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444 Revista Brasileira de Ensino de F��sica, vol. 23, no. 4, Dezembro, 2001

Uma Proposta para o Ensino de Mecanica Quantica

Ileana Maria Greca, Marco Antonio Moreira, Victoria E. Herscovitz

Instituto de F��sica, UFRGS,

Caixa Postal 15051, 91501-970, Porto Alegre, RS

Recebido em 27 de Abril de 2001. Aceito em 22 de Outubro de 2001.

Em decorrencia dos avan�cos da tecnologia quantica, como fazer para que estudantes de cursos deCiencias Exatas e Engenharia compreendam melhor conceitos centrais da Mecanica Quantica tem-se convertido em um tema atual de pesquisa na �area de ensino de Ciencias em n��vel internacional.Neste trabalho apresentamos a fundamenta�c~ao te�orica de uma proposta did�atica que aponta nestesentido e os resultados da sua implementa�c~ao em cursos de Engenharia.

As a consequence of the advances of quantum technology, how to help science and engineering majorsto get a better undersctanding of key quantum mechanical concepts has became a contemporaryresearch topic in science teaching at international level. In this paper we present the theoreticalframework of a didactical approach in this direction as well as the results of its implementationwith engineering students.

I Introdu�c~ao

A compreens~ao dos estudantes sobre conceitos deMecanica Quantica, o aprimoramento do seu ensino emn��vel universit�ario e sua incorpora�c~ao no ensino m�ediotem se convertido em temas atuais na pesquisa em En-sino de Ciencias. Ainda que at�e hoje as pesquisas publi-cadas a este respeito sejam escassas [1], em compara�c~aocom outras �areas como a Mecanica ou o Eletromag-netismo, nos �ultimos anos o n�umero de trabalhos apre-sentados a este respeito (antes restritos principalmentea modelos atomicos) tanto em congressos e conferencias,nacionais e internacionais, como nas revistas da �areatem crescido notavelmente [2].

Demais dizer que este interesse �e muito justi�cado.Em parceria com a Relatividade, a Mecanica Quantica�e a grande estrela do s�eculo XX. Base de sustenta�c~ao daf��sica nuclear, atomica, molecular e do estado s�olido, daf��sica das part��culas elementares e da luz, seus impactospr�aticos atingem hoje as mais variadas aplica�c~oes, be-ne�ciando at�e campos de praticidade imediata como asCiencias da Sa�ude e as Engenharias. Mais ainda, os de-senvolvimentos recentes na miniaturiza�c~ao eletronica ena nanotecnologia tem introduzido, at�e no mundo dosneg�ocios, dispositivos que somente podem ser aprecia-dos a partir dos princ��pios da Mecanica Quantica [3].Se at�e agora este conhecimento estava reservado aos es-tudantes de F��sica e de Qu��mica, parece inevit�avel que

a maioria dos pro�ssionais deste novo s�eculo deva terum conhecimento a este respeito bem mais aprofundadoque o necess�ario at�e ent~ao.

Certamente, ensinar Mecanica Quantica n~ao �e umatarefa f�acil. Seus princ��pios fogem da vis~ao cl�assicade mundo que possu��mos, fazendo que a maioria de-les levem a conseq�uencias que resultam \antiintuitivas".Assim, as implica�c~oes resultantes de conceitos comoos de superposi�c~ao de estados, princ��pio de incerteza1,dualidade onda-part��cula, distribui�c~ao de probabilidadese n~ao localidade continuam at�e hoje provocando acalo-rados debates, sendo alvo de cr��ticas at�e mesmo daque-les que contribu��ram a mold�a-la.

Por outra parte, a abordagem tradicional das dis-ciplinas introdut�orias para os cursos de Ciencias Ex-atas salienta aspectos hist�oricos, que apelam mais paraas caracter��sticas cl�assicas dos sistemas do que paraas quanticas, e dos conceitos quanticos antes enunci-ados, os estudantes recebem, sobretudo, informa�c~oesna forma de equa�c~oes2, com pouco v��nculo com afenomenologia. Al�em disto, a forma como ela �e apre-sentada defronta os estudantes com uma s�erie de fatoscuja racionalidade termina resultando duvidosa [4], emcontraposi�c~ao ao ensino das �areas da F��sica Cl�assica,que salienta o racioc��nio l�ogico e preciso que caracteri-za a \racionalidade" f��sica. Como conseq�uencia disto, aMecanica Quantica �e considerada como mat�eria dif��cil,com poucas liga�c~oes com o mundo real e at�e \esot�erica",

1Ainda que o conceito de incerteza esteja associado tamb�em ao conceito cl�assico de ondas, adquire outro signi�cado no contexto daMecanica Quantica, sendo estendido a qualquer par de observ�aveis n~ao simultaneos relativos aos objetos quanticos.

2Nos cursos introdut�orios, o formalismo n~ao �e apresentado de forma integral e os estudantes recebem, em geral, algumas f�ormulasisoladas.

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sendo seus conceitos n~ao compreendidos pelos estu-dantes [5-7]. Em resumo, as abordagens t��picas destescursos n~ao criam condi�c~oes para que os alunos apreen-dam a nova forma de perceber os fenomenos decor-rente dos princ��pios da Mecanica Quantica e cursossubseq�uentes, mais t�ecnicos, que n~ao discutem as con-cep�c~oes em que se baseiam os enunciados da teoria,tamb�em n~ao conseguem fazer isso [6],[8].

Estes fatores conduzem a que o desenvolvimento deestrat�egias did�aticas que favore�cam a aprendizagem sig-ni�cativa da Mecanica Quantica se tornem temas depesquisa relevante. Neste trabalho apresentamos umaproposta que foi implementada no IF-UFRGS duranteos semestres letivos 1999/1 e 2, em tres turmas da dis-ciplina de F��sica IV (onde estes conte�udos s~ao tradi-cionalmente introduzidos) das carreiras de Engenhariae Qu��mica, cujo objetivo foi, fundamentalmente, auxi-liar os estudantes a visualizar fenomenos microsc�opicosa partir dos princ��pios da Mecanica Quantica. Os re-sultados que apresentamos, no entanto, s~ao os obtidosna primeira implementa�c~ao da mesma (estudo piloto,primeiro semestre de 1999).

II Fundamenta�c~ao da proposta

em termos de aprendizagem

As pesquisas desenvolvidas pelo Grupo de Ensino doIF-UFRGS nos �ultimos anos tem-nos levado a consi-derar, como indica Feyerabend [9], que certas teoriascient���cas { e em particular as f��sicas | possuem deter-minadas caracter��sticas pr�oprias da linguagem naturale, por isso, para poder aprende-las �e preciso aprendernovas rela�c~oes de percep�c~ao e conceituais, trazendo �aluz concep�c~oes ocultas nos signi�cados dos seus enun-ciados. O referencial te�orico com o qual trabalhamosfoi a teoria dos modelos mentais de Johnson-Laird[10]; [11]. Segundo ela, um modelo mental �e uma re-presenta�c~ao interna que atua como um an�alogo estru-tural de situa�c~oes ou processos. Sua fun�c~ao �e a de darconta do racioc��nio dos indiv��duos tanto quando ten-tam compreender o discurso como quando tentam ex-plicar ou predizer o comportamento do mundo f��sico.Segundo estas teoria, a capacidade para in uenciar,controlar, iniciar ou predizer um fenomeno f��sico queest�a na base da sua compreens~ao deriva da constru�c~aode modelos de trabalho desse fenomeno. Frente auma situa�c~ao, tanto os elementos escolhidos para in-terpret�a-la como as rela�c~oes percebidas ou imaginadasentre eles determinam uma representa�c~ao interna que �ean�alogo-estrutural com a realidade percebida, de modoque atua como substituto dessa realidade. Da ma-nipula�c~ao desses substitutos aparecem propriedades erela�c~oes n~ao expl��citas do sistema que podem ser `lidas'de maneira direta, facilitando a realiza�c~ao de inferenciase predi�c~oes. Segundo Johnson-Laird (1983), os mode-los mentais deveriam a sua origem �a evolu�c~ao da habili-

