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ISSN 1677-0668 Revista Editada pelo CORECON/DF ANO VI - 24 - OUT/DEZ de 2005 ARTIGOS Os efeitos da taxa de câmbio sobre as exportações e importações PÁGINAS: 5, 6 e 7 O doutor em economia pela Universidade de Campinas (UNICAMP), Antônio Correa de Lacerda, em entrevista para a Revista de Conjuntura do Corecon- DF, falou sobre os efeitos da taxa de câmbio na economia brasileira e citou produtos e serviços mais afetados com a sobrevalorização cambial. Veja entrevista PÁGINA: 35 A importância da previdência social para as finanças públicas brasileiras Marcelo Abi-Ramia Caetano PÁGINA: 8 Economia política do emprego, produtividade e bem-estar na Ilha de Cuba PÁGINA: 20 Crise política e a taxa de juros João Paulo de Almeida Magalhães PÁGINA: 30 Cerca de R$ 46 bi devem entrar na economia com o pagamento do 13º salário Dieese George de Cerqueira Leite Zarur

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PÁGINAS: 5, 6 e 7 A importância da previdência social para as finanças públicas brasileiras PÁGINA: 20 PÁGINA: 30 PÁGINA: 35 PÁGINA: 8 George de Cerqueira Leite Zarur Marcelo Abi-Ramia Caetano João Paulo de Almeida Magalhães Dieese ISSN 1677-0668 Revista Editada pelo CORECON/DF ANO VI - Nº 24 - OUT/DEZ de 2005

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ISSN

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7-06

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Revista Editada pelo CORECON/DF ANO VI - Nº 24 - OUT/DEZ de 2005

ARTIGOS

Os efeitos da taxade câmbio sobre as exportações e importações

PÁGINAS: 5, 6 e 7

O doutor em economia pela Universidade de Campinas (UNICAMP), Antônio Correa de Lacerda, em entrevista para a Revista de Conjuntura do Corecon-DF, falou sobre os efeitos da taxa de câmbio na economia brasileira e citou

produtos e serviços mais afetados com a sobrevalorização cambial. Veja entrevista

PÁGINA: 35

A importância da previdência social

para as finanças públicas brasileiras

Marcelo Abi-Ramia Caetano

PÁGINA: 8

Economia política do emprego,

produtividade e bem-estar na Ilha

de Cuba

PÁGINA: 20

Crise política e a taxa de juros

João Paulo de Almeida Magalhães

PÁGINA: 30

Cerca de R$ 46 bi devem entrar na economia com o

pagamento do 13º salário

Dieese

George de Cerqueira Leite Zarur

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Revista de conjuntura out/dez de 2005�

Revista Editada pelo CORECON/DF - ANO VI - nº 24 - OUT/DEZ DE 2005

...................................................................................................................................... .....4

ENTREVIsTA

ANTôNIO CORREA DE LACERDAOs efeitos da taxa de câmbio sobre as exportações e importações........................................5

ARTIGOs

GEORGE DE CERqUEIRA LEITE ZARUREconomia política do emprego, produtividade e bem-estar na Ilha de Cuba...................................8

JOãO PAULO DE ALmEIDA mAGALhãEsCrise política e a taxa de juros ...........................................................................................20

DEPARTAmENTO INTERsINDICAL DE EsTATísTICAs E EsTUDOs sóCIO-

ECONômICOs - DIEEsE Cerca de R$ 46 bi devem entrar na economia com o pagamento do 13º salário ...............30

mARCELO AbI - RAmIA CAETANOA importância da previdência social para as finanças públicas brasileiras ................................35

EDITORIAL

A assinatura da Revista de Conjuntura pode ser efetuada contactando o CORECON-DF. O valor da assinatura é de R$ 70,00 anuais, o que equivale a quatro edições da revista.

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EDITORIAL

Editor Responsável: Roberto Bocaccio PiscitelliConselho Editorial: Mônica Beraldo Fabrício da Silva,Roberto Bocaccio Piscitelli,Humberto Vendelino Richter,Maurício Barata de Paula Pinto,Mário Sérgio Fernandez Sallorenzo, José Roberto Novaes de Almeida e José Aroudo Mota.Jornalista Responsável: Daniela Lima - Reg. DRT/DF: 4926Redação: Daniela LimaEditoração Eletrônica: Ars Ventura Imagem & Comunicação(61) 3273-1114

Tiragem: 4.000Periodicidade: TrimestralAs matérias assinadas por colaboradores não refletem, necessariamente, a posição das entidades. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desta edição, desde que citada a fonte.

CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA DA 11ª REGIÃO – DF

Presidente: Mônica Beraldo Fabrício da SilvaVice-Presidente: Roberto Bocaccio PiscitelliConselheiros Efetivos: Mônica Beraldo Fabrício da Silva,Roberto Bocaccio Piscitelli,Maurício Barata de Paula Pinto,Guidborgongne Carneiro N. da Silva,José Aroudo Mota,Victor José Hohl,Paulo Luiz Figueiredo de Oliveira,Humberto Vendelino Richter eMaria Cristina de AraújoConselheiros Suplentes: Newton Ferreira da Silva Marques,Max Leno de Almeida,Evilásio da Silva Salvador,Homero Gustavo Reginaldo Lima,José Luiz Xavier,José Luiz Pagnussat,Jusçanio Umbelino de Souza eGilson Duarte dos SantosEquipe do CORECON: Iraídes Godinho de Sales, Ismar Marques Teixeira, Michele Cantuária Soares, Jamildo Cezário Gomes e Angeilton Francisco Lima Faleiro.

End.: SCS Qd. 04, Ed. Embaixador, Sala 202 CEP 70300-907 – Brasília –DFTels: (61) 3225-9242 / 3223-14293964-8366 / 3964-8368Fax: (61) 3964-8364E-mail: [email protected]: www.corecondf.org.brHorário de Funcionamento: das 8:00 as 18:00 horas (sem intervalo)

EXPEDIENTE

Órgão Oficial do CORECON-DFO orçamento da União para 2006 promete ser uma grande batalha. Depois de

vários anos, volta a ser aprovado somente já em pleno exercício financeiro de sua aplicação, o que é um mau começo. Além disso, costuma-se fazer comparações entre a lei orçamentária vigente e o proposto do ano seguinte, quando, na realidade, a primeira comparação a ser feita deveria ser entre o programado e o executado, dada a desfiguração do orçamento público, sob diferentes aspectos: contingenciamento de dotações, retenções financeiras, alterações substanciais – principalmente ao final do exercício -, profusão de créditos impropriamente extraordinários – mediante Medidas Provisórias – e assim por diante.

Nestas semanas, para variar, trava-se uma grande discussão envolvendo o “comprimento do cobertor”, isto é, como compatibilizar o aumento do salário mínimo, a correção da tabela do Imposto de Renda, o reajuste do funcionalismo, a compensação aos Estados do ICMS sobre as exportações, entre outras reivindicações. Na prática, o que se tem visto é que o cobertor sempre fica mais curto do mesmo lado. Se por um lado o governo tem sido generoso com o capital, abrindo mão de expressivos recursos tributários, o tratamento com os trabalhadores, servidores, assalariados de um modo geral tem sido rigoroso, implacável mesmo. Basta ver, por exemplo, o apoio que ganhou a duplicação do limite de enquadramento no SIMPLES, em confronto com a resistência com a correção parcial da tabela do Imposto de Renda. Conforme estudos não contestados do UNAFISCO, se houvesse a intenção e a possibilidade de eliminar a defasagem acumulada desde 1996 pelos valores da tabela progressiva, o percentual a ser aplicado seria de 57,12%. Se fosse considerado somente o período do atual governo, esse número seria de 12,61%. Entretanto, o Relator da proposta orçamentária acena com um percentual de 7%. Diz-se que 10% de reajuste acarretaria uma “perda” de R$ 1,3 bilhão, o que também poderia ser traduzido como o ganho que os trabalhadores transferem para o Estado pelo congelamento dos valores. Também é muito curioso utilizar esse tipo de argumentação, quando se sabe que – dados o volume e a composição da dívida mobiliária pública interna, 0,5% de redução na SELIC reduz os encargos de juros da União – anualmente – em R$ 2,6 bilhões!

Quanto ao salário mínimo, a discussão também é acirrada. Um aumento para R$ 350,00 acarretaria um impacto de R$ 4,6 bilhões no orçamento. Para variar, alega-se que, além do mais, a previdência e muitos Municípios “quebrariam”. Ora, evidentemente, da forma contábil como se convencionou demonstrar as contas da previdência, artificialmente segregadas e infladas, a questão nunca terá solução. Do ponto de vista dos Municípios, o argumento parece ter adquirido a condição de uma espécie de freio. A partir de um trabalho elaborado pelo DIEESE, com base em dados da RAIS, verificou-se que apenas 9,06% dos servidores municipais recebem até 1 salário mínimo e 39,35%, entre 1 e 2 salários mínimos. Caso o salário fosse dobrado, o impacto seria de cerca de R$ 5 bilhões anuais aos cofres municipais. Por outro lado – convenhamos -, se não conseguimos melhorar a dignidade do piso salarial, há que se admitir que o País está carecendo de reformas urgentes e profundas, muito diferentes das que têm sido aprovadas nos últimos anos. Talvez se deva refletir, inclusive, sobre a viabilidade dessas instâncias político-administrativas, ou, então, sobre a repartição dos recursos e encargos entre as três esferas – União, Estados, Municípios.

Continua a haver, ao que tudo indica, uma enorme dificuldade para perceber a importância da valorização do salário mínimo – a começar pela necessidade de uma política para o piso salarial – como fator essencial para a amenização da concentração e das desigualdades de renda no País, e para a eliminação da miséria e a redução da pobreza. É preciso notar que esse acréscimo de renda para as pessoas e famílias beneficiadas seria destinado quase que exclusivamente ao consumo, preponderantemente à alimentação, retornando parte desses recursos, ao Tesouro, via tributação. Em face do nível atual da atividade econômica, tais aumentos na renda pessoal disponível tendem a criar um círculo virtuoso, com aumento da produção, do emprego e da renda.

Por fim, os economistas precisam convencer-se de que as decisões mais relevantes nesta área não são de caráter estritamente técnico, e, sim, de natureza essencialmente política.

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Os efeitos da taxa de câmbio sobre as exportações e importações A Revista de Conjuntura do Corecon-DF entrevistou Antônio Correa de Lacerda, doutor em Economia pela UNICAmP, professor-doutor do Departamento de Economia da FEA/PUC-sP e ex-presidente do Conselho Federal de Economia. Lacerda abordou os efeitos da taxa de câmbio na economia brasileira. Citou produtos e serviços mais afetados com a sobrevalorização cambial e falou sobre os ganhos de produtividade gerando compensações para os exportadores. O economista publicou vários livros, sendo o mais recente “Globalização e Investimento Estrangeiro no brasil”, da Editora saraiva.

Entrevista: Daniela LimaColaboração: Roberto bocaccio Piscitelli

ENTREVIsTA

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cionais, assim como prejudica a receita de turismo internacional e favorece o turismo de brasileiros no exterior.

Conjuntura - Quais têm sido os produtos e serviços mais afetados com essa sobrevalorização cam-bial?Antônio Correa de Lacerda - Os menos afetados têm sido as commodities agrícolas e metá-licas, na medida em que houve aumentos de preços no mercado internacional. Mas esse é um efeito passageiro e, no futuro, os preços das commodities poderão voltar a cair. Isso vai depender da demanda, principalmente da Chi-na, e também do fato de que os preços elevados tendem a ampliar

a oferta, porque mais paises fica-rão interessados em exportar esses produtos. Os setores mais prejudi-cados são justamente aqueles que geram maior valor agregado local.

Conjuntura - Na sua opinião, como a tendência observada na taxa cambial repercute em rela-ção aos contratos de médio e lon-go prazo com o exterior e no âni-mo das negociações em curso?Antônio Correa de Lacerda - Diante de uma taxa de câmbio desfavorável, no curto prazo as empresas tendem a manter con-tratos. Mas, com a perda de ren-tabilidade, desistem de exportar, enquanto outras desistem de pro-duzir, para importar. Infelizmente é um filme já visto no passado recente da nossa economia (perí-odo 1994-1998) a que – esperava – não voltaríamos a assistir tão cedo, tal a gravidade do erro. Isso enfraquece o País em qual-quer negociação internacional. O fato de estarmos com o câmbio defasado já nos coloca, por si só, em desvantagem com outros países que praticam justamente o contrário, como China, Índia e Rússia, por exemplo.

Conjuntura - Os ganhos de produtividade podem gerar com-pensações para os exportadores? Fatores de natureza tributária e financeira têm atuado em sentido tão relevante quanto a taxa de câmbio?Antônio Correa de Lacerda - São fatores que têm agravado

Conjuntura - Quais são os efei-tos mais diretos e imediatos da queda continuada na taxa de câmbio sobre as balanças comer-cial e de serviços?Antônio Correa de Lacerda - Uma taxa de câmbio baixa distor-ce a estrutura de preços relativos da economia. Fica mais barato importar do que produzir local-mente. Da mesma forma, prejudi-ca a competitividade de todos os produtos de alto valor agregado. Ambos os fatores impactam não somente a balança comercial e de serviços, mas também o nível de atividades, de investimentos, de emprego e renda. Na balança de serviços tende a provocar a ace-leração de remessas de lucros e dividendos das empresas transna-

“Diante de uma taxa de câmbio

desfavorável, no curto prazo

as empresas tendem a manter

contratos. Mas, com a perda

de rentabilidade, desistem de

exportar, enquanto outras desistem

de produzir, para importar.

Infelizmente é um filme já visto

no passado recente da

nossa economia”.

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a competitividade das empresas. Além de o juro, do câmbio e dos impostos não serem favoráveis, os fatores de competitividade sistêmica com logística, buro-cracia e infra-estrutura são péssi-mos. Tudo isso junto, a meu ver, explica por que um país como o Brasil, que é a nona economia mundial, medida pelo PIB por paridade de poder de compra, detém apenas pouco mais de 1% das exportações mundiais. Estamos comemorando o fato de exportarmos este ano menos de US$ 120 bilhões, mas a média do desempenho dos países em de-senvolvimento do nosso porte é de, pelo menos, o dobro disso.

Conjuntura - Na sua opinião, o governo deveria interferir com vistas a neutralizar ou amenizar os efeitos da valorização cambial? Sendo o caso, quais seriam as formas mais indicadas de interven-ção?Antônio Correa de Lacerda - Câmbio flutuante puro é uma abstração não presente no mundo real. A imensa maioria dos países pratica uma política de câmbio flutuante administrado ou sujo. Ou seja, o câmbio é livre, mas dentro de determinados limites. Logica-mente, o fato de o Brasil ter prati-cado nos últimos seis meses uma taxa de juros reais de 14% ao ano é um fator determinante para a apre-ciação cambial. Mas poderia haver maior proatividade do BC para evitar a sobrevalorização, com os vários instrumentos possíveis.

Conjuntura - Há riscos de uma deterioração significativa nos sal-dos de transações correntes? Os eventuais efeitos da atual política se manifestam em que prazos possíveis?Antônio Correa de Lacerda - Tudo depende do que se dese-ja para o País. Qual o projeto? Nossa trajetória de crescimento e desenvolvimento tem sido, infe-lizmente, medíocre. O Brasil há vinte e cinco anos cresce apenas 2,5% ao ano. É o lanterninha entre os países em desenvolvi-mento em termos de crescimento.

Deveríamos solidificar o setor externo, para que a economia pudesse crescer mais sustenta-damente. Mas, a meu ver, isso está longe dos atuais objetivos da política macroeconômica, exces-sivamente centrada nas “metas de inflação”. Nós temos um déficit estrutural na balança de serviços, da ordem de US$ 27 bilhões ao ano. Temos um expressivo passi-vo externo de 50% do PIB. Não podemos dar-nos o luxo de abrir mão de um sólido superávit co-mercial e reservas liquidas bem superiores aos US$ 50 bi atuais.

