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AGÔ BRASIL! AGÔ PARA A LUTA DAS IÁS PELA LIBERDADE DAS
RELIGIÕES AFROBRASILEIRAS
Ivonildes da Silva Fonseca
UFPB/PPGS-UEPB/CH
Introdução
A palavra iorubana Agô utilizada no mundo das religiões afrobrasileiras
significa “pedir licença”, “pedir perdão” e também “pedir calma”. Neste texto o seu uso
conforme pode ser apreciado no título é no sentido de “pedir licença” para contribuir na
visibilidade da luta das Ialorixás1 pela liberdade de expressarem as suas crenças nas
forças espirituais existentes nos seus sistemas religiosos.
A abordagem sobre a luta pela liberdade das religiões afrobrasileiras requer
o reconhecimento da participação feminina e assim é necessário que sejam postos e
expostos os feitos que conferem o reconhecimento à essas mulheres, sobretudo porque
a luta se faz com “ pequenas e grandes ações”.
Ao pretendermos exaltar a participação feminina não desconsideramos a
contribuição masculina que ao longo dos anos se afirmou no terreno afro religioso.
Seria um ato leviano de nossa parte, sobretudo porque há nas religiões afrobrasileiras
acolhimento para as pessoas como pessoas independente de situação econômica,
orientação sexual ou doutrina política.
Esse procedimento acolhedor está bem ilustrado na composição intitulada “É
D’Oxum” de autoria de Gerônimo (2009), principalmente nas estrofes: Nessa cidade todo mundo é D’Oxum Homem, menino, menina , mulher Toda essa gente irradia magia Presente na água doce, presente na água salgada E toda cidade brilha Seja tenente ou filho de pescador Ou importante desembargador
se dá presente é tudo uma coisa só. A força que mora n’água não faz distinção de cor E toda cidade é D’Oxum
1 A palavra iorubana Ialorixá significa “mãe de santo”. O radical Ial é usado para progenitora. É também é usada na forma abreviada “Iá”e é muito comum no cotidiano brasileiro dobrarmos o “Iá” e usarmos a palavra “Iaiá”.
Dessa forma, nas estrofes selecionadas podemos entender a “cidade” como
o espaço das religiões afrobrasileiras onde todo mundo é igual e todas as pessoas são
acolhidas. Tomando como alerta esse acolhimento irrestrito não há como desconsiderar
a contribuição de homens como o Babalaô Martiniano Eliseu Bonfim (BRAGA, 1995,
p.37-55);(LANDES, 2002, 60-73),Severiano Manoel de Abreu que com o seu
“encantado” o caboclo Jubiabá ganhou fama e desta fora vítima (BRAGA,1995, p.93-
123) Edison Carneiro (LANDES, 2002, p.11-12) (BRAGA, 2004,p.5) e tantos outros. E
na Paraíba, em contexto mais recente, como não relevar a atuação de Pai Lima D’Oiá ,
de João Balula (ambos habitantes no Orún ),Pai Carlos, Pai Erivaldo, Pai Ronaldo,
dentre outros.
Entretanto, a própria origem das religiões afrobrasileira no Brasil confere à
presença feminina uma contextualização histórica especial; foram elas quem
começaram os terreiros e os conduziram; foram elas quem desempenharam a múltipla
função exigida a uma mulher iniciada e ... a história continua...
Ao adentramos no mundo das religiões afrobrasileiras seja através de leituras
de livros, revistas; seja por trabalho de campo com a realização de observação e de
entrevistas; seja pela viagem que “sem hora marcada”, fazemos à memória, a
participação feminina se mostra indelével.
Os registros escritos e visuais trazem principalmente as mães de santo que
tiveram contato com escritores, jornalistas, pesquisadores, artistas e estes usufruíam da
possibilidade de difusão dos feitos dessas mães, mas há as que incrustadas nos
subúrbios ou nas periferias urbanas lutaram e lutam bravamente pelo reconhecimento da
dignidade das pessoas religiosas que cultuam os encantados, caboclos e orixás e ainda
esperam um reconhecimento.
Em uma das viagens aos compartimentos da nossa memória desfilaram
algumas dessas mulheres que ligadas ao mundo sobrenatural recebiam as comunicações
das forças superioras e realizavam os seus rituais, cumpriam obrigações religiosas,
amparavam as pessoas desanimadas e às vezes desesperadas. Todas essas ações são
elementos importantes na resistência religiosa que é a própria luta.