dade de percep�c~ao dos organismos com sistema nervoso,sendo a percep�c~ao o que estabelece a media�c~ao entre omundo e o homem. Assim, os humanos (e possivel-mente outros seres vivos) n~ao apreendem o mundo di-retamente sen~ao atrav�es de uma representa�c~ao internadele, pois a percep�c~ao implica a constru�c~ao de modelosmentais. Ou seja, a percep�c~ao de qualquer situa�c~ao est�acondicionada pelos modelos mentais que somos capazesde construir. Al�em da percep�c~ao, os modelos mentaispodem ser constru��dos a partir da experiencia j�a in-ternalizada e da intera�c~ao com terceiros, como vimosno caso do discurso. Os modelos mentais gerados porestas fontes podem in uenciar-se mutuamente; a per-cep�c~ao, por exemplo, pode ser in uenciada pelos mode-los gerados pela intera�c~ao com terceiros (pense-se comose modi�ca nossa percep�c~ao dos ru��dos noturnos depoisda leitura de uma novela de terror) e vice-versa. Den-tro da teoria postula-se que existem certos conceitos eprocedimentos primitivos, i. �e, inatos. Os demais con-ceitos devem ser constru��dos via modelos mentais, quedever~ao ser capazes de representar tanto a sua essenciaquanto a sua amplitude. O n�ucleo do modelo mentaldo conceito representar�a a essencia deste, ou seja, aspropriedades caracter��sticas do estado de coisas que oconceito descreve - por exemplo, o n�ucleo do modelomental do conceito de telefone celular inclui a no�c~ao dacomunica�c~ao sem �os - enquanto a amplitude do con-ceito estar�a determinada pelos procedimentos de ma-nipula�c~ao dos modelos, de forma a de�nir o conjunto deestados de coisas poss��veis que o conceito descreve - noexemplo anterior, telefone celular digital ou anal�ogico.Este processo de constru�c~ao dos conceitos via mode-los mentais tamb�em �e v�alido, segundo Johnson-Laird(ibid., p.415) para os conceitos abstratos. \Conceitossem funda�c~ao [em modelos mentais] di�cilmente s~ao abase de todas as frases abstratas; no momento em queos indiv��duos adquirem uma clara intui�c~ao acerca decomo o mundo tem de ser para que uma a�rma�c~ao sejaverdadeira, devem ter transcendido uma representa�c~aomeramente proposicional". Os n�ucleos direcionam aforma�c~ao dos modelos mentais pois determinam a formacomo o fenomeno �e \visualizado". Tomemos um exem-plo amplamente discutido como �e o do conceito de for�ca.Para os estudantes, uma caracter��stica essencial do con-ceito �e a rela�c~ao causal simples entre for�ca e movimento,enquanto o essencial de tal conceito na vis~ao da F��sicaCl�assica �e a intera�c~ao. Esses dois n�ucleos determinamformas diferentes de visualizar os fenomenos vinculadosao conceito de for�ca, envolvendo a constru�c~ao de mo-delos mentais \essencialmente" distintos em cada caso.Esta diferen�ca na forma de visualiza�c~ao dos fenomenosseria um dos fatores para as di�culdades que os estu-dantes tem com os conceitos da F��sica Cl�assica. Apesarda importancia desta quest~ao, ela raramente �e explici-tada no ensino da Mecanica Cl�assica.

O caso da Mecanica Quantica n~ao �e diferente. Ali�as,a di�culdade nesse caso �e maior. Como indicamos

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antes, seus fundamentos determinam uma forma de per-cep�c~ao dos fenomenos microsc�opicos diferente da pro-porcionada pela Mecanica Cl�assica. Desde este refe-rencial, ent~ao, as di�culdades que os estudantes uni-versit�arios enfrentam para a compreens~ao da MecanicaQuantica derivam fundamentalmente da di�culdade desubstituir os n�ucleos dos modelos mentais que servempara explicar o `mundo cl�assico', impedindo-os de cons-truir modelos mentais que lhes permitam visualizar\quanticamente" os fenomenos microsc�opicos. Nessesn�ucleos deveriam estar incorporados, entre outros, osconceitos de superposi�c~ao de estados, dualidade onda-part��cula e car�ater probabil��stico dos resultados de me-didas.

A quest~ao �e, ent~ao, como fazer para que os alunosgerem modelos mentais adequados para a percep�c~aoquantica dos fenomenos microsc�opicos. Acreditamosque uma solu�c~ao poss��vel seja, sobretudo em cursosintrodut�orios, salientar diretamente as caracter��sticasquanticas dos sistemas ao inv�es de buscar analogiascl�assicas que refor�cam as concep�c~oes cl�assicas dos estu-dantes, e usufruir das in�umeras experiencias com umaou poucas part��culas, dispon��veis hoje em dia, em geralconceitualmente simples, para que os estudantes pos-sam familiarizar-se com a \percep�c~ao" quantica. Dealguma forma, tais recentes experiencias { muitas delasrealiza�c~oes f��sicas dos antigos \gedanken-experiments",outras visando derrubar mitos cl�assicos �as vezes em-butidos em paradoxos { propiciam a forma�c~ao de umanova gera�c~ao de f��sicos que vem adquirindo uma com-preens~ao natural, \intuitiva", dos fenomenos quanticos[13]. Ainda que n~ao se pretenda que estudantes de ou-tras carreiras possam atingir tal n��vel de compreens~ao,acreditamos que esta proposta [14] pode ser uma al-ternativa vi�avel para um ensino mais e�ciente dos con-ceitos b�asicos de Mecanica Quantica nos cursos intro-dut�orios. A abordagem aqui proposta �e entendida comofenomenol�ogico-conceitual. Fenomenol�ogica para pro-piciar a cria�c~ao de uma nova percep�c~ao, e conceitual namedida em que os fenomenos escolhidos devem ser su�-cientemente simples (elementares) e dirigidos de formaa que a essencia semantica dos (primeiros) conceitosenvolvidos �que evidente.

III Discuss~ao dos conceitos

f��sicos fundamentais

Dada a posi�c~ao singular que a Mecanica Quanticaocupa dentro da F��sica { ainda que seu modelomatem�atico, seu formalismo abstrato, esteja �rme-mente estabelecido3, a interpreta�c~ao da teoria continua,como indicamos na Introdu�c~ao, ainda hoje, provocandoacirrados debates {, consideramos importante esclare-cer que neste trabalho adotamos a interpreta�c~ao daMecanica Quantica decorrente da formula�c~ao de VonNeumann. Diferentemente da interpreta�c~ao de Copen-hague, na interpreta�c~ao ortodoxa os estados quanticos(representados pela fun�c~ao de onda) possuem uma re-alidade independente da medida4 5. Embora o de-bate dessas quest~oes e o confronto entre as distin-tas interpreta�c~oes se convertam, sem d�uvida, em umaexperiencia que permite apreciar profundamente asbrechas entre os conceitos cl�assicos e quanticos, acre-ditamos, por�em, que primeiro �e indispens�avel que osestudantes aprendam os conceitos b�asicos em uma in-terpreta�c~ao { e neste caso por que n~ao na da inter-preta�c~ao ortodoxa, ou seja, aquela aceita usualmentenos meios academicos [16]{, antes de poder se con-frontar com outras interpreta�c~oes. Sem o pr�e-requisitoda compreens~ao de uma interpreta�c~ao (a ortodoxa, porexemplo), outras interpreta�c~oes �cam sem sustenta�c~ao.

A estrat�egia did�atica pretende, ent~ao, tornarpalp�aveis alguns dos primeiros princ��pios que, em nossoentender, s~ao fundamentais para compreender o mundomicrosc�opico, devendo estar, portanto, nos n�ucleos dosmodelos mentais necess�arios para a compreens~ao destemundo. Apresentamos, a seguir, uma breve descri�c~aoda interpreta�c~ao utilizada na proposta para os conceitosque consideramos centrais para esta proposta.

Superposi�c~ao de estados

O princ��pio da superposi�c~ao de estados �e conside-rado por alguns pesquisadores como o postulado zeroda Mecanica Quantica, sendo a superposi�c~ao de esta-dos um conceito fundamental tanto para entender-se omundo microsc�opico, como tamb�em para ilustrar umaconcep�c~ao que, ainda que com a mesma formula�c~aomatem�atica nas teorias quantica e cl�assica, implica emsigni�ca�c~oes completamente diferentes.

Em linguagem vetorial - onde cada vetor representa

3Como bem observa Jammer [15], nenhum outro formalismo com uma estrutura drasticamente diferente daquela da MecanicaQuantica foi jamais aceito como alternativa.

4Embora n~ao possuam, em geral, propriedades dinamicas espec���cas.5Freire Jr. (comunica�c~ao pessoal) ressalta, no entanto, que n~ao �e poss��vel associar exclusivamente uma interpreta�c~ao objetiva da

Mecanica Quantica (atribuir um car�ater objetivo ao conceito de estado de um sistema quantico, tornando-o menos dependente dos pro-cessos de medi�c~ao) �a interpreta�c~ao decorrente da formula�c~ao de von Neumann. Segundo ele, a abordagem de von Neumann, tratandoos aparelhos de medi�c~ao como objetos quanticos, diluiu os limites entre o mundo cotidiano e o mundo quantico, abrindo a possibilidadede se cogitar de uma intera�c~ao signi�cativa entre a consciencia do pesquisador e o sistema quantico, postura que inaugurou uma linhade abordagem subjetivista do problema da medida desenvolvida posteriormente por London, Bauer, von Weizscker e Wigner (emborao pr�oprio von Neumann n~ao tenha discutido o tema). Freire Jr. ressalta tamb�em que, em 1999, Michel Paty [17] propos uma extens~aodo signi�cado usualmente atribu��do aos conceitos de \estado f��sico" e \quantidade f��sica" de um sistema, de modo a permitir falar de\sistemas quanticos reais" como tendo \propriedades f��sicas" de�nidas, sem qualquer mudan�ca te�orica na Mecanica Quantica.