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A R T I G O

Economia política do emprego, produtividade e bem-estar na Ilha de Cuba1

George de Cerqueira Leite Zarur *

I - Contexto histórico e Con-juntura Econômica

Prevalece no pensamento eco-nômico a idéia de que racionalida-de se confunde com a otimização no emprego dos fatores, visando à produtividade máxima. A discus-são do caso da economia socialista cubana demonstra que a eficiência, definida pela otimização no em-prego dos fatores, não é o objetivo mais importante desse tipo de sis-tema. A economia cubana busca, em primeiro lugar, o emprego de toda a população economicamente ativa e a distribuição por igual dos salários, com diferenças mínimas de valor, mesmo que, para tanto, seja sacrificada a produtividade. Por isto, o estudo de Cuba, uma das poucas economias socialis-tas ainda existentes, reveste-se de grande relevância para o pensa-mento e para a teoria econômica.

Cuba produz cana, tabaco, açú-car, charutos, níquel, aço, cimento, petróleo, máquinas agrícolas, ma-

teriais de construção e possui algu-ma indústria voltada para a produ-ção de bens de consumo, mas é um país pequeno, que importa metade do petróleo que consome. O Pro-duto Nacional (pela paridade do poder de compra) estava na casa dos U$ 33,94 bilhões (fonte, CIA World Fact Book) em 2004 e o per capita, em U$ 3.000 2. A economia cubana volta a crescer: a previsão para 2005 é de um avanço de 9% do Produto Nacional. O índice de Desenvolvimento Humano do PNUD, de 2001, era o quinto da América Latina, apenas atrás da Argentina, Uruguai, Costa Rica e Chile.

Os Estados Unidos, situados a apenas 90 milhas das praias cuba-nas, têm, desde 1961, utilizado o bloqueio econômico para tentar destruir o sistema político do País. Além disto, durante o governo Clinton foi aprovada a lei Helms-Burton, que proíbe as empresas norte-americanas de realizar qual-quer transação com Cuba.

Após o período revolucionário inicial, que trouxe uma grande de-sorganização e reorganização na economia, o PIB do País passou a crescer, durante 15 anos, a uma taxa anual de cerca de 5% ao ano. Até 1989, o bloqueio norte-ameri-cano (iniciado em 1961) não tinha grande impacto, devido ao abaste-cimento da ilha pelo bloco soviéti-co. Em 1989, o fim da União Sovi-ética representou uma verdadeira catástrofe nacional para Cuba. Sua economia era absolutamente de-pendente da soviética, cujos subsí-dios ao País variavam de quatro a seis bilhões de dólares anuais (algo como 20 a 40% do PIB), o que fa-zia da ilha um fornecedor especia-lizado de açúcar para os países da Europa do Leste. Havia alguma in-dustrialização com base em insu-mos importados dos demais países socialistas, e a maior parte dos ali-mentos vinha do bloco soviético. Cessou a produção industrial, qua-se toda dependente de bens impor-tados. A maior fábrica de têxteis

1 Este trabalho resulta de um período de pesquisa de um mês, realizado em Cuba, pela Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (FLACSO).2 Dadas as características da economia cubana, não tem sentido o uso de indicadores como PIB ou PNB desvinculados do poder de compra.

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das Américas, por exemplo, hoje desativada em Santiago de Cuba, funcionava no processamento de algodão importado da ex-União Soviética e empregava nada me-nos do que 14.000 pessoas. O país viu-se sem energia, a indústria sem matérias primas e as pessoas sem comida em casa. A falta de água e os “apagões” tornaram-se parte do cotidiano.

De 1989 a 1994, Cuba atraves-sou o chamado “período especial”, caracterizado pela crise aguda na economia. As estimativas apontam para uma queda súbita de, pelo menos, 40% do PIB. O bloqueio econômico norte-americano, ao qual se associava a maior parte dos demais países latino-america-nos, impedia a importação de bens indispensáveis à vida cotidiana, que, de resto, Cuba não tinha como comprar por falta de divisas.

A resposta cubana deu-se em diferentes frentes: a primeira foi a liberação da remessa de dólares pelos cubanos de Miami para os seus parentes e amigos que vivem na ilha. Outra medida foi a reati-vação do turismo como principal vocação econômica do país. Para tanto, foi necessária alguma flexi-bilização na economia, que per-mitisse a associação com capitais europeus. Hoje, os hotéis são de exclusiva propriedade do estado cubano ou de propriedade e admi-nistração compartilhada com gran-des redes européias.

A prestação internacional de serviços representa outro fator re-levante na economia cubana. O país conquistou importantes avan-ços na área de pesquisa médica e possui a liderança mundial em setores como o da produção de al-gumas vacinas, subcampos da der-

matologia, tratamento para vicia-dos em drogas e medicina social. Esta última, organizada ao redor do “médico de família”, destaca-se na América Latina. Atualmente, há 15.000 médicos cubanos na Vene-zuela, cujos serviços são trocados pelo petróleo, tão necessário à vida de Cuba. Deverão ser treinados dez mil médicos de família venezue-lanos nas universidades cubanas. Com os atuais preços internacio-nais do petróleo, a situação do País estaria, ainda, mais difícil, não fos-se a relação com a Venezuela.

Cuba e Venezuela fundaram a “ALBA”, Associação Bolivariana de Livre Comércio, como reação à ALCA. Em 2004, o comércio bilateral chegou a um bilhão de dólares. Nos termos do tratado da ALBA, Cuba importará cerca de U$ 400 milhões a mais da Vene-zuela, por ano, a metade dos quais em bens de consumo e a outra me-

tade em produtos intermediários para suas indústrias. A Venezuela oferecerá linhas de crédito para a exportação de seus produtos. Para Cuba é um negócio de proporções elevadas. Para a Venezuela repre-senta a possibilidade de exportar algo mais do que petróleo, criando oportunidades em diferentes seto-res produtivos.

Há alguns outros desenvolvi-mentos recentes, como a explo-ração conjunta com a China das grandes reservas de níquel da Ilha, que devem situá-la como o mais importante fornecedor internacio-nal desta matéria-prima. Supõe-se que, em dois anos, a exploração de níquel deve superar o turismo como principal fonte de divisas para o país. O investimento anun-ciado chinês é de U$ 500 milhões Cuba poderá converter-se em um importante ator econômico seto-rial no mercado de níquel, como

“Em 2004, o comércio bilateral

chegou a um bilhão de dólares.

Nos termos do tratado da

ALBA, Cuba importará cerca

de U$ 400 milhões a mais da

Venezuela, por ano, a metade

dos quais em bens de consumo

e a outra metade em produtos

intermediários para

suas indústrias”.

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faz, por exemplo, o Chile, no mer-cado de cobre. Existem, também, indícios promissores na prospec-ção de petróleo descoberto por companhias canadenses no litoral cubano.

A paisagem do interior do país em abril de 2005 era de rios secos, vegetação amarelada, animais ma-gros e lavouras perdidas, lembran-do imagens do Nordeste brasileiro. Em mais da metade do território cubano não chove há, aproximada-mente, dois anos. A cultura de cana de açúcar, o principal produto his-tórico de exportação da Ilha, está extraordinariamente prejudicada. Aproveitando-se deste desastre climático, o governo optou por acelerar ações, já há algum tempo em curso, para erradicar a cana de

açúcar. Fala-se na desativação de 70 usinas de açúcar. Em voltando as chuvas, a cana será parcialmen-te substituída pela produção de alimentos. Esta alteração é justifi-cada pelos depreciados preços do açúcar ao longo de uma séria his-tórica mais extensa, em que pese os bons preços recentes do produto no mercado internacional. Contam, ainda, para a decisão, a demanda por alimentos dos cubanos e dos turistas, e a necessidade de “segu-rança alimentar” para o país.

II – Emprego, Produtividade e Bem-Estar

Em Cuba não são estatizados, somente, alguns poucos negócios, como restaurantes para turistas

instalados em residências, pe-quenos aluguéis, alguns meios de transporte de passageiros, como os caminhões adaptados da cidade de Santiago, operados pelos pró-prios proprietários. Existem, ain-da, as associações do Estado com empresas estrangeiras, pequenos produtores agrícolas organizados em cooperativas e a economia in-formal, esta, por definição, fora do controle estatal. Entretanto, até os cavalos e as carruagens para turis-tas em Havana e Varadero perten-cem a “centros eqüinos” estatais.

A economia socialista cubana tem como premissa maior o bem-estar e a distribuição da riqueza. Por isto, o emprego é um direito essencial para os cubanos. Como o desemprego não deve existir, há que se inventar no que as pessoas devem trabalhar. Visto que a eco-nomia não tem condições de ofe-recer trabalho para todos a partir de uma lógica voltada para a oti-mização do emprego dos fatores, há um aumento do setor serviços, além do nível requerido para o seu funcionamento ótimo3; algo como o enterrar e desenterrar de garrafas da política anticíclica, porém sem quaisquer outras conseqüências na demanda do que sua concentração em bens de consumo de massa essenciais e pouco sofisticados, bem como no decorrente direcio-namento da oferta neste sentido. Devido à escassez de capital e de insumos, o resultado desta forma especial de busca de emprego não amplia o volume da demanda glo-bal, mas incide na distribuição de renda, pois equaliza o emprego pela média. Como os salários têm

“A economia socialista cubana

tem como premissa maior o bem-

estar e a distribuição da riqueza.

Por isto, o emprego é um direito

essencial para os cubanos. Como

o desemprego não deve existir,

há que se inventar no que as

pessoas devem trabalhar”.

3 Segundo o World Fact Book da CIA, em 2004 estavam na agricultura 6.6% da população, na indústria, 25.5% e nos serviços, 67.9% (2004 est.).

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variações muito pequenas de va-lor, embora não haja desemprego a não ser residual (a taxa é de 2,5%), o nível salarial é muito baixo e, por vezes, também, o desempenho individual requerido, o que é con-trabalançado pelo elevado nível de educação da população e seus pre-visíveis efeitos na produtividade. Outro problema é que, a partir de certo ponto, unidades marginais de mão-de-obra não apenas se tornam desnecessárias, como ainda podem levar a um quadro clássico de ren-dimentos decrescentes.

Assim, na lógica da economia cubana, ao invés de se alocar o emprego a partir das necessidades produtivas, faz-se em termos de necessidades sociais. Não há uma relação entre emprego, produtivi-dade e mercado, como ocorreria em uma economia capitalista. O emprego existe em função do bem-estar médio da população, como um direito, e se a base produtiva é baixa, assim serão, também, todos os salários, sem grandes diferenças entre os mais altos e mais baixos.

A política do governo é a de possuir várias empresas no mesmo setor, avaliadas pelo seu desempe-nho financeiro e social. No caso daquelas voltadas à prestação de serviços para a população cubana, prevalece o critério social, fican-do o lucro em segundo plano. Nas empresas voltadas ao turismo e à exportação, a lucratividade é mais importante e há uma aproximação maior aos critérios de mercado. A avaliação do desempenho das empresas é realizada pela com-paração entre aquelas do mesmo ramo. Caso uma empresa apresen-te resultados considerados inade-quados, é reorganizada e, se após algum tempo não reage, pode ser

fechada e seus funcionários, retrei-nados e realocados em outros pos-tos de trabalho.

Devido à pressão por empre-go, a taxa de mortalidade das em-presas e instituições governamen-tais é baixa e a taxa de natalidade, muito alta. Em um quadro como o atual, de recuperação econômi-ca, é fácil fundar uma instituição na área cultural, o que encontra um mercado em expansão no tu-rismo. Algumas das mansões se-midestruídas de Havana ou San-tiago podem ser recuperadas para abrigar a nova instituição, e não há custos adicionais de salário, que já seriam, de qualquer manei-ra, pagos pelo Estado às mesmas pessoas em qualquer outro lugar. Por isto, chama a atenção o nú-

mero de museus especializados, que, além de possuírem pequenas equipes de pesquisa, complemen-tam os salários dos guardas com gorjetas. Podem se manter pela cobrança dos ingressos, que va-riam de dois a cinco dólares nor-te-americanos.

Cuba é uma economia dual, onde circulam pesos, a moeda na-cional de uso normal dos cubanos, e pesos convertibles, dinheiro ad-quirido pelos turistas e cubanos que os trocam por dólares, euros ou outras moedas estrangeiras. O peso convertible substitui o dólar, moeda forte de livre circulação até 2004. Há hotéis, restaurantes e lojas que só operam com pesos convertibles e outros que o fazem, apenas, com pesos normais. Em

“Na lógica da economia

cubana, ao invés de se alocar

o emprego a partir das

necessidades produtivas, faz-

se em termos de necessidades

sociais. Não há uma

relação entre emprego,

produtividade e mercado, como

ocorreria em uma economia

capitalista”.

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maio de 2005 o peso convertible estava valorizado em cerca de 10% acima do dólar e o euro cota-do a 1,15 pesos convertibles. O dó-lar ainda era penalizado com uma taxa extra de 10%, o que diminui o impacto na diferenciação de renda decorrente das remessas financei-ras provenientes dos Estados Uni-dos, recebidas apenas pelos que têm família em Miami. Estima-se que a implantação desse sistema tenha rendido cerca de 1,5 bilhão de dólares de reservas adicionais ao País.

Durante os anos oitenta, de crescimento acelerado da econo-mia cubana, eram assegurados salários razoáveis para todos. Em 1994, no “período especial”, o peso caiu a 150 por dólar e des-de então vem sendo valorizado,

chegando a cerca de 25 por dólar, recentemente. Hoje o salário míni-mo é de cerca de U$ 9,00 por mês, ou algo como 225 pesos mensais. A política é de progressiva valori-zação do peso normal, até que, ao longo dos anos, atinja o nível dos pesos convertibles.

Os baixos salários devem ser relativizados. Todo cubano tem direito a uma cesta básica mensal, que inclui cerca de 3 kg de arroz, 1,5 kg de açúcar branco, 3kg de açúcar mascavo, uma lata de óleo, 0,5 kg de frango, 0,5 kg de peixe, um pacote de macarrão ou biscoi-tos, uma barra de sabão de banho, além de charutos e um pouco de café. Ao trimestre, recebe um vi-dro de detergente líquido. Crianças e velhos recebem um litro de leite por dia4. O restante dos alimentos

necessários para um padrão acei-tável de alimentação deve ser ad-quirido nos chamados “mercados agropecuários”, onde produtores rurais associados em cooperati-vas vendem seus produtos. Vários itens de vestuário, sapatos, produ-tos de higiene etc. podem ser de-masiadamente caros e devem ser adquiridos em lojas próprias, que só vendem em pesos convertibles.

O governo aumentou seu gas-to social entre 1997 e 2002, supe-rando os 30% do Produto Interno Bruto (PIB), ou cerca de US$ 1600 por habitante. É o maior gasto so-cial de todos os países da América Latina e do Caribe. O Panamá, o segundo maior gasto social, aplica US$ 1300 por habitante, ou 25% do PIB. No Brasil, o gasto social em 2002 ficou próximo a US$ 950 por habitante, o que representa me-nos de 20% do PIB (Fonte: pesqui-sa conjunta de 2004, da CEPAL, PNUD e do Instituto Nacional de Pesquisas Econômicas de Cuba).

Tais gastos refletem-se, por exemplo, na educação. Impressio-nam o preparo e a informação do cubano médio nas ruas das princi-pais cidades do País. A educação é gratuita e de excelente qualida-de, devido à decisão política do governo, facilitada pela elevada disponibilidade de pessoal a ser alocado ao setor serviços. Hoje, não há salas de aula, no ensino elementar, com mais de 20 alu-nos. Os primeiros quatro anos de estudos são de oito horas, perío-do durante o qual as crianças re-cebem uma boa alimentação. A pré-escola é eficaz e amplamente disseminada. Pelas mesmas ra-zões, quase 70% da população

“Hoje o salário mínimo é

de cerca de U$ 9,00 por

mês, ou algo como 225

pesos mensais. A política é

de progressiva valorização

do peso normal, até

que, ao longo dos anos,

atinja o nível dos pesos

convertibles”.

4 São cestas básicas individuais, e não familiares, como as brasileiras.

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chega à universidade, o que re-presenta mais uma forma de “em-prego”. Para esse grande número de profissionais de nível superior, a economia não tem, entretanto, condições de oferecer atividade compatível com o treinamento profissional recebido.

