23417599 Verbetes Do Diccionario de Bolso Do Almanaque Philosophico Zero a Esquerda de Paulo Arantes

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Diccionario de Bolso do Almanaque Philosophico Zero à Esquerda Fascículo de Natal Ano II da Era FHC PAULO ARANTES especial para a Folha ''Fenum habet in cornu.'' Horácio, ''Sátiras'', I, 4, 33 Filósofo - Antes de tudo, um Funcionário da Humanidade (v. Funcionário). Definição atribuída a Edmund Husserl pelo renomado pedagogo Dr. Aristarco Argolo de Ramos. O corporativista Platão achava que a filosofia era uma carreira de Estado. Funcionário - De um ponto de vista lógico (v. ''From a logical point of view''), ora Empregado (''Bedeutung'', referência), ora Mordomo (''Sinn'', sentido). Exemplo: "Há uns dois anos, meu jovem empregado (agora ele se diz funcionário), logo que chegou da Bahia, fazia muito frio, saí com ele para comprar um agasalho". J.A. Giannotti, Folha, 19/11/95. Contra-exemplo: "Pois imaginei ter um criado só pra mim. Achava gostoso esses pedaços de cinema: o dono vai saindo, vem o criado com chapéu e bengala na mão, 'Prudêncio, hoje não bóio em casa, querendo sair pode. Té logo' ". Mário de Andrade, "Os Contos de Belazarte". O Patriarca e o Bacharel - "O Professor Giannotti é um filósofo que finge detestar o capitalismo." Antonio Carlos Magalhães (v. ACM), "Os Pecados do Filósofo", Folha, 13/9/95. Exemplo: "Meus dois lindos netos, Alexandre e Tiago, estão em Orlando fazendo o aprendizado de meninos ricos. E eles são muito ricos. Seus quartos competem com qualquer loja de brinquedos de São Paulo. Eles não possuem apenas um exemplar do último boneco importado, fazem questão de ter todas as modalidades da série. O fluxo de novidades é tão grande, que minha casa vai se tornando o depósito dos brinquedos rejeitados. Eles brincam com brinquedos novos como as mulheres de sociedade tratam de não repetir vestidos de festa. No último telefonema lhes perguntei: 'De que estão mais gostando?', e a resposta veio unânime: 'Compramos um monte de brinquedos novos'. (...) Tudo parece indicar assim que o mundo contemporâneo do consumo deixou de produzir idiotas robotizados". J.A. Giannotti, Folha, 19/11/95. Sacadura Cabral e Gago Coutinho - "O universo do consumo está passando por um processo de diversificação de tal modo inesperado e fantástico, que destrói por completo todos os prognósticos a respeito de sua função e de seu papel alienador (...). Ao invés da homogeneização ocorre uma diversificação capaz de servir a todos os gostos (...). As casas se tornam discotecas, videotecas, acervos de cultura para todos os gostos (...). O menino mais pobre da periferia de São Paulo sabe perfeitamente que roupa vestir, que música quer ouvir, a que programa assistir (...). A favelada pobre não quer apenas leite para seus filhos, mas também danoninhos." J.A. Giannotti, Folha, 19/11/95. "Não acredito na estandardização (...). Não acredito nisso

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Diccionario de Bolso do Almanaque Philosophico Zero à EsquerdaFascículo de NatalAno II da Era FHCPAULO ARANTESespecial para a Folha''Fenum habet in cornu.'' Horácio, ''Sátiras'', I, 4, 33Filósofo - Antes de tudo, um Funcionário da Humanidade (v. Funcionário).Definição atribuída a Edmund Husserl pelo renomado pedagogo Dr. AristarcoArgolo de Ramos. O corporativista Platão achava que a filosofia era umacarreira de Estado.

Funcionário - De um ponto de vista lógico (v. ''From a logical point ofview''), ora Empregado (''Bedeutung'', referência), ora Mordomo (''Sinn'',sentido). Exemplo: "Há uns dois anos, meu jovem empregado (agora ele se dizfuncionário), logo que chegou da Bahia, fazia muito frio, saí com ele paracomprar um agasalho". J.A. Giannotti, Folha, 19/11/95. Contra-exemplo: "Poisimaginei ter um criado só pra mim. Achava gostoso esses pedaços de cinema: odono vai saindo, vem o criado com chapéu e bengala na mão, 'Prudêncio, hojenão bóio em casa, querendo sair pode. Té logo' ". Mário de Andrade, "OsContos de Belazarte".