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um estado puro - este princ��pio pode ser expresso comosegue.

Se os vetores j'1 > e j'2 > representam poss��veisestados (puros) de um sistema, qualquer vetor j'3 >=c1j'1 > +c2j'2 > representa tamb�em um poss��vel es-tado do sistema.

Tal princ��pio n~ao pode formar parte de uma teo-ria determinista, pois nestas teorias, ainda que qual-quer vetor j' > possa ser escrito como um somat�oriode vetores j'i >, n~ao podemos considerar qualquervetor constru��do desta forma como representando umposs��vel estado (puro) com realidade f��sica. Ou seja,restringindo-nos ao caso bidimensional, onde existemdois poss��veis resultados x1 e x2 para uma dada me-dida, representados pelos subespa�cos E1 e E2, os ve-tores (normalizados) j'1 > e j'2 >, pertencentes aossubespa�cos E1 e E2, respectivamente, podem represen-tar estados puros, enquanto o vetor j'3 >=

�1

2

�j'1 >

+�1

2

�1=2j'2 >, em uma teoria determinista, n~ao pode.

Por isto, Dirac [19] a�rma que a maior diferen�ca entrea Mecanica Cl�assica e a Mecanica Quantica decorre doprinc��pio de superposi�c~ao de estados.

Portanto, uma teoria que inclua este princ��pio deveser inerentemente probabil��stica: as probabilidades deresultados de um determinado experimento podem serdiferentes de 0 ou 1 [20:108]. Rompe-se, desta forma, aidentidade que a F��sica Cl�assica estabelece entre estadode um sistema e resultado de uma medi�c~ao, ou seja, oresultado de uma �unica medi�c~ao n~ao nos pode infor-mar, em geral, de forma completa acerca do estado dosistema antes da medida, ocorrendo apenas rela�c~oes emforma probabil��stica.

Os questionamentos �a \realidade f��sica" desteprinc��pio foram formulados pelo pr�oprio Schr�odinger,na forma do famoso paradoxo do gato, sendo muitas asvozes a dizer que a \superposi�c~ao de estados" �e s�o umefeito matem�atico decorrente do desconhecimento sobreo estado do sistema. Este questionamento, por�em, temse mostrado incorreto, havendo-se conseguido veri�cara superposi�c~ao de estados em um �unico sistema" empequena escala6 [21]. Por outra parte, desenvolvimen-tos te�oricos recentes [22] permitiram tornar mais claro oporque de n~ao serem observados efeitos de superposi�c~aona escala macrosc�opica: basicamente, porque os sis-temas macrosc�opicos n~ao s~ao sistemas fechados, massim que interagem dissipativamente com o meio.

O princ��pio da superposi�c~ao de estados �e trabalhadosem grandes di�culdades matem�aticas pelos alunos emcursos tradicionais de Mecanica Quantica, quando seanalisam estados de norma �nita. Contudo, para a

maioria dos estudantes ele se torna apenas uma decom-posi�c~ao matem�atica, sem uma contrapartida na reali-dade f��sica, identi�cando-se com a concep�c~ao cl�assica[8]. Di�cilmente os estudantes se deparam, em cursosintrodut�orios (e at�e em alguns mais avan�cados), comas nuances deste princ��pio e suas conseq�uencias f��sicas.Mais ainda, apesar da sua importancia, raramente �ediscutido nos cursos introdut�orios de F��sica Geral etamb�em raramente aparece nos livros utilizados nestasdisciplinas.

Dualidade onda-part��cula e Princ��pio deIncerteza

Assim como para Dirac o princ��pio de superposi�c~aolinear de estados �e o postulado mais importante daMecanica Quantica, para outros a dualidade onda-part��cula ou sua vers~ao formalizada no princ��pio de in-certeza s~ao as inova�c~oes cruciais da Mecanica Quantica.Neste contexto diz-se que, no mundo microsc�opico, osaspectos corpusculares e ondulat�orios da mat�eria s~aocomplementares, ou seja, um sistema quantico pode exi-bir aspectos corpusculares ou aspectos ondulat�orios de-pendendo do arranjo experimental, mas n~ao ambos aomesmo tempo7. Em decorrencia, n~ao �e poss��vel mon-tar um dispositivo experimental onde os dois aspectospossam ser revelados ao mesmo tempo.

Este aspecto complementar do mundo microsc�opico�e expresso, no formalismo da Mecanica Quantica, nasrela�c~oes de incerteza. Segundo o Princ��pio de Incerteza,enunciado por Heisenberg em 1927, dado um par degrandezas f��sicas A e B, representadas pelos operadoresA e B que n~ao comutam, quanto maior �e o conhecimen-to de uma delas em um dado experimento, menor �e oconhecimento da outra. Matematicamente,

Se [A;B] 6= 0, ent~ao, �A � �B � ~

2: sendo �A a

incerteza no operador A e �B no operador B.

Este princ��pio refere-se, ent~ao, aos tipos de ob-serv�aveis que podem ser encontrados na teoria e podeser lido desde duas perspectivas [25:cap.1]. Por umaparte podemos consider�a-lo como uma propriedade fun-damental do estado f��sico de um sistema quantico deforma que, independentemente de como seja preparadotal estado, n~ao pode corresponder a valores precisosde dois observ�aveis incompat��veis; por exemplo, n~aopode ter valores precisamente de�nidos de posi�c~ao emomento. No mesmo sentido, um pacote de ondascl�assico n~ao pode ter valores perfeitamente de�nidosde posi�c~ao e n�umero de onda. A outra leitura (que

6No paradoxo original, os estados do gato estavam \emaranhados" (ver seguinte nota de rodap�e) com os estados poss��veis do �atomo.Os estados que na literatura se conhecem como "estados do gato de Schr�odinger", na verdade, n~ao s~ao estados emaranhados e, sim,superposi�c~oes coerentes de estados distingu��veis de um sistema �unico [23].

7Pessoa Jr. [24] chama a este enunciado da dualidade onda-part��cula de \vers~ao forte" (basicamente defendido por Niels Bohr).Segundo Pessoa Jr. (p. 29), o princ��pio pode ser enunciado de forma mais fraca, a saber: \Qualquer radia�c~ao ondulat�oria �e detectada

em pacotes m��nimos de energia ou massa e qualquer part��cula individual pode exibir fenomenos tipicamente ondulat�orios, como a

interferencia".

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pode ser pensada a partir do \microsc�opio de Heisen-berg") �e considerar o Princ��pio de Incerteza como umapropriedade fundamental do processo de medida, demodo que a incerteza, por exemplo, no momento �edevida �a perturba�c~ao do sistema no processo de me-dida. Ambas as leituras tem, no entanto, uma raiz co-mum: se o dispositivo de medida, segundo a primeiraleitura, apresenta incertezas inevit�aveis, necessariamen-te a medi�c~ao de uma grandeza perturbar�a a outra; poroutra parte, as perturba�c~oes que inevitavelmente acom-panham a medi�c~ao de grandezas incompat��veis nos im-pedir~ao de preparar um sistema quantico em um estadocom valores simultaneos bem de�nidos de grandezasincompat��veis. De qualquer forma, o Princ��pio de In-certeza �e uma limita�c~ao inerente a todo ato de medi�c~aoe n~ao pode ser superado com os avan�cos tecnol�ogicosdos sistemas de medi�c~ao. Este limite natural �a nossacapacidade de observa�c~ao leva-nos a abandonar id�eiascentrais da vis~ao cl�assica de mundo, como a do car�aterfundamental que o conceito de trajet�oria ocupa a�� .

Assim como no caso do princ��pio de superposi�c~ao,toda teoria que contenha um princ��pio sobre ob-serv�aveis incompat��veis �e inerentemente probabil��stica,ou seja, permite que as probabilidades de resultados deum determinado experimento sejam diferentes de 0 ou1. Somente se todos os observ�aveis de uma teoria foremcompat��veis (como �e o caso da F��sica Cl�assica), a teoriapode ser determin��stica.

Ainda que, tanto o princ��pio de superposi�c~ao deestados quanto o de incerteza, impliquem em teoriasprobabil��sticas, os dois s~ao conceitualmente diferentes,ou seja, que uma teoria tenha observ�aveis incompat��veisn~ao implica que estados puros possam ser somados evice-versa8.

