240 240240 TITÍLIA E O DEMTITÍLIA E O DEMTITÍLIA E O DEM ... · homenagem a São Paulo e Minas...

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    1826

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    Meu amor, minha Titília,

    Fui com efeito à Conceição (1) [e] achei tudo bom. Desci ao Ar-senal (2) pela ladeira da Prainha (3) e vi a Corveta (4) bastante adiantada. Entrei na Alfândega, dei minhas ordens e ao sair deu--me meio-dia e não pude como lhe havia dito ir ao Trem (5). Não podendo pelo verdadeiro e sincero amor que lhe tenho deixar de procurar todas as ocasiões de a ver, tentei e fiz caminho para esta chácara pela rua das Marrecas (6), aonde eu supunha achá-la, e tão grande é minha ventura que tive o gosto de a ver antes da tarde. Não assente mecê que o que digo é nem o mais levemente ditado pela lisonja ou engano; mas sim pelo coração todo seu, e que existe dentro.

    Deste seu fiel, constante, desvelado, agradecido e verdadeiro amante

    O Imperador

    P. S.Tendo, hoje vai ao pintor (7); pois, não querendo a Imperatriz ir ao exercício (8), tem o gosto de estar com mecê à sua vontade.O mesmo

    (1) Local onde se encontra a Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição, ainda hoje existente no Morro da Conceição, bairro da Saúde, no Rio de Janeiro, onde também ficava o palácio do bispo do Rio de Janeiro.

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    25. Arsenal da Marinha.

    (2) Arsenal da Marinha. Na época, ficava ao pé do Morro de São Bento, onde existiam os estaleiros da Marinha. Nesse local foram realizados os desembarques cerimoniais das duas esposas de d. Pedro I, a arquiduquesa Leopoldina e a prince-sa Amélia de Leuchtenberg.

    (3) Antiga ladeira da Fortaleza da Conceição, atual ladeira João Homem, no morro da Conceição.

    (4) Provável referência à corveta Duquesa de Goiás, incorporada à frota bra-sileira em 1826 e naufragada na entrada da barra do Rio Negro em 27 de fevereiro de 1827, durante a Guerra da Cisplatina.

    (5) D. Pedro refere-se à Casa do Trem, onde ficava guardado o armamento militar (trem de artilharia). O prédio, ainda existente, é hoje ocupado pelo Museu Histórico Nacional. A pólvora, estrategicamente, era guardada distante, onde era fabricada, no Jardim Botânico.

    (6) Atualmente a rua permanece com o mesmo nome. Próxima do Passeio Público, no Rio de Janeiro, ganhou esse apelido devido à fonte que existia no local. Luís Gonçalves dos Santos, o padre Perereca, assim a descreve: “É elegante, em semicírculo, sua figura, cuja corda fica ao correr da rua dos Barbonos (atual Evaristo da Veiga), onde estão dois tanques, para neles beberem as bestas; entre os dois tanques há uma escada de pedra com oito degraus; no plano superior está outro tanque com cinco marrecas de bronze, que nele lançam água pelos bicos; na fachada desta fonte se vê uma grande inscrição lapidar e no alto sobres-

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    saem as armas reais; perpendiculares aos tanques e escada estão dois balcões de ferro, [...] sobre os quais estão duas figuras de metal que representam Narciso e a ninfa Eco.”1 As estátuas de bronze são de autoria de Mestre Valentim, e, se-gundo Vieira Fazenda,2 o que o padre Perereca descreveu como sendo Narciso é na realidade a deusa Diana, e a ninfa, uma náiade. O erro persiste até hoje nas placas informativas dessas peças, que se encontram no Jardim Botânico, no Rio de Janeiro.

    26. Rua das Marrecas.

    (7) Não existe nenhum retrato conhecido de Domitila nessa época. Porém, como o mesmo pintor que a retratou mais tarde, Francisco Pedro do Amaral, tam-bém trabalhou na decoração de seu novo palacete em São Cristóvão entre 1826 e 1827, é bem provável que se trate deste artista. Amaral (1790-1831) foi pintor--chefe e diretor das Decorações da Casa Imperial.

    (8) D. Pedro fazia questão de participar dos exercícios militares que eram realizados no Campo da Aclamação, antigo Campo de Santana, atual praça da Re-pública, no Rio de Janeiro, e no Campo de São Cristóvão, dependendo do tipo de manobras. Também era frequente a presença do imperador nos exercícios milita-res executados no Quartel da Praia Vermelha, onde ficava estacionado o Segundo Batalhão de Granadeiros, formado por imigrantes e mercenários alemães.3

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    Meu amor,

    Dou-lhe parte que, havendo amanhã exercício (1), é mister mar-car o campo para a marcha, e não me entendendo o Valente (2) o modo por que eu o queria marcado, resolvi-me a ir com ele agora marcá-lo. Levo a minha filha também, e se a Imperatriz não for hei de ver se passo por sua casa para ainda ter o gosto de a ver antes da noite. Creia que sou o

    Seu fiel, constante, desvelado, agradecido e verdadeiro amante

    O Imperador

    (1) Exercícios militares. Pela expressão “marcar o campo”, pode se referir a manobras militares que eram realizadas no Campo de São Cristóvão, onde hoje se encontra o Centro Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas.

    (2) General Pereira Valente, ajudante de campo de d. Pedro I.

    27. Manobras militares no Campo de São Cristóvão. No centro à

    direita aparece d. Pedro cercado por sua guarda de honra.

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    Meu amor,Minha Titília,

    Estando o tempo a turvar-se, resolvi não fazer exercício, e nesta conformidade já mandei a ordem. Dou-lhe parte para que saiba e não se ache enganada esperando que o haja. Vou fazer a barba para mecê não ser arranhada à noite por

    Este seu desvelado, agradecido, fiel, constante e verdadeiro amante

    O Imperador

    P. S.A pena está o diabo pela chuva.

    28. D. Pedro I.

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    29. D. Pedro II no alto, d. Januária e d. Francisca.

    Meu amor,Minha Titília,

    Estimei muito saber pelo Simões que mecê, e a nossa Belinha, haviam passado bem. Eu, meu bem, passei incomodado do ou-vido com dores constantes e, para coroar a festa, havendo ido para a Glória (1) sem chuva, apanhei na volta toda esta maldita tormenta que por ora não me aumentou as dores; mas sim o pe-sar de a não poder ir ver de dia como desejava, pois bem sabe o quanto se interessa por mecê este seu desvelado, fiel, constante, agradecido e verdadeiro amante

    O Imperador

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    (1) A devoção da família a Nossa Senhora da Glória começou com d. João VI. Quando nasceu a primeira filha de d. Pedro e d. Leopoldina, d. Maria da Glória, o avô dedicou-a à Senhora da Glória, dando-lhe o nome, e levou-a ladeira acima, até o altar, rogando proteção. A tradição passou para d. Pedro I, d. Pedro II, chegando até os nos-sos dias. Os nomes dos demais filhos de Pedro I, assim como aconteceu com Maria da Glória, têm cada um seu significado próprio. D. Paula Mariana foi chamada assim em homenagem a São Paulo e Minas Gerais, províncias que cedo juraram fidelidade ao príncipe; d. Januária, em homenagem ao Rio de Janeiro; e d. Francisca, devido ao rio São Francisco, importante para a unidade nacional, correndo de Minas ao Nordeste.

    30. Ao fundo o outeiro da Glória, visto do Passeio Público.

    Meu amor do meu coração,

    Estimei muito saber que mecê e a nossa querida Bela passaram bem. Eu, meu amor, não passei muito bem, pois tive muita tosse e de manhã acordei doendo-me a espádua direita sobre a costela que quebrei (1), e ainda me continua. O tempo chuvoso, o meu incômodo e o despacho me impedem de ir agora pessoalmente saber da sua saúde, e abraçá-la com aquele entusiasmo nascido de um amor cordial que abrasa o coração seu e

    Deste seu amante, fiel, constante, desvelado, agradecido e verdadeiro, e amigo ex corde et anima

    O Imperador

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    (1) Na queda do cavalo em 30 de junho de 1823. Vide carta 1, p. 66.

    31. Palacete da marquesa de Santos, atual Museu do Primeiro Reinado.

    Meu amor,

    Não é porque desconfie de mecê e aceito a recomendação de vi-ver bem pois eu a não mereço, porque vivo. Foi só a querer saber que me fez escrever pois já há muito tempo que estava de óculo (1) e nada tinha visto, e pela demora já eu desconfiava que fosse a Durocher (2) com os vestidos. Que havemos [de] viver bem não tem dúvida pela parte desde seu amante etc.

    O Imperador

    (1) Com a mudança de Domitila em abril de 1826 para a chácara de São Cris-tóvão, d. Pedro passaria a espioná-la das janelas do palácio da Quinta da Boa Vista, onde residia. No Diccionario da lingua portugueza, de Antônio de Moraes e Silva,

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    encontramos a definição para óculo: “Instrumento composto de um ou mais ca-nudos, com lentes, que aumentam os ângulos visuais, exceta a objetiva, e a ocular, e que aproximam os objetos”. Enfim, com uma luneta, o nosso imperador ficava, literalmente, de olho na amante. Ora reclamaria saber que ela estava em casa e que mandara de propósito fechar as janelas para que ele não a visse, ora mandaria bilhetes perguntando de quem eram todas as carruagens estacionadas na chácara. Os ciúmes que ele sentia por ela eram tão intensos que, mesmo durante a segunda tentativa de separação, quando ela partiu para São Paulo, em junho de 1828, o im-perador deu ordens para descobrir se ela havia se encontrado com algum homem durante esse período, talvez devido à correspondência anônima que havia recebi-do (anexos 11 e 12, p. 190). Também em carta de 15/11/18274 existe referência dele vasculhando a residência de Domitila com o tal “óculo”.

    (2) Referência a Ana Durocher, modista francesa, dona de loja de tecidos, estabelecida na rua dos Ourives, próximo à rua do Ouvidor. Era mãe da famo-sa parteira do Segundo Reinado, Maria Durocher. Mais tarde, em 1829, quando Isabel Maria, a duquesa de Goiás, foi enviada para Paris, Durocher é quem iria providenciar o enxoval da menina.5

    O famoso palacete da marquesa de Santos em São Cristóvão teria diversos usos. Serviria de residência a d. Maria da Glória quando esta retornou para o Bra-sil, e posteriormente seria comprada pelo barão de Mauá, que faria o inverso de d. Pedro: espionaria das suas janelas o palácio de São Cristóvão, para saber se d. Pedro II estava em casa. Hoje abriga o Museu do Primeiro Reinado.

    Meu amor,minha Titília,

    Se minha voz, movida pela verdade, e inextinguível a que lhe consagro, alterando-se um pouco a escandalizou, lhe peço per-dão; mas a verdade jamais de mim se separará, e minha boca será o órgão por onde ela há de ser enunciada.

