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Frutas do Brasil, 35 Uva Fitossanidade 72 INTRODUÇÃO A videira (Vitis spp.) é uma frutífera considerada de clima temperado, mas que pode ser cultivada em todo o Brasil, exceto em regiões de clima amazônico. O hábito perene da cultura a submete a diferentes formas de estresses no campo, as quais tornam mais severos os prejuízos causados pelos nematóides, principalmente em altas populações. Nos parreirais brasileiros, foram relatadas 19 espécies em 9 gêneros de nematóides, que parasitam o sistema radicular causando distúrbios, tanto anatômicos, como fisiológicos (Tabela 1). Desses, os nematóides das galhas (Meloidogyne javanica e M. incognita), os das lesões (Pratylenchus brachyurus, P. jordanensis e P. thornei) e o nematóide-punhal “Dagger nematode ”: Xiphinema americanum (Sin. X. brevicolle), Xiphinema brasiliensis, X. index e X. krugi são os mais prejudicais à videira. DESCRIÇÃO DOS PRINCIPAIS NEMATÓIDES Nematóides-das-galhas ( Meloidogyne spp.) Identificação e hospedeiros São três as espécies de nematóides que causam galhas nas raízes das videiras em todo o mundo: Meloidogyne arenaria, Meloidogyne incognita e Meloidogyne javanica. Entretanto no Brasil, tem sido constatada apenas a ocorrência de M. javanica e M. incognita (Tabela 1). Esses patógenos pertencem ao reino animal, filo Nemata, classe Secernentea , ordem Tylenchida , superfamília Tylenchoidea (Orley, 1980), família Heteroderidae (Filipe e Stekehoven, 1941), gênero Meloidogyne (Goeldi, 1887). A identificação dessas espécies é feita, basicamente, pela observação da configuração perineal e dos padrões eletroforéticos de proteínas. A configuração Aphelenchus avenae Pratylenchus brachyurus Aorolaimus sp. (Sin. Peltamigratus sp.) Pratylenchus jordanensis Longidorus sp. Pratylenchus thornei Mesocriconema curvata Rotylenchulus reniformis Mesocriconema onoensis Tylenchulus semipenetrans Mesocriconema palustris Xiphinema americanum (Sin. X. brevicolle) Mesocriconema sphaerocephala Xiphinema brasiliensis Mesocriconema xenoplax Xiphinema index Meloidogyne incognita Xiphinema krugi Meloidogyne javanica Tabela 1. Nematóides associados às raízes de videiras (Vitis spp.) no Brasil. 5 DOENÇAS CAUSADAS POR NEMATÓIDES Vicente Paulo Campos Cleber Maximiniano Ester Alice Ferreira Fonte: UFLA, MG. 2000.

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Frutas do Brasil, 35Uva Fitossanidade72

INTRODUÇÃO

A videira (Vitis spp.) é uma frutíferaconsiderada de clima temperado, mas quepode ser cultivada em todo o Brasil, excetoem regiões de clima amazônico. O hábitoperene da cultura a submete a diferentesformas de estresses no campo, as quaistornam mais severos os prejuízos causadospelos nematóides, principalmente em altaspopulações.

Nos parreirais brasileiros, foramrelatadas 19 espécies em 9 gêneros denematóides, que parasitam o sistemaradicular causando distúrbios, tantoanatômicos, como fisiológicos (Tabela 1).Desses, os nematóides das galhas(Meloidogyne javanica e M. incognita), os daslesões (Pratylenchus brachyurus, P. jordanensis

e P. thornei) e o nematóide-punhal “Dagger

nematode”: Xiphinema americanum (Sin.X. brevicolle), Xiphinema brasiliensis, X. index

e X. krugi são os mais prejudicais à videira.

DESCRIÇÃO DOSPRINCIPAIS NEMATÓIDES

Nematóides-das-galhas(Meloidogyne spp.)