Também a assistência de saúde é boa e gratuita, merecendo desta-que o sistema de médicos de famí-lia. Cada um desses profissionais atende cerca de 90 famílias. O Es-tado procura cobrir todas as neces-sidades médicas da população. Os indicadores de saúde são dos mais elevados: a taxa de mortalidade in-fantil de Washington é quase o do-bro da de Havana. Já a esperança de vida, em 2005, chegava a 74,94 anos para os homens e 79.65 para as mulheres, com uma média de 77,4 anos. Já no Brasil, a média é de 71,41 anos. A esperança de vida em Cuba é, portanto, praticamente a mesma da norte-americana, si-tuada, para os homens, na casa de 74,89 anos e, para as mulheres, na de 80,67 anos (fonte: indexmundi, Internet).

A moradia é um problema grave no país. A Revolução dei-xou as pessoas nas casas em que moravam, mas a maior parte dos membros da elite pré-revolucioná-ria abandonou as suas e mudou-se para Miami. Surgiu, então, uma ampla disponibilidade de man-sões e residências confortáveis, que passaram a ser de propriedade estatal. Foram alugadas para diplo-matas ou transformadas em pré-dios de uso público, como residên-cias estudantis, museus, centros comunitários. Até 1989, início do “período especial”, houve inves-timentos significativos em habita-ção, descontinuados desde então. O resultado da interrupção foi a

atual falta de espaço para o abrigo de famílias em crescimento e para o surgimento de novas famílias, o que resulta em um excesso de pes-soas convivendo sob o mesmo teto. Como os imóveis são privados, sua conservação é de responsabi-lidade de seus proprietários. Dada a renda média baixa, é normal que imóveis residenciais não recebam a mais elementar conservação. Em Havana, há bairros inteiros em perigo de desabamento, incluindo muitas casas habitadas. A maioria das pessoas vive em imóveis de suas famílias ou alugados por um preço muito baixo, o que represen-ta outra forma de salário indireto.

É precário o transporte urbano, sobretudo nas duas maiores cida-des, Havana e Santiago. Não houve investimentos na renovação da fro-ta, e a incerteza no abastecimento de gasolina levou ao surgimento de meios de transporte alternativos, como, por exemplo, o “bicitaxi”, uma bicicleta-táxi. Carros america-

nos dos anos quarenta e cinqüenta decoram as ruas de Havana. Em ci-dades planas, como Cinfuegos, cir-culam carruagens-ônibus de oito lu-gares, puxados por cavalo. Em San-tiago, o maior volume de transporte público é realizado por pequenos caminhões particulares superlota-dos. Em Havana, trafegam carretas, transformadas em ônibus, em geral, também, superlotados. O transporte público nas cidades cubanas tem, por via de regra, preços baixíssimos ou simbólicos, compatíveis com a renda de seus usuários e com o ser-viço oferecido.

Em Cuba, a segurança pública é excelente. São raros os crimes de maior gravidade.

Embora, a educação e a saúde sejam, em larga medida, gratuitos, e os preços de aluguéis e transpor-tes públicos sejam quase simbóli-cos, calcula-se que o mínimo para uma família de duas pessoas viver com simplicidade seja algo em torno de 1200 pesos cubanos por

“A moradia é um problema grave

no país. A Revolução deixou as

pessoas nas casas em que moravam,

mas a maior parte dos membros da

elite pré-revolucionária abandonou as

suas e mudou-se para Miami. Surgiu,

então, uma ampla disponibilidade de

mansões e residências confortáveis,

que passaram a ser de

propriedade estatal”.

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mês, o equivalente a cerca de U$ 50,00. A grande maioria da popu-lação está em uma situação que, no Brasil, denominaríamos de “po-breza digna”, ou seja, não chega a passar fome, mas vive com pouco mais do que o suficiente para o es-sencial.

É estatisticamente desprezí-vel o número de indigentes, mas a população considerada pobre é de 14%, contrastando com os 32% do Brasil. Há, uma faixa que não consegue garantir a subsistên-cia só com o salário5. Existe, por esta razão, alguma migração para Havana, a partir das províncias orientais, onde há poucas alterna-tivas de complemento da renda do salário. Esses migrantes largam seus empregos, em sua localidade de origem, em busca de melhores oportunidades na capital do país. O abandono do emprego lança-os em uma espécie de “limbo” da

cidadania, pois representa a desis-tência da participação formal na economia e na sociedade política. Hoje, existe na cidade de Havana pelo menos um bairro inteiro ha-bitado por pessoas vivendo nesta situação, após o abandono de seus empregos na região de origem e, às vezes, na própria capital. Por isto, não têm salário ou cestas básicas. A escola das crianças, porém, é garantida e têm acesso ao médico de família do bairro vizinho. In-gressam na economia informal do turismo, vendendo rum e charutos falsificados, realizando pequenos furtos, oferecendo seus serviços como guias turísticos não-oficiais, pedindo esmolas ou atuando na prostituição.

No outro extremo, há a exceção de um grupo mínimo de grandes artistas e atletas de renome inter-nacional (talvez algo como 0,1% da população), que recebem seus

estipêndios em dólares, sendo-lhes garantido um nível muito elevado de vida.

A política de distribuir o sacrifí-cio por igual reduz a carência abso-luta (“indigência”) a quase zero e ge-neraliza a carência média. Por isto, a maior parte dos cubanos pensa em complementar seus rendimentos de salário. Há três formas principais de se obter acréscimos de renda:

1º - atividades relacionadas ao turismo: oferecem a possibilidade de ganhos absolutamente extraor-dinários, devido às gorjetas, con-sideradas um direito e solicitadas sem maiores inibições. Os ganhos com gorjetas podem ir de U$ 50,00 a U$ 1000,00 mensais, perfazendo uma diferença de, eventualmente, mais de cem vezes no orçamento doméstico. Por isto, empregos for-mais no setor turístico, de forma especial os de interação direta com o turista, como carregador de mala de hotel, porteiro, garçom, cama-reira e motorista de táxi são extre-mamente disputados;

2º - remessas do exterior. Hoje as remessas do exterior, principal-mente dos Estados Unidos, repre-sentam uma importante fonte de renda para a maior parte dos paí-ses latino-americanos, e Cuba não foge à regra. Calculam-se em cerca de novecentos milhões de dólares as remessas para a Ilha em 2004. Valores considerados pequenos nos Estados Unidos, de U$100,00 ou U$ 200,00, podem significar uma multiplicação de dez ou vinte vezes na renda familiar. Por isto, muitos dos migrantes para os Es-tados Unidos são, efetivamente, migrantes econômicos, que partem em busca do sustento de suas famí-lias residentes em Cuba;

5 A desnutrição, que não se confunde com a fome, chegava a 13%, em 2001, segundo o PNUD.

“A escola das crianças, porém, é

garantida e têm acesso ao médico

de família do bairro vizinho.

Ingressam na economia informal

do turismo, vendendo rum e

charutos falsificados, realizando

pequenos furtos, oferecendo seus

serviços como guias turísticos

não-oficiais, pedindo esmolas ou

atuando na prostituição”.

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3º - corrupção: mesmo Fidel Castro, na televisão pública, tem reconhecido a gravidade do pro-blema da corrupção no país. Esta é rara nos escalões superiores, mas comum nos pequenos negócios. Os milhares de gerentes de lojas, restaurantes e prestadores de ser-viços, freqüentemente, encontram uma maneira de desviar parte dos recursos que administram para sua conta particular e se “associar” ao proprietário do estabelecimento, o Estado. Recente levantamento da Procuradoria do Estado atingiu a cifra de 16.000 casos de corrupção.

Sem dúvida, o Estado pode e deve, também no capitalismo, par-ticipar de empresas em setores es-tratégicos e, especialmente, naque-les que os economistas clássicos denominaram “monopólios natu-rais”. Exemplos de empresas es-tatais bem sucedidas no Brasil são Banco do Brasil, Petrobrás, Vale do Rio do Doce, as empresas gerado-ras e distribuidoras de energia, as de telefonia e muitas outras. Em si-tuações como a da telefonia brasi-leira, a recente melhoria no sistema seria facilmente obtida por meio de uma simples quebra de monopólio, sem a necessidade de privatização gravosa do patrimônio público. Essas empresas estatais têm ou ti-nham como razão de sua eficiên-cia, uma clara estrutura de carreira, dotada de expressivas diferenças salariais associadas ao comprome-timento de seus empregados com o sucesso da firma. Na campanha di-famatória de imprensa a serviço de sua privatização, durante a década de 90, esta valorização do corpo de empregados, essencial para o sucesso de qualquer empresa, foi chamada de “corporativismo”, ex-pressão impregnada de conotações depreciativas.

Em Cuba, a ineficiência devi-do aos baixos estímulos salariais pode tornar-se um problema gra-ve. Por exemplo, nos restaurantes para turistas administrados pelo Estado, os garçons são prestati-vos e eficientes, na expectativa de gorjetas que podem multiplicar os salários. Já o produto da cozi-nha desses mesmos restaurantes é, freqüentemente, lamentável, pois cozinheiros não recebem gorjetas. Uma vez que o volume de gorjetas depende da quantidade de fregue-ses, o melhor para todos (incluindo os turistas) seria um acordo entre garçons e cozinheiros para a par-tilha das gorjetas recebidas pelos primeiros.

Uma estrutura bem definida de carreira em empresas privadas ou estatais resulta em um sistema de recompensas e punições para todas as pessoas, tais como a possibili-dade de ganhar um bom rendimen-

to ou o risco de perder o emprego. É verdade que, em países como o Brasil atual, a punição do traba-lhador sem qualquer motivo rela-cionado ao seu desempenho, por meio do desemprego ou de salários baixos, é muito mais freqüente do que a recompensa, devido à estag-nação da economia, às altas taxas de desemprego e à oferta abun-dante de trabalho. Mesmo assim, a recompensa está no horizonte do possível, como condição intrín-seca e premissa lógica do sistema econômico.

A demissão de empregados pou-co empenhados ou ineficientes tende a ocorrer apenas em casos extremos, pois poderá representar um proble-ma ainda maior para os gerentes e para o sistema cubano como um todo. Assim, é quase inexistente um sistema eficaz de sanções, positivas ou negativas, em toda a hierarquia do sistema produtivo.

“É verdade que, em países como

o Brasil atual, a punição do

trabalhador sem qualquer motivo

relacionado ao seu desempenho,

por meio do desemprego ou de

salários baixos, é muito mais

freqüente do que a recompensa,

devido à estagnação da economia,

às altas taxas de desemprego e à

oferta abundante de trabalho”.

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Quando a lógica não é a pro-dutividade, mas o emprego, não importa muito um sistema de san-ções, pois o próprio conceito de “eficiência”, central à economia capitalista, muda de sentido. As-sim, o sistema econômico cuba-no é muito eficaz para atingir seu maior objetivo, o emprego. Ob-viamente, há um limite à troca da produtividade por emprego. Após certo ponto, vigora o prosaico pa-radoxo de que só com o emprego da força de trabalho, sem o con-curso dos demais fatores, não há produção e sem produção não há emprego nem força de trabalho. Pode-se pensar em sistemas pro-dutivos pesadamente intensivos em mão-de-obra, como aconte-ceu na China socialista dos anos sessenta, onde, na construção de barragens, substituíam-se máqui-nas de terraplanagem por milhares de trabalhadores carregando terra

em cestas de vime. Havia a subs-tituição de capital por trabalho. No entanto, mesmo as cestas de vime são os equipamentos utilizados por esses trabalhadores, isto é, o “fator capital” utilizado no empreendi-mento6, e a própria barragem cons-truída desse modo passa a agregar capital à economia.

Posto de outro forma, é logi-camente absurda a relação entre emprego maior do que zero com produtividade zero, pois produti-vidade zero significa produção e renda iguais a zero, o que implica emprego zero. O inverso, empre-go zero associado a qualquer nível de produção superior a zero, seria possível, tão somente, nas utopias tecnológicas que prevêem uma economia inteiramente gerida por máquinas, sem qualquer interfe-rência humana.

A necessidade de recompen-sas na atividade econômica, em

busca de alguma produtividade, é, portanto, reconhecida pelo pró-prio governo cubano, que procura substituir incentivos salariais por prêmios, como fins de semana para as famílias dos trabalhadores em hotéis estatais ou a aquisição de determinados eletrodomésticos, como aparelhos de som, por preços mais baixos. Nos tempos da União Soviética abria-se a possibilidade de se conseguir automóveis russos Moskovitch. 7

A falta de incentivos individuais mais efetivos relaciona-se à falta de espaço para iniciativa e inovação nas economias ultraplanejadas. O planejamento centralizado impõe restrições à iniciativa em decisões frente a situações novas ou impre-vistas. Como o imprevisto é muito mais comum do que o contrário, a descentralização decisória é um importante elemento para o bom funcionamento da economia. Por exemplo, se o caminhão quebrar não se atrasará todo o processo produtivo até que o chefe do che-fe do chefe seja consultado, pois, simplesmente, se contrata outro caminhão na esquina mais próxi-ma. No planejamento centralizado a inovação torna-se mais difícil, uma vez que pressupõe métodos produtivos rotinizados. Tais arran-jos podem funcionar para determi-nados itens de produção em massa, visto que a ênfase na rotinização é compatível com o fordismo e com as fases iniciais da implantação de uma indústria voltada para a pro-dução em escala. Porém, o sistema econômico perde dinamismo em fases históricas subseqüentes, que

6 É o mesmo caso de arcos, flechas e machados de pedra, nas economias tribais.7As medidas contra gerentes que não correspondiam às expectativas faziam-se sentir, em momentos da União Soviética stalinista, por meio da

ameaça policial. Era preferível trabalhar no planejamento. Trabalhar na produção era arriscado, pois nesta área estava sempre presente a pos-sível acusação de “traição ao socialismo”, quando as metas de produção não eram atingidas, o que contribuía para a colonização da Sibéria.

“A necessidade de recompensas

na atividade econômica, em

busca de alguma produtividade,

é, portanto, reconhecida pelo

próprio governo cubano,

que procura substituir

incentivos salariais por

prêmios”.

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superam o fordismo e passam a valorizar a inovação permanente.

Na raiz do problema situa-se a premissa do planejamento, na sua vertente ultra-racionalista centrali-zada, de que a realidade econômica e social pode ser tratada da mesma forma pela qual a Engenharia pro-jeta uma ponte. Como o número de variáveis é inacreditavelmente maior entre seres humanos dotados de vontade e emoção do que entre blocos de concreto, este modelo só pode funcionar mal 8.

Essas razões parecem ter con-tribuído para o insucesso da antiga União Soviética.

As limitações à produtividade representam o preço para se distri-buir por igual o bem estar. A econo-mia cubana consegue pagá-lo devi-do ao excelente nível de educação popular e seus reflexos favoráveis na produtividade.

III – Expectativas e a Percep-ção do Sistema Econômico

Os baixos salários tornam-se fontes de insatisfação quando o trabalhador não consegue o su-ficiente para garantir um padrão de conforto adequado para sua família; ou quando vê o turista estrangeiro gastar vinte ou qua-renta vezes, em um único dia, o que ele, cubano, ganha em um ou dois meses de trabalho; ou, ain-da, quando sabe que o visitante estrangeiro possui, em casa, ob-jetos de comodidade, prestígio e prazer inacessíveis para a maior parte da população da Ilha. Muito além do consumismo estilo nor-

te-americano, caracterizado pela visita compulsiva ao shopping e pela aquisição frenética de novi-dades induzidas pela propaganda, há a questão de uma alimentação diversificada, do conforto obtido por meio da tecnologia e da legíti-ma e universal vontade humana de se adornar, com roupas, sapatos, cocares, uniformes, cosméticos, pinturas corporais e de possuir bens dotados de valor simbólico ou estético.