    É o que se espera do amigo. Fatal dito foste para mim, que tanto me tenho sentido pelo modo e ocasião em que [rasgado] dito, e porque tenho caprichado, e o capricho em estimá-la como mecê sabe.

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    O que se espera de amigos como eu é o que eu tenho feito, que é estimá-la como à minha mulher, e dizer-lhe sempre a verda-de para que seu nome vindo aparecer seja imediatamente elogia-do. Isto é o que se espera de amigos, e amigos como eu.

    Meu amor para com mecê é inacabável, pois meu coração é seu.

    A lisonja, assim como não mora comigo, não gosto que apa-reça junto de mim, por isso desmascaro os lisonjeiros que lhe beijam os pés para verem se assim eu os olho melhor, e deixo de os conhecer como os conheço de [rasgado] seu Imperador. O seu choro e a sua arrenegação procedida de eu dizer a verdade me consomem muito por ver o quanto mecê assentia enganada e o quanto foi o seu sentimento por tal. Se eu ainda agora visse o que acima digo, eu não reputaria o arranjo consigo; mas antes, sim, o choro, agradecimento de eu lhe mostrar a verdadeira luz e que estava enganada, e a arrenegação, de vergonha de não haver conhecido tais lisonjas.

    Quando falei de não virem saber de meus filhos cá em cima não foi [para] incomodá-la de preferirem a mecê, e a minha querida Bela; mas a falta de polidez como de homem para homem, e a essa falta de amor, como de súdito para seu Monarca.

    A minha Glória e Satisfação é que mecê conhece a verdade, e quem lha fala segue-a, e os conselhos de quem a estima e esti-mará sempre reputando-se

    Seu verdadeiro, fiel, agradecido, constante e desvelado amante do fundo do coração que agora morra se assim não é

    Pedro

    P. S.Assino-me Pedro para que veja que lhe falo unicamente como amigo independente de consideração alguma pública, puramente como um particular que ama a sua glória e deseja ver seu nome exaltado.

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    32. Carta de d. Pedro I para Domitila de Castro. Rio de Janeiro,

    circa 1825. Hispanic Society of America, Nova York.

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    Meu amor, minha Titília,

    Eu já não namoro a ninguém depois que lhe dei minha palavra de honra (1), e assim não lhe mereço teus ataques. E quanto a dizer--me que lhe não dei parte de ter ido outro dia a Botafogo tu engana--se, pois à noite eu lhe disse (por tal sinal) que tinha ido com a Im-peratriz no carro e a passo. Sinto infinito que depois de tanto tempo de prova mecê ache ainda capaz de lhe fazer traições e infidelidades

    Este que se considera e afirma ser seu amante fiel, constan-te, desvelado, agradecido e verdadeiro

    O Imperador

    (1) É impossível não nos recordarmos da gravidez de Maria Benedita, irmã de Domitila.

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    Meu amor,Minha Titília,

    Sempre solícito em cumprir religiosa e prontamente suas deter-minações, tenho o gosto de participar-lhe, primo (1), que já dei o seu recado ao Ponçadilha (2) para ele dar a Francisca (3), e secundo (1), que Maria Antonia Magalhães (4) mora na Rua da Ajuda, bem defronte da Rua de Santo Antônio. É para mim o maior gosto (embaixo do que ainda agora fizemos) o empregar--me em desempenhar aquelas comissões de que sou por mecê en-carregado, não só porque com isso muito me prezo, e folgo; mas até por mais nisto lhe mostrar quem é, e o quanto a deseja obse-quiar, e obedecer-lhe às suas Excelentíssimas ordens

    Este seu desvelado, constante, fiel, agradecido e verdadeiro amante do coração

    O Imperador

    P. S.Não tome a frase da escrita por mangação, antes se persuada do que é certo, que é o grande contentamento em que estou por isso.

    (1) Forma latina de “primeiro” e “segundo”.(2) Refere-se a um dos irmãos Ponçadilhas, José Manuel Rodrigues e João

    Manuel. O primeiro foi ajudante de campo do futuro marquês de Barbacena du-rante a Guerra da Cisplatina, cabendo a ele encontrar-se com d. Pedro em viagem para o Rio Grande do Sul, em 1826.

    (3) Francisca, filha do primeiro casamento de Domitila, foi educada no Colé-gio de Madame Mallet, na corte. Maria Graham afirma que, em protesto, diversas famílias tiraram suas filhas dessa escola.

    (4) Um documento preservado no Arquivo Histórico do Museu Imperial6 mostra a disposição dos convidados para um banquete oferecido em comemora-ção ao aniversário da duquesa de Goiás, realizado no palacete de Domitila, em São Cristóvão. Lá aparecem os nomes de Maria Magalhães e de Maria Antônia.

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    33. Carta de Domitila de Castro, com resposta de d. Pedro I. Rio

    de Janeiro. Hispanic Society of America, Nova York.

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    Filho,

    Eu tinha vontade de ir até aquela chácara do Engenho Velho (1), mas queria levar a Duquesa (2) e se for do seu gosto que ela lá vá comigo mande ordens para que venha o carro dela (3). Adeus, até logo

    Tua AmigaE filha Demetília

    [Na mesma carta a resposta de d. Pedro:]

    Nu em pelo respondo. Como tu quiseres, e o que tu quiseres que-ro Eu. Creio ser a de tua avó. Eu também lá irei.

    (1) Provável referência à casa da irmã dela, Ana Cândida.(2) Isabel Maria, filha de d. Pedro e Domitila, foi feita duquesa de Goiás após

    completar dois anos, em 24 de maio de 1826.(3) Em levantamento dos bens de d. Pedro quando de sua partida para Por-

    tugal, em 1831, figuram 67 veículos, entre eles um “carro de cortina pertencente à duquesa de Goiás”.7

    Nessa carta, muito mais difícil de transcrever do que qualquer uma de d. Pe-dro, podemos ver os problemas que Domitila tinha com a escrita.

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    1827

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    Minha querida filha do meu coração,

    Não podendo eu ter nada que contigo não reparta, eis a razão por que te ofereço. É queijo de Pinha (1), que me parece mui bom, e dos que agora me vêm de Inglaterra em lugar dos outros fedorentos que antes vinham. Estimarei sempre, e cada vez mais, ter ocasiões de te patentear a minha lembrança por ti, e o decidi-do amor, e inextinguível amizade, que sempre te mostrará ainda mesmo no través (2) de todos os perigos.

    Este teu filho amigo, e amante fiel, constante, desvelado, agradecido e verdadeiro

    O Imperador

    (1) “Queijo de Chester de 50 quilogramas requer três anos de armazém, antes de ir ao mercado; mas também a conta deste grande empate, posto que aliás no fabrico nenhuma dificuldade haja, se vende por tão subido preço, que bem vale a pena do es-perar. Também se fabricam pequenos; toda a gente os conhece; porque têm um feitio de pinha, e até queijos de pinha é o nome que entre nós se lhes costuma geralmente.”1

    (2) O mesmo que por meio de, através.

    Minha querida Filha e Amiga do C., (1)

    Como tenho de mandar o Fernando para a chácara, não quis deixar de te agradecer as expressões de amizade com que me tra-tas. Não escrevo mais pois já te escrevi hoje pelo teu Paulo (2). Adeus, até amanhã às horas da ordem.

    Teu filho, amigo e amante fiel etc.

    O Imperador

    P. S.Não repares na letra nem no torto das regras, pois é feita no can-to de uma casa que tem só porta, e por ela entra o sol que racha e mora aqui o novo Midas = Ponçadilha. (3)

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    (1) Coração.(2) Não identificado. D. Pedro pode se referir a algum amigo, criado ou es-

    cravo de Domitila.(3) Refere-se a um dos irmãos Ponçadilha, ou José Manuel Rodrigues, ou a

    João Manuel.

    Minha filha,

    Sinto como mecê sabe o incômodo da nossa querida Bela, que logo irei ver, acabe-se o despacho quando for que se acabe. O meu filho (1), e seu, deu-me muito cuidado antes de me ir para a Glória (mas já está bom). Teve uma dor mui grande, mas eu dei--lhe chá de Marcela (2), fomentei-lhe (3) a barriga com banha, pus-lhe um pano quente e deitei-lhe uma mezinha (4) de azeite puro, com que obrou e está bom.

    A Maria (5), que foi à Glória, teve lá enjoo de estômago, mas foi de não comer com apetite de ir. Dei-lhe um bolo, e vinho, e está boa.

    Tudo, meu bem, são desgraças sobre desgraças, e a única felicidade que tenho é ser o

    Seu amante fiel, constante, desvelado, agradecido e verda-deiro

    Imperador

    P. S.Não sendo o coco que veio da Bahia bom, remeto este, que esti-marei lhe agrade.

    (1) Pedro de Alcântara, futuro imperador d. Pedro II.(2) Macela ou marcela, uma erva brasileira, também conhecida como falsa

    camomila, usada na medicina popular para aliviar cólicas.(3) Fomentar: friccionar a pele com um líquido aquecido para fins curativos;

    fazer compressa quente e úmida.(4) Líquido medicamentoso aplicado com enema.

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    (5) Maria da Glória, filha de d. Pedro e d. Leopoldina, nascida no Rio de Ja-neiro em 4 de abril de 1819 e falecida em Lisboa a 15 de novembro de 1853. Rainha de Portugal.

    Os cuidados e carinhos de d. Pedro como pai são visíveis em vários momen-tos, inclusive em cartas para Domitila. As atitudes dele chegavam a impressionar, sendo constante a referência, inclusive diplomática, sobre o fato. Quanto ao enig-mático “o meu filho, e seu”: o único filho homem que eles tiveram, também cha-mado Pedro, nasceu em 7 de dezembro de 1825, cinco dias depois de d. Pedro II, e faleceu em 13 de março de 1826, durante a viagem dos imperadores e de Domitila à Bahia. Ele sempre ficou aos cuidados dos avós maternos. Logo após a morte de Leopoldina (11/12/1826), d. Pedro passou, por algum tempo, a referir-se aos filhos dele como também filhos de Domitila.

    34. D. Manoel Joaquim Gonçalves de Andrade, bispo de São Paulo.

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    Minha filhae querida amada do coração,

    Perdoa o não te [ter] escrito primeiro do que tu me escrevesse. Não foi esquecimento, antes desde as 6 e meia, que me levantei sem poder dormir, que estou para te escrever, e a minha cabeça está ainda tão fora dos eixos com tanto que tenho sofrido como sabes que agora mesmo pego na pena para te escrever dizendo-te que muito agradeço as uvas, e mais que tudo a tua lembrança que me cativa ainda mais, se é possível. Eu já estou morrendo que chegue a hora de ver-te com a nossa filha, que estimo passasse bem assim como tu. Não só o que é teu, mas o que é meu tu podes emprestar e dar. Eu só reparei, e disse ao Oliva (1), se tu terias vindo ou o que viria a traquitana (2), nem eu soube que nela tinha vindo o Bispo de São Paulo (3), pessoa a quem tu, e tua família, são obrigados. Antes pelo contrário, sempre te louvarei aquelas que possam mostrar publicamente tua franqueza e generosidade.