Identificação e hospedeiros

São três as espécies de nematóidesque causam galhas nas raízes das videirasem todo o mundo: Meloidogyne arenaria,

Meloidogyne incognita e Meloidogyne javanica.Entretanto no Brasil, tem sido constatadaapenas a ocorrência de M. javanica eM. incognita (Tabela 1). Esses patógenospertencem ao reino animal, filo Nemata,classe Secernentea, ordem Tylenchida,superfamília Tylenchoidea (Orley, 1980),família Heteroderidae (Filipe e Stekehoven,1941), gênero Meloidogyne (Goeldi, 1887).

A identificação dessas espécies é feita,basicamente, pela observação daconfiguração perineal e dos padrõeseletroforéticos de proteínas. A configuração

Aphelenchus avenae Pratylenchus brachyurus

Aorolaimus sp. (Sin. Peltamigratus sp.) Pratylenchus jordanensis

Longidorus sp. Pratylenchus thornei

Mesocriconema curvata Rotylenchulus reniformis

Mesocriconema onoensis Tylenchulus semipenetrans

Mesocriconema palustris Xiphinema americanum (Sin. X. brevicolle)

Mesocriconema sphaerocephala Xiphinema brasiliensis

Mesocriconema xenoplax Xiphinema index

Meloidogyne incognita Xiphinema krugi

Meloidogyne javanica

Tabela 1. Nematóides associados às raízes de videiras (Vitis spp.) no Brasil.

5DOENÇAS CAUSADASPOR NEMATÓIDES

Vicente Paulo Campos

Cleber Maximiniano

Ester Alice Ferreira

Fonte: UFLA, MG. 2000.

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perineal é o nome dado ao desenho formadopelas dobras da cutícula da fêmea na regiãoao redor do ânus e da vulva. A fêmea éretirada do tecido radicular e seccionadana parte posterior. Essa secção é montadaem lâminas e observada no microscópioótico. Em Meloidogyne javanica o arco dorsal(parte superior do desenho perineal) é maisou menos arredondado com sulco lateralque interrompe todas as linhas procedentesdo arco dorsal e do ventral (parte inferiordo desenho perineal) (Fig. 1A). Já emMeloidogyne incognita o arco dorsal é elevadoe em forma trapezoidal com linhascontínuas (Fig. 1B).

Os padrões eletroforéticos sãoresultados da migração de proteínas emum gel em virtude da ação de um campoelétrico (Tabela 2). Os fenótipos deM. incognita e de M. javanica apresentam,para a esterase, uma e três bandas,respectivamente.

Na identificação de M. javanica eM. incognita, podem ser empregadas plantasdiferenciadoras, as quais identificamtambém as diferentes raças de M. incognita,cujas reações são representadas naTabela 3.

Outros recursos podem ser tambémempregados na identificação dessasespécies, tais como: a citogenética,observações morfológicas da parte anteriordo corpo de adultos em microscópio óticoe eletrônico; formato do estilete de machos,juvenis do segundo estádio e de fêmeas;RFLP (polimorfismo no comprimento defragmentos de restrição), PCR (reação emcadeia da polimerase), sondas específicasde DNA (dot blot e squash blot).

Meloidogyne incognita e Meloidogyne

javanica têm ampla gama de hospedeirosentre plantas daninhas, essências florestais,frutíferas, culturas anuais e perenes,hortaliças em geral e plantas ornamentais.

Sintomas e epidemiologia

O ciclo de vida, considerado de ovo aadulto, das espécies de Meloidogyne javanica

e Meloidogyne incognita completa-se em

28 dias em condições ótimas de tempe-ratura e umidade, mas pode ser completadoem até 70 dias no inverno. O ciclo inicia-se com o ovo, onde ocorrem multiplicaçõescelulares, desenvolvimento embrionário eformação do primeiro estádio juvenil.Ocorre a primeira ecdise e passa ao segundoestádio juvenil (J2) o qual eclode do ovo evai para o solo. O J2 locomove-se pelo

Tabela 2. Fenótipos específicos de malatodesidrogenase e esterase das espécies deM. incognita e M. javanica. Rm indica dis-tância de migração da proteína no gel.