Esse contraste entre o padrão de consumo dos cubanos e dos turis-tas é tolerado principalmente pelos mais velhos, que se lembram do período pré-revolucionário, onde campeavam a fome e a indigência. Recordam que a educação era para poucos, pois em 1959 o número de analfabetos era de 65% e hoje é de

1%; a saúde era para poucos, pois o número total de médicos, que era de 3000, hoje é de 60.000; o sis-tema de aposentadorias e pensões, hoje, abrange cerca de 1.500.000 pessoas, com salários, por vezes, maiores do que os do pessoal da ativa; sabem que seu país tem um dos melhores índices de segurança pública e nele se pode, sem maior risco, a qualquer hora, andar em qualquer lugar.

Entre os jovens não há a acei-tação fácil do contraste entre seu padrão de vida e o nível de renda e consumo exibido pelos turistas. Não existe a memória do período anterior à Revolução; os benefí-cios como educação, saúde, ga-rantia de emprego e segurança so-cial são considerados como uma espécie de bem natural.

“Em 1959, o número de analfabetos

era de 65% e hoje é de 1%; a saúde

era para poucos, pois o número

total de médicos, que era de 3000,

hoje é de 60.000; o sistema de

aposentadorias e pensões, hoje,

abrange cerca de 1.500.000 pessoas,

com salários, por vezes, maiores do

que os do pessoal da ativa”.

8 É irônico que, no outro extremo do espectro ideológico do pensamento econômico, o uso indiscriminado de métodos quantitativos leve ao mesmo efeito: o modelo “técnico”, com a perda da percepção das infinitas variáveis que fazem a riqueza da diversidade humana. Iludindo a realidade, o número de variáveis deve ser reduzido a umas poucas, para que a quantificação seja possível. Assim, esta crítica não passa pela ideologia, mas pela simplificação do real em nome do racionalismo em suas múltiplas expressões políticas.

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Devido à situação de Havana como destino turístico, é nesta cidade que se encontra a maior quantidade de jovens com esta visão do mundo. Em outros lo-cais turísticos, como Varadero e nas demais praias, os cubanos lá estão, principalmente, para traba-lhar, vivendo acima da média do país, em função das gorjetas que recebem dos turistas. Cria-se aí outro problema, pois as melhores praias e hotéis do país não são fre-qüentados por cubanos.

Paradoxalmente, a excelente educação que todos recebem é fonte de insatisfação. A boa edu-cação desperta aspirações, levan-do as pessoas a almejarem algum

tipo de conquista, nas artes, nas ciências ou nos negócios. É extre-mamente frustrante, após décadas de estudos e um diploma univer-sitário9, que a melhor colocação a ser conquistada seja a de motoris-ta de táxi ou carregador de malas.

Logo, a insatisfação em Cuba está mais concentrada nas pro-ximidades de Havana e entre os jovens, embora se dissemine por outros locais e setores. Porém, a maior parte dos “balseiros”, que arriscam sua vida em embarca-ções precárias em busca da costa da Flórida, é composta por pes-soas de todas as idades, que não conseguem sobreviver adequada-mente apenas com o seu salário.

A maioria da população da Ilha, entretanto, tem confiança em que o País deverá superar os proble-mas econômicos e sente, na pró-pria idéia de eqüidade subjacente ao sistema socialista, um motivo de afirmação da identidade nacio-nal. Esta percepção decorre, em larga medida, da escola, onde se associam História e Socialismo, e é reforçada pela forte influência das freqüentes exposições e análi-ses de Fidel Castro, transmitidas pela imprensa. Fidel entra na casa das pessoas pela TV, é ouvido e forma a opinião pública.

O apoio ao socialismo em Cuba decorre da radical distri-buição de renda após a Revolu-ção e do reconhecimento de que antes da Revolução o país era um terreiro da máfia, onde os norte-americanos se liberavam de sua formação puritana. O povo cuba-no era uma folclórica expressão da América Latina, usada para o exercício do racismo. O Estado era dominado por ditadores com uniformes brilhantes, apoiados pelos Estados Unidos, de onde era controlada a maior parte da ativi-dade econômica. Nas primeiras décadas do século XX, a Consti-tuição Cubana incluía a chamada “emenda Platt”, que concedia aos Estados Unidos o direito de inter-venção na Ilha, fim para o qual foi construída a base de Guantánamo. A emenda foi formalmente revo-gada na década de 30, mas con-tinuou operando de fato. É muito forte a memória de um passado recente de humilhação nacional.

As relações com os Estados Unidos no período pós-revolucio-

“O apoio ao socialismo em Cuba

decorre da radical distribuição

de renda após a Revolução

e do reconhecimento de que

antes da Revolução o país era

um terreiro da máfia, onde os

norte-americanos se liberavam

de sua formação puritana”.

9 Ao contrário dos diplomas emitidos por muitas universidades brasileiras, os diplomas cubanos atestam, efetivamente, o conhecimento presumi-do após a conclusão do curso superior.

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nário são lembradas, em contra-ponto, pelo bloqueio econômico, invasão de mercenários, ameaça militar permanente, tentativas de assassinato de Fidel Castro, atos terroristas contra o país e uma campanha de difamação sem tré-guas. A pressão norte-americana é, por isto, percebida como uma tentativa de retorno à situação pré-revolucionária. Afinal, a recente lei Helms-Burton (sancionada no período Clinton), que proíbe o co-mércio de firmas norte-americanas com Cuba, é justificada pelo que é considerado o “roubo” de pro-priedades norte-americanas pelo governo cubano, donde se supõe que os Estados Unidos pretendem recuperar o que “perderam”. O so-cialismo, ameaçado pelo inimigo externo, está no cerne do orgulho e da afirmação nacional do povo cubano. O nacionalismo ajuda a explicar a resistência do sistema político e econômico.

A resistência política impede possíveis mudanças no sistema econômico, pois o ideal seria combinar bem-estar com maior produtividade. Paradoxalmente, o desequilíbrio a favor do primeiro, por meio do sacrifício da produti-vidade, pode prejudicar o próprio nível de bem-estar. Uma fórmula equilibrada entre os dois objeti-vos, implementada à medida que a economia fosse crescendo, acar-retaria um maior nível de renda, que, bem distribuída, representa-ria um melhor nível de bem es-tar. Esta fórmula passaria pelos seguintes fatores, pelo lado da produtividade: maiores estímulos expressos em diferenças salariais; maior liberdade de iniciativa na

criação de pequenas e médias empresas privadas; substituição do planejamento centralizado por um modelo mais flexível. E pelo lado do bem-estar: substituição do emprego universal pela renda mínima para toda a população, empregada ou não; manutenção dos gastos sociais, pelo menos nos níveis atuais; e, por fim, continui-dade do rígido controle da moeda para evitar situações como a bra-sileira, onde a política monetária é o primeiro fator conjuntural, le-vando à fragilidade macroeconô-mica, à má distribuição de renda e à pobreza da população.

A liberdade é um valor funda-mental para o bom desempenho da economia e para a felicidade das pes-soas. Mas a liberdade pessoal só faz sentido como corolário da liberdade coletiva do povo e da soberania da nação, para que a democracia não se avilte em discurso legitimador da pobreza de muitos e dos privilégios de elites internacionalizadas. Qual-quer ensaio de liberalização do sis-tema político e da economia cubana só terá viabilidade e legitimidade se os Estados Unidos abandonarem o bloqueio econômico, a ameaça ar-mada e a pretensão de restabelecer relações imperiais.

* George de Cerqueira Leite ZarurPh. D pela Universidade da Florida, ex-pesquisador visitante da Harvard University, Professor Internacional da FLACSO,

Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados.

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A R T I G O

Crise política e a taxa de juros

João Paulo de Almeida Magalhães *

1 - O Brasil registra a mais alta taxa de juros do mundo, sendo que, freqüentemente, seu nível tem-se revelado duas vezes su-perior ao do segundo colocado. As conseqüências óbvias, e extre-mamente graves, desse fato são o desencorajamento de aplicações em atividades produtivas, o des-propositado inchamento dos lucros no setor financeiro e a sobreva-lorização cambial, decorrente de grandes entradas de capital estran-geiro especulativo. A recente crise política, ligada a denúncias do uso de “caixa dois” pelo partido oficial e do pagamento do “mensalão” para garantir votos no Congresso, pode levar a mudança nesse estado de coisas.

Isso porque a crise teve refle-xos negativos sobre o Presidente da República, tornando mais difícil sua reeleição. A forma de contornar esse estado de coisas consiste em melhorar a imagem do Governo através de grandes investimentos públicos no ano eleitoral de 2006. E para conseguir esse resultado sem que a inflação se acelere outros gastos devem ser reduzidos; a candidata natural ao

corte é a despesa com os juros da dívida pública. Estes podem che-gar, no próximo ano, a 150 bilhões de reais. Se a taxa básica oficial for reduzida, digamos, para um terço do nível atual (e ainda assim continuará a ser elevada relati-vamente às do resto do mundo), teremos economia de 100 bilhões de reais, que poderia ser aplicada em investimentos, como os de infraestrutura. Estes, além de be-nefício direto para as populações locais, são capazes de gerar núme-ro significativo de empregos, com o conseqüente impacto favorável à candidatura oficial.

Tal parece ser a causa principal da posição defendida pela ministra Dilma Rousseff.

2 – Em sentido oposto, temos a tese dos que afirmam ser desne-cessário o acréscimo de investi-mentos ( e, portanto, a redução da taxa de juros), dado que o efeito negativo da crise política sobre a candidatura Lula é neutraliza-do pelo fato de a economia ir bem. Apesar da crise, a inflação continua sob controle, a dívida pública não está aumentando e exportações e superávit comercial

crescem rapidamente. Essa tese tem sido amplamente aceita pelos formadores de opinião do País.

Assim, importante analista política de jornal de circulação nacional (Teresa Kruvinel) dis-cute, em artigo recente, até que ponto o fato de a economia ir bem poderá ajudar a candidatura Lula. Lembra que Fernando Henrique foi eleito pelo sucesso do Plano Real, assinalando, porém, que em outros casos os bons resultados econômicos não tiveram contra-partida semelhante nas eleições. Bem mais importantes, todavia, foram os fatos registrados durante o primeiro depoimento do Minis-tro Palocci em comissão do Con-gresso. A oposição declarou, de início, que não discutiria o aspecto ético dos ataques ao Ministro, concentrando-se no exame do seu desempenho como responsável pela condução da política econô-mica. Personalidades de primeiro nível e incontestada liderança intelectual e política, como os se-nadores Arthur Virgílio e Jeferson Perez, elogiaram a ação do inque-rido, ou seja, consagraram a tese de que a economia vai bem. Em

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alguns casos os oradores manifes-taram, inclusive formalmente, sua discordância com as posições da Ministra Dilma.

3 – A prevalecer esta segunda posição, que pelo menos até o mo-mento parece ser a dominante, não é de se esperar qualquer mudança na política de juros. É importante, todavia, examinar a tese básica em que ela se apóia, ou seja, de que a economia vai bem. Há bases eco-nômicas sólidas, ou sua colocação é intrinsecamente débil, viabili-zando futura mudança?

O mínimo que se pode dizer é que a afirmação de que tudo vai bem na economia brasileira toca as raias do absurdo. Em qualquer análise minimamente responsável, o critério para avaliar o desempe-nho de economia subdesenvolvida é o ritmo de incremento do PIB. Este deve ser suficiente para colo-car o país em processo de elimina-ção do atraso econômico. A China e a Índia são hoje unanimemente elogiadas, por estarem crescendo em ritmo que varia de 7% a 95% ao ano, o que acontece igualmente na maior parte dos países do Leste da Ásia e até na vizinha Argenti-na. O mesmo aconteceu no Brasil durante cerca de trinta anos da segunda metade do século passa-do. Ninguém se preocupa muito com os níveis de equilíbrio fiscal, monetário e cambial registrados na China e Índia. Quando esse aspec-to é considerado, indaga-se apenas até que ponto podem ajudar ou comprometer o sucesso registrado em termos de incremento do PIB.

O surrealismo da tese de que a economia vai bem pode ser su-blinhado com um fato concreto. A opinião pública brasileira tem-se revelado chocada com noticiário sobre a prisão de brasileiros que

tentam ingressar clandestinamen-te nos Estados Unidos através da fronteira mexicana (inclusive aceitando freqüentemente risco de morte) e sobre a prisão e expulsão de brasileiros residindo ilegalmen-te naquele país. Recentemente, o Governo divulgou informação de que se acha residindo nos Esta-dos Unidos um milhão e meio de brasileiros, na maior parte clan-destinos, e, portanto, sem direito a atendimento médico, aposentado-ria e direitos trabalhistas em geral. Existe, inclusive, no Ministério das Relações Exteriores, funcio-nário em nível de embaixador, encarregado de zelar pelo interesse desses emigrantes. Ora, como a economia americana vai mal – com altíssimos (e possivelmente explosivos) déficits cambial e fis-cal – e a nossa economia vai bem, graças ao senhor Palocci, como explicar essa evasão ? Não seria o caso de o embaixador encarregado do problema convocar os clan-destinos brasileiros para informá – los de que estão redondamente

enganados, pois quem vai bem é o Brasil, e não os Estados Unidos, e nosso Governo se acha até preocu-pado com a potencial invasão do país por clandestinos americanos. Essa é, sem dúvida, proposta ab-surda. Não mais absurda, porém, do que o fato de representantes da elite intelectual e política brasileira declararem que nossa economia vai bem, quando ela não consegue sequer crescer aos 4% anuais necessários para empregar a mão-de-obra nova que se apresenta anualmente ao mercado.

E talvez não seja demais subli-nhar que o principal ganho ampla-mente proclamado pelos gestores de nossa política econômica , ou seja, de as exportações terem chegado ao nível de 100 bilhões de dólares e o superávit comer-cial, ao montante de 40 bilhões de dólares é , pelo menos, altamente discutível. Esses resultados foram obtidos com a colocação de “com-modities” agrícolas e industriais no mercado externo. Ora, a litera-tura especializada atribui o lento

“O mínimo que se pode dizer

é que a afirmação de que tudo

vai bem na economia brasileira

toca as raias do absurdo. Em

qualquer análise minimamente

responsável, o critério para

avaliar o desempenho de

economia subdesenvolvida é o

ritmo de incremento do PIB”.

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crescimento da América Latina exatamente à especialização de suas exportações em “commodi-ties”, setor de baixo valor adicio-nado por trabalhador, mercado de lento crescimento e altamente competitivo. Ou seja, sob a pers-pectiva de prazos médio e longo, é lícito afirmar que os bons resulta-dos obtidos no comércio exterior não são suficientes para garantir a retomada de crescimento acele-rado na economia brasileira. Pelo contrário, eles acarretam o risco de desencorajarem a adoção de nova estratégia econômica que leve o Brasil a abandonar o neolibera-lismo (com seu corolário de altos juros), que,durante duas décadas e meia, condenou o País à semi- estagnação.

A economia brasileira não vai, além disso, bem porque estima-tivas isentas prevêem para os qua-tro anos de Governo do PT taxa anual média de incremento do PIB inferior a 3%, resultado não dife-rente do que vem sendo registrado

nos últimos vinte cinco anos. E outra coisa não se poderia esperar, dado que a atual administração do País manteve a mesma política econômica que comandou a nossa economia nas últimas duas déca-das e meia.

Em suma, a Ministra Dilma está certa e o Ministro Palocci, errado. Cumpre, todavia, não exa-gerar os méritos da Senhora Mi-nistra. O Brasil precisa é de nova estratégia, que sucateie o recei-tuário neoliberal do Consenso de Washington. A posição da Senhora Ministra é claramente de curto prazo: para ela é preciso investir mais em 2006, a fim de garantir a reeleição do atual Presidente. Para obter os recursos necessários, despesas devem ser reduzidas e o candidato natural para o corte é o gasto com as taxas de juros.

O importante do ponto de vista da presente análise é que o predomínio da visão distorcida de que a economia vai bem exclui, nas condições presentes, a possi-

bilidade de baixa da taxa de juros nas proporções supra referidas. Tal situação só se modificará se im-portante deterioração no prestígio do atual Presidente levar à conclu-são de que, embora a economia vá bem, significativo aumento dos investimentos públicos revela-se eleitoralmente necessário. Nesse caso, os juros poderão baixar.

