Luanda a 11 de março por iniciativa da empresa Dão Sul. Além deste, foram apresentados pelo enólogo Osvaldo Amado

outros dois vinhos do Dão e da região da Bairrada e outro do Alentejo. «Todos são vinhos de estrutura média, acidez média e álcool médio e adaptam-se muito bem às iguarias angolanas», disse o enólogo. A Dão Sul detém marcas como a Quinta de Cabriz, Casa de Santar, Herdade Monte da Cal, Quinta do Encontro, Paço dos Cunhas de Santar e, no Brasil, a Vinícola Santa Maria. Desde 2011 que Osvaldo Amado é diretor de enologia da empresa. Além de presidente de júri em diversos concursos de vinhos, o enólogo já foi responsável por vários projetos nesta área e soma mais de 400 milhões de garrafas produzidas e cer-ca de 900 medalhas de Ouro e Prata em distinções nacionais e internacionais.

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30 anos da uccla

dmundo Rocha traz consigo em algumas folhas de papel as memó-rias escritas do seu tempo de jovem

ativista na Casa dos Estudantes do Império (CEI) para partilhar com o público. Ma-nuel dos Santos Lima, escritor e professor catedrático, recorda com factos e evidências os difíceis anos de 1950-60, marcados pela ditadura salazarista e por vários episódios que retratavam o desprezo da sociedade co-lonial portuguesa pelos negros vindos de África para estudar na então Metrópole.

«Não podíamos frequentar todos os mesmos sítios fora da Casa dos Estudantes do Império», recorda, apenas para dar um exemplo. «Enquanto os estudantes angola-nos de pele escura tinham uma média de mesada mensal entre mil e 1500 escudos, os mais claros recebiam até 3500 escudos».

Ambos angolanos, estes dois veteranos têm em comum o destino de terem vivido aquele período conturbado, sustentado pelo regime colonial português, e de terem servido na clandestinidade a causa naciona-lista, cujo espírito foi determinante para a luta pelas independências dos territórios então considerados portugueses. «Havia

plena consciência de que a independência seria o caminho a seguir», precisa o docente do Instituto Superior Politécnico Lusíadas do Huambo. «Até porque por toda a parte se falava disso. Também nas Nações Uni-das, o bloco afro-asiático fazia valer esse ponto de vista», lembra.

Já nos anos 50, era tema de conversa. Conta o jornalista Carlos Veiga Pereira, que confidenciava ideias sobre o assunto com o seu grande amigo e colega de quarto em Coimbra, António Agostinho Neto, procla-mado em 1975 o primeiro Presidente de Angola independente.

Tanto Edmundo Rocha, um dos diri-gentes do Movimento dos Estudantes Ango-lanos (MEA), como Manuel Lima, que viria a ser o primeiro comandante do Exército Popular de Libertação de Angola, incluem a lista de cerca de cem jovens africanos que fu-giram de Portugal de forma organizada, esca-pando à perseguição da PIDE. Foi determi-nante para essa fuga o papel desempenhado pelo MEA, apoiado por uma organização protestante com sede em Paris, por três agentes da CIA e pelo governo francês, se-gundo revelou o médico angolano no debate

realizado, em fevereiro, no Parlamento por-tuguês, por impulso de Vítor Ramalho, se-cretário-geral da União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa.

De Coimbra a LisboaA instituição dirigida por este luso-angolano está desde outubro de 2014, com o evento lançado em Coimbra, empenhada em pre-servar a memória coletiva e render a mereci-da homenagem àqueles homens e mulheres que, com a sua coragem, inteligência e de-terminação, levaram a bom porto a causa da liberdade e forjaram as condições para a au-todeterminação dos povos sob a dominação e repressão colonial. «Com a sua cantina, lar e posto médico, a CEI – cuja sede era no edifício na Avenida Duque d’ Ávila, n.º 23, na esquina com a Rua Dona Estefânia – foi, entre 1944 e 1965, uma âncora para muitos dos jovens vindos de África e da Ásia. Mais do que isso, e ao arrepio dos desígnios ofi-ciais, estimulou a troca de ideias entre jovens que sonhavam com o fim da discriminação racial e da desigualdade social». São palavras de Vítor Ramalho proferidas em Coimbra, onde funcionou uma delegação da CEI.

Lisboa rende homenagemà luta pela liberdade e independências africanas

Iniciada em 2014, em Coimbra – uma das cidades portuguesas que forjou muitos dos líderes africanos das antigas colónias –, a homenagem aos que lutaram pela liberdade e autodeterminação dos seus povos conhece o seu auge em maio, mês de África. A União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa, que assinala 30 anos de existência, realiza em Lisboa uma grande conferência para evocar a memória dos antigos associados da Casa dos Estudantes do Império.

João Carlos Luís de Almeida e Manuel Lima

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A Casa foi criada pelo regime português para melhor controlar os estudantes que vi-nham das colónias. Mas, «face à recusa de Salazar em aceitar o princípio da autodeter-minação das colónias portuguesas, muitos jovens associados da CEI promoveram ati-vidades culturais e políticas como forma de exprimir os seus anseios – a libertação dos territórios de que eram originários e o direi-to dos seus povos de conduzir livremente os seus destinos», lembrou Vítor Ramalho.

De várias gerações, figuras como Amíl-car Cabral, Agostinho Neto, Lúcio Lara, França Van-Dúnem, Pascoal Mocumbi, Mário Machungo, Joaquim Chissano, Pe-dro Pires, Miguel Trovoada, Alda do Espí-rito Santo, João Vieira Lopes, Pepetela e Gentil Viana, entre muitos outros que fize-ram parte do Movimento Associativo Estu-dantil, «são personalidades incontornáveis e referências obrigatórias», como aludiu o coordenador das homenagens em nome da Comissão organizadora.