Malato desidrogenase: —— ; Esterase: == .

Fonte: adaptado de Esbenshade & Triantaphyllou, 1990.

Fig. 1. Desenhos perineais de Meloidogyne javanica (A) eMeloidogyne incognita (B).Fonte: adaptado de Taylor & Sasser, 1978.

Arcodorsal

Arcoventral Vulva

Ânus

Sulco(linha

lateral)

Região do finalda cauda

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retirados da planta e são essenciais àalimentação e ao desenvolvimentosubseqüente do nematóide. Com aformação das células nutridoras e adefinição do sítio de alimentação, o juvenilmostra-se gradualmente mais robusto como corpo salsichóide e perde a mobilidade,tornando-se sedentário. Durante todo oprocesso de migração de células e formaçãode tecidos no período de desenvolvimentoembrionário, duas células foram mantidasintactas e localizadas no terço inferior docorpo do nematóide chamado de primórdiosexual. Nesse estádio começam amultiplicação e o desenvolvimento doprimórdio sexual. Se ocorrer a formação deapenas um prolongamento no primórdiosexual, desenvolverá um macho. Se formar,bifurcadamente, dois prolongamentos,resultará numa fêmea. Entretanto, seocorrer algum estresse no meio ambiente,como: deficiência nutricional, tempera-turas extremas, excesso populacional,dentre outros; os juvenis, já com bifurcaçãodo primórdio que normalmente resultariamem fêmeas, sofrerão reversão sexualformando machos com dois testículos.Esse fenômeno só ocorre no segundoestádio juvenil.

O juvenil com corpo bem desenvol-vido sofrerá a segunda ecdise passando ajuvenil do terceiro estádio e logo emseguida sofrerá a terceira ecdise passando

Fig.2. Ciclo de vida do nematóide das galhas radiculares(Meloidogyne ssp. ).Fonte: adaptado de Agrios, 1997.

Tabela 3. Reações de plantas diferenciadoras de raças de Meloidogyne incognita e daespécie M. javanica. Reação positiva (+) significa a presença de mais de 31 galhas oumassa de ovos por sistema radicular e negativa (-), até 30.

*Fumo (Nicotiana tabacum) cv. NC 95; algodão (Gossypium hirsutum) cv. Deltapine 16; Pimentão (Capsicumfrutescens) cv. California Wonder; tomate (Lycopersicon esculentum) cv. Rutgers.Fonte: adaptado de Taylor & Sasser, 1978.

solo à procura da raiz nova e penetra naraiz, até 6 mm da sua extremidade, oucoifa. No periciclo/endoderme ou regiãopróxima a ele, o J2, mediante injeção desecreções esofageanas através do estilete,incita a planta à formação de 3 a 8 célulashipertrofiadas ao redor do seu corpochamadas de células gigantes. Ocorretambém ao redor das células gigantesintensa multiplicação celular formandocélulas pequenas (hiperplasia) (Fig. 2).

As células gigantes constituemverdadeiros depósitos de nutrientes

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a juvenil do quarto estádio (J4). Nos J4,que vão dar machos, ocorre repentinamentea segmentação dos tecidos circundadospelas camadas externas do corpo formandoum nematóide filiforme, fenômenodenominado de metamorfose. A seguir,ocorre a quarta ecdise, libertando o machofiliforme das camadas do corpo do juvenil;esse vive aproximadamente 7 dias sem sealimentar na planta e sem função sexual, jáque a maioria das espécies de Meloidogyne éde reprodução partenogenética.

Tanto o J3 como o J4 são desprovidosde estilete e têm o esôfago parcialmentedegenerado sendo incapazes de sealimentarem.