O Princ��pio de Incerteza nos permite estabelecer,pela primeira vez na hist�oria da Ciencia, uma es-cala \absoluta" de tamanho: o mundo atomico esubatomico �e pequeno no sentido absoluto, porque qual-quer medi�c~ao efetuada nessa escala usar�a recursos damesma escala e poder�a afetar o resultado, de formaque �e preciso sempre indicar como est~ao sendo obser-vados os fenomenos. Ou seja, na escala atomica esubatomica existem limita�c~oes absolutas �as possibili-dades de medi�c~ao, quest~ao esta enfatizada por Dirac(1930)[19].

Os estudantes, por�em, s~ao apresentados, em geral,somente �as f�ormulas vinculadas ao Princ��pio de In-certeza, sem que sejam estabelecidas, pelo menos noscursos introdut�orios, as suas rela�c~oes com o conceito dedualidade ou com a id�eia de quantiza�c~ao. Assim, muitosdos estudantes aprendem as f�ormulas sem saber onde oucomo aplic�a-las. E, apesar de aceitar-se que as rela�c~oesde incerteza n~ao emergem de imperfei�c~oes tecnologica-

mente super�aveis nos dispositivos de medi�c~ao, esta �e ainterpreta�c~ao mais difundida possivelmente porque este�e o contexto em que os estudantes de ciencias primeira-mente se deparam com a palavra \incerteza"9 [6],[8].

Car�ater probabil��stico dos resultados demedidas e problema da medida

A Mecanica Quantica, como decorre dos princ��piosdiscutidos anteriormente, �e uma teoria inerentementeprobabil��stica: enquanto na Mecanica Cl�assica o resul-tado de cada medi�c~ao pode ser previsto com precis~aoarbitr�aria, desde que o estado inicial seja conhecido, aMecanica Quantica, nas mesmas condi�c~oes, oferece s�opredi�c~oes probabil��sticas. A natureza dessas probabi-lidades, por outra parte, difere das da F��sica Cl�assica:elas n~ao acontecem devido �a falta de conhecimento, poisa fun�c~ao de onda cont�em toda a informa�c~ao acerca doestado de um sistema, e as densidades de probabili-dades apresentam termos de interferencia porque s~aoresultantes do m�odulo ao quadrado de somas de ampli-tudes. Al�em disso, em contraposi�c~ao �a F��sica Cl�assica,a rela�c~ao entre o sistema a ser medido e o dispositivode medida �e sim�etrica e biun��voca [26]: assim como osistema deve modi�car o dispositivo de medida (paramover o ponteiro, por exemplo), o dispositivo modi-�ca o estado do sistema que �ca, em geral, depois decompletada a medida, em um estado diferente. O queacontece com o sistema durante a medida? Como deveser o dispositivo de medida para realizar as medi�c~oesdesejadas? Essas quest~oes, que n~ao aparecem no casocl�assico, constituem o que se denomina de problema damedida em Mecanica Quantica.

A teoria da medida em Mecanica Quantica foi as-sunto central nos debates das d�ecadas de vinte e trinta,quando se desenvolvia a compreens~ao a respeito dasmedi�c~oes para um �unico objeto. Nas d�ecadas seguintes,por�em, esse interesse passou, pois os sistemas comos quais os f��sicos trabalhavam, ainda que mecano-quanticos em princ��pio, s�o faziam uso da interpreta�c~aoprobabil��stica do quadrado das amplitudes da fun�c~aode onda. Segundo Thorne [25:2], \n~ao havia necessi-dade de invocar-se o que rapidamente foi visto comoo esot�erico, problem�atico e duvidoso 'colapso (redu�c~ao)da fun�c~ao de onda'." A quest~ao foi retomada com maisfor�ca na d�ecada de oitenta, quando os desenvolvimen-tos tecnol�ogicos come�caram a permitir a realiza�c~ao deexperimentos de medi�c~oes repetidas sobre um �unicosistema10.

O que ocorre com o sistema durante uma medi�c~aon~ao pode ser deduzido dos princ��pios anteriores, nem daequa�c~ao de Schr�odinger, que governa o comportamentodos sistemas quanticos. A equa�c~ao de Schr�odinger �e

8Por�em, como indica Hughes [20], a existencia de observ�aveis incompat��veis permite distinguir entre estados puros e mistos.9As id�eias de \erro na medi�c~ao", e de \medidas incorretas" s~ao as que aparecem mais vezes associadas �a de incerteza, nos pr�e-testes

usados em nossa pesquisa.10Isto n~ao quer dizer que a quest~ao da medida n~ao tivesse importantes desenvolvimentos em per��odos anteriores [27].

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uma equa�c~ao de evolu�c~ao temporal determinista (o es-tado �nal �e determinado univocamente pelo estado ini-cial) e revers��vel (do estado �nal pode-se em princ��piovoltar ao estado inicial), n~ao podendo governar ou des-crever um processo de medida inerentemente proba-bil��stico. Tal processo �e resgatado pelo postulado da�ltragem da fun�c~ao de onda, que incorpora a irrever-sibilidade nas medidas (depois de efetuada a medi�c~aon~ao �e poss��vel voltar ao estado anterior �a medida) e on~ao-determinismo (antes da medi�c~ao n~ao se pode predi-zer em que estado se encontrar�a o sistema depois damedi�c~ao)11.

O problema da medida �e uma quest~ao praticamenteomitida nos cursos tradicionais de Mecanica Quantica(os cursos de introdu�c~ao n~ao tratam sobre o tema), emparte devido �a sua complexidade e em parte porquemuitos dos livros utilizados nestas disciplinas foram es-critos nas d�ecadas em que este problema n~ao era umtema de pesquisa relevante. Por�em seu tratamento �eimportante, pois encerra, em si mesmo, as diferen�casfundamentais do tratamento quantico. Como discu-tido em Greca e Moreira (1999) [8], estudantes decursos avan�cados de gradua�c~ao parecem manter id�eiascl�assicas a este respeito.

IV Descri�c~ao da implementa�c~ao

da proposta

Implementamos, sob a perspectiva mencionada, noprimeiro semestre de 1999, uma experiencia-piloto12

em uma turma da disciplina de F��sica Geral do quartosemestre dos cursos de Engenharia da UFRGS, cons-tante de 25 estudantes, com a concordancia e colab-ora�c~ao da professora regular da turma. O projeto, de-senvolvido durante 24 horas- aula, incluiu os seguintestemas: computa�c~ao quantica, experiencia de inter-ferencia para sistemas quanticos, princ��pio de incerteza,experiencia de Stern-Gerlach e sistemas de dois estados,superposi�c~ao linear de estados, resultados de medi�c~oes,distribui�c~ao de probabilidades, equa�c~ao de Schr�odinger,problemas simples de autovalores (po�cos e barreirasde potencial), tunelamento e microsc�opio eletronicode varredura, �atomo de hidrogenio, espectros e saltosquanticos, paradoxo do gato de Schr�odinger, medi�c~oessem intera�c~ao com o objeto, laser e con�namento de ob-jetos quanticos com t�ecnicas de resfriamento. Em todasas aulas, a preocupa�c~ao dominante foi a de apresentaros fenomenos, destacando-se os conceitos envolvidos e

incentivando-se os estudantes, atrav�es das quest~oes pro-postas e das discuss~oes, a (re)criar a sua percep�c~ao. Asdiscuss~oes em grupos e com a professora foram, por-tanto, parte fundamental do processo. Cabe notar que,depois da terceira aula, todos os conceitos fundamentaisselecionados por n�os (estado - fun�c~ao de onda, princ��piode incerteza, superposi�c~ao linear de estados, resultadosde medi�c~oes, distribui�c~ao de probabilidades) j�a haviamsido apresentados aos alunos, sendo em cada nova aularetomados na \leitura" dos novos fenomenos, buscando-se assim a diferencia�c~ao conceitual progressiva13.

Cabe ressaltar que esses foram os �unicos conte�udostratados: as experiencias que tradicionalmente s~ao ap-resentadas aos estudantes - como radia�c~ao do corpo ne-gro ou efeito Compton, n~ao foram inclu��das. Estas ex-periencias formam parte da estrat�egia tradicional parao ensino introdut�orio da Mecanica Quantica, que, comoindicado na Introdu�c~ao, salienta aspectos hist�oricos queapelam mais para �as caracter��sticas cl�assicas dos sis-temas do que para �as quanticas e cujos resultados, emtermos dos aprendizagens alcan�cados pelos estudantes,n~ao s~ao satisfat�orios.