Exemplo para os jovens africanosPor Lisboa ter sido a sede da CEI – justifica Vítor Ramalho –, a cidade sente-se no dever de prestar esta homenagem aos antigos asso-ciados da Casa. Em maio, de 22 a 25, tem lugar na Fundação Calouste Gulbenkian um colóquio sobre a CEI, que reunirá em Lisboa os antigos associados que exerceram funções de primeiro-ministro ou cargos de Presidente da República, como Fernando

França Van-Dúnem (Angola), Pascoal Mocumbi, Mário Machungo e Joaquim Chissano (Moçambique), Miguel Trovoa-da (São Tomé e Príncipe), Pedro Pires (Cabo Verde) e ainda Jorge Sampaio (Por-tugal). Por razões de saúde, a viúva Maria Eugénia Neto, que representaria Agostinho Neto, não estará presente no evento, o qual marca o encerramento da homenagem, que acontece no mês dedicado a África e no ano de celebração dos 40 anos de independência dos países africanos lusófonos.

No dia 21, é inaugurada uma exposição documental sobre a CEI, nos Paços do Concelho da Câmara Municipal de Lisboa, que também evocará o 30.º aniversário da constituição da UCCLA. «Um valioso es-pólio, ainda desconhecido, que permitirá rever a memória», diz Vítor Ramalho.

Segundo Edmundo Rocha, a atitude dos estudantes da CEI de participação ativa na luta antifascista e anticolonialista pode servir de exemplo às juventudes africanas dos países de língua oficial portuguesa, dedicando-se à construção dos seus países num quadro demo-crático, de progresso e de liberdade. Por seu lado, Luís de Almeida, embaixador de Angola na CPLP, exortou, no debate realizado no Parlamento português, à união e irmandade entre os africanos e portugueses, sobrepondo--se a eventuais contingências políticas, seguin-do o espírito que orientou a CEI e a ex--CONCP (Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas).

MELHORAR A QUALIDADEDE VIDA DAS POPULAçõES

Esta «grande homenagem», como faz questão de sublinhar Vítor Rama-lho, acontece no ano de celebração dos 30 anos de existência da UC-CLA, que, desde a sua criação, tem trabalhado no sentido de aproximar cada vez mais as cidades dos países membros. A instituição, que conta com cerca de 40 empresas associa-das, intervém no domínio da coope-ração descentralizada, promovendo o desenvolvimento económico, em-presarial e a cultura lusófona, assim como a formação profissional, as fi-nanças, o urbanismo e património, o saneamento e ambiente, e a educa-ção e saúde. Entre os projetos, parti-cipou na reabilitação de edifícios em Díli (Timor-Leste), da marginal da Cidade da Praia (Cabo Verde), onde também interveio, no ano passado, em iniciativas para o abastecimento de água a 13 bairros pobres, através de uma candidatura apresentada à União Europeia (UE), com o apoio do Instituto Camões. Na cidade de São Tomé, decorrem trabalhos de sanea-mento básico, também no âmbito de um projeto apoiado pela UE. Igual ação foi desenvolvida para a limpeza da capital guineense, Bissau, tendo o país beneficiado de outro projeto de fomento ao empreendedorismo na área da apicultura.

Além de uma possível participa-ção na organização da toponímia de Luanda, técnicos da UCCLA reali-zam no município de Cazenga, em Angola, o levantamento das necessi-dades em matéria de saneamento básico. A 28 e 29 de abril, Luanda acolhe o 2.º Fórum sobre Investimen-tos em Infraestruturas em África, do qual a UCCLA é uma das entidades parceiras. Será uma «excelente pla-taforma» para o debate de soluções visando responder ao alerta dado pelas Nações Unidas, de que as po-pulações urbanas do continente afri-cano vão aumentar em cerca de 50% até 2030 e que poderá existir a ne-cessidade de construção de novas cidades.

Edmundo Rocha e Vítor Ramalho

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a inauguração da exposição «You Love Me,You Love Me Not» que reúne na Galeria Municipal Almeida Garrett do

Porto, até 17 de maio, uma seleção de obras da sua coleção africana de arte contemporânea, Sindika Dokolo, fundador e presidente da Fundação que leva o seu nome, anunciou o arranque de «uma parceria a longo prazo, de dois, três anos» entre Luanda e o Porto. Após a exposição, outros projetos serão desenvolvidos ainda este ano nas áreas da música e do teatro. O intercâmbio cultural patro-cinado pela Fundação e a Câmara Municipal do Porto prevê a criação de residências artísticas que permitam a artistas portugueses viverem experiências africanas e vice-versa. O presidente da Câma-ra do Porto, Rui Moreira, e o vereador da cultura, Paulo Cunha e Silva, afirmam que a iniciativa vem preencher uma lacuna no pa-trimónio cultural da cidade. A autarquia atribuiu por unanimidade a medalha de mérito no grau de ouro a Sindika Dokolo.

Natural do ex-Zaire (hoje RDC) e casado com Isabel dos Santos, filha do Presidente angolano, Dokolo tem créditos firma-dos no mundo das artes. Começou a sua coleção – considerada como uma das maiores de arte africana – aos 15 anos. O espólio da Fundação que criou em 2003 inclui 5000 peças de 140 artis-tas originários de 28 países africanos e da diáspora. Em 2006, criou em Luanda a primeira Trienal africana, evento que deverá

Fundação Sindika Dokolo

lança ponte cultural entre Luanda e Porto N

ter a 3.ª edição este ano e contará pela primeira vez com uma importante participação moçambicana.