Após a quarta ecdise, forma-se oadulto macho com estilete e esôfagodegenerados. As fêmeas já se apresentamcom os órgãos sexuais completos, globosas,branco-leitosas e providas de “pescoço”anterior. Três dias após alcançar o estádioadulto inicia-se a oviposição. Concomi-tantemente ocorre o estímulo nas glândulasretais para a formação de substânciapegajosa que é excretada no reto e gotejadapelo ânus. Como o ânus está próximo àvulva, os ovos, ao serem ovipositados, sãoimpregnados dessa substância formandoentão uma massa de ovos que fica presa àparte posterior da fêmea. A fêmea ovipositacerca de 50% dos ovos, ficando o restanteretido no seu útero após a sua morte (Fig. 2).

No final do desenvolvimento dessenematóide, o seu corpo já ocupa todo oparênquima cortical com a vulva alcançandoa parte externa da raiz; daí a massa de ovosser colocada na superfície da raiz, já emcontato com o solo. Em algumas plantas,entretanto, a massa de ovos fica retida abaixoda epiderme (Fig. 2). A fêmea pode pôr até2.850 ovos.

Os sintomas mais característicos evisíveis de Meloidogyne javanica e Meloidogyne

incognita ocorrem nas raízes onde seobservam engrossamentos, os quais seiniciam alguns dias após a penetração doJ2, atingindo o tamanho máximo quando onematóide alcança o estádio adulto. Esses

sintomas são chamados de galhasradiculares e podem variar com a cultivar.Plantas levemente infestadas apresentamgalhas pequenas nas raízes absorventes.Aquelas altamente infestadas podem terredução do sistema radicular com galhasgrandes e alongadas. Esses sintomastendem a ser mais severos em videirascultivadas em solos arenosos. Meloidogyne

incognita reduz a taxa de respiração e defotossíntese de videiras infestadas. Videirassão altamente sensíveis aos danoscausados por Meloidogyne javanica eMeloidogyne incognita causando decréscimosubstancial na produção.

Nematóides-das-lesões(Pratylenchus spp.)

Identificação e hospedeiros

São cinco as espécies de nematóidesque causam lesões nas raízes da videira nomundo: Pratylenchus vulnus, Pratylenchus

thornei, Pratylenchus scribneri, Pratylenchus

minius, Pratylenchus brachyurus. No Brasiltêm sido encontradas nos vinhedos trêsespécies: Pratylenchus brachyurus, Pratylenchus

jordanensis e Pratylenchus thornei (Tabela 1).Esses patógenos pertencem ao reinoanimal, filo Nemata, classe Secernentea,

ordem Tylenchida, superfamília Tylenchoidea

(Orley, 1980), família Pratylenchidae

(Thorne, 1949), gênero Pratylenchus

(Filipjev, 1936). No Brasil, Pratylenchus

brachyurus tem ampla gama de hospedeirosinfectando hortaliças, frutíferas, culturasanuais, perenes e ornamentais, dentreoutras. Entretanto, Pratylenchus thornei ePratylenchus jordanensis ocorrem apenas empessegueiro e macieira, respectivamente,além de videira.

A identificação de espécies dePratylenchus pode ser feita através daobservação de caraterísticas morfológicas,de acordo com chaves de classificaçãoapropriadas, como as de Café Filho &Huang (1989).

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Sintomas e epidemiologia

No ciclo de vida de Pratylenchus spp., ojuvenil do segundo estádio (J2) eclode doovo, locomove-se pelo solo e pode parasitaro hospedeiro, sofrendo três ecdises seminterromper o processo de alimentação,passando a J3, J4 e macho e fêmea adultos.Todos os estádios, após a eclosão do J2 doovo, inclusive macho e fêmea adultos, para-sitam e se alimentam do hospedeiro, penetran-do nas raízes novas e locomovendo-seinter e intracelularmente no parênquimacortical, destruindo os tecidos, tornando-osenegrecidos.

Todos os estádios são filiformes, nãoocorrendo dimorfismo sexual (Fig. 3).

O ciclo se completa em 3 a 6 semanas.A reprodução pode ser anfimítica oupartenogenética.