Apenas para reforçar a existência dessas muitas mães de santo que vivem no
anonimato, citamos Dona Constança, moradora no bairro do Uruguai que mantinha “as
missas pedidas”2 e uma procissão anual até a Igreja de São Joaquim e nesta entravam
meninas negras e não negras, meninos negros e não negros, vestidas/os de anjos , Mãe
Lili no bairro do Jardim Cruzeiro que figurava nos anos de 1970 como uma das
sacerdotisas pioneiras no estudo da língua Ioruba no Centro de Estudos Afro- orientais
da Universidade Federal da Bahia –CEAO/UFBA, Dona Lina, Dona Elza ambas na
Massaranduba que apoiavam, em especial, a juventude nas suas iniciativas artísticas e
de mobilização social, a exemplo dos grupos liderados pela militante negra Ana Rosa
dos Santos 3.
Das vidas das bravas religiosas que têm registros escritos reforçando acima
de tudo a Bahia como o berço sacerdotal do candomblé, temos:
Iyá Nassô, Adetá e Iyá Kalá, três negras africanas, representantes
importantes na história da afirmação do candomblé do Brasil com a fundação do
Terreiro da Casa Branca. Este terreiro foi o primeiro a ser tombado como patrimônio
histórico nacional e a sua linha iniciática é exclusivamente feminina. (OLAVO, 2001)
Eugênia Ana dos Santos, conhecida por Mãe Aninha, nascida no ano de
1869, “filha de Africanos”, fazia doces e quitutes e o local servia como ponto de
encontro das pessoas do candomblé. Filha do Terreiro da Casa Branca após divergir
deste, funda o terreiro Ilê Axé Opô Afonjá. Sabe-se que Salvador é uma cidade que tem
dentre as suas manifestações religiosas o evento denominado de “Lavagem’ que
consiste em uma romaria que se dirige para uma determinada igreja católica e lá
chegando realiza uma lavagem simbólica. Dessas lavagens a do Bonfim é das mais
conhecidas e desta a Mãe Aninha figura como precursora. Consta ainda da vida desta
religiosa a inserção das figuras dos Obás , “os 12 ministros de Xangô, cuja função, além
de religiosa, era cuidar da parte civil, por se tratar de pessoas importantes na sociedade
baiana.” Reconhecendo a importância da luta pela participação em eventos, apresenta
comunicação denominada “Culinária Litúrgica”no II Congresso Afrobrasileiro4. Em
1936, Mãe Aninha tem uma audiência com Getúlio Vargas no Rio de Janeiro e como
resultado sai o decreto de liberação aos cultos religiosos. (OLAVO, 2001)
2 A “missa pedida” era uma atividade que consistia em arrecadar fundos para a realização de alguma obrigação espiritual para um santo/orixá. Trajada a rigor as mulheres saiam com a imagem da entidade religiosa por determinadas ruas e ao abordar as pessoas diziam: “Missa pedida prá ....”, citando São Cosme e São Damião ou São Roque (Obaluaê) ou São Lázaro (Omolu). As pessoas faziam as doações possíveis e no caso dos últimos santos recebiam “pipocas” também conhecidas como “flores do velho” em troca. 3 Os bairros citados são da cidade de Salvador/Bahia. 4 O II Congresso Afrobrasileiro foi realizado em 1937 na cidade de Salvador/Bahia.
Mãe Senhora, Maria Bibiana do Espírito Santo, foi a sucessora de Mãe
Aninha e comandou o Ilê Axé Opô Afonjá até 1967, ano em que faleceu. É considerada
uma das mais importantes mãe de santo do Brasil. Sob a sua direção o Afonjá
aproximou intelectuais, a exemplo de Jorge Amado, Vivaldo da Costa Lima, Antonio
Olinto, Zora Seljan, Juanita Elbein, Pierre Verger dentre outros que agregaram prestigio
ao terreiro em uma época de perseguição policial. (OLAVO, 2001, MARCOS, 2008)
Maria Stella de Azevedo Santos, mais conhecida por Mãe Stella de Oxossi,
assumiu o comando do Ilê Axé Opô Afonjá em 17 de junho de 1976. Uma das bandeiras
mais conhecidas dessa sacerdotisa é a sua posição crítica ao sincretismo entendido como
a fusão dos santos católicos aos orixás africanos. Das exposições públicas de maior
repercussão ao combate ao sincretismo, há o registro da sua participação na II
Conferencia Internacional da Tradição dos Orixás, realizada em Salvador em 1983.