Sindika Dokolo é também o principal patrocinador da Feira Internacional de arte africana contemporânea «1:54», fundada pela marroquina Touria El Glaoui. Depois de duas edições em Londres a «1:54» (pelos 54 estados africanos) estreia-se este ano em Nova Iorque de 15 a 17 de maio. Aceita com humor o facto de ser mais conhecido em Portugal como «o marido de Isabel dos Santos» que por mérito próprio. «Às vezes orgulho-me de ser ela a minha mulher», disse após a inauguração e garantiu em tom de brincadeira que a exposição não constitui «uma OPA mais ou menos amigável sobre a cultura portuguesa».

poetisa e nacionalista Manuela Margarido foi homenageada numa exposição fotográ-

fica no Arquivo Histórico. As «Memórias Póstu-mas» são fotos tiradas por Maria José Palla e pontuadas com alguns poemas da intelectual santomense. Manuela Margarido, que esteve exilada em Paris durante o período colonial, foi após a independência embaixadora de São Tomé e Príncipe em Bruxelas e junto de várias organiza-ções internacionais e uma grande divulgadora da cultura santomense na Europa. Nasceu na roça Olímpia, na ilha do Príncipe, em 1925, e faleceu em Lisboa a 10 de março de 2007.

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recordada em exposição fotográficaManuela Margarido

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Sindika Dokolo na inauguração da exposição «You Love Me,You Love Me Not»

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lança ponte cultural entre Luanda e Porto artindo de uma detalhada pesquisa iniciada há cerca de seis anos pela Associação Tchiweka de Documentação (ATD), foi lançado em março, no Museu de História

Militar, em Luanda, o livro 1961 - Memória de um ano decisivo. A publicação contém documentos e fotos inéditas do acervo de Lúcio Lara “Tchiweka”, um dos principais líde-res da luta pela independência de Angola, bem como testemunhos de outros nacionalistas angolanos e seus apoiantes antifascistas em Portugal e noutros países, sobre o desencadear do combate que conduziria à derrubada do último império colonial.

«A leitura desta obra gera emoções e obriga-nos a reviver a chama do protesto que galvanizou milhares de nacionalistas de diferentes matizes políticas que, enjaulados pela PIDE na luta clandestina ou empunhando armas nas matas, lançaram as sementes da inesquecível gesta da libertação de Angola das grilhetas do ocupante português», afirmou o jornalista Gustavo Costa, que fez a apresentação da obra. «É uma arma poderosa, que resistiu a todas as tentativas de rasura da história da independência e mesmo a certas cor-rentes negacionistas, que gostariam de ver triunfada aqui uma narração ‘descafeinada’».

Atualmente, a ATD está a desenvolver um extenso e minucioso projeto de recolha de testemunhos orais e que têm como um dos objetivos a realização de um documentário em vídeo sobre a luta e a conquista da independência de Angola. Segundo o general Paulo Lara, diretor e mentor do projeto «Angola - Nos trilhos da Independência», este filme deverá es-trear-se em 2015, durante as comemorações dos 40 anos da independência angolana.

de Lúcio Lara em novo livroDocumentos e fotos inéditas

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de Angolaoncebido com a perspetiva de dotar as Forças Armadas Angolanas (FAA) de uma obra de referência sobre o percurso histórico-militar de Angola, de modo a facilitar o seu enten-

dimento e estudo a todos os níveis, o livro História Militar de Angola é um trabalho pioneiro nesta matéria. Será apresentado a 7 de maio, no Memorial António Agostinho Neto, em Luanda, numa ação conjunta do Departamento de Estudos e Investigação Militar do Estado Maior General das FAA, conjuntamente com a Editorial Kilombelombe, com a pompa e circunstância que merece.

Colaboraram na sua feitura os militares António Edilson Wanandumbo, António Borges Paquise, Maria Quarta Punza, Silvestre António Francisco, Pungula Fernando Manuel, Joa-quim Rufino Mbeça França e Justino da Glória Ramos, que foram coordenados pelo tenente--general das FAA Miguel Júnior, doutorado em História, que assina o primeiro capítulo, «A guerra na África Central Ocidental (do século XVI ao século XIX)», e Manuel Maria Di-fula, igualmente doutorado em História e professor titular da Universidade Agostinho Neto.

Como lembra no prefácio o general Nunda, «a História de Angola é uma história de guerras, resistências e embates», pelo que «esta obra de História é bem-vinda pois ela colmata o vazio que se fazia sentir no seio das FAA e representa um meio para se aprofundar o conhe-cimento a respeito da História Militar de Angola», que cada vez mais é imprescindível, pois foram estas guerras e conflitos que configuraram Angola como espaço territorial único e no qual passaram a coabitar os povos oriundos dos antigos reinos africanos.

História MilitarC

Sindika Dokolo na inauguração da exposição «You Love Me,You Love Me Not»

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santomense Alice Goretti Pina é um dos premiados com a bolsa «Criar Lusofonia» pelo projeto literário Feijão

N’Água, Pagá Dêvê, Lujá Bôtê e Outros Contos de se Ler a de-senvolver em São Tomé e Príncipe. A jovem escritora, radica-da em Lisboa, está entre os três selecionados do concurso deste ano, promovido pelo Centro Nacional de Cultura com o apoio da Direção-geral do Livro, dos Arquivos e das Biblio-tecas de Portugal, na área de criação e investigação literárias. «Será uma obra baseada nas lendas e crenças com expressão em São Tomé e Príncipe». A ideia, explica a autora, «é a de criar uma narrativa a partir do universo do oculto e da orali-dade, tendo como referência rituais de cura ou de apazigua-mento como o ‘Pagá Dêvê’ (em São Tomé) e, de igual modo, estórias como a do feitiço ‘Feijão n’Água’ e a lenda da senhora Luzia Botelho (Lujá Bôtê) de que muito falam os mais idosos na ilha do Príncipe».