Lesões necróticas de vários tamanhose cores são encontradas ao longo das raízesde videira infestadas por Pratylenchus.

Plantas infestadas apresentam perda devigor, sistema radicular e produçãoreduzidos. Plantas novas em solo infestadopermanecem fracas e podem morrer emconseqüência da inabilidade de produzirsistema radicular adequado.

Esses nematóides são endoparasitasmigradores, alimentando-se das célulascorticais; entretanto, Pratylenchus thornei éectoparasita.

Nematóide-punhal“Dagger nematode”(Xiphinema spp.)

Identificação e hospedeiros

Existem três espécies de Xiphinema

associadas às raízes da videira nos EstadosUnidos, na Europa e na Austrália,Xiphinema americanum, X. index e X. italiae.No Brasil, contudo, têm sido constatadasquatro espécies em videira, Xiphinema

americanum (Sin. X. brevicolle), X. index,

X. brasiliensis e X. krugi (Tabela 1).Essas espécies pertencem ao reino

animal, filo Nemata, classe Adenoforea, ordemDorylaimida, superfamilia Longidoroidea

(Thorne, 1935) (Khan & Ahmad, 1975),família Longidoridae (Thorne, 1935) (Meyl,1961; Hooper & Southey, 1973), gêneroXiphinema (Cobb, 1913).

A identificação dessas espécies é feitapor observação de caraterísticas morfológicasde acordo com chaves de classificaçãoapropriadas (Luc & Dalmasso, 1975).

No Brasil X. americanum (Sin.X. brevicolle), X. brasiliense e X. krugi têmampla gama de hospedeiros; entretanto,X. index só foi encontrado em cajueiro,além de videira.

Sintomas e epidemiologia

Das quatro espécies que ocorrem emvideira no Brasil, X. index, X. americanum

(Sin. X. brevicolle), X. brasiliensis e X. krugi,apenas a sintomatologia induzida porX. index tem sido estudada em detalhes,pois esse nematóide se reproduz bem emcondições de casa de vegetação. O ataquedessa espécie em videira causa engros-samento terminal, curvatura e necroses naraiz, cessando o alongamento da raiz.

Fig.3. Ciclo de vida do nematóide das lesões(Pratylenchus spp.).Fonte: adaptado de Agrios, 1997.

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Necrose extensiva nas raízes principaisresulta na proliferação lateral de outrasraízes, num efeito semelhante a vassoura-de-bruxa. Ocorre ainda redução do sistemaradicular e das raízes absorventes.A presença de X. americanum também temsido relacionada com a redução do sistemaradicular da videira.

O ciclo de vida inicia-se com a posturano solo. Ocorre então a multiplicaçãocelular, formação de tecidos e do juvenildo primeiro estádio em 6 a 7 dias.O crescimento do nematóide continua,ocorrendo quatro ecdises, passando ajuvenil do segundo, terceiro e quartoestádios, e adulto em 15 a 18 dias. Tantoa fêmea como o macho adultos sãofiliformes. Esses nematóides podem medirde 1,4 a 3,6 mm de comprimento e sealimentam externamente das raízes, sendoassim chamados de ectoparasitas.

Apesar desses nematóides reduziremo sistema radicular da videira, pelaalimentação direta nesse órgão da planta,principalmente para o X. index, essaassociação se torna muito mais importantee prejudicial a essa cultura em virtude dacapacidade desses nematóides detransmitirem vírus (Nepovirus) em todas asvideiras do mundo. As espécies X. index eX. americanum transmitem apenas Nepovirus,os quais possuem partículas com 30 nm dediâmetro, isodiamétricas e poliédricas.X. americanum é vetor do vírus da mancha-anelar-do-fumo e do tomateiro (TRSV eToRSV) e do vírus-do-mosaico-da-roseta-do-pessegueiro (PRMV), os quais causamimportantes viroses na videira na Américado Norte. X. index transmite o víruscausador da degenerescência-da-videira(Grapevine fanleaf virus, GFLV) e suasestirpes, virose de grande importância paraa indústria vitícola da Califórnia, EUA.A degenerescência é uma das mais antigase bem caracterizadas viroses da videira.No Brasil, a incidência dessa doença temsido de 2% a 3%, porém existe o risco de

