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  • HISTRIA DA ARTE NO BRASIL

    textos de sntese

    Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira Sonia Gomes Pereira

    Angela Ancora da Luz

    Rio de Janeiro

    E d itora U F R J

  • U N IV E R SID A D E FED ER A L D O RIO D E JA N EIR O

    ReitorCarlos Antnio Levi da Conceio

    Vice-reitor Antnio Jos Ledo Alves da Cunha

    Coordenador do Frum de Cincia e Cultura Carlos Bernardo Vainer

    EDITORA UFRJ

    Diretor Michel Misse

    Diretora Adjunta Fernanda Ribeiro

    Conselho Editorial Eduardo Viveiros de Castro

    Heloisa Buarque de Hollanda Norma Crtes Renato Lessa Roberto Lent

  • Copyright 2006 Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira,Sonia Gomes Pereira e Angela Ancora da Luz

    Ficha Catalogrfica elaborada pela Diviso de Processamento Tcnico - SIBI/UFRJ

    Oliveira, Myriam Andrade Ribeiro de.

    S255 Histria da arte no Brasil: textos de sntese / Myriam Andrade Ribeiro deOliveira, Sonia Gomes Pereira e Angela Ancora da Luz. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 3. ed., 2013.

    264 p.; 14x21 cm (Srie Didticos).

    ISBN 978-85-7108-382-0

    I. Arte Brasil Histria. 2. Arte brasileira. I. Pereira, Sonia Gomes.II. Luz, Angela Ancora. III. Ttulo. IV. Srie.

    CDD: 338.09

    1. ed. 20062. ed. 20083. ed. 2013

    Equipe editorial

    Edio de texto Arnaldo MarquesRevisoCeclia Moreira Sonja CavalcantiNormalizao bibliogrfica Andressa Rodrigues (estagiria)Capa e projeto grfico Giovani Borher

    Janise DuarteEditorao eletrnica Marisa ArajoUniversidade Federal do Rio de Janeiro Frum de Cincia e Cultura Editora UFRJ Av. Pasteur, 250CEP: 22290-902 - Praia Vermelha Rio de Janeiro, RJTel./Fax: (21) 2542-7646 e 2541-7946 Livrarias Editora UFRJ: (21) 2295-4095 http: //www. editora, ufrj. br

    t Fundao Universitria Jos Bonifcio

  • Sumrio

    Lista de figuras e pranchas 7

    Apresentao 13

    I Arte no Brasil nos sculos XVI, XVII e XVIII

    Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira

    7 Arte no Brasil no sculo X IX e incio do X X

    Sonia Gomes Pereira

    4 Arte no Brasil no sculo X X 111

    Angela Ancora da Luz

    Pranchas 2 07

    Sobre as autoras 25 7

  • Lista de figuras e pranchas

    Figuras

    Figura 1 Antiga "Casa de Cmara e Cadeia", atual Prefeitura de Mariana, Minas Gerais 22

    Figura 2 Capela de So Loureno dos Indios, Niteri 25

    Figura 3 Colgio jesuta de Salvador, atual Catedral Metropolitana 26

    Figura 4 Convento franciscano de Santo Antonio, em Joo Pessoa, Paraba 27

    Figura 5 Igreja de Nossa Senhora da Glria do Outeiro, no Rio de Janeiro 30

    Figura 6 Igreja de So Pedro dos Clrigos, no Rio de Janeiro. Arquivo do Iphan 31

    Figura 7 Igreja de Nossa Senhora do Rosrio, em Ouro Preto, Minas Gerais 32

    Figura 8 Igreja da Ordem Terceira do Carmo, no Rio de Janeiro 34

    Figura 9 Capela da Ordem Terceira do Carmo, em Recife, Pernambuco 36

    Figura 10 Igreja da Ordem Terceira do Carmo, em Ouro Preto, Minas Gerais 38

    Figura 11 Desenho do Aleijadinho para a fachada da Igreja de So Francisco, em

    So Joo Del Rei, Minas Gerais

    39

    Figura 12 Tipologia dos retbulos luso-brasileiros 41

    Figura 13 Retbulo da capela-mor e arco-cruzeiro da Igreja da Penitncia, no Rio de Janeiro

    43

    Figura 14 Pintura do forro da nave da Igreja de So Domingos, em Salvador, Bahia,

    executada por Jos Joaquim da Rocha

    45

    Figura 15 Capela do Noviciado da Ordem Terceira do Carmo, no Rio de Janeiro.

    Rococ carioca

    48

    Figura 16 Convento de Nossa Senhora das Neves, em Olinda, Pernambuco.

    Rococ pernambucano

    50

    Figura 17 Santurio do Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, Minas Gerais,

    aspecto interno. Rococ mineiro

    52

  • IH I S T R I A D A A R T E N O B R A S I L

    Figura 18 Senhor da coluna, por Manoel Incio da Costa. Museu de Arte Sacra 58de Salvador, Bahia

    Figura 19 Cristo do Passo da Agonia no Jardim das Oliveiras, por Antonio Francisco Lisboa, 60o Aleijadinho, em Congonhas, Minas Gerais

    Figura 20 Santurio e adro dos Profetas, em Congonhas, Minas Gerais 61

    Figura 21 Grandjean de Montigny. Projeto da Academia Imperial de Belas Artes. 70Litografia s/d. Fonte: Jean-Baptiste Debret. Voyage pictoresque et

    historique au Brsil. Paris: Firmin Didot Frres, 1834-1839, v. I, p. 467

    Figura 22 Nicolas-Antoine Taunay, 1816. Morro de Santo Antonio. leo sobre tela, 7245 x 56,5 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    Figura 23 Jean-Baptiste Debret, 1817. Desembarque da imperatriz Leopoldina. 75

    leo sobre tela, 44,5 x 69,5 cm (Coleo MNBA/bram/MinC)

    Figura 24 Simplcio Rodrigues de S, 1825. Retrato de Antnio Lus Pereira da Cunha, mar- 76

    qus de Inhambupe. leo sobre tela, 198 x 131 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    Figura 25 Fazenda de Santa Genoveva. Municpio de Rio das Flores, estado do 78Rio de Janeiro, 1844

    Figura 26 Vtor Meireles, 1879. Batalha dos Guararapes. leo sobre tela, 495 x 923 cm 84

    (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    Figura 27 Francisco Chaves Pinheiro, 1872. Alegoria ao Imprio Brasileiro. Terracota 87(escultura realizada para ser passada para o bronze, em tamanho trs vezes

    maior que o atual), 192 x 75 x 31 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    Figura 28 Jos Maria Jacinto Rabelo. Palcio Itamaraty. Rio de Janeiro, 1851/1855 88

    Figura 29 Jos Ferraz de Almeida Jnior, 1895. Recado difcil. leo sobre tela, 139 x 79 cm 95(Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    Figura 30 Eliseu Visconti, 1898. Giovent. leo sobre tela, 65 x 49 cm (Coleo MNBA/ 98Ibram/MinC)

    Figura 31 Francisco de Oliveira Passos. Teatro Municipal. Rio de Janeiro, 1905/1909 104

    Figura 32 Lasar Segall, 1920. Interior de indigentes. leo sobre tela, 85 x 70 cm (Masp) 114

    Figura 33 Vicente do Rego Monteiro, 1923. Flagelao. leo sobre tela, 80 x 90 cm 118(Coleo particular da Senhora Fernand Rousseau, Paris)

    Figura 34 Tarsila do Amaral, 1924. E.F.C.B. leo sobre tela, 142 x 126,8 cm (MAC-USP) 120

    Figura 35 Oswaldo Goeldi, 1930. Amanhecer na praia. Xilogravura, 11,7 x 12 cm (IEB-USP) 123

    Figura 36 Ismael Nery, s/d. Composio cubista. Guache sobre papel, 24 x 18 cm 124(Petite Galerie, Rio de Janeiro)

    Figura 37 Bruno Giorgi, 1953. So Jorge. Bronze, 126,3 x 100,4 x 46,9 cm (MAC-USP) 127

    Figura 38 Livio Abramo, 1935. Meninas de fbrica. Xilogravura, 14,3 x 18,2 cm (MAC-USP) 129

  • L I S T A D E F I G U R A S E P R A N C H A S

    9

    Figura 39 Portinari, 1947. Espantalho no arrozal. leo sobre tela, 60 x 73 cm (Coleo particular do senhor Mem Xavier da Silveira, Rio de Janeiro)

    136

    Figura 40 Ivan Serpa, 1951. Formas. leo sobre tela, 97 x 130,2 cm (MAC-USP) 143

    Figura 41 Geraldo de Barros, 1979. Objeto forma. Esmalte, 80 x 80 cm (Coleo particular) 145

    Figura 42 Lygia Clark, 1961. Bicho caranguejo. Alumnio (Pinacoteca do Estado, So Paulo) 146

    Figura 43 Franz Weissmann, 1958. Torre. Ferro, 140 x 55 x 55 cm (MNBA, Rio de Janeiro) 151

    Figura 44 Amlcar de Castro, 1972. Cavalo. Ferro soldado, 80 x 36 x 73 cm

    (Pinacoteca do Estado, So Paulo)

    153

    Figura 45 Irmos Roberto, 1936. Prdio da Associao Brasileira de Imprensa (ABI),

    Rio de Janeiro

    155

    Figura 46 Lcio Costa e equipe, 1936-1945. Ministrio da Educao e Sade, Rio de Janeiro 156

    Figura 47 Oscar Niemeyer, 1970. Catedral de Braslia, Braslia, Distrito Federal 158

    Figura 48 Iber Camargo, 1960. Conjunto de carretis. gua-tinta, 30 x 49,9 cm (MAC-USP) 162

    Figura 49 Farnese de Andrade, 1978. Mquina 5. Madeira, 100 x 52 x 15 cm

    (Coleo particular, Rio de Janeiro)

    164

    Figura 50 Carlos Vergara, 1969.0 bero esplndido. Instalao (Galeria Art Art, So Paulo) 168

    Figura 51 Carlos Zlio, 1967. Viso total. Duratex, papier mach, plstico e tinta vinlica, 86 x 72 cm (Coleo Gilberto Chateaubriand, Rio de Janeiro)

    174

    Figura 52 Antonio Manuel, 1975. Visualizao brasileira. Flan (Coleo particular,

    Rio de Janeiro)

    176

    Figura 53 Mira Schendel, 1973. Sem ttulo. Letraset e letra acrlica, 63,8 x 42,2 cm (Coleo particular, So Paulo)

    182

    Figura 54 Maurcio Salgueiro, 1965. Urbis II. Ferro, solda, som e luz; 118 x 80 x 75 cm

    (Coleo particular)

    185

    Figura 55 Jorge Duarte, 2003.0 casamento do sculo X X - d'aprs Picasso e Duchamp.