Goretti Pina também aceitou o desafio do grupo HBD para colaborar num outro projeto literário com o título Contextos de São Tomé e Príncipe, que visa apoiar causas sociais no país, mais

Feijão N Á́gua e outros contos de se ler

concretamente na ilha onde nasceu a escritora. O programa «Criar Lusofonia» nasceu em 1995 e tem por objetivo a atribui-ção de bolsas no domínio da escrita para estadas em países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, pretendendo-se criar oportunidades de contacto aprofundado com outros países lusófonos aos criadores/investigadores de língua portuguesa a fim de produzirem uma obra.

Alice Goretti Pina

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adir Tati surpreendeu ao desafiar o público português na última edição da Moda Lisboa 2015 com a sua mais recente coleção dedicada à liberdade e aos 40

anos de independência de Angola. A mais internacional dos estilistas angolanos apre-sentou uma produção inovadora, elegante, diferenciada pelos tons alegres de tecidos marcadamente africanos, arrancando vivos aplausos dos curiosos no final da passarelle.

Entre as estreias nesta 44.ª edição da Lisboa Fashion Week, sob a temática «Curiouser», a designer foi uma das principais atrações do evento, que decorreu entre 13 e 15 de março em três espaços distintos: Pátio da Galé, Casa da Balança da Mari-nha Portuguesa e Salão Nobre dos Paços do Concelho. Foram ao todo mais de 21 desfiles, nos quais se mostraram as tendências de criadores portugueses e internacio-nais para o inverno de 2016.

Outras duas estreias no certame foram as jovens angolanas Ana Cristina e Rufane Tomás, que também participaram no «Portugal Fashion Fall Winter 2015-2016» e assim se lançam na moda em busca do sucesso. O sonho de ambas as manequins, descobertas pela agência Dabanda, é fazer passerelles em cidades como Londres, Mi-lão, Paris e Nova Iorque. Para isso, disseram à África21, é muito importante passar por Lisboa, como porta de entrada e de descoberta de outros mercados.

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na Moda Lisboa 2015Revelações angolanas

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Uma criação da angolana Nadir Tati

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na Moda Lisboa 2015

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90 abril 2015 – África21

livro do mês

ntegrada na coleção «reler áfrica», coordenada por Victor Kajibanga, da UAN, a primeira publicação de uma obra do mais importante investigador africano do século

XX, a que se seguirão outras de temáticas africanas no domínio das Ciências Sociais e Humanas, pretende colmatar a lacuna do mercado editorial dos países de língua oficial portuguesa, que era a ausência de obras de referência neste campo do saber humanís-tico. Como acentua o coordenador, «Publicar e divulgar conheci-mentos e saberes sobre África é um desafio que a coleção abraça, contribuindo para a construção de uma nova epistemologia e uma nova hermenêutica dos estudos africanos no espaço lusófo-no, livre de estereótipos e de um olhar folclórico e exótico».

Resultado de uma vasta erudição do autor e profundo es-tudo sistemático à história e cultura africana, o livro apresenta uma tese a favor do que se considera ser a unidade cultural da África negra que, deste ponto de vista, «permaneceu viva sob ilusórias aparências de heterogeneidade». Cheikh Anta Diop apresenta assim uma das teses centrais que suportou a ideia de uma Unidade Africana, de âmbito político, e que esteve na base do sonho pan-africano de uma União Africana. É consi-derado um dos mais influentes e originais pensadores africa-nos do século XX e esta é uma das suas obras fundamentais.

Apoiando-se em citações de autores antigos como Heró-doto e Estrabão para ilustrar a sua teoria, segundo a qual os antigos egípcios apresentavam os mesmos traços físicos que os africanos negros de hoje (cor da pele, aspeto do cabelo, do nariz e dos lábios), Diop desenvolve de uma maneira muito peculiar uma interpretação de dados de ordem antropológica,

Cheikh Anta Diopeditado em portuguêsTarde, mas não a más horas, foi finalmente publicada em Portugal, sob o beneplácito da Faculdade de Ciências Sociais da Universi-dade Agostinho Neto (UAN), de Luanda, uma obra do historiador e filósofo senegalês Cheikh Anta Diop, A unidade cultural da África Negra, editada pela primeira vez em Paris em 1959.

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I como o papel do matriarcado, e de ordem arqueológica, que o levaram a concluir que a cultura egípcia é uma cultura negra. No plano linguístico, considerou igualmente, em particular, que o wolof, hoje falado na África Ocidental, é foneticamente aparentado com a língua egípcia antiga.

Regime matriarcal e poligamiaSubintitulada Esferas do Patriarcado e do matriarcado na Anti-guidade Clássica, a obra desenvolve prioritariamente este tema, e sobre o regime matriarcal conclui que é geral em África, quer na Antiguidade quer nos nossos dias, mas que este traço não resulta de uma ignorância do papel do pai na conceção da criança. «O culto fálico que é corolário do regime agrícola (pedras erguidas, obeliscos do Egito, templos da Índia do sul) comprova-o largamente; este demonstra que no momento em que a humanidade arcaica optava pela filiação matrilinear, a mesma tinha conhecimento do papel fecundante do pai. Em nenhum dos regimes descritos no berço meridional se negli-gencia sistematicamente o parentesco patrilinear».