Além de participação em eventos, publica livros e fundou em 1984 o Museu do
Candomblé do Brasil. (OLAVO, 2001)
Menininha do Gantois, Ialorixá do terreiro do Gantois, com o nome oficial
de Maria Escolástica da Conceição Nazaré foi iniciada desde menina no candomblé de
Mãe Pulquéria e assume a sucessão em 1922. A data dessa sucessão faz parte dos anos
mais duros de repressão ao candomblé (BRAGA, 2004, p.5); (LANDES, 2002, p.115-
133).
Das várias homenagens recebidas, as canções popularizaram Mãe
Menininha, tornando-a uma das mais conhecidas mães de santo do Brasil. Das canções
temos a composição de Celso Santana intitulada “Quem de lá vem vindo” e a “Oração
de Mãe Menininha” de Dorival Caymi.
O trecho da música de Celso Santana encontrado no artigo do professor e
pesquisador Godi5 (1991) nos dá uma idéia de uma característica das mais evidenciadas
nas mães de santo que é o acolhimento e na música este é tratado como caridade: (...) E pelo cinqüentenário de Caridade e de fé vamos
saudar Menininha no passo do candomblé (GODI, 1991, p. 68)
5 Antonio Jorge Victor dos Santos Godi reflete sobre as festas populares em especial o carnaval de Salvador como um universo propício à leituras sobre as relações sociais na cidade. Para tanto recorta os blocos de índios dando ênfase aos Apaches do Tororó.
A reiteração da personalidade sábia e doce dessa Ialorixá encontramos na
canção “Oração de Mãe Menininha”, na qual Caymi deixa evidente que os traços da
Mãe Menininha são os da sua orixá Oxum: Ai!Minha mãe Minha mãe Menininha Ai!Minha mãe Menininha do Gantois
A estrela mais linda, hein Tá no gantois e E o sol mais brilhante, hein Tá no gantois e A beleza do mundo, hein Tá no gantois e E a mão da doçura, hein Tá no gantois e O consolo da gente, ai Tá no gantois e E a Oxum mais bonita hein Tá no gantois e
Olorum quem mandou essa filha de Oxum Tomar conta da gente e de tudo cuidar Olorum quem mandou eô ora iê iê ô (CAYMI, 2009)
Hilda Dias dos Santos, carinhosamente chamada de Mãe Hilda ou Hilda
Jitolu tem imbricação com a vida da entidade cultural Ilê Ayê . Na sua trajetória de luta,
a Mãe Hilda incentivou a criação do Memorial Zumbi dos Palmares em Alagoas. Com
uma atuação muito forte na área escolar, Mãe Hilda extrapola os limites do Curuzú no
bairro da Liberdade em Salvador e os seus ensinamentos germinam e florescem em
escolas públicas : “preservar e expandir os valores da cultura africana no Brasil”.
Atualmente, há no bairro do Curuzu a Escola Mãe Hilda (OLAVO, 2001)
Luiza Franquelina da Rocha ou Gaiaku Luiza foi uma lutadora pela
manutenção da tradição jeje-mahi. Ao morrer em 2005, com 95 anos de idade dirigia o
terreiro Hùnkoámè Ayíonó Hùntóloji na cidade baiana de Cachoeira. Uma melhor
compreensão da dimensão da luta dessa Gaiaku pode ser obtida pela leitura da iniciação
jeje-mahi (CARVALHO, p.138-143). Diante das perseguições enfrentadas a sua
trajetória de sofrimento pode ser melhor compreendida na frase dita por ela própria:
“Sofri como Sofrê sofreu” (CARVALHO, 2006, p.110).