    Objeto (Coleo Anna Maria Niemeyer)

    201

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    10

    Pranchas

    Prancha 1 Vista de Ouro Preto, em Minas Gerais, com o pico do Itacolomi 209

    Prancha 2 Claustro do Convento de So Francisco, em Salvador, Bahia 211

    Prancha 3 Capela da Ordem Terceira de So Francisco, em Recife, Pernambuco 213

    Prancha 4 Capela-mor da Igreja de So Francisco de Assis, em Ouro Preto, Minas Gerais 215

    Prancha 5 Frei Agostinho da Piedade. Nosso Senhora de Montesserrate. Barro cozido policromado. Museu de Arte Sacra de Salvador, Bahia

    217

    Prancha 6 Antnio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. Passo da Cmz-s-costas ou Caminho

    do Calvrio. Madeira policromada.w Congonhas, Minas Gerais219

    Prancha 7 Pedro Amrico, 1882. A carioca. leo sobre tela, 205 x 134 cm

    (Coleo MNBA/Ibram/MinC)221

    Prancha 8 Hiplito Caron, 1884. Praia da Boa Viagem. leo sobre tela, 50 x 75 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    223

    Prancha 9 Giovanni Battista Castagneto, c.1898. Trecho da Praia de So Roque em Poque-

    t. leo sobre madeira, 32 x 40 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)225

    Prancha 10 Belmiro de Almeida, 1887. Arrufos. leo sobre tela, 89 x 116 cm

    (Coleo MNBA/Ibram/MinC)227

    Prancha 11 Rodolfo Amoedo, 1883. Ateli do artista em Paris. Aquarela sobre carto, 57 x 77 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    229

    Prancha 12 Rodolfo Chambelland, 1913. Baile fantasia. leo sobre tela, 149 x 209 cm

    (Coleo MNBA/Ibram/MinC)231

    Prancha 13 Anita Malfatti, 1915.0 farol. leo sobre tela, 46 x 61 cm (Coleo Gilberto Chateaubriand, Rio de Janeiro)

    233

    Prancha 14 Cndido Portinari, 1935. O caf. leo sobre tela, 131 x 197 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    235

    Prancha 15 Alberto Guignard, 1940. Lea e Maura. leo sobre tela, 104 x 85 cm

    Coleo MNBA/Ibram/MinC)237

    Prancha 16 Carlos Scliar, 1955. Sesta. Linoleogravura e pochoir, 42 x 62 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    239

    Prancha 17 Hlio Oiticica, 1964. Parangol, Capa 1 - Nildo da Mangueira.

    Reproduo de Andras Valentin (www.urbanismo.niter0i.rj.gov.br)

    241

    Prancha 18 Antonio Bandeira, 1953. A grande cidade iluminada. leo sobre tela, 72,4 x 91,4 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    243

    Prancha 19 Anna Letycia Quadros, 1965. Caracol. Gravura ponta-seca, relevo, 44 x 38 cm (Acervo da artista)

    245

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    11

    Prancha 20 Antonio Dias, 1966. A histria errada. Guache e nanquim sobre papel, 26 x 36 cm (Coleo Gilberto Chateaubriand)

    247

    Prancha 21 Rubens Gerchman, 1967. La tlvision. Tcnica mista sobre aglomerado,

    122 x 160 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    249

    Prancha 22 Nelson Leirner, 2001. Futebol. Plstico, gesso, cermica, madeira e papel, 110 x 300 x 200 cm (http://mocoloco.com/art/archives/nelson_leirner_apr_05.jpg)

    251

    Prancha 23 Maurcio Bentes, s/d. Cavalo de luz. Madeira, papel, cera, resina, ferro e luz

    fluorescente, 240 x 500 x 70 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    253

    Prancha 24 Oscar Niemeyer, 1991-1996. Museu de Arte Contempornea, Niteri, RJ. (vww.urbanismo.niter0i.rj.gov.br)

    255

  • Apresentao

    A carncia de manuais que sintetizem, em linguagem acessvel e didtica, as principais manifestaes da histria da arquitetura e das artes visuais no Brasil para uso em cursos de graduao de nossas universidades um problema com o qual se defrontam continuamente os professores da rea.

    Acrescente-se ainda que nem todas as bibliotecas possuem em seu acervo obras de referncia geral, como a H istria da arte no Brasil (1983), organizada por Walter Zanini, ou a. Arte no Brasil, da Editora Abril Cultural (1976), h longo tempo esgotadas.

    Acreditamos que os ensaios de referncia reunidos neste livro vm preencher em parte esta lacuna, colocando disposio dosestudantes e do pblico interessado em geral textos de sntese que focalizam os principais aspectos da arquitetura e das artes visuais produzidas no Brasil dos sculos XVI ao XX, acompanhados de bibliografia atualizada para cada perodo.

    Suas autoras so professoras da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no Departamento de Histria e Teoria da Arte, onde ministram disciplinas na graduao e na ps-graduao, relativas aos perodos aqui apresentados.

    Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira

  • Captulo 1

    ARTE NO BRASIL NOS SCULOS

    XVI, XVII E XVIII

    Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira

    Um simples olhar no atual mapa poltico da Amrica do Sul revela, de imediato, uma consequncia importante dos dois diferentes sistemas de colonizao - o espanhol e o portugus - que integraram este vasto continente cultura europeia ocidental. Enquanto as regies colonizadas pelos espanhis fragmentam-se em uma srie de pases e culturas nacionais autnomas, repetindo de certa forma a situao poltica da Espanha na poca da conquista, aquelas colonizadas pelos portugueses constituem um bloco compacto, sem sub-divises polticas, abrangendo quase metade do lado oriental do continente.

    Neste bloco oriental, ao oposto dos espanhis nas regies andinas, os colonizadores portugueses no encontraram culturas artsticas avanadas, com tradies sedimentadas de arquitetura e estaturia de pedra e mo de obra adestrada, que pudessem ser utilizadas eficazmente pelos novos donos da terra. Da, sem dvida, o cunho mais europeu e acentuadamente portugus da arquitetura construda no Brasil nos sculos XVI, XVII e XVIII, comparativamente de seus vizinhos latino-americanos. O que no significa, em absoluto, falta de originalidade ou de individualidade prpria, nas expresses culturais e artsticas da nova sociedade, formada em um outro hemisfrio, com clima e paisagem completamente distintos da Europa e incorporando etnias amerndias e africanas. E importante acrescentar que, frequentemente,

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    16essas criaes artsticas coloniais superam em vigor e qualidade

    a arte metropolitana do perodo, chegando mesmo a elaborar autonomamente tipologias no desenvolvidas ou de escassa re

    percusso em Portugal, como, por exemplo, as plantas curvi

    lneas e as verses rococs de pinturas ilusionistas de tetos de igrejas, que do um aspecto to peculiar arquitetura da regio de M inas Gerais.

    Por outro lado, na vastido territorial da colnia brasileira, a

    diversificao dos ciclos econmicos e as vicissitudes do processo poltico e social foram, aos poucos, determinando aspectos dife

    renciados na produo cultural e artstica das reas territoriais mais diretamente atingidas pelo sistema colonizador. Nos sculos XVI

    e XVII, foram as regies da Bahia e de Pernambuco, no Nordeste, desenvolvidas graas produo intensiva do acar, que consti

    turam os principais focos de interesse da Coroa portuguesa.

    Nelas se situa, em consequncia, a maioria dos monumentos significativos que se conservam deste perodo - tanto nas reas

    urbanas de Salvador, Recife, Olinda e de outras cidades da faixa litornea quanto nas zonas rurais ocupadas pelos antigos engenhos de produo aucareira.

    N o sculo XVIII, um novo ciclo econmicoo da minerao do ouro e dos diamantesdesloca para regies do interior a ateno

    dos colonizadores portugueses, at ento concentrados nas reas li

    torneas como caranguejos a arranhar as costas , no dizer de um cronista da poca. Em menos de duas dcadas, as minas da regio de

    M inas Gerais, descobertas por bandeirantes expedicionrios procedentes de So Paulo, j rendiam somas astronmicas a Portugal, financiando os faustos da corte de d. Joo V e a construo do gigan

    tesco convento de Mafra. N o Brasil, o opulento legado desses

  • A R T E N O B R A S I L N O S S C U L O S X V I , X V I I E X V I I I

    17tempos manifesta-se, ainda hoje, aos olhos do visitante, em urna srie de igrejas suntuosamente decoradas de talha dourada, nas cidades histricas de Ouro Preto, Mariana, So Joo Del Rei, Tiradentes e de vrias outras de menor renome, todas situadas no estado de Minas Gerais.

    N a dependncia direta do ciclo mineratrio, a cidade do Rio de Janeiro, porto escoadouro do metal precioso para Portugal, atinge notvel desenvolvimento no sculo XVIII, tornando-se capital dos vice-reis em meados do sculo e conhecendo um surto construtivo sem precedentes. E, ainda no mesmo perodo, a regio do Extremo norte que inclui os atuais estados do Par e do Maranho, favorecida por uma srie de medidas comerciais protecionistas, teve trs cidades que se destacaram pela qualidade e por caractersticas diferenciadas de sua arquitetura, comparativamente s da regio Sul. Estas cidades so as de So Lus e Alcntara, no estado do Maranho, e Belm, no Par, no delta do rio Amazonas.

    Urbanismo e arquitetura civil

    Apesar de iniciada oficialmente no dia 22 de abril de 1500, com a tomada de posse da nova terra descoberta por Pedro lvares Cabral a mando do rei d. Manuel I, a colonizao portuguesa quase no deixou vestgios materiais nas quatro primeiras dcadas do sculo XVI, fato que atesta o descaso inicial dos portugueses pela Colnia americana suas atenes permanecendo voltadas para as possesses do Oriente, auferidoras de maiores lucros. Com efeito, praticamente nada subsistiu das construes desses primeiros tempos, em sua maioria simples feitorias em madeira e barro, levantadas em pontos esparsos da costa, onde aportavam as naus portuguesas em busca do pau-brasil.

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    18A primeira tentativa de organizao poltica e adminis

    trativa do territorio data de 1534, com sua diviso em capitanias hereditrias, entregues a particulares investidos do ttulo de donatrios, aos quais a Coroa portuguesa transferiu, implicitamente, a gigantesca tarefa do povoamento, defesa e explorao de imensas extenses de terra, ocupadas apenas por tribos nmades

    de silvcolas.Demonstradas as insuficincias deste sistema, que deu re

    sultados satisfatrios apenas nas regies de Pernambuco e So Vicente, e diante das constantes ameaas de corsrios estrangeiros na costa desprotegida, o governo portugus decide ocupar-se diretamente do Brasil, criando em 1549 o Governo Geral , com sede na cidade de Salvador, fundada especialmente para esse fim. dignidade de cidade capital deve Salvador, em consequncia, o fato de ter tido em suas origens um plano ortogonal regularizad o s semelhante aos traados em xadrez das cidades espanholas da Amrica. Esse tipo de plano, de carter excepcional no contexto do urbanismo lusitano da poca, teve seu emprego no Brasil restrito aos centros administrativos de maior importncia, tais como o Rio de Janeiro, So Lus do Maranho, Belm do Par e ainda Mariana, escolhida em 1745 para sede do primeiro bispado de Minas Gerais.