    Beijando primeiramente as peras, as deitarei fora como me ordenas.

    Tenho o gosto de remeter-te a caixa já com o teu nome escri-to, duas calças, uma esteira e uma caixa de flores. O passarinho para a nossa Belinha eu reservo para lhe dar em mão própria.

    Já que tu me não mandastes a tina, faze-me o favor de a mandar lá estar com água esta noite na casa da janta para se banhar à noite.

    Este teu filho, amigo e amante, fiel, constante, desvelado, agradecido e verdadeiro

    O Imperador

    (1) Cunhado de Domitila, que seria despachado para Recife, junto com seu batalhão, em 3 de setembro de 1827.

    (2) A traquitana era um veículo de quatro rodas, sendo duas pequenas na frente e duas maiores atrás. Podia ser puxada por dois ou quatro cavalos. Era muito usada por membros da elite.

    (3) D. Manoel Joaquim Gonçalves de Andrade (1775-1847). Foi indicado bis-po de São Paulo por d. Pedro I em 12 de outubro de 1826, confirmado por breve

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    papal em julho de 1827 e sagrado em 28 de outubro, no Rio de Janeiro, pelo bispo e capelão-mor d. José Caetano de Sousa Coutinho. Retornou a São Paulo em de-zembro, fazendo a entrada na capital no dia 23. Assumiu o cargo de presidente da Província de São Paulo por três ocasiões. Esse mesmo religioso iria batizar a última filha de d. Pedro com Domitila, nascida em São Paulo, em 1830.

    Minha querida filha e minha amiga do coração,

    Manda-me dizer como passaste o resto da noite, e se te não fez mal o frio do chão nos pés. Igualmente te peço que me prometas, bem como eu te prometi, até, no dia dez (1), que te importas com ninguém; não te escandalizes, meu bem, com isto, porque tu tão bem me tens feito o mesmo. Tu decerto não terás dúvida, pois o que se não tenhas tenção de fazer, não está a prometer. Adeus, minha filha, no Teatro (2) nos veremos, e depois terá o gosto de te abraçar

    Este teu filho, amigo e amante fiel, constante, desvelado, agradecido e verdadeiro

    O Imperador

    P. S.Filha, dá-me uma resposta com que confortes este teu coração despedaçado.

    (1) Em carta datada de 14/10/1827,2 d. Pedro também faz referência ao dia 10 de setembro, quando eles reataram o relacionamento após o atentado à baronesa de Sorocaba. Os ciúmes continuavam sendo uma constante.

    (2) Referência ao Imperial Teatro São Pedro de Alcântara, incendiado em 1824, reinaugurado em março de 1826, ano em que pegou fogo novamente, sen-do reaberto em 18 de abril de 1827. Os espetáculos começavam às oito horas da noite. Depois de passar por sucessivas reformas e mudanças de nomes, o edifício foi demolido no final da década de vinte do século passado e um novo teatro, o João Caetano, foi erguido no local. Em 1838, esse teatro seria arrendado a Manuel Maria Bregaro, pai de Carolina Bregaro, casada com Rodrigo Delfim Pereira, filho de d. Pedro com a baronesa de Sorocaba.

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  • 1 3 8 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 3 9

    35. D. Pedro I e d. Maria da Glória.

    36. A praça que vemos em primeiro plano, conhecida na época como do Rocio, é a atual

    praça Tiradentes, no centro da cidade do Rio de Janeiro. À esquerda o Teatro Imperial, onde

    hoje se encontra o teatro João Caetano, e ao fundo a igreja de São Francisco de Paula.

  • 1 4 0 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 4 1

    Minha querida filha e minha amiga do coração,

    Muito hei de estimar o saber que passaste bem o resto da noite. Eu às 7 já estava em pé, mas não te escrevi logo porque tu esta-vas dormindo, o que fizeste até as nove e meia. É verdade que me demorei a escrever-te, mas foi por não o querer fazer defronte do Chalaça (1). Nossas filhas estão boas.

    Minha filha, eu não sei com expressões de peça perdão do quanto te mortifiquei ontem, mas tu melhor que eu sabes o que custa a roer ciúmes em silêncio, e sabes mais que eles fazem de-sesperar a ponto que se chega até a desejar matar e morrer. Eu tenho-te tanto amor que não sei até que ponto umas vezes me ar-rebata de prazer, outras de raiva. Eu conheço minhas esquisitices. Que hei de fazer, paciência. Eu, meu bem, não temo de ti nenhu-ma infidelidade, mas há circunstâncias, e ocorrências e azares, que às vezes fazem perder o juízo, excitar o ciúme, gerar-se a raiva, perpetrarem-se loucuras, e até mesmo coisas que só o de-sespero pode sugerir. Tudo isto me tem acontecido, e tem (conheço que sem razão nem motivo) dilacerado o coração já quase acaba-do deste teu filho. Falta (posto que não persiga) uma prova da tua parte para me convencer que tu não gostas mais de tua prima que de mim (2), e dando-ma tu, eu então poderei ficar dissuadido da desconfiança de tu a estimares mais do que a mim, e da suspeita de inteligência tua com aquele matuto leãozinho ou sagui loiro, e é a prova. Tu hás de mandar-me o anel (3) que tua prima te deu, e eu to restituirei à noite. Se me fazes isso eu ficarei mais descansado, e poderá gozar mais algum sossego este infeliz, e mais que infeliz

    Teu filho, amigo e amante, fiel, constante, desvelado, agrade-cido e SEMPRE VERDADEIRO

    O Imperador

    P. S.Manda-me dizer se vais à Ópera, que é Timonella (4), e a dança de Janij. Não deixes de ir por causa do bandalho do Bremense (5), pois não são estas as provas que eu quero, que são não fazer tu caso de um maroto tal que se continuar há de...

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  • 1 4 0 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 4 1

    Ainda que vá à Ópera ou eu ou tu, eu lá estarei em tua casa o mais tardar até as onze horas, pois a ópera é pequena, e a dança não a acabarei de ver para estar contigo, e se possível fosse quereria acabar com minha vida em menos de uma hora se me confessasse de todos os meus pecados para gozar a Glória eterna, pois deste mundo só a morte é que dá satisfação em circunstâncias como as deste teu desgraçado filho. Sou teu, tu és minha, e peço-te para que tu vejas o quanto eu te amo = Que tu me faças todas as infide-lidades que eu te fizer =, que então teu coração ficaria descansado dentro deste teu peito que está pronto a receber o golpe dado por ti. Eu já não sei o que digo, estou a modo de maluco, só quero apertar-te esta noite contra meu peito ou decerto acabo ou doido ou não sei como. Eu me estranho a mim mesmo, acho-me de tal modo com a cabeça abatida que ou não falo, ou falando contigo, falo no que não tenho razão alguma. Sou teu, acaba-me com esta triste vida, ela é tua, ela é da Pátria (6), ela me atormenta, só sou infeliz. À noite direi o que jamais poderei esconder.

    (1) Em setembro de 1827, após um estremecimento, o casal fez as pazes e reatou o romance, porém, como d. Pedro já estava tentando arrumar uma nova esposa na Europa, era importante ser discreto.

    (2) Não é a primeira referência de um ataque de ciúmes dado por d. Pedro a respeito dessa prima. Em outra carta de setembro de 1827,3 o monarca refere--se a Josefa, uma das primas-irmãs de Domitila, da família Santana Lopes. Ela e as irmãs solteiras moravam na época na corte, junto com seus pais. A mãe delas, Engrácia, era irmã de Escolástica, mãe de Domitila. O barão de Mareschal informa em um de seus despachos para a Áustria que a “família aflui de todos os lugares, avó, tios, primas e primos”.

    (3) A história do anel é uma verdadeira novela. Primeiro ele pede o anel, ela o manda, ele devolve dizendo que não é aquele e depois se convence de que está errado e que é o mesmo que havia visto na casa dela. Essa é a carta inicial da se-quên cia já publicada anteriormente.4

    (4) A ópera Timonella, ou O tutor logrado, de Luigi Caruso, estreou no Rio de Janeiro em 1826, sendo reapresentada em 1827.5 Como nesta carta d. Pedro faz referência a “nossas filhas”, ela só poderia ter sido escrita após o nascimento de Maria Isabel, em 13/8/1827.

  • 1 4 2 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 4 3

    (5) O “bandalho do bremense” pode se referir a algum desafeto do imperador que tenha dito algo a respeito de Domitila. Não seria a primeira vez que d. Pedro tomaria a defesa da marquesa sem que ela concordasse ou mesmo gostasse de tal atitude: “Se o motivo (de estar zangada) é o de ter eu ontem xingado o Albino e o João Caetano, tenho muita glória de punir por ti e pela tua honra”.6 Em carta datada de 15/11/1827, o barão de Mareschal, em relatório enviado à Áustria, conta que a 16 de junho daquele ano d. Pedro havia recebido uma delegação estrangeira vinda de Bremen, Alemanha.7

    (6) Esta é uma das cartas mais passionais de d. Pedro, tanto entre as já publi-cadas anteriormente quanto neste acervo inédito redescoberto. Em 1827 ele estava sob muita pressão. A Guerra da Cisplatina não ia bem e acabaria com a perda da província e a criação do Uruguai. Havia ainda a questão da sucessão portuguesa, a busca por uma nova esposa, enfim, aqui é o homem Pedro, e não o imperador, exausto, lançando um grito de socorro.

    Minha querida filha e amiga do coração,

    Não me taches, filha, de te não querer responder, nem tampouco disso me esquecer; neste momento, que são quase duas horas, acaba o Bicho (1) de me entregar tua para mim estimadíssima carta, e recebo a reprimenda de não ter mandado saber de ti. Eu a aceito como coisa tua, e ta agradeço, pois tu me ensinas, mandando saber de mim, o que eu deveria ter feito, e que não fiz por esquecimento, pois sempre existes em minha lembrança. Hei de estimar que passastes bem, e te divirtas ainda que eu me per-suada que te farei falta, e que tu com saudades acharás todos os divertimentos insossos, assim como eu os acho. Das meninas (2) ainda não tive notícias, mas decerto estão boas, pois se houvesse novidade já eu havia de saber; mas, não tendo de lá mandado participação, já havia mandado saber, e ainda não tinha vindo resposta. Logo que receba, terá o gosto de lá receber.

    Este teu filho, amigo e amante, fiel, constante, desvelado, agradecido e

    VerdadeiroO Imperador

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  • 1 4 2 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 4 3

    P. S.As encomendas ainda não chegaram todas, e o Borba já tem sa-cado por oito a dez contos de réis.

    (1) Bicho, Gaiato, Manuel Inglês, são criados ou amigos de confiança a quem d. Pedro e Domitila, nesse período crítico, confiavam suas mensagens.