4 – A crise política que aden-trou a área econômica, através do conflito Dilma – Paloci, colocou em dúvida a política oficial que tem nas altíssimas taxas de juros um dos seus pontos básicos. Den-tro do panorama presente não pa-rece provável qualquer mudança. Na verdade, porém, o enfraque-cimento da atual administração, resultante da crise política, pode, a prazo mais longo, ter impacto sobre a política de juros. Há, de fato, poucas dúvidas de que, se reeleito, Lula manterá a atual política econômica, à qual ele sempre ofereceu decidido apoio. A crise política aumentou, toda-via, as chances de vitória de can-didatura alternativa e, portanto, de mudança da política econômi-ca. A indagação é, assim, sobre a probabilidade de surgir candidato com visão desenvolvimentista, dentro da qual são absolutamente inadmissíveis taxas de juros do nível hoje vigente no Brasil.

O grande obstáculo ao sur-gimento de candidato com esse perfil é a visão curtoprazista domi-nante no País, visão que valoriza os equilíbrios cambial, fiscal e monetário, deixando de lado o objetivo básico do desenvolvi-mento ou da eliminação do atraso econômico. E o mais grave é que esse tipo de distorção se acha fir-memente implantado na própria concepção de política econômica

“A crise política que

adentrou a área econômica,

através do conflito Dilma –

Palocci, colocou em dúvida a

política oficial que tem nas

altíssimas taxas de juros um

dos seus pontos básicos”.

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de importante segmento de eco-nomistas brasileiros, conforme se mostra a seguir.

A CEPAL e o IPEA realizaram, em 2002, pesquisa cujo objetivo era determinar o que pensam os economistas brasileiros sobre meios e modos de o Brasil retomar o crescimento. Foram realizadas 38 entrevistas com especialistas do melhor nível nacional e soli-citados seis artigos. A conclusão dos organizadores foi a que segue: “Desde as primeira entrevistas ficou claro que o crescimento não tem ocupado parte central das pre-ocupações e reflexões da maioria dos economistas brasileiros De fato, o campo temático mostrou-se pouco propício a grandes aprofun-damentos por parte dos entrevista-dos e tornou-se – evidente, durante a pesquisa, que se tratava de um regresso ao tema”. E continuam: “Há como se mencionar uma ex-trema preocupação com o curto prazo. Em especial com a política de estabilização, a qual vem afo-gando e desfocando a visão de longo prazo” (pg. 34).

Ou seja, o economista brasilei-ro (ou pelo menos parcela signifi-cativa dos mesmos) perdeu a capa-cidade de analisar o longo prazo, com a conseqüente incapacidade de formular, ou defender, estraté-gias alternativas à presente política econômica (na qual as altíssimas taxas de juros têm papel funda-mental), cujo resultado foi levar o Brasil a 25 anos de semi-estagna-ção. E as raízes do problema são facilmente identificáveis. Como todo cientista de país subdesenvol-vido, o economista brasileiro não cria paradigmas analíticos, mas os importa dos países desenvolvidos. Nas ciências exatas isso não acar-reta maiores problemas. Quando

for descoberta a cura do câncer no Hemisfério Norte, ela valerá igual-mente para o Hemisfério Sul. O mesmo não acontece nas ciências sociais.

Países desenvolvidos não têm atraso econômico a eliminar. O importante para eles é garantir os equilíbrios fundamentais (cam-bial, fiscal e monetário). Política econômica que os garanta, como a elevada taxa de juros para conter a inflação, constitui o objetivo fun-damental de sua ação. Foi ao im-portar essa visão que o economista brasileiro se instalou no “curtopra-zismo” denunciado na pesquisa CEPAL – IPEA.

Esse problema inexistia no pas-sado, porque os especialistas em Economia do Desenvolvimento, instalados nos países desenvolvi-dos, reconheciam a importância da eliminação do atraso econômico e a especificidade do crescimento retardatário. Isso durou enquanto se acreditou na possibilidade do desenvolvimento em escala plane-tária. Com o fracasso das Décadas do Desenvolvimento, lançadas

pelas Nações Unidas logo após a Segunda Guerra Mundial, a situa-ção se modificou. Os países ricos perceberam a impossibilidade do desenvolvimento em escala plane-tária ou, pelo menos, que a tentati-va de levá-lo adiante resultaria em pesados ônus para eles, com regras mais rígidas de proteção ambiental e maiores preços dos recursos na-turais não-renováveis, a exemplo do sucedido com o petróleo. Com isso, cessaram os financiamentos para o estudo do atraso econômi-co, estiolando-se a Economia do Desenvolvimento.

Mais grave, porém, foi que se montou “barreira ideológica” cujo objetivo é colocar obstáculos à pretensão dos países subdesenvol-vidos de atingir o nível de vida das economias maduras. Essa tentativa viu-se recentemente denunciada pelo professor da Universidade de Cambridge, H.J. Chang, no seu livro que leva o nome significativo de “Kicking Away the Ladder” (traduzido na versão portuguesa como “Chutando a Escada”). A tese básica do autor é a de que os

“O economista brasileiro (ou pelo

menos parcela significativa dos

mesmos) perdeu a capacidade

de analisar o longo prazo, com

a conseqüente incapacidade de

formular, ou defender, estratégias

alternativas à presente

política econômica”.

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países desenvolvidos, após terem alcançado elevados padrões de vida, procuram impedir que os demais façam o mesmo.

Em síntese, embora a crise política, ao envolver a discussão da atual estratégia econômica, crie a possibilidade de mudança, a vi-são curtoprazista dominante torna difícil que, mesmo a prazo mais longo, estratégia alternativa seja implantada e, portanto, que taxas de juros de nível civilizado sejam adotadas.

5 – Essa situação tem encontra-do diversas explicações, a saber: os juros brasileiros são altos, seja por ser necessário atrair o capital estrangeiro, seja para permitir a rolagem da substancial dívida pública interna, seja ainda para manter a inflação sob controle. Na

prática, porém, a COPOM vem justificando as elevadíssimas taxas de juros como forma de conter a inflação.

Tudo começou quando, em 2002, o aumento da preços regis-trado pelo INPC chegou a quase 15%. O Governo que assumiu no ano seguinte declarou que se es-tava delineando no País a volta do processo hiperinflacionário, com a necessidade da adoção de medidas radicais para neutralizá-lo. Era essa uma colocação claramente falsa. Estava-se apenas diante de uma “bolha”, de duração limitada, resultante da provável eleição de candidato de esquerda, do qual se temia o lançamento de medidas econômicas radicais.

A tese de que se estava à bei-ra de uma explosão de preços

nada tinha a ver com os fatos. Em função da traumática experiência hiperinflacionária brasileira e da sobrevalorização eleitoreira do sucesso do Plano Real, difundiu-se no País a tese de que qualquer espiral de preços tende inexoravel-mente a se acelerar. Em compa-ração largamente divulgada, afir-mou-se que a inflação seria uma gravidez cujo resultado final seria, inevitavelmente, o parto hiperin-flacionário.

Semelhante tese não é, de for-ma alguma, confirmada pela His-tória Econômica. Após a Segunda Guerra Mundial o Brasil registrou 30 anos de inflação anual média de 20%, sem que esta jamais hou-vesse escapado de controle. Du-rante os anos 1970 –80, marcados pelos dois “choques do petróleo”, a Coréia do Sul registrou inflação anual média de 20%. Na década seguinte essa percentagem caiu para 5% sem que essa transição fosse precedida de explosão de preços. Experiência do mesmo tipo ocorreu nos outros países do Leste da Ásia.

A hiperinflação brasileira foi processo isolado resultante de erro de política econômica. Diferente-mente de outros países, o Brasil recusou-se a adotar as medidas requeridas para ajustar sua econo-mia à multiplicação dos preços do petróleo de 1974 e 1980. Enquan-to outros países adotavam medidas de inevitáveis corolários recessi-vos, o Brasil preferiu manter-se, nas palavras do Presidente Geisel, “uma ilha de prosperidade num mar de recessão”. O resultado foi o que se viu, mas nada indica que ele venha a ser repetido diante de qualquer aumento do desequilíbrio monetário.

Como conseqüência dessa

“A hiperinflação brasileira

foi processo isolado

resultante de erro de política

econômica. Diferentemente

de outros países, o Brasil

recusou–se a adotar as

medidas requeridas para

ajustar sua economia à

multiplicação dos preços do

petróleo de 1974 e 1980”.

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errada percepção, a atual adminis-tração do País passou a considerar de vital importância adotar metas de inflação zero, ou de nível não superior ao registrado no países da OCDE, adotando a taxa de juros como instrumento principal para alcançar tal resultado. A gravidade desse erro pode ser avaliada não só por ser falsa a alegação de que qualquer surto inflacionário, por menor que seja, tende a se acele-rar, como pelo fato de a unanimi-dade prática dos especialistas em Economia do Desenvolvimento considerar, em economias retar-datárias, inflação moderada e sob controle favorável ao crescimento. Vejamos alguns depoimentos.

No que se refere à relação entre desenvolvimento e elevação de preços, começaremos por citar Carliner (1995). Exprimindo o que considerava a opinião dominante entre especialistas, diz o seguinte: ”Muitos economistas recomen-dam que a inflação nos países em desenvolvimento não deveria ser maior que na OCDE. No entanto, ambos, Japão e Coréia, tiveram inflação anual bem acima de 10% durante seus anos de elevado crescimento. E a Índia (...) tinha a baixa inflação do túmulo. As lições parecem ser que uma baixa inflação, por si só, não é, claro, suficiente para se alcançar elevado crescimento, enquanto inflação extremamente alta, por exemplo, de 500% anualmente, é tão dis-torcedora que inibe fortemente o crescimento. No entanto, não há consenso sobre as conseqüências de uma taxa de inflação entre dez e trinta por cento nos países em desenvolvimento“ (pg. 33).

Escrevendo posteriormen-te, Yusuf e Stiglitz (2001), (este úl-timo Prêmio Nobel de Economia,

resumem a opinião dominante en-tre especialistas sobre as relações entre inflação e desenvolvimento. Segundo eles, “As descobertas iniciais eram equívocas: em países como o Brasil e a República da Coréia a inflação não parece ter prejudicado o crescimento, mas a experiência de outros países com inflação moderada ou alta revelou conseqüências negativas (...)” Mais adiante, mostra a visão atu-al:” Pelo início dos anos 90 havia um amplo consenso de que taxas baixas e estáveis de inflação eram objetivo desejável nos países em desenvolvimento. Embora taxas moderadas de inflação de até 40 % ao ano não serem necessariamente

prejudiciais ao crescimento” (pg. 229).

A posição dos especialistas na Economia do Desenvolvimento sobre a inflação é igualmente re-sumida em Buira (2004). Segundo ele, “Inflação elevada é, evidente-mente, má. Ela tem custos, provo-ca distorções e assim por diante, mas não é verdade que uma vez comece a se elevar, a inflação te-nha tendência a se acelerar. Como Stiglitz notou, não há evidência para isso; é apenas uma hipótese. E não é verdade que inflação elevada tenha altos custos para ser rever-tida. Essas teses foram testadas empiricamente, e há abundante evidência em sentido contrário.

“Uma baixa inflação, por si

só, não é, claro, suficiente

para se alcançar elevado

crescimento, enquanto

inflação extremamente

alta, por exemplo, de

500% anualmente ,é tão

distorcedora que inibe

fortemente o crescimento”.

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Bruno e Easterly ( diretor adminis-trativo adjunto do FMI na ocasião) Mohsi Kahn ( que era chefe adjun-to de pesquisa no Departamento do Oriente Médio do FMI) todos não conseguiram encontrar evidência de que a inflação é custosa. Se você tem uma inflação de 15 ou 20% [ ao ano]ela não parece ter altos custos em termos de cresci-mento. De fato, Akerlof, Dickens e Perry e outros sustentam que taxa moderada de inflação até melhora o desempenho econômico” ( pg. 46).

Igualmente significativa é a opinião de H.J.Chang, que ganhou recentemente grande projeção en-tre os especialistas em Economia do Desenvolvimento com seu livro “Kicking Away the Ladder“, em entrevista concedida à Revista Isto É, em 13 de abril de 2005), na qual comenta a política econômica em curso no Brasil, afirma :” Fran-camente em nenhum país a indús-tria de manufaturados ou qualquer outra obtém lucros acima de 7%. Se elas pagam 13% de juros reais

como podem sobreviver?” E mais adiante: “Se o Governo brasileiro quer mesmo investir no país tem que repensar sua macroeconomia e abandonar esse objetivo de infla-ção de um dígito. Nos anos sessen-ta países como a Coréia do Sul e Japão cresceram com inflação de 20% [ ao ano]” (pg. 76).

A opinião dominante entre os especialistas em Economia do Desenvolvimento autoriza, por-tanto, a tese de que a inflação nas economias retardatárias tem signi-ficado diferente do observado nas economias maduras. E muito es-pecialmente desmente o mito (que constitui uma das justificações da política atual) de que qualquer inflação, por menor que seja, tende inexoravelmente a se acelerar.

6 - O fato é, portanto, que a crise política não deverá, no curto prazo, alterar a política de altís-simos juros que vem marcando a administração econômica do País. Tal situação não deve modificar-se, a menos, é claro, que ocorra de-terioração bastante maior da ima-gem pública do Presidente, o que

forçaria a baixa dos juros a fim de elevar os recursos disponíveis para investimento. A prazo mais longo, a visão curtoprazista dificulta a de-finição de estratégia alternativa ao presente neoliberalismo, estratégia na qual os juros baixos constituirão aspecto fundamental.

Não há dúvida de que no momento presente certa visão de longo prazo começa a se afirmar, segundo deflui de obras coletivas organizadas por João Sicsú, Ana Célia Castro e Fábio Giambiagi. Na verdade, porém, elas não vêm recebendo, seja o nível de espe-cialistas, seja da opinião pública, a atenção que merecem. Trata-se da imposição pelos meios de co-municação (imprensa, organismos públicos de pesquisa, entidades econômicas internacionais etc.) do que se tem chamado de “pen-samento único”. A esperança de modificação nesse estado de coisas é proporcionada pelas eleições presidenciais de 2006. Um candi-dato de visão desenvolvimentista, como o atual Vice – Presidente da República, não poderá ser ignora-do nem pelos meios de comunica-ção de massa, nem pelo estamento técnico. Esse é um aspecto a ser sublinhado.

No XVI Congresso dos econo-mistas, realizado em novembro do presente ano, em Santa Catarina, foi unanimemente aprovada a Carta de Florianópolis, cujo ponto focal é a denúncia do curtoprazis-mo da política econômica no Bra-sil. Se fosse tomada de posição de candidato à Presidência da Repú-blica desencadearia grande debate nacional, o que não aconteceu com a Carta de Florianópolis.

Infelizmente, as pesquisas de opinião têm revelado até o mo-mento como principal alternativa o

“A opinião dominante entre

os especialista em Economia

do Desenvolvimento autoriza,

portanto, a tese de que a

inflação nas economias

retardatárias tem significado

diferente do observado nas

economias maduras”.

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senhor José Serra, oriundo do Go-verno passado, tão neoliberal como presente. Nova esperança surgiu quando lideranças mineiras (Aé-cio Neves, Itamar Franco e José Alencar), não comprometidas com a visão neoliberal, denunciaram o controle da política brasileira pelo PT de São Paulo e pelo PSDB do mesmo Estado, afirmando que mu-dança de rumos se faz necessária. Comentando essa tomada de posi-ção, o que se pode dizer é que São Paulo não tem, de fato, sido muito feliz nos Presidentes da República que proporcionou ao País.

No Governo passado tivemos paulista, de alta classe média e apontado como o chefe de Governo mais preparado do País. Presente-mente temos outro paulista, oriundo da militância sindicalista, e que

se orgulha de ter alcançado sua posição sem sequer completar os estudos secundários. Ambos são firmes aderentes ao Consenso de Washington e, portanto, respon-sáveis por fatia significativa das chamadas décadas perdidas em que mergulhou o País. No passado, dentro de critério econômico, exis-te largo reconhecimento de que os dois melhores Presidente da Repú-blica foram Getúlio Vargas, gaúcho, e Juscelino Kubitschek, mineiro. E entre os candidatos a pior coman-dante da economia brasileira temos o paulista Campos Salles, que, aliás,

também entregou a orientação da economia a um médico.