No estado da Paraíba embora o candomblé tenha chegado por volta dos
anos de 1970 muitos são os terreiros que atualmente tem as sacerdotisas e sacerdotes
iniciados no candomblé. Antes de o candomblé ter chegado às terras paraibanas o culto
predominante era Catimbó ou Jurema. Um dado comprobatório da predominância do
catimbó e da Jurema é encontrado nas falas das próprias sacerdotisas e dos sacerdotes:
“aqui na Paraíba todo mundo começou com a Jurema”. Antes do candomblé
encontravam-se os cultos umbandistas.
Atualmente as ações de elevação social do culto da Jurema vêm ganhando
intensidade 6na Paraíba, a exemplo da “Passeata da Paz” ocorrida na cidade de Alhandra
no dia 20 de junho de 2009 por iniciativa da Federação Cultural Paraibana de Umbanda,
Candomblé e Jurema – FCPUMCANJU presidida por Pai Beto de Xangô. A Passeata
fez parte do processo de positivar a cultura da Jurema Sagrada fortalecendo os nomes
de Zezinho do Açaís, Maria do Acais I, Maria do Acais II e Mestre Jardecilha (PAI
BETO DE XANGÔ, 2009) .
A partir da referencia dos nomes de alta representatividade na Jurema
Sagrada , principalmente os das mulheres comprovamos a necessidade de registro das
aguerridas pessoas religiosas paraibanas, sobretudo as iniciadas. Há algumas que já
têm nomes registrados em monografias, em eventos encontrados na internet, a exemplo
de:
Mãe Renilda de Oxossi , oficialmente Renilda Albuquerque cuja iniciação
se deu ainda na sua fase de criança. De tradição “jeje-savalu” tem ligação iniciática
com o terreiro da Kakunda de Iaiá.É uma das mulheres mais combativas pela cidadania
negra no estado da Paraíba entendendo que o direito de livre expressão religiosa é um
dos pilares dos direitos humanos. Atuando como sacerdotisa na acepção ampla da
palavra o seu campo de ação se estende por todos os segmentos sociais tendo inclusive
no ano de 2008 lançado o seu nome para o cargo de vereadora na cidade de João Pessoa,
pleito sem êxito. Com comportamento destemido e ciente da necessidade de
mobilização social rumo às conquistas sociais, Mãe Renilda fundou a Federação
Independente dos Cultos Afrobrasileiros - FICAB e realiza há alguns anos o Encontro
da Religião dos Orixás-ERO. É ativista no Movimento Negro paraibano. (MÃE
RENILDA, 2008)
Mãe Lúcia do Omidewá, Lúcia de Fátima Batista de Oliveira, é uma
sacerdotisa militante pelos direitos da população negra tendo nos últimos anos uma ação
direta no campo da saúde estando à frente do Núcleo paraibano da Rede Nacional de
Religiões Afrobrasileiras e Saúde. Na agenda de Mãe Lúcia sempre consta palestras
6 No livro “Gaiaku Luiza”, de Marcos Carvalho às páginas 37 e 104, há uma descrição do terreiro de iniciação no candomblé de Mãe Renilda .
sobre os temas da intolerância religiosa, educação ambiental e consciência ecológica
(MÃE LÚCIA, 2008). Mãe Lúcia, conforme a tradição local se iniciou na Jurema, teve
passagem pelo Moçambique7 e no ano de 2001 sacraliza a sua filiação ao Ilê Axé Opô
Afonjá mantendo as tradições deste terreiro baiano na cidade João Pessoa, além de
cultuar os seus encantados anteriores.
Mãe Marinalva, oficialmente Marinalva Amelha da Silva, filha de Ogum
com Oiá foi iniciada aos 15 anos de idade. A vida desta religiosa conforme registrou
Souza (2004) é marcada por uma luta intensa para manter as suas práticas religiosas;
lutas essas refletidas na fuga constante uma vez que ela enfrentava a perseguição
policial legalizada pela Constituição de 1934 do Governo Vargas. Diz a Mãe
Marinalva: (...)“naquela época que, quem fosse espírita a polícia pegava e dava e batia
e fazia e acontecia (...) .Em conseqüência da perseguição ela informou: “quando havia
qualquer problema, ia à justiça, eles vinha, fechava, eu pedia novamente, abria, era
aquela confusão(...) (SOUZA, 2004, p.57)
Com este texto pretendemos demonstrar a amplitude da luta das mulheres
religiosas e que essa luta pela liberdade religiosa é antes de mais nada uma
reapropriação da dignidade humana o que inclui a liberdade em ter e assumir a sua
escolha religiosa. Apesar de as religiões afrobrasileiras não serem mais apenas de
pessoas negras a luta pela liberdade religiosa representa o combate ao preconceito e a
discriminação étnico racial. Essa afirmação é acostada ao que Vagner Gonçalves da
Silva (apud HEBMULLER, 2009) constata:
[...] À medida que se combatem a religião e a tradição, se combate também uma herança que foi fundamental para constituir a identidade da população negra no Brasil, e essa herança e sua história são de origem africana. [...]