    (2) Maria Isabel, segunda filha de d. Pedro e de Domitila, nasceu em 13 de agosto de 1827. Em 26 de agosto, o imperador mandou tirar Isabel Maria e a filha recém-nascida da mãe, e as crianças passaram a viver com ele no Palácio de São Cristóvão. Maria Isabel faleceu em 25 de outubro de 1828, de meningite.

    Filha,

    Não te escrevi logo de manhã pois que haverão 4 horas que daí tinha vindo, e poderia parecer mangação perguntar-te como pas-saste, o que agora faço e ao mesmo tempo te apresento as condi-ções que me parecem serem iguais.

    1ª Mútua confiança de parte a parte.2ª Poder cada um de nós fazer o que lhe parecer, uma vez

    que guarde fidelidade ao outro.3ª Não darmos ouvidos (o que nunca fiz) a ninguém.4ª Não haverem ciúmes desordenados, e só sim os que forem

    bem fundados, e compatíveis com o bem viver, e conformes a toda condição que os destrói de per si.

    5ª Podermos sair a passeios, estarmos fora e conversarmos, contando uma vez que seja sustentada a 2ª.

    Teu filho etc.

    Imperador

    P. S.Lá vou depois da Ópera e então falamos.

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    Filha,

    Não só para meu cômodo como para não incomodar o Barão (1), que vinha para a cidade, julguei mais acertado não jantar na Tijuca. Ao mesmo tempo, tiro a utilidade de saber antes da noite como tu passaste desejando que fosse bem o resto, pois o princí-pio foi mau para nós ambos.

    Quero saber de quem é tanta sege que lá está, pois nem me-nos de três vi quando passei.

    Filha, eu hoje estou muito terno, e muito macio. Desejo sa-ber se tu estimarias que este teu grosseiro, mas teu muito amigo filho lá fosse. O meu desejo é este (de ir lá hoje), mas temo não se encontre a tua vontade em oposição. Eu espero que tu me man-des dizer que = (Não deixas de estimar que eu lá vá hoje às 9 e meia para as dez) =. Se isto me fizeres, eu me reputarei mui feliz, e cada vez mais.

    Teu filho, amigo e amante etc.

    Imperador

    (1) Não identificado. Pode ser uma referência ao barão de Mareschal (ver carta 65, nota 3).

    Filha,

    Remeto para te ser apresentado logo que tu chegares a casa este ramalhete, que eu quero que à noite, quando eu for, tu me digas se te lembras o que significa cada uma dessas flores de per si; e depois todas juntas (1). Adeus, até as horas da ordem, e no en-tretanto recebe o coração saudoso e que de ti nunca se esquece que te envia

    Este teu filho, amigo e amante etc.

    Imperador

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  • 1 4 4 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 4 5

    (1) D. Pedro refere-se à Linguagem das Flores, que os viajantes ingleses já ha-viam notado na Turquia e que os franceses acabaram por disseminar pela Europa. Nessa conversa sem palavras, não só cada flor tinha um significado, como o modo de ofertar e receber eram carregados de simbolismos. Maria Graham observou em 1821 que os jovens pernambucanos eram “tão destros no uso de sinais como os próprios amantes turcos. [...] Um namoro é mantido desta maneira, e termina em casamento sem que as partes tenham sequer ouvido as respectivas vozes”.8 Códigos através do manejo de leques também eram comuns.

    Filha,

    Não lembrando que hoje era dia de jogo (1) (pois minha cabeça estava perdida), te mandei dizer que às dez lá estava, mas não querendo que tu repares se chegar às dez e meia te escrevo. Hei de fazer as diligências para acabar (sem que eles desconfiem) o jogo às dez, e logo te irei abraçar.

    Teu filho, amigo e amante etc.

    Imperador

    (1) Em 1827, d. Pedro arrumou um parceiro de xadrez: o inglês John Henry Freese, conhecido na casa do barão de Mareschal. Talvez seja a esse jogo que ele se refira nessa e em outras mensagens. Observando-se as cartas datadas sobre o mesmo tema,9 percebe-se que as idas de d. Pedro à casa do diplomata austríaco e os jogos ocorreram na época em que ele tentava aparentar que nada mais existia entre os amantes.

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    Minha boa senhora,

    Não posso entender a razão de me não responder chamando-me de filho como eu chamo a Va. Ea. e espero que Va. Ea., mitigan-do alguma coisa seu gênio hoje irritado sem razão, me responda pondo no frontispício da carta Filho, na forma porque sempre me escreveu, e

    E. R. M. (1)

    (1) Espera Receber Mercê.

    D. Pedro, neste bilhete, talvez após alguma briga, dirige-se a Domitila ironi-camente imitando linguagem protocolar.

    Filha,

    Com o coração nas mãos deveras te confesso que não sei o mal que tenho feito em ir a Botafogo. Quero que me mandes dizer ou que à noite me digas. Quanto à Boa Vista, eu não conheço que duas: uma é esta chácara (1), outra é no alto da Tijuca (2), aonde não vou desde 10 ou doze de janeiro quando lá estava o barão de Mareschal (3), e que voltamos ambos. Quanto a Laranjeiras, de-pois daquelas três vezes que para lá fui em que na segunda entrei na casa da Lagoa do Marquês de Cantagalo (4), ainda não passei que cá pelo caminho que vai para o Botafogo, e passa pelo largo exatamente aonde eu caí.

    Portanto, filha, eu muito desejo saber o que é isto, e peço-te que ou me mandes dizer ou à noite mo digas, porque eu ainda que dê com a cabeça pelas paredes decerto não adivinho por quê. Agora, com toda a verdade que é inseparável de mim, te digo que não tenho minha cabeça com sentido em ninguém, nem fiz coi-sa, por menos que fosse, que pudesse fazer dizer-se nada de mim. Não duvido que houvesse algum bom ofício de algum maroto; mas fazendo-me tu o obséquio de me contar o que te disseram, eu estou

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  • 1 4 6 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 4 7

    pronto com a verdade a rebater e repelir qualquer intriga e moti-vo. Adeus, filha, até à noite, recebe o coração, abraços e beijos

    Deste teu filho, amigo e amante, que tendo sido mau em ou-tros tempos nunca te enganou e por isso se jacta de dizer seu verdadeiro

    Imperador

    (1) Quinta da Boa Vista, onde fica o Palácio de São Cristóvão, moradia do imperador. O local fazia parte de uma vasta fazenda jesuíta chamada São Cristó-vão. Quando da expulsão desses religiosos pelo marquês de Pombal, a propriedade passou à coroa. Com o passar do tempo, o terreno foi sendo loteado, e uma grande área, arborizada e elevada, foi adquirida por Antônio Elias Lopes, um rico comer-ciante português. A propriedade, de onde era possível avistar o porto e a cidade do Rio de Janeiro, recebeu o nome de Quinta da Boa Vista. Com a chegada de d. João VI e da corte portuguesa, Elias cedeu-a para o príncipe. D. Pedro para aí se mudou durante sua administração como príncipe regente, transferindo ao paço os serviços burocráticos que estavam espalhados por edifícios alugados.

    (2) Alto da Boa Vista, na Tijuca.(3) Philippe Leopold Wenzel, barão de Mareschal (1784-1851). Diplomata

    austríaco. Encarregado dos negócios da Áustria no Brasil de 1819 a 1826, ministro plenipotenciário em 1827. Retirou-se do país em 1830.

    (4) João Maria da Gama Freitas Berquó foi feito marquês de Cantagalo em 12 de outubro de 1826. Estava entre os acompanhantes de d. Pedro em 7 de setembro de 1822.

    37. Palácio de São Cristóvão, localizado na Quinta da Boa Vista.

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    Filha,

    Jamais receberei os sacrifícios que faz por mim de uma maneira mal entendida. Eu os recebo como provas de teu amor para co-migo. Que culpa posso eu ter de tu seres desconfiada sem razão? Que precisão tens tu de tomares tanto interesse por mim que não queres que te vá ver hoje? Eu, filha, hei de lá ir hoje, e só dei-xarei de o fazer se tu assim mo ordenas positivamente, o que eu tomarei como estares mal com este teu filho que tanto te ama e estima. Tu não deitaste pérola fora, teu filho sabe apreciar teus incômodos e cumprimentos para com ele, e te agradece ainda os menores, quanto mais este. Tu não tens que te emendar porque não te enganaste em visitares quem te quer bem. Eu lá vou ainda que me leve o Diabo, pois morrendo por ti, morro contente, e deixarei os meus inimigos satisfeitos. Adeus, filha, até as dez. Teu filho, amigo e amante

    Imperador

    P. S.Filha, pelo amor que tens a nossas filhas, não me faças por tuas inconsideradas expressões (e por mim não merecidas) atormen-tar-me eu. Filha, estou (pergunta a teu mano João) com a cara mais abatida, e muito mais ficará se em lugar de receber de ti agradáveis expressões eu na tua carta achar o contrário. Filha, eu te quero muito, tu bem o sabes, e se te não quisesse nada te diria, nem excogitaria todos os dias modos e entradas para te ir ver. Manda, filha, fazer a porta, e até ela ficar pronta irei entran-do pelo portão de costume (1), por onde hei de visitar hoje às dez horas querendo tu, o que espero, pois não quererás dar cabo des-te teu filho com mais essa provação de me proibir lá ir. E espero que tu te compadeças de quem é teu filho e teu amigo e amante.O mesmo

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  • 1 4 8 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 4 9

    (1) Nota-se ainda a tentativa de dissimulação entre eles. É preciso fin-gir para que os criados e pessoas mais próximas não percebam que houve a reconciliação dos amantes, a fim de que continuem não sabendo nada os em-baixadores, e consequentemente as cortes europeias, onde Barbacena e seus delegados estão tentando ajustar um novo casamento para d. Pedro. Curiosa a menção a mandar fazer a porta. Uma das lendas do palacete onde Domitila morava é que ele se comunicaria por um túnel com o Palácio de São Cristóvão, e seria por aí que o imperador entraria escondido. Mas a distância, a natureza do terreno e outros fatores não contribuem para a existência real dessa pas-sagem. O que houve, efetivamente, foi a construção de um portão no muro de divisa da casa da marquesa com a Quinta da Boa Vista, por onde d. Pedro poderia entrar discretamente.

    Filha,

    Como começas a sentir os prognósticos da sezão (1), ainda que não sintas mais nada, toma à noite o enxofar (2), porque ainda que ela venha, virá menor, e continuando a tomá-la não terás mais de duas outras, e se tiver segunda, tomando um vomitório e remédios, adeus sezões. Adeus, filha, até as onze.

    Teu filho, amigo e amante etc.

    Imperador

    (1) Febre intermitente ou maleita.(2) A mistura é ensinada novamente por d. Pedro em carta datada de

    22/1/1828: “Em duas colheres de água bem quente, meia colher de chá de flor de enxofre”.10

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    Querida Marquesa,

    Acabo de receber uma carta sua na qual me pede parelhas para mandar a fim de ir à Fazenda do visconde de Gericinó (1). Nada mais tenho a dizer-lhe senão que com todo o gosto passo já a mandar aprontar tudo, e conte que não terá falta alguma, e ao mesmo tempo lhe participo que as ordens que haviam em todas as repartições da Minha Imperial casa estão com todo o seu vigor, portanto não tem mais nada que mandar buscar o que precisar que tudo lhe há de ir.