Dado que o formalismo matem�atico �e inerente �a des-cri�c~ao quantica (como tamb�em, ali�as, �a cl�assica), umadas preocupa�c~oes no projeto foi introduzi-lo em simul-taneidade com os conceitos f��sicos. Para isso, traba-lhamos sobre a base de sistemas de dois estados (emparticular, o de spin do el�etron), que consideramos seriade melhor compreens~ao para os estudantes, para discu-tir as quest~oes da superposi�c~ao linear de estados, dis-tribui�c~ao de probabilidades e a diferen�ca entre estado deum sistema e resultado de uma medi�c~ao. Acreditamosque pensar em termos de vetores de espa�cos bidimen-sionais permite aos estudantes pensar de forma maisconcreta, a perceber melhor o que est�a envolvido nosprinc��pios fundamentais, e que pode �car mascaradoquando esses s~ao apresentados de forma mais geral.Ou seja, tais sistemas podem ser imaginados de formamais simples, facilitando assim a forma�c~ao de mode-los mentais. O uso de sistemas de dois estados n~ao �e,de modo algum, uma inova�c~ao pois aparece em v�ariostextos cl�assicos sobre Mecanica Quantica (por exem-plo, [31-33]). Contudo, como o tema do spin quasen~ao �e tratado nos cursos introdut�orios, esses sistemas,muitas vezes, n~ao s~ao abordados. Como os alunos apre-sentavam pouca familiaridade com o trato de equa�c~oesdiferenciais, depois de introduzir o conceito de (equa�c~aode) autovalores e de discutir a quest~ao da quantiza�c~aoda energia, lan�camos m~ao de recursos computacionais

11O �unico tipo de medi�c~ao que n~ao cumpre com estas condi�c~oes �e o denominado \medida quantica perfeita n~ao demolidora" em queo sistema j�a se encontra em um autoestado do observ�avel a ser medido [24].

12Esta proposta foi utilizada em duas outras turmas da mesma disciplina no segundo semestre de 1999.13A diferencia�c~ao progressiva �e um princ��pio, proposto por David Ausubel [28], [29], que se aplica tanto �a dinamica da estrutura

cognitiva como �a programa�c~ao do conte�udo. Do ponto de vista cognitivo, signi�ca que, �a medida que ocorre a intera�c~ao entre o conhe-cimento pr�evio e o novo conhecimento, as id�eias- ancora v~ao adquirindo novos signi�cados, maior clareza e estabilidade e, assim, maiorcapacidade de servir de ancoradouro para novos conhecimentos. Da �otica instrucional, sugere que as id�eias mais gerais e mais inclusivasda mat�eria de ensino devem ser apresentadas no in��cio do ensino para, somente ent~ao, serem progressivamente diferenciadas em seuspormenores e em suas especi�cidades [30].

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para mostrar como a quantiza�c~ao est�a regulada pelassolu�c~oes �sicamente aceit�aveis para a fun�c~ao de ondaassociada a determinados sistemas. Outra importanteenfase do curso foi a de vincular o modelo f��sico aaplica�c~oes tecnol�ogicas bastante recentes. A metodolo-gia de sala de aula foi a de trabalho em pequenos grupos(cada grupo sendo formado por tres ou quatro alunos),a partir de textos especialmente elaborados que conti-nham, ademais, uma rela�c~ao de quest~oes conceituais ede pequenos problemas com os quais os alunos deviamtrabalhar em aula, com o aux��lio da professora. NoApendice mostramos um destes textos.

V Metodologia de pesquisa

Descrevemos, a seguir, os resultados da primeira imple-menta�c~ao da proposta (estudo-piloto) e os comparamoscom os de uma turma semelhante usada para controle.A turma de controle recebeu instru�c~ao em conte�udosintrodut�orios de Mecanica Quantica durante o mesmoper��odo de tempo, mas com o enfoque tradicional e uti-lizando a literatura corrente na F��sica Geral (F��sicaIV de D. Halliday e R. Resnick e F��sica IV de P.Tipler). Os resultados tamb�em s~ao comparados comos de um grupo de estudantes da disciplina do cursode F��sica de Introdu�c~ao �a Mecanica Quantica (IMQ),do curso de F��sica da UFRGS, que recebeu instru�c~aoem conte�udos introdut�orios com uma abordagem seme-lhante �a da turma de controle (abordagem tradicional),por�em durante um per��odo de tempo mais prolongado(um semestre, literatura b�asica: Fundamentos de F��sicaModerna, de R. Eisberg). Interessava nos comparar odesempenho dos estudantes do grupo experimental comos do outro grupo, que, por um per��odo bastante maior,recebeu instru�c~ao nas id�eias fundamentais da MecanicaQuantica.

Dos v�arios instrumentos (testes de associa�c~ao deconceitos, respostas complementares dos testes de as-socia�c~ao de conceitos, quest~oes conceituais, entrevis-tas, documentos escritos dos estudantes, question�ariode avalia�c~ao da unidade por parte dos estudantes) - et�ecnicas de an�alise que utilizamos (an�alises interpreta-tiva, de agrupamentos hier�arquicos, multidimensionale multivariada) [34]; [35], apresentamos neste trabalhoapenas os resultados decorrentes de um teste de asso-cia�c~ao de conceitos, examinando mediante a an�alise deagrupamentos hier�arquicos [36].

A utiliza�c~ao dos testes de associa�c~ao de conceitos,em que os sujeitos devem escrever logo abaixo decada um dos conceitos selecionados para a pesquisa{ apresentados ao aluno aleatoriamente, cada um notopo de uma folha em branco { tantos conceitos (oupalavras) quantos possam associar ao conceito apresen-tado, decorre do pressuposto de que entender como de-terminados conceitos est~ao associados pode dar ind��ciosdos modelos mentais que permitiram percebe-los como

semelhantes [37]. Ou seja, se os n�ucleos dos modelosmentais determinam como os conceitos ou os fenomenoss~ao percebidos, dever~ao determinar tamb�em se certosconceitos e fenomenos s~ao percebidos como semelhantesou n~ao.

Tradicionalmente, os conceitos escolhidos para cons-truir um teste de associa�c~ao de conceitos s~ao os suposta-mente mais signi�cativos da �area que se pretende estu-dar, tanto a partir do n�umero de vezes que aparecemem livros de texto como pelos crit�erios dos especialistas.No caso em foco, levamos essas duas raz~oes em consi-dera�c~ao, al�em de certas premissas decorrentes do refe-rencial te�orico. Assim, o conjunto de conceitos- chavedevia conter alguns dos conceitos que consideramos fun-damentais para entender o mundo quantico, bem comoconceitos que se relacionassem mais �a fenomenologia,de forma a observar se os estudantes vinculavam estes�ultimos aos conceitos considerados fundamentais (ouseja, para ver como os estudantes \visualizavam" osfenomenos quanticos). Foram assim elaboradas listasde conceitos com estas caracter��sticas e o conjunto �nalsurgiu da discuss~ao com um especialista. Acreditamosque esta forma de constru�c~ao do teste lhe confere valida-de de conte�udo. Os conceitos que foram apresentadosaleatoriamente aos estudantes foram: el�etron, estadode um sistema f��sico, superposi�c~ao linear de estados,fun�c~ao de onda, dualidade onda-part��cula, princ��pio deincerteza, observ�avel, observ�aveis simultaneos, autoval-ores, resultados de medida, probabilidade, trajet�oria,tunelamento, efeito fotoel�etrico e valor m�edio.

Os dados fornecidos pelo teste de associa�c~ao deconceitos foram transformados em um coe�ciente derelacionamento (CR) entre pares de conceitos-chave, atrav�es do m�etodo de Garskof & Houston [38], j�a uti-lizado em outras pesquisas na �area de ensino de ciencias[39]; [40].

Este coe�ciente varia de 0 a 1 e d�a a medida da pro-ximidade entre dois conceitos. Quanto maior �e o valorde CR, maior �e o relacionamento entre os conceitos. Oscoe�cientes de relacionamento s~ao calculados para to-dos os pares de conceitos-chave e colocados sob formamatricial. Com base nas matrizes individuais para cadaestudante s~ao calculadas as matrizes m�edias dos coe�-cientes de relacionamento para grupos de estudantes.Esta matriz m�edia constitui a matriz de similaridadeque depois �e submetida �a An�alise de AgrupamentosHier�arquicos.

Em rela�c~ao �a t�ecnica, a An�alise de AgrupamentosHier�arquicos (AAH) [36];[41], �e utilizada para desco-brir a existencia de estruturas inerentes ao conjunto demedidas de similaridade. Essa t�ecnica estabelece umaescala hier�arquica entre os conceitos, com base em valo-res de proximidade (os coe�cientes de relacionamento,por exemplo), de forma que, quanto mais afastado est�ao ponto de liga�c~ao (ou seja, quanto mais posterior foro est�agio em que os conceitos s~ao agrupados), menor �ea intera�c~ao entre eles. A opera�c~ao b�asica realizada �e a

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constru�c~ao de agrupamentos por meio da combina�c~aode dois ou mais conceitos por vez, come�cando-se numest�agio em que todos os casos s~ao considerados comoagrupamentos separados, i. �e, considerando-se inicial-mente tantos agrupamentos como casos. No segundoest�agio, dois ou mais dos casos s~ao combinados em um�unico agrupamento. No terceiro est�agio, tanto um ter-ceiro caso pode ser inclu��do em um agrupamento j�aexistente, como outros dois casos podem emergir emum novo agrupamento. Este esquema prossegue at�e oest�agio em que todos os casos est~ao combinados em um�unico grupo. Uma vez que um agrupamento �e formado,n~ao pode mais dividir-se, podendo apenas se combinarcom outros agrupamentos.