O Patriarca e o Bacharel - "O Professor Giannotti é um filósofo que fingedetestar o capitalismo." Antonio Carlos Magalhães (v. ACM), "Os Pecados doFilósofo", Folha, 13/9/95. Exemplo: "Meus dois lindos netos, Alexandre eTiago, estão em Orlando fazendo o aprendizado de meninos ricos. E eles sãomuito ricos. Seus quartos competem com qualquer loja de brinquedos de SãoPaulo. Eles não possuem apenas um exemplar do último boneco importado, fazemquestão de ter todas as modalidades da série. O fluxo de novidades é tãogrande, que minha casa vai se tornando o depósito dos brinquedos rejeitados.Eles brincam com brinquedos novos como as mulheres de sociedade tratam denão repetir vestidos de festa. No último telefonema lhes perguntei: 'De queestão mais gostando?', e a resposta veio unânime: 'Compramos um monte debrinquedos novos'. (...) Tudo parece indicar assim que o mundo contemporâneodo consumo deixou de produzir idiotas robotizados". J.A. Giannotti, Folha,19/11/95.

Sacadura Cabral e Gago Coutinho - "O universo do consumo está passando porum processo de diversificação de tal modo inesperado e fantástico, quedestrói por completo todos os prognósticos a respeito de sua função e de seupapel alienador (...). Ao invés da homogeneização ocorre uma diversificaçãocapaz de servir a todos os gostos (...). As casas se tornam discotecas,videotecas, acervos de cultura para todos os gostos (...). O menino maispobre da periferia de São Paulo sabe perfeitamente que roupa vestir, quemúsica quer ouvir, a que programa assistir (...). A favelada pobre não querapenas leite para seus filhos, mas também danoninhos." J.A. Giannotti,Folha, 19/11/95. "Não acredito na estandardização (...). Não acredito nisso

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(...). Esse pessimismo não se sustenta, a não ser como visão subjetiva(...). Você se lembra que todo mundo imaginava que, por causa da comunicaçãode massa, haveria estandardização. Mas considere a televisão. Veja o númerode canais que você pode escolher. Portanto ocorre justamente o contrário."Fernando Henrique Cardoso, em entrevista ao Mais!, Folha, 13/10/96.

Bem estar na civilização - "Realmente acho que esse tipo de avaliação dacultura contemporânea é uma espécie de acesso romântico. Não é isso? Assim:estou com 'malaise' (imita alguém com 'malaise', mal-estar). Não existe basepara um pensamento desse tipo. Alguns intelectuais ficam em casa, com'malaise' (faz uma voz de pessoa babona, imita alguém meio desfalecido).Eles olham para o mundo e dizem: 'Ah! o mundo está indo para o diabo. Vamospara a rua, minha gente!'±" (v. "Militante imaginário"). Fernando HenriqueCardoso, em entrevista ao Mais!, Folha, 13/10/96.

"Militante imaginário" - Militante privado. Quase não sai de casa, salvopara ir a uma pizzaria (v. Pizzaria; Mirex - Militante realmente existente).

Pizzaria - Nome grego original da academia fundada por Platão. Indivíduosque não separam estética de política costumam se agrupar em pizzarias.Formam então minorias aguerridas (v. praga).

praga - V. Sarna.

Militante realmente existente (Mirex) - Lobista de si próprio. Aceita ajustepré-datado (v. Ajuste). Vítima inocente de um processo mal-intencionado (v.Processo de intenção), também conhecido como dialética do engajamento:"Pensando melhor, veremos que a intelectualidade nunca esteve tão engajada.Rara mesmo, em nossos dias, é a torre de marfim. Acredito aliás que acrítica independente, sem patrocinador nem interesse direto à vista, é o quemais está nos fazendo falta. Quase todos estamos empenhados, suponhamos, naadministração pública, nalgum partido, num departamento da universidade,numa firma de pesquisa, num sindicato, numa associação de profissionaisliberais, num setor de relações públicas, numa redação de jornal etc., com oobjetivo nem sempre muito crível de usar os nossos conhecimentos em favor dealguma espécie de aperfeiçoamento e modernização. Assim, um dos impulsosessenciais à idéia de engajamento, que mandava trazer a cultura ditadesinteressada ao comércio dos interesses comuns, se realizou plenamente. Oque não ocorreu foi a esperada diferença democrática que esta descida àterra faria. Na falta dela, o compromisso social dos especialistas, incluídaaí a dose normal de progressismo, é o mesmo que ir tocando o serviço, e acombatividade do engajamento pode ter algo de um lobby de si próprio".Roberto Schwarz, "Nunca fomos tão engajados", Folha, 26/6/94.