    N a imensa maioria das vilas e povoados do Brasil colonial, vigorou o modelo informal de urbanizao de razes medievais preferido pelos portugueses, com seus arruamentos estreitos e irregulares, acompanhando as curvas de nvel das encostas dos morros, ocupados pelos monumentos religiosos ou civis de maior destaque e outros acidentes geogrficos do terreno, como os

    riachos aurferos de Minas Gerais. Esses arruamentos espontneos,

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    19com suas voltas pitorescas e constantes subidas e descidas, constituem um dos principais encantos das cidades coloniais brasileiras, algumas das quais ainda conservam notvel grau de preservao arquitetnica e urbanstica. Exemplos particularmente bem conservados so Olinda e Ouro Preto, designadas cidades patrimnio mundial pela Unesco pela qualidade arquitetnica de seus monumentos e pelo casario colonial, inseridos no traado urbano original.

    Fundada em 1537 pelo donatrio Duarte Coelho para ser a sede da capitania de Pernambuco, Olinda uma das mais antigas fundaes portuguesas na Amrica. Apesar das destruies ocorridas no perodo da dominao dos holandeses (1630-1657), que estabeleceram sua capital na vizinha cidade do Recife, conserva ainda excepcional conjunto de monumentos religiosos e civis dos sculos XVII e XVIII e um casario homogneo, pitorescamente implantado em meio a uma exuberante vegetao tropical.

    J a cidade de Ouro Preto resulta da fuso de trs arraiais mi- neradores de criao espontnea, reunidos em 1711 para constituir a antiga Vila Rica de Nossa Senhora do Pilar. O ponto de referncia para a localizao das minas era o pico do Itacolomi, que ainda hoje domina a acidentada paisagem urbana da cidade, com seu caracterstico perfil escarpado. Inseridas no tecido urbano, nas partes baixas ou em destaque no cimo dos morros, as igrejas com suas torres coroadas por graciosos bulbos rococs so focos predominantes de ateno, subordinando a si o casario derramado pelas encostas (Prancha 1).

    N o panorama urbano das cidades martimas, as fortalezas e fortes ocupavam situao de destaque, balizando os principais pontos estratgicos da faixa litornea e ilhas adjacentes.

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    20De plantas variadas, incluindo complexos desenhos poligonais como o forte dos Res M agos em Natal, ou at mesmo curvilneos, como o de So Marcelo em Salvador, essas construes planejadas por engenheiros militares atestam a criatividade e a pericia tcnica desses profissionais, os nicos do mundo lusitano com formao terica especializada em construes, cuja influencia alcanou a arquitetura religiosa em algumas cidades de maior significao poltica, tanto em Portugal quanto nas colonias ultramarinas.

    Apesar da alta qualidade esttica dos conjuntos urbanos, a maioria das construes civis coloniais, quando focalizadas individualmente, apresentam padres arquitetnicos simples e pouco diversificados, j que tanto as casas de moradia quanto os edifcios pblicos reproduziam com fidelidade os tipos tradicionais portugueses. N a monotonia repetitiva das fileiras de fachadas, a linha contnua dos telhados de duas guas, com cumeeiras paralelas s ruas, quebrada apenas pela diferena do nmero de pavimentos variando de um, nas casas trreas, a dois ou trs, nos sobrados.

    Nas paredes lisas e caiadas de branco, os vos se distribuem de forma harmoniosa, enquadrados por molduras de pedra ou de madeira pintada de cores vivas, segundo o material construtivo empregado (alvenaria de pedra ou barro e madeira). Os sobrados apresentam comumente janelas com balces isolados ou de sacada corrida , incluindo vrias janelas em uma espcie de corredor externo. Esses balces so protegidos por balastres de ferro ou de madeira pintada de grande efeito decorativo, marcando a destinao residencial desses pavimentos superiores, em oposio aos trreos reservados a atividades comerciais e administrativas.

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    21Por ocasio das festas religiosas, que aconteciam com grande fre

    quncia nos tempos coloniais, as janelas de sacada corrida eram camarotes ideais para assistir s procisses e outros eventos religiosos e polticos, ocasies em que eram decoradas com colchas adamascadas e vasos de flores.

    Em Salvador, a concentrao de riqueza provinda da produo do acar possibilitou a construo de uma srie de imponentes sobrados senhoriais, com brases e portadas barrocas trabalhadas no arenito local, tais como os do antigo Solar Saldanha. A maioria desses sobrados, um dos principais atrativos da arquitetura colonial de Salvador, data das ltimas dcadas do sculo XVII e das primeiras do XVIII. J as reas rurais, mais alinhadas com as tradies lusas, as casas-grandes dos engenhos do Nordeste e da Bahia e os casasares de fazenda do Sudeste apresentam, assim como as construes urbanas, acentuada homogeneidade em todas as regies do pas.

    C om relao s construes oficiais, dada a ausncia de monarca residente at o ano de 1808, quando a Corte portuguesa transferiu-se de Lisboa para o Rio de Janeiro, os programas de maiores pretenses resumiram-se s casas de cmara e cadeia, nas municipalidades, e aos palcios de governadores e bispos, nas capitais. Dentre os ltimos, destacam-se os palcios dos governa

    dores do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Belm do Par que, apesar de serem construes de grandes dimenses e com certo apuro ornamental, conservam a simplicidade arquitetnica bsica dos programas civis portugueses dos sculos XVII e XVIII.

    Bem mais significativas so as casas de cmara e cadeia , smbolo do poder poltico nas antigas vilas coloniais, onde ocupavam geralmente a praa principal. Sua tipologia prolonga,

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    22na Amrica, a antiga domus municipalis medieval com a tradicional torre central do sino do povo, a exemplo das que ainda se conservam em Salvador, Ouro Preto, Mariana (Figura 1) e Gois Velho. Tipicamente lusitana, a associao em um mesmo edificio das atividades administrativas da cmara e da priso dos condenados mantm-se nos exemplos citados, ficando o pavimento trreo reservado para a priso e o superior para a cmara, com acessos externos independentes.

    Figura 1. Antiga Casa de Cmara e Cadeia, atual Prefeitura de Mariana, Minas Gerais

    Maneirismo e barroco na arquitetura religiosa

    Secundando o poder civil na obra colonizadora, a Igreja Catlica teve importantssimo papel na encomenda arquitetnica e artstica do Novo M undo, repetindo nos Trpicos, na Era Moderna, performance semelhante que tivera na formao da

  • A R T E N O B R A S I L N O S S C U L O S X V I , X V I I E X V I I I

    23civilizao europeia medieval. N o panorama urbano das vilas e povoados coloniais, destacando-se na exuberncia da vegetao tropical, contra o azul profundo do cu ou o verde terroso das montanhas mineiras, os volumes bem definidos das igrejas brancas so sempre pontos de referencia marcantes, subordinando a si o casario existente ao seu redor.

    Apesar da diversidade dos programas - incluindo capelas urbanas e rurais, igrejas conventuais e paroquiais, catedrais e igrejas de Irmandades - , a tipologa do templo catlico colonial apresenta poucas variaes, apegando-se a algumas caractersticas bsicas, que se mantiveram inalteradas ao longo das mudanas estilsticas do processo histrico.

    Entre essas caractersticas, figuram a ausncia de cpulas e de transeptos e a ampla predominncia das naves nicas em todas as regies do pas, com exceo apenas das igrejas italianizantes do arquiteto Antonio Giuseppe Landi (em Belm do Par) e da tardia Igreja da Candelria, no Rio de Janeiro. A explicao do fenmeno liga-se ao arraigado gosto lusitano pela simplicidade e nitidez dos

    volumes arquitetnicos e pela ambientao unitria dos espaos internos, para que o olhar possa abarcar de uma s vez - com a apreenso simultnea de todos os aspectos da suntuosa decorao em talha dourada, pintura e azulejos - o que constitui o interesse principal das igrejas luso-brasileiras.

    Um a avaliao de conjunto da arquitetura religiosa do Brasil colonial revela, tambm, a excepcionalidade dos traados poligonais e curvilneos, utilizados apenas em cerca de uma

    dzia de igrejas, dentre centenas construdas no pas ao longo dos sculos XVII e XVIII. A norma, portanto, aponta para os tradicionais planos retangulares - nos quais a sequncia contnua

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    24dos espaos longitudinais da nave e da capela-mor, separados pelo arco-cruzeiro, termina na parede reta contra a qual colocado o retbulo principal, ponto de convergencia de toda a organizao decorativa da igreja. Atrs dessa parede situa-se a sacristia, em disposio transversal nos fundos do edificio.

    De dimenses amplas e ornamentao luxuosa, essas sacristias so uma especificidade das igrejas coloniais brasileiras, com seus belos lavabos esculpidos em pedra e monumentais arcazes para guarda de paramentos e outros acessrios do culto. O acesso feito a partir de corredores laterais independentes, que viabilizam a circulao, sem perturbar o recolhimento dos fiis nos recintos da nave e da capela-mor.

    Quando vistas do lado de fora, a perspectiva lateral dessas construes religiosas via de regra desvenda uma harmoniosa sequncia de volumes escalonados, definida pela linha decrescente dos telhados, dos coroamentos piramidais das torres at a sacristia. Entretanto, sem nenhum tipo de decorao que identifique sua funo religiosa, as fachadas laterais de nossas igrejas coloniais pouco diferem das da arquitetura civil da poca. Toda a nfase ornamental reservada para a fachada principal, tendo como focos prioritrios as linhas do fronto, os coroamentos das torres e as molduras das janelas e portas.

    Os exemplos mais antigos de arquitetura religiosa conservados no Brasil datam j das dcadas finais do sculo XVI, poca em que se iniciaram as construes em materiais durveis. Entre os raros remanescentes dessa poca, situa-se a capela jesutica do Colgio de Olinda cuja planta, composta de nave nica e capelas laterais pouco profundas, seria retomada com poucas variaes, nas demais igrejas dos colgios jesutas das

  • A R T E N O B R A S I L N O S S C U L O S X V I , X V I I E X V I I I

    25cidades litorneas, ao longo do sculo XVII e da primeira metade do XVIIL D a mesma forma, a fachada da igreja de Olinda foi repetida inmeras vezes nas igrejas das misses jesutas do litoral, com a incorporao ocasional de uma torre lateral tal como nos exemplares que ainda subsistem em Anchieta e Nova Almeida, no Esprito Santo, e em Niteri, no Rio de Janeiro (Figura 2). N o entanto, a maior parte das construes jesutas brasileiras arruinou-se por falta de conservao adequada aps a expulso da Ordem, de Portugal e das suas Colnias, no ano de 1759.

    w III!Figura 2. Capela de So Loureno dos ndios, Niteri

    Entre os raros monumentos que ainda se conservam, em virtude da adaptao a outras funes, situam-se a igreja do antigo Colgio jesu ta de Salvador (atualmente, Catedral M etropolitana)

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    26e a do antigo Colgio de Santo Alexandre em Belm do Par (atualmente, Museu de Arte Sacra da Diocese).

    Construda entre os anos de 1657 e 1672, a igreja do Colgio de Salvador (Figura 3) tem fachada monumental em pedra de lioz portuguesa, na descendncia maneirista do Ges de Roma aclimatado em Portugal, onde incorporou, dentre outros elementos, as torres baixas laterais de sabor essencialmente lusitano. J a fachada da igreja de Belm do Par, construda em princpios do sculo XVIII com materiais e mo de obra locais, oferece uma verso tropicalizada do prottipo internacional, de grande fora expressiva, apesar de sua aparente rusticidade.