Na verdade, contudo, o crité-rio geográfico não tem maior im-portância. O necessário é se en-contrar candidato que adote para o País metas de desenvolvimento em vez de metas de inflação. Isto nos leva à paradoxal conclusão de que, em 2006, os economistas devem colocar em segundo pla-no seus trabalhos técnicos para, entrando na política, ajudarem a escolher candidato à Presidência que evite para o Brasil uma ter-ceira “ década perdida”.

*João Paulo de Almeida MagalhãesEconomista e professor da Universidade

Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Referências bibliográficas

Bielschowsky,R e Mussi (2002) ( orgs ) Políticas para a Retomada do Crescimento, IPEA, Brasília

Carliner ,Geoffrey comentário a Anne O. Krueger , (1995), East Asia Experience and Endogenous Growth Theory em Takatoshi Ito e Anne O. Kruege (orgs ), Growth Theories in Light of the East Asian Experience ,National Bureau of Economic Research , University of Chicago Press, Chicago,

Castro, AC. e Outros (orgs) Brasil em Desenvolvimento, Civilização Brasileira, Rio de Janeiro 2005

Buira, A (2004) The Dogmatism of Washinton Consensus em JJTeunissen e A. Akkerman (orgs) Diversity in Development, Fondad , Haia

Chang H.J. (2002) Kicking Away the Ladder, Anthem Press, Londres

Giambiagi, F. e A Villela ( orgs) Economia Brasileira Contemporânea . Elsevier, Rio de Janeiro 2005

Sicsú J. e Outros, ( 2005) Novo Desenvolvimentismo,um projeto nacional de crescimento com igualdade social, Manole, Barueri –São Paulo

Yusuf S e Stiglitz J E Development Issues:Settled and Open em Gerald Meier e Joseph Stiglitz( orgs) Frontiers of Development Economics, Banco Mundial Washington

As teses e idéias defendidas no presente texto são apresentadas de maneira mais aprofundada e sistemática em Nova Es-tratégia de Desenvolvimento para o Brasil, um enfoque de Longo Prazo, recentemente lançado pela editora Paz e Terra.

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C o n v ê n i o s d e A s s i s t ê n c i a e o u t r o sC o n v ê n i o s d e A s s i s t ê n c i a e o u t r o s

M a i s i n f o r m a ç õ e s n o s i t e : w w w . c o r e c o n d f . o r g . b r

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Page 29: 24-revista

Revista de conjuntura out/dez de 20052�M a i s i n f o r m a ç õ e s n o s i t e : w w w . c o r e c o n d f . o r g . b r

C o n v ê n i o s d e A s s i s t ê n c i a e o u t r o sC o n v ê n i o s d e A s s i s t ê n c i a e o u t r o s

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Revista de conjuntura out/dez de 2005�0

A R T I G O

Cerca de R$ 46 bi devem entrar na economia com o pagamento do 13º salário

Cerca de R$ 46 bilhões de-verão ser injetados na economia brasileira até o final de 2005, com o pagamento do 13º salário. O montante, em torno de 2,4% do produto interno bruto (PIB) do País, inclui todos os trabalha-dores do mercado formal, inclu-sive os empregados domésticos, e beneficiários da Previdência Social. Aproximadamente 56,4 milhões de brasileiros devem ser beneficiados. A estimativa é do DIEESE – Departamento Inter-sindical de Estatística e Estudos Sócio-econômicos.

Pelos cálculos da Instituição, os R$ 45,9 bilhões devem ser pagos a 56.456.635 pessoas. Para chegar a esses números, foram utilizados dados da Relação Anu-al de Informações Sociais (Rais) e do Cadastro Geral de Emprega-dos e Desempregados (Caged), ambos do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), da PNAD 2003, do IBGE (Pesquisa Nacio-nal por Amostra de Domicílios)

e informações do Ministério da Previdência e Assistência So-cial. No caso da Rais, o DIEESE considerou todos os assalariados com carteira assinada, ocupados no mercado formal, nos setores público (celetistas ou estatutá-rios) e privado, que trabalhavam em dezembro de 2003. Como o MTE não divulgou ainda os dados da Rais referentes a 2004, para realizar esta estimativa, ao total de 2003 foi acrescido o sal-do do Caged de 2004. Da PNAD, foi utilizado o contingente de empregados domésticos com registro em carteira. Também foram considerados os beneficiá-rios – aposentados e pensionistas – que, em setembro de 2005, re-cebiam seus proventos do Institu-to Nacional de Seguridade Social (INSS).

Com relação aos valores, para a estimativa do montante a ser pago aos beneficiários do INSS foi utilizado o total refe-rente a setembro deste ano. Para

Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos sócio-econômicos - DIEEsE

os assalariados, o rendimento foi atualizado pela variação da massa salarial nominal média de janeiro a junho de 2004 e de janeiro a junho de 2005, apurada pela Pesquisa de Emprego e De-semprego (PED), realizada pelo DIEESE e a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade, de São Paulo), na Gran-de São Paulo, e em parceria com governos e instituições locais nas regiões metropolitanas de Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador e Recife e no Distrito Federal.

O cálculo não considera os autônomos e assalariados sem carteira, que, eventualmente, recebem algum tipo de abono de fim de ano, nem os valores envolvidos nesses abonos, uma vez que essa informação é difícil de ser mensurada. Ao mesmo tempo, considerou-se como se todas as pessoas estivessem ap-tas a receber o décimo-terceiro integralmente, ou seja, tivessem

Page 31: 24-revista

Revista de conjuntura out/dez de 2005�1

no mínimo um ano no mesmo emprego ou de aposentadoria.

Além disso, não é levado em consideração por este estu-do o adiantamento da primeira parcela do 13º salário ao longo do ano, concedido por muitas empresas quando os funcioná-rios tiram férias ou por defini-ção, por exemplo, de Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) ou Convenção Coletiva de Traba-lho (CCT), quando se trata de categoria profissional. Assim, os dados apresentados constituem uma projeção do montante que entra na economia ao longo do ano e não necessariamente nos dois últimos meses. Entretanto, estima-se que a maior parte, em torno de 70% do total dos valo-res referentes ao 13º, seja paga no final do ano.

Dos cerca de 56,4 milhões de brasileiros que devem ser bene-ficiados pelo pagamento do 13º salário, 23.655.307, ou 41,9% do total, referem-se a beneficiá-rios da Previdência Social, como aposentados ou pensionistas. Empregados formais corres-pondem a 31.068.203 ou 55,0% do total, e são contribuintes da

previdência. Os 3,1% restantes são empregados domésticos com carteira de trabalho assinada.

No que diz respeito ao mon-tante a ser pago a título de 13º, observa-se a seguinte distribui-ção: cerca de 24,6% dos R$ 45,9 bilhões – aproximadamente R$ 11,3 bilhões – serão pagos aos

beneficiários do INSS, R$ 33,9 bilhões, ou 74,0% do total, irão para os empregados formaliza-dos e, por fim, aos empregados domésticos serão destinados em torno de R$ 634,3 milhões, o que representa algo ao redor de 1,4% de todo o montante. (Ver Tabela 1.)

“Dos cerca de 56,4 milhões de

brasileiros que devem ser bene-

ficiados pelo pagamento do 13° salário,

23.655.307, ou 41,9% do total, referem-se

a beneficiários da Previdência Social,

como aposentados ou pensionistas.

Empregados formais correspondem

a 31.068.203 ou 55,0% do total, e são

contribuintes da previdência. Os 3,1%

restantes são empregados domésticos

com carteira de trabalho assinada”.

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Revista de conjuntura out/dez de 2005�2

O total de pessoas que rece-berá o 13º salário em 2005 não é necessariamente comparável com o de 2004, exceto no caso dos beneficiários do INSS (que cresceu cerca de 4,9%), devido ao fato de a Rais 2004 não estar disponível. O mesmo raciocínio pode ser aplicado ao montante do 13º. Ainda assim, estima-se que 2,625 milhões de pessoas (sem contar os empregados do-mésticos) passaram a receber o benefício, por terem requerido aposentadoria ou pensão, ou ain-da se terem incorporado ao mer-cado de trabalho ou formalizado o vínculo empregatício. Também é possível estimar que o volume

de dinheiro a ser injetado na economia é, nominalmente, cer-ca de 14% maior.

Distribuição por região

Assim como a estrutura eco-nômica, a estrutura salarial não foge à regra no tocante à distri-buição geográfica dos recursos do décimo-terceiro. A maior parcela dos R$ 45,9 bilhões – ou seja, 57,0% -- devem ficar nos Estados da região Sudeste, que concentra também a maior parte dos trabalhadores, aposentados e pensionistas e empregados domésticos. A região Sul ficará com 16,9% do total do bene-

fício; ao Nordeste, caberão 14,1%. Para as regiões Centro-Oeste e Norte irão, respectiva-mente, 8,0% e 3,9%.

O valor médio nacional a ser pago a título de décimo terceiro foi estimado em R$ 812,72. Em termos dos proventos da Previ-dência, o valor médio nacional a ser pago é de R$ 478,07. Os em-pregados do mercado formal re-ceberão em média R$ 1.092,44. Cada trabalhador doméstico com carteira assinada terá direito a um valor médio de R$ 366,00.

O maior valor médio para o 13º deve ser pago em Brasília - R$ 1.664,85 – e o menor, no Piauí - R$ 464,17.

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Revista de conjuntura out/dez de 2005��

“Apesar de os números não serem precisos, não resta

dúvida de que o pagamento do 13° salário representa

uma grande injeção de recursos adicionais na mão dos

consumidores, que podem, em boa parte, dirigir seus

gastos para o consumo de final de ano”.

Dados do Distrito Federal

O DIEESE calculou em cer-ca de R$ 1,88 bilhão o valor que deverá ser pago a 1.129.403 pessoas no Distrito Federal em dezembro de 2005. Desse total de pessoas, 254.655 referem-se a beneficiários da Previdência Social – como aposentados ou pensionistas. Outros 836.316 são empregados do mercado formal, incluídos aí servidores públicos estatutários e celetis-tas, segundo dados da relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Tra-

balho, e 38.432 são empregados domésticos (PNAD-2003).

Como esses dados não com-putam o mercado informal, onde muitos podem receber o 13º salário, abono ou descontar antecipações concedidas, esti-ma-se que mais de 70% do 13º é pago no final do ano.

Como exemplo, apresenta-mos alguns dados da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), realizada no DF, onde o setor privado sem carteira de trabalho assinada envolvia cerca de 91,3 mil pessoas em setem-bro de 2005, com rendimento

médio de R$ 625,00 em agosto de 2005. Apesar de esses traba-lhadores não serem registrados, muitos recebem o 13º salário. O mesmo ocorre com o emprego doméstico, onde boa parte das empregadas são mensalistas, não-formais, mas que recebem o 13º salário.

Apesar de os números não se-rem precisos, não resta dúvida de que o pagamento do 13º salário representa uma grande injeção de recursos adicionais na mão dos consumidores, que podem, em boa parte, dirigir seus gastos para o consumo de final de ano.

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Revista de conjuntura out/dez de 2005��

A importância da previdência social para as finanças públicas brasileiras é inquestionável: no ano de 2004, o gasto com benefícios do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e dos Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) estaduais e federal totalizou 10,9% do PIB brasileiro e suas necessidades de finan-ciamento somaram 4,2%. Neste contexto, é natural que a previ-dência exerça papel relevante no debate sobre a sustentabilidade fiscal do país.

Este texto tem o objetivo de identificar os fatores que influen-ciam o custo de um plano previ-denciário e sua sustentabilidade. Há razões relacionadas à demo-grafia, ao mercado de trabalho e

A R T I G O

A importância da previdência social para as finanças públicas brasileiras

marcelo Abi - Ramia Caetano *

ao próprio desenho do plano de previdência. Para melhor com-preensão dos argumentos que se colocarão na seqüência, será apresentado um modelo matemá-tico simplificado do equilíbrio financeiro de curto prazo da previdência. A generalização por meio da ampliação da abordagem para um âmbito de equilíbrio di-nâmico, e não estático, não altera as conclusões fundamentais ex-postas no modelo básico1.

A álgebra elementar da pre-vidência social no curto prazo.

Pode-se afirmar que um plano de previdência apresenta equilí-brio financeiro de curto de prazo quando o total arrecadado supera ou se iguala ao montante pago

de benefícios. Sintetiza-se a ora-ção anterior mediante a seguinte equação matemática 2:

tttt ABLW ≥τ (1)

Onde:=τ alíquota média de contribui-

ção previdenciária;=tW salário médio de contribui-ção para a previdência no intervalo de tempo t3;

=tL quantidade média de con-tribuintes da previdência no intervalo de tempo t4;=tB valor médio do benefício

da previdência no intervalo de tempo t;=tA quantidade total média de

beneficiários da previdência no intervalo de tempo t.

1 A equação de Zelenka generaliza a formulação matemática para um contexto de equilíbrio dinâmico e com força de generalidade para os diversos

regimes de financiamento. 2 Neste artigo, preferiu-se incluir o superávit na definição de equilíbrio. Essa definição mais ampla é compatível com sua finalidade de esboçar os

elementos determinantes da sustentabilidade da previdência. O único aspecto não contemplado pela equação diz respeito às formas de financia-mento. A bem da verdade, a equação (1) representa o equilíbrio para um regime financeiro de RS.

3 t pode ser um intervalo de tempo qualquer; o uso mais usual é anual, mas nada impede que represente períodos mensais, semanais, bimestrais etc.4 A noção de média para as variáveis de estoque quantidade de contribuintes e de beneficiários representa uma média ponderada pelo período em

que o indivíduo se apresentou como contribuinte ou beneficiário. Por exemplo, se o intervalo de tempo é anual, um individuo que contribui du-rante o ano todo tem exposição igual a um. Aqueles que contribuíram somente durante seis meses teriam fator de ponderação correspondente a ½, já as pessoas que fizeram apenas uma contribuição durante todo o ano seriam computadas na média com peso equivalente a 1/12.

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Novas interpretações surgem ao reescrever a equação (1).

t

t

t

t

L

A

B

W≥τ (2)

Onde:

t

t

W

B= Taxa de reposição do regi-me previdenciário;

t

t

L

A= Razão de dependência pre-videnciária.

De (2) se observam três deter-minantes da sustentabilidade de um plano de previdência: alíquo-tas cobradas, razão de dependên-cia previdenciária (RDP) e taxa de reposição (TR). Define-se a RDP como o quociente entre o total de beneficiários e o total de

desde já fazem jus à análise mais aprofundada.

A RDP como determinante da sustentabilidade.

Esta variável sofre influência de questões demográficas, de aspectos conjunturais e estrutu-rais do mercado de trabalho, tal como flutuações de curto prazo da taxa de desemprego e do au-mento da participação feminina no mercado laboral e, por fim, do próprio desenho do plano previ-denciário, mais especificamente, as condições de qualificação aos benefícios.

Os efeitos da dinâmica popu-lacional sobre a previdência já são bastante discutidos e claros. O aumento da razão de depen-dência (RD) demográfica dos idosos tende a aumentar a quo-ciente entre beneficiários e con-tribuintes, ou seja, a RDP, pelo simples fato que as pessoas usu-almente recebem seus benefícios quando mais velhas e são ativas em idades menores6. Os avanços da medicina e da saúde pública permitiram redução das taxas de mortalidade em idades avança-das o que eleva a expectativa de vida e por conseqüência o tempo de recebimento de benefício previdenciário. Por outro lado, a quantidade média de filhos por mulher se reduz ao longo das últimas décadas e traz como

contribuintes e a TR como o va-lor médio do benefício em dado intervalo de tempo dividido pelo salário médio de contribuição no mesmo intervalo de tempo5.