A ética protestante e o espírito do capitalismo - ''Que o presidente daRepública (dr. Fernando Affonso Collor de Mello _v. Collor) venha a público,

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como chefe de Estado, clamar pela moralidade pública, ao mesmo tempo quetrata de defender seus interesses particulares, tudo isso está nas regras dojogo (v. La règle du jeu). Ninguém é movido por interesses universais e nãose pode pedir aos políticos que abdiquem do esforço pessoal de buscar opoder (Nota: ''Não se pode honestamente atribuir à índole original de umhomem o que é puro efeito de relações sociais''. Machado de Assis,''Memórias Póstumas de Brás Cubas'', cap. ''O Verdadeiro Cotrim''.) (...) Amulher de César não basta ser honesta; e, se cometer alguma falta, mais valemanter as aparências do que se confessar em público. Acontece que essasaparências são institucionalizadas, formam o arcabouço jurídico, o sistemade regras que invoca a idéia de justiça (...). Daí a regra política de quetodo político que for pilhado (v. Pilhar) agindo em interesse próprio deveser punido. Isto vale para Beria ou para aquele assessor do prefeito Kochque, pilhado (v. Pilhar) por corrupção, suicida-se diante das câmeras de TVpara salvar o chefe (v. O tipo ideal dos Grupos de Alto Nível) (...) Em vezdo discurso moralista (v. ''Moralista politicante''), cabe aceitar que ospolíticos agem por interesse privado (v. Escolher a audácia na finitude),mas como só o podem fazer em nome do bem comum, que ele calcule (sic) seusriscos de ser pilhado (v. Pilhar) em público (v. Sistema e mundo de vida)toda vez que atuar exclusivamente em nome de seu bem particular (...). Dessemodo, constitui-se uma moralidade pública que comporta a infração nos seusinterstícios (v. ''Infração intersticial'').'' J.A. Giannotti, Folha, 7/6/92(v. Corrupção).

A ética do capitalismo e o espírito protestante - ''Ainda tem quem recuseque é preciso fazer política, não se prender apenas aos princípios éticos.Frequentemente se ouve gente dizendo: Ah! Não ponho as minhas mãos nisso.(...) Mas são setores que ainda recusam a política, se refugiam. É umaregressão.'' Fernando Henrique Cardoso, Mais!, Folha, 13/10/96.

Jacobinistas (sic) xiitas - Gente sem noção de país (v. Gente com noção depaís). Exemplo: ''Derrubada a monarquia pela Revolução Francesa, aAssembléia Nacional Constituinte, dominada por jacobinistas (sic) xiitas,sem noção de país, ameaçava naufragar''. Luís Nassif, Folha, 16/11/96 (v.''Mirabô de Mello e outros estudos sobre a Revolução Francesa'').

Gente com noção de país - Exemplo: ''Mas o que você quer, rapaz? Se ocapitalismo for pro buraco, o Brasil vai junto. Se não, podemos tomar umacarona''. Chico Alvim, Poeta dos Outros (v. Contradição performativa;Partido Intelectual, ala esclarecida (majoritária) e ajustada).

''Deu a Lógica no Ajuste'' - ''Mas o presidente não é corrupto, tem uma putanoção de país e conhece como ninguém a dinâmica do capitalismo'' (GrandeOtelo). ''Então tudo bem'' (Oscarito).

Corrupção - Há corrupção de dois tipos. Tipo B, inferior: corrupção

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atrasada, segundo o paradigma desenvolvimentista da produção. Tipo A,superior: dita de acumulação flexível, que se exprime na formagramaticalmente correta do conflito de valores (v. La règle du jeu).