    Aproveito esta ocasião para lhe significar o meu contenta-mento pelas suas melhoras, as quais me acaba de dizer o Barão de Inhomirim (2), que são verdadeiras e parecem que prometem uma saúde vigorosa. Assim Deus permita. Ao mesmo tempo te-nho o prazer de assegurar-lhe o quanto a estimo, e lhe deseja todas as venturas que podes apetecer como quem é

    Seu amo e seu

    Imperador

    Boa Vista 7 18–27 11

    (1) Ildefonso de Oliveira Caldeira Brant (1774-1829). O visconde de Gericinó era irmão do marquês de Barbacena, Felisberto Cadeira Brant Pontes de Oliveira Horta. Amigo comum de Domitila e de d. Pedro, foi feito de mensageiro pelo im-perador na questão da retirada da marquesa da corte, em maio de 1828.

    (2) Dr. Vicente Navarro de Andrade (1776-1850). Barão de Inhomirim em 12/10/1826, conselheiro imperial e também médico da Imperial Câmara, além de amigo de d. Pedro.

    Essa carta, provavelmente, foi escrita na frente de outras pessoas. Note-se o tom protocolar e oficial. No mesmo dia, em carta já publicada, ele afirma: “Escre-vi-te como imperador, agora escrevo como teu filho”, e finaliza: “Adeus, filha, rece-

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  • 1 5 0 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 5 1

    be o coração cheio de saudades que, posto que seja teu, contudo tu não me privas que to ofereças, até mesmo única pessoa a quem o dediquei e por quem ele sempre suspirará dentro do peito”.11

    Filha,

    Estimarei saber que chegaste bem quanto à viagem, e sinto que o teu ouvido esteja pior, segundo me disse José Bernardes (1), a quem perguntei pela tua saúde. Deus queira que ele se enganasse no que me disse. Nossas filhas estão de mui boa saúde, a Maria (2) vai melhor e a Paula (3) também está com febre. Eu sei que tenho tido saudades tuas e aposto que tu também as terás tido de mim, que é que faz mitigar, mas por me ver retribuído na mesma moeda. Adeus, minha querida filha, até logo, que terei o gosto de te abraçar, beijar, etc. Nada mais digo senão que sou, e serei, teu filho, amigo e amante fiel, constante, desvelado, agradecido e sempre verdadeiro

    O Imperador

    10 18–27 11

    (1) José Bernardes Monteiro Guimarães, Moço da Imperial Câmara, tinha negócios com Domitila.

    (2) Maria da Glória, rainha de Portugal.(3) Paula Mariana era a sexta filha de d. Pedro e de d. Leopoldina. Nasceu

    em 17 de fevereiro de 1823 e faleceu em 16 de janeiro de 1833. Sempre foi muito enferma, e é constante a referência ao estado de saúde dela nas cartas à Domitila. Em 1828, o pai levou a menina para uma casa recém-comprada em Botafogo, para tomar melhores ares. No ano seguinte iria para a serra, onde hoje se encontra Pe-trópolis, sempre em busca de melhoras para a filha doente.

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    Minha querida filha,

    Logo que cheguei fui abraçar nossas filhas, que estão boas hoje, apesar [de] que a Bella ontem de uma jabuticaba que comeu vomi-tou muito, mas está boa. A Paula tem andado constipada, mas vai bem. Eu, esta manhã, que são 15, espremi tua coisa (1) e deitou uma lágrima maior do que ontem, parecendo depois de enxuta na camisa goma de polvilho exatamente; mas não tenho ardor nem inflamação, nem coisa que me faça descoroçoar de todo, apesar de que quando eu andei sossegado, e contigo, nunca tive nada. O Júlio diz que não é nada; mas eu é que tenho esse nada, ainda que nadinha, para cúmulo de toda a minha infelicidade. Hoje vou tomar o Le Bos, e ver se posso atalhar uma coisa que, posto que digam não é nada, é escandecência (2). Eu o que respondo é que tal nunca tive quando andava contigo. O portador, que é o José Pequeno, tem ordem de pedir ao Manuel Inglês (3) uma das se-ringas de prata (4) da Imperatriz e escondidamente levar-ta por cautela, e eu amanhã te escreverei para te participar como vou, e te remeterei uma receita para que no caso (hó!!! desgraça!!!) que te tenha aparecido alguma coisa tu deites seringadas com a tal seringa. Eu estou muito esperançado que tu não terás nada porque assim me parece que isto é o que diz o Júlio e o Peixoto, escandecência, e que com a viagem aumentou ainda que pouco a

    Este teu amigo etc.

    Imperador

    (1) D. Pedro está se referindo ao pênis.(2) No Diccionario de medicina popular,12 a definição inclui de prisão de ven-

    tre a um estado mórbido generalizado que vai de febre, sede, dor de cabeça, ventre duro, urina vermelha, até braços e pernas doloridas. Alguns dicionários antigos, como o Moraes, dão como aumento do calor interno a ponto de perturbar a saúde do paciente.

    (3) Criado particular de confiança de d. Pedro I, conhecido como Manuel Inglês.13

    (4) Essas seringas eram utilizadas para higiene íntima feminina.

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    Essa mensagem foi escrita em novembro de 1827, conforme carta já publicada anteriormente,14 onde podemos ler a continuação do “drama”, com a “tua coisa” sen-do espremida e o consequente resultado, narrado com igual nível de detalhamento.

    Filha,

    Eu não vou hoje à Ópera porque não quero apanhar ar de noite porque estou com o purgante, e logo que possa apanhar ar de noite terei primeiro que tudo o gosto de ir ver-te. O teu compadre já está arranjado, e melhor do que estava (1), e dou-te parte que comprei a casa do Visconde de Vila Nova no Botafogo (2). Acei-te, filha, saudades que de todo o coração te manda

    Este teu filho, amigo e amante etc.

    Imperador

    17 18–27 11

    P. S.Recebi as flores pela mão da Duquesa, e tas ofereço a ti de mimo.

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    38. Vista noturna da praia de Botafogo.

    (1) Em 17 de novembro de 1827, João de Castro, irmão de Domitila, recebeu o título de conselheiro de Estado.

    (2) No mesmo dia, 17 de novembro, d. Pedro adquiriu a residência do viscon-de de Vila Nova da Rainha, na praia de Botafogo. Existe uma discussão histórica a respeito dessa casa. Alguns afirmam que o palacete que d. Pedro possuía nessa praia fora herdado da mãe, a rainha d. Carlota Joaquina, que lá morara. Outros dizem que ele a teria comprado. Alberto Rangel15 demonstra, através de corres-pondência localizada em arquivos diplomáticos na França e na Inglaterra, a luta de d. Pedro para tirar do imóvel recém-adquirido o antigo inquilino, o embaixador britânico sir Robert Gordon. Gordon teimava em continuar lá morando, alegando tratativas documentadas com o proprietário anterior. D. Pedro, segundo demons-tram as cartas trocadas, dizia precisar da residência para ter onde instalar as filhas, Maria da Glória e Paula Mariana, convalescentes. A quantidade de pessoas de um séquito era grande, e talvez não fosse impossível pensar que d. Pedro teria real-mente comprado uma segunda propriedade em Botafogo para abrigar todos os servidores que acompanhariam as crianças.

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    As casas de Botafogo, segundo Debret16 e outros viajantes, estavam entre as chácaras mais encantadoras do Rio de Janeiro. O local era residência habitual de ricos negociantes brasileiros e ingleses e de altos funcionários imperiais.

    Filha,

    Nada me dizes de assistência? (1) Ainda nada? Além disto, que-ro saber a quem compraste o anel de cadeia e coração ou se to deram, e se assim foi com toda a verdade manda-me dizer quem to deu, e de quem é o cabelo que tem dentro do coração (2).

    Responde sem me enganares, e com aquela verdade com que eu sempre te falo. Até à noite, filha, tira-me da aflição em que estou por causa do anel que tantas tolices tem feito supor a

    Este teu filho, amigo e amante etc.

    Imperador

    P. S.A Paula está outra vez com febre, Deus queira não seja fatal.

    25 18–27 11

    (1) Referia-se d. Pedro ao atraso da menstruação de sua amante.

    Conforme cartas já publicadas,17 sabemos que a menstruação de Domitila atrasou ao menos uma semana nesse período. A primeira referência à “assistência” foi em 20/11/1827.

    No dia 22, ele diz:

    Se à noite tiveres alguma coisa irei à Glória, primeiro que à tua casa.18

    A “Glória” é a Igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro, provável refe-rência a alguma promessa feita por ele para que Deus não lhe enviasse outro filho

    72

  • 1 5 6 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 5 7

    da marquesa. O imperador não precisava de uma notícia dessas chegando à Euro-pa enquanto um novo casamento era negociado com tanta dificuldade.

    (1) Era comum o costume de possuir mechas e fios de cabelos de pessoas queridas como lembrança, muitas vezes transformando-os em adereços, como pulseiras e colares trançados com fechos em ouro, ou em medalhões, como no caso do coração usado por Domitila que atraiu os ciúmes do monarca.

    39. D. Maria II, rainha de Portugal.

  • 1 5 6 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 5 7

    Filha,

    Eu não te escrevi logo de manhã porque acordei às oito e um quarto, e logo apareceu o Chalaça, e tendo-me de me vestir (para a festa) (1) o não pude fazer com tenção de te escrever depois; mas infelizmente recebo a triste notícia do falecimento do nosso amigo Pedro (2) e então fechei-me, estando já para sair para a cidade, e te escrevi mal e porcamente pois eu não soube aonde fiquei com tal nova, e agora mesmo estou com uma cara que o Carlota (3), que nada sabia, me perguntou o que eu tinha. Eu sin-to ainda muito mais por eu me ter deixado iludir pelo B. de Soca Rabo (4) a ponto de fazer tal; mas como assim não seria? Sendo eu sincero e franco e ele, maroto e velhaco? Valha-nos Deus, o mesmo Deus lhe dê o Reino da Glória em remuneração de tantos e tão aviltantes trabalhos. Filha, até à noite depois que vier do Teatro, pois contigo quero aliviar este teu coração que se sente estalar de dor, remorsos, desesperação em suma, de tudo quanto é neste mundo de mortificante. Então, filha, manda estar a porta aberta que eu lá vou estar contigo. Aceita, filha, tudo quanto há de bom em amizade, pois te oferece

    Este teu filho, amigo e amante etc.

    Imperador

    1 18–27 12

    (1) Referência às festividades em comemoração ao quinto aniversário da co-roação de d. Pedro I: missa na Capela Imperial e recepção no paço.