O contexto das práticas afroreligiosas sempre marcado por opressão teve momento de
perseguição oficial e vive o momento de intolerância. Em artigo no qual analisa as
“relações de proximidade e antagonismo” entre o neopentecostalismo e as religiões
afrobrasileiras, Silva (2007, p.20) apresenta a demarcação da perseguição:
Essas religiões foram perseguidas pela igreja católica ao longo de quatro séculos; pelo Estado republicano, sobretudo na primeira
7 Moçambique é uma prática religiosa iniciada na Paraíba por Mário Miranda também conhecido por Maria Aparecida entre os anos de 1960 e 1970. Em pesquisa de campo encontramos mães e pais de santos com ligação ao Moçambique nas cidades de Sapé e João Pessoa.
metade do século XX, quando este se valeu de órgãos de repressão policial e de serviços de controle social e higiene mental; finalmente, pelas elites sociais, em um misto de desprezo e fascínio pelo exotismo que sempre esteve associado às manifestações culturais dos africanos e seus descendentes no Brasil
A perseguição oficial do Estado republicano foi exercida pela instituição
policial a quem foi conferido o poder de fechar e disciplinar as atividades religiosas do
segmento em questão havendo a divisão desse poder com a instituição de saúde uma
vez que sendo religiões de possessão, as pessoas entram em transe e este era
considerado prática de pessoas esquizofrênicas.
A liberação dos cultos afroreligiosos na Paraíba ocorre com a lei 3443, de 6
de novembro de 1966 (SOARES, 2007, anexo B). Todavia, analisando o corpo da lei
fica confirmada a restrição a essa liberação, uma vez que a prática religiosa gozará da
liberdade de realização sob condições: que a Secretaria da Segurança Pública autorize
desde que haja registro perante a lei civil e que as lideranças provem idoneidade e
mediante laudo psiquiátrico atestem que gozam de sanidade mental.
Essa submissão da religião afrobrasileira evidencia a continuidade das
proposituras de emancipacionistas que entendendo serem as pessoas negras com baixo
nível mental deveriam ainda que libertas ou livres ter o Estado as controlando e
disciplinando. (AZEVEDO, 2004, p. 30-43)
Uma das conquistas obtidas pelas religiões afrobrasileiras é a dispensa das
obrigações para com a polícia e com o serviço psiquiátrico. Em tese a garantia
preconizada pela constituição cidadã de 1988 estabelece um terreno livre de
preconceitos e de discriminações, mas não é o que acontece na prática. A concepção
científica sobre ser o transe sinal de insanidade mental ou como denominava o médico
maranhense Nina Rodrigues, “histeria”, perde espaço na contemporaneidade mas
perdura na concepção popular sobretudo alimentada pelas igrejas neopentecostais com
o agravante de ser entendido como um quadro produzido e mantido por uma figura
maligna responsável por todos os males e desequilíbrios que recebe dentre outras
denominações a de “diabo”. Há a intensificação em dias atuais da ideia de demonização
das religiões afrobrasileiras tendo como principal agente disseminador as igrejas
evangélicas, sobretudo as neopentecostais. (SILVA, 2007)
Tanto no momento da perseguição quanto no da intolerância, a resistência
das Ialorixás teve e tem notoriedade nas mais diversas ações. A partir dos dados
biográficos das Ialorixás presentes neste texto pretendemos evidenciar que essa luta está
compreendida na ação das religiosas que fundam e mantém terreiros, fundam
Federações, participam e organizam eventos científicos, interagem com parlamentares,
com agentes do poder executivo e também está na luta cotidiana das que não têm
visibilidade social dos seus ” feitos” mas esses têm imensurável importância no
processo de alcance da liberdade religiosa.
Referências
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