No contexto das equações (1) e (2) acima, os impactos das alíquotas de contribuição sobre a sustentabilidade previdenciária são bastante claros e simplistas. Maiores alíquotas de contribui-ção, dentro da perspectiva sim-plificada de (1) e (2), aumentarão o recolhimento para previdência e tornam o regime mais sustentá-vel. Abordagens mais amplas não devem circunscrever a análise da alíquota previdenciária a este aspecto. Há uma pletora de reper-cussões distributivas, alocativas e até mesmo com conseqüências negativas sobre a estabilização. Porém, as outras duas variáveis

“Os efeitos da dinâmica

populacional sobre a previdência já

são bastante discutidos e claros. O

aumento da razão de dependência

(RD) demográfica dos idosos tende

a aumentar a quociente entre

beneficiários e contribuintes”.

5 Há três definições distintas para taxa de reposição. Em comum, todas representam relação entre benefícios e salários de contribuição. Na definição presente neste TD, toma-se o ponto de vista da coletividade e se divide o beneficio médio recebido por um conjunto de indivíduos pelo salário médio de contribuição de outras pessoas. Noutros contextos a perspectiva é individual e pode assumir forma estática ou dinâmica. Na forma estática, compara-se o valor inicial do benefício com o salário final ou com os últimos salários. Numa configuração dinâmica, representa o quociente entre a soma de todos benefícios a receber e o total dos salários ao longo da vida.

6 Razão de dependência demográfica para idosos e razão de dependência previdenciária são conceitos distintos. O limite etário para que um indivíduo seja considerado como idoso não coincide com a idade em que o mesmo esteja apto à aposentadoria. Tampouco a pessoa em idade ativa é necessa-riamente contribuinte da previdência. Porém, a razão de dependência demográfica para idosos constitui um dos elementos chaves, em conjunto com mercado de trabalho e desenho do plano, para a determinação da razão de dependência demográfica.

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conseqüência de médio prazo a diminuição do número de poten-ciais contribuintes para o regime de previdência. As repercussões da dinâmica demográfica deste início de século sobre os países de renda alta e média vêm quase sempre na direção de incremen-to do custo previdenciário, sua intensidade que se caracteriza como fator diferencial.

O mercado de trabalho é o segundo fator determinante da RDP. Ao contrário da demo-grafia, que exerce influência de forma estrutural, a dinâmica do mercado laboral altera a razão de dependência tanto de uma pers-pectiva de curto prazo quanto de longo.

O desempenho conjuntural do emprego afeta diretamente o re-sultado previdenciário dado que a arrecadação se baseia primordial-mente em folha de pagamentos. A quantidade de contribuintes tende a diminuir em períodos recessivos em função da perda de dinamismo do mercado de trabalho. Entretanto, o número de beneficiários não se reduz em decorrência de uma recessão. Ninguém perde direito a um be-nefício já concedido porque a ati-vidade econômica arrefeceu. Ao contrário, desempregados que já completaram as condições para o recebimento de benefício podem requerê-lo de forma antecipada com o intuito de manutenção de renda7.

As alterações dinâmicas no mercado de trabalho também mo-dificam a RDP. Merece destaque

a maior inserção feminina com distintas repercussões intertem-porais. A curto prazo, a amplia-ção da cobertura previdenciária atenua a evolução da RDP. Há, nas primeiras décadas, aumento do número de contribuintes sem a respectiva elevação dos be-neficiários. À proporção que as primeiras mulheres que ingres-saram no mercado de trabalho envelhecem e se aposentam, a razão de dependência passa a assumir valor crescente e, em seu estado de maturidade, tor-na-se superior àquele de menor participação feminina no merca-do de trabalho. Isso ocorre por duas razões. Em primeiro lugar, as mulheres têm expectativa de vida superior a dos homens. Em segundo lugar, as regras vigentes permitem aposentadoria feminina com condições de elegibilidade

menos restritas que as masculi-nas. Em outras palavras, para o sistema previdenciário como um todo, aumenta-se o tempo médio de fruição de benefícios e se re-duz o de contribuição. Estes dois fatores elevam a razão de depen-dência previdenciária.

Revela-se o especial cuidado que a política previdenciária deve tomar no que toca ao tema ex-pansão de cobertura. Em muitas situações, a maior sustentabilida-de de curto prazo que se obtém pela queda da razão de depen-dência se contrabalança com o custo de longo prazo do aumento da relação entre beneficiários e contribuintes. Políticas previden-ciárias de curto horizonte tem-poral podem causar danos a sua sustentabilidade no longo prazo.

Por fim, o último elemento determinante da magnitude e

“A quantidade de contribuintes

tende a diminuir em períodos

recessivos em função da perda

de dinamismo do mercado

de trabalho. Entretanto, o

número de beneficiários não

se reduz em decorrência

de uma recessão”.

7 Natural que essa pessoa já tenha completado todas as condições de qualificação para pelo menos algum dos benefícios programados. No entan-to, caso não estivesse desempregada poderia optar por contribuir por mais tempo com o objetivo de ter maior valor inicial de benefício.

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Revista de conjuntura out/dez de 2005��

evolução da RDP é o desenho do plano previdenciário. Há uma influência direta e outra indireta. A primeira decorre das condições de habilitação aos benefícios. Regras mais restritas implicam, ceteris paribus, menor RDP que condições de qualificação mais suaves como a brasileira. Um plano hipotético que permitisse aposentadoria somente após o segurado completar 80 anos se-ria, por definição, sustentável, dadas as características demo-gráficas atuais. Por esse motivo que grande parte das reformas previdenciárias centram no item elegibilidade e buscam equilibrar o conflito entre sustentabilidade e alcance social da previdência.

A influência indireta surge em função dos incentivos que os regimes previdenciários e as-sistenciais colocam em relação à contribuição. Muitas vezes, a RDP apresenta valor superior à RD demográfica, o que indica que a cobertura dos regimes previdenciários para benefícios supera a da contribuição. O

Brasil exibe tal discrepância. Trabalhadores rurais são dispen-sados de contribuição efetiva para obtenção da aposentadoria. Necessitam somente de compro-vação de exercício de atividade rural. Por outro lado, o acesso a benefícios assistenciais também prescinde de contribuição prévia e gera incentivo a que pessoas de baixa renda busquem cobertura na assistência social, e não na previdência. Incentivo ampliado pelas altas alíquotas de contribui-ção previdenciária.

A história recente da previ-dência e assistência social bra-sileiras mostra ampliação de co-bertura para a população de baixa renda ao garantir benefícios sem exigência de contribuição passa-da. Parte deste aumento de custo se compensou pelas regras mais rígidas que se impuseram aos segmentos médios; em particular, o fator previdenciário. Criou-se a armadilha da credibilidade. Po-pulação de baixa renda não conta com maiores incentivos a con-tribuir porque sabe que receberá

seu benefício previdenciário ou assistencial mesmo assim. O de-sincentivo se repete nas camadas médias, porém por outro motivo: imaginam iminente alteração de regras previdenciárias que redu-zirão seus benefícios futuros ou que as farão postergar sua apo-sentadoria. A credibilidade é alta para quem não contribui e baixa para aqueles com maior potencial de contribuição. Há contexto favorável para alta cobertura no que tange aos benefícios e baixa no que se refere a contribuições.

A TR como determinante da sustentabilidade.

A TR, ou seja, a relação entre o valor médio do benefício e o salário médio de contribuição se determina pelo desenho do plano previdenciário; em particular, a fórmula de cálculo do benefício e as regras de indexação, assim como por condições de evolução salarial do universo de contri-buintes.

A fórmula de cálculo especifi-ca quanto o segurado receberá de aposentadoria, pensão ou auxílio quando fizer jus ao benefício. Há diversos tipos. No primeiro inexiste relação entre benefício a receber e histórico contribu-tivo ou salarial do segurado. Para benefícios assistenciais e aposentadorias rurais por idade, é comum o recebimento de valor equivalente a um salário mínimo ou uma proporção do mesmo8. No segundo tipo a fórmula é bastante simples, mas apresenta relação com salário ou contri-

“A história recente da previdência e assistência social brasileiras mostra ampliação de cobertura para a população

de baixa renda ao garantir benefícios sem exigência de

contribuição passada”.

8 Para o caso brasileiro, a Constituição de 1988 estabelece em seu art. 201, parágrafo 2o que nenhum beneficio terá valor mensal inferior ao salá-rio mínimo.

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buição. Para servidores públicos, ainda é possível, dadas as regras de transição, ter beneficio de va-lor idêntico ao último salário. Em outras circunstâncias, a fórmula de cálculo é mais complexa e se define em diversos passos: sele-ção dos salários de contribuição, indexação dos mesmos, determi-nação de limites máximos e mí-nimos de cada um dos salários de contribuição e, por fim, aplicação de fórmula específica sobre os salários de contribuição selecio-nados anteriormente9.

O primeiro passo consiste em selecionar as contribuições ou salários de contribuição uti-lizados. Para as aposentadorias por tempo de contribuição do RGPS e pela regra permanente do RPPS, separam-se todos os salários de contribuição de julho de 1994 até a data de requisição de benefício. Porém, há regra de transição para o RPPS onde se considera somente o último salá-rio. Alguns países levam em con-ta todo histórico contributivo do segurado, enquanto outros apenas os últimos anos. Diversos benefí-cios rurais não observam salário de contribuição algum, dado que o segurado receberá o salário mínimo. Neste último contexto, a previdência não busca repor renda que guarde algum tipo de relação com o histórico salarial do segurado.

Há um raciocínio básico para determinar a influência deste pri-meiro passo sobre a TR. Via de

regra, o salário de um indivíduo cresce ao longo do tempo, seja pelo crescimento da produtivi-dade laboral da economia como um todo, seja por mérito pessoal decorrente de sua maior expe-riência. Em outras palavras, os maiores salários concentram-se na fase final da vida ativa e os menores na inicial. Portanto, quanto mais longo o período de referência para a coleta dos salários de contribuição, maior será a quantidade de salários de contribuição de valor mais bai-xo. Espera-se, desta forma, que os regimes previdenciários cuja fórmula de cálculo de benefício contenha maior histórico salarial apresentem menor taxa de repo-

sição que os de curto histórico contributivo.

O segundo passo diz respeito a como se indexam as contribui-ções ou os salários de contribui-ção10. Neste aspecto, o tratamen-to dado à correção se distingue entre as situações onde a fórmula de cálculo leva em consideração os salários de contribuição ou simplesmente as contribuições. Em um primeiro momento se realizará análise dos desenhos de plano cujo benefício toma como base o salário de contribuição. Posteriormente, será feito exame análogo para as contribuições.

Como os salários de contri-buição podem remontar a déca-das passadas, faz-se necessário

“Espera-se, desta forma, que

os regimes previdenciários

cuja fórmula de cálculo

de benefício contenha

maior histórico salarial

apresentem menor taxa de

reposição que os de curto

histórico contributivo”.

9 Há desenhos de plano onde os valores de referência para a fórmula de cálculo do benefício são as contribuições vertidas, e não os salários de con-tribuição. Haverá notas explicativas quando as conseqüências sobre o regime de previdência se diferenciarem em função da seleção das contribui-ções ou dos salários de contribuição.

10 Há duas discussões distintas no que se refere ao tema da indexação em previdência. No presente parágrafo, atenção recai sobre indexação na fórmula de cálculo do benefício, ou o que também se chama de indexação antes da aposentadoria ou pensão. Outra perspectiva, que se verá mais adiante, relaciona-se à correção do valor benefício quando já em recebimento ou à indexação após a concessão da aposentadoria ou pensão.

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o uso de mecanismos que per-mitam sua correção para valores dos dias atuais. Há duas alterna-tivas básicas de indexação: pela inflação de preços ou de salários. Os objetivos de cada uma delas são distintos, assim como seu impacto para a TR. A indexação dos salários de contribuição pela inflação de preços objetiva atu-alizá-los de forma a preservar seu valor real. Considera-se na fórmula de cálculo do benefício o salário de contribuição do pas-sado com o poder de compra dos dias de hoje. A segunda opção de indexar à inflação de salários tem o propósito de manter a relação entre o salário de contribuição e o salário médio do mercado de

trabalho. Neste caso, a fórmula de cálculo busca repor o poder de compra do indivíduo em relação à média da sociedade. Se o sa-lário médio cresceu ao longo do tempo, o benefício refletiria tal evolução, e não apenas reporia a mesma cesta de consumo de tem-pos pretéritos. Como um exem-plo, pela indexação de preços, se no passado um segurado recebia o equivalente a duas cestas de bens, seu salário de contribuição atualizado terá o valor das duas cestas de bens. Pela indexação pelos salários, se a média da re-muneração fosse de quatro cestas no passado; então, o segurado recebia metade do salário médio. Por esse mecanismo, se hoje o

salário médio perfaz seis ces-tas, seu salário de contribuição atualizado corresponderia a três cestas, ou seja, metade da remu-neração média atual. Em resumo, a alternativa de correção pela inflação de preços torna o bene-fício compatível com o poder de compra absoluto dos salários de contribuição passados, enquanto a indexação pela inflação de salá-rios se propõe a repor o poder de compra relativo à média salarial.

Formas alternativas de in-dexação dos salários de contri-buição seriam a correção pelo salário mínimo ou por uma média ponderada entre inflação de preços e de salários. Mesmo sub ou superindexação são mate-maticamente factíveis ainda que não tragam em si algum objetivo explícito de política previdenci-ária11. De todo jeito, o desenho de plano mais comum realiza indexação plena pela inflação de preços ou de salários.

A TR não é neutra à regra de indexação antes da concessão do benefício. Correção pela infla-ção de salários tende no longo prazo a ser mais custosa que por preços. Isso porque se observam ganhos reais de salário em séries de tempo médias e longas. Em outras palavras, em grande parte dos casos, os benefícios concedi-dos com base na indexação de sa-lários tendem a ser superiores em comparação aos indexados pela inflação de preços. Constitui ten-dência, mas não regra inexorável. A depender das circunstâncias, o impacto sobre a TR pode ser o

“A indexação dos salários de

contribuição pela inflação de

preços objetiva atualizá-los de

forma a preservar seu valor

real. Considera-se na fórmula

de cálculo do benefício o

salário de contribuição do

passado com o poder de

compra dos dias de hoje”.

11 Natural que haja algum objetivo por detrás destas distintas formas de correção. Usualmente, a subindexação escamoteia objetivo fiscal de redu-ção de valor de benefícios, enquanto a superindexação beneficiaria grupos de interesse com força política ou com densidade eleitoral.

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oposto, caso, por exemplo, a so-ciedade sofra um longo período de queda de salários reais.

Nos planos previdenciários cuja fórmula de cálculo toma por base as contribuições, e não os salários de contribuição, a discussão acerca da indexação é mais ampla. É preciso definir o indexador do ganho real das contribuições vertidas, e não somente a correção de seu valor para o momento atual. Esses planos, no que toca este aspecto em particular, buscam inspiração nos planos de CD. A cada perí-odo, aportam-se contribuições que recebem rendimentos. Algo parecido com as aplicações finan-ceiras. Toda discussão acerca da indexação pela inflação de preços ou de salários se repete; porém, merece destaque o indexador relativo ao ganho real das con-tribuições passadas. Há diversas opções. Um primeiro tipo seria um ganho real fixo pré-determi-nado; por exemplo, seis por cento ao ano. As alternativas se referem a índices pós-fixados: taxa de juros de mercado, PIB real, PIB per capita, massa salarial, salário médio etc.

O reflexo que os indexadores terão sobre a TR dependerá do comportamento dos fatores de correção ao longo do tempo. Por exemplo, em países com histó-rico de taxa de juros superior à taxa de crescimento do PIB, a indexação por rentabilidade das aplicações financeiras torna o

valor da TR superior à indexação por evolução do produto. Se, por outro lado, a indexação se dá por PIB per capta, o impacto sobre a TR em sociedades com declínio populacional é distinto daquelas que apresentam crescimento de-mográfico.

O terceiro passo presente nas fórmulas de cálculo de benefício mais complexas refere-se à impo-sição de valores máximos e mí-nimos das contribuições ou dos salários de contribuição12. Para este aspecto, não há diferença de análise entre os planos que to-

mam como base as contribuições daqueles que utilizam os salários de contribuição. Com objetivo de tornar a apresentação mais sim-ples e curta, serão esboçados ape-nas os casos com uso dos salários de contribuição.