Reconhecendo, entretanto, que a tendência atual da evolução interna da família africana se orienta para um patriarcado mais ou menos atenuado pelas origens matriarcais da sociedade, considera que não é demais realçar o papel desempenhado, nesta transfor-mação, por fatores externos, tais como as religiões, Islão e Cristia-nismo, e a presença temporária da Europa em África.

Sobre a poligamia, depois de citar Engels, que salientava ser um regime praticado pelas classes sociais elevadas de todos os países, talvez não em graus diferentes, mas sob formas dife-

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rentes, considerava, por outro lado, que tinha tendência a ge-neralizar-se, «sem nunca deixar de representar o indício de um estatuto social», estando ligada também à divisão do trabalho socialmente aceite que reserva ao homem as tarefas arriscadas, de poder de força e de resistência.

Salientando que «A África Negra é uma das regiões do mundo em que o homem é o mais pobre, isto é, possui menos atualmente; porém, é a única região do mundo onde a miséria não existe apesar desta pobreza, em resultado da existência de uma solidariedade de direito», Diop denuncia com particular acuidade a visão deturpada e deturpadora do europeu que viajava por África períodos curtos e pensava que já sabia tudo sobre o continente negro, muitas vezes apenas considerações subjetivas sem lastro científico, como muitos queriam fazer parecer. Por isso é que ele apelava aos intelectuais africanos, no prefácio à primeira edição desta obra, em 1959, «para estu-darem o passado não para nele se comprazerem, mas para dele extraírem lições ou, ainda, para se afastarem dele com conhe-cimento de causa, caso seja necessário. Só um verdadeiro co-nhecimento do passado é passível de manter na consciência o sentimento de uma continuidade histórica, indispensável para a consolidação de um estado multinacional».

Investigador multifacetado habitado por um problema principal, o de afirmar a função civilizadora dos africanos na

Cheikh Anta Diop

Nascido em 29 de de-zembro de 1923 em Thieytou (Senegal), fale-ceu em 7 de fevereiro de 1986 em Dakar. Foi es-sencialmente historiador e antropólogo, que estu-dou as origens da raça humana e a cultura afri-cana pré-colonial, tendo sido considerado um dos maiores historiadores africanos do século XX, embora tenha feito uma especialização em física nuclear, no Laboratório de Química Nuclear do Colégio de França, formação pluridisciplinar de que se serviu para combinar vários métodos de abordagem. Nos seus estudos, enfatizou a contribuição da África e, em particular, da África negra, para a cultura e a civilização mun-diais. Ficou conhecido como um dos pais do Pan-africanismo, foi o precursor da Egiptologia na África e um dos maiores pesquisadores do continente. Foi responsável pelas pesqui-sas científicas sobre a negritude do Egito Antigo, que revolu-cionou a história da África e do mundo.

Obras principais: Nations nègres et culture : de l’antiquité nègre égyptienne aux problèmes culturels de l’Afrique noire d’aujourd’hui, (1954); A unidade cultural da África Negra, (1959); L’antiquité africaine par l’image, L’Afrique noire préco-loniale. Étude comparée des systèmes politiques et sociaux de l’Europe et de l’Afrique noire de l’antiquité à la formation des États modernes, (1960); Les fondements culturels techni-ques et industriels d’un futur État fédéral d’Afrique noire, Anté-riorité des civilisations nègres, mythe ou vérité historique? (1967); Parenté génétique de l’égyptien pharaonique et des langues négro-africaines (1977); Civilisation ou barbarie, (1981); Nouvelles recherches sur l’égyptien ancien et les lan-gues africaines modernes, Présence Africaine, Paris, (1988). Obra póstuma.

Um reparo: a tradução revela alguns erros de palmatória absolutamente evitáveis, como chamar a África um país (pág. 148), e adjetivar como armada «etiópia», quando na mesma página havia – bem empregue – a palavra etíope. Os patroní-micos dos historiadores Varrão e Estrabão são desde há muito tempo assim reconhecidos, não se utilizando os seus corres-pondentes em francês, até porque são latinos.

A unidade cultural da África NegraCheikh Anta DiopPedago – Luanda e Lisboa

Cheikh Anta Diop é considerado um dos mais influentes pensadores africanos do século XX e esta é uma das suas obras fundamentais

História, Cheikh Anta Diop foi pioneiro em demonstrar que o continente negro é o berço da Humanidade e que foi o Egito negro que inventou as ciências e as técnicas, as matemá-ticas e a filosofia, a escrita e a religião, repondo a verdade tol-dada durante muito tempo pelo «mito do negro» ignorante e fora da História. No entanto, embora restitua ao negro a sua memória, anuncia também o fim das certezas e abre novos caminhos para a investigação em África e sobre África, para além dos contributos africanistas.

A finalizar, preconiza que se pode deduzir «que a maior parte dos futuros sábios africanos, tendo em conta o seu passado cultural, pertencerão sobretudo à categoria dos que adotam uma perspetiva otimista refletida». Por isso, «talvez estes ve-nham a considerar que, quando a humanidade estiver concreti-zada, ao invés de morrer de tédio na mais completa ociosidade, o homem aperceber-se-á que a sua tarefa apenas começou. Descobrirá, então, que lhe é inteiramente possível, muito antes de 15 biliões de anos de reflexão, domesticar o sistema solar e dominá-lo até ao planeta periférico de Plutão, de modo pratica-mente eterno». «O universo do futuro estará, muito provavel-mente, impregnado pelo otimismo africano», conclui.