    Figura 3. Colgio jesuta de Salvador, atual Catedral Metropolitana

  • A R T E N O B R A S I L N O S S C U L O S X V I , X V I I E X V I I I

    27Nas adaptaes coloniais de partidos arquitetnicos de tra

    dio europeia, levadas a efeito pelas Ordens religiosas nas regies litorneas, sem dvida so os franciscanos que detm o selo de maior originalidade e liberdade criativa. Uma srie de conventos dessa Ordem, situados na costa litornea entre as cidades de Salvador e Joo Pessoa, foi especialmente destacada por Germain Bazin pelo ineditismo de suas solues arquitetnicas e ornamentais, desenvolvidas em solo brasileiro a partir de meados do sculo XVII.

    A cuidadosa escolha e valorizao dos stios urbanos e paisagsticos nos quais se inserem os conventos e o requinte ornamental das fachadas so caractersticas constantes. E sintomtico que tenha sido em fachadas tais como as das igrejas de Nossa Senhora das Neves de Olinda e Santo Antnio delgaraucom seus frontes movimentados em sequncias de volutas - que o barroco tenha feito, em fins do sculo XVII, suas primeiras incurses na arquitetura brasileira. A obra-prima do gnero, entretanto, a fachada do Convento de Santo Antnio de Joo Pessoa, datada de 1779, valorizada por um excepcional adro decorado de azulejos com representaes de Passos da Paixo (Figura 4).

    Figura 4. Convento franciscano de Santo Antnio, em Joo Pessoa, Paraba

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    28Merecem especial referencia os graciosos claustros desses

    conventos franciscanos, com suas galerias de arcadas toscanas e revestimentos parietais de azulejos, verdadeiros osis de verdura e

    frescor, admiravelmente adaptados ao clima tropical. O exemplo

    mais conhecido o claustro do Convento de So Francisco de Salvador, cujos azulejos ilustrando alegorias clssicas foram uma

    doao pessoal do rei d. Joo V Ordem franciscana (Prancha 2).

    Se o sculo XVII consagrou a primazia das Ordens religiosas na encomenda arquitetnica e artstica, veremos no scu

    lo seguinte essa primazia se deslocar progressivamente para as associaes leigas de Irmandades e Ordens Terceiras, cuja atuao

    seria decisiva na regio de M inas Gerais, onde foram proibidos os conventos, por determinao expressa do governo portugus.

    Nos canteiros de obras das novas igrejas de Irmandades passam a predominar os mestres de obra e artistas leigos, in

    cluindo mestios nascidos na prpria C olniatais como Antnio

    Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814), em M inas Gerais, e Valentim da Fonseca e Silva, o Mestre Valentim (1750-1813),

    no Rio de Janeiro. Esses artistas mestios, mais independentes do que seus predecessores portugueses subordinados s oficinas

    conventuais, tiveram importante papel na assimilao das novas tendncias artsticas do perodo, notadamente as plantas curvil

    neas e o vocabulrio ornamental do rococ.N o desenvolvimento da arquitetura religiosa do sculo

    XVIII, a tnica foi a diversificao em escolas regionais - fenmeno

    que continuou, no continente americano, o movimento ocorrido na arquitetura europeia sob a influncia dos ideais libertrios do

    Sculo das Luzes. Essa diversificao teve incio nas dcadas finais do governo do monarca d. Joo V (1707-1750), cuja poltica

  • A R T E N O B R A S I L N O S S C U L O S X V I , X V I I E X V I I I

    29de abertura s influncias do barroco italiano teria importantes consequncias na decorao interna das igrejas do barroco luso-brasileiro. D o ponto de vista arquitetnico, a manifestao mais evidente foi a busca de um maior dinamismo e variedade das plantas e volumes das igrejas - o que desenvolveu, no Brasil, duas linhas evolutivas independentes, tal como ocorreu na mesma poca em Portugal.

    A primeira, abrangendo as plantas poligonais, insere-se na tradio da engenharia militar portuguesa. Foram, com efeito, quase sempre engenheiros militares os autores dos projetos desse tipo de igreja no Brasil, como as de Nossa Senhora da Glria do Outeiro (no Rio de Janeiro), Nossa Senhora da Conceio da Praia (em Salvador) e So Pedro dos Clrigos (no Recife).

    D e todas, a mais interessante a graciosa Igreja da Glria do Rio de Janeiro (Figura 5), datada do perodo 1720-1740 e situada em uma elevao - como o prprio nome indica - com vista panormica para a baa de Guanabara. Ao contrrio das demais igrejas citadas, sua volumetria poligonal plenamente acusada no exterior do edifcio e pode ser identificada a distncia pelo destaque dado s pilastras de granito com elegantes coruchus, que fazem a juno entre os planos.

    J a Igreja da Conceio da Praia de Salvador, edificada entre 1739 e 1765, destaca-se pela inusitada soluo das torres em diagonal na fachada, que no teve posteridade na arquitetura das igrejas do Brasil. E importante salientar que essa igreja constitui um exemplo extremo de intercmbio colnia-metrpole na arquitetura brasileira do perodo, pois suas pedras foram talhadas e aparelhadas em Portugal e expedidas para o Brasil como lastro de navios comerciais, acompanhadas do mestre de obras encarregado da montagem da construo na chegada em Salvador.

  • ' I ..... : .>'*Figura 5. Igreja de Nossa Senhora da Glria do Outeiro, no Rio de Janeiro

    A segunda linha evolutiva que engloba as plantas curvilneas de tradio italiana, j raras em Portugal conta com apenas trs igrejas construdas na Colnia brasileira com caractersticas plenamente definidas. A mais antiga, e provvel fonte de inspirao para as outras duas, foi a igreja de So Pedro dos Clrigos no Rio de Janeiro (Figura 6), construda entre 1732 e 1740 e que, infelizmente, no mais existe, tendo sido demolida em 1944 na abertura da atual avenida Presidente Vargas.

    sintomtico que tambm tenha pertencido a uma Irmandade de clrigos a segunda igreja curvilnea construda no Brasil a de So Pedro em Mariana (Minas Gerais), iniciada por volta de 1752. Seu projetista, o portugus Antnio Pereira de Souza Calhei- ros, que tambm desenhou o plano da ltima igreja da srie a de

  • A R T E N O B R A S I L N O S S C U L O S X V I , X V I I E X V I I I

    Figura 6. Igreja de So Pedro dos Clrigos, no Rio de Janeiro. Arquivo do Iphan

    Nossa Senhora do Rosrio em Ouro Preto (Figura 7) - era doutor em cnones pela Universidade de Coimbra , o que faz dele o mais erudito arquiteto de sua poca no Brasil colonial. Conjugando crculos e elipses entrelaadas, as plantas dessas trs igrejas excepcionais incluam torres cilndricas, trao de absoluta novidade no contexto da arquitetura luso-brasileira da poca, destinado a ter ampla posteridade na arquitetura subsequente do perodo rococ em Minas Gerais.

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    Figura 7. Igreja de Nossa Senhora do Rosrio, em Ouro Preto, Minas Gerais

    Pombalino e rococ nas igrejas da segunda metade

    do sculo XVIII

    A diversificao regional atinge seu ponto culminante na segunda metade do sculo XVIII, poca em que dois novos estilos - o pombalino (de fonte italiana) e o rococ (de fontes francesa e germnica), ambos desenvolvidos no mesmo perodo em Portugal - dividem a produo arquitetnica dos principais centros coloniais. N o Rio de Janeiro, que se tornara

  • A R T E N O B R A S I L N O S S C U L O S X V I , X V I I E X V I I I

    33capital dos vice-reis em 1763, e em Belm do Par, capital do Extremo norte, duas cidades naturalmente voltadas para Lisboa, o primeiro estilo ser prioritrio, ao passo que as regies de Minas Gerais e Pernambuco desenvolvero, por seu turno, ver

    ses regionais do rococ internacional.O chamado estilo pombalino tem seu nome ligado ao

    marqus de Pombal, enrgico ministro do rei d. Jos I (1750- 1777), ao qual coube a gigantesca tarefa da reconstruo de Lisboa aps o terremoto de 1755. Em linhas gerais, trata-se de uma das vertentes do barroco tardio italiano, e sua adoo, nas reconstrues das igrejas lisboetas, parece ter sido motivada sobretudo por fatores de ordem econmica, tendo em vista que

    as decoraes italiana (que imitavam, em pintura, os mrmores usados nas igrejas de Roma) eram bem menos dispendiosas que

    as da sofisticada talha dourada rococ.Foi nas fachadas das igrejas do Rio de Janeiro que a marca do

    pombalino se fez sentir com maior evidncia, notadamente nas de Santa Cruz dos M ilitares, So Francisco de Paula e Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo (Figura 8), situada na Praa XV, no Rio de Janeiro. Nesta ltima, so dignas de nota duas belas portadas em pedra de lioz, diretamente importadas de Lisboa em 1761, de padro de qualidade anlogo s que decoram as igrejas pombalinas contemporneas de Portugal. Curiosamente, entretanto, as decoraes internas das igrejas cariocas adotaram o rococ francs, e no o pombalino italiano como as congneres lisboetas.

    O desenvolvimento do pombalino, em Belm do Par,

    apresenta aspectos particulares em virtude da atuao preponderante do arquiteto italiano Antonio Giuseppe Landi (1713-1791), que aportou na cidade em 1753, acompanhando uma expedio

  • 34j H I S T R I A D A A R T E N O B R A S I L

    Figura 8. Igreja da Ordem Terceira do Carmo, no Rio de Janeiro

    de demarcao de fronteiras da Amaznia e nela permaneceu at a morte, em 1791. Autor dos projetos da maioria dos edifcios importantes construdos em Belm naquele perodo, neles imprimiu um cunho acentuadamente italiano, que pode ser identificado primeira vista em igrejas como as de Santana e So Joo Batista de espaos centralizados e coberturas cupu- lares, aspectos incomuns na tradio luso-brasileira. Em 1996, uma restaurao providencial recuperou uma importante pintura ilusionista na parede do fundo da capela-mor da Igreja de So

  • A R T E N O R A S I L N O S S C U L O S X V I , X V I I E X V I I I

    Joo Batista, obra nica do gnero nas igrejas brasileiras do perodo colonial.

    A arquitetura religiosa da antiga regio de Pernambuco (que inclua, na poca, os atuais estados da Paraba e de Alagoas) desenvolveu uma original sntese das tradies da arquitetura luso- -brasileira com os padres do rococ internacional, introduzidos via Portugal, assim como nos casos anteriores de importao de formas artsticas europeias. A assimilao desse estilo na regio pernambucana estendeu-se da decorao interna ao desenho das fachadas das igrejas - no atingindo, entretanto, a volumetria externa das igrejas, tal como ocorreria em Minas Gerais.