La règle du jeu - ''É preciso saber conviver com a infração contra valoresalheios para que tenhamos política.'' J.A. Giannotti, Folha, 7/6/92. (v.Wanderley Luxemburgo, ''Contravenção ou Revolução'').

Collor - 1) Mudou a agenda (v. Agenda). ''Os passos iniciais do governoobedeciam a uma fria determinação, prejudicada, é verdade, por auxiliaresmedíocres a quem se confiaram tarefas claramente acima de suaspossibilidades (Nota: falha técnica sanada pela introdução de ministroséticos na máquina _v. Ministro ético, Minet). Mas era tão clara a lógicaque, bastaram alguns meses de governo Collor, para uma realidade política eeconômica que se arrastava há anos (v. Era Vargas; Geisel) ficarirremediavelmente velha da noite para o dia, obrigando a uma reformulação emtodo pensamento nacional (v. O que é pensar).'' Luís Nassif, Folha, 7/6/94;2) Pilhado (v. Pilhar) executando manobra radical (v. Manobra radical); 3)Introduziu o discurso filosófico da modernidade no Brasil. ''Vou prestigiaros deputados que estão comigo. Com a bandeira da modernidade, vouprestigiá-los nas suas bases, para que tenham a certeza de que 35 milhões devotos não foram em vão.'' Discurso de 2/9/92 na abertura do Colóquio ''AÉtica na Ética'', Folha, 4/9/92, págs. 1-5; 4) Inventor do Ministério Ético(v. Ministro ético, Minet). Forma de governo baseada na Ética do Discurso.Caracteriza-se por fechar-se estrategicamente em copas nos momentos deturbulência. Efeito paradoxal justamente enaltecido pelos bons observadoresda cena brasileira (cf. ''O silêncio dos inteligentes'', Folha, 20/9/92,págs. 6-3). Sem similar no Primeiro Mundo, este jogo político de linguagemnão-verbal foi exportado com sucesso para a Itália; 5) Quando se preparavapara, num segundo mandato, remodelar e retificar o país pela adoção deformas mais contemporâneas de vida e organização social, foi atropelado peloarcaísmo moral (v. Moralista politicante) herdado do período anterior (v.Era Vargas). Nas palavras do então ministro para questões de Ética nasFinanças, S. Exa. estava sendo vítima da contemporaneidade dos não-coetâneos(v. ''Ungleichzeitigkeit''), característica estrutural típica de umasociedade como a nossa, que ''se adiantou bastante, se industrializou, seurbanizou, mas não apresentou até agora o mesmo impulso (v. ''Empuxeindividual'') na construção de uma cultura ética consentânea com as reformasorientadas para a modernidade''. Marcílio Marques Moreira, ''Dialética eDualidade na Experiência Cultural Brasileira'', palestra de encerramento docolóquio ''A Ética na Ética'', Folha, 26/9/92; 6) Na hora grave e solene daAbdicação, deixou Carta Testamento, na verdade um fragmento de Discursorecolhido e divulgado em primeira mão pelo correspondente do ''FrankfurterAllgemeine Zeitung'', em matéria de 10/1/93: ''Minha gente! Minha gente comnoção de país e dinheiro vivo! Não me deixem só! Pátria e capital, latejo emvós! Mercê de Deus, nenhum de nós três irá para o buraco!'', ''Ein

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Hõllensturtz der Neuzeit'' (''Um mergulho da modernidade no quinto dosinfernos'') (v. Gente com noção de país; contradição performativa). (Nota:vive atualmente em Miami, onde acaba de publicar, pelo MIT, ''The Net andthe Self'', um estudo em que recolhe sua experiência pessoal _v.''Erinnerung''_ sobre o novo paradigma epistêmico _v. ''Linguistic Turn''_,que sua têmpera colossal _v. Collosso informe_ ajudou a forjar e agora, comjustiça, está levando à pia batismal sob o nome de ''global criminaleconomy''.)

Ministro ético (Minet) - Militante realmente existente em estado de graça(v. Mirex).