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Chama-se Dicionário de Siglas e Abreviaturas Angolanas e é uma observação, um levantamento, uma inventariação que entrou fundo na língua portuguesa e na forma como esta é usada na prática na sociedade angolana. Um trabalho que reflete um estudo cuidado e sistemático da criatividade local, ao registar um número elevado de siglas e acrónimos que consubstanciam a existência de um novo país, a Angola independente, usando, de modo renovador, a língua portuguesa. O dicionário, realça o prefácio, «acaba por demonstrar a vitalidade da língua portuguesa em Angola, na medida em que ela tem vindo a ser cada vez mais utilizada pelos angolanos e angolanas para criarem e recriarem novos conceitos, novas maneiras de sentir, falar, escrever e estar em língua portuguesa».

Dicionário de Siglas e Abreviaturas AngolanasAlexandre Mavungo Chicuna Edições Colibri, março de 2015

História, mistério e emoção numa obra que se passeia no Egito. A professora Emily, especialista em história das religiões, adquire um antigo manuscrito para a universidade sem saber o seu verdadeiro significado. Mas vai ter de descobrir rapidamente a importância, pois tem um grupo de criminosos no seu encalço. A chave para resolver o mistério encontra-se algures no deserto e Emily vai ter de ser a primeira a encontrá-la. Entretanto, em Chicago, uma perigosa seita monta um atentado em larga escala. Os seguidores acreditam que o mundo está podre, marcado pelo materialismo. A libertação pela morte é o único caminho. Os preparativos estão em marcha para desencadear o caos na cidade. Falta apenas um elemento, que tem estado guardado ao longo de vários séculos. Quando o caminho da professora universitária se cruza com o do líder da seita, a narrativa ganha novos contornos. Será que vai ser possível impedir aqueles homens de transformarem uma antiga promessa numa enorme destruição? A obra é baseada em factos e descobertas reais.

O EscribaA. M. DeanClube do Autor, Lisboa, março de 2015

Cuito Cuanavale: Crónica de uma Batalha conta-nos ao pormenor, pela voz de um oficial das forças internacionalistas cubanas, Rubén Jiménez, um dos episódios mais marcantes da Guerra Civil em Angola e da participação da África do Sul, ao lado da UNITA. Entre 15 de novembro de 1987 e 23 de março de 1988, Cuito Cuanavale assistiu ao maior confronto militar da Guerra Civil. O local da batalha foi o sul do país, na província de Cuando-Cubango, onde os exércitos das Forças Armadas Populares de Libertação de Angola e Cuba se opuseram aos da UNITA e ao exército sul-africano. Foi a batalha, até então, mais prolongada que teve lugar no continente africano desde a Segunda Guerra Mundial. O conflito deixou marcas no exército e no Governo da África do Sul, o que contribuiu para a alteração da correlação de forças na região austral do continente, tornando-se esta batalha um ponto de viragem decisivo na guerra que se arrastava há longos

anos. Por outro lado, os acontecimentos contribuíram para que o regime do apartheid aceitasse a assinatura dos Acordos de Nova Iorque, que deram origem à implementação da resolução 435/78 do Conselho de Segurança da ONU, levando à independência da Namíbia e ao fim do regime de segregação racial na África do Sul. Um livro que nos transporta para a época e para os acontecimentos, na primeira pessoa.

Cuito Cuanavale: Crónica de uma Batalha Rubén JiménezMayamba Editora, 2015, Angola

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Na década de sessenta, Boubacar Traoré ganhou protagonismo no Mali, pela sua fusão de blues com os sons malianos. Neste novo álbum, o músico reúne uma equipa eclética, incluindo Ballake Sissoko, Na kora e Vicent Bucher, e parte à descoberta de uma sonoridade mais partilhada com outros músicos. Traoré tem tido um percurso curioso. Apesar de se ter tornado assíduo nas rádios do Mali, não fazia produções em estúdio. Mais tarde, depois do golpe de Estado de 1968, o músico, visto como apoiante do regime anterior, desapareceu dos ouvidos do público. Só em 1990 lança o seu primeiro álbum, Mariama, um trabalho a solo. Desde então passou a viver da sua música, mergulhado na sua alma melancólica, algo serena, como as suas canções vão revelando. Mbalimaou é o nono álbum. Todas as composições são suas, o registo é intimista e as tradições locais estão lá. Um trabalho que não rompendo com o passado, traz novos sons ao seu reportório.

MbalimaouBoubacar Traoré

Dobet Gnahoré canta sobre a união das mulheres e África. Descreve a imagem da mulher enquanto força unificadora, por muitas gerações e para além do preconceito. Descreve as mulheres que a tocam. Vencedora de um prémio Grammy com Palea em 2010, Dobet Gnahoré é um dos talentos mais frescos na música africana atual. Canta em sete línguas e adota raízes e estilos musicais oriundos da Costa do Marfim, Congo, Camarões e de todo o oeste africano. No seu quarto álbum, Na Drê volta inspirada. Acompanhada por Colin La Roche de Féline, Clive Govinden, e Boris Tchango, além de Lokua Kanza e Paco Sery em duas das faixas do álbum, Ghanoré encarrega-se da composição de todas as músicas, apresentando visões profundas de uma África repleta de alegrias e tristezas, conduzidas por ritmos fortes e otimistas.