A escala resultante deste processo �e apresentada emum diagrama denominado \dendograma". Nos resul-tados apresentados a seguir, a distancia entre os con-ceitos est�a re-escalada para um intervalo de 0 a 25.Como o valor 25 pode representar uma distancia in-�nita entre os conceitos, ou seja, que n~ao tenham qual-quer intera�c~ao (e portanto, os agrupamentos feitos nesseponto n~ao serem signi�cativos), foi tomada como valorde corte para a an�alise dos agrupamentos signi�cativos

a distancia 20. A essa distancia acontecem as maioresintera�c~oes entre os conceitos para os AAH de dois es-pecialistas que responderam ao teste.

VI Resultados da an�alise de

agrupamentos hier�arquicos

Na Tabela 1 aparecem os valores de CR (coe�ciente derelacionamento m�edio) para cada grupo. O aumento novalor de CR no p�os-teste, comparado com o valor antesda instru�c~ao, foi estatisticamente signi�cativo para ostres grupos. A an�alise multivariada, comparando-seos valores m�edios de CR antes da instru�c~ao para cadagrupo mostra que n~ao existem diferen�cas signi�cativasentre os grupos, ao n��vel <0,001. Este resultado era es-perado, pois �e a primeira vez que todos esses estudantescursam alguma disciplina com conte�udos de MecanicaQuantica. Na terceira �la da tabela, aparece a estima-tiva do efeito do tratamento para cada grupo, tal comomedido pelo ��ndice. Esse ��ndice �e o quadrado da raz~aode correla�c~ao e indica quanto da variancia dos escoresindividuais �e atribu��da aos grupos.

Grupo F��sica Geral IV F��sica Geral IV Introdu�c~aoExperimental Controle Mecanica Quantica

Pr�e Teste 0,14 0,13 0,14P�os-teste 0,20� 0,14�� 0,17�

�2 0,48 0,07 0,27

Tabela 1: Valores de CR (m�edio) para os grupos estudados� Incremento estatisticamente signi�cativo (< 0,001).�� Incremento estatisticamente signi�cativo (< 0,005)

Da tabela se depreende que, ap�os a instru�c~ao, os es-tudantes dos tres grupos considerados estabelecem maisrela�c~oes entre os conceitos escolhidos. Por�em, para osestudantes do grupo experimental, as diferen�cas entreo pr�e e p�os-teste s~ao maiores.

Na Fig. 1 aparece o dendograma do pr�e-teste cor-respondente ao grupo experimental e nas Figs. 2, 3e 4 os dendogramas dos p�os-testes correspondentes aogrupo experimental (considerando-se somente os estu-dantes que tamb�em responderam o pr�e-teste, N=16),ao grupo de controle (N=10) e ao grupo IMQ (N=11),respectivamente. As interpreta�c~oes dos dendogramasforam consensuadas entre os tres pesquisadores.

V�arios dos agrupamentos que aparecem na Fig. 1,que poder��amos pensar serem signi�cativos, parecemdecorrer de uma associa�c~ao mecanica entre palavrassemelhantes, efeito que pudemos observar nas listas depalavras escritas pelos sujeitos. Isso acontece nos agru-pamentos de el�etron com efeito fotoel�etrico (palavracomum el�etron), observ�aveis - observ�aveis simultaneos(palavra comum observ�aveis) e dualidade onda-par

Figura 1. Agrupamentos hier�arquicos do pr�e-teste { Alunosdo grupo experimental.

t��cula - fun�c~ao de onda (palavra comum onda). Os out-ros dois agrupamentos tamb�em s~ao exemplos de asso-cia�c~oes estabelecidas entre os conceitos em outros con-textos. O agrupamento entre estado de um sistemaf��sico e superposi�c~ao linear de estados �e feito pelos es-tudantes a partir da Termodinamica, i. �e, eles asso-ciam, com estado, os estados de agrega�c~ao da mat�eria(s�olido, liquido, gasoso) e associam, com superposi�c~ao,

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a coexistencia desses estados (colocando s�olido-l��quido,s�olido-gasoso etc). Isso �e de esperar, sendo no contextoda Termodinamica em que os estudantes trataram fun-damentalmente do conceito de estado. O agrupamentoentre trajet�oria e tunelamento decorre, provavelmente,da associa�c~ao estabelecida no ambito do cotidiano en-tre caminho e t�unel. O agrupamento mais interes-sante, no contexto de expressar id�eias f��sicas que po-dem confrontar-se com as que esses estudantes encon-traram nas aulas de Mecanica Quantica, �e o formadopor resultado de uma medida { valor esperado { proba-bilidade. Esse agrupamento, possivelmente, re ete umaid�eia cl�assica associada �a probabilidade: se os resulta-dos de uma medi�c~ao efetuada sobre um sistema n~aocoincidem com os valores esperados calculados, �e pelapresen�ca de erros na medi�c~ao. Esses resultados devement~ao ser tratados estatisticamente.

De fato, a instru�c~ao dada aos alunos foi a de queassociassem com aquilo que lhes viesse �a cabe�ca. Por-tanto, �e de esperar que as associa�c~oes observadas nospr�e-testes desses grupos sejam menos signi�cativas,mais mecanicas, e vinculadas, em muitos casos, pelasimilaridade morfol�ogicas dos conceitos envolvidos. Issodifere do que acontece nos p�os-testes, em que os estu-dantes est~ao motivados a circunscrever-se ao ambito dotema pesquisado, e em que, por terem visto alguns dosconceitos durante as aulas, formaram alguma id�eia arespeito deles, tendendo a explicar o que entenderam.

Figura 2. Agrupamentos hier�arquicos do p�os-teste { Alunosdo grupo experimental.

Pode-se ver, na Fig. 2 correspondente ao p�os-testedo grupo experimental, que os dois elementos mais as-sociados s~ao el�etron e dualidade, associa�c~ao que podeser explicada como decorrencia de os sujeitos enten-derem o el�etron como uma part��cula quantica comcomportamento dual. Junta-se a este agrupamento oconceito de fun�c~ao de onda, e depois os conceitos deefeito fotoel�etrico, tunelamento e probabilidade. Esseagrupamento �e signi�cativo: nele aparecem elemen-tos fenomenol�ogicos (el�etron, tunelamento e efeito fo-toel�etrico) junto a conceitos quanticos que servem paradescreve- los. Poder��amos sintetizar este agrupamentona seguinte frase, montada levando em conta a ordemda associa�c~ao: \O el�etron �e uma part��cula quantica comcomportamento dual, expresso pela fun�c~ao de onda,

comportamento este que permite explicar o efeito fo-toel�etrico e o tunelamento, por meio da determina�c~aoda probabilidade". Este agrupamento re ete uma ca-racter��stica apontada na an�alise qualitativa [42], qualseja a de os fenomenos serem explicados a partir deconceitos (mais fundamentais).

Aparece, a seguir, um agrupamento entre estado deum sistema f��sico e superposi�c~ao de estados. Essa as-socia�c~ao difere, na nossa concep�c~ao, da associa�c~ao se-melhante surgida no pr�e-teste. Os estudantes n~ao maisassociariam com estado de um sistema f��sico conceitosderivados da Termodinamica, sen~ao que agora os con-ceitos estariam associados como conseq�uencia de que oestado de um sistema f��sico pode ser uma superposi�c~aode estados de um dado observ�avel. Por �ultimo, apare-cem agrupados observ�aveis e observ�aveis simultaneos.Note-se que tal agrupamento se junta ao de resultadode uma medi�c~ao. Diferentemente do pr�eteste, em que ovalor esperado estava agrupado com o resultado de umamedida (representativo de uma rela�c~ao cl�assica), talagrupamento se desfaz e o resultado de uma medida seassocia ao agrupamento de observ�aveis. Possivelmente,isso seja re exo do fato de os estudantes estarem en-tendendo que o resultado da uma medida depende dasgrandezas medidas. Aparecem, sem agrupar-se, os con-ceitos de trajet�oria, autovalor, Princ��pio de Incertezae valor esperado. A n~ao-associa�c~ao, com outros, doPrinc��pio de Incerteza �e re exo da escassa importanciadada a esse princ��pio por um numero signi�cativo de es-tudantes, tal como visto na an�alise qualitativa comple-mentar, n~ao inclu��da neste trabalho. O primeiro agru-pamento, ent~ao, descreve fenomenos f��sicos; o segundodescreve o estado do sistema, e o terceiro se refere aoque acontece depois da medida. Em resumo, ainda quealgumas associa�c~oes desej�aveis estejam ausentes, as as-socia�c~oes estabelecidas por estes estudantes s~ao todascorretas e os agrupamentos s~ao mais signi�cativos queos do pr�e-teste.