    (2) Quem seria o “amigo Pedro” é um dos grandes enigmas dessas cartas inéditas. O filho deles, com esse nome, havia falecido um ano antes. O irmão dela, Pedro de Castro, ainda estava vivo nessa época, assim como seu sobrinho, afilhado do monarca. Existe a possibilidade de ser algum membro do batalhão comandado por Carlos Maria Oliva que havia sido despachado para Recife, mas não foi possí-vel comprovar essa suspeita até o momento.

    73

  • 1 5 8 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 5 9

    (3) João Carlota, funcionário do paço, amigo de d. Pedro, presente entre as testemunhas de 7 de setembro de 1822.

    (4) B. de Soca Rabo é um provável anagrama do barão de Sorocaba.

    Filha,

    Dei o abraço nas nossas filhas, e recebi a tua segunda carta. Sinto não me dizeres = Podes vir = como eu te pedi; e espero que assim me mandes dizer, respondendo-me a esta, que serve para te tornar a pedir que me mandes dizer = Podes vir =, porque as-sim fico certo que não é por comprazeres comigo. Fui ver, como ontem te disse, as joias da Duquesa, e achei a peça número 6 que eu lhe não dei, bem como falta da número 2, que é um dos nossos que lhe dei. Eu não falo nisto senão para te dizer que cá existe a peça número 6 que, não tendo sido dada por mim, é tua, como ontem te disse. Não me tomes a mal minha franque-za, pois tudo quero fazer claro. Eu não quero que tu assentes que eu cá deixaria ficar uma das peças que ontem te disse que ficasses com elas, e por isso quis mui a levar. Espero me mandes dizer = Podes vir =. Se isto me fizeres, apesar do meu grande incômodo, conta comigo, se não pensarei e darei resposta à res-posta desta que te escrevo sem pressa, pois já estou crismado há muito tempo.

    Teu filho, amigo e amante etc.

    Imperador

    6 18–27 12

    P. S.Perdoa se me mostro sentido de não me dizeres = Podes vir =, mas tu vês que, assim como tu teimas em não mandares dizer-me = Podes vir =, também eu sentido posso pedir-te uma, e muitas vezes, este para mim grandíssimo favor, pois vejo nele teu desejo

    74

  • 1 5 8 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 5 9

    de gozares da minha grosseira companhia, bem como eu da tua, que sempre me será agradável.O mesmo

    Essa é a primeira de duas cartas do mesmo dia. Na outra, já publicada ante-riormente, d. Pedro diz:

    Não pude conseguir que me mandasses dizer ‘podes vir’. Paciência [...] eu lá vou. [...] Manda-me dizer se posso ir e manda estar a porta aberta, que eu lá vou, e adeus, até as dez horas. Responde-me a esta para ficarmos justos.19

    Como imperador, ele podia ordenar e obedeceriam, mas, como homem, pedia.Se ela dissesse não, ou não respondesse, ele não arrombaria a porta.

    Filha,

    Além de ir saber como passaste o resto da noite, eu vou agrade-cer-te o modo lhano com que me trates esta noite, e pedir-te que te não esqueças do que me prometes, e é o deixares-me uns dias por outros (às horas do costume) saber da tua saúde pessoalmente.

    Eu, minha filha, passei bem, como se ontem nada tivera tido, pois nem ainda nem sequer [tive] vontade de ir à caixa, e dormi bem. Só o que sinto é uma displicência, e fraqueza no corpo, mas que em breve será restabelecido. Adeus, minha filha, aceita os protestos da mais sincera amizade

    Deste teu filho, amigo, fiel, constante, agradecido e sempre verdadeiro

    O Imperador

    7 18–27 12

    75

  • 1 6 0 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 6 1

    P. S.Hei de confessar-me com o Monsenhor Fidalgo (1) amanhã, como te disse, e espero que tu me não enganes quanto ao que me prometes, pois então eu me reputarei o homem mais feliz por estar bem com Deus não estando tu mal comigo.

    (1) Duarte Mendes de Sampaio Fidalgo, monsenhor da Capela Imperial, cô-nego da Sé do Rio de Janeiro e reitor do seminário de N. S. da Lapa. Membro da comissão de 1822, responsável pela coroação e sagração de d. Pedro I.

    Pelo teor da carta, podemos entender que Domitila finalmente disse: “podes vir”...Após se confessar, d. Pedro mandou uma carta para ela em 8/12/1827:

    [...] Acabando de confessar-me, não posso por dever de cristão deixar de te ir (pelo modo que posso) pedir perdão das ofensas que tiveres de mim e daquelas que tu supuseres ter. Eu te peço, minha filha, que, da minha parte, peças perdão (tão decididamente como eu te peço) à tua mãe e que me respondas. Uma coisa te pediria, mas temo não ser atendido, que era queimares todas aquelas cartas que te tenho escrito desde 10 de setembro, não porque eu tenha medo que tu as mostres, mas porque pode acontecer (o que Deus não permita) que tu faleças (ainda que eu irei primeiro) e em tal desgraçado caso, minha honra ficar manchada. Se me fizeres isto, eu te remeterei as tuas que cá tenho guardadas.20

    Depois de pedir perdão a ela e à mãe, pede que ela destrua as cartas desde o reatamento até aquela data. O final do ano chegava, e com ele o aniversário de um ano da morte da imperatriz Leopoldina e as primeiras notícias da Europa a respeito das dificuldades em se arrumar uma nova esposa para d. Pedro. O que ele poderia ter feito para ofender a mãe de Domitila? Talvez fosse ainda um eco da tentativa de expurgar os Castros Canto e Melo da corte depois do atentado à baronesa de Sorocaba.

  • 1 6 0 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 6 1

    Filha,

    Como tu tens estado sem ires (e por mui justo motivo) ao Teatro, e tendo nós muito apetite de assistirmos à Comédia Francesa, e podendo-o não ir eu hoje ao Teatro, e ir depois de amanhã pare-cer combinação entre nós, ou para nestes dias que não vamos estarmos juntos, ou nós que vamos nos vermos, assentei de ir esta noite ao Teatro, um pouco para evitar todas as suspeitas e podermos viver sossegados. Eu bem conheço que muitos escrú-pulos são maus; mas, neste nosso caso, e posição delicadíssima, convém muito uma perfeita fantasmagoria. Manda-me dizer o que te parece, que é impossível que te não pareçam duas coi-sas: primeira, muito escrúpulo; segunda, muito bom pensamento, para gozarmos um do outro sem que os outros se divirtam à nos-sa custa. Adeus, filha, recebe o coração saudoso

    Deste teu filho, amigo e amante etc.

    Imperador

    13 18–27 12

    O jogo prossegue: a tentativa de não serem vistos juntos, a farsa, a “fantasmagoria”.

    Filha,

    Como me parece que tu tens alguma coisa que te aflija, e pare-cendo-me que te poderei pela minha companhia ainda que gros-seira consolar-te, pretendo ir mais cedo do que te mandei dizer, e irei às dez, e para que não haja jogo, para esse fim deixo ordem (indo agora para o Botafogo) que, não chegando eu até as oito, se retirem, e assim posso com certeza lá chegar à sua casa às dez.

    Adeus, filha, até então, e espero que estejas mais doce do que mostras pelas tuas cartas, que estão umas um tanto sem amiza-de, e outra seca como um pau. Eu estimarei não ser participante

    76

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  • 1 6 2 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 6 3

    pessoalmente das tuas quizílias (1), pois isso seria uma injustiça sendo eu tão bom (agora) para ti e sendo teu

    Filho, amigo e amante etc.

    Imperador

    14 18–27 12

    (1) Inimizade, antipatia.

    Querida Marquesa,

    Desejo saber como passou e lhe participar que eu e as meninas estamos bons, que a Maria Isabel se vai vacinar (1) e que a mi-nha filha Rainha (2) vai com bastante melhora. Estimamos que se divirta pelo Caju (3).

    Aceite os protestos da maior consideração com que sou,Querida Marquesa, Seu amo que muito a estima

    Imperador

    23 18–27

    12

    (1) Referência à vacina contra a varíola, instituída por d. João VI desde 1811. A vacinação era realizada às quintas-feiras e domingos na igreja do Rosário.

    (2) D. Maria da Glória, rainha de Portugal com a renúncia do pai, só assumi-ria efetivamente o trono em 1834, sob o nome de d. Maria II.

    (3) Provável referência à Ponta do Caju, próximo de onde hoje se encontra a zona portuária do Rio de Janeiro. Na época, era um agradável local utilizado para banhos de mar. Chegou a ser frequentado por d. João VI e d. Leopoldina.

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  • 1 6 2 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 7 1 6 3

    Querida Marquesa,

    Desejo saber como passou, e participar-lhe que eu e as meninas estamos bem, a Rainha vai assim mesmo. Já desde hoje lhe come-ço a dar os parabéns dos seus anos (1), mostrando-lhe o quanto desejaria que goze desses dias mais cem.

    Aceite os protestos da maior amizade e consideração, com que sou,

    Querida Marquesa,Seu amo que muito a estima

    Imperador

    26 18–27 12

    (1) O aniversário de 30 anos da marquesa seria no dia seguinte, 27 de dezembro.

    Querida Marquesa,

    Desejo que me mande dizer como passou e participar que eu e as meninas estamos bem, que a Rainha minha filha vai assim mesmo.

    Aceite os protestos da mais pura, lícita e sincera amizade, e consideração com que sou,

    Querida Marquesa,Seu amo que muito a estima

    Imperador

    31 18–27 12

    79

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  • 1 6 4 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 6 51 6 4 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 6 51 6 4 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 6 5

  • 1 6 4 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 6 51 6 4 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 6 51 6 4 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 6 5

    1828

  • 1 6 6 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 6 7

    40. Movimentação no porto do Rio de Janeiro.

  • 1 6 6 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 6 7

    Querida Marquesa,

    Agradeço-lhe muito o [rasgado], pois eu [rasgado] precisava de tua boa [rasgado] em razão do desespero em que estou por causa de ainda não ter recebido notícias do paquete (1) de outro dia, e do chegado de hoje (tendentes ao meu negócio), em razão de o Gordon (2) estar na Serra.

    Nada tenho a enviar-lhe senão os protestos da maior amiza-de e consideração com que sou,

    Querida Marquesa, Seu amo que muito a estima

    Imperador

    1 18–28 12

    (1) Derivação da palavra alemã pack, o mesmo que feixe, molho, maço de cartas. Paquebote, ou packet boat, era o termo com que se designava o navio que levava carta da França para a Inglaterra.1 A palavra paquete virou sinônimo do correio transportado pelos navios que ligavam a América à Europa.

    (2) Provável referência a notícias de Barbacena referentes às negociações diplomáticas visando ao apoio de Inglaterra, França e Áustria ao processo de sucessão do trono em Portugal. No final de 1827 e 1828, também começaram a chegar informações a respeito das dificuldades de se arrumar uma nova esposa para d. Pedro.