Ministros éticos entre si - Três Ministros Éticos (v. Ministro Ético, Minet)conversando sobre Kant no elevador privativo de Fernando Affonso Collor deMello, A Coisa-em-si (v. Sujeito automático; Collosso informe).

Manobra radical - Termo técnico do surfe. Operação coreográfica de altorisco. Em caso de redundância, morte certa na praia. Exemplo: ''Antes detudo, a esquerda deixou de compreender que a excelência da jogada deFernando Henrique Cardoso consistia em fazer um desvio pela direita,cortando-a ao meio, para, aglutinando o centro, lançar o jogo político (v.La règle du jeu) brasileiro em outro patamar (v. Patamar)''. J.A. Giannotti,''O Estado de S. Paulo'', 11/10/96.

Era Vargas - Modo de produção asiático. Vigorou durante meio século noBrasil. Com o início da Era FHC, o país pôde enfim retomar o processo deocidentalização interrompido em 1930.

Cartas sobre a Educação Estética da Humanidade - ''Tieta vai fazer sucessolá fora, aquelas paisagens, a Sônia Braga e as outras atrizes estão ótimas.Poderia ser um terço mais curto.'' Fernando Henrique Cardoso, em entrevistaao Mais!, Folha, 13/10/96. ''Durante séculos a humanidade preparou-se paraVictor Mature e Mickey Rooney.'' T.W. Adorno.

O conteúdo normativo da Modernidade - ''Eu me sinto à vontade para executaro programa de centro-esquerda, social-democrata, que é o horizonte doGoverno Collor''. Sérgio Paulo Rouanet, Folha, 19/7/92.

O testamento socrático de Hannah Arendt - ''Sirvo a República ao participardo Governo Collor, pois tenho a convicção de que seu projeto de reconstruçãoe modernização do país, dentro do respeito às leis, às liberdades e àsgarantias individuais é o que nos levará tanto ao desenvolvimento e àjustiça social, quanto à plena consolidação das instituições democráticas.''Celso Lafer, Folha, 19/7/92.

"Maluco dedutivista" - Qualquer indivíduo que chegar à conclusão insana de

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que o capitalismo não tem mais nada a oferecer à humanidade (v. Militanteimaginário). Sujeito mal intencionado (v. Processo de intenção).

Revolução Copernicana - 1) "o desenvolvimento econômico é o outro nome doaumento da produtividade" (Kant); 2) "comércio que por mar se faz, marítimose lhe o chama" (Farias Brito).

Cultura da culpa 1 - Calúnia e difamação contra os ricos, maquinadas porsolertes militantes imaginários (v. Militantes imaginários) mancomunados (v.Mancomunados) com malucos dedutivistas (v. "Malucos dedutivistas") emoralistas politicantes (v. "Moralistas politicantes"). Estudos recentesencomendados pela Área Externa do Banco Central demonstraram que a situaçãomiserável de grande parte da população brasileira se deve à baixíssimaprodutividade dos pobres, cabendo logicamente (v. Lógica) a maior parte darenda nacional aos setores cujos indicadores de produtividade atestam aracionalidade econômica do empuxe individual (v. "Empuxe individual") deseus integrantes com melhor inserção na utopia possível. Idéia antecipada emartigo pioneiro pelo real autor do conceito: "Está definitivamente superadaa 'cultura da culpa' (...) como se houvesse uma relação de causa e efeitoentre a riqueza de uns e a pobreza de outros". Folha, 25/10/92. Daí oaxioma: "Os pobres são os principais inimigos de si mesmos", destinado aconhecer um glorioso futuro científico.

Cultura da culpa 2 - "Eu não sou daquela turma que considera que nós somosapenas vítimas dos países que se deram bem. Não. Acho que nós somos um povoque não conseguiu criar uma nação saudável, robusta e afirmada. Eu não queropôr a culpa nos outros por inveja, porque eles se desenvolveram bem. Não. Euadoro os americanos, os EUA. Admiro muito. Mas acho que nós somos diferentese podemos fazer uma coisa melhor do que os americanos fizeram." CaetanoVeloso, Folha, 7/10/94.