    Nas fachadas do rococ pernambucano, chamam imediatamente a ateno as ondulaes da cimalha que parecem projetar verticalmente o fronto e os coroamentos bulbosos das torres, de desenho variado e s vezes bastante complexo. Datada de 1767, a fachada da Igreja conventual do Carmo em Recife, situada em uma regio movimentada do centro histrico da cidade, sem dvida a mais original. Em soluo sem precedentes na arquitetura da regio, a projeo vertical do fronto dramaticamente enfatizada pelo movimento ascendente em curvas reversas da parte central da cornija, na melhor tradio borromnica. esquerda da igreja conventual, a Capela da Ordem Terceira (Figura 9) tambm apresenta um inusitado desenho de fronto, em linhas sinuosas bem mais leves, lembrando solues ornamentais do mobilirio civil da poca.

    A regio brasileira que realizou a mais diversificada e abrangente sntese do rococ internacional com as tradies prprias da arte luso-brasileira foi Minas Gerais, cuja capital Vila Rica suplanta, na segunda metade do sculo XVTII, o

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    Figura 9. Capela da Ordem Terceira do Carmo, em Recife, Pernambuco

    desenvolvimento cultural e artstico dos antigos centros litorneos. Em Vila Rica nasceu e atuou o mais importante artista brasileiro de toda a poca colonial - o mestio Antonio Francisco Lisboa (1738-1814), o Aleijadinho que foi simultaneamente arquiteto, ornamentista e escultor, deixando vasta produo em

    diferentes cidades mineiras.As caractersticas mais evidentes das igrejas do rococ mi

    neiro so as torres cilndricas e as elegantes portadas de relevos escultricos em pedra-sabo - que substituram, na regio, as portadas em lioz, cuja importao era invivel em virtude da distncia dos portos litorneos. Trs igrejas excepcionais incluem

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    Ss&ss# M

    ainda movimentao sinuosa das plantas, caracterstica assimilada do rococ internacional. Esboada na fachada da Igreja de So Francisco d-e Assis em Ouro Preto, cujo projeto data de 1766, essa movimentao adquire soluo de plena continuidade e elegncia na fachada do Carmo em Ouro Preto (Figura 10), reformulada em 1770, alcanando quatro anos mais tarde as paredes laterais da nave da igreja de So Francisco de Assis em So Joo Del Rei. Todas essas igrejas esto documentalmente ligadas ao nome do Aleijadinho, autor das belas portadas em pedra-sabo, dos projetos de decorao interna e de parte substancial da talha. tambm de sua autoria o projeto original da igreja de So Francisco em So Joo Del Rei, cujos desenhos ainda se conservam no Museu da Inconfidncia de Ouro Preto (Figura 11). Observe-se entretanto que, originalmente, era a fachada principal que apresentava ondulao sinuosa, e no as laterais, repetindo soluo j ensaiada na igreja do Carmo em Ouro Preto.

    Esse fato nos remete a um segundo nome importante na histria do rococ mineiro o do arquiteto e mestre de obras portugus Francisco de Lim a Cerqueira, construtor da igreja de So Francisco em So Joo Del Rei e provvel autor da mudana no projeto do Aleijadinho. importante salientar que as aud- cias arquitetnicas dessas igrejas do rococ mineiro e das duas igrejas curvilneas do perodo barroco anterior no teriam sido possveis sem a percia tcnica dos mestres de obras portugueses atuantes na regio, a maioria originria do Norte de Portugal. Alm de Francisco de Lim a Cerqueira, merecem especial referncia Domingos Moreira de Oliveira e Jos Pereira dos Santos, ambos originrios da regio do Porto, responsveis pela construo

  • 381H I S T R I A D A A R T E N O B R A S I L

    Figura 10. Igreja da Ordem Terceira do Carmo, em Ouro Preto, Minas Gerais

    das mais audaciosas igrejas da arquitetura colonial mineira: as deSo Francisco de Assis e Nossa Senhora do Rosrio, em Ouro Preto;

    e a de So Pedro dos Clrigos, em Mariana.

    O esplendor do barroco nas decoraes internas

    Seguindo a tradio do barroco portugus, a decorao interna das igrejas coloniais brasileiras dominada pelas esplndidas ornamentaes de talha dourada, cujo emprego no mundo ibrico equivale ao do mrmore nas igrejas barrocas italianas,

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    Figura 11. Desenho do Aleijadinho para a fachada da Igreja de So Francisco, em So Joo Del Rei, Minas Gerais

    acrescido de efeitos de cintilao e rutilncia comparveis aos dos mosaicos bizantinos e vitrais medievais. Inicialmente restrita ao mbito dos retbulos no perodo maneirista, com o advento do barroco alastra-se progressivamente pelas paredes internas das igrejas, chegando a recobri-las por inteiro. Temos ento as igrejas forradas de ouro, tpicas do barroco luso-brasi- leiro que, segundo o historiador Robert Smith, produzem no visitante a impresso de suntuosas cavernas douradas . Dentre os exemplos mais notveis, podem ser citadas: a Capela Dourada

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    40em Recife, a Igreja da Penitncia no Rio de Janeiro e a M atriz de Nossa Senhora do P ilar em Ouro Preto.

    N o perodo barroco (que abrange, grosso modo, a primeira metade do sculo XVIII), dois modelos diferentes de retbulos orquestram sucessivamente essas esplndidas decoraes. O primeiro, que vigorou at cerca de 1730, conhecido pelo nome de nacional portugus (Figura 12, b), por se tratar de criao prpria

    do gnio lusitano, sem equivalentes em outras regies europeias. Sobre uma estrutura bsica composta de colunas torsas e ar- quivoltas concntricas, lembrando a composio dos portais romnicos da poca medieval desenvolve-se uma profuso exuberante de ornatos tomados ao repertrio clssico (folhagens de acanto) e ao judaico-cristo (videiras e cachos de uva, smbolos da Eucaristia; e pssaros fnix, smbolos da Ressurreio do Cristo). O centro do retbulo ocupado pelo trono , espcie de pirmide de degraus escalonados, destinada apresentao do Santssimo Sacramento ou do santo padroeiro da igreja.

    A mais antiga decorao colonial baseada em retbulos desse tipo a da capela da Ordem Terceira de So Francisco no Recife. Inclui sete retbulos alojados em arcadas rasas, interligadas por barrados de azulejos e painis figurativos com cenas da iconografia franciscana, que so prolongados na abbada, gerando a impresso de um espao compartimentado (Prancha 3).

    Outro exemplo notvel o da pequena capela de Nossa Senhora do 0 em Sabar (Minas Gerais), datada dos primrdios do sculo XVIII. Sua decorao obedece ao mesmo princpio da diviso das paredes e tetos em painis retangulares, abrigando pinturas relativas iconografia da Virgem e do Menino Jesus, visto que a Senhora do tradicionalmente padroeira das

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    Figura 12.Tipologia dos retbulos luso-brasileiros

    mulheres grvidas no mundo ibrico. Considerada por Germain

    Bazin como uma das criaes mais requintadas da arte barroca , essa capelinha apresenta a particularidade de uma srie de pinturas dispostas em volta do arco-cruzeiro, figurando pagodes e outras chinesices , em dourado sobre fundo azul.

  • 42Nas decoraes um pouco mais tardias do barroco na

    cional portugus, a diviso em painis desaparece e a talha desenvolve-se livremente recobrindo paredes e tetos, configurando as famosas igrejas forradas de ouro. o caso das suntuosas de

    coraes de talha dourada das igrejas do Mosteiro de So Bento, no Rio de Janeiro, e do Convento de So Francisco de Assis, em Salvador, datadas do perodo 1720-1740. Essas decoraes foram executadas por religiosos escultores das prprias fundaes conventuais, como era de praxe na poca, dentre os quais emerge o nome do monge beneditino Frei Domingos da Conceio (c. 1643- 1718), de origem portuguesa, que dirigiu e executou parcialmente a obra de talha e imagens do Mosteiro do Rio de Janeiro.

    O segundo tipo de retbulo barroco foi o d. Joo V ou joanino (Figura 12, c) de influncia italiana, introduzido no Brasil a partir da terceira dcada dos anos 1700. Suas principais inovaes foram a importncia plstica dada figura humana como tema ornamental e o apotetico remate do coroamento em dossel, com sanefas e cortinados de grande efeito teatral. As colunas torsas evoluem para o tipo salomnico berniniano com guirlandas de flores e o tero inferior estriado, tais como as do clebre baldaquino de Bernini na Baslica de So Pedro, em Roma. Entre os retbulos joaninos mais significativos, situam-se os do cruzeiro da antiga S de Salvador, o conjunto da Igreja da Penitncia no Rio de Janeiro (Figura 13) e o retbulo da capela- -mor da M atriz de Nossa Senhora do P ilar em Ouro Preto.

    Executada entre 1741 e 1751 pelo escultor portugus Francisco Xavier de Brito, que tambm trabalhou na Igreja da Penitncia no Rio de Janeiro, a talha da capela-mor da Matriz do Pilar em

    Ouro Preto uma das obras-primas do barroco joanino no Brasil.

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    Figura 13. Retbulo da capela-mor e arco-cruzeiro da Igreja da Penitncia, no Rio de Janeiro

    O elemento principal o monumental que ocupa toda a parede do fundo, com a Virgem do Pilar entronizada no alto de um

    gigantesco trono piramidal. Colunas salomnicas e pilastras seccionadas em volutas lor mam os elementos de suporte, coroadas por vasto dossel com cortinados, no alto do qual figuram os personagens da Santssima Trindade - Pai, Filho e Esprito Santo -

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    44rodeados por uma multido de anjos e querubins de tamanhos

    variados.Elemento fundamental na organizao decorativa do es

    pao interno da igreja, como de praxe nas igrejas luso-brasileiras, o retbulo da capela-mor do Pilar impe-se ao visitante desde a porta de entrada da igreja, atraindo o olhar por um jogo sutil de linhas convergentes, marcadas pela disposio dos retbulos na nave poligonal e reforadas pelas molduras da cornija em forte

    salincia, que faz a juno com o teto.O sentido barroco de grandiloqncia e dramatismo prprio

    da talha joanina encontra sua significao plena quando completado por pinturas em perspectiva ilusionista, na descendncia dos modelos difundidos pelo jesuta italiano Andrea Pozzo. Decorando amplas abbadas em tabuado corrido, essas pinturas substituem os tetos compartimentados em painis (caixotes) da fase anterior. A regio da Bahia desenvolveu uma verdadeira escola de pintores desse novo gnero em torno da figura de Jos Jo a

    quim da Rocha (c. 1737-1807) - que executou, dentre outras, as monumentais pinturas das abbadas das igrejas de Nossa Senhora da Conceio da Praia, de So Domingos (Figura 14) e de Nossa Senhora da Palma, todas situadas em Salvador.

    O magnfico forro da nave da Igreja da Conceio da Praia, de 1772-1774, a sua obra de maior impacto. Acima das paredes reais da igreja, eleva-se uma suntuosa arquitetura imaginria com colunas, balces e galerias, cuja parte central se abre para a representao do cu, com anjos e outros personagens celestiais rodeando a Virgem da Conceio, padroeira da igreja. Observe-se que essa parte central no apresenta escoro nem uso de perspectiva area baseada em gradaes de luz e cor, como nos prottipos italianos e

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    Figura 14. Pintura do forro da nave da Igreja de So Domingos, em Salvador, Bahia, executada por Jos Joaquim da Rocha

    centro-europeus. Essa particularidade, que afeta todas as pinturas do gnero em Portugal e no Brasil, parece estar ligada ao tipo especfico de sensibilidade religiosa do homem lusitano, que privilegia a comunicao direta e ntima com os santos vistos de perto e no perdidos em inacessveis alturas celestiais.