aumento em virtude da presença do vetorX. index, o qual já foi constatado no Brasil(Tabela 1). X. index não só dissemina ovírus entre plantas de um mesmo vinhedo,bem como reinfesta novos vinhedosestabelecidos em áreas de renovação, apóso arranquio das plantas infestadas, casopermaneçam no solo restos de raízes deplantas doentes. Essas duas espécies(X. americanum e X. index) são as maisconhecidas espécies vetoras de Nepovirus

no mundo, e estão entre as quatro queocorrem no Brasil (Tabela 1).

X. americanum é a espécie de maiorocorrência nos parreirais do mundo, eX. index tem distribuição mais restrita.

Várias outras espécies de Xiphinema,ainda não constatadas no Brasil, bem comode Longidorus, transmitem diversos vírusnos parreirais de vários países do mundo,exigindo, portanto, cuidados especiais naquarentena de espécies vegetais importadase maior ênfase nos levantamentos deespécies de Longidorideos nos parreiraisbrasileiros.

OUTROS NEMATÓIDESQUE ATACAM A VIDEIRA

Além daqueles nematóides encontradosnos parreirais brasileiros, anteriormentediscutidos, existem outras espécies citadasna Tabela 1, como Mesocriconema spp. (Fig.4A e 4B), Rotylenchulus reniformis, Aorolaimus

sp. (Sin. Peltamigratus sp.), das quais não seconhece a importância como patógenos davideira mesmo em altas populações. MasTylenchulus semipenetrans (Tabela 1) temocorrido em vinhedos, próximos oucircundados por plantações de citros, nosEstados Unidos e na Austrália. Seu efeito navideira em condições de campo ainda precisade maiores estudos. Mesmo assim pareceprudente evitar a sua disseminação ouintrodução em áreas de videiras ainda nãoinfestadas. O Tylenchulus semipenetrans atacacitros e oliveiras, além da videira.

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Controle

A definição e o uso das táticas decontrole dependerão da fase em que seencontra o empreendimento vitícola. Dessaforma, serão discutidas táticas que possamser empregadas nas seguintes fases dacultura: a) antes do plantio da videira;b) em vinhedo já estabelecido; c) renovaçãodo vinhedo.

a) Antes do plantio da videira: osnematóides de importância econômica paraa videira (Tabela 1) não são de distribuiçãouniversal. Portanto, existem locais ondeeles não ocorrem, os quais devem serescolhidos para o plantio da videira. Maspara mantê-los livres desses patógenosalguns cuidados são necessários: plantarmudas isentas de nematóides; evitar aentrada de enxurradas oriundas de áreasinfestadas; evitar a reinfestação da áreapor máquinas, implementos agrícolas eágua de irrigação infestados, entre outros.

Como os nematóides são organismosmicroscópicos, para certificar-se da suapresença em qualquer área ou em mudas,deve-se fazer a amostragem de solo e raízes,

obtendo-se amostra composta, comaproximadamente 400 a 500 g de solo e 80 gde raízes finas e enviá-la a um laboratório denematologia para análise (Fig. 5).

Noutra situação em que o plantio forfeito em local onde já se plantaram árvoresfrutíferas, deve-se fazer análise de solo eraízes e observar a incidência dosnematóides importantes da videiradiscutidos anteriormente. Ocorrendo taisnematóides, realizar rotação de culturaspor 2 a 4 anos com o plantio de culturasnão hospedeiras ou más hospedeiras dessesnematóides. O plantio de crotalária oumucunas reduzirá a população denematóides do gênero Meloidogyne. Se aárea para o plantio da videira estiverlocalizada abaixo de plantação infestadapor nematóides danosos à videira,recomenda-se fazer uma curva de nívelpara evitar que enxurradas tragamnematóides para o novo plantio. O uso deporta-enxerto resistente a nematóidesevitará prejuízos futuros devidos a essespatógenos. Entretanto, essa resistência nãoé total, permitindo alguma multiplicaçãodos fitonematóides. Dessa forma, o plantiodo porta-enxerto deve ser antecedido de

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A BFig.4. Nematóide parasita de videira, Mesocriconema spp., obtido de solo de vinhedo infestado, (A) todoo corpo do nematóide, (B) detalhe da parte anterior.