Na DrêDobet Gnahoré

Cansado da vida académica, George, um respeitado cientista africano e professor residente em Roterdão, vê-se preso na sua rotina. A morte de um velho amigo, que coordenava uma estação de investigação na Guiné Equatorial, parece ser o incentivo que George precisava para deixar a academia e regressar às suas origens africanas. Depois de chegar à Guiné Equatorial, encontra a estação num estado decadente, mas conhece um rapaz, Jimmy, que, com o seu positivismo, consegue abrir os olhos exaustos de George. George vai-se familiarizando com o Jimmy, enquanto este vai desempenhando o papel de casamenteiro entre George e Corina, responsável pelo orfanato local. No entanto, com a chegada repentina de um amigo de longa data que carrega um segredo e vai invadindo as suas rotinas, vão percebendo que na vida existem desafios realmente difíceis de ultrapassar.

Where The Road Runs OutRudolf BuitendachElenco principal: Isaach De Bankole, Juliet Landau, Stelio Savante, Sizo Motsoko.Género: Drama/Romance

Uma rapariga, Hirut, dirige-se para casa, depois da escola, quando um grupo de homens a cavalo a cercam e raptam. Hirut pega numa espingarda e tenta escapar, mas acaba por alvejar o seu suposto futuro marido. Na sua aldeia, a prática de sequestro e casamento forçado é comum e é uma das tradições mais antigas na Etiópia. Meaza Ashenafi, uma jovem e tenaz advogada, vem da cidade para representar Hirut e defender a tese de que a rapariga agiu em autodefesa. Meaza entra ousadamente em colisão com a autoridade civil, rígida e dominada pelo poder dos costumes, arriscando o seu trabalho para salvar a vida de Hirut. Abaixo da camada dos costumes socialmente respeitados e cultivados, a força patriarcal continua a ter como consequência as condições opressoras em relação às mulheres, o que este filme, baseado numa história real, reflete. O realizador etíope, Zeresenay Berhane Mehari, retrata com uma estranha beleza, a complexidade da transformação de um país em direção à igualdade de direitos, bem como a geração determinada a consegui-la.

DifretZeresenay Berhane MehariElenco: Meron Getnet,Tizita Hagere, Rahel TeshomeGénero: Documentário

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O Plano Nacional de Desenvolvimento, PND, abrange um conjunto de acções para incentivar o desenvolvimento sustentável do sector hoteleiro e turístico no nosso país. São investimentos que vão garantir uma nova política para o sector, permitindo o surgimento de uma oferta turística diversi�cada que integre praias, património cultural, desporto, ambientes naturais e lazer. Como resultado, Angola vai aumentar o número de unidades hoteleiras, incrementando a criação de empregos no sector e o número de visitantes.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO

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memória

eu muito caro Herberto, Escrevo-lhe agora para esse destino a fogo alto, e largo e forte e lento, que

você, incorruptível, intransigente e sem nenhuma concessão a outra «delicadeza demoníaca» que não a da paixão, a si mesmo se impôs. E o sopro, tantas vezes por si convocado nos alicerces da voz e das caligrafias dela pela escrita adiante, veio em crescen-do de vendaval na noite dessa terrível segunda-feira e por todo o dia e noite seguintes, varrer os arvore-dos e os espaços. E eu vi o ouro límpido e magnifi-cente levantado dos astros arder como sói dizer-se que a paixão queima, rejubilante e soberana. Havia um frio de nórdicas europas (essas, de que você foi «ocasional viajante»), destinado a limpar um pouco do excesso de cinzento das cabeças deste medievo futurismo vigente. Não houve porém notícia de uma única cabeça desorbitada, sequer o terceiro dia trouxe mais limpidez ou sábia delicadeza de paixão e Poema a este mundo «súbito e interminável», para louvar nele a sua «profana sacralidade».

O privilégio da Amizade é um dom de perma-nente reelaboração, de implacável reescrita. Um culto libertário do humor, que em si é um outro modo de carregar e fazer transbordar de Poema Contínuo todo e qualquer «real quotidiano». Oiço aqui a sua gargalhada sonora, viva, longamente movendo gestos e corpo. Gargalhada de quem ama visceralmente a Vida e a tenebrosa beleza que lhe é necessário extirpar, a haustos de fogo e água-viva. Assim nos fomos movendo, de um para o outro, com Angola de permeio. E esse seu modo inaugural e desconcertante de a ela chegar: «Como desconhe-cer bem a cidade de Luanda», para dela se enamorar em Olga Lima, arrebatado pelos vastos, inapreensí-veis horizontes de matos, cidades e vilas, que não apenas os da baía luandina e seus arredores de praias, ilhas, Miradouro da Lua.

Era quando, na plateia dos nossos vespertinos «escritórios» lisboetas (Bar Expresso e Solar dos Gale-gos), não havia opinadores precipitados a interrom-perem-nos a memória e as vozes, que encetávamos périplos por esses matos e a sua Luanda, ao mesmo tempo que cimentávamos a nossa Amizade «por en-tre trocas e baldrocas de livros e fotocópias».

Conta-me você como, depois de ter deixado de escrever em 1968, voltou por Antropofagias ao Poe-ma. Era uma tarde setembrina e luandense de 1971, instigado pelo pedido de colaboração, vindo de Mo-çambique através de Rui Knopfli e João Pedro Gra-bato Dias, para a revista Caliban. (Moçambique aonde você não chegou, por Luanda se ter perdido em si nos trocados para o resto da marítima viagem.)

Quedou-se pela Notícia, entre velhos companhei-ros do Café Gelo, exercendo aí a reportagem, a entre-vista, a tradução de notícias em estado de humor ne-gro, ou, ainda, a redação hílare de horóscopos e do chamado correio sentimental.