O mundo sem culpa - "Eu ontem, lá onde eu estava, assisti um filme sobre oCaetano Veloso _e ao falar do Caetano, eu falo de todo o mundo cultural, dosque me prestigiaram votando em mim, e dos que não votaram, mas que eu devoprestigiá-los, se aqui posso. O prestígio deles, às vezes, é muito maior doque o meu, e que o Caetano afinal dizia coisas bastante tocantes, dizendoque ele sentia, embora fosse ele pessoalmente cético como pessoa, que eleachava que o Brasil tinha algo importante a oferecer como diferença nomundo. Diferença não quer dizer antagonismo, quer dizer peculiaridade, coisaprópria. Nós temos um jeito próprio." Fernando Henrique Cardoso, Folha,7/10/94.

Vitória do realismo - "A pergunta não é retórica: o que é, o que significauma cultura nacional que já não articula nenhum projeto coletivo de vidamaterial, e que tenha passado a flutuar publicitariamente no mercado por suavez, agora como casca vistosa, como um estilo de vida simpático a consumir

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entre outros? Essa estetização consumista das aspirações à comunidadenacional não deixa de ser um índice da nova situação também da... estética.Enfim, o capitalismo continua empilhando vitórias." Roberto Schwarz, "Fim deséculo", Folha, 4/12/94.

Metacrítica da Razão Instrumental - ''A cegueira que se atribui aocapitalismo me parece ter raízes mais profundas. O capitalismo é apenas aface exposta do triunfo da razão instrumental que está na essência damodernidade (...). Não é à toa que temos grandes dificuldades em definir opapel do Estado. Como fazê-lo, se a grande vítima da razão iluminista foi acompaixão e o espírito comunitário?'' ''A Bolha Financeira e o PênduloAcaciano'', co-edição Matrix/Opportunity.

Welforstate - Estado de Compromisso (v. Era Vargas). Em extinção na Europa.Em estado de euforia no Brasil.

Sociedade transparente - Um mito, denunciar (v. Paris, anos 70). Exemplo:''A nova postura implica abandonar velhos conhecidos. Em primeiro lugar, aidéia, tão cara às esquerdas, de que se pode reformar a sociedade de cabo arabo''. J.A. Giannotti, ''O Estado de S. Paulo'', 2/11/96 (v. De cabo arabo).

De cabo a rabo - Diz-se da espiral ascendente de um tête-à-tête de gigantes,como a polêmica Alencar-Nabuco. Exemplo: ''De rabo para o leitor'', J.A.Giannotti, Folha, 5/3/96; ''De rabo para o poder'', Otavio Frias Filho,Folha, 7/3/96 (v. Ricos entre si).

Ricos entre si - A Cena Primitiva do Ajuste. Costuma ser representada ora àscostas, ora na cara, mas sempre às custas do elo mais fraco. Exemplo: ''Eque discussão pode haver agora que o antigo professor (Giannotti), outroraensaísta independente e crítico, atribui-se papel de papagaio de pirata docandidato a Fujimori local? (...) Um intelectual que apóia o governo,qualquer governo, virou propagandista, acólito, bajulador, tudo menosintelectual (...) Quanto a Giannotti, que encene a 'trabalheira' do novocargo, agora que está confirmado no posto que realmente sempre almejou, o deChalaça de Sua Majestade, o presidente perpétuo do Brasil''. Otavio FriasFilho, Folha, 7/3/96. ''O que importa salientar na resposta que a Folha deS. Paulo (sic) me deu é que toda ela visou anular minha legitimidade comointelectual (v. Processo de intenção), como se eu não passasse de um sabujodo poder. Não estou pretendendo, ao citar esse caso antigo, reviverpolêmicas e ressentimentos já superados, mas tão só salientar a continuidadena forma da crítica. No fundo (v. Forma) não é a mesma coisa que me fazPaulo Arantes?'' J.A. Giannotti, ''O Estado de S. Paulo'', 2/11/96. (Nota: Osaudoso Vicente Matheus enviou na ocasião carta ao ''Painel do Leitor'',explicando ao filósofo que ''papagaio de pirata'', ''Fujimori local'',''acólito'', ''bajulador'', ''chalaça'' e assemelhados deveriam ser

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entendidos num sentido eminentemente figurado.)