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Tabela 4. Porta-enxertos resistentes e suscetíveis a Meloidogyne ssp., Xiphinema index, Tylenchulussemipenetrans e Pratylenchus ssp.

A B

Fig.5. A presença de galhas nas raízes indica infecção por Meloidogyne spp.

alguma medida de controle que reduza onível populacional do nematóide no solo,como rotação de cultura, discutidoanteriormente. Também deve-se considerarque a resistência é específica. Porta-enxertoresistente a Meloidogyne spp. pode ser suscetívela Xiphinema spp. Trabalhos de pesquisa têmsido direcionados ultimamente, para a

obtenção de porta-enxertos ou cultivaresresistentes a Xiphinema vetores de vírus.Duas cultivares, Olmo 039-16 e Olmo 043-43, com resistência a X. index, forampatenteadas na Califórnia, EUA. Porta-enxertos usados na viticultura brasileirapossuem resistência diferenciada a fitone-matóides. Alguns serão discutidos a seguir:

Fonte: UFLA, MG. 2000.

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• 420 A – obtido em 1887 docruzamento de Vitis berlandieri e Vitis

riparia, é indicado para as cultivares Itália,Rubi, Benitaka e Patrícia em regiões deinverno mais intenso e apresentaresistência aos nematóides e à filoxera.

• Kober 5BB – híbrido de Vitis

berlandieri e Vitis riparia, obtido por Teleki eselecionado por Kober na Áustria, érecomendado para as variedades Itália, Rubie Benitaka e apresenta resistência satisfatória,principalmente ao gênero Meloidogyne.

• Schwarzmann – híbrido natural deVitis riparia e Vitis rupestris, selecionadopor Bizeng, é excelente porta-enxerto paraa Niágara Rosada e resistente a Meloidogyne

javanica, Meloidogyne incognita, Xiphinema

index e Tylenchulus semipenetrans.• SO4 – selecionado a partir dos

híbridos de Teleki nº 4 (Vitis berlandieri eVitis riparia), apresenta boa resistência decampo a Meloidogyne spp.; porém é sensívelà fusariose.

• Dog Ridge e Salt Creek (Ramsey) –apresentam grande resistência aosnematóides-das-galhas, principalmenteM. incognita, M. javanica e M. arenaria, comsuscetibilidade a X. index, nematóide vetordo vírus causador da degenerescência-da-videira.

• Harmony – possui boa resistênciaaos fitonematóides, com exceção deM. arenaria, porém algumas populações deX. index têm-se estabelecido em algumasde suas seleções.

• Freedom – possui boa resistênciaaos nematóides das galhas e à filoxera.

• 101-14 – híbrido de Vitis riparia eVitis rupestris, apresenta boa afinidade comcultivares viníferas, e boa resistência aMeloidogyne ssp.

• Richter 99 e Richter 110 – híbridosde Vitis berlandieri e Vitis rupestris, sãosuscetíveis a Meloidogyne incognita. Outrosporta-enxertos resistentes aos nematóidesde importância econômica da videira estãona Tabela 4.