    O requinte dos interiores do rococ

    A partir da stima dcada do sculo XVIII, o rococ domina a decorao interna das igrejas brasileiras, onde a pesada opulncia barroca cede lugar ao luxuoso requinte das composies

  • 46ornamentais sobre fundos claros, tendo as rocalhas assimtricas como tema principal. Aclimatado previamente em Portugal, onde havia sido introduzido por artistas de origem francesa e por gravuras ornamentais francesas e germnicas, esse estilo encontrou no Brasil terreno de frtil expanso nas novas igrejas de Irmanda- des e Ordens Terceiras, mais abertas incorporao de novidades artsticas do que as igrejas conventuais, tanto pela ausncia de tradies especficas quanto pelo fato de empregarem, em seus canteiros de obras, um grande nmero de artistas mulatos, for

    mados nas oficinas de trabalho locais.Apesar de ter sido introduzido em todas as regies da

    Colnia brasileira, onde retbulos do estilo so encontrados em numerosas igrejas, convivendo em harmonia com outros da poca barroca ou neoclssica, o rococ teve desenvolvimento mais abrangente no Rio de Janeiro, em Pernambuco e em Minas Gerais, as nicas regies que elaboraram decoraes unitrias envolvendo simultaneamente talha, pintura e azulejos, na melhor tradio europeia da obra de arte total .

    Foi na talha das igrejas do Rio de Janeiro que o estilo fez sua primeira apario no Brasil, por volta de 1753, quase contemporaneamente sua absoro em Lisboa, nos anos que precederam o terremoto de 1755. A partir dessa data, seu domnio na decorao interna das igrejas cariocas foi absoluto, inclusive nas que j

    haviam adotado o pombalino italiano nas suas fachadas.Infelizmente, poucos conjuntos escaparam ilesos s abran

    gentes remodelaes do patrimnio colonial do Rio de Janeiro na segunda metade do sculo X IX e em princpios do XX. Entre esses, situam-se os da Capela do Noviciado da Ordem Terceira do Carmo e o da Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Antiga S, nos

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    4quais trabalharam os dois principais artistas do rococ carioca: o mulato Valentim da Fonseca e Silva (c. 1745-1813) e Incio Ferreira Pinto (1759-1828), seu contemporneo e principal

    concorrente.Iniciada em 1773, a requintada decorao da Capela do

    Noviciado do Carmo (Figura 15) sugere um pequeno salo de festas, que lembra o ambiente da capela do Palcio de Queluz na periferia de Lisboa. Paredes e tetos so inteiramente revestidos de delicados motivos de talha dourada destacados contra fundos claros, como de praxe no rococ, em que os espaos vazios tm funo de contrapontos. Os concheados assimtricos ou rocalhas so o tema ornamental principal, juntamente com graciosos motivos florais. Esses temas so visveis por toda parte, tendo entretanto maior concentrao no coroamento dos dois retbulos e nas molduras dos quadros das paredes, ocupadas por pinturas com cenas alusi

    vas vida de Santa Teresa.O mesmo esquema de organizao decorativa foi empre

    gado, em escala mais ampla, no interior da Igreja do Carmo da Antiga S, cuja talha foi contratada em 1785 por Incio Ferreira Pinto. Paredes e abbadas revestidas integralmente com ornatos de talha dourada, em destaque contra fundos claros, produzem a mesma sensao ferica de festa palaciana. Considerando que essa igreja foi efetivamente utilizada como capela real iela Corte portuguesa, quando fixou residncia no Brasil em 1P08, fica ainda mais patente a relao com ambientes civis da poca, tpica do

    rococ religioso do Rio de Janeiro.A arquitetura religiosa da antiga regio de Pernambuco

    tambm assimilou com grande sensibilidade os padres estilsticos do rococ, chegando a praticar simultaneamente diferentes

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    Figura 15. Capela do Noviciado da Ordem Terceira do Carmo, no Rio de Janeiro. Rococ carioca

    verses de retbulos desse estilo. Introduzido por beneditinos procedentes do Norte de Portugal, o rococ pernambucano detm acentuada marca portuguesa, reforada pelas relaes comerciais privilegiadas estabelecidas entre Pernambuco e Lisboa a partir da criao de uma companhia geral de comrcio para a regio, no ano de 1759. Essas relaes comerciais favoreceram a importao dos habituais complementos arquitetnicos em pedra de lioz e revestimentos de azulejos usados, na poca, como lastro dos navios que aportavam em Pernambuco em busca do acar.

    A ambientao decorativa das igrejas do rococ pernambucano repete, de forma mais ntida do que em outras regies brasileiras, a tpica associao portuguesa de talha, azulejos e

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    pinturas. Um dos melhores conjuntos de azulejos conservados o que reveste a seo inferior das paredes da Capela de Nossa Senhora da Conceio da Jaqueira, na periferia da cidade de Recife. Esses azulejos so de padro policromado e possuem cabeceiras onduladas, decoradas com vasos em forma de rocalhas chamejantes - caractersticos da dcada 1765-1775, que assinala a fase madura do rococ em Portugal e no Brasil.

    Dentre as diferentes verses de retbulos do rococ pernambucano, a mais suntuosa a da capela-mor do Mosteiro beneditino de Olinda integralmente dourado, inspirado no modelo portugus do Mosteiro do Tibes, perto da cidade de Braga. N a maioria das igrejas locais prevaleceu, entretanto, uma verso de retbulo mais simples, elaborado na prpria regio, cuja principal caracterstica o remate em forma de fronto, com curvas e contracurvas acentuadas tal como na Igreja da M isericrdia e no Convento de Nossa Senhora das Neves em Olinda (Figura 16). Tambm so tpicas do rococ pernambucano as exuberantes sanefas na parte superior dos retbulos, particularmente desenvolvidas nos do arco-cruzeiro.

    Finalmente, as decoraes do rococ pernambucano incluem pinturas de tetos com perspectivas ilusionistas, tais como as do rococ mineiro, com pelo menos duas tipologias diferentes. A primeira, empregada em tetos planos ou de fraca curvatura, composta de painis figurativos independentes, com exuberantes molduras ornamentais. A pintura do forro da nave da igreja de Santo Antnio de Igarau utiliza esse tipo de composio, repetido em talha dourada no teto da igreja da Conceio dos M ilitares no Recife. A segunda tipologia desenvolve composies unitrias de pinturas perspectivistas assim

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    Figura 16. Convento de Nossa Senhora das Neves, em Olinda, Pernambuco. Rococ pernambucano

    como na fase barroca - deixando, entretanto, um amplo espao vazio na parte central, reservado representao de personagens celestiais. N a Igreja do Rosrio dos Pretos, em Recife, h uma bela pintura desse tipo do qual se conservam poucos exemplares em Pernambuco, tanto pela falta de conservao adequada quanto pelas remodelaes efetuadas no decorrer do sculo XIX.

    Particularidades do rococ mineiro

    As decoraes mais originais e de maior sentido de unidade plstica do rococ brasileiro foram sem dvida as de Minas Gerais, onde a talha e a pintura se integram em requintados conjuntos ornamentais, que constituem verdadeiros poemas

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    51sinfnicos de luz e cor. Observe-se que, tratando-se de uma regio interiorana, a dificuldade de transporte inviabilizou a utilizao de azulejos, substitudos eventualmente por lambris pintados imitao de azulejos , como na capela-mor da Igreja de So Francisco de Assis em Ouro Preto.

    Conforme ocorreu na talha pernambucana, a tipologia dos retbulos do rococ mineiro no teve padro unitrio, diversificando-se ao sabor da inventividade dos artistas e das preferncias de gosto das Irmandades que encomendaram as obras. Dois modelos prevaleceram, entretanto, possivelmente em virtude de sua adoo pelos principais escultores em atividade na regio: o portugus Francisco Vieira Servas (1720-1811) e o mulato Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. A principal diferena reside nos remates superiores, que, nos retbulos de Vieira Servas, incluem um motivo sinuoso conhecido pelo nome de arbaleta ou balestra (Figura 17), substitudo nos retbulos do Aleijadinho por um imponente grupo escultrico com a representao da Santssima Trindade (Prancha 4).

    Outra caracterstica das igrejas do rococ mineiro so as amplas pinturas ilusionistas dos tetos abobadados que, juntamente com o retbulo principal, funcionam como focos prioritrios de ateno, atraindo o olhar do espectador que se desloca no recinto da nave. Essas pinturas so criaes prprias dos pintores da regio efetuadas a partir dos modelos divulgados pelo rococ internacional, e incluem vrias tipologias diferentes.

    A obra mais importante do gnero a vasta pintura do teto da nave da Igreja de So Francisco de Assis em Ouro Preto, executada pelo pintor Manuel da Costa Atade (1762-1830). Com o ocorre habitualmente nas pinturas de tetos do rococ mineiro, uma leve

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    Figura 17. Santurio do Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, Minas Gerais, aspecto interno. Rococ mineiro

    trama de suportes vazados substitui as pesadas perspectivas arquitetnicas do modelo barroco e a composio sugere um suntuoso baldaquino elevado contra o cu. N a parte central, uma moldura sinuosa de rocalhas circunda a representao da viso celestial, dominada pela figura da Virgem entre nuvens em primeiro plano, rodeada por um concerto completo de anjos msicos.

  • A R T E N O B R A S I L N O S S C U L O S X V I , X V I I E X V I I I

    53A escultura religiosa

    De modo mais direto e sensvel do que a arquitetura e a decorao interna das igrej as, as esculturas ou imagens sacras refletem os aspectos mais significativos da arte brasileira da poca colonial, condicionados pelos valores religiosos da nova sociedade aclimatada nos Trpicos, a milhares de quilmetros da Europa. Isso porque, eruditas ou populares, em barro cozido ou em madeira policromada e dourada, as imagens tinham apenas a verossimilhana iconogrfica como comprometimento maior, essencial para que o santo pudesse ser reconhecido, e a adequao ao contexto, determinada pela funo.

    Estabelecida pela encomenda no Brasil colonial, essa adequao abrange quatro funes diferenciadas. A mais frequente a exposio em retbulos para culto devocional em igrejas e capelas, seja como invocao principal no trono central, seja como devoo secundria nos nichos laterais. As outras funes so o uso em procisses e nos demais rituais catlicos a cu aberto, a integrao em conjuntos escultricos montados por ocasio de festas religiosas de maior importncia e a incluso em oratrios de culto domstico.

    So caractersticas especficas das imagens retabulares : em primeiro lugar, a nfase de sua expresso dramtica, para serem vistas de longe; e, em seguida, a integrao formal e estilstica ao retbulo ao qual eram destinadas. Pode-se perceber, sem grande dificuldade, que as linhas sbrias e o panejamento vertical das esculturas luso-brasileiras do sculo XVII adequam-se perfeitamente aos retbulos do tipo maneirista. J os dinmicos retbulos do barroco joanino, de colunas torsas e exuberante

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    54ornamentao, possuem esculturas retricas de formas agitadas como complemento natural, ao passo que os do perodo rococ, de linhas mais suaves e elegantes, completam-se com imagens graciosas e de propores alongadas.