Amálgama - Método lógico-jurídico aperfeiçoado pelo promotor Vischinski nosprocessos de Moscou. Exemplo: ''Mas para que rigor (v. ''Uma certa tendênciaao insulto''), quando o interesse é desqualificar o meu ou qualquer trabalhofilosófico, na base de processos de intenção? (v. Síndrome dedeslegitimação; neo-parvenu). Valem o esquema abstrato e a intuiçãoprofunda, apresentados numa simples conversa, em que o autor, como seestivesse numa pizzaria, dialoga com suas próprias imagens no espelho (...).O exemplo mais teratológico, entretanto, vem de Ruy de Fausto, cuja mania hámais de 30 anos consiste em me acusar de ter plagiado suas idéias''. J.A.Giannotti, ''A beca chifruda'' (siiic!), ''O Estado de S. Paulo'', 2/11/96.

Dez mil metros acima do Brasil - ''No avião leio uma entrevista com RuyFausto (v. Ruy Fausto), imensa, na Folha, descrito como marxista insigne.Deve ser um bom sujeito. Depois de dar 'n' voltas em cima do muro, Faustoaconselha a companheiros marxistas de São Paulo a não aceitar empregos nogoverno Fernando Henrique. Sabe o que está pedindo? Que um brasileiro recuseconvite a cargo público? Fausto cita um certo Arantes, em que dá leve puxãode orelhas, por ter caído em tentação de ser funcionário público. É outromarxista ilustre.'' Paulo Francis, ''O Estado de S. Paulo'', 17/10/96 (v. Umcerto Arantes).

Um certo Arantes - 1) Reducionista da Escola Mecanicista. Frequentou osmaiores espíritos do seu tempo. Completamente ultrapassado e decadente. Omesmo autor que nos deu quando jovem um Hegel promissor, não se peja hoje depublicar um livro de diálogos no qual se transcreve até uma ida ao banheiro.''Silêncio no Butantã'', chegou a pedir um pró-reitor sinceramenteconsternado. (''O Estado de S. Paulo'', 23/11/96). Vive atualmente depizzaria em pizzaria (v. Pizzaria); 2) ''O Paulo Francis da filosofiabrasileira'' (Giannotti) (v. Dez mil metros acima do Brasil); 3) ''Pior queACM'' (Giannotti) (v. Ricos entre si); 4) Autor deste modesto ''baedeker''do Ajuste Intelectual.

Painel do LeitorBuemba! Buemba! - ''Querem anular a minha legitimidade.'' (Tucano Simão, SãoPaulo, SP)

Bicho solto - ''A dialética está solta nas ruas.'' (Coronel Erasmo Dias, SãoPaulo, SP)

Minidialética, sim senhor! - ''Total impaciência do conceito. A dialética dabrecha e do buraco ainda não está resolvida. De qualquer forma, dando buracoou brecha, alguém entrará pelo cano.'' (Ferdinando Fernandes, Rancharia, GO)

Almanaque Zero à Esquerda ou Almanaque FSP? - ''Constato com desprezo que o

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rancor está de volta. Recaída insidiosa desta Folha em sua antiga linhaeditorial, niilista, antropofágica, cínica? Confio firmemente que não. Numpaís bem ajustado, o jornalismo de deslize não tem vez. No que depender demim, continuará sendo apenas uma estrelinha no céu. Pelo que vejo,horrorizado, os caçadores de tropeços agora são outros. (...) Comete odicionarista anão _só pode ser de bolso a infeliz obra de um pigmeu_ umduplo e mortal erro, de lógica e de classe. Não é novidade: à esquerda,chafurdar no bas-fond das pequenas causas é prática sistemática e trivial;enquanto, do nosso lado, o cochilo pode até ser homérico (''et pourcause''), mas será sempre um deslize da própria Razão, fatigada de tantodeblaterar com os encalacrados de um exercício histórico findo. (...)Acresce que os desvios dos seres racionáveis só parecem tais ao olharsubalterno dos catões. (...) Em boa lógica, vale menos a pureza sublime daimarcescível regra, que a ninguém é dado seguir, do que o erro na suacarnação ebúrnea. (...) Só o deslize apresenta o mundo e solda a rede socialpressuposta. (...) O ajuste veio nos humanizar.'' (Brigadeiro E. GomesFreire de Andrade, idealizador da Esquadrilhada Fumaça, São Paulo, SP)