Preferencialmente a implantação dovinhedo deve ser feita em local livre de

nematóides de importância econômica paraa videira, bem como utilizando mudasisentas de fitonematóides. A prevençãoevita prejuízos ou problemas no manejodo vinhedo.

b) Em vinhedos estabelecidos: aconstatação de nematóides de importânciaeconômica em vinhedos já implantadosexigirá avaliação do estado geral dasvideiras. Uma alta infestação, comoobservada nas Fig. 5A e 5B depauperará asplantas, reduzindo progressivamente aprodução a cada ano. Essa situação podeser temporariamente aliviada aumentandoa irrigação, a adubação e realizando-sepodas menos severas. Muitos vinhedos,principalmente em solos arenosos, podemtornar-se economicamente não produtivos,necessitando de renovação.

Outros métodos podem diminuir osprejuízos causados por fitonematóides emculturas infestadas, como o uso de adubosorgânicos, pois possibilita o aumento deinimigos naturais dos nematóides, tais comofungos e bactérias e a melhoria da aeraçãodo solo, eliminando-se a compactação.

c) Renovação do vinhedo: nosvinhedos improdutivos ou velhos deve-sefazer análise de solo e raízes para aconstatação de fitonematóides. Ocorrendonematóides de importância econômica paraa videira, deve-se arrancar e queimar todosos sistemas radiculares das plantas queapresentam declínio. Nesse local, fazerrotação de cultura por 2 a 4 anos, complantas não hospedeiras do nematóidepresente na área e estabelecer novo parreiralcom porta-enxertos resistentes (Tabela 4).

Após a eliminação do vinhedo, umatentativa de recuperação do solo em áreasinfestadas por nematóides pode ser feitacom a aplicação de nematicidas.Os nematicidas atuais no mercadobrasileiro não são fumigantes e, porconseguinte, seus movimentos no solo sãolimitados. Dessa forma, necessitam deumidade no solo para se obter boa ação nocontrole de nematóides. Portanto, se nãotiver condições para a irrigação da área,aconselha-se aplicá-los após a chuva. AldicarbGR deve ser aplicado na dosagem de 1 a 2 g

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do ingrediente ativo (i.a.)/m2 ou 4-6 kg doi.a. por hectare e o Carbofuran em 6 kg do i.a.por hectare. Nos países europeus produtoresde vinhos finos também não se recomenda ouso de nematicidas nos parreirais cultivadospara esse fim.

Outra alternativa seria o uso dasolarização, técnica que consiste nacobertura do solo, preferencialmenteúmido, com filme plástico transparente,durante o período de maior radiação solar.Os efeitos da solarização, na redução depopulações de nematóides no solo, foramverificados entre os gêneros Meloidogyne,Xiphinema e Pratylenchus.

PRODUÇÃO DE MUDAS

A escolha do porta-enxerto adequadoconstitui um fator importante para osucesso da cultura. Entre os váriosrequisitos seguidos para essa escolha,inclui-se a resistência a nematóides deimportância econômica para a videira.Segue-se então à obtenção de estacas e aoenraizamento, o que deve ser feito emsubstrato isento de fitonematóides deimportância econômica. Para isso pode-setratar o substrato com brometo de metilana concentração de 150 cc por metrocúbico de substrato. Outras alternativaspara a desinfestação de substrato,

empregando calor, são o uso de coletoressolar e a aplicação de vapor de água aosubstrato.

NECESSIDADES DEPESQUISAS SOBRENEMATÓIDES PARASITASDA VIDEIRA NO BRASIL

Poucas são as pesquisas sobrenematóides em videiras no Brasil.Em vinhedos que apresentam plantas comdeclínio ou com baixas produtividades,dever-se-iam realizar levantamentos denematóides para certificar-se doenvolvimento desses patógenos nosprejuízos observados. O papel dosnematóides na disseminação de virosesem videira ainda é assunto para serexplorado no nosso país. Tambémpesquisas sobre diversas táticas de controlecomo: a) testes com novos porta-enxertosresistentes a nematóides; b) dosagens eépocas de aplicação de nematicidas;c) usos de organismos antagonistas nocontrole de fitonematóides, principalmentepara videiras produtoras de uvas finasempregadas na elaboração de vinhos;d) estudos sobre rotação de culturas emáreas de renovação de parrerais.