    Exemplos de perfeita adequao formal entre imagens e retbulos so raros no Brasil, em virtude das mudanas devocio- nais ocorridas nos sculos X IX e XX, somadas aos roubos e alienaes ilcitas de imagens que se tornaram rotina nos lti

    mos tempos. Dentre os conjuntos conservados podem ser citados, para o perodo maneirista, os retbulos da antiga igreja jesuta do Rio de Janeiro, atualmente dispostos na Igreja de Nossa Senhora do Bonsucesso, para a fase urea do barroco joanino, os colaterais do cruzeiro da Catedral de Salvador, e, para o rococ, o harmonioso conjunto da Igreja do Rosrio em Mariana, Minas Gerais.

    As imagens processionais feitas para serem vistas de vrios ngulos no meio de multides - exigem maior expresso realista. Tm frequentemente tamanho prximo do natural e articulaes que possibilitam mudanas de posio dos membros e outras partes do corpo. Recebem tambm o complemento de cabeleiras naturais, roupagens em tecido e outros adereos, que variam de acordo com as circunstncias. So as imagens de vestir , de grande popularidade na Pennsula Ibrica - cate

    goria que inclui, em Portugal e no Brasil, as chamadas imagens de roca , cujo corpo reduzido a uma armao de ripas, recurso que reduz os custos de confeco da imagem e diminui seu peso, facilitando o transporte nas procisses.

    Grande nmero de igrejas brasileiras ainda conserva em seu acervo imagens desse tipo, embora tenham cado em desuso

  • '55algumas das procisses tradicionais nas quais tomavam parte, como, por exemplo, a Procisso das Cinzas da Ordem Terceira de So Francisco de Assis. Entretanto, na maioria das igrejas paroquiais podem ser encontradas, ainda hoje, duas imagens desse tipo: o Senhor dos Passos e a Nossa Senhora das Dores, usadas nas procisses da Semana Santa.

    Os conjuntos escultricos mais frequentes na arte colonial brasileira foram os populares Prespios, montados por ocasio das festas do Natal, e os Passos da Paixo, montados na Semana Santa. A tradio portuguesa privilegiou tambm a colocao de Passos em capelas construdas especialmente para esse fim - tema que teve, no Brasil, um exemplo magnfico no conhecido conjunto da Via Sacra do Aleijadinho na cidade de Congonhas, em Minas Gerais.

    Duas das melhores esculturas religiosas conservadas em museus brasileiros - a excepcional M adalena do Museu de Arte Sacra de So Paulo, atribuda a Francisco Xavier de Brito (?-1751); e o Pastorzinho ajoelhado do Aleijadinho, do Museu da Inconfidncia de Ouro Preto - pertenciam, originalmente, a conjuntos escultricos dos tipos citados, hoje desaparecidos. Ambas possuem intensa expressividade e gesticulao dramtica, aspectos caractersticos da funo teatral desse tipo de imagens.

    Finalmente, as imagens de oratrio aparecem como fundamentais na vida cotidiana das populaes da poca colonial, pois a relao ntima e familiar com os santos sempre constituiu

    trao marcante do catolicismo luso-brasileiro. Pea essencial no mobilirio das casas, o oratrio variava de estilo e dimenses de acordo com as posses do proprietrio. Nele eram guardados os santos de especial devoo das famlias, quase sempre dispostos

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    56em torno de um crucifixo. Geralmente confeccionados em m adeira policromada mas podendo, tambm, incluir outros materiais como a pedra-sabo, o marfim e o barro cozido , os santos do oratorio atendiam a necessidades humanas de todos os tipos. Santa Brbara e So Sebastio, por exemplo, forneciam proteo contra tempestades e doenas infecciosas; Santo Onofre remediava adversidades financeiras; e o popularssimo Santo Antnio providenciava maridos para as donzelas e recuperava objetos per

    didos, entre outras especialidades.

    Oficinas conventuais e escolas regionais

    A maior parte das imagens sacras produzidas na Colnia brasileira, no sculo XVII, originou-se nas oficinas conventuais das Ordens religiosas, particularmente de jesutas, beneditinos, franciscanos e carmelitas. Submetidas a padres estticos convencionais, essas imagens seiscentistas tm, geralmente, posturas pouco movimentadas e expresses severas na tradio do maneirismo portugus, apresentando poucas variaes regionais pelo fato de os mesmos religiosos artistas executarem imagens para diferentes fundaes da Ordem, em pontos diversos do territrio

    brasileiro.O caso dos dois escultores beneditinos frei Agostinho da

    Piedade (c. 1580-1661) e frei Agostinho de Jesus (?-1661) pode ser tomado como exemplo das condies de trabalho vigentes nestas oficinas conventuais. Exatos contemporneos, faleceram ambos no ano de 1661, tendo fabricado imagens em barro cozido para vrios mosteiros do litoral - de Olinda a So Paulo. Embora de origem portuguesa, frei Agostinho da Piedade professou no Mosteiro de Salvador, na Bahia, onde ensinou o ofcio

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    57de ceramista ao monge brasileiro frei Agostinho de Jesus. Deixou algumas imagens assinadas, fato rarssimo na escultura colonial brasileira, que fundamentaram outras atribuies baseadas nas caractersticas de seu estilo, severo e contido. As mais notveis so a Nossa Senhora de Montesserrate (Prancha 5) e a Santana Mestra - ambas atualmente conservadas no Museu de Arte Sacra da Universidade Federal da Bahia.

    N o sculo XVIII, repetindo o fato ocorrido na arquitetura, a primazia da produo de imagens religiosas passou para as oficinas de artistas leigos, muitos deles mestios nascidos na prpria

    Colnia, trabalhando a servio das Irmandades e Ordens Terceiras. A principal consequncia foi a regionalizao verificada, passando as imagens a apresentar caractersticas diferenciadas em pontos diversos do territrio brasileiro notadamente na Bahia, em Pernambuco e em Minas Gerais.

    Entre as regies mencionadas, a Bahia ocupa lugar de destaque, tanto pela qualidade das imagens que saram de suas oficinas quanto pela quantidade produzida, em virtude da demanda do mercado interno, onde as imagens baianas sempre obtiveram grande aceitao. Dentre as caractersticas que condicionaram essa aceitao, destacam-se o refinamento de gestos e atitudes, a movimentao erudita dos panej amentos e, principalmente, a policromia de cores vivas com douramento vibrante, que confere s imagens um aspecto suntuoso. O escultor de maior projeo foi Manuel Incio da Costa, que nasceu em Salvador em 1762 e morreu aos 95 anos nessa mesma cidade. Sua vasta produo inclui obras exportadas para outros centros brasileiros, tendo sido particularmente prezadas suas representaes dramticas do Cristo da Paixo (Figura 18).

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    Figura 18. Senhor da coluna, por Manuel Incio da Costa.Museu de Arte Sacra de Salvador, Bahia

    A imaginria religiosa de Pernambuco tem como principal caracterstica o apuro tcnico da policromia que apresenta, na maioria dos casos, douramento integral dos panejamentos com requintado trabalho ornamental. As expresses fisionmicas so variadas, s vezes reproduzindo tipos locais. Entre os escultores de maior renome na regio, figuram Antnio Spangler Aranha e Luis Nunes, merecendo tambm referncia o nome de Manoel

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    59da Silva Amorim, apesar de sua produo j se situar em pleno sculo XIX.

    Resta falar de Minas Gerais, terra de origem do maior de todos os escultores brasileiros do perodo colonial o conhecido Aleijadinho, j citado vrias vezes neste texto pelo fato de tambm ter atuado como arquiteto e ornamentista sacro. Contando com oficina prpria e com grande nmero de aprendizes, exerceu notvel influncia na constituio das caractersticas bsicas das imagens mineiras, mais contidas e discretas do que as baianas e pernambucanas, porm com extraordinria fora de expresso.

    Filho natural do arquiteto e mestre de obras portugus Manuel Francisco Lisboa e de uma de suas escravas africanas, o Aleijadinho nasceu e passou toda a sua vida em Ouro Preto, onde morreu em 1814 aos 76 anos de idade. Se na Igreja de So Francisco de Assis em Ouro Preto encontram-se as mais requintadas manifestaes de seu talento arquitetnico e ornamental, o gnio do escultor encontrou campo privilegiado de expresso no monumental conjunto do Santurio de Congonhas que rene, em um nico stio, 64 imagens de Passos da Paixo em madeira e 12 esttuas de Profetas em pedra-sabo.

    Executadas entre 1796 e 1799 com o auxlio de artistas colaboradores de sua oficina, as imagens dos Passos distribuem-se em sete grupos, representado sucessivamente os episdios da Ceia dos Apstolos, Agonia no Jardim das Oliveiras (Figura 19), Priso, Flagelao, Coroao de Espinhos, Caminho do Calvrio (Prancha 6) e Crucificao. Cada um desses conjuntos escultricos concebido como uma autntica cena teatral, na tradio europeia das representaes dos Mistrios medievais. O principal destaque em todos os grupos so as esculturas do Cristo,

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    Figura 19. Cristo do Passo da Agonia no Jardim das Oliveiras, por Antnio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, em Congonhas, Minas Gerais

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    nas quais o Aleijadinho representou nuances variadas do sofrimento humano em expresses de extrema sensibilidade.

    J as esculturas dos Profetas, executadas posteriormente, entre 1800 e 1805, foram concentradas em uma rea estratgica nas muretas das escadarias e no parapeito do adro (Figura 20). A impresso de conjunto a de uma coreografia solene, na qual os gestos e as atitudes de cada personagem encontram correspondncia nos demais, tal como nos conjuntos escultricos de Bernini nas igrejas de Roma. Extraordinrio pensar que essas apocalpticas esculturas, consideradas por Germain Bazin como as ltimas expresses autnticas da arte crist ocidental, sejam obras de um artista mestio dos Trpicos, nascido escravo e praticamente autodidata.

    Figura 20. Santurio e adro dos Profetas, em Congonhas, Minas Gerais

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  • Captulo 2

    ARTE NO BRASIL NO SCULO XIX

    E INCIO DO XX

    Sonia Gomes Pereira

    A primeira metade do sculo XIX

    A vinda do Prncipe Regente e da Corte portuguesa em 1808 promoveu, no Brasil, uma grande transformao poltica, econmica e cultural. C om a abertura dos portos, praticamente se encerra o pacto colonial de monoplio com a Metrpole e, da em diante, o Brasil entra no circuito de expanso do capitalismo europeu, exposto a influncias diretas de outros pases alm de Portugal.

    Para adaptar a cidade do Rio de Janeiro posio de capital do Imprio Portugus, d. Joo implementa uma srie de medidas - dentre elas, a criao de uma Academia de Belas Artes - , que visava a dar ao Brasil um perfil atualizado, lanando as bases de instituies que promovessem a infraestrutura econmica necessria ao desempenho capitalista - e fundamentao cultural indispensvel formao de uma elite local, segundo os parmetros iluministas.