    81

  • 1 6 8 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 6 9

    Querida Marquesa,

    Desejo saber como passou; eu passei bem, e as meninas que lá vão. A Rainha já deu três passos segura pelas criadas. A Chica (1) está bem.

    Aceite os protestos da maior amizade e consideração com que sou,

    Querida marquesa, Seu amo que muito a estima e estimará,

    Imperador

    14 18–28 1

    (1) D. Francisca Carolina, quarta filha de d. Pedro I com d. Leopoldina. Nas-cida em 2 de agosto de 1824 e falecida em Paris, em 27 de março de 1897. A princesa d. Januária, nascida em 11 de março de 1822 e falecida em 13 de maio de 1901, não é mencionada em nenhuma destas cartas, talvez porque tivesse a saúde melhor que a das irmãs.

    Querida Marquesa,

    Desejo saber como passou; eu e as meninas estamos bons. A Rai-nha vai indo, e a Chica está boa.

    Aceite os protestos da maior amizade, e consideração com que sou,

    Querida Marquesa,Seu amo que muito a estima, e estimará

    Imperador

    15 18–28 1

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    83

  • 1 6 8 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 6 9

    Querida Marquesa,

    Desejo saber como passou. Eu passei bem, e as meninas. A Rai-nha vai indo.

    Querida Marquesa, Seu amo que muito a estima e estimará

    Imperador

    17 18–28 1

    Querida Marquesa,

    Muito sinto que ontem passasse tão incomodada, e lhe afirmo que muito atormentado estive enquanto o Barão (1) à noite me não assegurou que estava melhor. Agora muito estimo a melhora, e um parasita que amanhã pelas 11 ou meio-dia já o crescimento que tiver seja menor, e poderá ser que em consequência da des-carga, dele mesmo escape, o que eu muito desejaria.

    Aceite os protestos de maior amizade e consideração com que sou,

    Querida Marquesa, Seu amo que muito a estima, e estimará

    Imperador

    25 18–28 1

    (1) Barão de Inhomirim (ver carta 68, nota 2).

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  • 1 7 0 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 7 1

    Querida Marquesa,

    Muito estimei saber ontem quando vim do Teatro que continua-va a passar bem, e que desde as nove e meia até as 11 e quarto que não dormia mui sossegada. Meu prazer será consumado se eu souber que hoje não teve acréscimo (1), ou que o teve muito menos, pois a Marquesa não pode pensar a aflição com que tenho andado, motivada pelo cuidado que tenho tido. Se eu alguma vez estiver doente é que poderá calcular que tal é uma mortificação, como a minha tem sido.

    Aceite os protestos da maior, e mais pura, e sincera amizade e consideração com que sou,

    Querida Marquesa,Seu amo que muito a estima e estimará

    Imperador

    28 18–28 1

    (1) Febre intermitente.

    86

  • 1 7 0 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 7 1

    Querida Marquesa,

    Desejo saber como passou, e muito estimarei que fosse bem, pois me interesso cordialmente pela sua saúde, que apeteço ser sem-pre no melhor estado.

    Aceite os protestos da maior amizade e consideração com que sou,

    Querida Marquesa,Seu amo que tanto a estima e estimará

    Imperador

    2 18–28 2

    P. S.Agora com todo o prazer parto para a Glória, acompanhado de todos os filhos, em dar graças pela melhora da Rainha, que tam-bém vai.

    87

  • 1 7 2 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 7 3

    Querida Marquesa,

    Muito desejo saber como tem passado, e como está de saúde, pois me interesso o mais possível por que ela seja a mais perfeita. Eu estou bom, e cheguei bem. As meninas estão boas, todas menos a Paula, que vai melhor. Aceite os protestos da maior amizade e consideração com que sou,

    Querida Marquesa, Seu amo que muito a estima e estimará

    Imperador

    26 18–28 2

    Muito estimarei, querida Marquesa, saber como passou, ese lhe não fez mal a chuva que apanhou durante o seu passeio, em que estimo se divertisse. Eu estou bom, o Pedro (1) está quase sem abalo de pulso e muito esperto, como costuma, as mais bem. Quero ver se agora lhas posso mandar, tanto a Duquesa, que já deu ou vai dar lição, como a Maria Isabel. Não posso por ora dar uma resposta cabal à sua pergunta relativa ao nosso Felício (2), pois hei de examinar os papéis, tirar algumas informações, para dar um conselho salutar.

    Aceite os protestos da maior amizade e consideração como sou,

    Querida marquesa, Seu amo que muito a estima e estimará

    Imperador

    5 18–28 3

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  • 1 7 2 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 7 3

    (1) Pedro de Alcântara, futuro d. Pedro II.(2) D. Pedro refere-se ao filho de Domitila com o primeiro marido. Felício foi

    enviado para estudar em Paris no segundo semestre de 1827, tendo por guardião o médico imperial dr. Domingos dos Guimarães Peixoto, que também ia para a capital francesa realizar especialização médica. Ambos recebiam pensão do go-verno imperial, que foram todas encerradas no início de 1828, deixando tanto o dr. Peixoto como Felício sem amparo financeiro, o que foi resolvido em junho do mesmo ano.

    Querida Marquesa,

    Mande-me dizer como passou. Eu passei bem. O menino às 3 ho-ras da noite parecia estar melhor, porque dormiu até a essa hora, dos mais nada posso dizer porque agora me levanto da cama, e ainda os não vi.

    Aceite os protestos da maior amizade e consideração com que sou,

    Querida Marquesa, Seu amo que muito a estima e estimará

    Imperador

    7 18–28 3

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  • 1 7 4 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 7 5

    Querida Marquesa,

    Desejo saber como passou. Eu passei bem, e todos os filhos. A Paula vai indo.

    Aceite os protestos da maior, mais sincera e desinteressada amizade com que sou,

    Querida Marquesa, Seu amo que muito a estima e estimará

    Imperador

    28 18–28 3

    Querida Marquesa,

    Desejo que me mande dizer como passou. Eu passei bem; mas agora estou com muita pena no fundo do meu coração pela morte inesperada do Ponçadilha (1), que aconteceu às 5 horas e meia, em menos de 5 minutos deitando sangue pela boca e ouvidos. Só pôde chamar o Maurício (2), que quando chegou já havia dado contas a Deus. As filhas vão bem.

    Aceite os protestos da maior, mais pura, sincera e desinte-ressada amizade com que sou,

    Querida Marquesa, Seu amo que muito a estima e estimará,

    Imperador

    17 18–28 4

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    92

  • 1 7 4 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 7 5

    (1) Provável referência à morte de João Manuel Rodrigues Ponçadilha. O ou-tro irmão, José Manuel, irá servir o filho de d. Pedro, d. Pedro II, como secretário, já com a patente de coronel.

    (2) Padre José Maurício Nunes Garcia?

    Querida Marquesa,

    Desejo saber como passou e mais sua mãe. Eu passei bem, e todos.Aceite os protestos da maior, mais pura, sincera e desinte-

    ressada amizade com que sou,Querida Marquesa, Seu amo que muito a estima, e estimará

    Imperador

    24 18–28 4

    Querida Marquesa,

    Mande-me dizer como está, e mais sua mãe e tia. Eu estou bom, e todos, menos a Paula, que se vomitou ontem.

    Aceite os protestos da maior, mais pura, sincera e desinte-ressada amizade com que sou

    Seu amo que muito a estima, e estimará

    Imperador

    16 18–28 5

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  • 1 7 6 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 7 7

    Minha querida Marquesa,

    Muito desejo que goze de perfeita saúde, e de tão perfeita como eu desejo para mim e para meus filhos. Peço-lhe que acredite que estas minhas expressões são filhas do Amor que lhe consagro e consagrarei, atentas às relações tão íntimas que tivemos.

    Eu sempre sou o mesmo homem. Estar longe ou estar per-to não me faz diferença para mostrar-lhe uma verdadeira, pura, sincera e cordial amizade. Eu não seria homem digno de exis-tir neste mundo se assim não pensasse. Eu estou, Deus louvado, [bem] de saúde. A Paula já anda e vai à casa de fora. As mais, e o Pedro, estão bons. A Duquesa mui esperta, e cada vez mais galante, e a Maria (1) igualmente, e já quer andar só.

    Eu lhe asseguro que jamais me esquecerei, quando for tem-po, de lhe mandar dizer que venha para sua casa gozar mui des-cansada do que é seu, e muito seu, e então, pelo sossego em que há de estar, conhecerá a necessidade que havia desta sua saída temporária da Corte. (2)

    Vou tratar de mandar começar a arranjar o seu jardim, e espero que ficará muito bom, e a seu gosto.

    Aceite o protesto da maior, mais pura, sincera e desinteres-sada amizade, com que sou,

    Querida Marquesa, Seu amo que muito a estima, e estimará

    O ImperadorBoa Vista, 23 de julho de 1828.

    (1) Maria Isabel faleceria três meses depois.(2) Após o retorno do marquês de Barbacena da Europa, d. Pedro convenceu-

    -se de que era necessário o afastamento de Domitila da corte para que ele tivesse chance de receber o “sim” de alguma princesa europeia. O que havia adiado desde o relatório do barão de Mareschal, em julho de 1826, resolveu pôr em prática, e Domitila partiu no final de junho de 1828 para São Paulo.

    95

  • 1 7 6 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O 1 8 2 8 1 7 7

    Querida Marquesa,

    O meu amor pela Marquesa é que me compele a escrever-lhe, e é que me compeliu no protesto que lhe remeti diretamente, e no outro, que por motivo de carta sua em que me dizia coisas que, se não esperava, igualmente o fez.

    Eu não desejo que meu casamento seja frustrado por causa da Marquesa, e se a Marquesa estivesse na minha delicada po-sição decerto com o seu gênio, se ainda o não perdes, faria pior. Agradeço a sua atenciosa e amigável carta, mas permita-me que lhe peça que faça o que eu lhe digo, não pelas ameaças, que só servem para aborrecerem e desvanecerem ideias de inteligências entre mim e a Marquesa, mas sim por convicção. A Duquesa bem e eu bom, e sempre seu verdadeiro e sincero amigo

    Pedro

    21 18–28 12

    Esta é a última carta do lote vendido na Europa e que hoje pertence à Hispa-nic Society of America. Nela, observamos a continuação de uma discussão entre Domitila, exilada em sua cidade natal, e d. Pedro. Após viver quatro anos na capital do Império, em meio ao luxo e ao poder, a acanhada São Paulo da época não era suficiente para a marquesa. Se na corte ela já teve que enfrentar situações emba-raçosas, pior lidar com o provincianismo paulistano. As velhas amigas evitavam--na, os piqueniques fracassavam, e até as diversões e festas não passavam de uma pálida imitação dos faustos da corte. Alguns dias antes, d. Pedro havia recebido uma mensagem de Domitila (anexo 9, p. 188) comunicando que estava partindo de volta para a corte em 23 de dezembro. O imperador ameaçou até mesmo de não deixá-la ver a filha, a duquesa de Goiás:

    Não espere a marquesa, de chegar sem expressa ordem minha, que eu a trate como minha amiga prezada que é (como creio). [...] saiba que no caso (que eu não espero) de vir sem ordem minha que a marquesa a vá ver, pois ela não poderá visi-

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    tar a quem não quer concorrer para a glória de seu pai, do seu imperador e da sua pátria. Nada mais tenho a dizer, senão que pode estar certa que, imediatamente eu vir que a sua presença aqui me não influi nada sobre um negócio de tão grande monta para o Império, eu serei o primeiro que, enviando-lhe expressamente um soldado como agora faço, lhe mande ordem para se recolher para sua casa, pois bem poderá e deverá supor quanto me custará o meu imperial coração vê-la ator-mentada com incômodos.2

    Mas essa determinação em mantê-la afastada foi diminuindo à medida que as negativas aos pedidos de casamento iam se somando. Em abril de 1829, d. Pedro permitiria o retorno de Domitila à corte.