Diferentemente do caso anterior, a Fig. 3 corres-pondente ao p�os-teste dos estudantes do grupo de con-trole mostra um escasso relacionamento entre os con-ceitos: dos quinze conceitos arrolados, sete n~ao se rela-cionam com os restantes. O primeiro agrupamento queaparece �e o de el�etron e probabilidade, juntando-se de-pois efeito fotoel�etrico e tunelamento. Esse agrupa-mento re�une conceitos fenomenol�ogicos, aos quais seadiciona, por�em, somente o conceito fundamental deprobabilidade. Isso pode signi�car que os fenomenosn~ao sejam compreendidos a partir de conceitos maisfundamentais. Aparece depois um agrupamento entrefun�c~ao de onda e dualidade e, por �ultimo, entre resul-tado de medida e valor esperado, o que, como indicadoanteriormente, re ete uma associa�c~ao cl�assica. Ou seja,neste caso, al�em de existirem poucos agrupamentos,alguns deles s~ao pouco signi�cativos ou incorretos doponto de vista da Mecanica Quantica.

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Figura 3. Agrupamentos hier�arquicos do p�os-teste { Alunosdo grupo de controle.

Figura 4. Agrupamentos hier�arquicos do p�os-teste { Alunosdo grupo IMQ.

Na Fig. 4, que corresponde ao p�os-teste dos estu-dantes da IMQ, o primeiro agrupamento que aparece�e o de observ�avel com resultado de medida e comobserv�avel simultaneo, semelhante ao terceiro agrupa-mento do grupo experimental. Aparece depois um agru-pamento entre probabilidade, Princ��pio de Incerteza evalor esperado, agrupamento que possivelmente re e-tia a id�eia de que, se n~ao �e poss��vel determinar comcerteza o valor de uma grandeza f��sica, s�o podemos con-hecer o seu valor prov�avel (valor esperado) e que este �eafetado pela probabilidade de ocorrencia dos diferentesposs��veis resultados. Aparece depois um grande agru-pamento, onde conceitos mais fenomenol�ogicos como ode el�etron, efeito fotoel�etrico, tunelamento e trajet�oriaaparecem junto a conceitos mais fundamentais comofun�c~ao de onda e dualidade. Por�em, diversamente doagrupamento semelhante no grupo experimental, aquiaparece tamb�em o conceito de trajet�oria, em princ��pioum conceito cl�assico. Uma leitura, neste caso, poderiaser: \O el�etron �e uma part��cula que apresenta efeitofotoel�etrico e isso evidencia seu comportamento dual.A fun�c~ao de onda dessa part��cula d�a conta do tunela-mento, trajet�oria percorrida pela part��cula". Final-mente, os conceitos de superposi�c~ao de estados e deestado de um sistema f��sico n~ao aparecem relaciona-dos nem entre si nem com qualquer outro. Neste caso,ent~ao, os dois primeiros agrupamentos podem ser pen-sados como representando elementos ap�os a medi�c~ao,

enquanto o terceiro descreve fenomenos (incluindo-seentre eles o de trajet�oria). Sob essa perspectiva,dir��amos que a estes estudantes est�a faltando concebercomo �e o sistema antes da medida. Este grupo apre-senta alguns agrupamentos semelhantes aos do grupoexperimental, por�em as associa�c~oes estabelecidas pare-cem ser menos signi�cativas e, em um caso, incorreta.

Os resultados desta an�alise, no que concerne aogrupo experimental, mostram que, comparativamentecom os outros dois grupos, estabeleceu mais rela�c~oesentre os conceitos, mostrando, parece, que a aprendiza-gem dos conceitos, na medida em que pode ser eviden-ciada por esta t�ecnica (n�umero e qualidade das asso-cia�c~oes), foi mais signi�cativa nos estudantes que re-ceberam instru�c~ao com a abordagem proposta do quenos estudantes dos outros dois grupos, que receberaminstru�c~ao com a abordagem tradicional.

VII Considera�c~oes �nais

Os resultados obtidos com outras turmas em outraoportunidade, assim como com outros instrumentos et�ecnicas de an�alises [14], [34], [42] parecem tamb�em in-dicar que a abordagem fenomenol�ogico-conceitual uti-lizada foi bem sucedida no que diz respeito �a incor-pora�c~ao, por parte de um n�umero signi�cativo dosestudantes, de conceitos fundamentais para a com-preens~ao de fenomenos microsc�opicos. Estes estu-dantes conseguem fazer predi�c~oes corretas e dar ex-plica�c~oes consideradas adequadas para este n��vel deaprendizagem a respeito de v�arios destes fenomenosmostrando, ao que parece, a forma�c~ao de modelosmentais com n�ucleos consistentes com a fenomenolo-gia quantica. Isso, aparentemente, n~ao �e conseguido naabordagem tradicional n~ao s�o durante per��odo seme-lhante de tempo sen~ao, tamb�em, durante um per��odobem maior.

Al�em disso, a utiliza�c~ao de resultados atuais depesquisa e de inova�c~oes tecnol�ogicas n~ao s�o foi im-portante para o processo de forma�c~ao de uma novaforma de percep�c~ao dos fenomenos microsc�opicos comotamb�em motivou os estudantes, muitos dos quais pas-saram a considerar a Mecanica Quantica como umaporta a novos horizontes, inclusive no seu campo pro�s-sional. �E interessante destacar que o clima de dis-cuss~ao, envolvendo a grande maioria dos estudantes,caracterizou as aulas. Os alunos se sentiram exigidos acompreender fenomenos desde uma perspectiva em con-fronto com a Mecanica Cl�assica e, ainda, que nem todostenham conseguido faze-lo, todos parecem ter perce-bido que a Mecanica Quantica fornece um novo olharsobre os fenomenos microsc�opicos. A professora regularda turma, que j�a ministrou cursos similares em v�ariasoportunidades, �cou agradavelmente surpresa pelo en-volvimento demonstrado pelos estudantes. Esse inte-resse parece haver-se mantido para a �area seguinte do

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curso { no�c~oes de Estado S�olido. Por �ultimo, 84% dosestudantes avaliaram positivamente o projeto, sugerin-do que os alunos, embora bastante exigidos duranteas aulas, as vivenciaram como uma boa experienciade aprendizagem. Embora nossa proposta tenha sidoimplementada em turmas das carreiras de Engenharia,cremos que a necessidade de uma mudan�ca no ensinointrodut�orio de conte�udos quanticos tamb�em �e de fun-damental importancia para os estudantes dos cursosde Licenciatura. Hoje �e relativamente f�acil encontrarmuitos dos novos fenomenos e aplica�c~oes decorrentesdos fundamentos da Mecanica Quantica em revistase livros de divulga�c~ao cient���ca. Por�em, como indicad'Espagnat [40], ao tentar simpli�car uma id�eia com-plexa, estes textos terminam passando uma id�eia incor-reta sobre a Mecanica Quantica. �E comum que, nestescasos, acabe-se passando a id�eia, por exemplo, de queel�etrons, pr�otons, f�otons s~ao bolinhas que colidem en-tre si, refor�cando imagens cl�assicas, concep�c~oes essas\falsas, n~ao no detalhe, mas de uma maneira essen-cial" [43:263]. S~ao os professores que d~ao aula no n��velm�edio que, inicialmente, devem tentar conseguir mu-dar este tipo de imagem. Claro que para isso eles de-vem ter uma id�eia clara sobre os conceitos fundamen-tais. Isso, no entanto, n~ao acontece. Durante o tran-scurso do trabalho de pesquisa, tivemos oportunidadede fazer um estudo explorat�orio com professores do en-sino m�edio, pertencentes �a rede p�ublica e particular,em um curso de atualiza�c~ao em F��sica (Pr�o-CienciasFAPERGS-UFRGS 2000). Nessa ocasi~ao, foi poss��velconstatar que, efetivamente, os professores, embora mo-tivados para incorporar temas de Mecanica Quanticaem suas aulas e reconhecendo sua importancia, muitasvezes n~ao o fazem por sentirem-se despreparados parauma discuss~ao conceitual sobre estes assuntos. Napr�atica, os cursos de forma�c~ao de professores incluem,em geral, somente uma disciplina espec���ca sobre osconceitos quanticos fundamentais, via de regra apre-sentada da maneira tradicional. Por outro lado, umaoutra experiencia-piloto, realizada com uma turma deestudantes do �ultimo curso do n��vel m�edio, nos per-mitiu veri�car o interesse que esses temas despertamneles e a forma com que permitem discutir conceitosapresentados aos estudantes anteriormente. Para citarum exemplo, na apresenta�c~ao do Princ��pio de Incerteza,os estudantes discutiram amplamente a quest~ao da va-lidade das leis da F��sica Cl�assica, embora n~ao fosseminicialmente motivados para isto.