Angola entrara na sua vida pela Amada, pela pai-xão, e por esse mundo que você continuará a nomear, criando-o desde as mais fundas raízes e do mais fértil do seu húmus, para um esplendor de metáfora que nada tem para (se) explicar: inteligência primeva e jubilosa da paixão apoderando-se do ritmo súbito conquistado. Mas é muito conveniente ler tudo isso com olhos perscrutadores. Em si não «acabou a inspi-ração, essa fulminante aliança entre a experiência e a consciência». Em si começa a levitação da brasa viva dos astros sobre a noite inaugural de um permanente Amor em Visita, «admirável atentado contra as coisas planamente narráveis da vida».

zetho Cunha gonçalves

O privilégio da Amizade é um dom de permanente reelaboração, de implacável reescrita

HERBERTO HELDER (1930-2015)

A poesia é feita contra todosM

O Plano Nacional de Desenvolvimento, PND, abrange um conjunto de acções para incentivar o desenvolvimento sustentável do sector hoteleiro e turístico no nosso país. São investimentos que vão garantir uma nova política para o sector, permitindo o surgimento de uma oferta turística diversi�cada que integre praias, património cultural, desporto, ambientes naturais e lazer. Como resultado, Angola vai aumentar o número de unidades hoteleiras, incrementando a criação de empregos no sector e o número de visitantes.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO

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Última página

[email protected]ão Melo

uem o ignora deve reler a história. O nascimento do capitalismo foi acompanhado, em todo o lado, por uma generalizada e comprovada ocorrência de abusos, oportunismos, aproveitamentos, espoliações e crimes.

Originariamente, portanto, não há capitalismo assético.Ao contrário do que pensam alguns, ingenuamente, isso não

é válido apenas para os séculos XVIII ou XIX. O Prémio Nobel de Economia Paul Krugman, por exemplo, explica como se formaram as elites económicas em Israel: «As oligarquias israeli-tas devem a sua posição não à inovação ou à sua capacidade empreendedora, mas ao seu sucesso em controlar os negócios privatizados nos anos 80, mantendo atualmente a sua posição devido à influência junto do governo, combinada com o contro-lo dos principais bancos».

Ora, se isso é assim, por que razão certos representantes das elites ocidentais, arvorando uma pretensa superioridade moral que não é preciso recuar no tempo para desmentir cate-goricamente, perdem tempo a tentar denegrir os capitalistas africanos?

No caso de alguns deles, originários da esquerda e da extre-ma-esquerda europeia, é confrangedor vê-los esquecer os ma-nuais em que fizeram a sua formação política e onde o processo de formação histórica do capitalismo está claramente explicado. A questão é que já se acomodaram ao capitalismo existente nos seus países, fingindo esquecer como se formaram, historicamen-te, os «seus» capitalistas (alguns deles ex-escravocratas, como, se-gundo a historiadora Aurora Ferreira, as famílias portuguesas li-gadas ao banco Fonsecas & Burnay).

Os capitalistas angolanos em formação são um dos alvos preferidos dos ataques desses representantes das elites ociden-tais, em especial portugueses, quer vivam no Rossio ou em Oxford. As suas recorrentes campanhas a propósito da identi-dade dos capitalistas angolanos e da origem dos seus fundos, além de ocultarem (mal) os seus complexos neocoloniais, apenas servem para nos distrair daquela que deve ser, na atual etapa histórica, a preocupação principal da sociedade angola-na em relação àqueles: exigir deles uma atitude construtiva, que contribua para a edificação de um país realmente bom para todos viverem.

Serei frontal: neste momento, só me preocuparia se a origem dos fundos dos capitalistas do meu país fosse, por exemplo, o negócio da droga, o tráfico de seres humanos, o terrorismo, a prática de crimes de sangue ou o roubo, no sentido literal da palavra. Quanto à «soft corruption», conceito que, como escrevi atrás, Krugman aplica a Israel (apoio ou favorecimentos do Esta-do, uso de informações privilegiadas, ajustes diretos, etc.), consi-dero-a o único caminho historicamente possível para o surgi-mento de uma burguesia nacional em todos os países onde a introdução do capitalismo foi forçada por fatores externos.

É bom lembrar que o colonialismo português tudo fez (até cortar a cabeça de proprietários agrários nativos) para impedir o surgimento de uma burguesia angolana.

Alcançada a independência, em 1975, e adotado o modelo capitalista, quinze anos depois, só o Estado estava e ainda está em condições de promover o surgimento dessa burguesia. Caso contrário, a economia continuaria totalmente dominada por estrangeiros.

O que, como cidadão, exijo dos capitalistas angolanos é que tenham uma visão verdadeiramente nacional, patriótica e de longo prazo. Assim, espero que não se limitem a ser comissionis-tas e rentistas, investindo sobretudo na produção, gerando em-pregos, respeitando e valorizando os trabalhadores, contribuindo para a resolução dos problemas básicos da população e para o surgimento de uma classe média alargada e forte, apostando, vi-sionariamente, na educação (como fizeram as elites asiáticas) e na saúde e apoiando a inovação.

De igual modo, sugiro-lhes (gratuitamente) que deixem de concentrar todos os negócios nas suas mãos, dando espaço a outros interessados em ser empresários e/ou cruzando interesses com candidatos a capitalistas de outras origens familiares, regio-nais ou políticas e, por último, que promovam iniciativas altruís-tas sistemáticas e estruturais. Isso é do seu interesse político, económico e de segurança.

É o capitalismo,estúpidos!

Só o Estado está em condições de promover a criação de uma burguesia nacional

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