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    Anexos

  • 1 8 0 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O A N E x O s 1 8 1

    41. Vestimentas de pessoas na cidade de São Paulo.

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    As cartas a seguir não são em sua totalidade inéditas. A última carta de Domitila para d. Pedro, por exemplo, já foi publicada anteriormente. Algumas outras cons-tam do CD Pedro I: um brasileiro, feito pelo Museu Imperial, porém as versões apresentadas nesta obra foram transcritas diretamente dos originais, corrigindo erros e omissões anteriores. A última missiva, uma minuta em que d. Pedro enu-mera os filhos bastardos, só apareceu, em parte, na obra de Octávio Tarquínio de Sousa A vida de dom Pedro I.

    Os documentos anexos estão na seguinte ordem:

    1 – Nomeação de Domitila como dama camarista da imperatriz, 1825.2 e 3 – Documentos referentes à primeira tentativa de banimento de Domitila

    e dos irmãos da corte, após o atentado contra a baronesa de Sorocaba, em 1827.4 a 8 – Cartas de Domitila respondendo a d. Pedro a respeito da retirada dela

    da corte em junho de 1828.9 a 11 – Cartas de Domitila e de sua mãe para d. Pedro, dezembro de 1828.12 e 13 – Cartas anônimas dirigidas a d. Pedro I após o conhecimento do

    retorno de Domitila para a corte, em março de 1829.14 a 15 – Cartas de Domitila para d. Pedro a respeito da necessidade de se

    retirar definitivamente da corte, provavelmente junho a agosto de 1829.16 – Cartas de despedida de Domitila para d. Pedro, 26/27 de agosto de 1829.17 – Minuta de uma carta de d. Pedro I na qual, além de outros assuntos, trata

    dos filhos que teve fora do casamento.

    42. Vestimentas das damas do paço.

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    43. Carta da marquesa de Aguiar para Domitila de Castro notificando

    sua nomeação como dama camarista da imperatriz. Rio de Janeiro, 4 de

    abril de 1825. Museu Imperial/IBRAM/MinC, Rio de Janeiro

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    Ilma. Exma. Sra.,

    Sua Majestade A Imperatriz minha Ama me Ordena de parti-cipar a V. Exa. que A Mesma Augusta Senhora houve por bem fazê-la Sua Dama Camarista; o que eu lhe faço saber a V. Exa. para sua inteligência.

    Deus guarde a V. Exa. Paço em 4 de abril de 1825.

    Marquesa Camareira-Mor (1)Sra. D. Dometília de Castro Canto e Melo

    (1) Maria Francisca de Portugal e Castro, marquesa de Aguiar, dama da rainha d. Maria I, camareira-mor da princesa e depois imperatriz d. Leopoldina. Viúva de d. Fernando José de Portugal e Castro, conde e marquês do mesmo título. Morava na rua do Lavradio, no Rio de Janeiro, até 1831, quando retornou para Lisboa.

    Essa nomeação foi feita logo em seguida à afronta sofrida por Domitila na Capela Imperial, quando as damas da corte ali reunidas retiraram-se após sua en-trada no local. Apesar de parecer curioso a nomeação ter saído em nome da impe-ratriz, era um procedimento usual. Cada soberano nomeava seus cortesãos.

    D. Pedro deve ter solicitado isso como um favor a d. Leopoldina e esta, sem suspeitar ainda de nada, concedeu-o.

    Ilma. e Exma. Senhora,

    Havendo Sua Majestade o Imperador entabulado, em potência estrangeira, negociações ao complemento das quais muito de frente se lhes opõem a estada de Vossa Excelência nesta Corte, e mesmo neste Império. E conhecendo o mesmo Augusto Senhor o quanto Vossa Excelência se interessa por sua glória particular e felicidade da nossa pátria, tendo deixado tempo oportuno para lhe mandar esta participação, ordena Sua Majestade Imperial que Vossa Excelência, embarcando no bergantim português Treze de Maio, siga para Portugal ou para outro qualquer país estrangei-ro que Vossa Excelência escolha, ficando Vossa Excelência na

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  • 1 8 4 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O A N E x O s 1 8 5

    inteligência que deverá partir o mais tardar até o dia três ou qua-tro de setembro próximo futuro, levando Vossa Excelência em sua companhia, além de seus dois irmãos, os gentis-homens da Câmara José de Castro e Pedro de Castro, aquelas pessoas que quiser. Outrossim, manda o mesmo augusto senhor participar a Vossa Excelência que nada perderá das honras, regalias, pensões e de tudo aquilo que Sua Majestade Imperial lhe mandava dar, bem como a seus irmãos.

    Sua Majestade o Imperador fica certo [de] que Vossa Exce-lência executará o que lhe ordena, independente de mais ordem ou procedimento algum, e, para que nada falte, se expedem as ordens necessárias por todas as repartições competentes.

    Deus guarde a Vossa Excelência. Paço, 26 de agosto de 1827.

    Senhora marquesa de Santos.

    Nesse ofício com letra de Francisco Gomes da Silva, secretário de d. Pedro I, vemos a decisão do imperador em afastar da corte Domitila e seus irmãos, três dias depois de ocorrido o atentado à baronesa de Sorocaba. O bispo de São Paulo, intermediando o banimento, conseguiria, evocando o fato de Domitila ter tido um filho há pouco tempo, protelar essa partida, até que finalmente, por volta de 10 de setembro, d. Pedro e ela fizeram as pazes.

    Ilmo. e Exmo. Sr.,

    Tendo a Marquesa de Santos de fazer uma viagem à Europa por assim convir aos interesses deste Império Nossa Pátria, e não querendo Sua Majestade o Imperador que uma Dama de Seu Paço deixe de ir com toda a decência que lhe é devida, e lembrando-se que V. Exa. é seu irmão e que ninguém melhor a poderá acompanhar com mais interesse e cuidado. Há o mesmo Augusto Senhor por bem ordenar que V. Exa. acompanhe a dita Marquesa à Europa, e que lá persista com ela, ficando V. Exa. na inteligência que deve sair deste porto no bergantim português

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    Treze de Maio, e que deve partir o mais tardar até no dia três ou quatro de setembro sem falta.

    [ilegível], 26 de agosto de 1827.

    Sr. P. Castro Canto e Melo

    Ordem para Pedro de Castro do Canto e Melo seguir a irmã para o exílio na Europa. Com a negativa da partida, ele seria retirado da corte e enviado para a Cisplatina.

    Meu bom senhor,

    Estimo a boa saúde de V. M. e de S. Altezas.Meu senhor, como V. M. tem sido Meu Pai e de todos os

    meus Filhos, eu peço licença a V. Majestade para acabar de efe-tuar o casamento da minha Chiquinha com o mano José (1) isto sendo do gosto de V. M., senão, nada farei. Minha mãe ainda passa incomodada, minha tia o mesmo, mano José também hoje amanheceu com muitos tremores de frios e assim está de cama. Eu, graças a Deus, vou passando sem novidade.

    Sou de V. M. criadaQue muito o estima e obrigada

    Marquesa de Santos

    (1) Ver nota 1 da carta 34. O casamento foi realizado em 24 de maio de 1828.

    Senhor,

    Estimo a saúde de V. M. e de S. A. V. Majestade sabe mui bem que, se eu vou fazer este passeio, é só para lhe fazer a vontade. Não que eu tal tenções tivera de sair daqui para parte alguma. Assim, senhor, não posso ir para o mês que vem, sim nos princí-

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  • 1 8 6 T I T Í L I A E O D E M O N Ã O A N E x O s 1 8 7

    pios de julho. Não sou destas de saco às costas, já lhe faço esta vontade, e assim peço-lhe não me mortifique mais.

    Sou de V. M. criada e obrigada.

    Marquesa de Santos

    Em resposta a esta carta, d. Pedro escreve em 22/5/18281:

    Minha filha (d. Maria da Glória) infalivelmente sai até dois do mês de julho, e por isso eu muito desejo que a marquesa saia pelo menos seis dias antes, o que vem a ser 26 de junho, porque muito convém que os que vão possam dizer “a mar-quesa já saiu”, e não “está para sair”. Todos acreditarão o que aconteceu e não o que está para ser, que pode não ser, e o negócio é grave e mui grave. Na sua primeira presta-se a tudo que eu lhe mandar, pede-me instruções, e agora que lhe escrevo diz-me que não pode antes de princípios de julho, tendo convido com o Gericinó até meado de junho. Sustente sempre aquela palavra que uma vez der e não faça rodeios, veja bem a quem a dá e qual é a magnitude do negócio que é dependente do cumprimento de sua palavra.

    A próxima carta responde ao imperador.

    Senhor,

    Perdoe-me que lhe diga isto: eu não preciso de conselhos, não sou como V. M., as minhas respostas são todas nascidas do meu coração. Ao Gericinó eu sempre disse que sairia no princípio de julho, e se ele disse o contrário disto, mentiu. Eu torno de novo a fazer esta vontade, sairei até o fim deste mês que vem e Deus permita sejam todas as suas vontades feitas assim como eu as faço. Eu tive criação, sei conservar a minha palavra e sou de V. M. criada e obrigada

    Marquesa de Santos

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    Senhor,

    Estimo a boa saúde de V. M. e de S. A. Vejo Vossa Majestade falar-me na minha jornada e nos meus cavalos, e que não há tempo a perder. Sei mui bem isso. Faz esse favor de mandar vir os ditos cavalos para, enquanto eu não for, serem tratados. Esse o fato irá mesmo por terra. Porque eu ainda não tenho destino algum, daqui vou mesmo a cavalo. Guardo o préstimo de V. M. para outra coisa e também rogava-lhe que me mandasse dizer por quanto tempo quererá que eu esteja separada da minha casa, ora nisto pode ter coração. Enquanto o falarem e dizerem que eu não vou, seria melhor dizerem-lhe outras coisas que devia dizer, não lhe importarem comigo. Eu sairei. Não se mortifique com a minha jornada, eu tenho paciência para lhe at