Embora uma forma�c~ao mais completa dos profes-sores seja um elemento fundamental para introduzirconceitos quanticos no n��vel m�edio, como apresenta-los na realidade da escola brasileira exige mais estudo.Ou seja, ainda que nossa implementa�c~ao did�atica tenhautilizado um m��nimo de ferramentas matem�aticas, paraos estudantes do n��vel m�edio os elementos de C�alculo(e, obviamente, as equa�c~oes diferenciais) s~ao totalmentedesconhecidos. Como fazer ent~ao para introduzir tais

conte�udos sem cair em simpli�ca�c~oes que levem a er-ros? Dever-se-�a enfatizar, exclusivamente, a dimens~aohist�orico-epistemol�ogica da mudan�ca introduzida pelaMecanica Quantica, como prop~oem diversos autores,ou ser�a poss��vel \aprofundar-se" um pouco mais nosaspectos conceituais, possivelmente fazendo uso de si-mula�c~oes computacionais para superar as de�cienciasmatem�aticas? S~ao perguntas para as quais parece aindan~ao haver uma resposta clara, por�em nosso trabalhosinaliza para esta segunda dire�c~ao.

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Apendice

COMO SABER SOBRE A EXIS-TENCIA DE UM OBJETO SEM IN-TERAGIR COM ELE. (OU COMO �E

POSS�IVEL, NO MUNDO QUANTICO,VER NA ESCURID~AO.)

Um fabricante conseguiu inventar uma classe debombas, cheias de um g�as altamente combust��vel, queexplodem quando s~ao atingidas por um �unico f�oton.Dadas essas caracter��sticas, o processo de produ�c~ao

deve ser realizado na escurid~ao. Depois de constru��dasas bombas, descobriu-se que por algum tipo de pro-blema na fabrica�c~ao, algumas estavam cheias e outrasn~ao, pois sobrou parte do g�as combust��vel. Como sepoderia saber quais eram as bombas \boas" (que fun-cionavam), sem perder toda a produ�c~ao?

Exerc��cio

1: Por que o fabricante perderia toda sua produ�c~ao?

O fabricante, desesperado, se encontrou com umamigo, por acaso f��sico, que lhe disse ser poss��vel sal-var parte dessa produ�c~ao. (Naturalmente o fabricante,antes de obter a sua ansiada resposta, teve que assistira uma aula de Mecanica Quantica.) Vamos agora discu-tir qualitativamente o problema e depois fazer algumascontas.

Um dispositivo muito usado em F��sica, o inter-ferometro, que aparece na Fig. 1, permite separar umraio de luz incidente em dois, de modo que na sa��dado interferometro �e poss��vel observar fenomenos de in-terferencia. O dispositivo, que consta de 2 espelhosque re etem completamente a luz que chega at�e elese 2 semiespelhos que transmitem uma parte dos raiosque chegam at�e eles e re etem a outra parte, possuitamb�em dois detetores com alarmes na sa��da de formaque a \interferencia construtiva" �e detectada por umdetector D1, enquanto D2 coleta a \interferencia de-strutiva". Imaginemos que a fonte s�o emite um f�otonpor vez e que o interferometro �e ajustado de tal modoque s�o toca o alarme do detector D1, ou seja, s�o chegamf�otons a este detector.

2

1

Espelho A

Espelho B

Semiespelho

Semiespelho

D2 Interferênciadestrutiva 0%

D1 Interferênciaconstrutiva

100%

Fonte defótons

Figura 1

Exerc��cio

2. Por que se obt�em padr~ao de interferencia para umf�oton?

O que aconteceria se coloc�assemos um objeto blo-queando a passagem dos f�otons por uma das dire�c~oes?Os f�otons que chegarem ao objeto (Fig. 2) s~ao absorvi-dos, portanto se pode determinar por qual caminho pas-sou cada f�oton. Sabemos, pela experiencia de Young,que se �e poss��vel determinar o caminho pelo qual pas-sou um objeto quantico, n~ao mais se obt�em o padr~ao de

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interferencia, existindo portanto probabilidades iguaisde que o f�oton seja detectado em cada um dos dois de-tetores.

2

1

Fonte defótons

Caminho bloqueado, ofóton não passa

Semiespelho reflete 50% paraD1

Semiespelho reflete50% para D2

Figura 2

A interferencia quantica acontece se n~ao exis-te em princ��pio qualquer forma de determinarpor qual dos caminhos alternativos o f�oton (ououtro objeto quantico elementar) passou. Se,de alguma forma, podemos conhecer por ondepassou, ent~ao a interferencia desaparece.

Vejamos, agora, como auxiliar o nosso a ito fabri-cante com tal dispositivo. Coloquemos a bomba nointerferometro, bloqueando um dos caminhos. Se abomba �e ruim (ou seja, est�a sem g�as, Fig. 3), �e trans-parente e os f�otons podem atravess�a-la sem problemase, portanto, soar�a apenas o alarme do detector D1, poisse produzir�a interferencia. Este caso �e identico ao daFig. 1.

Bomba ruim

D1 Alarme ativado

D2 Alarme desativado

Figura 3

Exerc��cio

3. Qual �e a diferen�ca entre as contribui�c~oes em D1 paraos casos apresentados nas Fig. 2 e 3?

Se a bomba, pelo contr�ario, �e boa, i.e., est�a cheia deg�as, pode absorver f�otons e se poderia determinar, emprinc��pio, o caminho escolhido pelos f�otons. Portanto,n~ao haver�a padr~ao de interferencia, podendo os f�otonsser detectados tanto por D1 como por D2, aleatoria-mente, pois o �ultimo semiespelho pode transmitir oure etir aleatoriamente os f�otons que chegam at�e ele,como acontece na Fig. 2.

Exerc��cio

4. Por que n~ao podem soar os alarmes dos dois dete-tores simultaneamente?

Neste caso, se se escuta o alarme de D1 (Fig. 4), n~aose pode distinguir do caso anterior, em que a bomba eraruim. Se se escuta o alarme de D2 (Fig. 5), sabe se quea bomba �e boa. Se se escuta o Bang! saberemos que abomba era boa....(Fig. 6)

Bomba boa

D1 Alarme ativado

D2 Alarme desativado

2

Figura 4

Bomba boa

D1 Alarme desativado

D2 Alarme ativado

2

Figura 5

Ex- Bomba Boa ...

D1 Alarme desativado

D2 Alarme desativado

BANG!!!

1

Figura 6

Exerc��cios

5. Por que se pode saber que a bomba est�a cheia de g�asao escutar o alarme de D2?

6. Completar a seguinte planilha:

Estado Caminho Padr~ao de Observa�c~ao Con-da Bomba do f�oton interfe experimental clus~ao

rencia

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No terceiro caso (Fig. 5), quando se ouve o detectorD2, consegue-se uma informa�c~ao (que a bomba colo-cada estava cheia de g�as) sem interagir com o objeto(pois, se o f�oton tivesse interagido com a bomba, estateria explodido). Ou seja, ainda que o f�oton percorra ocaminho onde n~ao est�a a bomba, \tem-se" informa�c~aosobre o outro caminho que poderia ter escolhido. Ouseja, esta �e uma \medida", sem o risco da intera�c~aocom o objeto. Dispositivos que utilizam esses funda-mentos poderiam, por exemplo, \fotografar" �atomos,sem mudar seu estado. Experiencias que mostram queisso pode ser feito na pr�atica foram desenvolvidas naUniversidade de Innsbruck, �Austria, em 1995.

Exerc��cios

7. Por que esta experiencia n~ao tem contrapartida nomundo cl�assico?

8. Determinar a probabilidade de que o alarme do de-tector D1 dispare quando o recipiente da bomba est�avazio, sabendo que:

j1 > representa o f�oton no caminho 1,

j2 > representa o f�oton no caminho 2, que o espelhomuda a dire�c~ao do f�oton (re ex~ao) segundo j1 >!i j2 > e j2 >! i j1 >, que o semiespelho muda a

dire�c~ao do f�oton (re ex~ao e transmiss~ao) segundo ej1 >! (1=2)1=2[j1 > +ij1 >] e j2 >! (1=2)1=2[j2 >+ij1 >]

9. Determinar a probabilidade de que a bomba es-teja cheia de g�as, sem interagir com ela.

Para o caso, ent~ao, de que se disponha de um dis-positivo do tipo proposto aqui, existe uma probabili-dade de 1/4 de poder detectar as bombas boas. Pode-se mostrar que a probabilidade de \medi�c~oes livres deintera�c~ao" pode aproximar-se arbitrariamente de 1, sese disp~oe de um n�umero grande de dispositivos.

Exerc��cio

10. Quais propriedades dos objetos quanticos permitemfazer estas medi�c~oes livres de intera�c~ao?

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