    Alm disso, esteve tambm presente na poltica portuguesa, durante a permanncia no Brasil, a ideia de construir um Imprio Portugus Ultramarino, transferindo de vez para o Brasil a sua sede - ideia polmica, que acabou sendo abandonada, mas que certamente motivou o investimento na estruturao da Colnia em busca de um arcabouo compatvel condio de capital da monarquia portuguesa.

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    66A independncia era, dessa forma, inevitvel, e os confli

    tos que tumultuaram o perodo correspondente ao reinado ded. Pedro I e s subsequentes regncias so causados, sobretudo, pelas divergncias em torno do modelo de nao a ser construdo.

    A superao do sistema artstico colonial

    C om esse comentrio geral sobre o cenrio poltico do Brasil na primeira metade do sculo XIX, torna-se possvel entender melhor as profundas modificaes ocorridas na arte brasileira da

    poca.A prtica artstica no perodo colonial encerrava-se pra

    ticamente na produo religiosa - conventos, igrejas e todo o seu recheio tradicional: talha, imaginria, pintura de forros - , ladeada apenas pela interveno dos engenheiros militares na construo e manuteno das fortificaes e na orientao do arruamento das cidades e vilas.

    N o entanto, esse formato tradicional da arte colonial apresentou algumas mudanas a partir de meados do sculo XVIII, sobretudo na capital da Colnia - o Rio de Janeiro. A administrao progressista de governadores e vice-reis equipou a cidade com prdios civis de porte mais monumental, como o Pao, e investiu em servios urbanos tais como o abastecimento de gua, por meio de um aqueduto e alguns chafarizes. N a pintura desse perodo, destacam-se temas no religiosos como o retrato e mesmo a paisagem - adotados por artistas como, por exemplo, Leandro Joaquim , Jos de Oliveira Rosa, Joo Francisco Muzzi, Manuel da Cunha, Manuel Dias de Oliveira e Jos Leandro de Carvalho. Surgiu, ainda, o interesse pelo paisagismo e at mesmo a referncia mitologia greco-romana - como na obra

  • A R T E N O B R A S I L N O S C U L O X I X E I N I C I O D O X X

    67do arquiteto-escultor Mestre Valentim, que construiu o Passeio Pblico, inaugurado em 1783, decorando-o, entre outros elementos, com esttuas em bronze de Apolo, Mercurio, Diana e Jpiter. So sinais evidentes de mudana de gosto, certamente influenciada pelos modelos portugueses contemporneos, que apontavam para um interesse maior por obras laicas e pelo retorno ao classicismo.

    A instituio da Academia de Beias Artes

    no Rio de Janeiro

    Esse processo de mudana de gosto seria radicalizado com a contratao, em 1816, de uma Misso Artstica chefiada por Jacques Lebreton, antigo membro do Instituto de Frana, e integrada pelo arquiteto Grandjean de Montigny, os pintores Nicols Taunay e Jean-Baptiste Debret, o escultor Auguste Tau- nay, o gravador Charles Pradier, alm de alguns artfices, sendo posteriormente incorporados os escultores Marc e Zpherin Ferrez. Vindos para o Brasil principalmente pelas circunstncias polticas ligadas queda de Napoleo, alguns desses artistas posteriormente retornaram Frana, como Nicols Taunay e Pradier, mas outros permaneceram mais tempo, como Debret, ou se radicaram definitivamente, como Montigny e os irmos Ferrez, conseguindo cumprir em 1826 o objetivo maior da chamada Misso Artstica Francesa: a fundao de urna Academia Imperial de Belas Artes na cidade do Rio de Janeiro.

    A Academia inaugurou, no pas, o ensino artstico em moldes formais, em oposio ao aprendizado emprico tpico dos sculos anteriores. Estruturada dentro do sistema acadmico, fornecia um ensino apoiado nos preceitos bsicos do

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    68classicismo: a compreenso da arte como representao do belo ideal; a valorizao dos temas nobres, especialmente de carter exemplar, como a pintura histrica; a importncia do desenho como estruturao bsica da composio; a preferncia por algumas tcnicas, como a pintura a leo, ou de alguns materiais, como o mrmore e o bronze, no caso da escultura.

    Certamente essas novas diretrizes contrariavam a tradio colonial, restrita em grande parte temtica religiosa e ao predomnio de certos materiais como a madeira fato que ser, futuramente, criticado pela historiografia da arte brasileira ligada ao modernismo. Mas inegvel que a Academia ampliou os horizontes das artes plsticas no pas, criando um novo estatuto para o artista, fornecendo-lhe uma formao tcnica aprimorada e expandindo o repertrio temtico.

    Fundada e mantida pelo Estado, a Academia atrelava a produo artstica ao direcionamento oficial, o que seguramente cerceou uma expanso mais livre dos artistas como seria tambm criticado posteriormente pelos modernistas - , mas naquele momento, em que no existia ainda no pas um mercado para consumo das artes, o patronato do Estado foi de vital importncia para o seu desenvolvimento.

    Um dos mais importantes membros dessa Misso Francesa foi o arquiteto Grandjean de Montigny. Nascido em 1776, foi aluno dos arquitetos Charles Percier e Pierre Fontaine, obtendo da Academia de Arquitetura de Paris, em 1799, o prmio mximo - o Prmio de Roma - , que lhe assegurou uma permanncia de seis anos de estudos na Itlia. Voltando Frana, escreveu vrios livros, dentre eles uma obra sobre a arquitetura toscana. Em 1807, foi designado pelo Instituto de Frana para dirigir os trabalhos da sala

  • 69de sesses do Parlamento da Westphalia, onde exerceu as funes de arquiteto rgio.

    Essa era a sua bagagem profissional quando, em 1816, foi contratado para vir ao Brasil. Dessa data at a sua morte, em 1850, Grandjean realizou numerosos projetos de arquitetura e urbanismo, dos quais infelizmente bem poucos se concretizaram- certamente em razo das dificuldades polticas e econmicas do perodo. Cerca de 170 projetos e croquis encontram-se arquivados no Museu Nacional de Belas Artes, na Biblioteca Nacional e no Museu D. Joo VI da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, atestando a sua ampla produo nos mais variados programas: palcios, escolas, teatros, mercados, alfndegas, residncias, alm de inmeros projetos para decoraes festivas e para intervenes urbanas, tais como abertura de praas e avenidas e instalao de chafarizes.

    O seu projeto para o prdio da Academia Imperial de Belas Artes (Figura 21) foi iniciado em 1816 prevendo dois pisos, o superior destinando-se residncia dos professores europeus. Interrompidas as obras em 1817, s foram retomadas em 1823, quando Grandjean o reduziu a um nico pavimento, mantendo o alteamento da parte central, em forma de prtico, terminado em fronto. Concludo em 1826, constitua-se num dos melhores exemplos do rigor neoclssico na cidade mesmo com o acrscimo de um segundo pavimento feito entre 1882 e 1884 - at ser demolido em 1937. Apenas o prtico central foi preservado e levado para o Jardim Botnico, onde se encontra ao fundo de uma alameda de palmeiras imperiais.

    Duas outras obras de Grandjean de M ontigny existem ainda no Rio de Janeiro. Um a delas a antiga Praa do Comrcio,

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  • 70I H I S T O R I A D A A R T E N O B R A S I L

    T X jIZII rnm4y'mir.iU;Figura 21. Grandjean de Montigny. Projeto da Academia Imperial de

    Belas Artes. Litografia s/d. Fonte: Jean-Baptiste Debret. Voyage pictoresque et historique au Brsil. Paris: Firmin Didot Frres, 1834-1839, v. I, p. 467

    atualmente Casa Frana-Brasil, que apresenta uma planta em cruz grega, constituda de duas naves cobertas por abbadas de bero e sustentadas por colunas monumentais - um espao interno tpico da arquitetura neoclssica, por sua harmonia, simetria e clara referncia aos modelos greco-romanos. A outra obra a prpria casa em que viveu o arquiteto, no bairro da Gvea, atualmente Solar Grandjean de Montigny, pertencente Pontifcia Universidade Catlica um exemplo da capacidade do arquiteto de unir o seu repertrio erudito tradio brasileira de casas rurais.

    A importncia de Grandjean de M ontigny est ligada tambm sua atuao no ensino - responsvel pela cadeira de Arquitetura, desde a inaugurao da Academia em 1826 at a sua morte em 1850, formando uma gerao de arquitetos que seria especialmente atuante na segunda metade do sculo, consolidando a longa durao do neoclassicismo na arquitetura brasileira.

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    71Os irmos Marc e Zpherin Ferrez tambm haviam estu

    dado em Paris. Chegados ao Brasil um pouco depois da Misso Francesa, foram a ela incorporados em 1820, ficando Marc responsvel pela cadeira de Escultura, por um perodo semelhante ao de Grandjean: da inaugurao da Academia em 1826 at a sua morte, tambm em 1850. Realizaram numerosos bustos e relevos

    arquitetnicos, sempre seguindo os modelos formais e temticos da Antiguidade clssica, como pode ser visto na ornamentao da fachada da Academia Imperial de Belas Artes (Figura 21).

    O pintor Nicolas Taunay, nascido em 1755, desde o incio de sua carreira dedicara-se pintura de paisagens, executando-as ao ar livre, nas florestas nas imediaes de Paris. Dedicou-se tambm figura humana, acrescentando pequenos personagens em obras de outros paisagistas. Em 1784, tornou-se membro agregado Academia de Belas Artes em Paris e obteve uma bolsa para frequentar a Academia de Frana em Roma. Trs anos depois voltou a Paris, passando a expor no Salo at 1814. Em 1801 ilustrou Os litigantes, de Racine, e, de 1806 a 1807, trabalhou para a Manufatura de Svres. Durante o perodo napolenico, conheceu uma fase de intensa atividade, sendo muito requisitado como pintor de batalhas. Tinha, portanto, uma carreira consolidada como pintor, quando a queda do Imprio determinou sua partida, j sexagenrio, para o Brasil, onde viveu at 1821.

    A produo de Taunay no Brasil abrange, sobretudo, retratos e paisagens. Os seus bigrafos afirmam que, empolgado pela beleza dos panoramas do Rio de Janeiro, fazia enormes caminhadas pelas florestas que circundavam a cidade para descobrir novos pontos de vista. N os cinco anos de permanncia no Rio de Janeiro, produziu cerca de trinta paisagens da cidade e suas ime-

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    72diaes. Dentre elas, o Morro de Santo Antnio em 1816 (Figura 22), em que se revela a sua sensibilidade j de cunho romntico na captao da atmosfera peculiar da cidade.

    Figura 22. Nicolas-Antoine Taunay, 1816. Morro de Santo Antnio.leo sobre tela, 45 x 56,5 cm (Coleo MNBA/Ibram/MinC)

    Tendo retornado Frana em 1821, Nicolas Taunay no chegou a se envolver com o ensino na Academia, s inaugurada em 1826. Deixou em seu lugar o filho, Flix-mile Taunay, que tambm se distinguiria como pintor e professor da cadeira de Pintura de Paisagem, vindo a ser diretor da Academia de 1834

    a 1851.O pintor Jean-Baptiste Debret nasceu em 1768 e muito

    moo acompanhou Itlia o pintor Louis David, de quem era primo. E