A fórmula mais simples des-considera qualquer limite, seja máximo ou mínimo. No entanto, a política previdenciária intencio-na não somente que o benefício de aposentadoria ou pensão re-ponham renda em nível similar àquela que se recebia em vida ativa. Muitas vezes, a política

12 Não se deve confundir a discussão deste item com a imposição de tetos para um pilar básico. Toda argumentação centra-se no uso deste ins-trumento para a fórmula de cálculo do benefício. Nesse contexto, a contribuição ou o salário de contribuição são valores já efetivamente reco-lhidos e conhecidos. O que se discute é se a fórmula de cálculo do benefício deveria considerar seus valores na integralidade ou impor tetos e pisos para os mesmos no momento do cômputo da fórmula de cálculo. Por exemplo, ainda que o salário de contribuição de um indivíduo no passado tenha sido 1.000 U.M., discute-se se o valor considerado deveria ser inferior ou superior as 1.000 U.M.

“Toda discussão acerca

da indexação pela

inflação de preços ou

de salários se repete;

porém, merece destaque

o indexador relativo

ao ganho real das

contribuições Passadas”.

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previdenciária também é uma política de redistribuição. O caso brasileiro apresenta tal conjunção de fatores onde se busca conco-mitantemente distribuição e que o benefício guarde semelhanças com a renda média auferida em vida ativa. Trabalhadores que recebem acima do teto do RGPS recolhem contribuições limitadas ao mesmo; porém, não há teto para contribuição patronal. Em outras palavras, os segurados de renda mais alta contribuem além dos salários de contribuição que se utilizarão no cálculo de seus benefícios. Por outro lado, um trabalhador rural que sequer contribui, terá aposentadoria por idade de um salário mínimo.

Em resumo, a imposição de li-mites aos salários de contribuição

depende dos objetivos da política previdenciária. Caso se inten-cione somente estreitar vínculo entre o benefício e o histórico contributivo, não há razão para o estabelecimento de tetos. Caso se pretenda que a previdência também contenha elementos re-distributivos, um caminho seria a imposição de valor máximo para o salário de contribuição para as camadas de renda elevada e de um mínimo para os segmentos de menor participação na renda na-cional. Os mais afluentes contri-buiriam com salários superiores aos considerados na fórmula de cálculo, ao contrário do ocorrido com os mais pobres.

O quarto e último passo da fórmula de cálculo se refere à função matemática que se aplica-

rá aos salários de contribuição ou às contribuições descritas nas três etapas anteriores. Há diferenças entre o uso dos salários de contri-buição ou de contribuições. Pri-meiro se apresentarão fórmulas de cálculo que tomam como base os salários de contribuição.

A função mais simples se-ria a seleção de uma estatística de momento das informações selecionadas sobre o salário de contribuição: média, mediana ou moda, por exemplo. A média é o exemplo mais comum. Casos menos triviais tomam a média de parte dos salários de contribuição selecionados, e.g. os oitenta por cento maiores, e não de toda a seleção.

As fórmulas mais sofisticadas introduzem elementos distributi-vos ou incentivam a postergação da aposentadoria. O método mais comum para inclusão de aspectos distributivos se realiza pela diferenciação de taxas de reposição por faixas de renda. Por exemplo, para os segurados que tiveram média de salários de contribuição até dois salários mínimos se reporia integralmente o salário de contribuição médio. Para aqueles com salário de con-tribuição médio superior a dois salários mínimos, haveria taxa de reposição de setenta por cento, a título de exemplo, sobre a parcela da média que excedesse ao limiar de dois salários mínimos. Como regra geral, esta fórmula de cál-culo apresenta taxas de reposição decrescentes com a renda. Seu objetivo é reduzir o encargo so-bre as contas públicas dos bene-fícios de maior valor e, simulta-neamente, favorecer os segurados com menor poder aquisitivo.

“Os segurados de renda mais

alta contribuem além dos

salários de contribuição que

se utilizarão no cálculo de

seus benefícios. Por outro

lado, um trabalhador rural

que sequer contribui, terá

aposentadoria por idade de

um salário mínimo”.

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Conciliam-se objetivos fiscais com distributivos.

Em outras circunstâncias, a fórmula de cálculo tem por finalidade o adiamento da apo-sentadoria. Quanto mais tarde um segurado se aposenta, maior será seu benefício. Dois exemplos merecem destaque. Em primeiro lugar, pode-se estabelecer uma penalização de percentual deter-minado por ano de antecipação. A Emenda Constitucional (EC) 41, por exemplo, reduz em 5%, ou a depender do caso 3,5%, o valor do benefício por ano de antecipação. Em segundo lugar, tal como ocorre com o fator pre-videnciário, a própria fórmula de cálculo cria taxa de reposição crescente com a idade e tempo de contribuição do segurado. Em outras palavras, TR e RDP são variáveis dependentes porque há regimes de previdência que definem sua fórmula de cálculo como forma de induzir a prote-lação da aposentadoria e, a partir daí, reduzir a RDP.

O quarto passo assume ca-racterísticas distintas quando as contribuições, e não os salários de contribuição, são os valores tomados como base para o cál-culo do benefício. Após sua cor-reção pela inflação de preços ou salários acrescida de um indexa-dor específico para o ganho real, obtém-se o montante acumulado pelo segurado, seja de forma efetiva ou escritural. A questão seguinte resume-se à conversão do montante acumulado em ren-da permanente. Diversas alter-nativas existem. A primeira seria considerar o plano CD na fase acumulação para se transformar em BD na fase de recebimento.

Várias hipóteses e métodos são possíveis para transformar o montante acumulado em benefí-cio definido. Uma segunda opção seria manter o plano CD na fase de recebimento.

Os parágrafos anteriores de-monstraram que a fórmula de cálculo do beneficio é uma das características do desenho do plano previdenciário que contém abundância de detalhes. Cuidado especial deve tomar a política previdenciária para definição da TR que mantenha a sustentabili-dade do regime de previdência. Regra geral, a maior benevo-lência da fórmula de cálculo do benefício implica maiores TR. Novamente, não há TR ideal, trata-se de uma questão de polí-

tica previdenciária. Um regime previdenciário sustentável, mas que não forneça aposentadorias condignas aos segurados é tão indesejável, do ponto de vista social, quanto outro magnânimo, porém insustentável.

O segundo elemento que determina a TR é a regra de in-dexação após a concessão dos benefícios, isto é, como e em que freqüência se corrigirão os bene-fícios. Há duas alternativas bá-sicas, indexação pela inflação de preços ou de salários, e um outro conjunto que promove super ou subindexação. Também apresenta relevância a periodicidade do reajuste.

A fundamentação conceitual para opção por indexação pela

“Um regime previdenciário

sustentável, mas que não

forneça aposentadorias

condignas aos segurados

é tão indesejável, do ponto

de vista social, quanto

outro magnânimo, porém

insustentável”.

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inflação de preços ou de salários é a mesma exposta anteriormen-te. O princípio da correção pela inflação de preços se sustenta na idéia que o poder de compra do benefício previdenciário deve se manter constante ao longo de seu período de recebimento. Por sua vez, a indexação pela variação dos salários toma como base a perspectiva que o valor do bene-fício deve se manter compatível com a evolução da renda dos trabalhadores na ativa.

Há alternativas de indexação que fogem do padrão tradicional. O RGPS adota dois tipos dis-tintos de indexação a depender do valor do benefício. Como o piso previdenciário é o salário mínimo, há um conjunto de be-nefícios indexados por este. Para os demais, cujo valor supera o piso, a indexação se dá pela infla-

ção de preços. Nos anos em que o salário mínimo recebe ganhos reais, o benefício previdenciário médio é sobreindexado à inflação de preços, porém, apenas um conjunto de beneficiários recebeu ganho real, o outro somente re-pôs a perda de poder compra pro-vocada pelo aumento de preços.

Tal perfil de reajustes tem duas implicações. A primeira reflete a complexidade da política previdenciária com o confronto entre objetivos distributivos e de estabilização. Parte daqueles que vêem a previdência como poten-cial distribuidora de renda tende a tomar postura favorável à so-breindexação do piso previdenci-ário pois favoreceria, a princípio, as pessoas mais necessitadas. Por sua vez, os que dão maior peso à estabilização macroeconômica assumem postura contrária à vin-

culação do piso previdenciário ao salário mínimo em função de sua pressão sobre a despesa do RGPS. Nenhuma das partes está totalmente correta ou errada. Seu posicionamento revela apenas suas prioridades e preferências. A segunda implicação mostra que há arranjos institucionais que mesclam as políticas de pre-vidência com as de mercado de trabalho. Há custos e benefícios desta opção. Como benefício esperado, os segurados se bene-ficiariam de políticas de mercado de trabalho. A indexação do piso previdenciário ao salário mínimo e a correção de benefícios de funcionários públicos inativos pelo mesmo percentual dos sa-lários dos servidores ativos são dois exemplos por garantirem aos aposentados e pensionistas os ganhos auferidos no mercado de trabalho. O custo esperado desta decisão é que avanços no mercado de trabalho podem não ocorrer em função dos seus custos sobre a previdência. Por exemplo, servidores ativos po-dem deixar de receber aumento em decorrência do impacto da elevação de seus salários sobre a folha de inativos.

Importante lembrar que o fim da alta inflação no Brasil a partir de meados dos anos 90 destruiu um dos mecanismos de ajuste rá-pido a desequilíbrios estruturais da previdência: a subindexação de benefícios em um contexto de hiperinflação. Em conjuntura de inflação mensal superior a dois dígitos, uma simples correção de benefícios com valores abaixo da inflação por poucos meses reduz substancialmente a TR e compensa eventuais elevações na RDP. Com o fim da alta in-

“O fim da alta inflação no

Brasil a partir de meados

dos anos 90 destruiu um

dos mecanismos de ajuste

rápido a desequilíbrios

estruturais da previdência: a

subindexação de benefícios

em um contexto de

hiperinflação”.

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flação, o ajuste pela TR é longo. Propõem-se novas fórmulas de cálculo de benefícios que alteram o valor somente dos benefícios a conceder, e não dos já concedi-dos, em decorrência dos direitos adquiridos. De modo análogo, a procrastinação do reajuste dos benefícios por longos períodos é de difícil execução política. Não é à toa que as reformas previden-ciárias brasileiras aconteceram justamente após o término da alta inflação.

De toda a discussão acima, percebe-se que a dinâmica da TR não é neutra às regras de indexa-ção. Das duas formas clássicas de reajuste de benefícios, se pela variação de preços ou de salários médios, a segunda fornece maior rigidez à TR porque garante ao benefício médio a mesma cor-reção do salário médio, ou seja, numerador e denominador da TR variam praticamente na mesma proporção e, portanto, dificulta-se o ajuste do regime previdenci-ário a desequilíbrios de natureza fiscal. A indexação por preços permite redução da TR em mo-mentos de ganhos salariais e proporciona à previdência maior sustentabilidade em períodos de crescimento econômico. Como, em conseqüência do aumento da produtividade do trabalho, espera-se que os salários reais apresentem ganhos ao longo do tempo, a indexação por preços tende a gerar TR inferior à in-dexação por salários. Portanto, fornece maior sustentabilidade à previdência.

As indexações alternativas se-guem uma regra básica para a di-nâmica da TR. Quanto maior for o reajuste dos benefícios, maior será a TR. Do ponto de vista da

estabilização, menos sustentável fica o regime. Da perspectiva da distribuição, mais se favorecem os beneficiários com maior cus-to para o restante da sociedade que paga suas aposentadorias e pensões. O reajuste resultante dependerá das regras jurídicas, das restrições de natureza fiscal e do equilíbrio de forças entre os diversos segmentos político-sociais.

A periodicidade do reajuste, assim como a regra de indexação, também exerce influência sobre a dinâmica da TR. O valor médio do benefício anual é função cres-cente da freqüência de reajustes. Por exemplo, os aposentados teriam maior valor real médio de benefício caso fossem reajusta-dos todos os meses, e não uma vez por ano. Uma conjuntura de alta inflação exacerba esses efeitos. Reajustes trimestrais com

taxas de inflação superiores a dois dígitos reduzem mais forte-mente o salário real médio anual que reajustes mensais, ou seja, a subindexação e a diminuição da freqüência de reajustes permi-tiam o veloz declínio da TR. Ou-tro estratagema eliminado pelo controle inflacionário. Conclui-se que o ajuste da sustentabilidade previdenciária pela TR com pre-ços estáveis é mais demorado e sofisticado.

O terceiro fator a determinar o comportamento intertemporal da TR são as condições do mercado de trabalho; em particular, a evo-lução do salário médio ao longo do ciclo econômico, o cresci-mento de longo prazo da produ-tividade do trabalho e os ganhos salariais por antiguidade.

Em relação ao comportamen-to de curto prazo do mercado de

“De modo análogo, a

procrastinação do reajuste dos

benefícios por longos períodos

é de difícil execução política.

Não é à toa que as reformas

previdenciárias brasileiras

aconteceram justamente após o

término da alta inflação”.

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trabalho, a TR sofre influência da ciclicidade do salário em contextos de indexação de be-nefícios pela inflação de preços, enquanto apresenta neutralidade quando se verificam reajustes pela inflação de salários. Quando se corrigem as aposentadorias e pensões pela variação de salários, a TR se mostra neutra à inflação salarial porque ganhos ou perdas ocorridas no salário real médio se repassarão aos benefícios e tornam a TR invariante a flutua-ções salariais ao longo do ciclo econômico. Em outras palavras, numerador e denominador da TR variam na mesma proporção o que a mantém constante. Por sua vez, TR e variação salarial têm correlação negativa com indexa-ção de benefícios à inflação de preços. Os ganhos ou perdas re-ais de salário não se transmitem aos benefícios de modo que em períodos de ganhos salariais a TR cai, enquanto aumenta nas fases de perda.

Um fator estrutural do mer-cado de trabalho com potencial efeitos sobre a TR é a evolução de longo prazo da produtividade do trabalho. Novamente, o com-

portamento da TR depende das regras de indexação. Para inde-xação pela inflação de salários, há neutralidade e maior rigidez; para correção dos benefícios pela variação de preços, a TR se mostra de maior variabilidade e flexibilidade. As razões são idên-ticas àquelas apresentadas no pa-rágrafo anterior. Com indexação por salários, ganhos salariais por produtividade se repassam aos benefícios e, portanto, numerador e denominador da TR variam na mesma proporção. Ao contrário, a indexação pela inflação de preços não propaga os ganhos salariais aos benefícios, o que ocasiona correlação negativa entre pro-dutividade e TR, ou seja, quanto maior a produtividade, menor será a TR. Em resumo, a indexa-ção pela inflação de preços retira a rigidez da TR tanto conjuntural quanto estruturalmente; porém, torna a sustentabilidade da previ-

dência mais sensível ao compor-tamento macroeconômico.

O último aspecto do mercado de trabalho a influenciar a TR é o crescimento salarial por mérito ou antiguidade. Há dois motores para evolução salarial: em primei-ro lugar, o salário do trabalhador cresce porque há elevação da produtividade como um todo e, em segundo lugar, há incrementos salariais com o tempo devido a sua maior experiência, os ganhos por mérito ou antiguidade. Obser-va-se que o ganho meritocrático tem caráter individual, portanto, sua influência sobre a TR se dá por meio da fórmula de cálculo do benefício. Em sociedades onde a evolução salarial por mé-rito é mais acentuada, as fórmulas de cálculo que compreendem um maior período contributivo implicam menores TR, ao se con-siderar salários menores para o cômputo do benefício.

* marcelo Abi-Ramia CaetanoEconomista e Técnico de Planejamento e Pesquisa do IPEA

A assinatura do economista Humberto V. Richter, em seu artigo “O Mercado de Trabalho para o Economista”, apareceu incorreta na edição Nº 23 da Revista de Conjuntura. Retificando – Richter é economista e conselheiro do CORECON-DF.

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